as bases neurocientÍficas do desenvolvimento humano
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Memória e Aprendizagem
Memória são todos os fatos, eventos, emoções e desempenhos que recordamos, sendo alguns por curtos períodos, outros
para toda vida. Apesar de vivenciarmos situações juntamente com demais indivíduos que nos cerca, nossas memórias serão
diferentes, pois cada um possui sua individualidade.
Izquierdo (2011) em seus estudos voltados à memória refere-se a ela como,Aquisição, formação, conservação e evocação de
informações. A aquisição é também chamada de aprendizado ou aprendizagem: só “grava” aquilo que foi aprendido.
A evocação é também chamada de recordação, lembrança, recuperação. Só lembramos aquilo que gravamos, aquilo que foi
aprendido.[...] O acervo de nossas memórias faz com que cada um de nós seja o que é: um indivíduo, um ser para o qual não
existe outro idêntico. (IZQUIERDO, 2011, p. 11)
Casos de falhas de memória são frequentes, mas na maioria das vezes são relapsos, contudo com o avançar da idade a falta
de estimulação adequada e/ou surgimento de doenças neurológicas fazem com que a memória se torne mais debilitada.
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Não existe nenhuma área cerebral individual dedicada a armazenar toda a informação que aprendemos. A memória de
trabalho (presente na memória de curta duração) armazena no cérebro informação consciente por um curto período de
tempo. O armazenamento passivo de maior quantidade de informação é designado memória de longa duração.
Lembramos que também existem as falsas memórias...
FALSAS MEMÓRIAS - por vezes nosso cérebro estabelece memórias que são falsas na sua origem, normalmente porque
um evento é interpretado de maneira errada.
Memória que se imaginou (esperou ver) e não do que de fato esteve (algo parecido e confundido).
Também podem ser criadas durante o que parece ser uma recordação (pessoa está convencida que algo aconteceu, pode
reformular o evento a partir de esboços de outras memórias e então vivenciá-la como se fosse uma recordação “real”).
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No campo educativo, voltado às descobertas da Neurociência, Sprenger (2008) cita 7 passos
essenciais para o ensino da memória, tornando a aprendizagem mais significativa, segunda a autora “A
memória é um processo que requer repetição, e é a memória que proporciona o nosso retorno no
tempo”.
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DIFICULDADES NA MEMÓRIA
Assim como existem crianças que tem dificuldades para responder ou perceber adequadamente
os estímulos, existem outras que tem dificuldade para guardá-los na memória de trabalho e depois
utilizar a informação. Nas estratégias utilizadas é importante considerar:
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Além disso, ressaltamos disso ressaltamos as atividades propostas no quadro abaixo, procurando
desenvolver a qualidade da memória e melhorar a retenção.
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Também, dentro da perspectiva das propostas de GÓMEZ & TERÁN, apresentadas nos quadros anteriores, enfatizamos
algumas atividades que desenvolvem a Memória Visual...
ESTRATÉGIAS PARA MELHORAR A QUALIDADE DA MEMÓRIA VISUAL
• Apresentar às crianças objetos de uso comum, por exemplo, um carro, uma xícara, um lápis, etc. São apresentados a
ela os objetos e pede-se a ela que abra os olhos, em seguida feche os olhos. Escondem-se os objetos, pede-se a ela que abra
os olhos e os nomeie. Isto pode complicar-se progressivamente com um maior número de objetos com a idade da criança.
• Utilizar fotos ou ilustrações de objetos familiares começando com duas ilustrações e chegando até cinco. Pede-se a ela
que nomeie os objetos da esquerda para a direita, retiram-se as ilustrações e pede-se à criança que nomeie na mesma ordem.
• O mesmo exercício anterior, porém somente apresentando as ilustrações em separado sem nomeá-las. Pede-se à
criança que as memorize e ao final nomeie os objetos apresentados.
Apresenta-se á criança uma série de cartões com linhas verticais coloridas. A progressão cresce com um número maior de
linhas verticais e de cores utilizadas. Pede-se a ela que reproduza a sequência com palitos coloridos ou de forma gráfica com
as cores correspondentes. É importante mencionar que deve ter atenção à sequência correta das cores.
• Colocar cinco objetos em fila sobre a mesa do professor. Pode-se aos alunos que retenham a ordem na qual estão
posicionados os objetos. Ao entrar, a criança que estava fora tem que adivinhar qual objeto foi mudado de lugar. É
importante ter em conta a idade para a quantidade de objetos que são colocados.
• Apresentar, durante um determinado tempo, ilustrações geométricas e pedir à criança que reproduza cada cartão.
• Apresentar ilustrações com letras. Pede-se que depois as reproduza no papel. A quantidade de letras pode ir
aumentando de acordo com a idade.
• Apresentar uma figura durante uns segundos. Mostrar a seguir uma ilustração onde a figura está representada junto a
outras de categoria mais ou menos próxima. Pedir que identifique a figura observada. Podem ser utilizadas figuras
geométricas, números, letras, sinais de trânsito, notas musicais, etc. A complexidade do exercício varia de acordo com as
figuras utilizadas para identificação, a similaridade com outras figuras da ilustração e o tempo de exposição.
• Pedir-lhe que desenhem ou escrevam de memória os objetos da sala de aula, o que observaram no caminho de uma
sala até outra, no caminho de casa, etc.
• Sete alunos colocam-se em frente à classe. Pede-se ao restante do grupo que os observem e memorizem seus colegas:
seu penteado, como estão vestidos, etc. Depois de um minuto de observação o grupo de crianças saem da sala e mudam
entre elas seus sapatos, relógios, penteados, bonés, jaquetas, etc. Em seguida voltam a entrar na sala e pede-se ao grupo que
digam as mudanças que ocorreram.
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Referências Bibliográficas:
ABREU, Neander; MATTOS, Paulo. Memória. In: MALLOY-DINIZ, Leandro F. AVALIAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA. Porto Alegre: Artmed, 2010.
ERNÉ, Silvio A. O exame do estado mental do paciente. In: CUNHA, Jurema Alcides. PSICODIAGNÓSTICO V. Porto Alegre: Artmed, 2000.
GÓMEZ, Ana Maria S.; TERÁN, Nora Espinosa. Dificuldades de aprendizagem: detecção e estratégias de ajuda. EQUIPE CULTURAL (trad.). Brasil: Cultural, S.A.
IZQUIERDO, Iván. Memória. 2 ed. Porto Alegre: Artmed, 2011.
MARSHALL, Jessica. Esquecer para lembrar. Mente e cérebro. São Paulo: Duetto, ano XV, nº 183, abril, 2008.
PINTO, Graziela Costa. O livro do cérebro 3: memória, pensamento e consciência. São Paulo: Duetto, 2009.
PINTO, Graziela Costa. O livro do cérebro 4: envelhecimento e disfunções. São Paulo: Duetto, 2009.
SPRENGER, Marilee. Memória: Como ensinar para o aluno lembrar. São Paulo: Penso, 2008.
A Teoria das Inteligências Múltiplas e suas implicações para Educação
Autora: Maria Clara S. Salgado Gama - Doutora em Educação Especial pela Universidade de Colúmbia, Nova
Iorque
No início do século XX, as autoridades francesas solicitaram a Alfredo Binet que criasse um instrumento pelo
qual se pudesse prever quais as crianças que teriam sucesso nos liceus parisienses. O instrumento criado por
Binet testava a habilidade das crianças nas áreas verbal e lógica, já que os currículos acadêmicos dos liceus
enfatizavam, sobretudo o desenvolvimento da linguagem e da matemática. Este instrumento deu origem ao
primeiro teste de inteligência, desenvolvido por Terman, na Universidade de Standford, na Califórnia: o
Standford-Binet Intelligence Scale.
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Subsequentes testes de inteligência e a comunidade de psicometria tiveram enorme influência, durante este
século, sobre a ideia que se tem de inteligência, embora o próprio Binet (Binet & Simon, 1905 Apud Kornhaber
& Gardner, 1989) tenha declarado que um único número, derivado da performance de uma criança em um teste,
não poderia retratar uma questão tão complexa quanto a inteligência humana. Neste artigo, pretendo apresentar
uma visão de inteligência que aprecia os processos mentais e o potencial humano a partir do desempenho das
pessoas em diferentes campos do saber.
As pesquisas mais recentes em desenvolvimento cognitivo e neuropsicologia sugerem que as habilidades
cognitivas são bem mais diferenciadas e mais específicas do que se acreditava (Gardner, I985). Neurologistas
têm documentado que o sistema nervoso humano não é um órgão com propósito único nem tão pouco é
infinitamente plástico. Acredita-se, hoje, que o sistema nervoso seja altamente diferenciado e que diferentes
centros neurais processem diferentes tipos de informação (Gardner, 1987).
Howard Gardner, psicólogo da Universidade de Hervard, baseou-se nestas pesquisas para questionar a
tradicional visão da inteligência, uma visão que enfatiza as habilidades linguística e lógico-matemética. Segundo
Gardner, todos os indivíduos normais são capazes de uma atuação em pelo menos sete diferentes e, até certo
ponto, independentes áreas intelectuais. Ele sugere que não existem habilidades gerais, duvida da possibilidade
de se medir a inteligência através de testes de papel e lápis e dá grande importância a diferentes atuações
valorizadas em culturas diversas. Finalmente, ele define inteligência como a habilidade para resolver problemas
ou criar produtos que sejam significativos em um ou mais ambientes culturais.
A teoria
A Teoria das Inteligências Múltiplas, de Howard Gardner (1985) é uma alternativa para o conceito de
inteligência como uma capacidade inata, geral e única, que permite aos indivíduos uma performance, maior ou
menor, em qualquer área de atuação. Sua insatisfação com a ideia de QI e com visões unitárias de inteligência,
que focalizam, sobretudo as habilidades importantes para o sucesso escolar, levou Gardner a redefinir
inteligência à luz das origens biológicas da habilidade para resolver problemas. Através da avaliação das
atuações de diferentes profissionais em diversas culturas, e do repertório de habilidades dos seres humanos na
busca de soluções, culturalmente apropriadas, para os seus problemas, Gardner trabalhou no sentido inverso ao
desenvolvimento, retroagindo para eventualmente chegar às inteligências que deram origem a tais realizações.
Na sua pesquisa, Gardner estudou também: (a) o desenvolvimento de diferentes habilidades em crianças normais
e crianças superdotadas; (b) adultos com lesões cerebrais e como estes não perdem a intensidade de sua
produção intelectual, mas sim uma ou algumas habilidades, sem que outras habilidades sejam sequer atingidas;
(c ) populações ditas excepcionais, tais como idiot-savants e autistas, e como os primeiros podem dispor de
apenas uma competência, sendo bastante incapazes nas demais funções cerebrais, enquanto as crianças autistas
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apresentam ausências nas suas habilidades intelectuais; (d) como se deu o desenvolvimento cognitivo através
dos milênios.
Psicólogo construtivista muito influenciado por Piaget, Gardner distingue-se de seu colega de Genebra na
medida em que Piaget acreditava que todos os aspectos da simbolização partem de uma mesma função
semiótica, enquanto que ele acredita que processos psicológicos independentes são empregados quando o
indivíduo lida com símbolos linguísticos, numéricos gestuais ou outros. Segundo Gardner uma criança pode ter
um desempenho precoce em uma área (o que Piaget chamaria de pensamento formal) e estar na média ou mesmo
abaixo da média em outra (o equivalente, por exemplo, ao estágio sensório-motor).
Gardner descreve o desenvolvimento cognitivo como uma capacidade cada vez maior de entender e expressar
significado em vários sistemas simbólicos utilizados num contexto cultural, e sugere que não há uma ligação
necessária entre a capacidade ou estágio de desenvolvimento em uma área de desempenho e capacidades ou
estágios em outras áreas ou domínios (Malkus e col., 1988). Num plano de análise psicológico, afirma Gardner
(1982), cada área ou domínio tem seu sistema simbólico próprio; num plano sociológico de estudo, cada
domínio se caracteriza pelo desenvolvimento de competências valorizadas em culturas específicas.
Gardner sugere, ainda, que as habilidades humanas não são organizadas de forma horizontal; ele propõe que se
pense nessas habilidades como organizadas verticalmente, e que, ao invés de haver uma faculdade mental geral,
como a memória, talvez existam formas independentes de percepção, memória e aprendizado, em cada área ou
domínio, com possíveis semelhanças entre as áreas, mas não necessariamente uma relação direta.
As inteligências múltiplas
Gardner identificou as inteligências linguística, lógico-matemática, espacial, musical, cinestésica, interpessoal e
intrapessoal. Postula que essas competências intelectuais são relativamente independentes, têm sua origem e
limites genéticos próprios e substratos neuroanatômicos específicos e dispõem de processos cognitivos próprios.
Segundo ele, os seres humanos dispõem de graus variados de cada uma das inteligências e maneiras diferentes
com que elas se combinam e organizam e se utilizam dessas capacidades intelectuais para resolver problemas e
criar produtos. Gardner ressalta que, embora estas inteligências sejam, até certo ponto, independentes uma das
outras, elas raramente funcionam isoladamente. Embora algumas ocupações exemplifiquem uma inteligência, na
maioria dos casos as ocupações ilustram bem a necessidade de uma combinação de inteligências. Por exemplo,
um cirurgião necessita da acuidade da inteligência espacial combinada com a destreza da cinestésica.
Inteligência linguística: Os componentes centrais da inteligência linguística são uma sensibilidade para os sons,
ritmos e significados das palavras, além de uma especial percepção das diferentes funções da linguagem. É a
habilidade para usar a linguagem para convencer, agradar, estimular ou transmitir idéias. Gardner indica que é a
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habilidade exibida na sua maior intensidade pelos poetas. Em crianças, esta habilidade se manifesta através da
capacidade para contar histórias originais ou para relatar, com precisão, experiências vividas.
Inteligência musical: Esta inteligência se manifesta através de uma habilidade para apreciar, compor ou
reproduzir uma peça musical. Inclui discriminação de sons, habilidade para perceber temas musicais,
sensibilidade para ritmos, texturas e timbre, e habilidade para produzir e/ou reproduzir música. A criança
pequena com habilidade musical especial percebe desde cedo diferentes sons no seu ambiente e, frequentemente,
canta para si mesma.
Inteligência lógico-matemática: Os componentes centrais desta inteligência são descritos por Gardner como
uma sensibilidade para padrões, ordem e sistematização. É a habilidade para explorar relações, categorias e
padrões, através da manipulação de objetos ou símbolos, e para experimentar de forma controlada; é a habilidade
para lidar com séries de raciocínios, para reconhecer problemas e resolvê-los. É a inteligência característica de
matemáticos e cientistas Gardner, porém, explica que, embora o talento cientifico e o talento matemático possam
estar presentes num mesmo indivíduo, os motivos que movem as ações dos cientistas e dos matemáticos não são
os mesmos. Enquanto os matemáticos desejam criar um mundo abstrato consistente, os cientistas pretendem
explicar a natureza. A criança com especial aptidão nesta inteligência demonstra facilidade para contar e fazer
cálculos matemáticos e para criar notações práticas de seu raciocínio.
Inteligência espacial: Gardner descreve a inteligência espacial como a capacidade para perceber o mundo visual
e espacial de forma precisa. É a habilidade para manipular formas ou objetos mentalmente e, a partir das
percepções iniciais, criar tensão, equilíbrio e composição, numa representação visual ou espacial. É a
inteligência dos artistas plásticos, dos engenheiros e dos arquitetos. Em crianças pequenas, o potencial especial
nessa inteligência é percebido através da habilidade para quebra-cabeças e outros jogos espaciais e a atenção a
detalhes visuais.
Inteligência cinestésica: Esta inteligência se refere à habilidade para resolver problemas ou criar produtos
através do uso de parte ou de todo o corpo. É a habilidade para usar a coordenação grossa ou fina em esportes,
artes cênicas ou plásticas no controle dos movimentos do corpo e na manipulação de objetos com destreza. A
criança especialmente dotada na inteligência cinestésica se move com graça e expressão a partir de estímulos
musicais ou verbais demonstra uma grande habilidade atlética ou uma coordenação fina apurada.
Inteligência interpessoal: Esta inteligência pode ser descrita como uma habilidade pare entender e responder
adequadamente a humores, temperamentos motivações e desejos de outras pessoas. Ela é melhor apreciada na
observação de psicoterapeutas, professores, políticos e vendedores bem sucedidos. Na sua forma mais primitiva,
a inteligência interpessoal se manifesta em crianças pequenas como a habilidade para distinguir pessoas, e na sua
forma mais avançada, como a habilidade para perceber intenções e desejos de outras pessoas e para reagir
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apropriadamente a partir dessa percepção. Crianças especialmente dotadas demonstram muito cedo uma
habilidade para liderar outras crianças, uma vez que são extremamente sensíveis às necessidades e sentimentos
de outros.
Inteligência intrapessoal: Esta inteligência é o correlativo interno da inteligência interpessoal, isto é, a
habilidade para ter acesso aos próprios sentimentos, sonhos e idéias, para discriminá-los e lançar mão deles na
solução de problemas pessoais. É o reconhecimento de habilidades, necessidades, desejos e inteligências
próprias, a capacidade para formular uma imagem precisa de si própria e a habilidade para usar essa imagem
para funcionar de forma efetiva. Como esta inteligência é a mais pessoal de todas, ela só é observável através
dos sistemas simbólicos das outras inteligências, ou seja, através de manifestações linguísticas, musicais ou
cinestésicas.
O desenvolvimento das inteligências
Na sua teoria, Gardner propõe que todos os indivíduos, em princípio, têm a habilidade de questionar e procurar
respostas usando todas as inteligências. Todos os indivíduos possuem, como parte de sua bagagem genética,
certas habilidades básicas em todas as inteligências. A linha de desenvolvimento de cada inteligência, no
entanto, será determinada tanto por fatores genéticos e neurobiológicos quanto por condições ambientais. Ele
propõe, ainda, que cada uma destas inteligências tem sua forma própria de pensamento, ou de processamento de
informações, além de seu sistema simbólico. Estes sistemas simbólicos estabelecem o contato entre os aspectos
básicos da cognição e a variedade de papéis e funções culturais.
A noção de cultura é básica para a Teoria das Inteligências Múltiplas. Com a sua definição de inteligência como
a habilidade para resolver problemas ou criar produtos que são significativos em um ou mais ambientes
culturais, Gardner sugere que alguns talentos só se desenvolvem porque são valorizados pelo ambiente. Ele
afirma que cada cultura valoriza certos talentos, que devem ser dominados por uma quantidade de indivíduos e,
depois, passados para a geração seguinte.
Segundo Gardner, cada domínio, ou inteligência, pode ser visto em termos de uma seqüência de estágios:
enquanto todos os indivíduos normais possuem os estágios mais básicos em todas as inteligências, os estágios
mais sofisticados dependem de maior trabalho ou aprendizado.
A seqüência de estágios se inicia com o que Gardner chama de habilidade de padrão cru. O aparecimento da
competência simbólica é visto em bebês quando eles começam a perceber o mundo ao seu redor. Nesta fase, os
bebês apresentam capacidade de processar diferentes informações. Eles já possuem, no entanto, o potencial para
desenvolver sistemas de símbolos, ou simbólicos.
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O segundo estágio, de simbolizações básicas, ocorre aproximadamente dos dois aos cinco anos de idade. Neste
estágio as inteligências se revelam através dos sistemas simbólicos. Aqui, a criança demonstra sua habilidade em
cada inteligência através da compreensão e uso de símbolos: a música através de sons, a linguagem através de
conversas ou histórias, a inteligência espacial através de desenhos etc.
No estágio seguinte, a criança, depois de ter adquirido alguma competência no uso das simbolizações básicas,
prossegue para adquirir níveis mais altos de destreza em domínios valorizados em sua cultura. À medida que as
crianças progridem na sua compreensão dos sistemas simbólicos, elas aprendem os sistemas que Gardner chama
de sistemas de segunda ordem, ou seja, a grafia dos sistemas (a escrita, os símbolos matemáticos, a música
escrita etc.). Nesta fase, os vários aspectos da cultura têm impacto considerável sobre o desenvolvimento da
criança, uma vez que ela aprimorará os sistemas simbólicos que demonstrem ter maior eficácia no desempenho
de atividades valorizadas pelo grupo cultural. Assim, uma cultura que valoriza a música terá um maior número
de pessoas que atingirão uma produção musical de alto nível.
Finalmente, durante a adolescência e a idade adulta, as inteligências se revelam através de ocupações
vocacionais ou não vocacionais. Nesta fase, o indivíduo adota um campo específico e focalizado, e se realiza em
papéis que são significativos em sua cultura.
Teoria das inteligências múltiplas e a educação
As implicações da teoria de Gardner para a educação são claras quando se analisa a importância dada às diversas
formas de pensamento, aos estágios de desenvolvimento das várias inteligências e à relação existente entre estes
estágios, a aquisição de conhecimento e a cultura.
A teoria de Gardner apresenta alternativas para algumas práticas educacionais atuais, oferecendo uma base para:
(a) o desenvolvimento de avaliações que sejam adequadas às diversas habilidades humanas (Gardner & Hatch,
1989); Blythe Gardner, 1 990) (b) uma educação centrada na criança com currículos específicos para cada área
do saber (Konhaber & Gardner, 1989); Blythe & Gardner, 1390) (c) um ambiente educacional mais amplo e
variado, e que dependa menos do desenvolvimento exclusivo da linguagem e da lógica (Walters & Gardner,
1985; Blythe & Gardner, 1990)
Quanto à avaliação, Gardner faz uma distinção entre avaliação e testagem. A avaliação, segundo ele, favorece
métodos de levantamento de informações durante atividades do dia-a-dia, enquanto que testagens geralmente
acontecem fora do ambiente conhecido do indivíduo sendo testado. Segundo Gardner, é importante que se tire o
maior proveito das habilidades individuais, auxiliando os estudantes a desenvolver suas capacidades intelectuais,
e, para tanto, ao invés de usar a avaliação apenas como uma maneira de classificar, aprovar ou reprovar os
alunos, esta deve ser usada para informar o aluno sobre a sua capacidade e informar o professor sobre o quanto
está sendo aprendido.
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Gardner sugere que a avaliação deve fazer jus à inteligência, isto é, deve dar crédito ao conteúdo da inteligência
em teste. Se cada inteligência tem um certo número de processos específicos, esses processos têm que ser
medidos com instrumento que permitam ver a inteligência em questão em funcionamento. Para Gardner, a
avaliação deve ser ainda ecologicamente válida, isto é, ela deve ser feita em ambientes conhecidos e deve utilizar
materiais conhecidos das crianças sendo avaliadas.
Este autor também enfatiza a necessidade de avaliar as diferentes inteligências em termos de suas manifestações
culturais e ocupações adultas específicas. Assim, a habilidade verbal, mesmo na pré-escola, ao invés de ser
medida através de testes de vocabulário, definições ou semelhanças, deve ser avaliada em manifestações tais
como a habilidade para contar histórias ou relatar acontecimentos. Ao invés de tentar avaliar a habilidade
espacial isoladamente, deve-se observar as crianças durante uma atividade de desenho ou enquanto montam ou
desmontam objetos. Finalmente, ele propõe a avaliação, ao invés de ser um produto do processo educativo, seja
parte do processo educativo, e do currículo, informando a todo momento de que maneira o currículo deve se
desenvolver.
No que se refere à educação centrada na criança, Gardner levanta dois pontos importantes que sugerem a
necessidade da individualização. O primeiro diz respeito ao fato de que, se os indivíduos têm perfis cognitivos
tão diferentes uns dos outros, as escolas deveriam, ao invés de oferecer uma educação padronizada, tentar
garantir que cada um recebesse a educação que favorecesse o seu potencial individual. O segundo ponto
levantado por Gardner é igualmente importante: enquanto na Idade Média um indivíduo podia pretender tomar
posse de todo o saber universal, hoje em dia essa tarefa é totalmente impossível, sendo mesmo bastante difícil o
domínio de um só campo do saber.
Assim, se há a necessidade de se limitar a ênfase e a variedade de conteúdos, que essa limitação seja da escolha
de cada um, favorecendo o perfil intelectual individual.
Quanto ao ambiente educacional, Gardner chama a atenção pare o fato de que, embora as escolas declarem que
preparam seus alunos pare a vida, a vida certamente não se limita apenas a raciocínios verbais e lógicos. Ele
propõe que as escolas favoreçam o conhecimento de diversas disciplinas básicas; que encoragem seus alunos a
utilizar esse conhecimento para resolver problemas e efetuar tarefas que estejam relacionadas com a vida na
comunidade a que pertencem; e que favoreçam o desenvolvimento de combinações intelectuais individuais, a
partir da avaliação regular do potencial de cada um.
Referências
Blythe, T.; Gardner, H. A school for all intelligences. Educational Leadership, v.47, n.7, p.33-7, 1990.
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Gardner, H.; Giftedness: speculation from a biological perspective. In: Feldman, D.H. Developmental
approaches to giftedness and creativity. São Francisco, 1982. p.47-60.
Gardner, H.Frames of mind. New York, Basic Books Inc., 1985.
Gardner, H. The mind's new science. New York, Basic Books Inc., 1987.
Gardner. H.;Hatcb, T. Multiple intelligences go to school: educational implications of the theory of Multiple
Intelligences. Educational Researcher, v.18, n.8. p.4-10, 1989.
Kornhaber, M.L.; Gardner, H. Critical thinking across multiple intelligences. Trabalho apresentado durante a
Conferência "The Curriculum Redefined. Paris, 1989.
Malkus, U.C.; Feldman, D.H.; Gardner, H. Dimensions of mind in early childhood. In: Pelegrini, A. (ed.)The
psychological bases for early education Chichester, Wilev. 1988, p.25-38.
Walter,J.M.; Gardner, H. The theory of multiple intelligences: some issues and answers. In: Stemberg, RJ.;
Wagner, R.K. (ed.) Pratical intelligence: nature and origins of competence in the every world.. Cambridge.
Cambridge University Press, p.163-82 © 1998 Trait Tecnologia Ltda.
Entrevista com Howard Gardner
Múltiplas inteligências Para o psicólogo americano Howard Gardner, criador da teoria das habilidades múltiplas,
a predisposição genética e as experiências vividas na infância podem favorecer nossos “computadores mentais”.
Em sua opinião, é mais importante estimular do que medir os recursos mentais por Daniele Fanelli O ser humano
tem muitos tipos de inteligência. A hipótese do psicólogo Howard Gardner, formulada em 1982, o tornou
conhecido mundialmente. Passados 25 anos, ele sustenta haver, além das reconhecidas habilidades linguística e
lógico-matemática, outras seis formas de inteligência: espacial (mais presente em navegantes e engenheiros);
corporal-cinestésica (desenvolvida em atletas ou dançarinos); interpessoal (representada pela capacidade de
compreensão dos sentimentos do outro); intrapessoal (expressa pelo autoconhecimento); naturalística (referente
à relação da pessoa com a natureza) e musical. Professor da Universidade Harvard, Gardner é considerado um
dos “demolidores” do conceito de quociente de inteligência (QI). Suas teorias, entretanto, têm pequena aceitação
entre neurobiólogos. Resenha publicada recentemente na revista Educacional Psychologist menciona a
insuficiência de comprovação empírica. A possibilidade de medir a inteligência pela aplicação de testes simples
parece ser um critério para validação das hipóteses.
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Artigo publicado em 2004 pela revista Nature Neuroscience relacionava o desenvolvimento de competências a
fatores socioeconômicos e a aspectos biológicos como dimensões do cérebro, duração da memória de curto
prazo, velocidade de transmissão sináptica e metabolismo neuronal. No mesmo ano foi observada correlação
entre o QI de bebês e a velocidade de crescimento do córtex cerebral. Tais descobertas não parecem perturbar o
prolífico Gardner, que tem sua teoria aplicada com eficácia em escolas de todo o mundo. Nesta entrevista, ele
declara-se mais interessado em estimular virtudes e talentos humanos do que em medi-los.
Mente & Cérebro: O senhor poderia resumir sua teoria da inteligência múltipla?
Howard Gardner: A visão tradicional a respeito da inteligência, que prevalece há centenas de anos, sustenta que
em nosso cérebro existe um único computador, de capacidade muito geral. Quando funciona bem, a pessoa é
inteligente e capaz de destacar-se em qualquer atividade. Se o desempenho for apenas razoável, o portador
consegue resultado satisfatório em diversas circunstâncias. Mas se funcionar mal, o dono desse equipamento é
um tolo, incapaz de estabelecer relações coerentes. Discordo disso tudo. Creio que a relação cérebro-mente pode
ser descrita como um conjunto de oito ou nove sistemas distintos de elaborações fundamentais. Um deles pode
atuar muito bem enquanto outro apresenta rendimento mediano e um terceiro funciona mal.
Qualquer observador admitiria que na patologia há fenômenos que sustentam minha hipótese. Existem pessoas
dotadas de grande talento artístico ou com habilidade para números e xadrez que, no entanto, são incapazes de
compreender os outros e manter relacionamentos. A medicina oficial as considera casos patológicos, mas eu
sustento que esses fenômenos são normais.
Múltiplas inteligências Para o psicólogo americano Howard Gardner, criador da teoria das habilidades múltiplas,
a predisposição genética e as experiências vividas na infância podem favorecer nossos “computadores mentais”.
Em sua opinião, é mais importante estimular do que medir os recursos mentais por Daniele Fanelli
[continuação]
M & C: Vejamos um exemplo: como o senhor avalia a sua mente?
Gardner: Com base na teoria da inteligência múltipla eu sou, certamente, do tipo lingüístico-musical. Minha
lógica é boa, mas jamais fará de mim um matemático. Fisicamente não sou nada especial e sou medíocre na
inteligência espacial, mas me viro bem com um mapa. A inteligência interpessoal, diferentemente de outras,
pode ser melhorada. Assim, espero continuar aprimorando minha capacidade de compreender outros.
M&C:Uma das principais objeções à sua teoria é a impossibilidade de medir as oito formas de
inteligência.
Gardner: Se eu estivesse de fora observando meu trabalho, é provável que dissesse a mesma coisa. Trata-se de
uma crítica bem razoável. Mas estou certo de que, se minhas idéias forem um dia levadas a sério, algum
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pesquisador desenvolverá instrumentos capazes de medir as várias inteligências. Mas para mim isso jamais foi
uma prioridade. Não me dediquei ao tema. Robert J. Sternberg [pai da teoria “triárquica”, segundo a qual a
inteligência se manifesta em três modalidades distintas: analítica, criativa e prática] tentou fazê-lo no âmbito de
sua pesquisa, mas os resultados não me pareceram muito convincentes. Posso deduzir que ou suas teorias são
equivocadas, ou medir as diversas inteligências humanas é tarefa mais complicada do que parece.
M&C: Mas a psicometria clássica faz medições. As pontuações que a pessoa obtém nos diversos testes
verbais e lógicos estão correlacionadas, o que sugere a existência de uma inteligência “geral”. O QI está
vinculado a diversos parâmetros biológicos. O que o senhor pensa sobre isso?
Gardner: Levo a sério essa questão e, se tivesse de reescrever meu livro sobre a inteligência múltipla, trataria
mais do tema. Mas há fenômenos que esses estudos não explicam, em particular as razões que nos tornam tão
diferentes uns dos outros. Um cientista pode passar a vida tentando acumular provas da existência de uma
inteligência geral, mostrando como esta se correlaciona a este ou aquele fator; ou pode tentar explicar por que as
pessoas têm habilidades tão diversas, quais as causas dessas diferenças e a que servem.
M&C: Mas as duas coisas não se contradizem. Podemos fazer uma analogia com os músculos do corpo,
que se desenvolvem de forma desigual em cada pessoa. Isso não impede que algumas pessoas possuam –
graças à combinação de genes, alimentação e exercícios físicos – estrutura muscular bem mais
desenvolvida e potente que outras. Nem todos podem se tornar um Schwarzenegger. O que vale para os
músculos não poderia valer para os neurônios?
Gardner: Tenho a mente aberta em relação à questão. Caso eu viva mais 30 ou 40 anos e a ciência identifique
uma propriedade biológica fundamental – por exemplo, a velocidade de transmissão nervosa ou a plasticidade
das conexões entre os neurônios – que explique uma parte maior ou menor das diferenças de inteligência, estarei
pronto a rever meu pensamento.
Múltiplas inteligências Para o psicólogo americano Howard Gardner, criador da teoria das habilidades múltiplas,
a predisposição genética e as experiências vividas na infância podem favorecer nossos “computadores mentais”.
Em sua opinião, é mais importante estimular do que medir os recursos mentais por Daniele Fanelli
[continuação]
Mas isso não esclarece as razões para alguém ser mais capaz em certos setores que em outros. A resposta pode
ser simplesmente que a vida humana não é infinita, e, portanto, não podemos ser excelentes em tudo. Penso que
a explicação mais plausível esteja na predisposição genética e nas experiências infantis capazes de “estimular” e
potencializar um dos computadores mentais de que dispomos. Um gênio poliédrico como Leonardo da Vinci é
exceção, e não regra. E devemos explicar ainda a origem das diferenças nos perfis e talentos.
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M &C: O senhor usa os termos “inteligência” e “talento” como sinônimos. Mas, para a maioria das
pessoas, esses termos se referem a conceitos bem distintos.
Gardner: De fato. Mas, ao privilegiar o termo “inteligências” em vez de “talentos” ou “habilidades”, fiz um
movimento retórico importante. Todos reconhecem a existência de diferentes talentos e habilidades humanas, e
provavelmente eu não estaria aqui sendo entrevistado se tivesse usado essas palavras em vez de “inteligências”.
M&C: O que o senhor entende por inteligência?
Gardner: O ponto é que a definição de inteligência não é óbvia. Trata-se de algo debatido por estudiosos e leigos.
Segundo minha análise, os pesquisadores orientados pela cultura escolástica se concentraram nas habilidades
verbais e lógicas, denominando as “inteligências”. É uma questão de retórica e linguística. Não é “a” resposta
correta. As pessoas com bom desempenho em línguas e lógica são, em geral, bons alunos, e nós as classificamos
inteligentes. Nada tenho contra isso, desde que se fale em “inteligência escolástica”. Se, porém, sairmos da
escola e estudarmos a inteligência de arquitetos, bailarinos ou comerciantes descobriremos que podem ser
excelentes naquilo que fazem, independentemente do desempenho escolar. Se os homens de negócio tivessem
inventado o QI, a avaliação mediria, provavelmente, atitude em relação a risco, iniciativa e capacidade de
vender. Nenhuma dessas coisas é medida pelos testes clássicos de inteligência.
M&C: Mas isso não ameaça relativizar o conceito de inteligência, esvaziando-o de seu significado intuitivo
e científico?
Gardner: A ciência não deve, necessariamente, reforçar o senso comum, muitas vezes equivocado. Minhas
pesquisas, além disso, atingem o campo das ciências sociais, diferentes da física ou da biologia, justamente
porque devem sempre elucidar os próprios conceitos, propondo definições novas e mais adequadas. O filósofo
Bertrand Russell disse certa vez que as idéias de todos os grandes pensadores podem ser resumidas em uma ou
duas frases: o que os torna notáveis é a estrutura argumentativa que criaram para sustentar as afirmações e
defendê-las das críticas. Se eu transmitir às pessoas apenas o conceito de que, além da escolástica, existem
outras formas de inteligência, já será um enorme progresso. Creio que já alcancei algo nesse sentido. Mas Daniel
Goleman conseguiu ainda mais, pois seu conceito de “inteligência emocional” tem apelo intuitivo, aludindo às
experiências do cotidiano, sobretudo no mundo do trabalho. O gerente de uma empresa pode ter a mente
perfeitamente organizada e revelar-se um desastre para motivar funcionários. A diferença entre nossas pesquisas
é que estabeleci oito critérios a serem atendidos por uma suposta inteligência (ver quadro na pág. 36).
M&C: Há poucos anos o senhor identificou a existência de uma oitava inteligência, a naturalística. Pensa
em acrescentar outras?
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Gardner: Escrevi bastante a respeito da possibilidade de uma inteligência moral. Até há pouco tempo era cético
quanto a isso, mas mudei de idéia depois de algumas leituras, em particular o livro escrito pelos neurobiólogos
Jean-Pierre Changeaux e Antonio Damásio. Avalio a possibilidade de uma inteligência existencial, mas o
problema é saber se é diferente de qualquer outra capacidade filosófica. Se não for, poderá ser explicada pelas
inteligências lingüística e lógica. As provas nesse sentido ainda não são conclusivas.
M&C:Haveria em nosso DNA genes que a seleção natural favoreceu, proporcionando assim a inteligência
naturalística ou a existencial?
Gardner: Certamente. Há genes para a inteligência naturalística e, provavelmente, para todas as formas de
inteligência que menciono. Creio, porém, que cada um desses tipos possui subcomponentes. Na inteligência
linguística, por exemplo, não haveria só um gene, mas centenas. Alguns deles podem predispor às línguas
estrangeiras, outros, à poesia e assim por diante. Mas se dissesse em meus livros que há 500 inteligências,
ninguém me levaria a sério.
M&C: Falemos de seu último livro, Five minds for the future. O senhor descreve com precisão as cinco
mentes que devemos desenvolver para viver na futura sociedade: sintética, respeitosa, ética, disciplinada e
criativa. Que mentes não deveríamos cultivar?
Gardner: Ninguém me havia feito esta pergunta até agora. No livro falo, sobretudo, do mau uso que se pode
fazer de cada tipo de mente. Temo particularmente e penso que não deveríamos cultivar a mente
fundamentalista, aquela determinada a não mudar de idéia sobre as coisas. É uma postura muito mais comum do
que pensamos. Basta perguntar a alguém se recentemente mudou de idéia a respeito de algo. Provavelmente dirá
que sim, mas se pedirmos um exemplo, terá dificuldade em responder. Sem perceber, nos aferramos facilmente a
nossas convicções.
M&C: Permita-me uma provocação. O que o senhor diz é sem dúvida correto. Qualquer um concordaria
que é bom ser mais disciplinado, respeitoso, razoável e assim por diante. Qual é, assim, a novidade da
mensagem de seu livro?
Gardner: É uma pergunta legítima. Objetivamente, há aspectos da natureza humana sobre os quais é difícil hoje
dizer algo de original. Esses temas, entretanto, devem ser reapresentados para cada nova geração de forma que
lhe pareçam compreensíveis e sensatos. Creio ser importante fazer isso, sobretudo porque hoje se fala da mente
quase que apenas do ponto de vista cognitivo. Em vez disso, eu falo de respeito, ética e educação em um sentido
mais clássico. Não deveria valer apenas a nota tirada na prova de matemática, mas o tipo de ser humano que nos
revelamos. Em segundo lugar, é verdade que o respeito sempre foi considerado qualidade desejável, mas na era
da globalização, num mundo em que os povos podem facilmente se destruir, trata-se de algo indispensável.
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M&C: Por qual de seus estudos o senhor gostaria de ser lembrado no futuro?
Gardner: Sou conhecido como “o fulano da bizarra ideia sobre inteligência”, mas gostaria que as pessoas
recordassem a pesquisa sobre ética profissional que realizo há 15 anos e que se tornou um estudo sobre a
confiança. Não sei se no futuro me darão crédito em relação a esse trabalho, mas não importa, pois estou
totalmente convencido de que é indispensável. O domínio cultural exercido pelo mercado nos Estados Unidos
está arruinando o que há de mais precioso no ser humano. Os americanos acabarão por destruir a si mesmos e
provavelmente ao mundo, pois ignoram qualquer aspecto da vida que não seja comercializável. E porque pensam
que, se fizerem uma prece todo domingo de manhã, terão indulto para arruinar qualquer habitante do planeta nos
outros seis dias e meio.
Estudando a ética e o sentimento de confiança, gostaria de chamar atenção para coisas antes importantes que
hoje não têm mais valor. De fato, a pergunta que você me fez é equivocada. A correta seria: por que as coisas de
que falo, que todos deveriam saber foram esquecidas?
OITO CRITÉRIOS PARA DEFINIR TALENTOS
1. Ser isolável em casos de lesão cerebral;
2. Ser desenvolvida em autistas “eruditos”, prodígios ou indivíduos excepcionais;
3. Basear-se em uma (ou mais) série de operações identificáveis;
4. Atingir níveis diversos de competência identificáveis em todo indivíduo;
5. Ter história evolutiva plausível;
6. Ser apoiada por dados da psicologia experimental;
7. Ser apoiada por provas de psicometria;
8. Ser codificável em um sistema de símbolos.
Daniele Fanelli é jornalista científica – Tradução de Doris Cavallari.
Para conhecer mais: Five minds for the future. Howard Gardner. Harvard Business School Press,
2006.Inteligências múltiplas: a teoria na prática. Howard Gardner. Artmed, 2000.
A matemática na educação infantil – A teoria das inteligências múltiplas na prática escolar. Kátia Smole.
Artmed, 2000.
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Distúrbios Motores :a) Relacionados à posição do Corpo:
Falta permanente de atenção ; Falta de respostas quando se fala com o aluno; Necessidade de falar muito alto para que o aluno entenda;
Cifose ou Corcunda- O indivíduo, ao invés de manter a posição ereta do corpo, pende a região torácica para trás e a cabeça para frente.
Lordose- O indivíduo encurva a região lombar para a frente.Escoliose- O indivíduo pende a coluna para um dos lados.
Dicasde posição
correta
Ao sentar tronco ereto e cabeça erguida ( os assentos ou encostos não devem ser inclinados ) ;
Ao abaixar coluna ereta com dobramento do joelho ; Escovar dentes com corpo ereto diante da pia ; Ao deitar posicione-se de lado com as pernas ligeiramente dobradas ( preferência
para colchão ortopédico ); Ao ler sentado tronco na posição vertical, sem inclinação.
Desenvolvimento Motor
Desenvolvimento Perceptivo
Sintomas:
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Atraso considerável no início da fala ou articulação defeituosa; Acentuado atraso escolar, apesar de o aluno apresentar inteligência normal.
É necessário que o professor domine algumas atividades para identificar problemas de audição em alunos e, a partir daí, procurar os recursos para amenizar o problema. Assim as atividades propostas estão ligadas aos seguintes aspectos:
Acuidade Auditiva;
Memória Auditiva;
Seqüência Auditiva.
Irritabilidade constante dos olhos: olhos lacrimejantes, pálpebras avermelhadas, inchadas ou remelosas;
Náuseas, visão dupla ou névoas, durante ou após a leitura; Esfregar os olhos, franzir ou contrair o rosto quando se olha para objetos distantes; Muita cautela no andar, quase nunca corre e tropeça sem motivo aparente;
Sintomas:
Atividades Educativas da Audição:
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Desatenção anormal durante trabalho na lousa, mapas na parede e outras atividades que exijam observação;
Queixas de enevoamento visual e tentativas de afastar com as mãos objetos imaginários, que atrapalham a visão;
Inquietação, irritabilidade e nervosismo exagerados, depois de um prolongado trabalho visual; Pestanejar com exagero, principalmente durante a leitura; Segurar o livro muito perto ou muito distante dos olhos; Inclinar a cabeça para um lado durante a leitura; Capacidade de leitura por períodos curtos.
Acuidade visual; Memória visual; Memória visomotora;
Transtornos de articulação: Dislalia e Disartria Omissão de uma ou mais letras ( paia = praia ); Substituição de uma ou mais letras ( Taizan = Tarzan ); Distorção ou adição ( açucar= açúcar / fazi = fiz ); Necessário: observar o desenvolvimento do aluno. Fala atrasada: Observar 3/4 anos de idade: sem emissão de sons articulados e inteligíveis. Necessário: procurar médico especialista para identificar causa e orientar tratamento. Transtorno do ritmo: Gagueira acompanhada: tensão muscular, rápido piscar de olhos, careta e outros
comportamentos. Necessário: apoio psicológico; técnicas de respiração. Defeitos associados a lesão cerebral: Afasia ( perda ou distúrbio da fala ).
Necessário: programas de reaprendizagem da fala.
Coordenação muscular visomotora fina; Integração visomotora.
Atividades Educativas da Visão :
Podem ser agrupadas em 4 grupos principais:
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Aspectos Vocábulo: capacidade de compreender palavras; Fluência: capacidade de expressar-se verbalmente; Articulação: capacidade de articular palavras de forma clara; Compreensão de Leitura: capacidade de compreender a linguagem escrita; Escrita: capacidade de se comunicar através da escrita.
Observamos funcionamento intelectual abaixo da média, nos seguintes aspectos: Comunicação; Cuidados Pessoais; Habilidades Sociais; Desempenho na família e comunidade; Independência na locomoção; Saúde e segurança; Desempenho escolar; Trabalho e lazer.
Consegue compreender ordens simples, mas apresenta mais dificuldades quando se dão duas ou mais ordens complexas;
Possui pouca iniciativa, pouca criatividade e pouco espírito crítico; Pode ter maior dificuldade para se expressar e para controlar emoções; Apresenta ritmo de aprendizagem mais lento, necessitando de repetidas explicações; Tem maior dificuldade em abstrair e generalizar; Pode apresentar problemas para se adaptar a novas situações.
Cabe ao Professor:
Características do aluno com deficiência intelectual
Principais Distúrbios do Desenvolvimento
Atividades Educativas da Linguagem:
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Entrar em contato com a família para certificar-se das atitudes do aluno no lar; Encaminhar o aluno, caso julgue necessário, com relatório de observação para um
profissional especializado da área de saúde realizar o diagnóstico diferencial. Agir naturalmente; Identificar o nível de desenvolvimento do aluno; Elaborar planejamento.
Iniciar com conceitos e operações simples e concretas, construindo gradativamente a complexidade e abstração;
Certificar-se do aprendizado e assimilação do aluno no conhecimento anterior; Trabalhar várias vezes com o mesmo conceito, por períodos mais curtos de tempo, associando-os
ao cotidiano; Diminuir o número de estímulos na sala de aula; Utilização constante de recursos audiovisuais; Elogiar os sucessos e compreender afetuosamente suas dificuldades.
Participação em atividades extracurriculares de forma integrada com os colegas- favorece percepção da realidade social e desenvolvimento geral do aluno;
Criatividade do professor; Participação da família; Procura de orientações com profissionais especializados.
Aprendendo e assimilando:
Atividades Integradas:
Paralisia Cerebral
( Encefalopatia crônica da
infância não progressiva)
O que fazer ?
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É uma síndrome caracterizada pela alteração da coordenação dos movimentos, do tônus muscular e a permanência dos reflexos primitivos. Pode ou não haver deficiência mental associada. É um quadro de intensidade variável, dependendo da extensão e localização da lesão.
Pré-natal: Rubéola, toxoplasmose e citomegalovírus. Peri-natal: Anóxia por trabalho de parto anormal e prolongado; prematuridade. Pós-natal: Meningite e encefalite.
Quanto ao tipo de alteração do movimento:
Quanto ao tipo de localização no corpo:
Paralisia Cerebral grave: atendimento educacional especializado. Com a evolução do caso: algumas conseguem acompanhar as atividades de classe regular; Paralisia cerebral leve: encaminhamento do aluno para as escolas de ensino regular; Maiores problemas educacionais do aluno paralisado cerebral: leitura, escrita e coordenação
motora.
Uso de criatividade; Adaptação de materiais para o bom desempenho do aluno; Utilização de conteúdo programático = das classes regulares- desenvolvido quase que
individualmente- obedecer ritmo, condições físicas e intelectuais do aluno.
Nível de desempenho individual; Capacidades físicas remanescentes; Dificuldades motoras; Dificuldades de linguagem;
Monoparesia; Diparesia;
Definição:
Espástica; Atetose; Atáxica;
Escolaridade do aluno com paralisia cerebral:
Devem ser analisados:
Causas:
Tipo:
Quadriparesia; Hemiparesia.
Cabe ao professor:
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Observar quais vias o aluno apresenta maior facilidade para o aprendizado- para traçar objetivos que permitam acompanhamento, controle e avaliação do mesmo.
Oferecer ambiente favorável á realização de experiências e vivências que o levem á reabilitação física, ao desenvolvimento mental e o ajustamento social e afetivo;
Propiciar a aquisição de experiências básicas ( treino motor, área cognitiva) que levem o aluno á aprendizagem nos graus subsequentes e ao desenvolvimento harmônico de sua personalidade;
Favorecer condições para o desenvolvimento das capacidades intelectuais, através da aprendizagem formal em todas ás áreas do currículo em caráter especial;
Levar á consciência de suas limitações e de suas capacidades; Levar a uma conduta independente, á autoconfiança e iniciativa.
Objetivos da Escola:
Definição:
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É um acidente ou erro genético, caracterizado pela presença de um cromossomo extra no par 21. Observaremos alteração cerebral, acarretando em atraso no desenvolvimento neuropsicomotor.
Ausência de reflexo da primeira infância;
Flacidez generalizada; Face e ponte nazais achatadas; Fenda palpebral oblíqua; Pregas epicântricas na parte interna dos olhos; Pescoço curto e grosso; Prega única na palma das mãos; Boca pequena; Hiperelasticidade articular ( frouxidão das articulações ); Espaço aumentado entre o 1º e o 5ºdedo; Pé chato, dentre outras.
Pré-natal (antes do nascimento) – Observamos: Idade materna avançada; Filho anterior com alguma anomalia cromossômica; Antecedentes familiares.
Pós-natal ( após o nascimento) – Realização de exames: Cariótipo; Dermatóglifo; Teste de apgar.
Diagnóstico:
Características e sinais clínicos:
Incidência:
Cromossomo par 21
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1,3 meninos para 1 menina.
Doenças gastrointestinais; Endócrinas; Problemas respiratórios; Problemas cardíacos; Problemas auditivos; Problemas visuais; Problemas de coluna.
Desenvolvimento neuropsicomotor deficitário; Cada caso é um caso; Trabalhar expectativas familiares; Hoje O portador da Síndrome de Down pode alcançar estágios muito avançados de raciocínio e
desenvolvimento; Desenvolvimento Psicomotor – deve enfatizar: Equilíbrio; Coordenação de movimentos; Estrutura do esquema corporal; Orientação Espacial; Sensibilidade; Hábitos posturais; Exercícios respiratórios.
Desenvolvimento Cognitivo- Deve atender as necessidades especiais, sem haver um desvio dos princípios básicos da Educação dos ditos “normais”;
Respeitar a variação intelectual de cada um – oferecer iguais possibilidades de desenvolvimento, independente do ritmo individual;
Valorizar o aluno, incentivando-o em seu processo Educacional; Realizar planejamentos e avaliações periódicas, a fim de poder suprir necessidades do grupo, com
constante reavaliação do trabalho.
Desenvolvimento da Linguagem: Criar um ambiente favorável e estimulador; Nunca falar pelo aluno, nem deixar que os outros falem por ele; Aguardar a solicitação do aluno, não antecipando suas vontades; Criar situações inesperadas que provoquem reações do aluno, aguardando seus comentários.
Alterações médicas:
Informações Educacionais Importantes:
Perspectivas futuras do Síndrome de Down:
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Inclusão Social e Escolar; Dismistificação do preconceito; Inclusão em Escolas regulares e profissionalização nas Indústrias e outros; Garantia dos direitos como cidadãos e seres humanos; Reivindicação dos familiares e do próprio portador de seus direitos.
Afetividade e Cognição: Rompendo a Dicotomia na educação
Valéria Amorim Arantes
Pensar e sentir são ações indissociáveis. Esta é a idéia que tentaremos imprimir e defender ao longo do texto,
tendo como preocupação central transpô-la para o campo educacional. E o faremos expondo algumas reflexões
acerca do papel da afetividade no funcionamento psicológico e na construção de conhecimentos cognitivo-
afetivos.
O leitor ou leitora podem estar se perguntando: por que conhecimentos cognitivo-afetivos? Haveria
conhecimentos exclusivamente cognitivos ou exclusivamente afetivos? A essa segunda pergunta poder-se-ia
responder sim ou não. Se a resposta for sim, tratar-se-á de uma concepção centrada na justaposição dicotômica
entre cognição e afetividade, embasada no princípio de que a razão e as emoções constituem dois aspectos
diferenciados no raciocínio humano. Ao contrário disso, se a resposta for não, conceber-se-á a intrínseca relação
entre os processos cognitivos e afetivos no funcionamento psíquico humano. Assumimos a segunda perspectiva,
daí o emprego da expressão conhecimentos cognitivo-afetivos, e duas razões nos levam a tal posição.
A primeira é de cunho psicológico: não corremos o risco de sermos interpretados a partir de crenças arraigadas
em nossa cultura, que consideram a inteligência e a afetividade dicotômicos e/ou separados, no processo de
construção do conhecimento. Ao contrário, acreditamos que o conhecimento dos sentimentos e das emoções
requer ações cognitivas, da mesma forma que tais ações cognitivas pressupõem a presença de aspectos afetivos.
Talvez nos faltem em nossas linguagens cotidiana e acadêmica expressões como "conhecimento sentido" ou -
porque não? "sentimento conhecido".
Em decorrência desse primeiro aspecto, no campo educacional, aparece uma segunda razão que nos leva a
rechaçar a divisão histórica e culturalmente estabelecida entre os "saberes racionais" e os "saberes emocionais".
Se os aspectos afetivos e cognitivos da personalidade não constituem universos opostos, não há nada que
justifique prosseguirmos com a idéia de que existem saberes essencialmente ou prioritariamente vinculados à
racionalidade ou à sensibilidade. Posto dessa maneira, a indissociação entre pensar e sentir nos obriga a integrar
nas explicações sobre o raciocínio humano as vertentes racional e emotiva dos conceitos e fatos construídos.
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Partimos da premissa de que no trabalho educativo cotidiano não existe uma aprendizagem meramente cognitiva
ou racional, pois os alunos e as alunas não deixam os aspectos afetivos que compõem sua personalidade do lado
de fora da sala de aula, quando estão interagindo com os objetos de conhecimento, ou não deixam "latentes" seus
sentimentos, afetos e relações interpessoais enquanto pensam.
Apresentadas tais razões, já adentramos no objeto do presente texto: refletir sobre o tema da afetividade nos
contextos psicológico e educacional.
Um pouco de história
Vários foram os pensadores e filósofos que, desde a Grécia Antiga, postularamuma suposta dicotomia entre
razão e emoção. Quando Platão definiu como virtude a liberação e troca de todas as paixões, prazeres e valores
individuais pelo pensamento, considerado, por ele, um valor universal e ligado à imutabilidade das formas
eternas (Silva, 2002), e quando Descartes criou a tão conhecida e famosa afirmação na história da filosofia -
"Penso, logo existo"-, sugeriam a possibilidade de separação entre razão e emoção ou, o que seria mais
adequado, assumiram implicitamente uma hierarquia entre tais instâncias do raciocínio humano, em que o
pensamento tem valor de excelência.
Nessa mesma direção, Immanuel Kant, na obra Fundamentação da metafísica dos costumes (1786), nos advertiu
sobre a impossibilidade do encontro entre razão e felicidade, quando afirmou que "quanto mais uma razão
cultivada se consagra ao gozo da vida e da felicidade, tanto mais o homem se afasta do verdadeiro
contentamento". Afirmou também que se Deus tivesse feito o homem para ser feliz não o teria dotado de razão.
Esse filósofo considerava, ainda, as paixões como "enfermidades da alma". Tais reflexões denotam, também,
como Kant estabelecia uma hierarquia entre a razão e as emoções.
Longe de terem sido esquecidas, essas premissas da filosofia permanecem vivas até os dias atuais, muitas vezes
traduzidas sob metáforas que ouvimos freqüentemente na vida cotidiana: "não aja com o coração", "coloque a
cabeça para funcionar", "seja mais racional". Nessa perspectiva, parece-nos que para uma pessoa tomar decisões
corretas é necessário que ela se livre ou se desvincule dos próprios sentimentos e emoções. Fica a impressão de
que, em nome de uma resolução sensata, deve-se desprezar, controlar ou anular a dimensão afetiva.
Na história da psicologia, o cenário parece não ser muito diferente. Por influência evidente da filosofia, de onde
surgiram, durante muitas décadas as teorias psicológicas estudaram separadamente os processos cognitivos e
afetivos. Seja por dificuldade em estudá-los de forma integrada, seja por crença dos psicólogos e cientistas que
se debruçaram sobre a temática, tal separação parece ter nos conduzido a uma visão parcial e distorcida da
realidade, com reflexos nas investigações científicas e no modelo educacional ainda vigente. Os cientistas
comportamentais, por um lado, ao centrarem seus estudos apenas nos comportamentos externos dos sujeitos - e,
portanto, relegando a um segundo plano experiências mais subjetivas, como a das emoções -, e algumas
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concepções cognitivistas que buscam compreender o raciocínio humano apenas em sua dimensão semântica ou
por meio de formalizações puramente lógicas, são exemplos desse modelo. Por outro lado, e de forma também
distorcida, podemos entender algumas teorias que privilegiam os aspectos afetivos e/ou inconscientes nas
explicações dos pensamentos humanos, dedicando um papel secundário aos aspectos cognitivos.
Tanto no campo da psicologia quanto no campo da neurologia, algumas perspectivas teóricas e científicas
questionam os tradicionais dualismos do pensamento ocidental, apontando caminhos e hipóteses que prometem
inovar as teorias sobre o funcionamento psíquico humano, na direção de integrar dialeticamente cognição e
afetividade, razão e emoções.
Novas compreensões sobre o funcionamento psíquico humano
Um primeiro autor que podemos citar como tendo questionado as teorias que tratavam a afetividade e a cognição
como aspectos funcionais separados foi o biólogo e epistemólogo suíço Jean Piaget (1896-1980). Em um
trabalho publicado a partir de um curso que ministrou na Universidade de Sorbonne (Paris) no ano acadêmico de
1953-54, "Les relations entre l'intelligence et l'affectivité dans le développement de l'enfant" , o autor nos
advertiu sobre o fato de que, apesar de diferentes em sua natureza, a afetividade e a cognição são inseparáveis,
indissociadas em todas as ações simbólicas e sensório-motoras. Ele postulou que toda ação e pensamento
comportam um aspecto cognitivo, representado pelas estruturas mentais, e um aspecto afetivo, representado por
uma energética, que é a afetividade.
De acordo com Piaget, não existem estados afetivos sem elementos cognitivos, assim como não existem
comportamentos puramente cognitivos. Quando discute os papéis da assimilação e da acomodação cognitiva,
afirma que esses processos da adaptação também possuem um lado afetivo: na assimilação, o aspecto afetivo é o
interesse em assimilar o objeto ao self (o aspecto cognitivo é a compreensão); enquanto na acomodação a
afetividade está presente no interesse pelo objeto novo (o aspecto cognitivo está no ajuste dos esquemas de
pensamento ao fenômeno).
Nessa perspectiva, o papel da afetividade para Piaget é funcional na inteligência. Ela é a fonte de energia de que
a cognição se utiliza para seu funcionamento. Ele explica esse processo por meio de uma metáfora, afirmando
que “a afetividade seria como a gasolina, que ativa o motor de um carro mas não modifica sua
estrutura”(ibidem.,p.5). Ou seja, existe uma relação intrínseca entre a gasolina e o motor (ou entre a afetividade
e a cognição) porque o funcionamento do motor, comparado com as estruturas mentais, não é possível sem o
combustível, que é a afetividade.
Na relação do sujeito com os objetos, com as pessoas e consigo mesmo, existe uma energia que direciona seu
interesse para uma situação ou outra, e a essa energética corresponde uma ação cognitiva que organiza o
funcionamento mental. Nessa linha de raciocínio, diz Piaget, “é o interesse e, assim, a afetividade que fazem
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com que uma criança decida seriar objetos e quais objetos seriar” (ibidem.,p.10). Complementando, todos os
objetos de conhecimento são simultaneamente cognitivos e afetivos, e as pessoas, ao mesmo tempo que são
objeto de conhecimento, são também de afeto.
No transcorrer de seu trabalho, Piaget incorpora um outro tema na relação entre a afetividade e a cognição, que
são os valores. Ele considera os valores como pertencentes à dimensão geral da afetividade no ser humano e
afirma que eles surgem a partir de uma troca afetiva que o sujeito realiza com o exterior, com objetos ou
pessoas. Eles surgem da projeção dos sentimentos sobre os objetos que, posteriormente, com as trocas
interpessoais e a intelectualização dos sentimentos, vão sendo cognitivamente organizados, gerando o sistema de
valores de cada sujeito. Os valores se originam, assim, do sistema de regulações energéticas que se estabelece
entre o sujeito e o mundo externo (desde o nascimento), a partir de suas relações com os objetos, com as pessoas
e consigo mesmo.
O psicólogo Lev Semenovich Vygotsky (1896-1934) também tematizou as relações entre afeto e cognição,
postulando que as emoções integram-se ao funcionamento mental geral, tendo uma participação ativa em sua
configuração. Reconhecendo as bases orgânicas sobre as quais as emoções humanas se desenvolvem, Vygotsky
buscou no desenvolvimento da linguagem - sistema simbólico básico de todos os grupos humanos -, os
elementos fundamentais para compreender as origens do psiquismo.
Produto e expressão da cultura, a linguagem configura-se, na teoria de Vygotsky, como um lugar de constituição
e expressão dos modos de vida culturalmente elaborados. A linguagem forneceria, pois, os conceitos e as formas
de organização do real. Em suma, "um modo de compreender o mundo, se compreender diante e a partir dele e
de se relacionar com ele". (In: Oliveira, Ivone M., 2000).
Vygotsky explicita claramente sua abordagem unificadora entre as dimensões cognitiva e afetiva do
funcionamento psicológico. Afirma ele que (1996):
"A forma de pensar, que junto com o sistema de conceito nos foi imposta pelo meio que nos rodeia, inclui
também nossos sentimentos. Não sentimos simplesmente: o sentimento é percebido por nós sob a forma de
ciúme, cólera, ultraje, ofensa. Se dizemos que desprezamos alguém, o fato de nomear os sentimentos faz com
que estes variem, já que mantêm uma certa relação com nossos pensamentos."
Marta Kohl de Oliveira (1992), numa explanação acerca da afetividade na teoria de Vygotsky, salienta que o
autor soviético distinguia, no significado da palavra, dois componentes: o "significado" propriamente dito
(referente ao sistema de relações objetivas que se forma no processo de desenvolvimento da palavra) e o
"sentido" (referente ao significado da palavra para cada pessoa). Neste último, relacionado às experiências
individuais, é que residem as vivências afetivas. Em tal sentido, a autora afirma que "no próprio significado da
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palavra, tão central para Vygotsky, encontra-se uma concretização de sua perspectiva integradora dos aspectos
cognitivos e afetivos do funcionamento psicológico humano".
Henri Wallon (1879-1962), filósofo, médico e psicólogo francês, reconhecendo na vida orgânica as raízes da
emoção, nos trouxe, também, contribuições significativas acerca da temática. Interessado em compreender o
psiquismo humano, Wallon se debruçou sobre a dimensão afetiva, criticando vorazmente as teorias clássicas
contrárias entre si, que concebem as emoções ou como reações incoerentes e tumultuadas, cujo efeito sobre a
atividade motora e intelectual é perturbador, ou como reações positivas, cujo poder sobre as ações é ativador,
energético. Criticando tais concepções, pautadas, a seu ver, numa lógica mecanicista e linear, Wallon rompe com
uma visão valorativa das emoções, buscando compreendê-las a partir da apreensão de suas funções, e atribuindo-
lhes um papel central na evolução da consciência de si. Em suas postulações concebe as emoções como um
fenômeno psíquico e social, além de orgânico.
Assim como Piaget e Vygotsky, Wallon mostra-nos, em seus escritos, compartilhar da idéia de que emoção e
razão estão, intrinsecamente, conectadas (1986):
"A comoção do medo ou da cólera diminui quando o sujeito se esforça para definir-lhe as causas. Um sofrimento
físico, que procuramos traduzir em imagens, perde algo de sua agudez orgânica. O sofrimento moral, que
conseguimos relatar a nós mesmos, cessa de ser lancinante e intolerável. Fazer um poema ou um romance de sua
dor era, para Goethe, um meio de furtar-se a ela."
Na perspectiva genética de Henri Wallon, inteligência e afetividade estão integradas: a evolução da afetividade
depende das construções realizadas no plano da inteligência, assim como a evolução da inteligência depende das
construções afetivas. No entanto, o autor admite que, ao longo do desenvolvimento humano, existem fases em
que predominam o afetivo e fases em que predominam a inteligência.
Após um período inicial em que se destacam as necessidades orgânicas da criança, Wallon identifica um outro
período - aproximadamente a partir dos seis meses -, em que a sensibilidade social começa a se configurar. Esta
etapa vai sendo superada à medida que os processos de diferenciação - entre si e o outro -, vão se tornando cada
vez mais elaborados. Assim, considera o psiquismo como uma síntese entre o orgânico e o social. Para tal, as
emoções vão se subordinando cada vez mais às funções mentais. Em suma, a afetividade reflui para dar espaço à
atividade cognitiva. Vale a pena recorrermos a uma afirmação de Heloisa Dantas (1990), estudiosa da obra de
Wallon, que parece ilustrar a relação entre emoção e razão, posta pelo autor: "A razão nasce da emoção e vive da
sua morte." Ou, como afirmou Galvão (1995): "é uma relação de filiação e, ao mesmo tempo, de oposição."
A preocupação em superar as tradicionais dicotomias entre razão e emoções e entre as dimensões cognitiva e
afetiva do funcionamento psíquico humano pode ser identificada também em estudos mais recentes, no campo
da neurologia.
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Nessa perspectiva, o neurologista Antônio R. Damásio, em sua notável obra O erro de Descartes (1996), postula
a existência de uma forte interação entre a razão e as emoções, defendendo a idéia de que os sentimentos e as
emoções são uma percepção direta de nossos estados corporais e constituem um elo essencial entre o corpo e a
consciência.
Damásio identificou, no acompanhamento de pacientes com lesões cerebrais - especialmente pré-frontais -,
características comuns. Dentre elas, uma significativa redução das atividades emocionais. Isso o levou a
estabelecer relações entre áreas cerebrais, raciocínio e tomada de decisões e emoções. Afirmou ele: "Parece
existir um conjunto de sistemas no cérebro humano consistentemente dedicados ao processo de pensamento
orientado para um determinado fim, ao qual chamamos raciocínio, e à seleção de uma resposta, a que chamamos
tomada de decisão, com uma ênfase especial no domínio pessoal e social. Esse mesmo conjunto de sistemas está
também envolvido nas emoções e nos sentimentos e dedica-se em parte ao processamento dos sinais do
corpo."
Para Damásio, a emoção e o sentimento assentam-se em dois processos básicos, que funcionam em paralelo: "o
primeiro, a imagem de um determinado estado do corpo justaposto ao conjunto de imagens desencadeadoras e
avaliativas que o causaram; e o segundo, um determinado estilo e nível de eficácia do processo cognitivo que
acompanha os acontecimentos descritos no primeiro." Estabelecendo uma intrínseca relação entre os sentimentos
e os modos cognitivos, postula ainda que "a essência da tristeza ou da felicidade é a percepção combinada de
determinados estados corporais e de pensamentos que estejam justapostos, complementados por uma alteração
no estilo e na eficiência do processo de pensamento."
Apontemos a essência do erro de Descartes, segundo Damásio:
"...a separação abissal entre o corpo e a mente, entre a substância corporal, infinitamente divisível, com volume,
com dimensões e com um funcionamento mecânico, de um lado, e a substância mental, indivisível, sem volume,
sem dimensões e intangível, de outro; a sugestão de que o raciocínio, o juízo moral e o sofrimento adveniente da
dor física ou agitação emocional poderiam existir independentemente do corpo. Especificamente: a separação
das operações mais refinadas da mente, para um lado, e da estrutura ou funcionamento do organismo biológico
para o outro."
Preocupado em articular as emoções com os processos cognitivos - "emoções bem direcionadas e bem situadas
parecem constituir um sistema de apoio sem o qual o edifício da razão não pode operar a contento" -, Damásio
rompe também com a idéia cartesiana de uma mente separada do corpo. Como ele mesmo apontou, talvez a
famosa frase filosófica - Penso, logo existo- devesse ser substituída pela anti cartesiana - Existo e sinto, logo
penso.
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Outro autor, ligado ao campo da neurologia, que também compartilha da premissa de que os processos
cognitivos e os processos afetivos são indissociáveis é Joseph LeDoux. Segundo LeDoux (1993;1999), o sistema
da amígdala ministra a memória emocional inconsciente, enquanto o hipocampo proporciona a memória
consciente de uma experiência emocional. Sendo assim, o autor postula que os sentimentos e os pensamentos
conscientes são parecidos e que ambos são gerados por processos inconscientes, e que a influência das emoções
sobre a razão é maior do que a da razão sobre as emoções. Para ele, ambas as memórias "se unem em nossa
experiência consciente de um modo tão imediato e rigoroso que não podemos analisá-la minuciosamente
mediante a introspeção". Mas voltemos, então, para o campo da psicologia.
O psicoterapeuta americano Greenberg (1993;1996) também nos adverte sobre a intrínseca relação entre
cognição e emoção quando se refere aos chamados esquemas emocionais: "...não baseiam-se unicamente na
emoção, implicam uma síntese complexa de afeto, cognição, motivação e ação, que proporciona a cada pessoa
um sentido integrado dele ou dela mesma e do mundo, assim como também um significado subjetivamente
sentido". Para Greenberg, enquanto a emoção nos sinaliza a respeito do que está nos afetando e estabelece a
meta para que possamos alcançá-la, a cognição nos ajuda a dar sentido à nossa experiência, assim como a razão
nos ajuda a imaginar o melhor modo de alcançarmos a meta. Como Damásio e LeDoux, Greenberg parece
compartilhar da tese de que o afetivo estabelece os problemas para que o cognitivo os resolva.
É impossível não fazermos referência, ainda, à perspectiva de Howard Gardner e de sua equipe da Universidade
de Harvard, muito em voga nos dias atuais, que, partindo do pressuposto de que o ser humano desenvolve
diferentes funções intelectuais, apregoa a idéia das "inteligências múltiplas", contrapondo-a à da inteligência
como uma função única. Sem entrarmos no mérito da quantificação da inteligência posta por tal enfoque, parece-
nos relevante o paradigma colocado por estes estudiosos que pressupõe a substituição da percepção simplista do
ser humano, por uma visão de que as pessoas são dotadas de ampla diversidade de competências e linguagens.
Gardner postula que a inteligência é uma atitude que se expressa por meio de sistemas simbólicos diferentes, e
isso supõe uma clara ruptura com a idéia de inteligência como entidade única e abstrata. Dentro dessa linha,
salientamos, especialmente, o grande impacto e sucesso obtido pelo trabalho de Daniel Goleman, intitulado
Inteligência emocional. Embora não estejamos de acordo com os pressupostos teóricos e epistemológicos desses
autores, reconhecemos a importância que seus estudos vêm tendo na mudança dos paradigmas científicos que
procuram ressignificar o papel das emoções no raciocínio humano.
Um autor que também aponta, em seu recente trabalho, para a conexão entre os aspectos afetivos e cognitivos é
o holandês Nico Fridja (Fridja et al. 2000). Ele o faz postulando, especificamente, a forte influência que as
emoções exercem sob as crenças. Salienta que, enquanto o pensamento racional não é suficiente para a ação, as
emoções induzem as pessoas a atuarem de uma determinada maneira. Em suma, os sentimentos estão apoiados
pelas crenças, e as crenças pelos sentimentos.
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Entre todos esses enfoques que questionam a dicotomia historicamente posta entre razão e emoções e entre
cognição e afetividade, podemos incluir a Teoria dos Modelos Organizadores do Pensamento (Moreno, Sastre,
Bovet, Leal, 1998), segundo a qual o sujeito elabora e organiza sínteses complexas de significados a partir de
processos afetivos e cognitivos.
Os modelos organizadores são conjuntos de representações mentais que as pessoas realizam em situações
específicas e que as levam a compreender a realidade e a elaborar seus juízos e suas ações. Construídos não
somente a partir da lógica subjacente às estruturas de pensamento, os modelos organizadores do pensamento
comportam os desejos, sentimentos, afetos, representações sociais e valores de quem os constrói. Tal referencial
teórico procura, pois, demonstrar como os aspectos cognitivos e afetivos se articulam de maneira dialética no
funcionamento psíquico.
Aspectos cognitivos e afetivos presentes na organização do pensamento
Fundamentando-nos na Teoria dos Modelos Organizadores do Pensamento e em seus pressupostos realizamos
um trabalho de investigação (Arantes, V., 2000), que nos permitiu adentrar no estudo acerca da correlação entre
os aspectos afetivos e cognitivos subjacentes ao funcionamento psíquico. Pudemos identificar como as pessoas
pensam e analisam uma determinada situação de acordo com seus estados emocionais. Optamos por um caminho
metodológico em que nossa amostra de pesquisa foi dividida em três grupos distintos de docentes, sendo cada
um deles induzido a experienciar um determinado estado emocional antes de solicitado a resolver uma situação-
problema. Enquanto no primeiro grupo, denominado positivo, foi solicitado aos docentes que recordassem,
escrevessem, comentassem e dramatizassem uma experiência pessoal na qual se sentiram satisfeitos e felizes por
terem ajudado alguém, no segundo, denominado negativo, a mesma atividade solicitada esteve centrada numa
experiência negativa. Tratava-se, pois, de solicitar que recordassem uma situação, vivida por eles, em que se
sentiram insatisfeitos e infelizes por não poderem ajudar alguém. Com o terceiro grupo, denominado neutro, não
foi realizada nenhuma atividade prévia à coleta de dados. Nós o denominamos grupo neutro apenas por esta
razão, o que não significa que esses sujeitos estivessem emocionalmente neutros.
Escolhemos uma situação dilemática relacionada a conteúdos de natureza moral para essa investigação por ser
de entendimento corrente que alguns conteúdos morais solicitam, implicitamente, a articulação entre os aspectos
cognitivos e afetivos durante o raciocínio. Assim, apresentamo-lhes um conflito ligado a uma temática que faz
parte do cotidiano das escolas públicas brasileiras e que mobiliza a preocupação daqueles que ali trabalham: o
consumo de drogas pelos alunos e alunas. Pedimo-lhes que opinassem sobre os sentimentos, pensamentos e
desejos de uma professora, ao flagrar um aluno fumando maconha durante o horário de aula.
Os resultados obtidos nessa investigação (Arantes, V., 2000; 2001) mostraram que um mesmo conflito pode
receber tratamentos diferentes e antagônicos, dependendo do estado emocional prévio do sujeito que o enfrenta.
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Enquanto o grupo positivo encarou o aluno drogado como uma pessoa boa e com um futuro promissor, o grupo
negativo o viu como uma pessoa problemática, perigosa e, portanto, indesejável. Enquanto o grupo positivo
apresentou em suas respostas diferentes formas de ajudar o aluno, o grupo negativo apontou, como melhor
forma de resolver o conflito enfrentado, excluí-lo da instituição escolar.
Os resultados dessa investigação parecem nos dizer que, quando estamos felizes, preparamos nossas "cabeças"
para analisarmos e compreendermos as necessidades e problemas dos demais, elaborando estratégias de ação
mais solidárias e generosas. Os mesmos resultados nos indicam também que os estados emocionais influenciam
nossos pensamentos e ações tanto quanto nossas capacidades cognitivas. Assim, ao sermos solicitados a resolver
problemas, a forma como organizamos nosso raciocínio parece depender tanto dos aspectos cognitivos quanto
dos aspectos afetivos presentes durante o funcionamento psíquico, sem que um seja mais importante que o outro.
Finalizando o quadro até aqui esboçado, ficamos com a certeza de que não devemos mais admitir as polarizações
entre o campo da racionalidade e da afetividade presentes nas explicações do funcionamento psíquico. O
comportamento e os pensamentos humanos se sustentam naindissociação - de forma dialética-,de emoções e
pensamentos, de aspectos afetivos e cognitivos. As emoções não são obstáculos a serem evitados, como sugerem
algumas teorias psicológicas, sociológicas e filosóficas. Nas interações com o meio social e cultural criamos
sistemas organizados de pensamentos, sentimentos e ações que mantêm entre si um complexo entrelaçado de
relações. Assim como a organização de nossos pensamentos influencia nossos sentimentos, o sentir também
configura nossa forma de pensar. Assim, acreditamos que pensar e sentir são ações indissociáveis.
No cenário da educação: a busca por uma escola diferente
"Nenhum ser humano nunca nasceu com impulsos agressivos ou hostis e nenhum se tornou agressivo ou hostil
sem aprendê-lo."
Ashley Montagu
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A discussão esboçada na primeira parte nos traz a certeza de que necessitamos construir um sistema educativo
que supere a clássica contraposição entre razão e emoção, cognição e afetividade, e que rompa com uma
concepção - por nós tão conhecida -, que atribui ao desenvolvimento do intelecto, dos aspectos cognitivos e
racionais, um lugar de destaque na educação, relegando os aspectos emocionais e afetivos de nossa vida a um
segundo plano. Assim é que a educação tradicional e os currículos escolares, ao trabalharem de maneira
puramente cognitiva a matemática, a língua, as ciências, a história, etc., acabam por priorizar apenas um desses
aspectos constituintes do psiquismo humano, em detrimento do outro (ou dos outros).
Para discorrermos sobre a dimensão afetiva no campo da educação, vislumbramos a possibilidade de reflexão
sob duas perspectivas diferentes, inter-relacionadas e complementares: a do desejo, aqui entendida apenas em
sua dimensão motivacional, de interesse; e a dos sentimentos e afetos como objetos de conhecimento. Mesmo
reconhecendo a importância da motivação e dos interesses como uma dimensão essencial da afetividade na vida
psíquica e para a educação, no fundo tal perspectiva costuma ficar presa a uma visão dicotômica que reduz o
papel dos sentimentos e emoções a uma energética. Vamos, no presente texto, nos dedicar apenas à segunda
perspectiva.
Acreditamos poder avançar as discussões que apontam para a articulação das relações intrínsecas entre cognição
e afetividade, no campo da educação, se incorporarmos no cotidiano de nossas escolas o estudo sistematizado
dos afetos e sentimentos, encarados como objetos de conhecimento. Defendemos a idéia de que tais conteúdos
relacionados à vida pessoal e à vida privada das pessoas podem ser introduzidos no trabalho educativo,
perpassando os conteúdos de matemática, de língua, de ciências, etc. Assim, o princípio proposto é de que tais
conteúdos sejam trabalhados na forma de projetos que incorporem de maneira transversal e interdisciplinar os
conteúdos tradicionais da escola e aqueles relacionados à dimensão afetiva .
Um bom caminho para a promoção de tal proposta é lançar mão do emprego de técnicas de resolução de
conflitos no cotidiano das escolas, principalmente se os conflitos em questão apresentarem características éticas
que solicitem aos sujeitos considerar ao mesmo tempo os aspectos cognitivos e afetivos que caracterizam os
raciocínios humanos.
Para justificar tais princípios nos pautamos em idéias como as de Moreno (2000), especialmente quando afirma
que: "os suicídios, os crimes e agressões não têm como causa a ignorância das matérias curriculares, mas estão
freqüentemente associados a uma incapacidade de resolver os problemas interpessoais e sociais de uma maneira
inteligente." A autora nos leva a refletir sobre o fato de que os conteúdos curriculares tradicionais servem -
mesmo que não somente -, para "passar de ano", ingressar na universidade, mas parecem não nos auxiliar a
enfrentar os males de nossa sociedade ou os conflitos de natureza ética que vivenciamos no cotidiano.
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Se recorrermos à epígrafe utilizada anteriormente, em que Montagu afirma que nenhum ser humano torna-se
agressivo ou hostil sem aprendê-lo, temos de admitir que, se vivemos momentos de intensa violência, em algum
momento da história, tal violência foi, por nós, construída, aprendida. As relações e os conflitos interpessoais do
cotidiano, com os sentimentos, pensamentos e emoções que lhes são inerentes, exigem de nós auto
conhecimento e um processo de aprendizagem para que possamos enfrentá-los adequadamente.
Apesar de os conflitos acontecerem continuamente em nossas vidas, nossa sociedade parece vê-los sempre de
forma negativa e/ou destrutiva. Diante de um conflito vivido, por exemplo, entre dois irmãos ou irmãs, a conduta
do pai ou da mãe normalmente contempla a idéia de que extingui-lo é a melhor forma de resolvê-lo. Nesse
sentido, é comum argumentarem que o melhor é que façam "as pazes" e voltem a ser amigos(as), como eram
antes do início da situação conflitiva. Em suma, o conflito é visto como algo desnecessário, que viola as normas
sociais e que, portanto, deve ser evitado.
Em outro sentido, Johnson e Johnson (1995) afirmam que: "o que determina que os conflitos sejam destrutivos
ou construtivos não é sua existência, mas sim a forma como são tratados". Para esses autores, as escolas que
desprezam os conflitos os tratam de forma destrutiva e aquelas que os valorizam os tratam de forma construtiva.
Assim, os conflitos tratados construtivamente podem trazer resultados positivos, melhorando o desempenho, o
raciocínio e a resolução de problemas.
Estamos de acordo com esses autores e acreditamos que uma escola de qualidade deve transformar os conflitos
do cotidiano em instrumentos valiosos na construção de um espaço autônomo de reflexão e ação, que permita
aos alunos e alunas enfrentarem, autonomamente, a ampla e variada gama de conflitos pessoais e sociais.
Sentimo-nos encorajadas a investir na reorganização curricular da escola, para que seja um lugar onde, de forma
transversal, se trabalhem os conflitos vividos no cotidiano.
Nesta perspectiva, consideramos, por um lado, que os sentimentos, as emoções e os valores devem ser encarados
como objetos de conhecimento, posto que tomar consciência, expressar e controlar os próprios sentimentos
talvez seja um dos aspectos mais difíceis na resolução de conflitos. Por outro lado, a educação da afetividade
pode levar as pessoas a se conhecerem e a compreenderem melhor suas próprias emoções e as das pessoas com
quem interagem no dia a dia. Grosso modo, tratar-se-á de desenvolver uma postura analítica perante sentimentos
e valores.
A título de ilustração, descreveremos, brevemente, uma atividade realizada por uma professora de ensino
fundamental, desenvolvida sob nossa orientação, que demonstra como é possível promover a educação dos
sentimentos e emoções em uma perspectiva transversal e interdisciplinar, por meio de técnicas de resolução de
conflitos. Ela iniciou a atividade solicitando que seus alunos e alunas relatassem situações por eles
experienciadas, que lhes tivessem causado intensa tristeza e/ou insatisfação. Depois de alguns voluntários
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apresentarem seus relatos, foi solicitado a todos os alunos e alunas, individualmente, que registrassem a situação
recordada por meio de desenhos e/ou escrita, contemplando os sentimentos, pensamentos e desejos vividos
naquela situação. Os temas mais freqüentes no grupo foram: agressão física e psíquica dos maridos ou
companheiros (pais das crianças) contra as mulheres (mães das crianças); a morte (roubos seguidos de
assassinatos e vítimas do HIV); conflitos interpessoais que envolviam bens materiais. Após o registro individual
a professora solicitou que aqueles que quisessem mostrassem o desenho feito, o texto escrito e comentassem
sobre a situação.
Na seqüência, solicitou aos alunos e alunas que buscassem formas de solucionar o conflito apresentado, com o
objetivo de levá-los a refletir sobre a forma como haviam atuado no passado e como atuariam hoje, caso
revivessem o mesmo conflito. As crianças elaboraram soluções de diferentes naturezas: organizar uma festa, dar-
se um presente, rezar, ressuscitar a pessoa falecida, conversar com amigos, chorar, dentre outras. Após
escreverem e desenharem as estratégias de atuação ante o conflito vivido, abriu-se novamente o espaço para
reflexão em grupo, quando a professora e alunos(as) tiveram oportunidade de apresentarem questionamentos
quanto à eficácia ou não das soluções elaboradas, bem como dos sentimentos, valores e pensamentos subjacentes
a cada uma delas.
Após este trabalho inicial, quando os alunos e alunas tiveram a oportunidade de se expressarem e discutirem
com o grupo suas idéias acerca dos conflitos vividos, desenvolvendo não só a percepção e tomada de consciência
dos sentimentos e emoções, como também sua capacidade dialógica e cognitiva, várias atividades foram
elaboradas e realizadas, utilizando-se das diferentes áreas do conhecimento "científico" como instrumentos para
a formação desses alunos e alunas. Assim, foram desenvolvidas atividades como: expressão oral e corporal dos
sentimentos; produção de textos, classificação e seriação das causas dos sentimentos negativos do grupo; a
"localização" corporal dos sentimentos; história de vida; e a questão do consumismo compensando carências
afetivas.
Com esse exemplo, nosso intuito foi o de ilustrar como a educação da afetividade pode e deve levar em
consideração a vertente racional e emotiva dos conceitos e fatos que os alunos e alunas estão aprendendo,
dispondo de um planejamento de atividades e técnicas que incluam e detalhem os conteúdos e objetivos
curriculares específicos de cada uma delas.
Assim, sem abrir mão dos conteúdos tradicionais da escola, a professora em questão trabalhou conteúdos de
natureza afetiva, entendendo-os como objetos de conhecimentos para a vida dos estudantes, da mesma forma
que a matemática e a língua são vistas como objetos de conhecimento a serem aprendidos. Resumindo, com esse
tipo de proposta educacional, a escola entende que da mesma forma que os estudantes aprendem a somar, a
conhecer a natureza e a se apropriar da escrita, é fundamental para suas vidas que conheçam a si mesmos e a
seus colegas, e as causas e conseqüências dos conflitos cotidianos. Trabalhando dessa maneira, por meio de
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situações que solicitem a resolução de conflitos, a educação atinge o duplo objetivo de preparar alunos e alunas
para a vida cotidiana, ao mesmo tempo que não fragmenta as dimensões cognitiva e afetiva no trabalho com as
disciplinas curriculares.
A título de encerramento, recorremos a uma afirmação de Moreno (1998): "Integrar o que amamos com o que
pensamos é trabalhar, de uma só vez, razão e sentimentos; supõe elevar estes últimos à categoria de objetos de
conhecimento, dando-lhes existência cognitiva, ampliando assim seu campo de ação." Trabalhar pensamentos e
sentimentos - dimensões estas indissociáveis - requer dos profissionais da educação a disponibilidade para se
aventurarem por novos campos de conhecimento e da ciência para darem conta, minimamente, de realizarem as
articulações que a temática solicita. Eis uma nova e difícil empreitada, que exige coragem para enfrentarmos o
desafio posto: buscar novas teorias e abrir mão de verdades há muito estabelecidas em nossa mente. Desafio
salutar para o avanço da educação. De mais a mais, a recusa a este trabalho contribuirá para a consolidação do
"analfabetismo emocional" na sociedade contemporânea.
Que não seja assim!
A memória dos neurônios
Dráuzio Varella
Somos muito apegados à vida. Salvo nas crises de depressão psicológica grave, desistir ativamente de viver é
acontecimento raríssimo. Embora alguns jurem que se perderem as pernas, a visão, um ente querido ou se
tiverem uma doença incurável preferirão morrer, quando tais eventos ocorrem, rapidamente mudam de idéia.
Como médico, acompanhei inúmeros pacientes que enfrentaram situações típicas daquelas em que costumamos
dizer: “Se isso acontecesse comigo, eu queria morrer!” Em quase trinta anos de cancerologia, no entanto, ouvi tal
pedido apenas três vezes. Não me refiro, é lógico, às súplicas inconsequentes dos momentos de dor lancinante,
cansaço extremo ou gripe forte, como chegam a fazer os mais dramáticos. Falo de três pessoas lúcidas, sem
dores ou outra aflição aguda, que se sentaram diante de mim para dizer: “Doutor, chega, por favor”. Ainda
assim, a esse pedido seguiram-se vários dias de hesitação e arrependimento, nos três casos.
A intensidade do apego à existência tem raízes evolucionistas. Nos 3,5 bilhões de anos em que a vida caminhou
pela Terra até nascermos você e eu, nossos antepassados competiram ferozmente pelas reservas alimentares,
cresceram e multiplicaram-se. No decorrer desse tempo, milhões de gerações de indivíduos que lutaram com
mais determinação pela sobrevivência deixaram mais descendentes, e esses herdaram as características genéticas
dos pais. Por isso, agarrar-se à vida a qualquer preço é característica fundamental de todas as espécies que
habitam o planeta.
Há, entretanto, algumas situações humanas em que a lei da sobrevivência a qualquer preço talvez não mereça ser
respeitada, na visão da maioria. É o caso da deterioração do sistema nervoso central. Poucos de nós
encontraríamos justificativa para viver numa cama, com descontrole esfincteriano, na dependência total dos
outros, sem reconhecer os filhos ou entender qualquer palavra ao redor, para sempre. E, pior, sem condições
físicas sequer para dizer: “Chega, pelo amor de Deus”.
Expectativa de vida
O século 20 trouxe um aumento da expectativa de vida ao nascer, sem paralelo na história da humanidade. Em
1900, a média de vida na Europa desenvolvida era 45 anos. Hoje, está por volta de 80 em diversos países. Nos 5
milhões de história do Homo sapiens, jamais aconteceu tal feito: em apenas 100 anos, quase dobrar a vida média
da espécie. Esse recorde nos deixa curiosos: quanto viverão nossos filhos? E os netos, então?
No momento, duas linhas de pensamento dividem a ciência:
1) A primeira acha que existe limite de duração para o corpo humano. Para eles, a vida média da população nos
países industrializados vai ficar ao redor de 85 anos.
Chegaram a essa conclusão analisando os índices de mortalidade associados às principais doenças modernas. A
conclusão foi pessimista: nem acabando com as mortes por câncer, doença cardiovascular e diabetes, a média de
vida da humanidade ultrapassaria 95 ou 100 anos.
2) Para o segundo grupo, não há limite inerente à duração da vida humana. Contando com os avanços científicos
que virão, uma criança nascida hoje poderá viver 100 ou 110 anos; talvez mais.
A discussão entre as duas correntes está longe de acadêmica; dela depende o futuro das políticas sociais dos
países. Nos Estados Unidos, em 1990, para cada 100 trabalhadores de 18 a 64 anos, havia 20 aposentados com
mais de 65 anos. Se as projeções estiverem corretas, com o aumento da longevidade, os mesmos 100
trabalhadores terão que pagar aposentadoria para 36 aposentados, em 2050.
Vamos admitir a hipótese de que as previsões mais otimistas estejam corretas: que possamos viver mais de 100
anos e receber regularmente nossos salários mensais. Nesse caso, será fundamental investirmos na melhora da
qualidade de vida na velhice. Para tanto, podemos reduzir o número de calorias ingeridas, aumentar a atividade
física e evitar muitas doenças preveníveis. Mas, como preservar a memória e a agilidade intelectual? Como
manter a integridade do sistema nervoso central se é sabido que os neurônios morrem à medida que
envelhecemos?
A resposta virá depois de uma explicação de ciência básica.
A morte dos neurônios
Em 1955, H. Brody publicou, em Nova York, o primeiro estudo que deu suporte à convicção de que os
neurônios são destruídos com o passar dos anos. Tomou 20 cérebros de indivíduos cujas idades variavam entre
alguns meses e 95 anos. Fez cortes histológicos desses cérebros, corou-os com uma substância que deixa os
neurônios bem visíveis e contou-os numericamente. Brody encontrou perda significante de neurônios com a
idade, inclusive em áreas essenciais para manter a capacidade de planejamento e em centros que controlam a
percepção de estímulos sensoriais.
Estudos posteriores mostraram que no córtex cerebral, estrutura sem a qual não haveria por que termos orgulho
da condição humana, até 40% dos neurônios desaparecem com a idade. Em centros ligados à gênese e controle
das emoções, a perda atingiria 25% a 50%.
Com o advento das técnicas mais modernas para obtenção de imagens radiológicas, como a tomografia
computadorizada e a ressonância magnética, foi possível a obtenção de radiografias nítidas do sistema nervoso
central. Empregando essa tecnologia, diversos autores documentaram redução do volume cerebral com a idade.
Em 1992, S. Rapoport, do National Institute on Aging, estudando ressonâncias magnéticas cerebrais de homens
de diferentes idades, concluiu que o volume total do cérebro diminui 10% nos homens com mais de 60 anos,
quando comparado com o grupo de 25 anos ou menos. Rapoport e seu grupo afirmaram que as imagens obtidas
sugerem redução das dimensões da massa cinzenta, camada cerebral onde se situam os corpos dos neurônios (os
neurônios parecem aranhas, com um corpo central e muitas patas compridas, chamadas axônios, que
estabelecem conexões à distância com outros neurônios).
Estudo semelhante conduzido por M. de Leon na Universidade de Nova York, comparando imagens cerebrais de
jovens de 20 a 30 anos, com as de adultos de 60 a 70, mostrou que a redução de volume, embora pequena, era
significante e comprometia não só a massa cinzenta, mas também a branca, situada mais internamente e que
contém os axônios.
Essas evidências experimentais explicam a deterioração neurológica progressiva de grande parte das doenças da
senectude: Alzheimer, demência senil, Parkinson e tantas outras. O que não conseguem explicar são os casos dos
idosos lúcidos. A perda de tantos neurônios afetou a qualidade dos contos de Jorge Luís Borges? Os quadros de
Matisse?
Embora não explicasse a velhice inteligente, a teoria da morte continuada dos neurônios forneceu as bases
anatômicas para a impressão geral de que a idade estaria irreversivelmente ligada ao descontrole motor, à perda
da memória e do controle emocional.
A vida dos neurônios
A teoria da morte inexorável foi seriamente contestada, pela primeira vez, por H. Haug, da Universidade de
Lübeck, na Alemanha. Num estudo com 120 cérebros, Haug fez uma observação simples: o tecido cerebral
encolhe, quando cortado e corado para os exames de rotina no microscópio. E mais, o tecido jovem encolhe mais
do que o velho. A partir daí, Haug desconfiou de que as ideias anteriores poderiam estar incorretas: se
esticarmos uma borracha contendo dez alfinetes, eles vão parecer mais separados do que se deixarmos a
borracha contrair. Com a densidade dos neurônios aconteceria a mesma coisa: nas lâminas de tecido cerebral
infantil, mais retrátil, os neurônios apareceriam mais próximos, concentrados. No velho, tecido menos retrátil,
neurônios mais separados, densidade menor.
A partir da publicação desse trabalho, em 1984, a conclusão de que a idade estaria irreversivelmente associada à
perda neuronal sofreu o primeiro abalo: talvez fosse devida a mero artefato histológico.
O achado instigou a curiosidade dos neurocientistas. Nos anos que se seguiram, vários laboratórios se dedicaram
ao estudo da questão, alguns procurando desenvolver métodos de processamento do tecido nervoso que
evitassem o “encolhimento”; outros tentando corrigir os erros de medida provocados por esse fenômeno. Os
resultados foram conflitantes até que, em 1987, ocorreu o segundo abalo na teoria da morte neuronal obrigatória.
Nesse ano, o grupo de R. Terry, da Universidade da Califórnia, mostrou que havia outro problema com os
trabalhos que serviram de base para a crença na morte de neurônios: os cérebros mais velhos empregados nos
primeiros estudos, seriam realmente de idosos sadios ou haveria casos de Alzheimer e demência senil entre eles,
doenças definitivamente associadas à perda de células cerebrais?
O argumento do grupo de Terry era consistente: à época da publicação daqueles estudos iniciais, os métodos
para caracterizar essas patologias cerebrais eram antiquados, muito menos sensíveis do que os modernos. Sem
perceber, os pesquisadores teriam incluído idosos já doentes em seu material, influenciando os resultados finais.
Para demonstrar que estavam certos, Terry e seu grupo estudaram 51 cérebros de pessoas consideradas normais,
depois de submetê-las a uma bateria exaustiva de testes de avaliação da capacidade intelectual. Encontraram
diminuição no número de neurônios longos, com a idade. Em compensação, notaram um aumento dos curtos. Os
neurônios encurtam, mas não morrem, concluíram.
No mesmo ano, Coleman e Flood publicaram uma revisão rigorosa dos trabalhos anteriormente publicados e
concluíram que a teoria da morte dos neurônios com a idade havia sido estabelecida com base em trabalhos
experimentais que apresentavam problemas técnicos capazes de comprometer as conclusões finais.
Com o advento de técnicas tridimensionais, mais precisas para a contagem de neurônios, diversos pesquisadores
demonstraram que o envelhecimento não está associado à perda inevitável de neurônios, salvo em condições
patológicas:
1) A. Peters e M. Moss da Universidade de Boston estudaram os cérebros de macacos rhesus, espécie de
macacos com organização social caracterizada por rígida hierarquia e macho-dominantes ditatoriais. Em mais de
dez anos de pesquisas, nas quais foram contados neurônios em áreas cerebrais ligadas à visão, controle motor e
resolução de problemas complexos, os autores não conseguiram demonstrar que houvesse perda significante de
neurônios com a idade.
Em artigo publicado na revista Science, em 1996, Peters afirmou: “Quando começamos a estudar os macacos,
assumimos que haveria perda de neurônios do córtex cerebral, com a idade. Levou muito tempo para
descobrirmos que não há”.
2) Nos últimos 20 anos, J. Morris e L. Berg, da Universidade de Washington, estão acompanhando 200 pessoas
idosas que eram saudáveis ao entrar no estudo. Anualmente, os pesquisadores testam as habilidades cognitivas
de cada indivíduo e entrevistam seus familiares na tentativa de identificar sinais precoces de demência senil.
Quando os participantes do estudo morrem, os pesquisadores examinam o tecido cerebral e contam os neurônios
presentes numa área cerebral crítica para a retenção da memória. Em pessoas com idades de 60 a 90 anos, os
autores não foram capazes de demonstrar diferenças no número de neurônios presentes nessa área.
Em contraste, estudos da mesma área conduzidos entre portadores de doença de Alzheimer avançada mostram
perdas de até 65% dos neurônios e, em casos de demência senil, 50%. Esses números deixam claro que nas
doenças neurodegenerativas a perda de neurônios está definitivamente associada às deficiências neurológicas
que as caracterizam.
3) Em 1993, o grupo de M. Albert, de Harvard, analisou as ressonâncias magnéticas cerebrais de 70 indivíduos
saudáveis de diferentes idades. Comparando as dimensões das diversas áreas cerebrais entre indivíduos com
idade de 30 a 80 anos, os autores não encontraram diferença nas dimensões da substância cinzenta e apenas 8%
de redução no volume da substância branca dos mais velhos. Na conclusão do trabalho Albert diz: “Pensava-se
que nós perdíamos neurônios cada dia de nossas vidas. Isso não é verdade”.
Perda da memória
Embora não pareça haver perda significativa de neurônios nos circuitos do hipocampo (estrutura situada
profundamente, no meio do cérebro, crucial para a estruturação da memória), com a idade surgem deficiências
funcionais nesses circuitos. Testes de aprendizado aplicados em roedores e primatas não humanos deixam claro
existir redução na capacidade de reter informações, à medida que o animal envelhece.
Trabalhos recentes, empregando a melhor tecnologia disponível, confirmam a existência de fenômeno
semelhante nos seres humanos. A conclusão é coerente com a impressão popular de que os velhos têm
dificuldade progressiva para lembrar de fatos recentes, embora muitas vezes nos surpreendam pela lembrança
detalhada de acontecimentos remotos.
Os estudos atuais mostram que há distinção clara entre o déficit associado ao envelhecimento “normal”, e aquele
que representa manifestação inicial da doença de Alzheimer, por exemplo. A diferença mais importante é a de
que as pessoas idosas saudáveis são capazes de reter novas informações, embora possam apresentar retardo para
gravá-las na memória. Nos casos patológicos, em que ocorre perda substancial de neurônios, como vimos na
doença de Alzheimer e demência senil, surge incapacidade progressiva e irreversível para memorizar
informações recém-adquiridas.
Se não ocorre perda significante de neurônios no caso do envelhecimento “normal”, como se explicaria, então, a
falta de memória de que tantas pessoas se queixam?
É provável que a perda de memória associada à maturidade seja consequente a um longo processo multifatorial:
1) O processo de aprendizado envolve circuitos de neurônios que se conectam a partir de diferentes centros
cerebrais. Para aprender um caminho novo através das ruas de uma cidade, é preciso captar as imagens no lobo
temporal, centro da visão, integrá-las com os circuitos de neurônios ligados à percepção tridimensional do
espaço, à função coordenadora do cerebelo e com a circuitaria do lobo frontal, onde a informação será
processada para se tornar consciente.
Os neurônios não estão ligados uns nos outros como os fios elétricos: suas terminações não se tocam, ao
contrário, deixam um espaço livre microscópico, entre um axônio e outro, chamado sinapse. Na sinapse, são
liberados íons e os mediadores químicos necessários para a condução do estímulo, que corre numa velocidade
vertiginosa, medida em milis segundos.
A preservação desse mecanismo implica não apenas a estimulação adequada nas fases de desenvolvimento
cerebral, como o uso continuado pelo resto da vida. A transmissão de estímulos nervosos envolve mediadores
químicos liberados num dos terminais da sinapse e receptores que os captam na outra. É um processo que
depende de treinamento para ser conservado. Quanto mais repetido for ele, maior o repertório que poderá ser
gravado na memória.
O ato repetitivo explica por que velhos atores são capazes de memorizar textos enormes, enquanto pessoas muito
mais jovens não conseguem guardar um simples recado telefônico.
É importante lembrar, que a perda de memória está muitas vezes ligada ao número de bits armazenados. Uma
criança que conviva com trinta pessoas terá menor probabilidade de esquecer o rosto de uma delas, do que um
adulto de esquecer um rosto entre milhares de outros.
No mundo moderno, boa parte das queixas de falta de memória das pessoas maduras está relacionada com o
fluxo de informações. Calcula-se que o número de informações acumuladas no cérebro de um homem de 50 anos
seja pelo menos três vezes maior do que o contido no cérebro de um rapaz de 25. Tal fato dá ideia da dificuldade
que os neurocientistas encontram para desenvolver testes de avaliação de memória que possam ser aplicados nas
diversas faixas etárias.
3) Mesmo sem morte de neurônios, a memória pode se deteriorar em razão de outras alterações neurológicas.
O grupo de A. Peters, da Universidade de Boston, estudando cérebros de macacosrhesus verificou que nos
macacos mais velhos, a mielina (camada que envolve as terminações nervosas como a capa dos fios elétricos)
apresentava sinais de degeneração não encontrados nos jovens. Quanto mais intensa a desmielinização
encontrada, maior o déficit das funções cognitivas do animal. Os neurônios precisam estar bem encapados para
funcionar direito.
Em 1995, L. Callahan demonstrou que com a idade pode ocorrer mudança na morfologia das sinapses (espaço
livre entre os terminais de dois neurônios), alterando a condução do estímulo mesmo em neurônios
aparentemente íntegros.
J. Morrison e colaboradores do Mount Sinai, em Nova York, mostraram que pequenas diminuições na
concentração de receptores (moléculas que captam sinais químicos) existentes nas sinapses podem provocar
deficiências importantes da memória com a idade.
O grupo de A. Arnsten, de Yale, demonstrou com elegância que não só essa perda de receptores, mas também a
de neurotransmissores, como a dopamina e acetilcolina (moléculas que transmitem sinais entre neurônios), pode
estar associada às dificuldades de memorização dos mais velhos.
4) O decréscimo na produção de estrógeno característico da menopausa interfere com os eventos neurológicos
que conduzem às deficiências cognitivas e de memória (esse é um dos argumentos mais fortes dos defensores da
reposição hormonal para as mulheres). No homem, a relevância dos hormônios nesses déficits, embora pouco
clara, não deve ser menos importante.
A memória do futuro
O dogma de que os neurônios morrem a cada dia que passa parece abandonado na neurociência atual. Se essas
células não são destruídas com o tempo, a deterioração progressiva da inteligência e da motricidade não é
obrigatória na velhice.
A circuitaria de neurônios envolvida no mecanismo de memorização tem sido mapeada com rigor. As moléculas
responsáveis pela transmissão e recepção de sinais entre neurônios começam a ser conhecidas e manipuladas. Os
genes que codificam muitas delas já podem ser clonados e inseridos em bactérias-escravas para produção
industrial. Em alguns anos, muitas deficiências cognitivas tradicionalmente associadas à idade poderão ser
prevenidas, tratadas com eficácia, ou adiadas por 10 ou 20 anos. Quem sabe?
Indisciplinado ou Hiperativo?
Na sala de aula ele é o "pestinha": arranca os brinquedos dos colegas, anda de um lado para o outro, não fica
mais de dois minutos sentado no mesmo lugar. Nunca termina as tarefas solicitadas e sai da sala várias vezes
sem pedir licença. Em algumas ocasiões, chega a ser agressivo. Esse comportamento, geralmente confundido
com indisciplina, é característico de um distúrbio de atenção que atinge cerca de 5% das crianças e adolescentes
de todo o mundo: a hiperatividade. Conhecer os sintomas e aprender a lidar com esse problema é uma obrigação
de qualquer professor que não queira causar danos a seus alunos. Afinal, a demora em diagnosticar o caso pode
trazer conseqüências sérias para o desenvolvimento da criança.
Alan Akel, de 12 anos, sofria nas aulas e teve de atrasar seu aprendizado (hoje está numa classe intermediária
entre a 3a e a 4a série) porque a direção da escola que frequentava, em São Paulo, não identificou que havia algo
de errado em seu comportamento. Os pais foram obrigados a retirá-lo do estabelecimento e só descobriram que o
filho era hiperativo quando a direção de outro colégio os orientou a procurar um médico.
Professor Observe:
Embora prejudique a capacidade de concentração e atenção, a hiperatividade é facilmente tratável. Além da
medicação, a reorientação pedagógica na escola ajuda o aluno a não perder rendimento. Alan, por exemplo,
apresentou melhoras assim que passou a ter um atendimento especial. "Ele é inteligente e consciente de seu
problema, o que faz com que controle melhor a instabilidade emocional", afirma Egle Mazzocchi de Souza,
coordenadora pedagógica da Essência Equipe de Ensino, onde ele estuda numa turma com apenas seis crianças e
dois professores.
Segundo o psiquiatra Ênio Roberto de Andrade, coordenador do Ambulatório de Transtornos de Deficiência de
Atenção do Hospital das Clínicas, de São Paulo, a hiperatividade só fica evidente no período escolar, quando é
preciso aumentar o nível de concentração para aprender. "O diagnóstico clínico, no entanto, deve ser feito com
base no histórico da criança", explica. "Por isso, a observação de pais e professores é fundamental."
Geralmente, os hiperativos se mexem muito durante o sono quando bebês. São mais estabanados assim que
começam a andar. Às vezes, apresentam retardo na fala, trocando as letras por um período mais prolongado que
o normal. Em casa, esses sintomas nem sempre são suficientes para definir o quadro. Na escola, porém, eles são
determinantes.
O distúrbio ainda não tem uma causa única comprovada. Sabe-se que a origem é genética e que seus portadores
produzem menos dopamina, um neurotransmissor responsável pelo controle motor e pelo poder de concentração,
que atua com maior intensidade nos gânglios frontais do cérebro. Isso explica o fato de os hiperativos não se
concentrarem e esquecerem facilmente o que lhes é pedido. Pela alta incidência em meninos — cerca de 80%
dos casos —, acredita-se que o problema possa estar relacionado também ao hormônio masculino testosterona.
Paciência e disponibilidade:
Três fatores principais ajudam a distinguir o hiperativo da criança que tem apenas um distúrbio de atenção mais
leve e daquela que busca apenas chamar a atenção: a contínua agitação motora, a impulsividade e a
impossibilidade de se concentrar, seja em brincadeiras ou em atividades pedagógicas. Essas atitudes devem ser
constantes durante pelo menos seis meses seguidos (leia no quadro posteriormente com outros sintomas típicos).
Os professores que têm alunos hiperativos precisam de paciência e disponibilidade, pois eles exigem tratamento
diferente, mais atenção e uma rotina especialmente estimulante", afirma Regina Borella, orientadora pedagógica
do Colégio Pueri Domus, de São Paulo. Ela viveu essa situação quando Vicente*, de 5 anos, foi matriculado no
Pueri. Os pais chegaram avisando que o filho precisava de limites claros, pois era "desobediente e mal-educado".
Bastaram dois meses para a educadora suspeitar de hiperatividade. A escola, então, sugeriu aos pais uma
consulta com um psiquiatra ou neurologista para confirmar o diagnóstico e, simultaneamente, passou a trabalhar
de forma diferenciada com o garoto.
Ele era colocado junto de alunos mais tranqüilos, para que sua agitação não encontrasse seguidores, e nas
atividades de roda a professora estava sempre ao seu lado. Regina chegou a criar uma regra contra as "fugas" da
sala: todas as manhãs, Vicente faz três riscos com giz no quadro-negro. É o número de vezes que pode sair.
Sempre que se levanta, ele apaga uma das marcas. O limite funcionou. Hoje, o menino se controla mais antes de
deixar a classe.
Trabalho com os Pais
Nem sempre os pais admitem que o filho é hiperativo. "Muitos acham que a criança é esperta demais e, por isso,
está sempre interessada em novidades", afirma Helena Samara, diretora da Escola Móbile, de São Paulo. "Além
disso, eles acreditam que o tratamento com medicamentos pode tirar a espontaneidade do pequeno." Helena tem
dois alunos nessa situação matriculados em suas turmas. Para um deles, a escola desenvolve sozinha um trabalho
pedagógico intensivo, pois os pais não aceitam o diagnóstico.
Em casos leves, o distúrbio pode ser tratado apenas com terapia e reorientação pedagógica", diz o psiquiatra
Ênio de Andrade. "Os casos graves necessitam de tratamento com medicamentos." O tratamento é feito por um
período mínimo de dois anos, mas deve durar até a adolescência, quando os sintomas diminuem ou desaparecem,
graças ao amadurecimento do cérebro, que equilibra a produção da dopamina.
Baixa Auto- Estima
Para a psicóloga Mônica Duchesne, da Associação Brasileira do Déficit de Atenção, outra conseqüência da
hiperatividade é a baixa auto-estima das crianças, que surge quando elas notam que são diferentes das demais —
em alguns casos, são as únicas a não concluir o dever. "Isso pode criar um estigma que traz repercussões
sociais", analisa.
O aluno Matheus*, da Móbile, cujos pais também refutam o diagnóstico de hiperatividade, sofreu essas
conseqüências. Ele se sentia inferior porque era repreendido por seu comportamento agressivo. As professoras,
então, começaram a elogiar o que ele produzia. Seis meses depois, Helena Samara notou diferença: "Ele está
afável com os amigos e já relata em casa o que faz na escola, sinal de que sua percepção aumentou".
Para Mônica, se a hiperatividade não for adequadamente tratada na infância, pode deixar seqüelas na fase adulta, como
desorganização para executar tarefas e rotinas diárias, distração excessiva, sonolência diurna e cansaço mental. Além disso,
a pessoa corre o risco de se tornar hipersensível a críticas e irritadiça, apresentar aparente falta de motivação e rancor
exagerado, bem como problemas de memorização.
“ Os nomes dos alunos foram trocados a pedido da direção das escolas.
Teste pode Ajudar no Diagnóstico:
O site da Associação Brasileira do Déficit de Atenção ( http://www.dda.med.br/ ) divulga um procedimento
baseado na observação da criança que pode auxiliar no diagnóstico da hiperatividade. Dividido em dois
módulos, o primeiro mede o grau de desatenção da criança. O segundo mede o grau de hiperatividade e de
impulsividade. Os resultados levam em conta o desempenho nos dois módulos. Para o diagnóstico ter validade,
os sintomas devem ser verificados antes dos 7 anos de idade e persistir por pelo menos seis meses, sem que a
criança se dê conta deles, e em grau incompatível com o nível de desenvolvimento dela. O teste serve como
auxílio para professores e orientadores da escola, mas é preciso ter em mente que o diagnóstico final deve ser
feito sempre por um médico. Quanto mais cedo se diagnosticar, melhor para a criança. Crianças simplesmente
desatentas também necessitam de orientação e de acompanhamento individual para que a desatenção não se
torne crônica e prejudicial.
Módulo 1 – Desatenção:
Observar se a criança exibe os seguintes sintomas:
não presta atenção a detalhes e faz erros por descuido nas tarefas escolares, trabalhos ou outras atividades;
tem dificuldade de manter a atenção em tarefas ou jogos;
parece não escutar quando lhe falam diretamente;
não segue as instruções até o final e não termina tarefas escolares, atribuições domésticas ou deveres (que
não seja devido a comportamento opositivo ou incapacidade de entender as instruções);
tem dificuldade em organizar tarefas e atividades;
evita, desgosta ou é relutante em se engajar em tarefas que exigem esforço mental mantido;
perde coisas necessárias para as tarefas e atividades, tais como brinquedos, obrigações escolares, lápis, livros
ou ferramentas;
é facilmente distraído por estímulos externos;
é esquecido em atividades diárias.
Módulo 2 - hiperatividade/impulsividade:
Observar se a criança exibe os seguintes sintomas:
agita mãos ou pés ou se remexe na cadeira;
abandona sua cadeira em sala de aula ou outras situações nas quais se espera que permaneça sentada;
corre ou escala em demasia em situações impróprias;
tem dificuldade para brincar ou se envolver silenciosamente em atividades de lazer;
está sempre "a todo o vapor";
fala demais;
é impulsiva;
dá respostas precipitadas, antes de ouvir a pergunta inteira;
tem dificuldade de aguardar sua vez;
se intromete na conversa dos outros ou a interrompe.
Resultados :
O aluno é predominantemente desatento se forem observados seis ou mais sintomas do módulo 1 e alguns
sintomas do módulo 2;
O aluno é predominantemente hiperativo/impulsivo se forem observados seis ou mais sintomas do módulo 2 e
alguns sintomas do módulo 1;
O aluno considerado misto se forem observados seis ou mais sintomas dos módulos 1 e 2.
Como lidar com a agitação dos alunos:
Crianças hiperativas podem apresentar melhoras consideráveis em seu comportamento e desenvolvimento
pedagógico se algumas regras forem consideradas. Aí vão as sugestões da psicóloga Mônica Duchesne e do
psiquiatra Ênio Roberto de Andrade:
trabalhe com pequenos grupos, sem isolar as crianças hiperativas;
dê tarefas curtas ou intercaladas, para que elas possam concluí-la antes de se dispersar;
elogie sempre os resultados;
use jogos e desafios para motivá-las;
valorize a rotina, pois ela deixa as crianças mais seguras, mas mantenha sempre elevado o nível de estímulo,
através de novidades no material pedagógico;
permita que elas compensem os erros: sutilmente, faça-as pedir desculpas quando ofenderem os colegas ou
convença-as a arrumar a bagunça em classe;
repita individualmente todo comando que for dado ao grupo e faça-o de forma breve e usando sentenças
fáceis de entender;
peça a elas que repitam o comando, para ter certeza de que escutaram e compreenderam o que você quer;
dê uma função oficial às crianças, como a de ajudante do professor; isso pode melhorar o relacionamento
delas com os colegas e abrir espaço para que elas se movimentem mais;
mostre os limites de forma segura e tranquila, sem entrar em atrito;
oriente os pais a procurar um psiquiatra, um neurologista ou um psicólogo.
Para seguir os conselhos acima providencie os seguintes materiais e deixe-os sempre ao alcance dos alunos na
sala de aula:
1) Caixa com gibis e caixa com livros de histórias infantis. A criança hiperativa, quando faz uma atividade do
começo ao fim, geralmente termina antes dos outros. Nesse caso, deixe que ela leia revistinhas ou livros, como
forma de premiação. Mas certifique-se de que o aluno está realmente lendo e não fingindo que lê. Dê a ele
atividades de leitura com responsabilidade. Peça, por exemplo, que ele conte para os outros o que leu, o que
achou legal na história, qual é o personagem mais engraçado, mais maluco, inteligente, diferente etc. Ou então
peça para ele desenhar a história lida, o que vale tanto para gibis como para livros de histórias.
2- Palavras cruzadas, jogos de trilha, atividades com figuras (jogo dos sete erros ligue os pontos, encontre a
figura escondida). É importante oferecer à criança hiperativa atividades diversificadas que exijam atenção mas
que não a desgaste intelectualmente. Assim, ela terá sempre prazer em executá-las. Essas atividades têm também
a função de premiar o aluno por ter terminado o trabalho rotineiro com atenção.
3- Atividades que estimulem as quatro operações: somar, subtrair, multiplicar e dividir, todas com desenhos
que contextualizem o assunto.
4- Aparelho de som e fitas ou CDs de música erudita. Esse tipo de música mantém o ambiente calmo e pode ser
tocado enquanto os alunos fazem as atividades. Com isso, você também estará educando musicalmente as
crianças.
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TRANSTORNO DO DÉFICIT DE ATENÇÃO / HIPERATIVIDADE (TDA/H)
DEFINIÇÃO
É um distúrbio que atinge aproximadamente 6% de crianças e adolescentes em idade escolar segundo estatísticas
mundiais.
CARACTERÍSTICAS
- Prejuízo na capacidade de concentração, atenção e planejamento, que pode ou não está associado a uma
agitação excessiva ou a impulsividade para agir;
- Baixo rendimento escolar.
CAUSAS
- O distúrbio ainda não tem uma causa única comprovada;
- Origem genética;
- Desajuste de duas substâncias que fazem a comunicação entre os Neurônios ( células nervosas ) a
Noradrenalina e a Dopamina.
LOCALIZAÇÃO AO NÍVEL CEREBRAL:
Córtex pré- frontal (área do cérebro que controla a razão e a emoção ).
DIAGNÓSTICO:
O QUE OCORRE AO NÍVEL CEREBRAL
Os Neurotransmissores (Noradrenalina e Dopamina) não vão trabalhar em harmonia, aumentando a dispersão e
agitação;
O cérebro vai funcionar mais aceleradamente, filtrando menos informações;
Vamos observar avalanches incontroláveis de dados na mente do portador de TDAH;
Dependendo da intensidade vai prejudicar a memória, o aprendizado e a rotina.
O diagnóstico precoce é o meio mais eficiente de ajudar os portadores a crescerem sem traumas.
TRABALHO COM OS PAIS:
Esclarecimento e informações para procura de tratamento especializado.
TRABALHO DOS PROFESSORES:
Os professores precisam de paciência e disponibilidade;
Tratamento diferenciado com mais atenção e rotina especialmente estimulante;
Encaminhar o caso para especialistas para confirmar o diagnóstico.
OBSERVAR SE O ALUNO EXIBE OS SEGUINTES SINTOMAS:
Trabalhe com pequenos grupos, sem isolar as crianças hiperativas;
Dê tarefas curtas ou intercaladas, para que elas possam concluí-las antes de se dispersar;
Elogie sempre os resultados;
Use jogos e desafios para motivá-las;
Valorize a rotina, pois ela deixa as crianças mais seguras, mas mantenha sempre elevado o nível de estímulo,
através de novidades no material pedagógico;
Permita que elas compensem os erros: sutilmente, faça-as pedir desculpas quando ofenderem os colegas ou
convença-as a arrumar a bagunça em classe;
Repita individualmente todo comando que for dado ao grupo e faça-o de forma breve e usando sentenças
fáceis de entender;
Peça a elas que repitam o comando, para ter certeza de que escutaram e compreenderam o que você quer;
Dê uma função oficial às crianças, como a de ajudante do professor; isso pode melhorar o relacionamento
delas com os colegas e abrir espaço para que elas se movimentem mais;
Mostre os limites de forma segura e tranquila, sem entrar em atrito;
Oriente os pais a procurar um psiquiatra, neurologista, psicólogo, terapeuta ocupacional, Fonoaudiólogo,
pedagogo e/ou profissional especializado em desenvolvimento infantil.
Recursos materiais que poderão estar sempre ao alcance dos alunos na sala de aula
Caixa com gibis e caixa com livros de histórias infantis. A criança hiperativa, quando faz uma atividade do
começo ao fim, geralmente termina antes dos outros. Nesse caso, deixe que ela leia revistinhas ou livros, como
forma de premiação. Mas certifique-se de que o aluno está realmente lendo e não fingindo que lê. Dê a ele
atividades de leitura com responsabilidade. Peça, por exemplo, que ele conte para os outros o que leu, o que
achou legal na história, qual é o personagem mais engraçado, mais maluco, inteligente, diferente etc. Ou então
peça para ele desenhar a história lida, o que vale tanto para gibis como para livros de histórias.
Palavras cruzadas, jogos de trilha, atividades com figuras ( jogo dos sete erros, ligue os pontos, encontre a
figura escondida ). É importante oferecer à criança hiperativa atividades diversificadas que exijam atenção mas
que não a desgaste intelectualmente. Assim, ela terá sempre prazer em executá-las. Essas atividades têm também
a função de premiar o aluno por ter terminado o trabalho rotineiro com atenção.
Atividades que estimulem as quatro operações: somar, subtrair, multiplicar e dividir, todas com desenhos que
contextualizem o assunto.
Aparelho de som e fitas ou CDs de música erudita. Esse tipo de música mantém o ambiente calmo e pode ser
tocado enquanto os alunos fazem as atividades. Com isso, você também estará educando musicalmente as
crianças.
ATIVIDADE AVALIATIVA
Após discussões estabelecidas a respeito das múltiplas inteligências, desenvolver atividades, que estimulem
aspectos cognitivos como: criatividade, memória, atenção, concentração, iniciativa, tolerância, raciocínio e
linguagem, dentre outros aspectos relacionados as inteligências intra e interpessoal.
INDICAR NO PLANEJAMENTO DA ATIVIDADE OS SEGUINTES ASPECTOS:
Denominação da atividade: Atividades para estimular as múltiplas inteligências
Procedimentos da atividade: metodologia que contemplem aspectos multisensorias
Objetivos da atividade: Desenvolver as múltiplas inteligências
Recursos a serem utilizados: Música, data-swow, dinâmicas de apresentação
CRITÉRIOS AVALIATIVOS:
Participação, organização e planejamento da atividade;
Apresentação dos grupos das atividades elaboradas;
Datas das apresentações: 14 e 15/09/2012
Início das apresentações: 8h o tempo contemplado para cada equipe se apresentar será de 30 minutos.