banco de idéias nº 55 - jun/jul/ago 2011

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    ndice

    CONSELHODE ADMINISTRAO Arthur Chagas DinizElcio Anibal de Lucca

    Alencar BurtiPaulo de Barros Stewart

    Jorge Gerdau JohannpeterJorge Wilson Simeira Jacob

    Jos Humberto Pires de ArajoRaul Leite LunaRicardo Yazbek

    Roberto Konder BornhausenRomeu Chap Chap

    CONSELHO EDITORIAL Arthur Chagas Diniz - presidente

    Alberto OlivaAlosio Teixeira Garcia

    Antnio Carlos Porto GonalvesBruno Medeiros

    Cndido Jos Mendes PrunesJorge Wilson Simeira Jacob

    Jos Luiz CarvalhoLuiz Alberto Machado

    Nelson Lehmann da SilvaOctavio Amorim Neto

    Roberto FendtRodrigo Constantino

    William Ling

    Og Francisco Leme eUbiratan Borges de Macedo

    (in memoriam)DIRETOR / EDITOR

    Arthur Chagas Diniz

    JORNALISTA RESPONSVELLigia Filgueiras

    RG n 16158 DRT - Rio, RJ

    PUBLICIDADE/ ASSINATURAS:E-mail: [email protected]

    Tel: (21) 2539-1115 - r. 221

    FOTOSImagePlus, Photodisk e Wikipedia.

    INSTITUTO LIBERAL

    Rua Maria Eugnia, 167 - Humait22261-080 - Rio de Janeiro - RJ

    Tel/Fax: (21) 2539-1115E-mail: [email protected]

    Internet: www.institutoliberal.org.br

    Think Tank - A Revista da Livre-Iniciativa

    Ano XV - no 55 - Jun/Jul/Ago - 2011

    Expediente

    ENERGIA 13

    LEGISLATIVO

    LIMPANDOAS FICHASJoo Luiz Coelho da Rocha

    MATRIADE CAPA

    CAPITALISMOBRASILEIRAMarcel Domingos Solimeo

    DESTAQUE

    O MUNDO RABEEAPOLTICA...Jos Alexandre Altahyde Hage

    10

    15

    5

    ECONOMIA

    OS DESAFIOS CONTINUADOSDAUSINADE BELO MONTE

    Adriano Pires e Abel Holtz

    O BOM, O MAUEO FEIOUma viso liberal do fato

    20ESPECIAL 19

    REALIZAO

    BANCODE IDIAS uma publicao do

    Instituto Liberal. permitida a reproduode seu contedo editorial, desde quemencionada a fonte.

    A EVOLUO RECENTEDAINFLAO...Antnio Carlos Prto Gonalves

    LIVROS

    AS CAUSASDO DEBILITAMENTODOLIBERALISMONO SCULO XX

    Og Leme

    26LIBERALISMO 23

    UMASOCIEDADE INFANTILIZADApor Rodrigo Constantino

    Nesta Edio

    NOTASPLC N 306/08

    ENCARTE ESPECIALpor Jos L. Carvalho

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    EditorialSua opinio da maior impor-

    tncia para ns. Escreva paraBanco de Idias.

    Leitores

    Envie as suas mensagens paraa rua Rua Maria Eugnia, 167 -Humait - Rio de Janeiro - RJ -22261-080, ou [email protected].

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    os Alexandre Hage, doutorem cincia polt ica pela

    Unicamp, faz uma atraente viagempelo que chamamos de primavera

    rabe. O que acontece l impactao resto do mundo. As revoltas e ma-nifestaes populares no norte dafrica seguem perspectivas diferen-tes, umas das outras, tendo em co-mum o movimento de massas con-tra governos. O prof. Hage analisaa questo estabelecendo diferenasentre o que os analistas do mundointeiro apontam como manifesta-es em favor da democracia, talcomo concebida no Ocidente.

    A opinio pblica mdia, sacia-da de tantos vexames de seus pol-

    ticos, logo se afeioou defesa daaplicao de lei da Ficha Limpapostulando sua aplicao imediata,percebendo a posio dos quepediam sua aplicao apenas apartir de 2012 como uma mina doseternos corruptos de olho no poderpoltico. O prof. Joo Luiz Coelhoda Rocha aplaude, mas chama aateno para o fato de que nopodemos atropelar a lei eleitoral vi-gente, sob pena de perdermos osbenefcios. A lei no uma pana-cia e a cultura patrimonialista est

    entranhada de tal forma que, nin-gum confessa delito, mesmo quecolhido em flagrante. Outra obser-vao importante o risco que cor-remos tendo uma Corte Superior in-tegrada por ministros de indicaodo Executivo em exerccio.

    Os professores Adriano Pires e Abel Holtz, especialistas eminfraestrutura, analisam os desafiosde construir a Usina de Belo Mon-te. A ideia de construir a hidroeltricaj tem 35 anos, e parece que nosprximos meses estar sendo ini-ciada. Isso est dependendo de umrelatrio favorvel do IBAMA. Osarticulistas, apesar do conjunto depolmicas que envolvem a constru-o da hidreltrica, vem nela umadas solues para uma economiacuja demanda energtica cresce5% a.a. Felizmente, afirmam, o Bra-sil tem fontes renovveis que permi-tem a produo sustentada de ener-gia eltrica sem que seja necess-rio subsidiar seu preo. As ONGsnacionais e internacionais quese opem construo de Belo

    Monte compartilham a viso idlica,ingnua que pretende tirar do passeu poder de explorar seus recur-sos naturais de forma soberana.

    Marcel Solimeo questiona omodelo de capitalismo brasileiro.Ao analisar o que vem ocorrendo,ele avalia a que grau chegou ointervencionismo. Solimeo est con-vencido de que o governo passoua controlar as grandes empresasprivadas, atravs de financiamen-tos subsidiados de longo prazo eparticipao forada de sindicatosem Conselhos de Administrao. Oexemplo mais flagrante o caso dasubstituio do presidente da Vale,que defendia os interesses dos

    acionistas e no as escolhas polti-cas do governo. Outro marcosignificativo desse modelo de capi-talismo estatal a deciso de cons-truir um trem de alta velocidadeentre o Rio e Campinas. Alm doprojeto ter passado sem discussespelo crivo do Congresso que, en-fim, representa a populao, oaodamento do governo acabapor garantir aos eventuais investi-dores um retorno, ainda que cus-ta do contribuinte. Mudar o critriopara a medio do dficit pblico,

    tornar o ndice de preos mais bemcomportado, reduzindo o impostoe o reajuste do preo dos combus-tveis, mudar o direcionamento docrdito, mas no a oferta global demoeda, so procedimentos ado-tados pelas autoridades brasileiras.

    Antonio Carlos Prto Gonalves,economista da FGV, responde aessas questes que j passaram afrequentar as discusses dos brasi-leiros. A conquista da estabilidadedepois de anos de inflao eleva-dssima se deve ao povo brasileiro.No se deve correr riscos.

    O Encarte da presente edio o ensaio do prof. Jos L. Carvalhosobre a poltica ambiental.

    Completam esta edio oextraordinrio texto do saudosoprof. Og Leme, sobre questesque diariamente somos obriga-dos a responder, alm da rese-nha do livro O Estado bab, peloeconomista e escritor RodrigoConstantino. A edio de NOTASaborda o Projeto de Lei Comple-mentar n 306/08.

    JSr. Editor,

    A minha filha e seu marido j meavisaram que vo morar no Canad.No suportam mais ver o descalabroda corrupo poltica brasileira, e noquerem que seus filhos sejam conta-minados com a vida deletria que seinstalou no Pas. Com efeito, aqui otrabalhador honesto e espoliadocom alta carga tributria, sem retor-no em servios pblicos de qualida-de, s para custear a despesa de po-lticos e de mquina pblica. Minhafilha e marido esto enojados comtanta sujeira pblica, patrocinada pe-los poderes da Repblica. Ningum punido. Temos um Judicirio leniente

    e de indicao poltica (STF). O Con-gresso uma casa de compadrio es-prio, onde os conselheiros de ticaso formados por polticos dependu-rados na Justia, e sua comisso maisimportante a CCJ presidida por umpoltico que responde a processo noSTF. No se tem um ensino pblicode qualidade, e muitas cidades brasi-leiras no dispem de escolas prepa-radas para a educao. Enfim, comos professores pblicos mal remune-rados, educao no Brasil no dado o tratamento de escola, na for-ma do disposto constitucional. Comose pode viver em paz no Brasil?

    O Pas que no se preocupa comseu povo e no investe com serieda-de em educao s pode mesmo seratropelado por trambiqueiros, queapenas querem tirar vantagem doprestgio poltico dos cargos que ocu-pam. Enriquecem do dia para a noitee no querem ser investigados pelasociedade. Esses polticos no deve-riam ser objeto de Comisso Parla-mentar de Inqurito, mas de inquritopolicial com punio sumria.

    Jlio Csar Cardoso, por e-mail

    Prezado Jlio,

    A deciso de sua filha e seu genroesto consistentes com o sentimentode indignao que habita pequenaparte de nossa gente. Conte com asolidariedade e o nosso esforo paratentar mudar as coisas.

    O editor

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    Destaque

    O mundo rabe e a poltica:Democracia e revolta no Oriente Mdio

    Jos Alexandre Altahyde HageDoutor em Cincia Poltica pela Unicamp. Professor no curso de Relaes Internacionais da FAAP-SP.

    GUISADE EXPLICAO

    se transformou em lugarcomum dizer que os aconte-

    cimentos polticos do Oriente M-dio, ou do mundo islmico, inte-ressam a todo o sistema interna-cional, de uma forma ou de ou-tra.1 A razo disso que a regio

    tem caractersticas culturais,geopolticas e econmicas que acolocam na primazia das grandesquestes da poltica internacional,

    no passado e na atualidade.H algumas formas de serenvolvido nos desdobramentospolticos do Oriente Mdio, mes-mo que involuntariamente. No

    aspecto cultural e religioso foi emIsrael que nasceram as trs gran-des religies monotestas que con-formam o globo. Praticamente o

    Judasmo, o Cristianismo e oIslamismo marcam presena emtodos os Estados nacionais, deuma forma ou de outra; mesmona China e na ndia, com suas

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    Destaque

    culturas muito peculiares, h pre-sena da mensagem de Cristo edo Profeta, o que nem sempre sed de forma emocionalmenteequilibrada.

    No quesito geopoltico no hcomo ignorar a importncia queo Oriente Mdio tem para a sa-de da poltica mundial. Sobre issopodem ser vislumbradas as ten-tativas da Autoridade Palestina emse firmar frente a Israel que, nofundo, transformou a Palestina emuma espcie de gueto, que vive nadependncia de Jerusalm paraobter o mnimo de viabilidade. AAutoridade Palestina, como medi-da de evoluo para um Estadopropriamente dito, no deixa deser fico, uma vez que sua exis-tncia depende do senhorio emvrios pontos.

    Tambm no h como deixarde reconhecer a militncia irania-na para transformar Teer emcentro relevante para os negciospolticos e econmicos regionais,adentrando, para isso, em temasde profunda sensibilidade, comoo de dominar o ciclo do combus-tvel nuclear. De certa forma, oobjetivo de lograr algum nvel deimportncia poltica para o mun-do rabe algo que perdura des-de as aventuras de T. H. Lawrence,o Lawrence da Arbia, que per-corria a regio para libert-la daspotncias que lutavam na PrimeiraGuerra Mundial, mas sem obtersucesso. Tambm no se podeesquecer dos esforos auto-nomistas do presidente Nasser, no

    Egito dos anos 1950 e 1960,para afastar as grandes potnciasdas decises nacionais.

    No tocante economia, valedizer a economia da energia, oOriente Mdio se torna interesseobrigatrio. Arbia Saudita,Kuwait, Iraque e Ir comportamalgo em torno de 60% das reser-vas mundiais de petrleo, confor-me as estatsticas apresentadaspela Agncia Internacional deEnergia. Pelo fato de a economia

    internacional ser movida a com-bustvel fssil, a rea em questopassa a ter importncia e evidn-cia que vo alm do convencio-nal, at exagerada, uma vez queo drama energtico (sua produ-o e comercializao) migra tam-bm para vizinhos que no guar-dam relevncia como produtoresde hidrocarbonetos, caso do Egitoe da Sria. Com efeito, no soprodutores altura dos mencio-

    ajudam a abrir a porta para mu-danas.

    O descontentamento apresen-tado naqueles pases varia degrau, podendo ir dos protestos decolorao romntica, como emTnis, passando por movimentosde massa, caso do Cairo, e de-sembocando na luta armada, oque se pode ver na Lbia. O resul-tado dessas militncias ainda noest claro e concludo. Por con-seguinte, algumas anlises queso veiculadas podem ser interpre-tadas mais como fruto do desejodo articulador do que autorizadaspela realidade.

    Democracia, estabilidade dojogo poltico e economia, regula-da racionalmente, so atributospresentes no mundo industrializa-do e tidos como avano em esca-la internacional. Mas h necessi-dade de tempo para se saber serealmente esses valores so efeti-vamente o objeto de luta dasatuais manifestaes que envol-vem o mundo rabe e islmico.Abaixo algumas consideraes.

    A PRIMAVERARABE

    As manifestaes e revoltasque marcam presena no Egito,na Lbia e na Tunsia em princpiono devem ser compreendidas demodo homogneo. Embora se-jam pases de cultura rabe eislmica, eles no conformamuma unidade poltica coesa, aexemplo das experincias ociden-tais da atualidade, em que as

    analogias superam divergnciashistricas. No entanto, mesmoque pases rabes tenham expe-rincias e culturas distintas, ain-da assim h como dizer que o ter-mo oriente, para identific-los,no congruente, embora de usoconsagrado.

    O professor Mohamed Habib,da Universidade Federal do Rio deJaneiro, no atribui validade aotermo oriental para designar po-vos de origem semita, o que vale

    nados, mas Cairo e Damasco socentros de aglutinao polticaque acabam expressando confli-tos que a regio fomenta.

    Por isso que se deve conside-rar os mega-acontecimentos decarter poltico e cultural de pa-ses como Egito, Tunsia e Lbia,com poder de irradiar suas crisespara outros centros internacio-nais. Desde janeiro de 2011 apopulao desses Estados animamanifestaes que passaram a serconhecidas pelo termo Primave-ra rabe, em que grupos demons-tram amplo descontentamentocom seus governantes e, assim,

    No tocante

    economia, vale dizera economia daenergia, o Oriente

    Mdio se tornainteresse obriga-

    trio. Arbia Saudita,Kuwait, Iraque e Ir

    comportam algoem torno de 60% das

    reservas mundiaisde petrleo,

    conforme as esta-tsticas apresen-tadas pela Agncia

    Internacional deEnergia.

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    para rabes e judeus. Isto porquese trata de gente que professa esegue, em grande parte, os mes-mos valores que constituem cul-turalmente o ocidente judaico-cristo, a saber, a prpria filoso-fia que remonta ao perodo cls-sico greco-romano e transporta-

    da por pensadores rabes para aEuropa Ocidental. Alis, foi nonorte da frica que nasceram San-to Agostinho e um dos mais origi-nais pensadores rabes para acincia poltica europia, anteci-pando Maquiavel, Ibn Jaldun.2

    No mesmo nvel de dilogohavia preocupaes de EdwardSaid, da Universidade de Co-lumbia, para quem o termoorientalismo, para compreenderos povos rabes, no deixava de

    ser artificialismo intelectual daGr-Bretanha e da Frana impe-rialistas, cujo objetivo era justa-mente atribuir viso extica e ex-cntrica a povos subordinados aosdois poderes.3 Desta forma, oorientalismo se transformou eminstrumento de fascinao sobreos rabes como se fossem seresexticos, donos de mistrios esensualidades infinitos, que deve-riam ser catalogados nocomo pertencentes ao mesmo

    tronco cultural, mas como orien-tais, distantes.

    Esses elementos conceituaisacima so importantes para com-preender a atual situao do Ori-ente Mdio e norte da frica.Aquelas revoltas no so excn-tricas. Elas fazem parte de um cir-

    cuito de descontentamento que,de alguma forma, liga-se s con-testaes que vm grassando halguns anos na Europa Ociden-tal e nos Estados Unidos. E quaisso os motivos mais exaltadospara isso? A resposta pode ser aangstia sobre o futuro sob umaeconomia internacional desajus-tada e sem perspectiva de pro-gresso para a maioria.

    Em outra instncia, o desen-volvimento econmico dos gran-

    des pases rabes se deu por meiodo Estado (capitalista estatal), fun-dando empresas e se responsabi-lizando pelo pleno emprego. Ple-no emprego que, alm de nuncater existido no mesmo nvel doeuropeu, recebeu golpes forts-simos nos anos 1990, com o pro-cesso de reforma institucional doEstado, bem como da crise de2008.

    bom recordar que o desen-volvimento poltico e econmico

    do Egito, primeira vista, nodeixou de ser feito sob inspiraeseuropias e com toques deiluminismo. Pode-se dizer que acriao da Irmandade Muul-mana, nos anos 1920, guardarelao com o padro culturalEuropeu? De incio a resposta

    no para a pergunta. Mas se forobservada uma outra vertente, hde se considerar que aquilo que aIrmandade demandava no erato estranho para pases como aFrana ou os Estados Unidos,uma vez que o desejo dos irmosmuulmanos era a libertao realdo Egito, que era consideradopas subordinado ao Reino Unido.E nesse aspecto a libertao e acriao do Estado nacional noso patrimnios europeus espa-

    lhados pelo mundo? A Primavera rabe pode serinterpretada como marca de in-satisfao contra um modelo deestabilidade poltica que no maisfunciona. O modelo posto emquesto advm justamente da lutade empenho nacional que o pre-sidente Nasser organizara no Egi-to para fazer, de alguma forma, oEstado sob o estilo ocidental comexrcitos regulares, com errio ecom burocracia especializada.

    Arbia Saudita, Kuwait, Iraque e Ir comportam algo em torno de 60% das reservas mundiais de petrleo.

    Destaque

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    www.institutoliberal.org.br

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    Instituto Liberal

    A Sucia depoisdo modelo suecode Mauricio Rojas

    Este livro mostra o que

    aconteceu com o modelo de

    welfare state implantado

    naquele pas. Originalmente socialista, Rojas assistiu

    debacle do famoso modelo sueco

    da economia do bem-estar e s

    alteraes que se sucederam,

    desmascarando a derradeira

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    Destaque

    Mas necessrio frisar queesse modelo de desenvolvimentopoltico e econmico tpico dosanos 1950 no existiu somente noEgito de Nasser. Regimes anlo-gos ou inspirados nele estiverampresentes na Arglia de Ben Bella,nos anos 1960, no Iraque deSadan Hussein e na Lbia do co-ronel Kadhafi nos anos 1970 plataformas nacionalistas e comtoques de racionalidade poltico-administrativa. Isto sem mencio-nar a Amrica Latina, lugar deexcelncia nos experimentos daeconomia autrquica. Afinal, pormais estranho que possa parecer,Iraque e Lbia tiveram algum mo-delo de industrializao, eficinciaeconmica e bem-estar social,pleiteando reforma agrria, sa-de e educao universais e direito moradia.4

    Ento, quais so os elementosque concorrem para provocardesgastes polticos e sociais in-ditos naqueles pases? Alm damencionada crise de 2008, htambm que citar o pacto pro-posto h dcadas pelo estilo na-cionalista que procurava oferecercerto nvel de desenvolvimentosocial e econmico que, em trocade anuncia poltica, comeou afazer gua. Em outras palavras,enquanto o projeto autoritrioconseguia oferecer compensa-es, a sociedade aceitava diri-gentes que tambm tinham ves-tes de heris e lderes, uma vez queeram anti-imperialistas.

    As manifestaes que come-

    aram com a queda do governoBen Ali, na Tunsia, existiram emvirtude da indiferena que aquelegoverno mantinha perante a aladesprotegida da sociedade. A pla-taforma autoritria que governa-va desde 1987 no tinha maisinsumos para manter a estabilida-de. O mesmo vale para o Egito,sob o governo Mubarak, que co-mandara o pas por mais de trin-ta anos e no toa comentarque o Cairo a maior cidade

    Islmica do mundo. O que os pa-ses rabes de modo geral tm emcomum, na atualidade, falta deprojeto de longo prazo para umapopulao majoritariamente jo-vem, com menos de trinta anos.Populao vida por emprego emelhores condies de vida. Go-vernos autocrticos, cujo modeloperdurava desde os anos 1950,no mais tinham condies decontinuar com aquelas mesmasfeies e exigindo lealdade.

    No caso da Lbia estava paten-te que seu socialismo modarabe e com toques islmicos,presente no Livro Verde deKadhafi, no apresentava condi-es de sobreviver em um climapoltico em que a populao jo-vem exige novos parmetros ebusca novas conquistas. A ques-to no ignorar ou desprezarseus governantes, at porque elesdeviam contar com alguma basede legitimidade, mas saber queesses mesmos governantes sefossilizaram no tempo e perderamo real contato com o povo.

    Por conseguinte, as revoltas emanifestaes populares no nor-te da frica seguem perspectivasdiferentes, tendo em comum omovimento de massas contra go-vernos. Contudo, o desfecho po-ltico disso tudo no deve serapontado, a no ser como expres-so de escolha individual. Porexemplo, boa parte dos analistaschega a apontar a emergncia dademocracia naqueles pases, sen-do que (para quem cita) demo-

    cracia deve ser aquele regime ex-trado da Europa Ocidental.Vale dizer, democracia que seja

    pautada por reconhecida regrado jogo, que contemple a existn-cia de partidos polticos indepen-dentes e organizados, em que hajaliberdade de crtica e de imprensae, por fim, que haja tambm umainstituio de carter superior,que no somente regule as regrasdo jogo eleitoral mas atribuaa vitria a quem de direito,

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    Destaque

    ainda que isso traga algum des-gosto, como se fosse um SuperiorTribunal Eleitoral.

    De fato, isso se aproxima daconcepo de democracia que ogrande pensador austracoSchumpeter havia feito demo-cracia por procedimento, que sejalinear e no cause perturbaesprofundas. Em parte pode-se di-zer que essa democracia a queviceja no pacto ps-SegundaGuerra na Europa Ocidental, en-tre os partidos trabalhistas, comu-nistas e cristos. Mas mesmo noVelho Mundo o conceito de de-mocracia tambm passa por no-vas interpretaes, que vo almdaquele pacto feito para angariargovernabilidade.

    Certamente as revoltas domundo rabe, e afins, so popu-lares e expressam as angstias desetores mais vulnerveis economi-camente. Mas, apesar de tudo,isso no nos d ainda elementospara dizer que haver democra-cia no Egito ou na Lbia. Isso por-que historicamente no h l ins-tituies que sejam anlogas sque so conhecidas na Europa ounos Estados Unidos o que devevaler tambm para outros pases,como o Brasil atualmente. Pode-se corroborar as observaes doprofessor Habib e de Said sobreimputar o termo oriental aos ra-bes, apesar das distncias e dosvalores que os separam da Eu-ropa.

    Porm, mesmo adotando asobservaes dos dois intelectuais

    no deixa de ser lcito observartambm que a democracia no transferida de modo instantneoou por procurao. Na base,pode ser que europeus e rabessejam frutos da mesma culturajudaico-crist ou greco-romana.No entanto, isso no significa quea democracia ser implantadapor causa disso. Pode at haver aconstruo de regime convenien-te e legtimo, mas ele no poderser compreendido logo como de-

    mocrtico, mesmo que seja deinspirao popular.

    De incio, h que se conside-rar que a democracia, obrigato-riamente, no fruto da vontadenacional, como havia imaginadoJean-Jacques Rousseau, em quea democracia seria direta, semintermedirios. No fundo, no hcomo saber se as revoltas popu-lares no estariam demonstrandoforte descontentamento contraplataformas autoritrias e esgota-

    1 No ignoramos que por OrienteMdio se deve compreender, geogra-ficamente, os Estados localizados en-tre o Egito e o Ir, e banhados peloMar Mediterrneo, como Israel (e a Autoridade Palestina), Lbano, Sria,Jordnia e Iraque. Contudo, como fe-nmeno poltico e cultural devemosestender esse raciocnio abarcandooutras localidades, como o prprioEgito, os vizinhos da frica do Norte,igualmente rabes e islmicos, o Ire a Turquia que no so rabes,

    mas islamizados.2 Em portugus no h mais prati-camente textos de Ibn Jaldun. Em es-panhol, a importante editora mexica-na Fondo de Cultura Econmica edi-tou Introduccin a la Histria Univer- sal. Mxico-DF, Fondo de CulturaEconmica, 1997. No mbito dos es-tudos internacionais dois importantesanalistas dedicaram trabalho ao pen- sador rabe, Yves Lacoste e RobertCox.

    3 Trata-se do livro Orientalismo: OOriente como Inveno do Ociden-te, de Edward Said. So Paulo, Cia.das Letras, 2007.

    4 Concordamos que possa ser con-traproducente procurar ver traos devirtude social em governos que atual-mente so defenestrados do poder. Istono quer dizer aceitar o autoritarismode Hussein ou Kadhafi pelo fato deconstatar avanos no bem-estar socialem seus governos. A posio da Lbiana escala do ndice de Desenvolvi-mento Humano das Naes Huma-nas, no ano de 2010, era 53, certa-

    mente a mais alta de todo o conti-nente, uma vez que a posio damaior potncia africana, a frica doSul, era 110. Apenas a ttulo decomparao, a posio brasileira noIDH 73. A quem se interessaadentrar aos projetos de desenvolvi-mento rabe, ver: Peter Gowan, ARoleta Global. Rio de Janeiro, Re-cord, 2003. Ver tambm John Pilger,Os Novos Senhores do Mundo. Riode Janeiro, Record, 2004.

    NOTASE REFERNCIASBIBLIOGRFICAS

    Por conseguinte,as revoltas e mani-festaes populares

    no norte da fricaseguem perspectivasdiferentes, tendo emcomum o movimentode massas contra

    governos. Contudo,o desfecho polticodisso tudo no deve

    ser apontado, ano ser comoexpresso de

    escolha individual.

    das para, depois de certo arran-jo, desejar a existncia de outraque tenha mais vigor e nimo,mas tambm baseada em gru-pos fortes, na confiana mais

    sobre o homem do que nas ins-tituies etc. Vigor e nimo necessrios

    para enfrentar questes hist-ricas dentro da Lbia, na ArbiaSaudita e em parte do Egito, asaber, a dificuldade de se insti-tuir o poder de Estado centrali-zado sem sofrer os desgastes depresses tribais, localistas e ex-t remis tas que tambm noapreciam Kadhafi ou a famliareal saudita.

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    Limpando as fichasJoo Luiz Coelho da Rocha

    Advogado. Scio do escritrio Bastos-Tigre, Coelho da Rocha e Lopes Advogados.

    Legislativo

    uma certa tendncia cul-tural brasileira em somente

    reagir a fatos danosos ou cho-cantes de uma maneira espas-mdica. Veja-se agora o casodesse monstruoso assassinato decrianas numa escola pblica, emque de imediato surgem congres-

    sistas e formadores de opi-nio bradando pela proibiode venda de armas. A matria es-tava vencida, derrotada em umplebiscito popular, mas em face dochoque, da comoo logo surgemos que surfam nessas ondas parasolicitar medidas drsticas.

    De igual maneira, na questoto longa, to arraigada entrens, da corrupo que tem vi-cejado na nossa representaopopular, depois de tantas incidn-

    cias pblicas fora as no reve-ladas de corrupo, de mau usodos nossos recursos, apareceuenfim uma bem acolhida lei da fi-cha limpa, a Lei Complementar n164 de junho de 2010, destina-da a tentar seccionar na origemtais tendncias malss exigindo

    um passado atestadamente livrede condenaes penais, eleitoraisou no, como condio de can-didatura a postos pblicos.

    Assim, a lei boa em suas re-gras mais estritas para registro decandidatos a postos eletivos, ain-da que no seja nenhuma pedrade toque ou elixir miraculosopara solver os problemas en-dmicos da corrupo entre nos-sos agentes pblicos. Isso porquetantos eleitos no passado, sem

    nenhuma mcula formal emseu currculo, acabaram por seintoxicar com a tentao doganho fcil com o uso de seucargo, pela vertiginosa vocaopatrimonialista que por tantosanos permeia o exerccio dopoder no pas.

    Na esteira da promulgaodaquela lei complementar surgi-ram questes sobre sua aplicaos eleies gerais de outubro de2010, pois que pelo princpiogeral da vigncia legislativa nopas pode ela trazer, como no nos-so caso, regra de eficcia imedia-ta, assim que publicada (artigo 5da LC164).

    Processos judiciais chegaramaos tribunais superiores do pas,contestando a aplicao da lei

    H

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    quelas eleies de 2010, poisque havia normas especficas deinaplicabilidade matria de pro-cesso eleitoral quando este j es-tivesse em curso. A partir da vi-mos um aceso debate entre osministros, antes no Tribunal Supe-rior Eleitoral, depois em ltima ins-tncia no Supremo Tribunal Fede-ral, refletindo uma divergncia cla-ra entre os que solicitavam a apli-cao desde logo da lei moraliza-dora, sob argumentos de princ-pio da moralidade ou de que alino se cuidava de processo elei-toral, mas de condies bsicas

    de inscrio de candidaturas, eoutros que se aferraram ma-triz de inaplicabilidade da lei aocurso eleitoral j em existnciaquando publicada a lei, em nomeda segurana jurdica de todo equalquer cidado.

    Como se cuida de assuntoafeto a interesse popular bvio, vista de nosso histrico inesgot-vel de corrupo entre nossos ho-mens pblicos, acompanhou-secom certa proximidade tal debate

    judicirio, na imprensa e na mdiaeletrnica, o que acabou por cau-sar um festival de extensos votosmanifestados naqueles tribunais.

    Admite-se que a opinio p-blica mdia, saciada de tantos ve-xames de seus polticos, logo seafeioou defesa da aplicao deimediato da lei da ficha limpa,percebendo a posio dos quepostulavam sua eficcia somentenas eleies de 2012 como maisuma arma dos eternos corruptos

    de olho no poder poltico.Tal entendimento h de ser, anosso ver, apreciado cum granumsalis, pois que por trs dessa fre-ntica busca moralizadora, corre-ta e louvvel por ser moralizadora,mas perigosa por ser frentica,existe uma porta aberta para abu-sos do poder estatal e poltico di-ante de seus cidados.

    Alguns ministros do TSE, Tribu-nal Superior Eleitoral, e depois doSTF, Supremo Tribunal Federal, se

    apresentaram extremamente rigo-rosos, proclamando a necessida-de da imediata aplicao das re-gras restritivas da LC 164 s pr-prias eleies de outubro de2010, sob bsicos argumentoscalcados nos princpios moraliza-dores da lei. Nesses momentos,como de hbito, mais ainda ago-ra, em que a TV estatal transmitesesses do judicirio superior,mostram-se facetas demaggicas

    de magistrados muito prestes adivulgar palavras de cunhobravateiro, procurando preenchero lugar de justiceiros atentos ao

    clamor das ruas.Ora, a mais que justa e com-preensvel indignao popularcom esse desfile de atos decorrupo, revelados como liga-dos a representantes polticos, nojustifica uma adeso sfrega edesastrada s normas moraliza-doras, passando por cima deparmetros constitucionais bsi-cos que so, na verdade, garan-tias de todos os cidados. Comodizem os americanos na letra ines-

    quecvel da cano popular:Fools rush in where wise mennever go....

    Como a lei da ficha limpa sveio luz quando a campanhaeleitoral j estava em curso, v-laj exigvel em seus padres restri-tivos naquelas eleies seria per-verter a garantia legal de que alei nova s poder se aplicar aprocessos eleitorais ainda no ini-ciados, j com seu procedimentoento corrente. Palavras tortuosasdo ministro Ayres de Brito, no

    seu estilo flamboyant, tentavamesclarecer que condies de

    inexistncia de condenaes pr-vias no dizem vez a processoeleitoral, mas a requisitos bsicosde candidatos, mas tal sofisma,aliado dialtica cansativado julgador, no conseguiu pre-valecer.

    Na verdade, at que todo onovo ordenamento seja aplicadosem afronta Constituio, demodo sereno e sopesado, cabe aoeleitor, ilustrado pela divulgaoda eventual ficha limpa, no vo-

    tar em tais candidatos. Ao se de-mandar o necessrio respeito abases constitucionais no se estconvalidando ou ratificando con-dutas ilcitas no passado de can-didatos, mas se pautando pelorespeito a garantias bsicas dacidadania, cujo afrontar pode tra-zer consequncias terrveis emoutras questes em que tal ten-dncia, por desrespeito a situa-es j constitudas, j passadas, sempre um recurso tirnico que

    o Prncipe pode utilizar quandomenos se espera.De todo modo, o episdio do

    qual aqui cuidamos revela a faceum tanto demaggica, um tantoexibicionista e muito despreparadade grande parte do Judicirio nasua faceta lulista, representadopor julgadores como RicardoLewendovski, Joaquim Barbosa eCarmen Lcia, que trataram damatria de uma forma visivelmen-te voltada s grandes platias,

    Legislativo

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    A opinio pblica

    mdia, saciada detantos vexames deseus polticos, logo

    se afeioou defesada aplicao de ime-diato da lei da fichalimpa, percebendo a

    posio dos quepostulavam sua

    eficcia somente nas

    eleies de 2012como mais umaarma dos eternos

    corruptos de olho nopoder poltico.

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    cleres em arguir pontos morali-zadores, em levantar vozes con-tra poderosos e diatribes seme-lhantes.

    Lembramos que a LC 164veda candidatura, em certos ca-sos, onde no h ainda trnsitoem julgado da deciso conde-natria sobre o candidato, valedizer, onde ainda cabe recurso arespeito, e concordamos em quetal foi necessrio, vista do nos-so interminvel sistema recursal,aliado morosidade legendriado poder judicirio. Mas, porisso mesmo, muito cuidado foi

    necessrio quanto vignciadas novas regras, e um dessescuidados teve a ver com suairretroatividade.

    O episdio, encerrado na suafase judicial em uma apertadavotao por maioria de um voto,refletiu assim esse carterciclotmico da nacionalidade, ha-via tantos anos inerte, estarrecidacom tantos desvios de conduta,mas amortecida na capacidadede reao e, de repente, sfrega

    e aodada na busca de um cor-retivo atropelado a princpiosconstitucionais.

    Mostrou ainda que certosjulgadores, quase todos egressosda era Lula de indicaes ao STF,no possuem o necessrio dis-tanciamento das infuses dema-ggicas, aproveitando o apreciarde temas to relevantes para de-cidir mais de olho na plateia doque na justia.

    Enfim, a lei da ficha limpa benfica para o pas, mas, parausarmos a expresso comum,no nenhuma panacia a resol-ver os endmicos problemas decorrupo da poltica brasileira.Mais importante, sem dvida, se-ria um zelo e controle mais estritodos atos dos estatocratas, a taltransparncia to falada para ovazio, e tambm uma aojudicante muito mais presta e efi-ciente pelo mesmo poder judici-

    rio, de sorte que os indiciadostenham seus julgamentos chega-dos ao fim em tempo pelo menosrazovel, sem as inacreditveis de-moras claramente debitveis aoemperramento, lentido, ao eter-no apego a formalismos de nos-sos julgadores.

    Por um estranho problemascioantropolgico na nossa cul-

    tura genrica, no Brasil ningumconfessa, mesmo colhido em fla-grante delituoso, o que j por siembarga e prejudica um deslindemais rpido do evento.

    Mais que a sofreguido exi-bida em ver aplicvel a nova lei,os ministros que tanto apego pa-recem mostrar luta pela mo-ralidade poderiam atuar de modomais discreto e efetivo na per-secuo criminal dos agentes p-blicos que incidirem em delitos li-

    gados ao exerccio desvioso deseu poder. Assim se combate opernicioso hbito patrimonialistabrasileiro que tanto tem atrasadoo real crescimento do pas. Aodireta, serena, concentrada, semnecessidade de um display de vai-dades em elocubraes verbaisde duvidosa consistncia, comovimos nesse ridculo julgamento

    sobre efeitos das unies homo-afetivas.A lei da ficha limpa merit-

    ria, mas outras leis h muitotempo existem fustigando acorrupo pblica, e os senhoresministros podem e devem aplicaras mesmas em um exerccio s-rio, educativo, da judicatura, dis-pensveis as exibies demaggi-cas que pouco contribuem parao aperfeioamento das institui-es polticas do pas.

    Legislativo

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    Ministros do STF proclamaram necessidade da aplicao das regras da LC 164 s eleiesde outubro 2010.

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    Os desafios continuados dausina de Belo Monte

    Adriano Pires1 e Abel Holtz21 Diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE).

    2 Engenheiro, consultor na rea de energia e negcios.

    esmo com a determinadaao do governo para tor-

    nar realidade o projeto de BeloMonte, ao esta que se tornouvoluntariosa e no levou em con-ta os impactos que podem cau-sar aos demais empreendimentosamaznicos, o projeto custa adeslanchar. A deciso da Vale desubstituir o pseudoautoprodutortrouxe um peso maior composi-o da Nesa (EPE criada paratocar o projeto) e, se o IBAMAdeixar, o projeto dever iniciaras obras principais ainda estesemestre.

    O que est em questo , doponto de vista ambiental e execu-tivo, a ao emocional desprovidade bom senso. O projeto atraiemoes desde que se chamavaKarara. E, mesmo tendo muda-do de nome e sido reestudado,no deixou de causar calafrios em

    alguns e xtase em outros. Almdisso, a rejeio de ambientalistase populaes locais que se achamagredidas dever causar obstru-es ao bom curso de sua im-plantao, com custos adicionaisimprevisveis e, possivelmente,multas por atrasos.

    Cabe o registro de que, aocontrrio do que ocorre na Euro-pa, onde as ONGs contrrias aoprojeto esto sediadas, a capaci-dade de gerao brasileira pre-cisa crescer a passos monumen-tais. Enquanto o nosso consumode energia eltrica deve aumen-tar mais do que 5% ao ano, a taxaeuropia da ordem de 2%. Essebaixo ritmo de crescimento possi-bilita aos europeus construremusinas solares e elicas parasubstituir usinas termeltricas enucleares cuja operao aproxi-ma-se do final da vida til.

    muito importante atentar paraeste fato.

    Apesar de investir fortementeem programas de energias alter-nativas, os pases europeus, secomparados ao Brasil, aindaesto engatinhando no uso de fon-tes renovveis. Na Alemanha, passempre citado como exemplo douso de fontes renovveis, apenas10% da energia eltrica so pro-duzidos por essas fontes, a inclu-das as hidreltricas. Enquantoisso, no Brasil, as usinas hidrel-tricas continuam produzindo maisde 90% da eletricidade gerada nopas sem usufrurem de qualquersubsdio. No podemos abrir modisso, da a importncia das usi-nas do Madeira, de Belo Montee de outras que devero serconstrudas na Amaznia.

    Alm disso, os programas deenergia renovvel nos pases de-

    M

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    Energia

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    senvolvidos tm por detrs gran-des volumes de subsdios ou aobrigatoriedade de compra deenergia dessas fontes por parte

    dos distribuidores de energia el-trica. Em ambos os casos, isso temlevado a aumentos significativosnas tarifas pagas pelos consumi-dores ou nos impostos pagos pelasociedade.

    A usina de Belo Monte ser dotipo fio dgua e est sendo pro-jetada para atender as limitaesambientais, e seu novo projetocontempla um reservatrio de516 km, considerados 134 qui-lmetros no Reservatrio dos Ca-

    nais e, dos 382 quilmetros res-tantes, 228 quilmetros no pr-prio leito do rio Xingu. Os dadosapresentados ao Ibama indicamque Belo Monte ter 27 turbinas,sendo 20 Francis de 550 Mwcada, mais nove turbinas Bulbocom 25,9 Mw cada, com redu-o da capacidade de gerao noperodo seco.

    Cabe reafirmar que a des-peito de tudo que possa ser ditosobre a obra, a construo da

    usina de Belo Monte assegura aproduo de uma energia limpa,aumenta de forma substancial aoferta de energia eltrica apreos competitivos per se e dgarantia de fornecimento de ener-gia ao setor produtivo nacionalnum contexto de retomada docrescimento econmico. E estefato a Vale percebeu, e por issoentrou no projeto.

    O fato que a construo dehidreltricas em nosso Pas um

    tema que tem motivado grandesembates entre governo e am-bientalistas, Ministrio Pblico eAdvocacia Geral da Unio, ndi-os ao lado de religiosos e Insti-tuto Brasileiro de Recursos Reno-vveis, Empresa de PlanejamentoEnergtico e Tribunal de Contasda Unio, Agncia Nacional deEnergia Eltrica e Agencia Nacio-nal de guas, empresas pblicase empresas privadas, ONGs na-cionais e internacionais.

    Associaes, investidores, go-verno, consumidores, tcnicos,jornalistas, cineastas, curiosos epessoas comuns da sociedade

    tm lido, escrito e conversado so-bre Belo Monte. A discusso giraem torno de custos, dificuldadesde construo, agresses flores-ta, aos silvcolas e s pessoas quehabitam a regio da hidreltricae a rea de sua influncia, inclu-sive onde sero implantadas as li-nhas de transmisso que ligaroa usina ao sistema interligadonacional.

    O fator de capacidade de BeloMonte de aproximadamente0,44, inferior mdia das hidre-ltricas existentes hoje, entre 0,50

    e 0,60.No perodo seco da bacia dorio sero gerados cerca de 2.800Mw mdios, significando dizer quedurante esse perodo os investido-res estaro tendo que comprar deoutras geradoras do sistema1.600 Mw mdios para atenderseus compromissos nos contratosde venda de energia. Um custoadicional queles necessrios aoinvestimento. certo que a com-pra se far pelo preo do MRE

    (Mecanismo de Realocao deEnergia).Quando o rio estiver no pe-

    rodo de cheias, a hidreltrica es-tar operando com todas as suasmquinas gerando e entregandoao sistema quase o mesmo mon-tante de Mw mdios que estarautorizada a comercializar, rece-bendo pelo mesmo MRE umareceita que no impactar noequilbrio econmico-financeirodo projeto.

    A viso idlica, ingnua que dprojeo miditica tem que serrevertida para que o pas ofereapreos de energia eltrica compe-titivos, aproveitando sua vanta-gem comparativa vis--vis outrospases dada pela construo desuas hidreltricas.

    Assim, nosso governo deveinterpretar a ao dos rgos con-trrios ao nosso desenvolvimentocom a abrangncia que nos in-quieta.

    preciso no ser aodado eestruturar os projetos na Amaz-nia sem voluntarismo, sem abrirmo do direito legitimo e indel-vel de virmos a explorar nossosrecursos naturais na AmazniaBrasileira de forma soberana ecuidadosa, pois sabemos que ofuturo do Pas interessa preci-puamente aos brasileiros e ener-gia e meio ambiente so de nossointeresse e base para manutenode nossa independncia.

    A exatido dos elementos emdiscusso infelizmente s poderser conhecida quando o projetovier a ser concludo, aps ter per-corrido uma verdadeira viacrucis

    que se estende por mais de 35anos, desde os estudos iniciais.Isso considerando que o leiloser realizado como previsto.

    Registre-se que a Eletrobrasmenciona que as vazes do Xingu,no trecho onde ser construda ausina, tm uma mdia de 19.816metros cbicos de gua por se-gundo nos meses de abril a se-tembro. A partir da o fluxo caipara 1.065 metros cbicos porsegundo uma reduo de 94%.

    Energia

    A viso idlica,ingnua que d

    projeo miditicatem que ser rever-

    tida para que o pasoferea preos deenergia eltrica

    competitivos, apro-veitando sua vanta-

    gem comparativavis--visoutros

    pases dada pelaconstruo de suas

    hidreltricas.

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    m uma economia de mer-cado, as decises dos agen-

    tes econmicos so tomadas combase em suas expectativas quan-to aos resultados de seus investi-mentos, os quais podem ser posi-tivos ou negativos, pelo que o ca-pital investido denominado de capital de risco. Se uma ativida-de considerada essencial no atraio setor privado o governo realiza

    diretamente o investimento ouconcede incentivos para que asempresas possam faz-lo.

    Cabe sociedade, por sua re-presentao no Congresso, defi-nir quais projetos ou atividadesdevem ser executadas diretamen-te pelo Estado ou podem receberincentivos para que o setor priva-do os execute, tendo em conside-rao critrios como prioridade,

    relao custo/benefcio e a formamais eficiente do uso dos recur-sos. Com as PPP Parceria P-blico Privada, que consistem emum contrato de prestao de ser-vios de mdio e longo prazos,procura o governo incentivar osetor privado a financiar proje-tos de interesse social.

    Nem sempre, no entanto, osprincpios da economia de mer-

    E

    Matria de Capa

    Capitalismo brasileiraMarcel Domingos Solimeo

    Economista do Instituto de Economia da Associao Comercial de So Paulo.

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    Matria de Capa

    cado, com decises empresariaisbaseadas em anlise econmica,ou o interesse pblico, expressona participao da sociedadeatravs do Parlamento, so con-siderados. A deciso de construiro TAV Trem de Alta Velocidade(o popular trem-bala) foi ape-nas do Executivo, e as condiespara a sua execuo foramfixadas pela Medida ProvisriaN 511/10 que, embora aprova-da pelo Congresso, no contouefetivamente com qualquer con-tribuio do Congresso, que se li-mitou a referendar a posio

    do Executivo.Assim, o BNDES vai garantir ofinanciamento de at R$20 bi-lhes ao projeto do trem-bala,de um custo total previsto de R$33,1 bilhes, que seguramenteser ultrapassado em muito. Ataxa de juros de TJLP mais 1% aoano claramente envolve subsdioa ser suportado pelo contribuin-te. Mais absurdo do que o finan-ciamento subsidiado do BNDES,a Unio ainda garante um subs-

    dio de at R$5 bilhes para aempresa construtora, caso a de-manda efetiva no atinja a previ-so que serviu de base ao clculoeconmico do projeto. Segura-mente, o subsdio ser necess-rio, porque os estudos de viabili-dade econmica do projeto noparecem dar segurana ao inves-timento.

    Assim, tudo indica que, emcondies normais, os investido-res no se interessariam pelo pro-

    jeto, por no consider-lo econo-micamente vivel.Com a garantia da MP 511,

    no entanto, essa anlise deixa deser fundamental para a deciso,porque uma possvel, e bastanteprovvel, demanda abaixo do pre-visto no projeto ser coberta peloTesouro. Perde-se, assim, umparmetro relevante para a avali-ao da rentabilidade da obra, etransfere-se ao contribuinte umrisco que deveria ser do investidor.

    O subsdio da taxa de juros ea garantia governamental talvezpudessem se justificar em um pro-jeto altamente prioritrio e de ele-vado benefcio social. Conside-rando-se, no entanto, as deficin-cias na infraestrutura e as carn-cias na rea social, parece difcilaceitar que uma obra faranicacomo essa seja prioritria.

    Alm disso, no caso do TAV, noentanto, no parece haver justifi-

    Esse exemplo, infelizmente,no o nico de interveno dogoverno que provoca distoresque reduzem a eficincia da eco-nomia.

    Quando a Companhia Vale doRio Doce, que era uma empresaestatal ineficiente, foi privatizada,houve uma mobilizao contrriatanto da parte do PT como dossindicatos. Essa reao no se li-mitou aos protestos verbais, masatingiu, em muitas oportunida-des, uma violncia descabida.

    Atualmente a Vale a segun-da mineradora do mundo, uma

    empresa altamente rentvel e qued grande contribuio ao saldoda balana comercial. Suas aesganharam muito valor na Bolsa,e seus resultados tm sido muitosatisfatrios para os acionistas.Como empresa de capital aber-to, apresenta a transparnciaexigida pela CVM e pelo merca-do. Contribui de forma importan-te para o Tesouro com o paga-mento de impostos, e para a eco-nomia com a gerao de empre-

    gos e renda.O executivo Roger Agnelli mos-trou-se bastante competente nagesto da empresa, tendo em vistao interesse dos acionistas, entre osquais se encontram grandes gru-pos empresariais e fundos de pen-so, mas, tambm, milhares depequenos investidores. Se foi efi-ciente como administrador, Agnellino se mostrou igualmente hbildo ponto de vista poltico, ao con-trariar os donos do Poder, que

    pretendiam impor diretrizes paraa empresa.Assim, Agnelli foi substitudo, e

    a Vale j comea a se enquadrarna orientao do governo, deci-dindo participar do Consrcio quevai construir a Usina Hidreltricade Belo Monte, no Rio Xingu,substituindo a Gaia, empresa doGrupo Bertin, que desistiu porenfrentar dificuldades financeiras.A ao governamental na substi-tuio do presidente da empresa,

    cativa para subsdio, ou mesmopara o financiamento de um pro-jeto de custo extremamente ele-vado, quando comparado ao be-nefcio. A omisso do Congressoe da sociedade no debate de as-

    sunto to importante, por suas re-percusses econmicas e sociais,deixou que a deciso de transfe-rir para o contribuinte o risco doprojeto fosse tomada unilateral-mente pelo governo.

    Trata-se de um precedente quecontraria normas bsicas da ges-to pblica, ao admitira priori apossibilidade de subsdio e jogarpara o Tesouro, leia-se contribu-inte, o custo da insuficincia dedemanda ou o da inadimplncia.

    O executivo Roger

    Agnelli mostrou-sebastante compe-tente na gesto daempresa, tendo emvista o interesse

    dos acionistas,entre os quais se

    encontram grandesgrupos empresariaise fundos de penso,

    mas, tambm,milhares de pe-quenos investidores.

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    que de capital aberto e sujeita governana coorporativa, repre-sentou uma interveno que con-trariou as normas da CVM, a queesto sujeitas as companhias co-tadas em Bolsa, e provocou que-da no valor das aes, com pre-juzo aos acionistas minoritrios.

    Mais do que a ao do gover-

    no na administrao e na gestoda Vale, o que preocupa a posi-o do Ministro Mantega parajustificar essa interveno. Segun-do o Ministro, o ex-presidente Lulaficou aborrecido com decises daCompanhia mas, como democra-ta, no retaliou a empresa. Po-dia ter aumentado impostos, masno fez nada disso. Prosseguiu oMinistro afirmando que o gover-no tem o direito de intervir na Valeporque no apenas o BNDES par-

    ticipa do capital da empresa,como tambm o Fundo de Pen-so. Esse Fundo pertence aos fun-cionrios do Banco do Brasil, eserve para garantir a aposentado-ria dos mesmos. Como, no entan-to, ele administrado pelos diri-gentes sindicais, que fazem partedo grupo dos donos do Poder,nada mais natural para o Minis-tro do que o governo retaliar ouintervir na empresa. Esse pareceser o pensamento predominante

    na rea governamental, o que jus-tifica a ao intervencionista cadavez mais ampla.

    Se, no passado, petistas e sin-dicalistas se opunham violenta-mente privatizao, aps che-garem ao poder parecem ter mu-dado no de opinio, mas de es-tratgia. Em vez de continuar

    questionando a privatizao, de-cidiram se beneficiar financeira epoliticamente das empresasprivatizadas, ocupando diretoriase conselhos. Alm disso, como,regra geral, tais empresas aten-dem s diretrizes do governo, con-cluram que no era necessria apropriedade estatal da empresapara que ela fosse utilizada doponto de vista poltico ou econ-mico.

    Quando alguma empresa no

    segue as diretrizes, ou objetivos,dos donos do Poder, o governousa sua fora, que imensa, paraenquadrar seus dirigentes.

    Alm da influncia nasprivatizadas, o governo passou ater grande influncia em empre-sas privadas, graas ao mono-plio dos recursos de longo pra-zo que detm, atravs do BNDESe dos fundos de penso das esta-tais. Assim, passou a influenciardecises do setor privado esco-

    lhendo vencedores, forando fu-ses, estimulando a formaode consrcios para disputaremobras pblicas e expandindo aparticipao estatal no crdito,inclusive com parcerias bastantediscutveis com bancos privados.

    Exemplo bastante expressivoocorreu no setor frigorfico. A pre-

    texto de estimular o surgimento degrandes grupos brasileiros, capa-zes de competir no exterior, oBNDES deu suporte financeiro adois grupos, mediante debnturese participaes acionrias, inclu-sive para a compra de empresasno exterior. Estudo da FGV mos-trou que, ao contrrio do que sepoderia esperar dessa interven-o, nem pecuaristas, nem con-sumidores foram beneficiadospela concentrao no setor patro-

    cinada pelo Banco. Os critrios deescolha desses dois grupos, bemcomo em outros casos, nunca fo-ram bem explicados, havendomuitas dvidas, por exemplo, nasintervenes no setor de telefonia,na escolha dos beneficiados.

    A Petrobrs exerce um poderquase absoluto em diversas ativi-dades ligadas ao petrleo, noapenas por deter o monoplio dealgumas reas, mas por privilgi-os que lhe tm sido concedidos e,

    Matria de Capa

    O BNDES vai garantir o financiamento deat R$20 bilhes ao projeto do trem-bala,de um custo total previsto de R$ 33,1 bilhes,que seguramente ser ultrapassado.

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    Matria de Capa

    tambm, por deter a propriedadedos gasodutos para transporte deleo e de gs, alm de ser forne-cedora quase nica de matrias-primas para a indstria petro-qumica. No bastasse isso, oMinistro de Minas e Energiaanunciou que a Petrobras vai au-mentar sua participao na pro-duo de etanol para 15% domercado. Com nova MP (sempremedida provisria) o lcool passaa ser considerado como combus-tvel e sujeito ao controle da Agn-cia Nacional de Petrleo. Comisso, a Agncia ter poder para

    regular os estoques e exercer maiscontrole sobre o setor sucro-alcooleiro. Com isso aumentou orisco e a incerteza de um setorque precisa de segurana para osinvestimentos, que so de longoprazo, pois a interveno da ANPpode afetar no apenas os pre-os como vir a estabelecer impos-tos sobre a exportao, quandohouver carncia no mercado in-terno, como j se cogitou recen-temente.

    A Empresa Brasileira de Cor-reios, que foi marcada por escn-dalos em gestes anteriores, dis-putada politicamente para suautilizao como cabide para in-dicaes polticas e com uma de-sorganizao que manchou aimagem de um servio eficiente nopassado, foi agora vitaminadapara o exerccio de outras fun-es, antes mesmo de recuperara eficincia administrativa. O go-verno editou Medida Provisria

    (cada vez o Congresso participamenos das decises, servindo ape-nas para homologar as medidasdo executivo) ampliando o cam-po de atuao da empresa, queagora pode atuar em logstica,servios financeiros e digitais, te-lecomunicao e ter subsidiriasno exterior. No bastasse tudoisso, os Correios podero partici-par como scios do TAV, talvezpara permitir viabilizar o projeto

    do famoso trem-bala. Pode-sesupor que a interveno direta doEstado na economia talvez sejamaior atualmente do que quan-do este detinha muitas empresasestatais que foram privatizadas.Lembra muito o perodo do gover-no Geisel, com o famoso tripempresas estatais, estrangeiras eprivadas que deveriam conduziro pas ao desenvolvimento acele-rado, sendo que tanto no passa-

    plo, vem interferindo no apenasna forma de comercializao deremdios como tambm preten-de limitar a deciso dos mdicosde prescreverem certos medica-mentos e ditar normas para apublicidade de alguns produtos,limitando a liberdade de empre-sas e cidados em nome da pro-teo do consumidor. Some-se aisso a tributao excessiva, quechega a mais de 50% do fatu-ramento em algumas empresas,e o poder absoluto do fisco sobreos contribuintes pessoas jurdicas,que so obrigados a fazer a es-

    criturao diretamente no com-putador da Receita, sem qualquerrespeito ao segredo comercial. Ocomrcio em geral se depara qua-se diariamente com medidas oupropostas, sejam do poder muni-cipal, do estadual ou do federal,que criam obrigaes e limitamsua liberdade de atuao, apretexto de defender o consumi-dor, mas impondo custos adicio-nais que acabaro sendo pagospor eles.

    Em um quadro como essepode-se questionar at que pon-to o Brasil uma economia de li-vre-mercado ou se pode ser con-siderado um modelo de capita-lismo brasileira, parecido como modelo chins, em que a pro-priedade dos meios de produopode estar nas mos do setor pri-vado, mas o poder de deciso dasempresas depende do consenti-mento do governo.

    preciso discutir a eficincia

    desse modelo, pois as experinci-as do passado mostraram quequanto mais aumenta a ao di-reta do Estado no campo empre-sarial menos eficiente se torna aeconomia. Da mesma forma, oexcesso de tributao, de regula-mentao e interveno retira aflexibilidade operacional das em-presas, restringe a criatividadedos empresrios e desestimula oesprito empreendedor.

    do como agora parte das gran-des empresas privadas depen-de do governo. Atualmente essadependncia se refere a recursossubsidiados do BNDES e a inves-

    timentos dos fundos de pensodas estatais, uma vez que o pasno dispe de fontes de recursosde longo prazo para financiar osinvestimentos privados.

    Devemos considerar ainda osincentivos fiscais, para alguns se-tores, escolhidos muitas vezes emfuno de sua capacidade depresso ou contatos, e as inter-venes via agncias reguladoras,em outros. A ANVISA, por exem-

    Em um quadro comoesse pode-se questio-nar at que ponto o

    Brasil uma economiade livre-mercado ou sepode ser consideradoum modelo de capita-

    lismo brasileira,parecido com o modelochins, em que a pro-priedade dos meios deproduo pode estar

    nas mos do setorprivado, mas o poderde deciso das empre-sas depende do con-

    sentimento do governo.

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    reduo acentuada do ndicede criminalidade no Rio de

    Janeiro se deve, sem dvida, sintervenes no Morro do Cruzeiroe no chamado Complexo do

    Alemo. Estas aes policiais emilitares sucessivas guardaramentre si a semelhana da rapidez eda confidencialidade. Acionadopelo Comandante da Marinha, porvolta das 23 horas da noite que

    antecedeu a invaso do Morro doCruzeiro, o Corpo de FuzileirosNavais estruturou em completosigilo uma invaso vitoriosa quesurpreendeu a bandidagem quevinha sendo, at aquele momento,sempre avisada por agentes dasprprias polcias civil e militar sobreas incurses planejadas. Nohouve tempo hbil para osagentes informarem, aosbandidos encastelados, sobre asaes que seriam conduzidas peloCorpo de Fuzileiros Navais

    associado ao BOPE. O Rio viviauma temporada de incndiosdirios de nibus que atemorizavaos cariocas. A invaso inesperada eo uso de blindagem do corpo defuzileiros desmantelaram aresistncia dos bandidos que foramtelevisionados em desatinada fuga.Os resultados principais semanifestaram na apreenso recordede 40 toneladas de cocana emaconha, sem perda de vidas demoradores locais.

    que houve (e est havendo)de pior no perodo so as

    consequncias da denncia sobreo valor do patrimnio do MinistroPalocci, da Casa Civil. Em 3 anos,seu patrimnio lquido cresceu cercade 20 vezes. No se trata denenhuma herana ou doaorecebida por ele. Suas declaraessobre esse enorme ganhopatrimonial so, antes de tudo,ofensivas inteligncia do brasileiro

    comum: servios prestados, comremunerao baseada em taxa dexito. Lamentavelmente o Ministro senega a informar os nomes e osvalores dos pagamentos de seusclientes, baseado em uma hipotticaclusula de confidencialidade. Istopermite uma vasta gama desuspeies, especialmente no querespeita qualificao dos xitos.Hoje, at os mdicos so obrigadosa revelar os nomes dos seuspacientes Receita Federal. inadmissvel que um ministro da

    importncia de Palocci no entendaque, tendo sido Ministro da Fazenda at a quebra do sigilo bancrio deFrancenildo poderoso e influenteparlamentar e ainda relevante figurado PT, demore tanto a arranjar umlibi. A Casa Civil, cujanotoriedade, no mau sentido, seacentua com a lobbista EreniceGuerra, est na berlinda. A demoraem informar detrimental paraPalocci. Lulla j foi chamado paracoordenar os esforos para blindarPalocci. um especialista.

    procedimento mais feio einadequado do perodo foi o

    conjunto de episdios que marcou ademisso de Roger Agnelli dapresidncia da Vale. Presidindo aempresa desde sua privatizaoformal, h 10 anos, a performancede Agnelli pode ser medida de vriasmaneiras: lucro, distribuio dedividendos, impostos recolhidos,ganhos de produtividade. Mas, nadamede melhor do que transformar a

    Vale no segundo maior minerador domundo. E por que Agnelli foiobrigado a renunciar? A resposta to simples quanto absurda: ele saiuporque em seu comportamento dedefender acionistas no viunenhuma prioridade em instalar umaempresa siderrgica no Par,sabendo-se que existe um excesso deoferta no setor de 550 milhes det/ano. Ora, a siderrgica do Parfazia parte da campanha eleitoralda ento governadora Ana JuliaCarepa, que acabou derrotada em

    sua campanha para a reeleio.Lulla no perdoou Agnelli porfrustrar seu projeto poltico,que inclua a siderrgica.O capitalismo de Estado estcada vez mais manifesto em todosos Conselhos de Administraode empresas que tm entre seusacionistas fundos privados (?)de penso de empresas estatais.

    A primeira deciso do substitutode Agnelli construir a siderrgicado Par. Chega?

    A O O

    EspecialUma viso liberal do fato

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    Economia

    A evoluo recente dainflao brasileira

    Antonio Carlos Prto GonalvesProfessor da Fundao Getulio Vargas

    inflao no Brasil voltou aincomodar e preocupar a

    populao, pois vem ocorrendoum aumento de seu percentual.O Grfico 1 mostra a inflaobrasileira medida pelo IPCA nosdoze meses anteriores ao ms emquesto. Este exame dos dadospassados sugere que realmenteh um recrudescimento da taxade inflao anual.

    No entanto, o que mais preo-cupa so as projees futuras. Por

    exemplo, se anualizarmos a taxade inflao medida pelo IPCA noperodo janeiro a abril de 2009,o nmero obtido ser 5,25% a.a.Se fizermos o mesmo com o pe-rodo de janeiro a abril de 2010,o nmero ser 8,15% a.a. E sefizermos a anualizao baseadano ritmo de aumento de preosde janeiro a abril de 2011, a taxaanual ser de 10,0% a.a., per-centual substancialmente maiordo que o dos anos anteriores.

    Enfim, apesar das negativasdas autoridades governamentais, indubitvel que h um aumentoda taxa de inflao. A perguntaque se coloca imediatamente por que isso vem ocorrendo. OBrasil um pas que conseguiu do-minar a inflao crnica que oassolou durante muitos anos, che-gando a percentuais de quase90% ao ms no final da dcadade 1980. O Grfico 2 mostra esteextraordinrio desempenho anti-

    A

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    Economia

    inflacionrio; por mais de quinzeanos a inflao brasileira tornou-se praticamente irrisria em com-parao com o que vinha acon-tecendo anteriormente.

    A reduo permanente da in-flao para nveis civilizados,

    deve ser, sem dvida, um motivode orgulho e satisfao para osbrasileiros. Orgulho e satisfao,e tambm de confiana na capa-cidade do pas de resolver seusproblemas. Muito provavelmenteo bom momento atual da econo-mia brasileira se relaciona maiorconfiana no pas por parte denossa prpria populao e do res-to do mundo, que aqui vem inves-tir. Ressalte-se que outros pasesda Amrica Latina, em particulara Argentina, aps debelarem comsucesso suas elevadas taxas deinflao seguiram polticas econ-micas que acarretaram a volta daalta de preos e da instabilidadeeconmica (talvez devido s mu-danas dos partidos no governo).

    No caso brasileiro, nos ltimosdezesseis anos houve uma mu-dana democrtica de governo,do PSDB para o PT (sempre emaliana com o PMDB). No

    obstante a taxa de inflao per-maneceu controlada; e mais im-portante ainda, os elementos fun-damentais para esse controle,como o resultado primrio su-peravitrio do oramento pblicoe a ao independente do Banco

    Central para obter a meta de in-flao, continuaram, mesmoaps a mudana dos partidosno governo. Mas a taxa de infla-

    o no Brasil est novamente emalta, havendo risco de reacenderas expectativas inflacionrias e os

    processos de correo monetriae de indexao, os quais reali-mentam a inflao e tornam dif-cil debel-la. Porque esse casode sucesso brasileiro pode entose frustrar?

    Provavelmente a razo funda-mental o equvoco econmicosrio de considerar que a inflaoe o crescimento real da economiasejam objetivos alternativos, mu-tuamente exclusivos: ou bem setem crescimento econmico ou se

    combate a inflao, segundo essaviso equivocada.Tal equvoco desconhece os

    avanos na teoria econmica dainflao ocorridos nas ltimasdcadas do sculo passado, e queesto associados a dois prmiosNobel concedidos aos lderesdesses avanos: Milton Friedmane Edmund Phelps.

    Segundo essa teoria premiadae testada, o crescimento do PIBreal de uma economia s pode

    ocorrer sustentavelmente se hou-ver aumento do investimento e/ouda produtividade, levando ex-panso da capacidade de produ-

    Grfico 1: Taxa de variao em 12 meses (%)

    Grfico 2: Taxa de variao mensal do IPCA: 1990/2009(mdia anual)

    Fonte: IBGE

    Fonte: IBGE

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    Economia

    o instalada no pas. A meraadoo de polticas fiscais e mo-netrias expansivas, com o obje-tivo de fomentar a demanda agre-gada, no gera necessariamentemais investimento e aumentos daprodutividade. A demanda maisalta pode induzir as empresas ainvestirem mais; no entanto talefeito, se ocorrer em escala sufi-ciente, s ser sentido algunsanos aps, quando os investimen-tos maturarem.

    Alm do mais a poltica fiscalexpansiva atual do governo bra-sileiro se baseia em aumento dos

    gastos de consumo do governo(despesas com o custeio da m-quina pblica), e no em aumen-to dos investimentos. Estes sim,poderiam aumentar a capacida-de de produo do pas. Mas oque se verifica a continuidadedos gargalos infraestruturais dopas, sobretudo no setor de trans-porte (aeroportos com capacida-de esgotada, ferrovias e hidroviascom atraso na construo, rodo-vias congestionadas, e assim por

    diante). possvel que haja tam-bm dificuldades srias na ofertade energia, caso a economia con-tinue a se expandir no ritmo dosquatro primeiros meses de 2011.

    Resumindo, a curto prazo umnvel de demanda agregada ex-cessivo, agindo sobre a capacida-de de produo essencialmentefixa (estamos no curto prazo), vailevar superutilizao dessacapacidade e ao aumento dospreos. Pode ocorrer um aumentoreal do PIB a curto prazo, mas no sustentvel. um voo de gali-nha. Pior que isso: quando ocor-re a volta ao nvel normal de pro-duo, a economia volta cominflao, com expectativas deinflao, com indexao, etc.

    O Grfico 3 mostra a evolu-o recente do uso da capacida-de de produo no Brasil. Comose pode observar, no momento as

    empresas no ps esto funcio-nando a um nvel de capacidadehistoricamente elevado. preci-so refrear a expanso da de-manda agregada para no re-sultar na acelerao da inflao

    brasileira. possvel entender que o go-verno brasileiro no tenha refrea-do a demanda em 2010, ano deeleies presidenciais, e com se-gundo turno. Mas porque no ofaz em 2011, primeiro ano demandato do novo governo, pe-rodo normalmente adequadopara que (maquiavelicamente) sefaam os males necessrios? Cer-tamente difcil de entender. Oque est sendo feito atualmente uma espcie de maquiagem, ouseja, muda-se o critrio para amedio do dficit pblico comose a mudana no critrio fossecapaz de conter a demanda; pro-cura-se tornar o ndice de preosmais bem comportado, reduzin-do o imposto e o reajuste dos pre-os dos combustveis; muda-se odirecionamento do crdito masno a oferta total de moeda, e

    assim por diante. Na verdade estamaquiagem no apenas incuacomo as maquiagens comuns. pior, pois a reduo de impostocorresponde de fato a uma polti-ca fiscal expansiva! O poder de

    compra deixado na mo dopblico, e a demanda agregadapode aumentar! Reduzindo o pre-o do combustvel ao consumidoro ndice de preos pode diminuira curtssimo prazo, mas aumen-tar logo a seguir devido expan-so da demanda consequente reduo do imposto.

    Em sntese, preciso que oBanco Central do Brasil atue fir-memente para colocar de novo ainflao na meta, cumprindo ocontrato implcito que fez como governo e com a populao dopas e mantendo sua credibili-dade. Se tal atitude implicar umataxa de crescimento real do PIBmenor em 2011, certamente ha-ver ganhos nos percentuais decrescimento nos anos subse-quentes, e mais do que compensa-dores, pois a inflao continuarsob controle.

    Grfico 3: Nvel de utilizao da capacidade instalada naindstria (%, dessazonalizado)

    Fonte: CNI

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    Liberalismo

    As causas do debilitamento do

    liberalismo no sculo XXOg LemeEconomista, com Mestrado pela Universidade de Chicago

    (04.08.1922 - 06.01.2004)

    comum, no final das minhaspalestras sobre liberalismo e

    as virtudes da ordem liberal, quealgum me pergunte: Muitobem, ento por que a ordem libe-ral do sculo XIX, que perdurou at

    a 1 Guerra Mundial, foi progres-sivamente substituda, em grausdiferentes e em praticamente to-dos os pases, por diferentes tiposde estatismo? Se o liberalismo erato bom, como se explica suasubstituio pelo Estado-Leviat?Foram vrios os motivos, confor-me passo a relalar.

    O primeiro deles ocorreu eainda persiste em boa dose nocampo das idias, conforme ob-servao pertinente de Hayek, e

    se refere prtica de um racio-nalismo exacerbado. De acordocom ela, o que no pode ser ex-plicado racionalmente ou nodecorre da ao inteligente pro-positada do homem no merece

    crdito. Como a ordem liberal sefundamenta em considervel me-dida em instituies e prticas so-ciais espontneas originrias daao humana no deliberada como so a linguagem, o dinhei-ro, o mercado, o direito consue-tudinrio, os usos, costumes e tra-dies ela passou a ser questio-nada e substituda por equivalen-tes sucedneos sintticos, forjadospropositadamente nas pranchetasdos engenheiros-sociais. O

    Esperanto foi proposto comoidioma universal, e os nossosimortais da Academia Brasileira deLetras no se cansam de proporregras gramaticais que engessemdefinitivamente o nosso belo e

    mutante idioma. So ridculos osacordos Brasil-Portugal sobrenormatizao e controle da nos-sa escrita e da nossa fala, cadavez menos dispostas a aceitar asideias com que so ameaadaspor esses puristas ingnuos.

    A economia de mercado temsofrido mais, muitssimo mais, doque a linguagem espontnea quefalamos e modificamos no nossocotidiano. Durante o sculo XX,vrias formas e graus de planeja-

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    O estado de guerra uma situao excepcionalque coloca direitos individuais de quarentena eprivilegia os propsitos do Estado.

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    mento econmico tentaram ocu-par o lugar at ento exercido poragentes individuais livres, motiva-dos por interesses pessoais e

    guiados pelos preos relativos dosbens e servios. E o mais espan-toso que isso tenha ocorridomesmo aps Mises e Hayek teremdemonstrado, nos anos 20, a im-possibilidade do clculo econmi-co numa economia centralmenteplanejada. Em outras palavras, osdois grandes economistas aus-tracos previram o fracasso inevi-tvel de economias conduzidaspor autoridades estatais carentesde preos de mercado para gui-

    las. Acertaram em todos os casosonde esse tipo de interveno eco-nmica governamental teve lugar.

    O liberalismo floresceu muitomais nos pases onde prevaleciao direito consuetudinrio do queem pases ligados ao positivismojurdico, como ocorre com o Bra-sil. O direito espontneo consue-tudinrio gestado, na realidade,pela livre interao dos membrosde uma sociedade, atravs dotempo; ele emerge dos usos, cos-

    tumes e tradies, e so desco-bertos e no criados pelos ju-zes e legisladores que os transfor-mam em leis e os sistematizam.

    Contrariamente, o direito positivoacabou se convertendo na prti-ca viciosa de considerar lei aquiloque as assemblias legislativasproduzem e sancionado pelopresidente do pas. Os leitores in-teressados no assunto podem lero excelente livro de Bruno Leoni jurista italiano j falecido Lawand Freedom edio do LibertyFund, Indianpolis, USA.

    O destino do dinheiro no foimais feliz. Ele foi criado para di-

    minuir aquilo que os economistaschamam de custos de transao.Ele serve de meio de troca, unida-de de conta e de meio deentesouramento. Sua vignciadepende sobretudo de crdito,isto , ele vige enquanto os usu-rios acreditarem nele, de formaque ele aceito corriqueiramentenas transaes dirias no merca-do. O dinheiro pode ter credi-bilidade sem ter sido criado pelogoverno; a histria se encarrega

    de mostrar a viabilidade do di-nheiro privado. Por outro lado,o fato de ser fruto do monoplioestatal no assegura a suacredibilidade. Existe hoje um n-mero crescente de economistasliberais simpatizantes da priva-tizao do dinheiro. Os leitoresinteressados no problema podemler o livro de Hayek,A Privatizaodo Dinheiro, editado pelo Institu-to Liberal do Rio de Janeiro. Emsntese, a crtica liberal indaga:

    Por que manter monoplio esta-tal do suprimento de dinheiro?Procurei dar aos leitores alguns

    exemplos de perverso no uso doracionalismo. Pretendo, a seguir,mostrar-lhes a malignidade deoutro tipo de deformao intelec-tual prevalescente no sculo XX, oholismo-animista , complementodo racionalismo exacerbado, for-mando com ele uma dupla letal.O holismo-animista trata os mem-bros individuais de uma comuni-

    dade como se fossem um agre-gado, um todo. Pior ainda, umtodo com atributos humanos:memria, honra, propsitos, etc.

    No holismo-animista os indivdu-os so substitudos por uma enti-dade abstrata o pas que ad-quire concretude e virtudes huma-nas, entre as quais a capacidadede ter propsitos, prprios e maisimportantes do que os dos mem-bros individuais da comunidade.Resulta da uma sociedade, pare-cida com a dos animais gregrios,na qual os cidados esto a ser-vio do pas e, portanto, diferen-temente de uma ordem social

    onde os governantes estejam aservio dos cidados. Em sntese,o holismo-animista gera socieda-des no liberais, nas quais oscidados so sufocados pelos in-teresses do pas: Deutshlandber Alles! A crtica liberal alertacontra os fantasmas holistas-animistas que tanto sofrimentocausaram durante o sculo XX.

    Mas no foram apenas o exa-gero racionalista e o surrealismoholista-animista que comprome-

    Liberalismo

    F. A. Hayek

    Ludwig von Mises

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    teram a prtica liberal no sculoXX. Houve pelo menos trs fen-menos histricos que igualmentealimentaram o estatismo: as guer-

    ras, as crises econmicas e o idealdo desenvolvimento econmico.Bem, guerra guerra, como

    clamava aquela velhinha de umaanedota bem conhecida, reivindi-cando seus direitos! O estadode guerra uma situao excep-cional que coloca direitos indivi-duais de quarentena e privilegiaos propsitos do Estado. o cal-do de cultura, o gar-gar doholismo-animista, que faz crescero governo custa da liberdade

    dos cidados. No h ordem li-beral que resista a uma situaode guerra. E o sculo XX teve mui-tas, de vrias escalas e durao,diferentes lugares e os maisvariados motivos. Como guerra eliberalismo no so compatveis,sobrou o pior, no sculo XX, parao liberalismo.

    Alm das guerras do sculo XX,houve a Grande Depresso de1929 para conspirar contra o li-beralismo. A idia subversiva o

    adjetivo me pareceu apropriado que surgiu na chamada Crise dosAnos 30 foi a de que o merca-do, deixado livre, acabava crian-do sua prpria runa. Assim sen-do, a ao deliberada e racionaldas autoridades era reclamadapara disciplinar o mercado, evi-tando as suas impropriedades. Omercado falhava devido, em par-te, falta de poderes do FRS (Fe-deral Reserve System), o bancocentral americano, para enfrentar

    os ciclos econmicos.Alm de uma suposta falha demercado, associada supostafalta de poderes por parte do FRSque conjuntamente responderiampela Crise de 29, criou-se a ideiapara sair da crise se fazia neces-sria uma ao estatal mais enr-gica no mercado, para reanimara debilitada demanda agregada.A soluo seria o aumento dosgastos pblicos, ideia Keynesianaassimilada pelo Presidente Roo-

    sevelt e que serviu de fundamentode poltica econmica para o NewDeal. (Sobre o assunto recomen-dado a leitura do captulo sobre a

    grande depresso Free toChoose de Milton Friedman.Foi exatamente em meados

    dos anos 30 que surgiu o que hojese conhece como macroe-conomia, de inspirao Keyne-siana, formulada na base de re-

    portncia na expanso doestatismo: a busca deliberada dodesenvolvimento econmico. Paraos liberais, o processo econmi-

    co gerador de prosperidade ma-terial decorre da livre ao dosagentes econmicos; umsubproduto espontneo, no de-liberado da busca, pelos agentesindividuais, de seus prprios inte-resses particulares. Essa ideia docarter no propositado do de-senvolvimento econmico estexposta no livro A Riqueza daNaes (1776), do escocs AdamSmith.

    Durante o sculo XX, especial-

    mente aps a II Guerra Mundiale da experincia sovitica em pla-nejamento econmico, prolifera-ram os esforos dos economistaspara analisar e entender o fen-meno da prosperidade. Simulta-neamente, acumularam-se pro-gressivamente as tentativas de cri-ao de instrumentos tcnicospara a ao deliberada do gover-no na gerao e na conduo dodesenvolvimento econmico, des-de matrizes de insumo-produto a

    modelos matemticos extrema-mente sofisticados de planejamen-to econmico. Na realidade, tra-tou-se de enorme desperdcio detempo, talento e dinheiro: a his-tria se encarregou de mostrarque Adam Smith estava certo: ariqueza das naes decorre daao individual autnoma numambiente social respeitador dosdireitos de propriedade e dos con-tratos livremente firmados entrecidados livres. A evidncia

    emprica disponvel clara: amelhoria das condies materiaisde vida dos povos depende daexistncia da liberdade, especial-mente da liberdade econmica.Esta, por sua vez, depende de ins-tituies que tornem eficazes osdireitos humanos, especialmentea liberdade, os direitos de pro-priedade e a busca individual dafelicidade. Essas instituies so oEstado de direito e a economiade livre mercado.

    Liberalismo

    A evidncia empricadisponvel clara: a

    melhoria das condiesmateriais de vida dospovos depende da

    existncia da liberdade,especialmente da

    liberdade econmica.Esta, por sua vez,

    depende de instituiesque tornem eficazes os

    direitos humanos,

    especialmente a liber-dade, os direitos depropriedade e a buscaindividual da felicidade.

    laes funcionais entre grandesagregados, consumo (C), investi-mento (I), poupana (S) e rendanacional (Y). Como esses agrega-dos so, conforme o nome suge-

    re, somas de consumo, investi-mentos e poupanas individuais,surge o problema de saber quemseria o sujeito da ao. No di-fcil concluir que em matria depoltica econmica seria o gover-no, uma concluso inteiramentecompatvel com a ideia doholismo-animista que fundamen-ta as polticas anticclicas domi-nantes no sculo XX.

    No campo econmico houveoutro fenmeno de enorme im-

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    Livros

    Uma sociedade infantilizadaResenha do livro O Estado Bab, de David Harsanyi. Ed. Litteris, 2011.

    uando perdemos nosso di-reito de sermos preguiosos,

    no saudveis ou politicamente in-corretos? Essa a pergunta queDavid Harsanyi faz em seu livro OEstado Bab, que mostra cominmeros exemplos como os ame-

    ricanos esto cada vez mais tro-cando liberdade individual porcontrole estatal.

    A tirania das boas intenescostuma ser a mais perigosa detodas, pois os bons samaritanosjamais descansam em sua nobremisso de cuidar dos outros. Li-berdade pressupe responsabili-dade, assim como liberdade deescolher tolices. Imbudos de umaarrogncia paternalista, os babsno aceitam isso, e partem para

    suas aes salvadoras: Algo deveser feito, eis a reao dos babsdiante de atitudes que no apro-vam, significando sempre maisintromisso estatal em nossasvidas.

    O grau de chatice dos babschegou a um patamar insuport-vel. Como bem coloca o autor:Para esses intrometidos, a utopia um mundo sem fumantes, semgordura, onde o lcool bebidoapenas com moderao, oMcDonalds vende McNuggets detofu com molho de baixa caloriae os seios nus de uma estrela popso dignos de uma sesso noCongresso e de histeria emmassa.

    O Estado bab ocorre quan-do o governo assume umhiperinteresse em microadmi-nistrar o bem-estar dos cidados.Mas o governo vai alm de seupapel quando tenta nos protegerde ns mesmos. Uma vez que esta

    porteira aberta, o cu o limitepara os babs, que pretendemeliminar todo comportamentoprejudicial ou irracional daface da Terra. A imprensa, cominclinao para manchetesaterrorizantes, joga mais lenha nafogueira, ajudando a criar umambiente de pnico propcio sintervenes dos babs.

    O dogma compartilhado pe-los babs que se meter na vidaalheia por meio das leis a formamais rpida de criar uma socie-dade superior. O bom senso paradeterminar a fronteira legtimadessa interveno se perdeu faztempo. Os guardies do estma-go, por exemplo, criaram umaverdadeira milcia alimentarpara tentar barrar do cardpio ositens prejudiciais sade. Mas, sepodemos proibir um ingredienteque no saudvel, o que impe-de o governo de proibir muitos outodos eles?

    Para sustentar suas medidasestpidas, os babs no se impor-tam em apelar para a tortura dosnmeros. Exames com ratos delaboratrio provam que vriosalimentos podem matar, ignoran-

    do apenas que a quantidadeingerida pelos ratinhos seria equi-valente ao jantar que um giganteconsideraria exagerado. Na ver-dade, at a gua pode matar, seconsumida em quantidade exces-siva. Entre o remdio e o veneno,muitas vezes est somente a do-sagem.

    Mas nada disso incomoda osbabs. Eles precisam salvar vidas!

    O terrorismo constante: o a-car um veneno, a gordura e afritura so armas letais, o cigarro morte certa, at para fumantespassivos. No obstante as menti-ras e exageros dessas pesquisas,resta perguntar: por que cada in-divduo no deve ser livre paraescolher como viver, ainda que suaescolha nos parea destrutiva? Abusca pela sade perfeita algoque nos remete ao nazismo. So-ciedades livres devem se preocu-par em garantir a liberdade deescolha.

    Babs so presunosos, eacreditam que sabem melhor queos outros como a vida deve servivida. Eles partem da premissaarrogante de que conhecem asescolhas certas. So moralistasautoritrios, que desejam imporseu estilo de vida aos demais. Vi-ver assumir riscos, mas os co-vardes babs querem uma vidatotalmente segura (e sem graa),e pior, querem obrigar os outrosa desejar o mesmo.

    Tudo que os liberais pedem :deixem-nos em paz! Que cadaum possa viver de acordo comsuas prprias escolhas. Afinal decontas, at o fumo muito maissaudvel que o fascismo.

    Q

    JUN/JUL/AGO - 2011 - N 55 26

    porRodrigo ConstantinoEconomista e escritor

    Se salvar vidas o nico motivopara termos leis, nunca teremos leis

    suficientes. (David Harsanyi)

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