armazÉns do instituto brasileiro do cafÉ: o legado … · as mudanças na conjuntura...
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4O COLÓQUIO IBERO-AMERICANO PAISAGEM CULTURAL, PATRIMÔNIO E PROJETO Belo Horizonte, de 26 a 28 de setembro de 2016
ARMAZÉNS DO INSTITUTO BRASILEIRO DO CAFÉ: o legado de uma paisagem cultural no norte do Paraná
BARBOSA, RAQUEL A. (1); SOUZA, GISELA B. (2)
1. Universidade Estadual de Maringá. Departamento de Arquitetura e Urbanismo
Av. Colombo, 5790 - Jardim Universitario, Maringá - PR, 87020-900 [email protected]
2. Universidade Federal de Minas Gerais. Escola de Arquitetura. Departamento de Urbanismo
Rua Paraíba, 697 - Funcionários, Belo Horizonte – MG 30130-140 [email protected]
RESUMO
Criado em 1952 a fim de executar uma política cafeeira nacional, bem como regular a comercialização do café, o Instituto Brasileiro do Café foi extinto em 1990. A atuação deste instituto se dava por meio da fixação de um valor mínimo para o grão no mercado externo e interno, visando garantir a rentabilidade da produção. Essa política materializou-se em uma rede de gigantesco armazéns ao longo das sedes urbanas inseridas nas regiões produtoras, cuja a única finalidade era a estocagem e redistribuição do café. O processo de ocupação do Norte do Paraná esteve fortemente atrelado à expansão da economia cafeeira e justamente no período áureo da atuação do IBC – entre 1952 e 1967, quando a contribuição desta comodity para as divisas nacionais oscilou entre 74% a 55% do total – esta região foi sua principal produtora no âmbito nacional. O presente artigo visa destacar o papel do IBC como importante agente na configuração de uma Paisagem Cultural da produção cafeeira no Norte do Paraná e também sua condição de representar hoje – por meio de seus antigos armazéns – um dos poucos vestígios materiais remanescentes desta prática que motivou o rápido povoamento da região e entrou em declínio a partir de meados dos anos 1970. O artigo analisa a atuação específica deste instituto no Norte do Paraná, bem como sua pregnância de memória coletiva local. A fim de demonstrar a importância do IBC e de seus armazéns na configuração de uma Paisagem Cultural da produção cafeeira no Norte do Paraná o presente estudo optou por enfocar sua análise em três sedes urbanas: Maringá. Marialva e Paiçandu. Demonstra-se o papel de seus armazéns na morfogênese destas cidades e descreve-se seu atuado estado de conservação. O artigo conclui destacando a necessidade de preservação destes importantes vestígios de uma Paisagem Cultural da produção cafeeira no Norte do Paraná.
Palavras-chave: Paisagem Cultural; Patrimônio Territorial; Instituto Brasileiro do Café.
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Considerações Iniciais
O mercado internacional do café foi o grande impulsor da economia brasileira entre o período
republicano até meados do século XX. Neste lapso temporal, a economia brasileira esteve
intrinsicamente vinculada à produção deste produto primário e das flutuações de seus valores
de exportação. A pungência econômica desta produção é corroborada pela constante
presença da burguesia cafeeira no cenário político brasileira, principalmente na primeira
república (OLIVEIRA, 2012). Logo, a dependência da economia brasileira dos valores de
comercialização destas comodity, por um lado, e a importância política da burguesia cafeeira,
por outro, justificam uma série de ações e intervenções estatais que culminariam à criação o
Instituto Brasileiro do Café.
Entre 1906 – data do Convênio de Taubaté – e a crise de 1929, as medidas intervencionistas,
classificadas como “operações valorizadoras”, foram patrocinadas pelos governos dos
Estados produtores do grão (CANCIAN apud OLIVEIRA, 2012). Estabelecia-se, neste
contexto, um valor mínimo ao café que, caso não fosse atingido, parte da produção seria
comprada e a estocada pelo Estado, estabilizando artificialmente o valor do café (OLIVEIRA,
2012). Contudo, devido às oscilações do mercado internacional consumidor de café,
consolidou-se paulatinamente a ideia de um planejamento de alcance nacional. Dessa forma,
durante a primeira era Vargas, foi criado o Departamento Nacional do Café (DNC),
subordinado ao Ministério da Fazenda, cujo objetivo era garantir o avanço e a otimização da
cultura cafeeira (SILVA, 1994 apud OLIVEIRA, 2012).
Com o fim da Segunda Guerra, a reabertura do mercado europeu e aumento de consumo dos
Estados Unidos, o mercado internacional de café alcançou uma prosperidade sem
precedentes na história. No Brasil, o café, que em 1946 correspondia 36% das divisas
arrecadas, aumentou sua participação em 1948 para 42% e chegou aos impressionantes 74%
em 1952, ano de criação do IBC. Até o ano de 1967, estes índices mantiveram-se a uma
porcentagem nunca inferior à 55% (OLIVEIRA, 2012). Neste período, ocorreu uma mudança
crucial na cafeicultura brasileira que representou o auge das intervenções estatais na política
cafeeira: a criação do Instituto Brasileiro do Café, 1952, durante o segundo governo varguista.
(OLIVEIRA, 2012).
O processo de ocupação do Norte do Paraná esteve fortemente atrelado à expansão da
economia cafeeira, justamente no período áureo da atuação do IBC, entre 1952 e 1967,
quando a contribuição desta comodity para as divisas nacionais oscilou entre 74% a 55% do
total, esta região foi sua principal produtora no âmbito nacional. O presente artigo visa
destacar o papel do IBC como importante agente na configuração de uma Paisagem Cultural
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da produção cafeeira no Norte do Paraná e também sua condição de representar hoje – por
meio de seus antigos armazéns – um dos poucos vestígios materiais remanescentes desta
prática que motivou o rápido povoamento da região e entrou em declínio a partir de meados
dos anos 1970. Para tanto, o presente artigo se apoia na definição de Paisagem Cultural como
“marca do trabalho sobre o território”, como âmbito geográfico associado a uma atividade
(SABATÉ, 2004).
O artigo se apoia, primeiramente, na recuperação histórica da forma de atuação deste instituto
no Brasil. Na sequência analisa-se a atuação específica deste instituto no Norte do Paraná,
bem como sua pregnância de memória coletiva local. A fim de demonstrar a importância do
IBC e de seus armazéns na configuração de uma Paisagem Cultural da produção cafeeira no
Norte do Paraná o presente estudo optou por enfocar sua análise em três sedes urbanas
fundadas: Maringá; Marialva e Paiçandu. Por último, demonstra-se o papel de seus armazéns
na morfogênese destas cidades e descreve-se seu atuado estado de conservação.
A Criação do Instituto Brasileiro do Café
A partir de 1948 começaram a crescer as reivindicações por parte da burguesia cafeeira a
favor da criação de um órgão estatal destinado a defender os interesses da produção,
distribuição e consumo do café no país e no exterior. Entre os motivos que geraram estas
reinvindicações, cabe mencionar que parte significativa dos ganhos da comercialização do
café no mercado internacional ficavam na mão do comércio exterior (GUARNIERI, 1979). Por
outro lado, não se pode deixar de considerar a importância deste setor na economia do país
naquele momento. A criação de um órgão de âmbito nacional para reger a política cafeeira era
de grande interesse, pois possibilitaria a maximização das receitas de divisas provenientes de
suas exportações, o que era fundamental, também, para fomentar novas frentes de
investimentos no país e, significativamente, o crescimento industrial.
O crescimento industrial tornou-se cada vez mais dependente da evolução econômica do
café. Como consequência, a política cambial excluiu da pauta de exportação outros produtos.
Portanto, embora a economia cafeeira não fosse mais o centro do processo de acumulação
de capital, ela passou a assumir uma importância como elemento estratégico para o
financiamento do desenvolvimento econômico. Justificava-se também por este aspecto a
necessidade da criação de um órgão governamental voltado para política cafeeira
(GUARNIERI, 1979).
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Em 1952, por conseguinte, sob o governo de Getúlio Vargas, a lei nº 1.779 criou o Instituto
Brasileiro do Café (IBC), entidade autárquica destinada a realizar a política econômica do café
brasileiro no país e no estrangeiro. As diretrizes da lei delimitavam as funções que essa
instituição tinha:(1) a promoção de pesquisas e experimentações no campo da agronomia e
de tecnologia do café, com a finalidade de baratear o seu custo; (2) aumentando a produção
por cafeeiro e melhorando a qualidade do produto; (3) defender um preço justo para o
produtor, condicionado à concorrência da produção alienígena e dos artigos congêneres, (4)
bem como difundir o consumo do produto através de propagandas; (5) regulamentar e
fiscalizar o trânsito do café das fontes de produção para os portos ou pontos de escoamento e
consumo e o respectivo armazenamento; (6) fixar cotas de exportação por porto; (7) adotar
medidas que assegurassem a manutenção do equilíbrio estatístico entre a produção e o
consumo; (8) defender preço justo para o café, nas fontes de produção ou nos portos de
exportação, inclusive, quando necessário, mediante compra do produto para retirada
temporária dos mercados (BRASIL, 1952, art. 2º e 3º).
O IBC possuía uma estrutura básica de diversos órgãos de planejamento e controle, e uma
descentralização da estrutura administrativa, subdivida em agências regionais, agências
locais, serviços locais de assistência à cafeicultura e escritórios no exterior. As Agências
Regionais tinham sede em Belo Horizonte (MG), Caratinga (MG) Londrina (PR), Maringá
(PR), Paranaguá (PR), Rio de Janeiro (RJ), Salvador (BA), Santos (SP), São Paulo (SP),
Varginha (MG) e Vitória (ES). Os Escritórios no Exterior tinham sede em Beirute, Hamburgo,
Londres, Milão, Nova York e Tóquio, sendo que em Beirute, Hong-Kong e Triste haviam
entrepostos (BRASIL, 1976, Art. 3º e 5º).
A criação do IBC marcou mais uma fase da intervenção do estado na economia cafeeira, com
o papel de órgão regulador de tal política. Propunha-se um amplo sistema de financiamento
do grão através da afixação de um preço mínimo de compra do produto pelo Instituto em
âmbito nacional, a regulamentação da quantidade de café que seria disponibilizado para
comércio externo e no âmbito internacional. A escolha dessas diretrizes baseava-se no fato
de que a total liberdade comercial para o café conduziria a uma situação de superprodução e
uma súbita baixa nos preços (GUARNIERI, 1979).
Em 1961, em virtude de uma superprodução que desencadeou uma baixa no preço dos grãos,
o IBC criou o Grupo Executivo de Racionalização da Cafeicultura (GERCA), com a intenção
de erradicar o excedente de cafezais, utilizando como ferramenta básica a renovação da
agricultura por meio da diversificação das culturas (OLIVEIRA, 2012).
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O GERCA realizava pesquisas ligadas ao cultivo do café, além de formação para produtores
rurais através de filmes, cartilhas e recursos audiovisuais, difundia novas tecnologias – desde
mudas selecionadas até o beneficiamento do café. O órgão também realizou o levantamento
aéreo-fotográfico das regiões produtoras do grão a fim de delimitar e avaliar as áreas
produtoras de café, calcular a população cafeeira, classificar as técnicas utilizadas nas
lavouras e delimitar as coberturas vegetais. Esse serviço de fotointerpretação ocorreu nos
Estados do Paraná, São Paulo, Minhas Gerais e Espírito Santo (OLIVEIRA, 2012). O material
produzido é de inegável valor histórico para a recuperação histórica da paisagem cultural do
café no país (Figura 1).
Figura 1 - Área delimitada para a realização para inventário cafeeiro no ano de 1967. Fonte: MIC/IBC/GERCA, 1970, p.61 apud Oliveira, 2012.
As mudanças na conjuntura internacional, o esmaecimento da importância da cultura do café
no âmbito da economia nacional e a substituição dessa cultura por produções agrícolas
mecanizadas e mais rentáveis criaram o quadro que permitiu a promulgação da a lei nº8029
de 12/04/1990, que autorizou o poder executivo a extinguir o IBC e incorporou seus bens
imóveis e móveis ao patrimônio da União, sob responsabilidade da Secretaria de
Administração Federal. Sendo que o decreto 99.240, de 07/07/1990 extingue a autarquia, até
o fim desse processo, o IBC ficou vinculado ao Ministério da Economia, Fazenda e
Planejamento.
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O IBC como agente indutor de uma paisagem cultural no Norte do
Paraná
A implantação da cafeicultura paranaense, seguiu o seguinte eixo: Baixada Fluminense, Vale
do Paraíba, interior de São Paulo, até chegar no Norte do Paraná, sendo que o café operou na
região a maior obra de desenvolvimento urbano. A produção paranaense em menos de 30
anos de cultivo, entre as décadas de 30 e 60, passou de uma participação na produção
nacional inferior à 5% para mais de 50%. Contudo, ainda o Norte do Paraná tenha se tornado
a principal região produtora de café nos anos 1960, a implantação deste cultivo na região
encontrou muitos obstáculos: a crise de 1929, o fantasma da superprodução, confisco
cambial, a Segunda Guerra Mundial, geadas muito violentas, entre outros tantos (OLIVEIRA,
1978).
O Norte do Paraná é fruto de um grande empreendimento imobiliário rural-urbano orquestrado
pela companhia colonizadora Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP), subsidiária da
empresa de capital britânico Paraná Platations (1924-1943), posteriormente adquirida (1943)
por um grupo de empresários paulistas, vindo a denominar-se Companhia Melhoramentos
Norte do Paraná (CMNP), responsável pela fundação de 63 núcleos urbanos na região
(REGO, 2009, MENEGUETTI e REGO, 2008).
Para além do parcelamento rural e da fundação dos núcleos urbanos de apoio a cafeicultura,
a expansão da estrada de ferro representava um segundo ramo dos negócios da empresa
britânica Paraná Plantations, infraestrutura estratégica para escoamento da produção e fio
condutor da implantação dos diversos núcleos de ocupação sobre o território. Com a compra
da CTNP em 1943, por um grupo paulista, há uma maior presença do Estado Nacional na
ocupação deste território: subsidia-se a compra da Cia inglesa e assume-se a propriedade e
responsabilidade da execução da expansão da ferrovia. Sob a nova jurisdição da empresa
estatal RVPSC desde 1944, as obras de expansão da ferrovia são retomadas somente após
uma década: entre 1954 e 1958 são concluídos aproximadamente 90km de extensão.
A atuação do IBC coincide com o período de expansão desta infraestrutura, face à grande
importância da cultura do café na balança comercial do país, garantir o escoamento eficiente
do produto era um fator de grande relevância na logística da produção. Em entrevista
semi-estruturada, o Engenheiro Agrônomo Éseron Rose Bührer – que trabalhou no IBC como
primeiro chefe da Agência Regional de Maringá – relatou que o IBC teve influência na
consolidação da estrada de ferro na região, pois o trem era o meio mais seguro de exportação
do produto, devido a precariedade das autoestradas (BÜHRER, 2015).
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A expansão da linha férrea e a implantação do IBC na região, portanto, fazem parte de um
mesmo processo histórico. Salienta-se que esta infraestrutura foi decisiva para ocupação
territorial desta região. Ainda que, ao logo do tempo a ferrovia perdeu seu papel comunicador
entre os núcleos urbanos, sua extensão conta parte significativa da história local, podendo
enquadrar-se na definição de parque patrimonial (SABATÉ, 2004). Percebe-se, ao longo dela,
a presença de sub-âmbitos que são as diferentes paisagens culturais referentes à ocupação
ao longo de seu eixo; é neste recorte que a atuação do IBC é indutora de uma Paisagem
Cultural da produção cafeeira.
O IBC teve uma atuação relevante na conformação da política agrária e econômica do
Paraná, com repercussões também na vida social e cultural, na delimitação de espaços e na
distribuição de renda (OLIVEIRA, 2012). O Instituto, na região norte e oeste do referido estado
possuía uma estrutura composta por 42 unidades armazenadoras, que estavam sob o
comando das Agências Regionais situadas nas duas maiores cidades fundadas pela
CTNP/CMNP: a de Londrina e da de Maringá (Figura 2). Durante a década de 1960, os
estoques governamentais tiveram um crescimento gradativo, chegando a pico no ano 1968,
quando o Norte do Paraná chegou a apresentar um estoque de 20,2 milhões de sacas,
significando um participação relativa da ordem de 38% do total acumulado pelo IBC em níveis
nacionais no período considerado (IBC, 1978/79).
A partir de 1968 ocorreu uma reversão nessa tendência acumulativa de estoque, houve o
exaurimento do excedente à níveis insignificantes. Tal fato se deu devido as situações
adversas que o parque cafeeiro paranaense sofreu com as geadas ocorridas nos anos de
1967, 1969, 1972, 1975. Dessa forma, para atender as necessidades de demanda interna e
externa de café, a Autarquia lançou mão de suas reservas, declinado significativamente o
volume de mercadoria na região. Na safra de junho de 1975 à junho de 1976, houve um
declínio de estoque brasileiro de aproximadamente 16 milhões de sacas (IBC, 1978/79).
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Figura 2 – Mapa de atuação do IBC no Estado do Paraná. Área de atuação das agências regionais do IBC no estado do Paraná. Fonte: Oliveira, 2012, p.65.
Estavam subordinados à Agência Regional de Maringá 25 municípios da porção oeste do
estado, sendo que 23 deles possuíam unidades de Serviços Locais de Assistência à
Cafeicultura (SELACs). Nem todos os municípios possuíam unidades armazenadoras; a
jurisdição de Maringá contava com 19 armazéns, distribuídos em 15 sedes urbanas1. Neste
artigo optamos por analisar de forma pormenorizada a inserção de cinco armazéns
implantados em três cidades da Regional de Maringá, fundadas pela CMNP: Maringá (1947);
Marialva (1951) e Paiçandu (1960). Juntas as cinco unidades do IBC analisadas foram
responsáveis por 36% do total da capacidade de armazenagem da Regional de Maringá – ver
tabela 01. A escolha por analisar os IBC na Regional de Maringá deu-se pelo fato de que, ao
contrário de grande parte das cidades sob jurisdição de Londrina – que como esta, foram
fundadas pela companhia inglesa –; a ocupação das cidades da Regional de Maringá deu-se
no período em que a CMNP já era uma companhia brasileira, em que o Estado Nacional
fazia-se mais presente neste território por meio da expansão da ferrovia e da atuação do IBC.
1 Três localizados em Maringá, dois em Cianorte e em Jandaia do Sul, um em: Cascavel, Cruzeiro do Oeste,
Loanda, Mandaguaçu, Mandaguari, Marialva, Moreira Salles, Nova Esperança, Paiçandu, Paranavaí, Peabirú e
Umuarama.
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Tabela 1 - Unidades Armazenadoras analisadas em relação ao total da Regional de Maringá. Fonte: Elaboração das autoras com base em IBC, 1978/79, p.11.
Unidade/Localidade Área Coberta
(m2)
Capacidade de Armazenagem
(Sacas)
Porcentagem sobre o total da Regional
Marialva 16 128 556 416 4,5%
Maringá I 24 192 846 720 7,5%
Maringá II 19 008 504 812 4,5%
Maringá III 30 240 1 058 400 9,4%
Paiçandu 31 824 1 097 928 9,7%
Total Paiçandu, Maringá e Marialva
121.392 4.064.276 36%
Total da Regional de Maringá
330 786 11 287 784 100%
Segundo Bührer, o IBC atuava na racionalização da produção, dando suporte técnico e
financeiro ao produtor. Além desses subsídios, cabia ao IBC a compra do produto e a sua
classificação e revenda para o mercado interno e externo. Outra aspecto de grande relevância
que o IBC teve na região, foi a organização e o financiamento de cooperativas ainda hoje
atuantes no agronegócio, como: a COCAMAR (Cooperativa Cafeicultores Agropecuaristas de
Maringá), a COCARI (Cooperativa dos Cafeicultores de Mandaguari). Bührer ainda relata que
ele mesmo organizou diversos cursos de cooperativismo na região, a fim de capacitar os
agentes envolvidos (BÜHRER, 2015).
Na entrevista realizada, Bührer descreveu como era a política da autarquia. Buscava-se
manter constate o valor do grão, independente das oscilações do mercado externo,
garantindo a continuidade da lucratividade da monocultura, mesmo quando o preço da saca
do café no mercado externo fosse inferior ao pago pelo IBC e vice e versa. Vale lembrar que
apenas o Instituto podia comercializar o café no mercado internacional, assim esse monopólio
dava espaço para o contrabando de café na região, que ocorria com a fronteira do Paraguai
(BÜHRER, 2015).
Questionado acerca dos motivos que puseram fim na cultura cafeeira da região, Bührer
salientou a grande quantidade de mão de obra que o plantio do café necessita:
(...)em uma propriedade com 10 mil pés de café, era necessário aproximadamente 60 pessoas no manuseio da cultura, já na cultura da soja, são necessários entre 4 a 5 pessoas. (BÜHRER, 2015)
Dessa forma, com o avanço das leis trabalhistas, manter uma propriedade com menos
funcionários tornou-se muito mais rentável (BÜHRER, 2015). Alia-se a esse fator a abertura
de novas culturas, como a soja, que necessitam de menos mão-de-obra, bem como a
mecanização do campo.
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O agrônomo Armínio Kaiser – que atuou no órgão por 46 anos, de 1953 à 1989, sendo
transferido para o Norte do Paraná logo em 1957 – lembra que, quando começou a trabalhar
no IBC, o café representava mais de 50% das receitas do Brasil e que, conforme a oscilação
da produção, chegou a representar 60 a 70%. No entanto, em 1989, quando deixou o Instituto,
o café não representava nem mesmo 2% das receitas. Dentre as diversas causas,
menciona-se o avanço da industrialização e a diversificação da agricultura, como a soja, o
trigo, milho (KAISER, 2013). O supracitado agrônomo atuou também como fotógrafo no
instituto e registrou entre 1953 e 1989 mais de duas mil imagens do trabalho e cotidiano na
cafeicultura, seu acervo iconográfico foi reunido no livro “Ao sabor do café” (Figura 3).
Figura 3 – Cotidiano nos armazéns do IBC. Registros de Armínio Kaiser. Fonte: http://camaraclara.org.br/cd_rom_kaiser/09_armazenagem.htm
Unidades armazenadoras e sua implantação no território
As unidades armazenadoras são as estruturas físicas do extinto Instituto Brasileiro do Café
cuja a única finalidade era a estocagem e distribuição da produção, logo são os principais
vestígios desta paisagem cultural. Estas eram distribuídas sobre o território de forma similar;
sempre estavam atrelados à linha férrea. Tal característica garante ao conjunto arquitetônico
uma configuração de rede de edifícios conectados pela linha férrea, o que corrobora a
hipótese levantada; a linha férrea é o fio condutor da criação de uma paisagem cultural da
produção cafeeira e o IBC seu agente indutor. Essa constância sobre o território conta uma
história, como um roteiro cinematográfico, onde os ícones são elementos fundamentais na
criação deste, e garantem ao lugar sua identidade (SABATÉ, 2004).
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Sabaté (2004) aponta que muitas vezes, os próprios moradores da região, são os mais
surpreendidos com a história narrada pois “aqueles que dormem sobre um potencial de
recursos impressionantes, dificilmente concede a ele importância(...)” (SABATÉ, 2004, p.45).
Por meio de entrevistas orais realizadas com moradores da região, percebeu-se a importância
de resgatar a história deste instituto. A atuação do IBC sobre o território é negligenciada pela
comunidade, ainda que todos recordem da importância da cafeicultura na região, sendo
recorrente a afirmação: “Naquela época era só café”. A ausência de lembrança do instituto
cujos remanescentes urbanos constituem-se em grandes armazéns – com áreas cobertas
entre 16 e 31 mil metros quadrados – é significativa. Como se demonstrará na sequência, este
esquecimento é motivado pela própria inserção urbana destas construções; são estruturas
introvertidas e ainda hoje desconectados da cidade. Entretanto, ao observar esse conjunto
com o olhar mais atento percebe-se que vinculado à sua arquitetura, sua forma de construção
e função social é possível criar um itinerário que conte a história de ocupação da região, e isso
por si só já é um grande incentivo à recuperação deste conjunto.
Figura 4 - Unidades Armazenadoras no Aglomerado Urbano de Maringá. Fonte: Google Earth. Captado pela autora em Julho de 2015.
O aglomerado urbano de Maringá, composto por Paiçandu, Maringá, Sarandi e Marialva (ver
figura 04) está inserido na rede cidades fundadas pela CMNP. Nessas cidades, os armazéns
se localizavam originalmente nas bordas originais da cidade; consoante, portanto, com o
conceito de “limite” tal qual definido por Panerai (2006): sempre à margem do plano inicial
traçado pela CMNP, geralmente implantados no tecido de chácaras, que faziam a transição
entre o tecido urbano e as glebas rurais – ver destaque em amarelo nas figuras 6, 7 e 8.
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Mantinham, portanto, uma relação ambígua com o núcleo urbano no qual se inseriam:
participavam na composição da paisagem urbana, mas não pertenciam a ela; suas atividades
vinculavam-se a produção rural, sua inserção ocorria em bordas rurbanas. Frequentemente,
com a expansão urbana, as parcelas originais em que se inseriam estes armazéns foram
envoltas pelo tecido urbano, constituindo enclaves, desvinculados das atividades e da
dinâmica do entorno urbano.
Não se tem ao certo as datas de instalação das unidades armazenadoras na região, mas com
base nas fotografias áreas das cidades é possível afirmar que foram instaladas entre as
décadas de 60 e 70. O que significa que tais armazéns compõe a paisagem da área desde os
primeiros anos desta ocupação recente, que ocorreu entre as décadas de 50 e 60. Tal fato
corrobora a relevância do IBC e de seus armazéns na configuração socioespacial da região,
bem como da paisagem cultural disseminada pela cultura do café.
De modo geral, estas unidades resumem-se a grandes armazéns edificados em uma
estrutura modular metálica, que se repete a fim de se adaptar às diferentes necessidades da
área de estocagem prevista, o que configuram áreas coberturas de dimensão monumental.
Os armazéns são elevados da cota do solo, alinhando-se com o nível do trem a fim de facilitar
o manuseio das sacas. No meio dos edifícios, a linha férrea conformava um grande rasgo
nestas plataformas elevadas, pois o trem acessava o espaço coberto dos armazéns (Figura 5).
Além desse recorte no interior, a linha férrea, em alguns casos, também contornava os
edifícios exteriormente.
Figura 5 – 1-Estrutura metálica. 2-Rasgo na plataforma para acesso do trem Registros de Armínio Kaiser. Fonte: http://camaraclara.org.br/cd_rom_kaiser/09_armazenagem.htm
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Os armazéns possuíam portas nas duas laterais. O afastamento entre as portas era calculado
com base na distância que o cargueiro faria entre a retirada da saca do trem até o armazém, a
fim de criar menores distâncias e, portanto, menores custos (BÜHRER, 2015). Além dessas
aberturas, o edifício conta com uma iluminação zenital que ocorre através de telhas
translúcidas, como poder ser analisado nos registros históricos de Armnínio Kaiser.
Atualmente, já se observa uma tendência na reutilização dos edifícios do IBC. Entretanto,
estes projetos de reconversão tratam cada unidade armazenadora de forma isolada, sem a
previsão uma articulação futura entre eles, e em alguns casos, passando o direito de uso do
edifício para iniciativas privadas, contribuindo, portanto para o esmaecimento da memória
coletiva sobre o papel que o IBC exerceu na região.
Na sequência, realizaremos uma breve análise sobre o estado atual dos barracões presentes
no aglomerado urbano de Maringá, os armazéns: Maringá I, Maringá II e Maringá III, Paiçandu
e Marialva. De modo geral, os espaços analisados estão sob a jurisdição das prefeituras
locais e têm sido reaproveitados como grandes depósitos ou repassados para iniciativas
privadas.
Unidade armazenadora de Paiçandu
O IBC de Paiçandu foi a maior unidade armazenadora da Regional de Maringá, com
31.824m2 de área coberta – ver tabela 01 – e data, provavelmente, da década de 1970.
Atualmente está sob o controle de uma cooperativa local, que utiliza o espaço para
armazenamento de grãos e óleo. A concessão do uso do armazém expirava em 2010, no
entanto até o presente momento não houve sua devolução para a prefeitura e nenhum novo
projeto foi apresentado para reutilização da área (RODRIGUES, 2010).
Para a compreensão da inserção do armazém na estruturação urbana, é preciso analisá-lo
em relação ao plano inicial projetado pela CMNP e às expansões subsequentes (Figura 6).
Observa-se que o armazém foi implantado conectado à linha férrea, porém fora do tecido
urbano do núcleo inicial proposto, em uma gleba de chácara, configurando-se neste primeiro
momento como um “limite” (PANERAI, 2006). Logo, o armazém mantinha uma relação dúbia
com o núcleo urbano: apesar de sua implantação denotar autonomia em relação a este – pois
a estrutura da cidade não era alterada pelo edifício e sua dinâmica vinculava-se ao meio rural
–, sua grande dimensão e sua proximidade relativa faziam com que este participasse do
cenário urbana. Com o adensamento urbano e anexação de novos bairros para leste da
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cidade, a junção do armazém, o campo de esportes e o cemitério passou a configurar um
grande enclave, configurando, portanto, uma urban fringe belt (CONZEN, 2008). Ainda hoje
edifício está no limite entre a área urbanizada e áreas de expansão recente, nas quais glebas
rurais e novos loteamentos coexistem. Outro aspecto que se revela na leitura da cartografia
elaborada pelo Exército com base em vôo aéreo de 1980 – ver figura 06 – é o declínio
significativo da produção cafeeira na região – comparar com as figuras 07 e 08 –, bem como
do próprio IBC que não é mais identificado no mapa.
Figura 6 – Mapa de Paiçandu de 1990 elaborado com base em levantamento aéreo de 1980. Em amarelo claro: lote de inserção do IBC. Em magenta: o armazém do IBC. Linha azul: ferrovia. Linha laranja: Estrada Velha. Linha vermelha: Rodovia PR 323. Linha amarela tracejada: limites do plano da CMNP. Em azul claro: campo de esportes e cemitério. Fonte: Carta do Exército de 1990, adaptado pelas autoras.
Unidades Armazenadoras de Maringá
Na cidade de Maringá foram implantados três armazéns. Entre os anos de 1952 e 1963,
momento em que o espaço produtivo rural da região dedicava-se quase que exclusivamente à
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cultura cafeeira (Figura 7), foram implantados dois armazéns. O primeiro, o IBC Maringá I –
com uma área coberta de 24.192m2 –, foi implantado a margem do plano inicial da cidade,
próximo à Estrada Velha – primeira eixo de ligação entre as cidades do aglomerado – e às
áreas destinadas às atividades produtivas – a menos de 1km da zona industrial e da zona 3,
bairro operário destinado à baixa renda no plano inicial da cidade. Apesar da grande
dimensão do armazém, verifica-se também que sua implantação não alterou a estrutura
urbana original da cidade, inserindo-se em lote rural e conformando um limite na paisagem da
época. (Figura 7).
Em 1963, no entanto, observa-se que já se esboçava como um enclave, com o início de
ocupação de novos loteamentos para além do plano original (Figura 7). Com o passar dos
anos, o crescimento e a densificação do tecido urbano adjacente, não apenas o envolveu por
completo, como, também, veio a exercer pressão em sua parcela original, modificando-a. De
todos as unidades encontradas no aglomerado, este foi o único caso em que não se verificou
o ramal que permitia a conexão original entre o edifício e a ferrovia, esta parte do lote foi
perdida devido a construção de um viaduto. Tal processo que transformou o armazém de
limite a enclave, inserindo-o em um tecido residencial.
Atualmente uma parte do armazéns está sob o controle da Prefeitura Municipal de Maringá,
que o utiliza como central de compras e abastecimento da cidade e também como depósito.
Outra parte do edifício foi recentemente doada à Incubadora Tecnológica de Maringá, órgão
vinculado à Universidade Estadual de Maringá, que vem fazendo alterações na estrutura do
local. A sede da Incubadora Tecnológica de Maringá no antigo armazém do IBC foi
inaugurada em 2013 e conta com um espaço projetado para 12 empresas, atualmente todo
ocupado. (INCUBADORA TECNOLÓGICA DE MARINGÁ,2013)
O segundo armazém em Maringá, construído ainda antes de 1963, foi localizado entre a
ferrovia e a BR 376 – nova estrutura regional que veio a substituir o papel antes exercido pela
Estrada Velha. Este edifício possui uma área coberta de 19.008m2, e hoje está sob posse da
Polícia Federal, que o utiliza para estocagem de veículos apreendidos.
O segundo armazém implantado em Maringá também estava inserido fora do plano inicial da
cidade em uma gleba rural, de forma espelhada a primeira unidade armazenadora de
Maringá, próximo à zona 6 – bairro destinado à classes média e baixa –, configurando-se
também como um limite da paisagem entre a área urbana e a rural (Figura 7). Com a
expansão urbana, a gleba rural na qual o edifício se encontra foi envolta pelo tecido urbano.
Entretanto este processo correu de forma distinta ao do IBC Maringá I, no qual entorno
tornou-se predominantemente residencial; nesta região observa-se o desenvolvimento de um
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tecido industrial esgarçado, com muitos vazios urbanos oriundos da ocupação dispersa da
gleba rural original. Vale ressaltar que o lote no qual se insere o armazém faz divisa com
equipamentos introvertidos e o fundo de vale do Ribeirão Maringá, conformando com esses,
ainda hoje, um hiato urbano.
Último armazém a ser inserido, o Maringá III, provavelmente em meados da década de 70,
possui 30.240m2 cobertos, sendo o maior da cidade. Localiza-se na continuidade da linha do
trem, à leste da cidade de Maringá, próximo à área conurbação entre Maringá e Sarandi. Vale
ressaltar que o edifício está a menos de 1 km da outra unidade armazenadora do IBC, o
Maringá I, tendo apenas a pista do antigo aeroporto entre eles, em lote desmembrado do
campo de pouso. No momento de sua implantação, o fenômeno de conturbação entre
Maringá e Sarandi, que viria a modificar significativamente sua implantação, ainda não se
manifestava. O IBC Maringá III estava, portanto, novamente no limite entre a área urbanizada
e área rural (Figura 7).
Este armazém encontra-se hoje desocupado, entretanto, a prefeitura Municipal de Maringá o
doou as instalações para um grupo de empresários, que pretende utilizá-las para a criação de
parque tecnológico, o projeto fora denominado de “armazém digital”. Segundo o grupo de
empresários, o “Armazém Digital de Maringá” será um parque tecnológico que visará o
desenvolvimento de soluções em tecnologia (ARMAZÉM DIGITAL, 2014). O projeto não
prevê em nenhum uso voltados à comunidade ou vinculado ao fortalecimento da memória
coletiva.
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Figura 7 - Mapa de Maringá de 1972 elaborado com base em levantamento aéreo de 1963. Em amarelo claro: lote de inserção do IBC. Em magenta: o armazém do IBC. Linha azul: ferrovia. Linha laranja: Estrada Velha. Linha vermelha: Rodovia BR 376. Linha amarela tracejada: limites do plano da CMNP. Em azul claro: Antigo Aeroporto, hachura amarelo claro: local no qual se implantou o Maringá III em meados de 1970. Em verde musgo: Lavouras de café. Fonte: Carta do IBGE de 1972, adaptado pelas autoras.
Unidade Armazenadora de Marialva
O armazém de Marialva foi implantado, antes de 1963, em local afastado da do plano inicial
cidade, em uma área de parcelamento de sítios, junto a ferrovia e à Estrada Velha. Com a
expansão urbana da cidade, o armazém acabou sendo envolto por um tecido industrial.
O edifício fora doado ao município em 2015, até então a municipalidade possuía apenas a
concessão de uso, segundo nota da prefeitura da cidade prevê-se a instalação de órgãos
institucionais no local (MARIALVA, 2015). Atualmente o espaço vem sendo utilizado para
armazenar entulhos da prefeitura e a sua área externa como estacionamento de veículos
municipais. Este armazém possui uma área coberta de 16.128m2 e encontra-se em estado de
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degradação, com rachaduras e infiltrações aparentes, bastante avançado em relação aos
outros edifícios do aglomerado.
Figura 8 - Mapa de Marialva de 1972 elaborado com base em levantamento aéreo de 1963. Em amarelo claro: lote de inserção do IBC. Em magenta: o armazém do IBC. Linha azul: ferrovia. Linha laranja: Estrada Velha. Linha vermelha: Rodovia BR 376. Linha amarela tracejada: limites do plano da CMNP. Em verde musgo: Lavouras de café. Fonte: Carta do IBGE de 1972, adaptado pelas autoras.
Conclusão
Os armazéns do IBC são os vestígios histórico desta extinta Instituição, bem como
testemunhas de uma relevante parte da história da região: o ciclo do café, que fora a
economia motriz de ocupação da região norte paranaense, e atualmente estão subutilizados
e/ou abandonados As iniciativas das municipalidades levam a crer que se não ocorrer
nenhuma ação conjunta nesses espaços, eles continuarão a cumprir o papel de depósito, ou
serão passados para a inciativa privada, alienando da população parte de sua memória
coletiva.
A paisagem cultural produzida e induzida pelo IBC constitui-se de um conjunto maior que
apenas os seus armazéns. Ainda que a prática da produção cafeeira seja atualmente escassa
região; as marcas desta que foi outrora sua única cultura agrícola permanecem sobre o
território rural e urbano, tendo a linha férrea como fio condutor da construção destas
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paisagens culturais da cultura do café e os lotes periurbanos de inserção como local de tensão
entre o rural e o urbano, entre o passado e o presente.
Este trabalho buscou, portanto, por meio da análise de uma pequena amostra, demonstrar
que é possível – e necessário – caracterizar a rede de armazéns implantados pelo IBC como
parte patrimônio cultural desta região de ocupação recente. Trata-se de afirmar a importância
do resgate de sua história, tanto de seus aspectos físicos, como em sua contribuição para a
organização sociocultural e econômica da região. A reabilitação deste conjunto arquitetônico
e sua reinserção na dinâmica urbana podem vir a contribuir para a construção dessa
identidade cultural, não apenas na região estudada, bem como em todos os locais nos quais
tais estruturas estão presente.
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