autolesão: a dor psíquica impressa no corpo
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Trabalho de Conclusão de Curso da aluna Márcia Valadares Trevisan para obtenção do título de especialista em Saúde Mental para Equipes Multiprofissionais sob coordenação do Prof. Hewdy Lobo Ribeiro e orientação da Profa. Ana Carolina Schmidt de Oliveira.TRANSCRIPT
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UNIVERSIDADE PAULISTA
MÁRCIA VALADARES TREVISAN
AUTOLESÃO:
A DOR PSÍQUICA IMPRESSA NO CORPO
SÃO PAULO
2015
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MÁRCIA VALADARES TREVISAN
AUTOLESÃO:
A DOR PSÍQUICA IMPRESSA NO CORPO
Trabalho de conclusão de curso paraobtenção do título de especialista em SaúdeMental para Equipes Multiprofissionais,apresentado à Universidade Paulista - UNIP.
Orientadores:
Prof a. Ana Carolina S. de Oliveira
Prof. Hewdy L. Ribeiro
SÃO PAULO
2015
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MÁRCIA VALADARES TREVISAN
AUTOLESÃO
A DOR PSÍQUICA IMPRESSA NO CORPO
Trabalho de conclusão de curso para obtenção dotítulo de especialista em Saúde Mental paraEquipes Multiprofissionais, apresentado àUniversidade Paulista - UNIP.
Orientadores:
Prof a. Ana Carolina S. de Oliveira
Prof. Hewdy L. Ribeiro
Aprovado em:
BANCA EXAMINADORA
_______________________/__/___
Prof. Hewdy Lobo Ribeiro
Universidade Paulista – UNIP
_______________________/__/___
Profa. Ana Carolina Schmid Oliveira
Universidade Paulista – UNIP
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DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho ao meu pai, pela sua escuta e apoio.
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AGRADECIMENTOS
Ao Prof. Dr. Hewdy Lobo Ribeiro, pela sua contribuição, dedicação,
orientação e empenho no sentido de proporcionar uma formação de qualidade.
À Prof.ª Ana Carolina S. de Oliveira, pela sua orientação, disponibilidade,
contribuição e determinação em disseminar conteúdos acadêmicos relevantes.
Aos meus familiares.
Aos amigos que são família.
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EPÍGRAFE
“O poeta é um fingidor. Finge tão completamente. Que chega a
fingir que é dor. A dor que deveras sente.”
(Fernando Pessoa)
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RESUMO
Esta revisão bibliográfica reúne informações referentes ao tema da Autolesão.
Os dados foram encontrados em três estudos brasileiros publicados no período de
2010 a 2013; foram incluídas as modificações classificatórias introduzidas pelo
DSM-5 (APA, 2014) sobre este assunto. A autolesão também é chamada de
automutilação ou escarificação. Este fenômeno consiste em provocar vários tipos de
lesões no próprio corpo, com instrumentos cortantes, perfurantes, entre outros; sem
ter como objetivo consciente o suicídio. Os sujeitos relatam que sentem alívio
enquanto realização as lesões, o que permite inferir a existência de uma dorpsíquica. A conexão entre a dor psíquica e a dor física, e suas manifestações são
investigadas a partir dos fundamentos psicanalíticos apresentados pelos autores das
pesquisas e complementadas com as informações encontradas na POA –
Psicoterapia de Orientação Analítica (2015).
Palavras- chave: Autolesão, Automutilação, Escarificação.
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ABSTRACT
This literature review gathers information on the topic of self-injury. The datafound in three Brazilian studies published in the 2010-2013 period; They wereincluded in the qualifying changes made by the DSM-5 (APA, 2014) on this subject.The self-injury is also called self-mutilation or scarification. This phenomenon is tocause several types of lesions in the body, with sharp, piercing instruments, amongothers; without conscious goal as suicide. The subjects report that they feel reliefwhile conducting the lesions, which allows us to infer the existence of a psychic pain.
The connection between the psychic pain and physical pain, and its manifestationsare investigated from the psychoanalytic arguments presented by the authors of theresearch and complemented with the information found in the POA - AnalyticPsychotherapy.
Key-words: Self-Injury, Self-Mutilation, Scarification
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO......................................................................................... 12
1.1 Outros Conceitos.............................................................................. 13
1.2 A Dor Psíquica é Real........................................................................ 14
2 OBJETIVO ............................................................................................... 16
3 METODOLOGIA...................................................................................... 17
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO............................................................... 18
5 CONCLUSÕES........................................................................................ 24
REFERÊNCIAS ........................................................................................ 26
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1 INTRODUÇÃO
Esta revisão bibliográfica reuniu informações de três estudos publicados; no
período de 2010 a 2015, referentes ao tema: Autolesão Não Suicida, também
denominada Automutilação e ou Escarificação; incluiu as modificações do
diagnóstico diferencial apontadas pelo DSM-5 (APA, 2014), bem como relacionou a
ligação entre a dor psíquica e a dor física através dos fundamentos encontrados na
POA – Psicoterapia de Orientação Analítica (2015).
Abordado no DSM-5, Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais
(APA, 2014), na Seção III “Condições para Estudos Posteriores”, o tema da
Autolesão Não Suicida é a indicação da presença deste sintoma nas atuais
demandas da saúde mental. Suas características diagnósticas são descritas como
comportamento repetitivo de provocar lesões superficiais em seu próprio corpo
intentando abrandar os sentimentos negativos e a falta de integração social. Alguns
indivíduos relatam sentir o ato como uma punição merecida e a maioria usufruir de
uma espécie de alívio imediato. Objetos afiados, agulhas, ponta de cigarro aceso,borracha, são alguns dos instrumentos utilizados com frequência. Durante um
mesmo processo é possível que o sujeito realize um conjunto de ferimentos
paralelos superficiais, com simetria de um ou dois centímetros, geralmente no dorso
do antebraço ou nas coxas. A utilização de vários métodos para gerar a lesão
denota psicopatologia agravada e pode incluir tentativas de suicídio. Quanto à
prevalência, enquanto no transtorno de comportamento suicida para o sexo feminino
e masculino ocorre a proporção aproximada de 3:1 ou 4:1, na autolesão não suicidaos gêneros se aproximam. A autolesão não suicida não está classificada pelo DSM-
5 como sintoma do transtorno borderline, se diferenciando no comportamento
colaborativo dos pacientes e estudo de neurotransmissores.
Este trabalho justificou-se por cooperar com a produção de conhecimento na
área acadêmica. Sua relevância esta em destacar a voz do sujeito que vivencia o
fenômeno, revelando algumas de suas necessidades e fomentando a discussão
sobre as várias formas de se compreender os sintomas. A contribuição social está
em munir os multiprofissionais da saúde com novos dados, que podem ser
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expandidos a todos agentes transformadores. Do aspecto Científico, o estudo
justificou-se pela escassez de publicações, a crescente demanda e a urgência de
propostas terapêuticas.
1.1 Outros Conceitos
Automutilação e escarificação são diferentes formas de nomear o mesmo
fenômeno.
Jatobá (2010) discorre sobre a escarificação na adolescência e salienta que
escarificar é apenas uma subcategoria da automutilação (apud FAVAZZA, 2007;LUCA, 2006). A autora adverte sobre a necessidade de uma escuta clínica para um
diagnóstico diferencial, demonstrando a prática frequente de diagnóstico de
transtorno de personalidade borderline para adolescentes que escarificam o corpo.
Pondera sobre a fase de desenvolvimento do adolescente, suas necessidades
adaptativas e as angústias naturais vivenciadas durante esse período da vida. “A
nosso ver, a escarificação é um fenômeno que pode estar presente tanto nos casos
de psicose como de neurose, necessitando ser avaliada e tratada de acordo com
cada caso”. “É em função dessas questões que a psicanálise considera de
fundamental importância o diagnóstico diferencial, uma vez que o mesmo fenômeno
pode aparecer em estruturas diferentes” (JATOB Á, pg. 40).
Cedaro e Nascimento (2013) descrevem a Automutilação como ato intencional
de se machucar, podendo ter uma intensidade superficial, moderada ou profunda,
sem ideação suicida consciente. Sendo que através de cortes, beliscões,
espancamentos, mordidas entre outras formas de agredir o próprio corpo, procuram
alivio. Os autores afirmam que publicações recentes demonstram que o ato de se
automutilar se manifesta em diferentes faixas etárias, havendo uma frequência maior
entre os adolescentes, principalmente do sexo feminino (apud ARCOVERDE e
AMAZONAS, 2011; DINAMARCO, 2011; WITHLOCK, POWERS, e ECKENRODE,
2006).
Segundo o Manual Clínico dos Transtornos do Controle dos impulsos os fatoresde risco referentes à automutilação são descritos como: abusos na infância;
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separação parental; conflitos familiares; convivência com outro praticante de
autolesão; abuso de drogas; ter sofrido de bulling; sintomas relativos à depressão,
impulsividade, ansiedade e autoestima reduzida; ideação ou tentativa de suicídio.
(apud, WHITLOCK; ECKENRODE; SILVERMAN, 2006; YSTGAARD et. al. 2003).
1.2 A Dor Psíquica é Real
Presentes no fenômeno da Autolesão Não Suicida estão à dor física e a dor
psíquica. A primeira sentida como boa, suave, enquanto a outra, insuportável
precisa se materializar, encontrar uma forma de expressão, de manifestação para
que a angústia cesse mesmo que momentaneamente.
Descrita por Henriques et al. (2015) a nocicepção é a recepção através do
sistema nervoso de um estímulo possivelmente danoso, sendo que este pode ser
térmico, químico ou mecânico. A percepção da nocicepção está relacionada a
fatores culturais, ao contexto, ao gênero entre outros, devendo ser analisada como
uma emoção e não apenas como uma sensação. Se existe uma sensação
experimentada como dor, seja de origem orgânica, hipocondríaca, alucinatória ououtras, há dor real.
Conforme Henriques et. al. (2015) as estruturas neurais sofrem transformações
morfológicas e funcionais, após um estado doloroso persistente. Estudos realizados
em relação à percepção de membro fantasma indicam alterações organizacionais no
córtex primário somatossensorial. A dor intensa provoca mudanças neuroplásticas,
modificando a função inicial da dor, que deixa de ser apenas sinalizadora de uma
ameaça e persiste desestabilizando o indivíduo. De igual maneira o cérebro associa
as experiências psicológicas de estresse e afeto as suas estruturas captadoras de
estímulos dolorosos, enviando informações às estruturas cerebrais supras
segmentares, responsáveis por fazer a ligação da vivencia de desprazer e aversão
aos estímulos nociceptivo. Dessa forma o sujeito pode reconhecer o desprazer
promovido pelo estresse como uma dor física e não psíquica, ocorrendo uma
dificuldade de interpretação.
Nas observações de Dinamarco (2011) sobre a dor encontramos seus fatores
biológicos, determinando-a como primeira percepção do corpo, quando esse se
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encontra prejudicado em seu funcionamento. Dessa forma o corpo que padeceu
devido a um trauma físico mobiliza seu funcionamento na tentativa de retornar ao
estado de equilíbrio que existia antes da dor. Os demais processos do corpo estarão
em segundo plano. Para a autora mesmo que a dor psíquica seja insuportável,
havendo um dano físico, o organismo voltará sua atenção na decisão de corrigir a
lesão física e a dor psíquica ficará em suspenso momentaneamente. Depreendendo
assim que ao cortar a pele o sujeito encontraria uma forma de se poupar do
enfrentamento psíquico.
Ao refletir sobre esses dados é possivel compreender que a despeito da
afirmativa do sujeito de sentir-se aliviado enquanto realiza as lesões em seu corpo,
as quais são consideradas superficiais, o fenômeno não pode ser banalizado, uma
vez que está associado à intensa dor psíquica.
Conforme De Lara (2012), quando a angústia se apresenta, é combatida pelos
mecanismos de defesa e pelos sintomas. Porém o indivíduo percebe suas
perturbações e o processo mental envolvido, com o agravamento deste quadro os
mecanismos defensivos podem diminuir a tomada de consciência.
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2 OBJETIVOS
Esta revisão bibliográfica objetiva: reunir informações sobre o tema da Autolesão
Não Suicida, destacar as modificações nosológicas entradas no DSM-5 (APA, 2014)
a respeito deste assunto, fomentar a discussão sobre a importância de se identificar
o fenômeno e dar voz a dor psíquica do sujeito.
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3 METODOLOGIA
O material utilizado no presente estudo foi obtido através de busca na base
Lilacs, e no Google Acadêmico. Para tanto os descritores determinados foram: Autolesão, Automutilação e Escarificação; os filtros aplicados foram: psicologia,
período de 2010 a 2015 e português. Apenas três publicações se enquadravam no
perfil de interesse e consistiram como fonte de informação. Como complemento a
estes dados e objetivando atualizar as informações foram inseridas as modificações
do diagnóstico diferencial encontradas no DSM-5 (APA, 2014). Após cuidadosa
leitura do material, seus dados foram relacionados e fundamentados através da
teoria psicanalítica encontrada em acervo pessoal.
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4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
A partir do material encontrado nas publicações utilizadas como referência, o
conteúdo foi relacionado às novas informações do DSM-5 (APA 2014) e ampliadocom a Psicoterapia de Orientação Analítica (2015).
Cedaro e Nascimento (2013) determinaram como metodologia a análise dos
depoimentos de três jovens, do sexo feminino, nas idades que compreendem 15 a
21 anos de idade. As pacientes foram atendidas no CAPS – Centro de Atenção
Psicossocial, após praticarem automutilação. Registros colhidos no setting
terapêutico apresentam discursos de raiva, de culpa, de prazer, de afastamento
social e prejuízo nas relações familiares. Revelaram que uma adolescente, aos 13anos de idade, sentindo o ímpeto de agredir alguém, não o faz, prefere provocar a
autolesão; outra paciente sente conforto ao ver seu sangue escorrer, tentando
escapar das sensações de angústia e fracasso; a terceira jovem relata alívio durante
a automutilação e incomodo posterior, explica que esse fenômeno sempre esteve
presente em sua vida, bloqueando afetos, limitando e que durante o ato inventa
outra pessoa que aparece e vive.
Analisando estes depoimentos, Cedaro e Nascimento (2013) descreveram a
essência melancólica como uma dor auto erótica, que faz o sujeito entrar em
conflito, enquanto experimenta pensamentos de amor, ódio e culpa ao mesmo
tempo. O gozo na autolesão deriva da impossibilidade de resistir a um Supereu
demasiadamente severo; sendo que a autopunição serve como método para vingar-
se dos objetos originais, torturando seus afetos através do ganho secundário de sua
doença sem agredi-los diretamente Freud “Luto e Melancolia” (1917, apud).
Em Dinamarco (2011) encontramos outra forma de compreender o mesmo
fenômeno. Em conformidade com o método qualitativo fenomenológico, a autora
colheu os dados através da observação dos relatos e declarações nos perfis de uma
comunidade do Orkut denominada: Comunidade Self-Mutilation Addicts, após esta
coleta destacou tópicos e relacionou a automutilação ao período contemporâneo.
Dinamarco (Ibid) elegeu 31 integrantes, que iniciaram a comunidade em
15/11/2004; faixa etária de 19 a 34 anos de idade; 34% pertencendo ao sexofeminino e 66% ao sexo masculino; 90% já completaram ou estavam próximos de
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completar o ensino médio. Os números foram levantados nas publicações dos
membros, nas datas de 15/11/2004 e 12/12/2008; os dados retirados da Home,
pertencem ao período de 12/12/2004 a 12/12/2008.
Freud (1907) em “Atos obsessivos e prática religiosa” compreende os detalhes,
como sendo o sagrado, em rituais de pacientes descritos como neuróticos
obsessivos. As informações encontradas na Comunidade Self- Mutilation Addicts
demonstraram que alguns participantes ouvem música clássica durante o ritual de
execução das autolesões, enquanto outros atuam movidos por um forte impulso.
Sentimentos de satisfação, desprezo à humanidade, superação de limites e até
apreço a “arte de se mutilar”, são desvelados (DINAMARCO, 2011).
De acordo com Adriana Dinamarco (2011) a escolha dos objetos lesivos; a
presença de música ou silêncio; a escolha da parte do corpo que receberá o corte; a
profundidade; o formato; além da previsão de possíveis suspensões do ato, devido à
presença de terceiros, são sintomas de ritos realizados de forma inconsciente. Cada
detalhe ritualístico tem um significado para o sujeito, parecem estar impregnados de
culpa e experiências vivenciadas pela mente infantil.
Participantes da comunidade do Orkut fazem uma reflexão sobre seus atos, um
deles comenta que não vê as autolesões como punição, experimenta prazer e afirma
que faz os cortes por estética, acredita que são belos; outro membro da comunidade
explica que não pensa como o colega, não faz por estética nem exibe as lesões, faz
para se sentir vivo e sair de uma espécie de tédio. Diante desta contradição a autora
da pesquisa argumenta sobre os possíveis atos inconscientes que não são
compreendidos pelos sujeitos da pesquisa (DINAMARCO, 2011).
Para a pesquisadora estas postagens permitem compreender os indivíduos e o
fenômeno no momento sócio histórico em que estão inseridos; uma sociedade que
induz a exibição de um corpo ideal, a ostentação e a falta de encontrar um
significado para a sua vida. Algumas psicopatologias e sintomas estão relacionados
à sociedade em que se manifestam (apud FREUD 1930). Adriana Dinamarco
realizou ainda, um estudo a respeito dos livros e filmes relacionados pelos
integrantes da comunidade Self-Mutilation Addicts. Considerou que as escolhas
podem refletir os possíveis questionamentos dos participantes em relação à
sociedade que marginaliza o sujeito, a solidão, a busca de um sentido para a vida e
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um ideal de autoimagem que consiga se destacar da grande massa (DINAMARCO,
2011).
A proposta de Jatobá (2010) foi dissertar sobre a escarificação a partir de suaexperiência clínica e do estudo de um caso. Como método a pesquisadora
selecionou trechos do discurso de uma paciente, articulando-os com a teoria
psicanalítica. A pesquisa diverge de Dinamarco (2011) optando por focar a
singularidade do sujeito investigado sem, no entanto, relaciona-lo ao contexto sócio
histórico.
A jovem chegou ao consultório da pesquisadora levada por seus pais, após
perfurar o antebraço com a ponta de um compasso, meses antes. Diagnosticadacom Transtorno de Personalidade Borderline, havia a necessidade do diagnóstico
psicanalítico, realizado sob o processo transferencial, a fim de se evitar o
diagnóstico-relâmpago, promovendo a escuta e o diagnóstico diferencial (Jatobá,
2010).
Segundo Jatobá (2010) a jovem sente angústia diante da separação do outro e
do chamado a sexualidade. Não encontra espaço de expressão no meio familiar, se
posicionando como objeto sexual em suas relações afetivas. Ao descrever o ato de
autolesão, a jovem comenta que não sente a dor do corte e que se livra de uma dor
ainda maior, deixando em seu corpo uma marca que retrata o mapa de seu
sofrimento. Realiza as lesões no antebraço com a finalidade de poder optar por
mostra-las ou esconde-las. Em casa não retira o sangue da pia do banheiro, nem
esconde as marcas de seus cortes, explicando que escarificar-se é a única maneira
que encontra para ser escutada.
Esses dados corroboram com Cedaro e Nascimento (2013) salientando a
dificuldade de interação familiar e a utilização do fenômeno como forma indireta de
expor a angústia, o sofrimento, o isolamento, perante a família.
Quanto aos instrumentos utilizados durante as autolesões as três pesquisas
convergem para ferramentas perfurantes ou cortantes, tais como: estilete, gilete,
compasso. Os dados referentes à faixa etária dos pesquisados apontam pequenas
divergências: Jatobá (2010), Cedaro e Nascimento (2013) estudam o período que
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compreende a adolescência e a juventude, enquanto Dinamarco (2011) elege
participantes do Orkut com idades que compreende o período dos 19 aos 34 anos.
Como conclusão de seu trabalho Jatobá (2010) faz observações referentes aomomento vivido pelo adolescente, sua necessidade de lidar com as demandas
sexuais, de se responsabilizar por suas escolhas. Salienta que após submeter-se a
análise, a paciente conseguiu perceber os possíveis motivos que influenciavam seus
atos. Para a autora o ser humano é um ser de linguagem e o ato de escarificar pode
denotar uma forma de tentar comunicar o indizível, o inominável, o desejo de
contornar simbolicamente o embate com o real.
Segundo Bulgarão (2011) a clínica contemporânea vê surgir um aumento dasdoenças da alma, a cultura não oferece a mediação simbólica suficiente, ocorre uma
diminuição do poder da expressão através da palavra e a não contenção da
violência pulsional (apud Kristeva, 2002; Minerbo, 2009).
Dinamarco (2011) observou o grupo Self-Mutilation Addict , primeira comunidade
brasileira sobre automutilação, encontrada na internet. A pesquisadora compreende
que a sociedade contemporânea cobra do sujeito uma diferenciação. Exige um
corpo perfeito ou modificado e a ostentação de suas aquisições. A autora conclui
que o indivíduo é invadido pelo ditame social, fazendo com que não haja uma
barreira entre seu corpo e a sociedade. O prazer relatado ao efetuar os cortes pode
advir de um ganho secundário, uma tentativa de desviar a dor psíquica para a dor
física, de sentir o corpo como possibilidade de existência. Percebendo-se misturado
e ferindo seu próprio corpo, o sujeito também fere o outro e vinga-se. O sintoma
fundido ao corpo deixa de ser rejeitado e através de sua dimensão ritualística insere
uma marca de pertencimento, uma satisfação erótica e solitária.
Em consonância Gaspar (2010) explica que para que o sujeito se constitua é
preciso um movimento reflexivo. O sujeito deve ser investido libidinalmente pelo
outro, possibilitando assim um espaço para que ele se perceba como indivíduo
separado, estabelecido.
Em Cedaro e Nascimento (2013) a análise parte da teoria de Freud (1917) sobre
a melancolia, segundo os autores as jovens sofrem com a separação, com a perdado objeto de amor. Ocorre uma falha na superação do narcisismo primário, o sujeito
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não consegue direcionar as pulsões para os objetos ou ideais e volta-os para si. As
autolesões representariam um masoquismo primário submetido a um superego
tirânico ou ao gozo materno. As pacientes estariam presas em uma atmosfera
melancólica, de perigo e satisfação, provocando alívio e indiretamente lançando um
pedido de socorro.
A Autolesão Não Suicida recebeu destaque no DSM-5 (APA,2014) Manual
Diagnóstico E Estatístico de Transtornos Mentais, inserida na seção III - “Condições
para Estudos Posteriores” evidencia a necessidade de novas pesquisas e reafirma
que o ato de provocar lesões no próprio corpo não é critério determinante para o
diagnóstico do Transtorno de Personalidade Borderline. Estes dados podem ser
relacionados com os comentários disponíveis em Jatobá (2010). A autora
questionou o fato de que a jovem, sujeito de seu estudo, recebeu o diagnóstico de
Transtorno de Personalidade Borderline, enquanto vivenciava o estado de
desenvolvimento da adolescência e as angústias demandadas por essa fase. Em
seu trabalho, que utilizava os dados do DSM-IV (APA, 2002) a época, destacou que
alguns critérios para o diagnóstico, segundo o manual, eram automutilação,
escarificação e queimaduras. O diagnóstico diferencial alertava para a necessidade
de se observar o período de desenvolvimento, antes de se diagnosticar estrutura de
personalidade.
Atualmente encontramos no Diagnóstico Diferencial o seguinte texto:
Embora com frequência associado, o transtorno da personalidade borderline
não é invariavelmente encontrado em indivíduos com autolesão não suicida. As duas condições diferem em vários aspectos. Indivíduos com transtorno dapersonalidade borderline com frequência manifestam comportamentosperturbados agressivos e hostis, enquanto a autolesão não suicida está maisassociada a fases de proximidade, comportamentos colaborativos erelacionamentos positivos. Em um nível mais fundamental, existem diferençasno desenvolvimento de sistemas diferentes de neurotransmissores, masestas não serão aparentes ao exame clínico (DSM-5, 2015, p.805).
É possível compreender, portanto, que existe uma importância significativa em
fomentar novas reflexões e estudos sobre o fenômeno da Autolesão Não Suicida.
Atentando para o fato de que o sujeito apresenta sua subjetividade de maneira
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dinâmica, seu diagnóstico deve ser dinâmico e referenciado por atualizações
constantes.
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5 CONCLUSÕES
Os Resultados encontrados convergem para os seguintes fatores: oconflito psíquico do sujeito; a falta de consciência a respeito de suas
motivações para realizar o ato de se lesionar; a dor psíquica sendo impressa
no corpo, com a intensão de buscar alívio emocional; o prejuízo das relações
familiares e sociais.
Quanto as possíveis causas, elas parecem estar intimamente ligadas ao
processo dinâmico e subjetivo do sujeito. Sendo assim, tão singular, quanto
multifatorial.
É possível observar através das pesquisas estudadas, que para as
famílias, o fenômeno desperta dúvidas e preocupação. Para os sujeitos
pesquisados, alívio, dúvidas, angústia, prazer, culpa, excitação,
pertencimento de grupo, entre outros sentimentos.
Como foi destacado pelo DSM-5 (APA, 2014) ainda não é possível definir
o fenômeno como sintoma de transtorno de personalidade borderline, como
uma síndrome à parte, uma falha no desenvolvimento, entre outros. São
necessárias as coletas de novos dados.
Nas mãos dos diversos profissionais envolvidos, devem estar às
ferramentas de informação, destinadas ao sujeito, às famílias e a sociedade
em geral; promovendo espaços de reflexão, diluindo a banalização da dor
psíquica.
O adoecimento envolve a família, a sociedade, as relações; sendo
importante que a informação, a escuta e que possíveis terapêuticas cheguem
a todos.
Riesenberg-Malcolm (2004) salienta a contribuição da psicanálise na
terapêutica através da postura do analista. O profissional recebe a
comunicação do paciente e a modifica para uma forma possível de ser
compreendida. De posse deste conteúdo o sujeito pode melhorar suas
relações objetais. (apud BION, 1962).
Diante do exposto é possível notar à relevância de um diagnóstico
diferencial e da atenção necessária ao sujeito que vivencia uma dor psíquicatão intensa, que acaba por se materializar sendo impressa no corpo.
7/21/2019 Autolesão: a Dor Psíquica Impressa no Corpo
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Em forma de camuflagem, a dor permanece, sua comunicação é falha,
está escondida carecendo de espaço para ser interpretada e elaborada. A
psicoterapia é um caminho possível para esta escuta.
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REFERÊNCIAS
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RIESENBERG-MALCOLM, Ruth, Suportando Estados Mentais Insuportáveis, Riode Janeiro, Imago Editora, 2004.