autos c. o. - relatório i

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C C O O M M I I S S S S Ã Ã O O P P A A R R A A O O E E S S T T U U D D O O D D O O P P R R O O C C E E S S S S O O C C O O N N T T R R A A - - O O R R D D E E N N A A C C I I O O N N A A L L E E S S T T R R A A D D A A L L V V O O L L U U M M E E I I Ministério da Administração Interna

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CCOOMMIISSSSÃÃOO PPAARRAA OO EESSTTUUDDOO

DDOO PPRROOCCEESSSSOO

CCOONNTTRRAA--OORRDDEENNAACCIIOONNAALL EESSTTRRAADDAALL

VVOOLLUUMMEE II

MMiinniissttéérriioo ddaa AAddmmiinniissttrraaççããoo IInntteerrnnaa

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CCOOMMIISSSSÃÃOO PPAARRAA OO EESSTTUUDDOO

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- RELATÓRIO PRELIMINAR – DOCUMENTO RESERVADO -

Comissão para o Estudo do Processo Contra-ordenacional Estradal – Relatório Preliminar

ÍNDICE

VOLUME I

A. INTRODUÇÃO

1. Antecedentes

2. Constituição da Comissão para o Estudo do Processo Contra-ordenacional

Estradal – tarefa e pressupostos

B. ENQUADRAMENTO E DADOS DE SITUAÇÃO

1. Evolução do processo contra-ordenacional estradal – sinopse

2. Descrição do processo de contra-ordenações actual

3. Avaliação – identificação dos estrangulamentos e limitações

C. PROGRAMA DE REESTRUTURAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO CENTRAL

DO ESTADO – ENQUADRAMENTO E ASPECTOS A TER EM CONTA

D. SOLUÇÕES – DESENVOLVIMENTO, VIABILIDADE E

DIFICULDADES DE IMPLEMENTAÇÃO

1. Levantamento do auto de contra-ordenação

2. Notificação

3. Cobrança

4. Registo e recepção

5. Processamento

6. Impugnação Judicial

7. Assinaturas digitais

8. Externalização da preparação da decisão

E. DIMINUIÇÃO DO NÚMERO DE AUTOS DE CONTRA-ORDENAÇÃO –

OBJECTIVO TRANSVERSAL

Pág.

1

2

4

6

8

18

19

20

22

24

24

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30

31

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- RELATÓRIO PRELIMINAR – DOCUMENTO RESERVADO -

Comissão para o Estudo do Processo Contra-ordenacional Estradal – Relatório Preliminar

F. PROPOSTAS

G. CONSIDERAÇÕES FINAIS

VOLUME II – ANEXOS

Anexo 1

Inspecção Temática n.º 4/2003 da Inspecção-geral da Administração Interna –

Conclusões

Anexo 2

Informação n.º 221/2005 – GJC (PP 118/05), de 9 de Setembro de 2005

Anexo 3

Informação DGV n.º 261/04/GJC, de 31 de Maio de 2006

Anexo 4

Informação DGV n.º 123/GJC/2006, de 13 de Março de 2006

Anexo 5

Lei Orgânica da DGV

Anexo 6

Informação estatística (dados de sinistralidade e de desenvolvimento do

processo contra-ordenacional)

Anexo 7

Notas síntese das reuniões da Comissão

37

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Comissão para o Estudo do Processo Contra-ordenacional Estradal – Relatório Preliminar 1 / 43

COMISSÃO PARA O ESTUDO DO PROCESSO CONTRA-ORDENACIONAL ESTRADAL

RELATÓRIO

A. INTRODUÇÃO

1. Antecedentes

O processo de contra-ordenações originado por infracções ao código da estrada e respectiva

legislação complementar, deve desempenhar um papel preponderante na definição dos contornos de

uma política de segurança rodoviária que se ambiciona seja eficiente e capaz de assegurar uma

diminuição consolidada dos índices de sinistralidade rodoviária.

Um processo de contra-ordenações ágil e eficaz contribuirá certamente de forma muito

significativa para a obtenção de um novo quadro de sinistralidade rodoviária, designadamente ao

induzir mudanças de comportamentos e novas atitudes, pelo que a intervenção no pormenor dos

moldes em que assenta actualmente o referido processo se tornou uma decisão incontornável.

Acontecimentos recentes, que vieram enfatizar problemas e dificuldades que já não são novos,

então amplamente noticiados, motivaram à altura que fosse ordenado à Direcção-Geral de Viação

(DGV) uma averiguação profunda das razões e explicações para a verificação de um conjunto de

ocorrências classificadas como inaceitáveis e em que urgia compreender as causas. O resultado da

averiguação desencadeada, mais do que permitir a confirmação, por mero conhecimento analítico das

questões e das dificuldades existentes, deixou clarividente a necessidade de ser incentivado um

trabalho de maior profundidade, capaz obter uma perspectiva global do processo de contra-

ordenações resultantes da infracção ao Código da Estrada, desde logo pela aferição das questões de

natureza institucional, instrumental, relacional e funcional que atravessam todo o processo e que

foram então enunciadas pelo supra identificado relatório da DGV.

Atentas as conclusões do relatório ordenado à DGV, considerado o conjunto de questões,

propostas e intenções que foram sendo levantadas pela mesma DGV ao longo dos últimos anos, mas

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Comissão para o Estudo do Processo Contra-ordenacional Estradal – Relatório Preliminar 2 / 43

que todavia nunca foram incrementadas, e ainda com o propósito de avaliar, com a profundidade que

se justifica, a introdução de medidas que visem a normalização de todo o processo contra-

ordenacional, numa perspectiva integrada e tendo presente a diferente natureza das entidades

envolvidas, foi determinada a criação da Comissão para o Estudo do Processo Contra-ordenacional

Estradal (adiante referida como Comissão).

2. Constituição da Comissão para o Estudo do Processo Contra-ordenacional

Estradal – tarefa e pressupostos

A criação e constituição da Comissão foram determinadas por despacho do Senhor Secretário de

Estado da Administração Interna, com data de 15 de Março de 2006.

Após cada uma das entidades constituintes ter indicado o seu representante, a Comissão iniciou

os seus trabalhos integrando os seguintes elementos:

Dr. Raul Oliveira – Gabinete do Secretário de Estado Adjunto e da Administração Interna;

Dr. Miguel Braga – Gabinete do Secretário de Estado da Administração Interna;

Dra. Eliana Pinto – Gabinete do Subsecretário de Estado da Administração Interna;

Major João Fernando Maia – em representação da Guarda Nacional Republicana

Subintendente José Leonardo – em representação da Polícia de Segurança Pública

Por despacho do Secretário de Estado da Administração Interna foi ainda designado

como elemento da Comissão e como coordenador dos trabalhos, o Dr. Rogério Pinheiro,

Director-Geral de Viação.

Conforme bem explicitado no despacho que a constituiu, a tarefa da Comissão assentou

na identificação dos problemas e estrangulamentos existentes e verificados no actual

processo de contra-ordenações por infracção ao Código da Estrada e, nesse seguimento, na

apresentação de soluções capazes de reformular os procedimentos e práticas em vigor,

designadamente pela produção de um novo desenho para todo o processo, tendo também

em conta a existência de mais do que um actor no processo e as particularidades que daí

resultam.

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Comissão para o Estudo do Processo Contra-ordenacional Estradal – Relatório Preliminar 3 / 43

As entidades fiscalizadoras constatam em média, por dia, 3.500 infracções ao Código da Estrada

(no ano de 2005 foram levantados 1.276.521 autos de contra-ordenação). Esta circunstância,

atendendo à especificidade social que representa, ao impacto negativo que induz ao combate à

sinistralidade rodoviária e não deixando de ter presente o empenhamento político que o Governo quer

garantir para esse combate foi o móbil de uma iniciativa especialmente destinada a encontrar novas

soluções que assegurem no futuro que o Código da Estrada é mais respeitado.

No desenvolvimento do seu trabalho, a Comissão assumiu como ponto de partida, as

conclusões resultantes da Inspecção Temática nº 4/2003 da Inspecção Geral da

Administração Interna – Anexo 1 – bem como os relatórios elaborados pelos serviços da

DGV – Anexos 2, 3 e 4 – que procedem a uma reflexão sobre o quadro actual modelo de

processamento e tratamento dos autos de contra-ordenação e que desenvolvem, e

sustentam como enquadráveis, um conjunto de opções que, não tendo sido implementadas

ao longo dos últimos anos, podem vir a constituir uma enorme janela de oportunidade para

concretizar a ambicionada modernização do sistema.

Procurando habilitar os membros da Comissão com a informação suficiente para melhor

compreender as especificidades do processo de contra-ordenações actual, o coordenador da

Comissão entregou um conjunto de documentos que contribuíram para identificar os

principais problemas e estrangulamentos do processo.

No início dos trabalhos foram definidos os seguintes pressupostos orientadores da tarefa

da Comissão:

1. Exposição do quadro completo e actual do processo contra-ordenacional estradal,

pormenorizadamente enunciado, com identificação das diversas etapas e dos actores

intervenientes em cada uma delas, desde o momento em que o auto é levantado até

ao momento em que o processo é remetido comarca criminal competente;

2. Identificação, por enumeração taxativa, dos principais estrangulamentos e

dificuldades que se impõem ao longo do processo contra-ordenacional;

3. Considerações sobre a nova realidade que deriva do estabelecido no Programa de

Reforma da Administração Central do Estado (PRACE) e aferição das implicações que

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daí podem resultar para o processo contra-ordenacional estradal, designadamente

quanto à eventual opção pela centralização de todo o processo, ainda que mantendo

determinados actos e diligências a um nível desconcentrado e de forma a não

diminuir a qualidade do serviço prestado aos cidadãos;

4. Assumida a decisão de retirar os governos civis do processo de contra-ordenações.

B. ENQUADRAMENTO E DADOS DE SITUAÇÃO

1. Evolução do processo contra-ordenacional estradal – sinopse

A Direcção Geral de Viação tem competências no domínio do processamento de contra-

ordenações por infracção ao Código da Estrada desde 1994.

Com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de Maio, que aprovou um novo Código

da Estrada e revogou o Decreto-Lei n.º 36 672, de 20 de Maio de 1954, foi determinado que as

infracções ao Código da Estrada revestiam a forma de contra-ordenações, salvo se constituírem

crimes, sendo nesse caso puníveis e processadas nos termos gerais das leis penais.

Assim com a entrada em vigor do citado diploma, as contravenções rodoviárias foram

transformadas em contra-ordenações, processadas pela Administração, no caso em concreto, pela

DGV.

A DGV viu-se então confrontada com a necessidade de adaptar rapidamente a sua estrutura de

recursos humanos e de meios a uma nova realidade que manifestamente encerrava uma

complexidade muito maior do que acontecia até esse momento.

Foi então adoptado o Sistema Informático de Gestão de Autos – SIGA, que embora longe de ser

perfeito, permitiu à DGV acautelar o primeiro impacto das novas competências de havia sido investido.

O SIGA, na sua primeira versão, apesar de se ter mostrado bastante adaptado ao processo de

colecta da receita proveniente das contra-ordenações processadas, nunca se revelou suficientemente

eficaz na gestão do processo de decisão e pós-decisão do processo contra-ordenacional.

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Concomitantemente, a par da implementação do SIGA, a DGV introduziu profundas alterações ao

nível dos recursos humanos. Foram criadas cinco divisões e secções de contra-ordenações nas

Direcções Regionais de Viação (Porto, Coimbra, Lisboa, Évora e Faro) e nas Delegações Distritais de

Viação (Braga, Viana do Castelo, Vila Real, Bragança, Aveiro, Viseu, Guarda, Leiria, Castelo Branco,

Santarém, Setúbal, Portalegre e Beja).

O desenvolvimento e concretização das diferentes fases do processo contra-ordenacional estradal

assentou desde essa data na intervenção de juristas e de assistentes administrativos que, alocados

aos serviços desconcentrados da DGV, foram procurando conferir o melhor desempenho ao processo.

Ao longo do tempo, a par de um crescimento constante do número de autos de contra-ordenação

levantados, verificou-se existir um entrave suplementar derivado da dificuldade de contratação, em

especial juristas no universo da Administração Pública, o que levou a DGV a recorrer à contratação

fora desse universo em regime de “outsourcing” e de avença.

Acresce ainda, que ao longo dos últimos doze anos o processo contra-ordenacional tem estado

repartido, se considerarmos só a DGV, por três subunidades orgânicas, o Gabinete Jurídico e do

Contencioso no que respeita ao processo propriamente dito, a Direcção de Serviços de Informática no

que concerne ao desenvolvimento e gestão do SIGA I e mais tarde do SIGA II e a Direcção de

Serviços Administrativos relativamente à cobrança dos autos de contra-ordenação, conforme melhor

se percebe pela consulta da Lei Orgânica da DGV – Anexo 5.

O desenvolvimento e a gestão do sistema informático de apoio ao processo, sempre foram

assegurados pelo recurso à contratação externa dos serviços da empresa EDINFOR, o que ainda hoje

se verifica.

A complexidade do processo, associada ao um ímpeto crescente de contestação pelos infractores,

resultante em grande medida do maior conhecimento da legislação e dos seus direitos, o que

determinou um considerável aumento do número de defesas, e o reduzido contributo da primeira

versão do SIGA, levou a que ao longo do tempo a missão da DGV tenha enfrentado alguns

insucessos, caracterizados por:

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Comissão para o Estudo do Processo Contra-ordenacional Estradal – Relatório Preliminar 6 / 43

1. Um grande desfasamento temporal entre o momento em que é cometida a infracção ao Código

da Estrada e o momento em que o infractor é punido, o que reduz o efeito pedagógico da

aplicação da sanção;

2. Um elevado número de prescrições de autos de contra-ordenação, o que valoriza e incentiva o

sentido de impunidade que se instalou no espírito dos condutores prevaricadores;

3. A sensação interiorizada ao longo do tempo de que o Estado era incapaz de fazer cumprir o

Código da Estrada.

Em grande medida, a elevada sinistralidade rodoviária que marca o passado recente explica-se

por uma cultura de irresponsabilidade e impunidade muito implantada nos condutores.

Em 2004, a plena integração do sistema informático SIGA II (resultante da evolução do SIGA I)

permitiu uma melhoria significativa em termos do rigor com que são feitos os registos informáticos.

Ainda assim, o próprio SIGA II continua a não ser um sistema concebido especificamente para tratar

as contra-ordenações, sendo antes sim, e tão só, um sistema de registo do processamento dos autos.

Recentemente as alterações introduzidas ao Código da Estrada vieram facilitar o processo, embora

a disfunção entre o processamento propriamente dito e o suporte informático, que se encontra diluído

por várias aplicações sem interligação entre si, associado a uma permanente redução dos recursos

humanos por efeito de aposentação, permitam inferir que, a não serem introduzidas alterações

profundas, o sistema correrá o risco de, num futuro próximo, eclipesar.

2. Descrição do processo de contra-ordenações actual

Para efeito do trabalho a desenvolver pela Comissão ficou assente desde o início a enorme

conveniência de uma apresentação pormenorizada do processo de contra-ordenações resultantes

da infracção ao Código da Estrada, com identificação das diversas etapas e dos actores

intervenientes em cada uma delas, desde o momento em que é levantado o auto de contra-

ordenação até à eventual remessa do processo para a comarca criminal competente.

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3. Avaliação – identificação dos estrangulamentos e limitações

O processo contra-ordenacional actual evidencia vários estrangulamentos nas suas diferentes

etapas, na fase de levantamento do auto de contra-ordenação, na fase da notificação, na fase de

cobrança, na fase de registo e recepção, na fase da decisão e na fase do processamento judicial.

Na FASE DE LEVANTAMENTO DO AUTO DE CONTRA-ORDENAÇÃO (da responsabilidade

das entidades fiscalizadoras – nos termos definidos pelo Código da Estrada), constatam-se deficiências

no processo de autuação efectuado pelas entidades fiscalizadoras no preenchimento dos autos,

designadamente pela omissão de elementos relevantes, pela deficiente descrição sumária dos factos,

pela inserção errada da codificação da infracção ou ainda pela indicação errada do montante da

coima. Quando o auto chega à DGV para ser registado no SIGA II, estes erros e omissões,

determinam em muitos casos a anulação do auto e a necessidade de o mesmo ser devolvido.

Um dos erros mais comuns que ocorre nesta fase consiste no preenchimento de forma incorrecta

e sem objectividade do espaço “descrição sumária” onde, não raras vezes, os factos que deram lugar

ao levantamento do auto de contra-ordenação são descritos de forma ambígua ou incorrecta, o que

facilita ao infractor a produção de defesa ou de impugnação judicial.

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Esta situação tem maior premência desde a entrada em vigor do projecto Polícia em Movimento,

atendendo à associação automática de uma proposta de texto à digitação do código de infracção, o

que leva a que, pela excessiva abrangência do texto proposto, sejam descritas várias situações

legalmente enquadradas nesse código de infracção embora o facto ocorrido tenha sido um só.

Por exemplo, quando é digitado o código de infracção nº 2540840102, o sistema propõe

automaticamente como descrição sumária o seguinte texto “Utilização, pelo condutor, durante a

marcha do veículo, de auscultadores sonoros (ou de aparelho radiotelefónico)”. Ora o agente autuante

não pode aceitar como suficiente este texto, tal e qual ele é apresentando, devendo, pelo contrário

editá-lo, eliminando o que não interessa e descrevendo factualmente o ocorrido.

Estes anacronismos associados à dificuldade de notificação, referida a seguir neste relatório,

explicam o elevado número de prescrições verificados logo no domínio da competência das entidades

autuantes.

Na FASE DE NOTIFICAÇÃO (da responsabilidade das entidades fiscalizadoras, nos termos

definidos pelo Código da Estrada), podem verificar-se duas situações, ou a infracção detectada

permite a abordagem imediata do infractor, sendo nessa circunstância levantado de imediato o auto

de contra-ordenação e o infractor notificado no local (infracções directas), iniciando-se, nesse

momento, o desenvolvimento do processo ou a infracção detectada não permite a abordagem

imediata do infractor (infracções indirectas) e, nesse caso, a notificação será feita por via postal para a

residência do proprietário de veículo.

Ora, o acto de notificação do proprietário do veículo, constitui uma das grandes dificuldades do

processo. Ao longo do tempo o condutor foi consolidando a convicção de que a não actualização da

sua morada (quer como proprietário da viatura, quer como titular da carta de condução), o beneficia,

atendendo a que a impossibilidade da notificação corre a favor do infractor, porquanto o processo fica

inviabilizado.

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Comissão para o Estudo do Processo Contra-ordenacional Estradal – Relatório Preliminar 10 / 43

Idêntica situação ocorre quando a viatura é pertença de uma empresa ou constitui um bem

adquirido em processo de “leasing”, “rent-a-car” ou “ALD”, onde a identificação do condutor infractor

raramente é assegurada com sucesso.

Não obstante as alterações introduzidas ao Código da Estrada preverem que, nestes últimos

casos, a sanção acessória de inibição de conduzir é transformada em apreensão da viatura por igual

período de tempo, tal circunstância continua ainda assim a ser favorável para o condutor infractor.

Estas oportunidades de dilação dificultam a utilização de estratégias de fiscalização assentes em

equipamentos de detecção automáticos, como sejam por exemplo os radares digitais fixos ou os

detectores automáticos de transposição de semáforo vermelho, essenciais para superar a carência de

recursos humanos com que se debatem as entidades fiscalizadoras.

As dificuldades verificadas no acto da notificação da infracção, constituem um dos aspectos

essenciais a corrigir no próximo figurino do processo contra-ordenacional, e para cujo objectivo a

Comissão pretende dar o seu contributo.

Na FASE DE COBRANÇA DO AUTO DE CONTRA-ORDENAÇÃO, verificam-se

estrangulamentos resultantes da dificuldade de associar a um determinado auto de contra-ordenação

a informação da liquidação da respectiva coima.

Autos de contra-ordenação levantados com notificação directa

No caso da infracção ser detectada pela entidade fiscalizadora no momento em que ocorre,

procedendo-se de imediato à notificação do infractor, este tem, nos termos da lei, três formas de

proceder de imediato à liquidação voluntária da coima: por cartão Multibanco (através do aparelho

POS), em dinheiro e em cheque.

O pagamento por cartão Multibanco é o mais facilitador para o processo, atendendo a que a

informação de boa cobrança do auto entra directamente no SIGA II e associa-se imediatamente ao

auto ainda antes deste ser registado ou recepcionado pela DGV. Neste caso, quando o auto é

processado, já consta no sistema a informação que a respectiva coima está liquidada.

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No caso do infractor pagar a coima em dinheiro ou em cheque, se é um facto que a entidade

fiscalizadora deposita imediatamente os valores na conta da DGV, a listagem ou o comprovativo de

depósito, que confronta os valores cobrados com o número do auto a que dizem respeito, não chega

à DGV de forma tão célere como seria desejável.

Acresce que, quando essa lista ou o comprovativo de depósito dá entrada na DGV (em formato

papel), a informação de boa cobrança tem que ser digitada auto a auto no sistema SIGA II, o que

provoca atrasos na associação de cobrança ao auto a que a mesma diz respeito, não existindo

qualquer automatismo neste procedimento.

Não raras vezes, um auto que está a ser processado pelo jurista e ao qual ainda não foi indexada

a informação de pagamento voluntário que realmente ocorreu, é decidido, erradamente, no

pressuposto de auto não pago. Quando a decisão é notificada ao infractor origina legítima reacção de

desagrado, no mínimo, determina a devolução do auto para fase de elaboração de nova decisão.

Algumas situações deste tipo resultam na imediata impugnação judicial o que coloca a DGV numa

situação particularmente desconfortável.

Ainda neste âmbito, verificam-se por vezes a recepção na DGV de cheques sem provimento, o

que vem introduzir novas dificuldades ao processo.

Autos de contra-ordenação levantados com notificação indirecta

Se o infractor não for notificado no imediato e no local onde cometeu a infracção, a notificação é

enviada para o domicílio, conferindo-se então ao infractor as seguintes formas de pagamento

voluntário da coima: por Multibanco ou nos postos dos CTT.

Ora, o modelo de pagamento por Multibanco tem uma fragilidade, que consiste no facto de o

sistema ser aberto. O que significa que, por exemplo, se o cidadão for liquidar uma coima de 120 € e

se este se equivocar digitando uma quantia de 12 € ou 1200 €, o sistema aceita a liquidação, o que dá

posteriormente lugar a um processo de correcção de pagamento, que é feito de forma manual, ou é

exigido ao cidadão o valor em falta, ou é devolvido, por cheque, o valor cobrado em excesso.

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O sistema Multibanco tem contudo a particularidade muito favorável de integrar automaticamente

no SIGA II, a informação de boa cobrança de cada auto, embora por vezes o faça com erros.

O modelo de pagamento nos postos dos CTT não evidencia nenhum problema em particular,

atendendo a que os CTT transferem imediatamente a verba recebida para a conta da DGV, para além

de integrarem a informação de cobrança de cada auto, automaticamente no sistema SIGA II, pelo que

a informação de boa cobrança fica imediatamente disponível para o jurista que prepara a decisão, em

igualdade de circunstâncias com o sistema POS ou Multibanco.

Caso especial das cauções de boa conduta

Concomitantemente com este processo ocorre outra manobra de cobrança/devolução que,

embora não tendo que ver directamente com o processo de cobrança de autos, requer uma manobra

complexa, manual, com o consequente empenhamento de recursos humanos.

Trata-se do processo da suspensão da pena de sanção acessória de inibição de conduzir, por

prestação de caução de boa conduta.

Solicitado que seja este procedimento por parte do condutor infractor e desde que a pretensão se

enquadre no preceituado da lei, deve o condutor depositar a favor do Estado uma determinada

quantia, apurada por referência à declaração de IRS do cidadão. Essa quantia fica depositada em

conta bancária da DGV durante o período suspensão da pena (na maior parte dos casos, de seis

meses), findo o qual deve a DGV devolver essa quantia ao cidadão em causa, desde que durante esse

período não tenha sido cometida outra contra-ordenação grave ou muito grave, porque nesse caso a

verba reverte definitivamente a favor do Estado.

Na prática, devido à complexidade da manobra em questão e à permanente carência de recursos

humanos, a DGV só procedia à devolução dessa verba quando o condutor a solicitava. Tal facto foi

recentemente corrigido, tendo a DGV iniciado um processo de regularização das verbas que se

encontravam em condições legais de devolução aos legítimos proprietários.

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Este processo, para além de moroso e de absorver consideráveis recursos humanos, não

representa uma vantagem para o Estado, atendendo a que a DGV tem funcionado como um mero

interposto de dinheiro, sem que daí resulte qualquer benefício para além da cobrança de juros.

Urge assim encontrar solução para simplificar este procedimento.

Na FASE DE REGISTO E RECEPÇÃO DO AUTO (da responsabilidade da DGV), o principal

estrangulamento ocorre na correcção dos erros e no preenchimento de dados em falta, com origem

nas entidades fiscalizadoras.

De facto, para que o auto de contra-ordenação seja registado no sistema SIGA II, é necessário

que os dados de identificação do condutor, código de infracção, etc. constantes do auto estejam

totalmente isentos de erros.

Não raras vezes, porque as entidades fiscalizadoras nem sempre têm acesso facilitado a todas as

bases de dados relevantes, dados essenciais estão incorrectos ou mesmo omissos, o que determina

logo à partida a obrigatoriedade de proceder ao reenvio desses autos às entidades que o emitiram ou

à sua própria correcção na DGV.

Na FASE DO PROCESSAMENTO também se verificam estrangulamentos, essencialmente

resultantes da inexistência de um sistema informático que constitua de facto o suporte de todo o

processamento e da própria complexidade do processo contra-ordenacional.

De facto, como já ficou dito atrás, o actual sistema informático SIGA II, para além de só muito

recentemente permitir a continuidade entre as fases de levantamento do auto, notificação e

processamento da decisão, continua a não permitir um processo contra-ordenacional informatizado

em contínuo, fundamentado na produção nula de peças em papel e que enquadre todo o

processamento desde o levantamento do auto até à decisão judicial produzida em tribunal.

Por outro lado, o sistema SIGA II ainda não consegue interagir com a totalidade das bases de

dados do sector automóvel desenvolvidas pela DGV (condutores e veículos, por exemplo), pelo que,

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Comissão para o Estudo do Processo Contra-ordenacional Estradal – Relatório Preliminar 14 / 43

ainda não é possível obter automatismos plenos que facilitariam a integração automática de

informação relevante para o desenvolvimento do processo.

A FASE DO PROCESSAMENTO JUDICIAL enferma de todos os males sobejamente

conhecidos.

Particularmente a transferência do processo contra-ordenacional para os tribunais, quer por

impugnação judicial pelo infractor não conformado com a decisão administrativa proferida pela DGV,

quer pelo não cumprimento da sanção imposta ao infractor, corresponde a um trabalho intenso e

moroso por parte da DGV, que consiste em fotocopiar todo o processo contra-ordenacional e no envio

para tribunal do original em suporte papel (se associado à coima houver sanção acessória, são

enviados ao Tribunal os originais mais uma cópia).

Quando não acontece prescrever antes, não raras vezes o processo acaba por prescrever no

momento em que se encontra no tribunal, adicionado que seja o atraso verificado no âmbito da

intervenção da DGV com o atraso dos mesmos Tribunais.

SISTEMATIZAÇÃO DE ESTRANGULAMENTO DO PROCESSO CONTRA-

ORDENACIONAL

Sistematizando os estrangulamentos do actual processo contra-ordenacional estradal, referimos:

1. Levantamento do auto de contra-ordenação:

1.1. A autoridade administrativa não tem possibilidade de monitorizar o número de livros de autos

e a respectiva distribuição pelas entidades fiscalizadoras.

1.2. Erros e omissões no preenchimento dos dados relativos à identificação do condutor infractor;

1.3. Falta de objectividade na “descrição sumária” da infracção ao Código da Estrada que

determina a autuação;

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2. Notificação (da infracção, da decisão administrativa e da decisão judicial):

2.1. Discrepância entre a morada efectiva do infractor e a morada que está inscrita no título de

condução e que consta da base de dados de condutores, em virtude da sua não

actualização;

2.2. Discrepância entre a morada efectiva do proprietário do veículo e a morada que consta da

base de dados de proprietários, devido a não actualização;

2.3. Pessoas colectivas proprietárias de veículos (sistemas de “leasing” e “ALD”) que identificam

como utilizadores habituais dos veículos, outras pessoas colectivas;

2.4. Pessoas colectivas proprietárias argumentam a impossibilidade de identificar o condutor

infractor;

2.5. Proprietárias dos veículos identificam os condutores infractores com dados incorrectos ou

incompletos ou como sendo residentes no estrangeiro;

2.6. Condutores notificados não procedem ao levantamento da correspondência em carta

registada com origem nas entidades fiscalizadoras ou na DGV – trata-se de um procedimento

em expansão consolidado pela sensação de que, enquanto não há notificação não há lugar a

punição;

2.7. Ausência de um sistema informático integrado que permita a emissão automática da

notificação através da introdução de dados simplificados (matrícula do veículo infractor,

data/hora e local da infracção, código de infracção).

2.8. Inexistência de uma ligação informática entre o sistema de envio de notificação registada

(CTT) e o sistema informático de gestão de autos de contra-ordenação (DGV), o que

permitiria uma automatização total do processo.

3. Cobrança de autos de contra-ordenação:

3.1. Falta de um automatismo entre a operação de cobrança e o respectivo processo de contra-

ordenação a que esta diz respeito;

3.2. Liquidação de cobrança através de cheque sem provisão;

3.3. Possibilidade de digitação de quantias desconformes no processo de liquidação por

Multibanco;

3.4. Caso particular do processo de gestão das cauções de boa conduta, que não se encontra

informatizado, nem automatizado.

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4. Registo de autos de contra-ordenação:

4.1. Elementos de identificação do condutor infractor registados de forma incompleta ou com

algarismos trocados, por via do preenchimento incorrecto do auto pelas entidades

fiscalizadoras;

4.2. Obrigatoriedade imposta ao funcionário que procede ao registo do auto, de consultar com

frequência o ficheiro de condutores para proceder à respectiva correcção, e quando tal lhe for

possível;

4.3. Obrigatoriedade imposta ao funcionário que procede ao registo do auto de proceder à

devolução do mesmo à entidade fiscalizadora para que se proceda à respectiva correcção.

5. Processamento contra-ordenacional

5.1. O sistema informático regista a cobranças dos autos com atraso, o que determina a

necessidade de anular as decisões que erradamente alegam a não liquidação voluntária da

coima - à data da decisão não constava do registo de autos cobrados, o que se verifica dois

ou três meses mais tarde). Tal facto tem motivado alguns recursos judiciais desnecessários);

5.2. A audição de testemunhas é aproveitada pelos mandatários dos condutores infractores para

retardar a elaboração da decisão, designadamente requerendo a audição de testemunhas

em várias cidades do país;

5.3. Inexistência de um sistema informático que integre as diferentes bases de dados relevantes e

a inexistência de automatismos informáticos que permitam a produção de decisões sobre

modelos automáticos ou semi-automáticos (no caso das contra-ordenações graves e muito

graves sem defesa ou com defesa irrelevante);

5.4. A notificação da decisão padece das mesmas dificuldades registadas na notificação inicial da

contra-ordenação;

5.5. Ambientes de trabalho nem sempre adaptados às particularidades do processo contra-

ordenacional, por vezes com manifesta falta de espaço e arquivos quase sempre

inadaptados;

5.6. Falta de recursos humanos, ainda assim colmatada pela contratação de avençados ou

trabalhadores em regime de “outsourcing”, cuja convivência com os funcionários do quadro

nem sempre se apresenta pacífica;

5.7. Intervenção dos Governadores Civis no processo contra-ordenacional que em muitos casos

provoca uma diluição da responsabilidade do processamento que não favorece o processo;

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5.8. Incumprimento, por vezes sistemático, do Manual de Contra-ordenações editado pelo

GJC/DGV, por parte dos vários protagonistas do processo;

5.9. Processo contra-ordenacional repartido por três subunidades orgânicas da DGV, o Gabinete

Jurídico e do Contencioso, no que respeita ao processo propriamente dito, a Direcção de

Serviços de Informática, no que concerne ao desenvolvimento e gestão do SIGA I e SIGA II e

a Direcção de Serviços Administrativos, relativamente à cobrança dos autos de contra-

ordenação;

5.10. Sistema de cobranças complexo, com uma gestão difícil e morosa das várias fases do

processo de arrecadação de receita das contra-ordenações, agravado pelo expediente da

devolução de cauções de boa conduta.

6. Processamento judicial

6.1. Problemas inerentes ao sistema judicial, em particular quanto ao atraso na decisão dos

processos;

6.2. O envio de processos para execução judicial exige o empenhamento de muitos recursos

humanos, pois é necessário proceder à cópia integral de cada processo, que vai em original

para o Tribunal;

6.3. Embora esteja previsto no Código da Estrada que, após notificação do infractor por carta

registada com aviso de recepção e se esta for devolvida, deve a autoridade administrativa

proceder á notificação por carta simples para a morada que conste na carta de condução ou

do proprietário do veículo, considerando-se assim o infractor notificado, verificam-se casos

em que o Juiz determina o arquivamento do processo se dele não constar o aviso de

recepção assinado em conformidade, alegando não ter a certeza da notificação do infractor;

6.4. Nem sempre os Tribunais informam a DGV das decisões proferidas.

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Ponto de situação do tratamento dos autos de contra-ordenação

C. PROGRAMA DE REESTRUTURAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO CENTRAL DO

ESTADO – ENQUADRAMENTO E ASPECTOS A TER EM CONTA

Atento o momento que Portugal atravessa no que respeita à implementação de medidas

estruturais que visam a modernização da Administração Pública, o trabalho da Comissão não poderia

deixar de reflectir um pensamento sobre a forma como no processo de contra-ordenações resultante

da infracção ao Código da Estrada se podem fazer reflectir as orientações aprovadas pelo Governo no

âmbito do PRACE.

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Efectivamente pela Resolução de Conselho de Ministros n.º 39/2006, de 21 de Abril, o Governo

aprovou as orientações gerais e especiais para a reestruturação do conjunto dos ministérios,

determinando na subalínea iii) da alínea b) do n.º 12 a criação do Gabinete de Segurança Rodoviária

(e cuja designação entretanto evoluiu para Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária - ANSR), que

integrará, de entre outras, as atribuições da DGV nos domínios das políticas de prevenção e segurança

rodoviária e de contra-ordenações, as do Conselho Nacional de Segurança Rodoviária e as das

comissões distritais de segurança rodoviária e mais, determinando na subalínea vii) da alínea e) do

mesmo número, que a DGV é extinta, sendo as suas atribuições relativas a veículos, condutores e

infra-estruturas rodoviárias transferidas para o Ministério das Obras Públicas Transportes e

Comunicações (MOPTC).

Coincidindo o momento da constituição da Comissão com o desenvolvimento da supracitada

Resolução de Conselho de Ministros, que de resto se encontra em rápida implementação, puderam os

membros da Comissão, na parte que releva para a tarefa que lhe está incumbida, conhecer as

orientações já definidas que assentam designadamente nos seguintes aspectos principais:

1. A ANSR será dirigida por um Presidente e um Vice-Presidente e o quadro de pessoal

será o da Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna:

2. A ANSR não disporá de serviços desconcentrados;

3. O processo de contra-ordenações estradais, concretamente o tratamento e gestão

das contra-ordenações directas e indirectas, deve ser, nessa circunstância

centralizado, desaparecendo a responsabilidade dos Governadores Civis no processo.

D. SOLUÇÕES – DESENVOLVIMENTO, VIABILIDADE E DIFICULDADES DE

IMPLEMENTAÇÃO

1. Levantamento do auto de contra-ordenação

Como já se referiu é essencial para o bom desenvolvimento de todo o processo de contra-

ordenações, que, desde logo e a montante, o auto seja correctamente levantado e devidamente

preenchidos todos os campos.

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Nesse sentido afigura-se muito relevante que possa ser incrementado nas entidades fiscalizadoras,

um conjunto de ferramentas informáticas que lhes permitam processar o auto de contra-ordenação de

forma simplificada e com o menor número de erros.

Por outro lado, devem ser assegurados aos militares e agentes das forças de segurança maior

formação, especificamente dirigida ao preenchimento dos diferentes campos constantes do auto, que

incorpora a definição sumária dos factos de que resulta a autuação do condutor, designadamente

assegurando a inserção correcta do código de infracção.

2. Notificação

As deficiências constatadas nos procedimentos de notificação da infracção, são outro aspecto

muito prioritário a corrigir no novo figurino do processo contra-ordenacional.

Apreciadas as dificuldades e comprovadas que estão estatisticamente, haverá desde logo que

introduzir uma inversão no princípio base vigente. O ónus do condutor que motiva entraves ao normal

desenrolar dos actos de notificação deve cair inequivocamente sobre quem os cria.

Ou seja, é imperativo que o registo do endereço dos condutores, dos proprietários dos veículos ou

dos habituais utilizadores tenha um valor inquestionável, com o mesmo impacte, por exemplo, do

endereço fiscal, que os cidadãos não correm o risco de não actualizar.

A dificuldade na determinação do endereço correcto e eficaz para efeito da notificação,

ou seja o endereço que efectivamente permite encontrar o infractor que se pretende

notificar, pode ser contrariada pela adopção de mecanismos incentivadores de um maior

cumprimento pelos cidadãos da obrigatoriedade de alterarem o endereço registado no título

de condução sempre que se verificar a mudança de morada.

Esta evolução vai constituir um passo firme na ambicionada celeridade do tratamento

dos processos de contra-ordenação estradal.

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Quando a notificação é efectuada no endereço que consta do título de condução, deve

considerar-se bem feita e por isso válida, ainda que o infractor tenha entretanto mudado de

residência.

Esta opção traz agregada a necessidade de ponderar outros mecanismos de incentivo à

alteração do endereço do título de condução sempre que se verifica efectivamente a

alteração de morada do seu titular. O que pode passar pela não cobrança de qualquer taxa

de serviço (actualmente o seu custo está nos € 22,00), ou pela agilização dos processos

administrativos necessários (que hoje implicam uma razoável burocracia e um inerente

gasto de tempo).

A questão das notificações, todavia, não se reduz a este entrave criado pela não

actualização das moradas.

Actualmente um infractor apenas se considera notificado – quando tal não acontece no

acto – através de carta registada.

A Comissão avaliou alterações a introduzir às normas vigentes para as notificações no

processo de contra-ordenações estradal, tendo desde logo por base o pressuposto

transversal de diminuir o âmbito da aplicação subsidiária das disposições do Código de

Processo Penal (CPP) às regras definidas para as notificações em sede do processo de

contra-ordenações estradais. Através de uma iniciativa legislativa – alteração do CÓDIGO

DA ESTRADA – deverá ser definido um novo regime legal de notificações específico para o

processo de contra-ordenações estradais, que desde logo considere, sempre que se

demonstrem adaptáveis à realidade, as melhores práticas hoje vigentes, designadamente as

seguidas, e diga-se com bastante sucesso, pela administração fiscal.

A par da questão relacionada com a imposição de ónus negativo pela não alteração do

endereço, a administração fiscal concentra os seus esforços no âmbito da notificação, no

envio de carta registada. Nos casos em que não se obtém sucesso – que, segundo foi

possível apurar são cerca de 10% das situações – recorre à notificação pessoal e à

notificação por aviso postal na residência do cidadão infractor. A Comissão considera que

este modelo pode ser uma solução a importar com sucesso para o processo de contra-

ordenações estradal.

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Na aplicação da solução enunciada ao processo contra-ordenacional estradal, o volume

sobrante de notificações, que não tenha conhecido sucesso pela forma de carta registada,

seriam então realizadas por pessoal dotado de poder para o efeito, sendo efectuadas pelas

forças de segurança, no que poderão ser apoiadas por recursos humanos entretanto

disponibilizados no âmbito das alterações derivadas do PRACE.

Evidentemente que se trata de uma opção que encerra dificuldades, designadamente na

sua operacionalidade, mas que ainda assim não será despiciendo apreciar o impacto,

designadamente o financeiro, da solução preconizada, pois do maior sucesso das

notificações, designadamente as pessoais, pode resultar um encaixe financeiro muito

considerável que tem que ser tido em conta na orçamentação das despesas implicadas.

Nas contra-ordenações indirectas o problema assume uma relevância ainda maior

quando estão em causa veículos registados na propriedade de pessoas colectivas,

designadamente os adquiridos por contratos de leasing ou ALD, em que é identificada a

sociedade locadora que, por sua vez, nem sempre identifica o locador perante as entidades

fiscalizadoras ou administrativas. A Comissão ponderou, a título de solução desincentivadora

destes comportamentos prejudiciais a um processo diligente, passar a prever-se uma

cominação maior ou um período mais longo de apreensão do veículo para a empresa

proprietária que não assegura a notificação do infractor condutor de um veículo de que é

proprietária, fazendo-se repercutir com maior intensidade no proprietário do veículo as

desvantagens de não colaborar no processo de notificação.

3. Cobrança

Como já se referiu acima, o processo de cobrança também encerra dificuldades, designadamente

por exigir enorme afectação de recursos humanos.

Face ao exposto, o futuro quadro de procedimentos relativos ao pagamento das coimas, deve

assentar no pressuposto de que qualquer pagamento, seja feito em dinheiro, em cheque ou por

Multibanco ou ainda nos postos dos CTT, é transmitido automaticamente, em módulo “off line” para o

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sistema informático de processamento de autos de contra-ordenação, que procederá, também

automaticamente, à associação da boa cobrança ao respectivo auto. Deste modo torna possível numa

fase muito inicial do processo, garantir que a informação está disponível e é considerada por quem

prepara a decisão, que vai contemplar de forma inequívoca na apreciação, a informação de que a

coima foi paga voluntariamente.

É igualmente necessário proceder à alteração do formato de pagamento por Multibanco, de forma

a garantir a impossibilidade da ocorrência de erros de digitação, como os que foram acima descritos.

No que respeita ao processamento de cauções de boa conduta, que como acima foi dito, não

beneficia hoje de qualquer suporte informático, podem ser adoptadas duas soluções: a possibilidade

de requerer a suspensão da execução da sanção acessória de inibição de conduzir pela prestação de

caução de boa conduta é excluída das disposições do Código da Estrada, ou, a manter-se a actual

legislação, seja desenvolvido um módulo informático específico, associado ao sistema principal de

processamento de autos, de forma a automatizar este procedimento.

Na primeira opção, o processo de suspensão da pena de sanção acessória de inibição de conduzir,

manter-se-ia associado ao cumprimento das restantes condicionante previstas nas alíneas b) e c), do

n.º 3, do artigo 141º do Código da Estrada.

Na segunda opção, e numa primeira análise, não se afigura muito complexo que, na fase de

composição da decisão, e em face de solicitação específica nesse sentido, seja criado um automatismo

que produza a decisão determinando a aplicação de caução de boa conduta e definindo o seu valor. A

cobrança da caução cumprirá os mesmos pressupostos da liquidação da coima, sendo produzido um

alerta automático ao fim do tempo de suspensão da pena e emitido de forma automática o cheque no

valor da caução previamente depositada, em nome do condutor infractor que consta do auto.

4. Registo e recepção

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O registo e a recepção dos autos devem ser efectuados pelas próprias entidades fiscalizadoras,

que deste modo estarão numa posição privilegiada para proceder à correcção dos erros e omissões

que eventualmente fiquem associados ao auto no momento em que é levantado.

Aliás no âmbito do trabalho desenvolvido pela Comissão, ficou assente como elemento transversal

e estruturante a todas as soluções contempladas no Relatório, a emergência do processo contra-

ordenacional assentar num sistema informático único. Ou seja desde o momento em que o auto de

contra-ordenação é levantado até à eventual remessa do processo para o competente foro judicial,

todos os procedimentos correm no mesmo sistema informático, assegurados os devidos acessos e os

necessários cruzamentos de dados entre as entidades fiscalizadoras, a entidade competente para

preparar a decisão e a entidade competente para decidir.

5. Processamento

No domínio do processamento e em particular no que toca ao papel a desempenhar pelos

sistemas informáticos, salienta-se que qualquer que seja o sistema informático de apoio ao processo

contra-ordenacional, este contemple os seguintes requisitos:

1. Sistema contínuo entre o início do processo de contra-ordenação com o levantamento do

auto, e a eventual remessa do processo para decisão judicial produzida pelo tribunal;

2. Um sistema que elimine na totalidade a existência de papel, através da produção de

“templates” ou da digitalização de documentos imprescindíveis, como sejam as notificações, a

defesa, a decisão, etc.;

3. Um sistema que permita o acesso a todas as bases de dados detentoras de informação

relevante para o processo, como sejam as dos veículos e as dos condutores, RIC, RIO, etc.,

permitindo assim a automatização de procedimentos e preenchimentos;

4. Um sistema que generalize o conceito de “jurista virtual”, não só para as contra-ordenações

de estacionamento, não pagas e sem defesa, como acontece hoje, mas que se estenda o

conceito a todas as contra-ordenações leves, graves e muito graves, pagas ou não pagas,

com ou sem defesa. O sistema, ao invés de ter cerca de duzentos modelos de decisões

disponíveis, como se passa actualmente, deve ter a capacidade de ir produzindo (leia-se

“compondo”) a decisão automaticamente em função das informações que lhe são

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disponibilizadas, fundamentando-se num modelo “if X-than Y” (o detalhe desta proposta,

constitui o Anexo 3 deste relatório).

5. Um sistema, que através da emissão de alertas, permita uma auditoria permanente ao

processo contra-ordenacional, de forma a possibilitar a detecção e correcção rápida de desvios

temporais do processamento.

DESENVOLVIMENTO DO CONCEITO DE JURISTA VIRTUAL

Actualmente, o sistema SIGA II disponibiliza ao jurista que está a analisar o auto de contra-

ordenação e a preparar a respectiva decisão, cerca de duzentas propostas de decisão abertas (leia-se,

possíveis de edição), que tentam abranger a totalidade das opções possíveis que se apresentam ao

jurista, e que influenciam a produção da decisão.

Como é evidente, ninguém consegue memorizar esta quantidade de opções e optimizar a sua

escolha. O que realmente se passa é que cada jurista domina cerca de uma dezena de modelos,

conseguindo produzir cerca de 80% das suas decisões, editando a opção que melhor se adapta às

condicionantes do auto que está a processar. Os restantes 20% obrigam-no a produzir uma decisão

de raiz.

Por outro lado, o sistema SIGA II não permite a ligação automática a nenhuma base de dados

actualmente disponível, quer da DGV, como seja o Registo Individual do Condutor, Base de

Condutores, quer, por exemplo da DG de Registos e Notariados (base de proprietários).

Esta circunstância, obriga a que o jurista em fase de processamento do auto, seja

permanentemente obrigado a sair do sistema SIGA II para aceder a essas bases, para consultar dados

relevantes para a fundamentação da decisão.

Ainda na actualidade, existem dois processos facilitados no universo da totalidade dos autos de

contra-ordenação. Um dos processos é o que contempla o arquivo directo na própria entidade

fiscalizadora, das contra-ordenações leves, pagas e sem defesa. Outro do processo facilitado é o das

contra-ordenações resultantes de estacionamento ilegal, sem defesa, não pago (excepto se se verificar

sobre passadeiras), e que é sujeito a um processo automático, designado por “jurista virtual”, que

produz uma decisão que determina ao arguido o pagamento da respectiva coima, acrescida de custas.

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A proposta da comissão consiste na extensão desta facilidade à totalidade do universo das contra-

ordenações, quer sejam leves, graves ou muito graves, com ou sem pagamento voluntário, com ou

sem defesa, seja ou não o condutor reincidente.

Para tanto, é necessário que o sistema informático a desenvolver interaja na totalidade com todas

as bases de dados detentoras de informação relevante e que condicione a decisão.

Qualquer que seja a tipologia e gravidade da contra-ordenação em análise, desde que o acesso a

essas bases de dados se processe de uma forma “on-line”, é necessário que o sistema informático vá

“compondo” a decisão através de frases chave associadas a realidades inerentes à contra-ordenação,

ao cadastro do condutor, à circunstância de a coima ter sido ou não paga voluntariamente, e assim

sucessivamente até que a decisão esteja completa, sem que o jurista tenha editado o que quer que

seja.

Por exemplo, imaginando uma contra-ordenação grave, com pagamento voluntário da coima por

parte do arguido:

1. Através de um processo de “jurista virtual”, a folha de decisão, quando for aberta, importará

automaticamente (do próprio auto de contra-ordenação levantado pela entidade fiscalizadora no

mesmo sistema informático) o NOME, MORADA (que será colocada automaticamente no espaço

próprio visível sob a janela do envelope de expedição postal), Nº DE BI e CARTA DE CONDUÇÃO

DO ARGUIDO, Nº DO AUTO, e o CÓDIGO DE INFRACÇÃO.

2. A partir daqui, o sistema informático é possuidor de informação base que lhe permite começar a

produzir um texto preestabelecido, com preenchimento de espaços em branco com informação

relevante.

3. Ao identificar o CÓDIGO DE INFRACÇÃO, e porque detecta que se trata de uma contra-ordenação

grave, o sistema deve automaticamente aceder, através do Nº DE BI ou da CARTA DE

CONDUÇÃO, ao RIC (cadastro) e introduz automaticamente, em espaço próprio na folha de

decisão, as contra-ordenações graves ou muito graves que eventualmente constarão no RIC.

4. Por essa consulta ao RIC, o sistema assume uma de duas informações: ou o arguido é primário

(cadastro limpo) ou o arguido tem em registo outras contra-ordenações graves ou muito graves

(portanto reincidente), o que lhe permite automaticamente produzir texto em conformidade com a

informação de que dispõem.

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5. Concomitantemente, analisando outra informação relevante já anteriormente introduzida no

sistema, com seja a atempada liquidação voluntária da coima ou não, volta a ser possível ao

sistema produzir automaticamente texto preestabelecido em função das duas variáveis.

6. E assim sucessivamente, num processo de “if X, than Y” até que a decisão seja automaticamente

produzida e disponibilizada para o decisor final que ainda dentro do sistema a valide, assinando a

decisão através de assinatura digital ou digitalizada, dando então início ao processo, também

automático de impressão, dobragem, envelopagem e expedição postal da decisão administrativa

para o arguido (esta última fase de pós decisão, já é automatizada actualmente).

O processo acima descrito é válido e adaptável a toda a tipologia de auto de contra-ordenação

desde que o arguido não apresente “defesa”. Contudo também neste caso os automatismos acima

descritos são aplicáveis, com a condicionante de que ao ser accionada uma janela de defesa, será

automaticamente aberto no texto uma janela de edição de texto livre, que permite ao jurista que está

a processar o auto, fazer uma apreciação da defesa, seguindo então com o automatismo de produção

de texto da decisão:

Se o jurista considerar a defesa procedente, accionando comando próprio nesse sentido, atendendo a

que não necessita de justificar esse facto, o sistema não abre janela de texto de edição livre e limita-se

a produzir um texto de “arquivamento do auto”.

Se por outro lado, o jurista considerar a defesa totalmente improcedente, o sistema deve abrir uma

janela de edição livre de texto, onde tem que justificar os fundamentos da improcedência, findo o qual

o sistema produz automaticamente a decisão de punição como se de um auto sem defesa se tratasse.

O processo fica assim simplificado, inibe dissertações desnecessárias, o jurista só edita texto

no caso de apresentação de defesas consideradas improcedentes, as decisões evidenciarão

uma homogeneidade de texto e parafraseado constante.

O desenvolvimento de um sistema informático deste tipo obriga à criação de um grupo de

trabalho muito coeso, constituído por juristas conhecedores do processo contra-

ordenacional e informáticos com elevados conhecimentos em programação e

desenvolvimento informático.

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É ainda necessário que o processo contra-ordenacional seja antecipadamente simplificado

até ao limite máximo do legalmente admissível e ainda, que não hajam dúvidas quanto ao

desenvolvimento do mesmo.

6. Impugnação Judicial

Atento o facto de se ter constatado como indispensável que os processos de contra-ordenação

estradal continuem a ser julgados por tribunais comuns, até pela consagração constitucional dessa

obrigatoriedade, a Comissão debateu a possibilidade de serem criados foros específicos, pelo menos

nas comarcas distritais, especificamente vocacionadas para a decisão judicial dos processos de contra-

ordenação resultantes da infracção ao Código da Estrada.

Entende a Comissão ser exequível a criação de secções específicas nos Tribunais de Pequena

Instância Criminal para decisão dos recursos das decisões administrativas, das execuções e para a

promoção de acções crime pela não entrega do título de condução para cumprimento de sanção

acessória.

Do mesmo modo, não obstante reconhecer-se a complexidade da solução, valerá a pena

ponderar a importação para o processo de contra-ordenações estradais, naturalmente com as

necessárias adaptações, do sistema dos julgados de paz, que inclusivamente poderia vigorar apenas

para uma parte das contra-ordenações. Simultaneamente, ponderar-se uma previsão legal que

determine a não admissão de recurso da decisão administrativa proferida em sede de processo de

contra-ordenação para determinado tipo de infracções.

Tais secções seriam criadas de imediato nos tribunais com maior volume de processos,

designadamente, Lisboa, Porto, Aveiro, Leiria, Coimbra, Santarém, Setúbal e Faro, ainda que, em

termos ideiais, a melhor opção seria criar estas secções em todas as capitais de Distrito.

A solução evidencia como grandes vantagens a criação de uma homogeneidade jurídica na

apreciação dos processos e a criação de condições para a informatização total dos procedimentos

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entre a autoridade administrativa e a autoridade judicial, permitindo a continuidade do processo

contra-ordenacional (18 ligações de rede, adicionados a tantos computadores quantos os juízos

criados, isto no caso de ser possível a solução ideal preconizada no parágrafo anterior).

A um outro nível e assegurado que esteja a manutenção das garantias do cidadão, que se

consideram indiscutivelmente salvaguardadas, deve implementar-se na prática a consagração legal

prevista na alínea bb) do artigo 3º, da Lei n.º 53/04, de 4 de Novembro, que autorizou o Governo a

proceder à revisão do Código da Estrada, e onde se determina a inadmissibilidade do recurso de

decisões judiciais em sede de impugnação judicial de decisões administrativas, com excepção da

decisão de cassação do título de condução.

Ainda neste domínio, na fase de impugnação judicial, em relação aos autos indirectos e

contestados, de acordo com dados disponíveis na DGV, verifica-se que em sede judicial

muitos dos procedimentos vêm a cair em razão de um insuficiente ou mesmo deficiente

acompanhamento dos mesmo, que considere e tenha presente os aspectos específicos do

regime das contra-ordenações estradais, sendo frequentemente negligenciados na

apreciação judicial pormenores jurídicos de enorme relevância, essenciais para a formulação

de um juízo condenatório.

Ora, em fase de apreciação judicial, pós-impugnatória, a representação do Estado está,

nos termos da lei, cometida ao Ministério Público. É certo que, nos termos genericamente

previstos no artigo 70.º do RGCO, a autoridade administrativa pode participar na audiência,

de forma a trazer à mesma «(…) elementos que reputem convenientes para uma correcta

decisão do caso (…)». Porém, tal susceptibilidade parece constituir uma prerrogativa do

Juiz, sob solicitação da autoridade administrativa, sem que esteja convenientemente clara e

solidificada a posição processual e poderes instrumentais de que esta goza.

Assim sendo, a posição da autoridade administrativa in casu, até por força da aplicação

subsidiária das regras processuais penais, é a que goza qualquer outra entidade que, ao

abrigo do artigo 340.º do CPP, entenda o Juiz dever ouvir para o bom julgamento da causa.

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Sem prejuízo da indispensável consideração dos aspectos financeiros e organizacionais

subjacentes, designadamente em sede de custo/benefício, crê-se que a extensão do

acompanhamento dos processos desde a sua análise e preparação para decisão

administrativa, até à conclusão judicial, nos casos em que esta comporte audiência de

discussão e julgamento, poderia constituir um relevante contributo para a eficácia quer

repressiva, quer mesmo preventiva, tanto geral, como específica, no âmbito do ilícito

estradal.

Sugere-se assim, caso se pretenda rever o processo contra-ordenacional estradal, quer

seja avaliada a vantagem em contemplar norma expressa pela qual, no caso em apreço, a

posição da autoridade administrativa ganhe contornos de especial colaborador do Ministério

Público, por inspiração na figura do Assistente em processo penal, com direitos processuais

a fixar em concreto.

7. Assinaturas digitais

Atento o espírito das soluções preconizadas pelo Relatório, fica clara a necessidade de encontrar

soluções para um outro aspecto muito relevante relacionado com as assinaturas digitais.

Em diferentes casos, tem-se verificado a existência de decisões judiciais que vão no sentido de

considerar que uma decisão administrativa, pelo facto de não se mostrar assinada pelo punho da

autoridade administrativa, comportando folhas impressas sem qualquer assinatura e uma final na qual

tem aposta uma assinatura digitalizada, enferma de inexistência jurídica por não ter sido aposta na

decisão recorrida qualquer assinatura manuscrita.

Estas decisões fundamentam-se na aplicação subsidiária do disposto no CPP ao processo contra-

ordenacional estradal.

Nesse sentido a Comissão, conhecidas inclusivamente as informações recentes que os serviços da

DGV produziram, assumiu como solução para o estrangulamento em causa, que, através de iniciativa

legislativa, seja alterada a actual redacção do Código da Estrada no sentido de permitir a assinatura

digitalizada nas decisões administrativas proferidas no âmbito do processo de contra-ordenação

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rodoviária, o que significará abandonar a aplicação dos dispositivos do processo penal a esta questão

concreta.

8. Externalização da preparação da decisão

As considerações expendidas em B. 3. deste Relatório e que, conforme aí se afirma, constituem

um elemento a considerar quanto às soluções a desenvolver pela Comissão, encaminha-nos para a

necessidade de responder ao desafio da centralização do processo de contra-ordenações resultante da

infracção ao Código da Estrada.

Ora, assumido o facto da ANSR não dispor de serviços desconcentrados, e que inclusivamente a

referida entidade fará assentar o seu funcionamento administrativo no apoio disponibilizado pelo

quadro de pessoal da Secretaria-geral do Ministério da Administração Interna, a opção por externalizar

parte dos procedimentos inerentes ao processo afigurou-se desde cedo como uma solução a

ponderar.

Aliás, mais considerando a verificada dificuldade de dispor de juristas do quadro da administração

pública, como bem testemunha a realidade sentida ao longo dos últimos anos pela DGV, que

inclusivamente se viu obrigada à contratualização de juristas em regime de avença e ainda ao apelo a

protocolos com instituições do ensino superior para cedência de licenciados em direito, o que, em bom

rigor, nunca foi do ponto de vista da eficiência, uma solução com grandes resultados.

São precisamente estas aferições que nos levam a excluir a opção por soluções mistas e a propor

a opção pelo recurso a soluções de externalização, designadamente o recurso ao outsourcing.

Tendo estudado a questão a Comissão concluiu como viável a opção de, no tratamento

dos processos de contra-ordenação, toda a componente relativa à preparação da decisão

ser externalizada, recorrendo ao regime de “outsourcing”. Naturalmente desde que fique

salvaguardado que a decisão do processo estará sempre e necessariamente fora desse

âmbito, sendo assegurada por funcionários públicos com competências delegadas para o

efeito.

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A externalização de serviços atinentes ao processo terá como vantagens o aumento da

eficiência, pois a contratualização seria realizada com o pressuposto de que a entidade teria

capacidade para corresponder às necessidades inerentes a um procedimento desta

dimensão. A restrição nos custos representa uma outra vantagem, uma vez que a

externalização implicaria uma redução nos quadros de funcionários actuais, bem como uma

ocupação menor de espaço físico consagrado a áreas de trabalho e arquivo.

E quanto a custos, constatou-se ainda que a necessidade de afectar funcionários

públicos à decisão do processo contra-ordenacional implica dispor de um número adequado

de funcionários, que terá seguramente que ser superior ao número de delegados regionais

e delegados de viação que hoje têm essa competência. Isto porque sendo a preparação da

decisão assegurada por entidade externa, será conveniente que o tempo necessário para o

decisor apreciar cada processo seja substancialmente maior do que hoje dispõe o decisor

competente. Estima-se ser necessário um número aproximado de 45 decisores, que

analisariam e assinariam uma média de 60 decisões diárias, previamente preparadas pela

entidade privada contratada, que deve igualmente assegurar o desenvolvimento e

manutenção do sistema informático.

A este propósito diga-se, e no seguimento da ideia já acima expressa, que não é exacto

que se afigure simples assegurar, no quadro disponível na administração pública, o número

de juristas necessário para exercerem as competências de decisão nos moldes aqui

preconizados.

Como salvaguarda e em alternativa ao outsourcing puro, a Comissão apreciou as

premissas de um eventual recurso a Parcerias Público-Privadas (PPP), cuja utilização em

Portugal tem obtido resultados díspares em função da área de implementação, concluindo

que a solução implicaria eventualmente dificuldades ao nível do período de vigência e

eventual rescisão dos respectivos contratos, não constituindo uma vantagem em relação à

opção pelo outsourcing puro.

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A Comissão alerta contudo que, optando-se pela externalização de procedimentos, é

fundamental antecipadamente definir os limites do âmbito da sua intervenção, bem como

determinar o modo de funcionamento da entidade privada, contratada para elaborar as

propostas de decisão que posteriormente funcionários públicos vão analisar, decidir e apor a

respectiva assinatura.

Aliás, no quadro dessas salvaguardas, particularmente quanto ao acesso à base de dados

pessoais, considera a Comissão que, quanto ao acesso aos registos individuais dos

condutores, em particular quanto ao Registo Individual do Condutor (RIC), a solução deve

passar por um sistema informático que permita, no momento da introdução do auto de

contra-ordenação no suporte informático (que deve ser único desde o momento do

levantamento do auto até à eventual remessa do processo para o foro judicial), seja

assegurado através de um cruzamento de dados com o RIC, que a informação constante do

mesmo e relativa ao condutor infractor em causa, seja desde aí remetida para o sistema,

podendo os juristas responsáveis pelo processo elaborar a proposta de decisão com base

nos dados relevantes para o efeito, i.e., as referências às contra-ordenações graves e muito

graves previamente cometidas ao infractor em causa. Desta forma, o funcionário

responsável pelo processo, não terá acesso a informações pessoais e confidenciais dos

condutores em geral, mas apenas às relevantes para a análise casuística, até porque não

lhe é assegurado o acesso aberto ao sistema do RIC.

Esta solução não preconiza alterações de fundo às regras vigentes para o acesso ao

RIC, não exige assegurar esse acesso aos agentes de um eventual outsourcing e tem todas

as condições para ser validada pela Comissão de Protecção de Dados Pessoais, cujo

parecer, a ser validado este Relatório, deve, ainda assim, ser solicitado.

Neste domínio da externalização de procedimentos, considera-se muito relevante ponderar a

possibilidade de atribuir às forças de segurança a responsabilidade de assegurarem as

audições inerentes às diferentes fases do processo de contra-ordenações, designadamente

dos condutores infractores e das testemunhas arroladas em cada processo (aliás na prática

já se verifica esta situação em alguns dos distritos), bem como da competência para receber

e entregar os títulos de condução (nos casos em que estiver em causa a aplicação da

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sanção acessória de inibição de conduzir decidida pelo ANSR ou pelos tribunais), podendo

par o efeito integrar, como pessoal civil, funcionários que actualmente desempenham

funções nos serviços desconcentrados, isto atenta a previsível necessidade das forças de

segurança disporem de um reforço de pessoal.

E. DIMINUIÇÃO DO NÚMERO DE AUTOS DE CONTRA-ORDENAÇÃO – OBJECTIVO

TRANSVERSAL

Para lá da tarefa incumbida à Comissão nos termos melhor definidos em A. 2. deste Relatório –

identificar os problemas e estrangulamentos existentes e verificados no actual processo de

contra-ordenações por infracção ao CÓDIGO DA ESTRADA e, na sequência, a apresentação

de soluções capazes de reformular os procedimento – entendeu a Comissão aproveitar a

oportunidade para analisar o processo de contra-ordenações numa outra dimensão, desta

feita mais estrutural. Ou seja, para além de encontrar respostas para tratar melhor o actual

número de processos de contra-ordenação registados em cada ano, melhor ainda seria

poder encontrar soluções para tratar de forma mais expedita um número de processos

consideravelmente menor do que hoje se verifica existir.

Partindo deste desafio, a Comissão teria necessariamente que enquadrar as soluções a

imaginar, na condição que essas mesmas soluções não coloquem em crise a actual filosofia

subjacente ao estabelecimento das molduras previstas no Código da Estrada para cada uma

das infracções ao mesmo diploma legal. Pelo menos que essas soluções não contrariassem

o corpo nuclear dessa previsão legal, porquanto estaria a Comissão a formular respostas

que podem contrariar radicalmente a concepção de política de segurança rodoviária actual.

A Comissão entendeu não ser, de todo, essa a sua tarefa.

A Comissão definiu então como restrições à equação de iniciativas que contribuam para

a diminuição do número de autos de contra-ordenação registados em cada ano e que por

norma dão origem a defesa, as seguintes constatações:

1. Que a verdadeira pressão tendente a combater os comportamentos de risco

evidenciados pelos utentes da via e que pode ser exercida sobre o condutor

infractor, não se assegura tanto pela aplicação de coimas de valor elevado (por

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maior que seja) mas, antes pelo contrário, pela aplicação da sanção acessória de

inibição de conduzir;

2. Que um abrandamento da pressão sobre o condutor, seja em termos gerais, seja

apenas no domínio da inibição de conduzir, pode ter efeitos muito nefastos nos

índices de sinistralidade que têm vindo a descer de uma forma sustentada;

3. Que o número de autos não tem tendência a diminuir, especialmente tendo presente

a previsível implementação do projecto de instalação de radares digitais fixos, que,

em última instância, ao aumentarem a fiscalização, vão seguramente aumentar o

número de processo de contra-ordenação.

Assim, não sendo previsível que da definição de soluções que passem pela diminuição

da fiscalização ou da redução do grau de penalização resulte alguma vantagem para a

política de sinistralidade rodoviária, o desafio de diminuir sustentadamente o número de

autos de contra-ordenação verificados em cada ano, pode ser atingido, pelo menos no

médio prazo, pela formação da convicção nos cidadãos em geral e nos condutores em

particular, que o processamento dos autos de contra-ordenações é muito eficaz, é ágil, que

as decisões são bem preparadas tecnicamente e bem habilitadas do ponto de vista da

fundamentação, o que é assegurado, entre outras, pelas soluções aqui preconizadas por

exemplo para a notificação, para o mecanismo do “jurista virtual” e pelo sistema informático

único do processo.

Mais do que isso, esse objectivo será alcançado fazendo notar aos cidadãos que a

implementação dessas novas soluções vai permitir que os índices de prescrição de

processos seja cada vez menor e, passo a passo, até residual, aspecto que, atendendo à

convicção que a generalidade dos infractores hoje têm que o processo até pode prescrever

e portanto existem todos as razões para reclamar, pode ter resultados surpreendentes.

Não obstante, a Comissão ponderou uma inovação, que, sem prejuízo de necessitar de

melhor apreciação técnico-jurídica, inclusivamente com a colaboração de outros sectores da

administração pública, designadamente quanto ao valor e ao âmbito de aplicação (note-se

que foi intenção da Comissão manter a tarefa cingida, de momento, ao âmbito da tutela do

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MAI), pode surtir efeitos positivos e relevantes – a introdução de uma taxa administrativa a

pagar pelo infractor no momento da apresentação de defesa ou impugnação.

Esta solução, como foi dito atrás, necessita de ser melhor estudada do ponto de vista da

forma, mas pareceu à Comissão que, do ponto de vista substantivo, tem todo o cabimento,

até comparado com a prática seguida ao nível dos tribunais comuns, que como se sabe

serve em muitos aspectos de referência ao processo contra-ordenacional estradal.

Consideram os membros da Comissão que, num primeiro alcance, esta solução faria

com que os condutores infractores que tomam conhecimento de uma decisão administrativa

muito bem fundamentada ou que têm a consciência que cometeram essa mesma infracção

(por exemplo quando o excesso de velocidade ficou registado, ou quando a taxa de

alcoolemia foi mecanicamente verificada) e que hoje têm todas as razões para apresentar

defesa por não terem nada a perder e muito a ganhar (desde logo com a prescrição do

processo) possam ponderar de futuro sobre as verdadeiras vantagens de apresentar essa

defesa.

Isto na convicção de que seremos capazes de vir a ter um processamento de autos

muito mais eficaz que reduza significativamente os índices de prescrição e esse não seja

mais o móbil de apresentação de defesas pelos infractores.

Sem prejuízo do exposto, designadamente na parte inicial deste E., a Comissão está

disponível para, numa fase posterior e aferida superiormente a validade das soluções

preconizadas neste Relatório preliminar, avaliar novas soluções que possam estar para lá

das limitações que nos impusemos em matéria de política de segurança rodoviária, e vir a

explorar alterações mais radicais quanto à filosofia que hoje prevalece e, então sim, estudar

por exemplo a realidade de outros países, designadamente a verificada em Espanha que

utiliza o sistema habitualmente designado de “carta por pontos”.

F. PROPOSTAS

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Cumpre sintetizar as soluções enunciadas ao longo do Relatório, o que, em bom rigor, se traduz

verdadeiramente no conjunto de alterações que, merecendo a validação superior, serão introduzidas

no desenho do actual processo de contra-ordenações por infracção ao Código da Estrada e respectiva

legislação complementar:

Sistematizando as propostas de alteração ao actual processo contra-ordenacional

estradal que a Comissão preconiza, referimos:

1. Levantamento do auto de contra-ordenação

1.1. Implementação de um sistema automático de controlo que permita à autoridade

administrativa, acompanhar a distribuição do número de auto de contra-

ordenação (no caso do projecto “Polícia em Movimento”) ou do número dos

livros de autos (para o caso das unidades ainda não integradas no projecto

“Polícia em Movimento”)e pelas respectivas entidades fiscalizadoras: no primeiro

caso a solução passa por criar um automatismo próprio no sistema informático e

no segundo caso é resolúvel por assegurar o cruzamento de informação entre as

entidades fiscalizadoras e a autoridade administrativa no momento em que é

efectuada a requisição dos livros de autos à Imprensa Nacional Casa da Moeda;

1.2. No procedimento de identificação do condutor infractor, os autos de contra-

ordenação terão que ser preenchidos sem erros e sem comportarem omissões de

informação relevante: este desiderato pode ser alcançado com a implementação

de automatismos informáticos que permitam o preenchimento automático dos

campos em função da digitação de dados correlacionáveis (por exemplo, o

preenchimento automático do nome e morada através da digitação do número

de carta de condução);

1.3. Preenchimento com a máxima objectividade do campo referente à descrição

sumária da infracção que determina o levantamento do auto. Neste particular, é

necessário rever os mecanismos de correlação actualmente em uso entre o

código de infracção e a “descrição sumária” correspondente que é disponibilizada

ao agente, para que este edite e valide os factos objectivos que ocorreram.

2. Notificação (da infracção, da decisão administrativa e da decisão judicial):

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2.1. É premente valorizar junto dos condutores e dos proprietários dos veículos, a

importância da actualização do endereço registado nas bases de dados de

condutores e de veículos. Este objectivo será amplamente alcançado quando;

2.1.1. Forem facilitados os procedimentos administrativos a seguir pelo cidadão

permitindo o requerimento por Internet;

2.1.2. Esta correcção não representar despesa para o cidadão;

2.1.3. Quando a coima a pagar pelo não cumprimento da determinação legal de

proceder à alteração do endereço do título de condução, que já hoje é

obrigatória, seja incrementada para valores dissuasores;

2.1.4. Quando efectivamente a administração conseguir, através de

procedimentos claros, demonstrar ao cidadão que a não actualização do

endereço associado ao título de condução não representa um benefício,

como hoje é considerado, mas antes um prejuízo que pode ser penoso, em

função do cidadão se considerar notificado sempre que o for para o endereço

registado na base de dados dos condutores como sendo actual.

2.2. Ainda neste domínio, propõe-se introduzir na redacção do actual Código da

Estrada, no que concerne à alternativa actualmente concedida às pessoas

colectivas proprietárias de veículos (sistemas de “leasing” e “ALD”, empresas,

etc.) que não identificam condutores infractores ou que identificam condutores

residentes no estrangeiro ou ainda que identificam outras pessoas colectivas, de

procederem à permuta da eventual sanção de inibição de conduzir por igual

período de apreensão do veículo com que a infracção foi cometida, sendo que o

período de apreensão do veículo é multiplicado por um factor que seja entendido

como verdadeiramente dissuasor do recurso a esta opção.

2.3. Afigura-se claro que o acto da notificação beneficiará muito se o sistema

informático permitir a emissão automática da mesma através da introdução de

dados simplificados (matrícula do veículo infractor, data/hora e local da

infracção, código de infracção), no que será acompanhado da criação uma

ligação informática entre o sistema de envio de notificação registada (CTT) e o

sistema informático de gestão de autos de contra-ordenação, permitindo deste

modo a automatização total do processo.

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2.4. É necessário valorizar junto dos Tribunais a norma do Código da Estrada que

considera o cidadão notificado, quando após o envio, sem sucesso, de carta

registada com aviso de recepção, é enviada carta simples. Não raras vezes, os

Tribunais têm considerado não notificado o infractor que não assinou o aviso de

recepção, desvalorizando o Código da Estrada, em detrimento do Código do

Processo Penal, que diga-se, tem aplicação subsidiária ao processo de contra-

ordenações estradal.

3. Cobrança de autos de contra-ordenação:

3.1. No domínio das cobranças, impõe-se que seja desenvolvido no âmbito do

sistema informático de gestão de autos, um automatismo que proceda à ligação

entre a cobrança e o auto de contra-ordenação a que respeita. Esse cruzamento

de informação deve ser tão imediato quanto possível por forma a que o jurista

que está a preparar a decisão não proponha uma punição no pressuposto de

“não pago”, quando efectivamente a coima já se encontra liquidada pelo

cidadão. Para tanto, bastará que todas as entidades bancárias ou de gestão de

pagamentos intervenientes no processo de cobrança, enviem para o sistema

informático de gestão de autos, em formato digital, uma tabela com informação

relevante “n.º do auto – quantia paga – data de pagamento” e que esta seja

automaticamente assimilada por aquele, fazendo recair sobre o auto a

informação de liquidação da coima.

3.2. A fragilidade demonstrada hoje pelo sistema Multibanco, ao aceitar a digitação

de quantias não coincidentes com a efectiva quantia a liquidar pelo cidadão, será

ultrapassada se, no momento em que é produzida a notificação para pagamento

da coima, o próprio sistema informático de gestão de autos possa produzir uma

tabela “n.º de auto – quantia a liquidar – data limite de pagamento” que envia

automaticamente para a SIBS. Desta forma a liquidação do auto passa a ser feita

em sistema fechado, em tudo idêntico a outros modelos de pagamento via

Multibanco (água, electricidade, etc.);

3.3. O caso particular do processo de gestão das cauções de boa conduta, terá muito

a ganhar se o seu processamento vier a ser integrado no sistema informático de

gestão de autos.

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4. Registo de autos de contra-ordenação:

4.1. As dificuldades e estrangulamentos hoje verificados na fase de registo e

recepção dos autos de contra-ordenação, estarão consideravelmente resolvidas

se vier a ser adoptado um sistema informático de gestão de autos contínuo e

único, desde o momento do levantamento do auto até à eventual remessa do

processo para Tribunal, bem como com a integração de todas as bases de dados

que registam informação relevante para o processo contra-ordenacional.

Desse modo seria consideravelmente esbatido o efeito perturbador para o

processo que hoje representa o condicionalismo do funcionário que procede ao

registo do auto ter que consultar, com muita frequência, a base de dados dos

condutores e veículos para confirmação de dados e, no caso de erro ou omissão, o

auto ter que ser devolvido à entidade fiscalizadora para ser corrigido. O acesso

automático assegurado por um sistema informático único e contínuo pode

permitir ultrapassar este enorme condicionalismo.

4.2. Esta fase do processamento – registo do auto de contra-ordenação – que

actualmente é elaborada pela DGV, pode passar a ser da responsabilidade das

entidades fiscalizadoras sem incremento de trabalho.

5. Processamento contra-ordenacional

5.1. Relativamente ao processo contra-ordenacional em sentido estrito, propõe-se

que o mesmo assente num sistema informático poderoso, instalado em rede, que

permita o acesso de todos os intervenientes no processo, que integre todas as

bases de dados relevantes para o processo, que seja único ou pelo menos

contínuo desde o início até ao fim do processo (isto é, desde o levantamento do

auto, passando pela notificação, proposta e emissão de decisão, notificação da

decisão, análise do cumprimento da decisão, envio do processo a Tribunal,

processamento jurídico em Tribunal). Um sistema informático concebido nestes

termos, assente em automatismos de construção da decisão, composta em

função de “inputs” relevantes (liquidação da coima voluntária ou não,

apresentação de defesa ou não, etc), num princípio de “jurista virtual”, permitirá

certamente uma evolução consolidada na qualidade do processamento, uma

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redução dos recursos humanos e do tempo, na expectativa última de assegurar

uma redução muito significativa da taxa de prescrições que actualmente se

verifica.

5.2. No que respeita à audição de testemunhas, bem como a outras diligências do

processo de contra-ordenações, que exijam contacto presencial com os cidadãos,

a Comissão propõe que, para que se mantenha a qualidade dos serviços,

designadamente pelo critério de proximidade às populações, que sejam criados

postos de atendimento específicos para o processo contra-ordenacional, dotados

de um terminal com o sistema informático de gestão de autos e de recursos

humanos excedentes de outros serviços, atendendo a uma eventual

centralização do processo.

5.3. Com o processo de preparação da decisão apoiado pelo sistema informático

moldado nos termos propostos, irá verificar-se uma considerável redução dos

recursos humanos envolvidos no processo. Assim, e para obviar as questões de

desenquadramento actualmente sentidas quando intervêm simultaneamente

funcionários do quadro da DGV, avençados e funcionários em regime de

“outsourcing”, propõe-se que o processo de preparação da decisão seja

assegurado por contratação externa de serviços, sendo que a decisão, pela

responsabilidade que representa é assegurada por funcionários públicos a

exercer funções no âmbito da ANSR;

5.4. Todo o processo contra-ordenacional estradal deve ser centralizado na ANSR,

devendo ser eliminada a intervenção dos Governos Civis;

5.5. Produção de um Manual de Contra-ordenações Rodoviárias que, após aprovação

global, será cumprido por todos os protagonistas intervenientes no processo;

5.6. Centralização numa única unidade de todo o processo contra-ordenacional, que

será dotada de meios para proceder ao controlo e acompanhamento do processo

em termos jurídicos, informáticos e de processamento da cobrança. Deste modo

serão atenuados os casos de diluição de responsabilidade que hoje se verifica na

DGV, onde este processo é garantido por três direcções de serviço;

6. Processamento judicial

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6.1. No que concerne ao processo judicial desenvolvido nos Tribunais, a Comissão

sentiu algumas dificuldades em encontrar soluções.

Tendo noção do grau de inovação que encerra, propõe-se como determinante

para a melhoria do processo, a criação de foros específicos de direito rodoviário,

pelo menos nas Comarcas Distritais, garantindo-se melhores condições de

informatização ao nível dos tribunais envolvidos, integrando-os no circuito único e

informatizado autoridade administrativa – autoridade judicial.

A criação destes foros judiciais específicos, permitiria um melhor entrosamento

entre a autoridade administrativa e autoridade judicial, obviando assim alguns

erros processuais actualmente cometidos de parte a parte, através do

desenvolvimento de reuniões sistemáticas entre os responsáveis das duas

entidades. Por esta via, eventuais erros processuais sistemáticos cometidos a

montante do processo judicial seriam discutidos e corrigidos atempadamente, ao

contrário do que acontece agora, onde a autoridade administrativa só reage em

função de sentenças de arquivamento por erro processual. De igual forma,

situações como a consideração por parte do poder judicial de arguido não

notificado, mesmo quando a autoridade administrativa cumpriu todos os

procedimentos previsto na lei, poderiam ser imediatamente corrigidos.

6.2. Na impossibilidade da implementação desta medida, a Comissão preconiza o

desenvolvimento de conversações de nível político com o Ministério da Justiça

para, pelo menos, se procurar uma simplificação de procedimentos no envio dos

processos para Tribunal, no sentido de prescindir do envio das peças

documentais em original e aceitar a remessa do processo em cópias produzidas

pelos sistemas informáticos e de documentos digitalizados. Deste modo seria

possível cumprir o grande objectivo de se eliminar o arquivo em suporte papel no

processo contra-ordenacional estradal.

G. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Comissão entendeu ter como tarefa, definir soluções capazes de reformular o processo de

contra-ordenações estradais, designadamente a produção de um novo desenho, tendo

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especialmente em conta a existência de mais do que um actor nesse processo e as

particularidades daqui resultantes e a capacidade que essas soluções possam representar

para um procedimento mais expedito, mais prático e funcional, e que, desde logo,

combatessem os índices de prescrição de todo desmobilizadores do efeito pretendido sobre

os condutores infractores.

Foi propósito da Comissão indicar caminhos e definir soluções que se afigurem viáveis,

ciente contudo que, a serem as mesmas patrocinadas superiormente no âmbito da decisão politica,

será com toda a certeza muito pertinente que se verifique o tratamento mais pormenorizado das

especificidades inerentes à implementação de cada uma delas. Tais tarefas podem ser asseguradas

por uma comissão de execução, a quem poderá ser incumbida a missão de operacionalizar e integrar

cada solução.

Desde logo é muito relevante que seja assegurado um casamento perfeito entre o

desenvolvimento das soluções de natureza jurídica e as soluções de natureza informática que devem

conjugar as respectivas especificidades de forma milimétrica.

Mais pretende a Comissão, disponibilizar-se para, se assim superiormente for entendido como

vantajoso e pertinente, assegurar o acompanhamento periódico do processo de implementação das

medidas que preconiza no seu Relatório, fazendo o respectivo “follow up” quanto ao grau de sucesso

do processo.