argan. cubismo (cap)

8
5/10/2018 Argan.Cubismo(Cap)-slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/argan-cubismo-cap 1/8 528 como realidade revelada, mas justamente por isso realca a da arte e investiga e valoriza os process os pelos quais, no da hlstoria, e ssa cri at ivi dad e s e rea li zou: li nha, f orma, c or et c.j a o cubismo e ele tambern, ao grau maximo, pintura de museu da inteno;;:ao,a objecao nao e inf unda da nem o f ens i va. Na re ali - L; U..... " ,. ••- pas as bases de uma nova figuracao, que nao descende da experiencia historica; mas se reflete nela e a clariflca: nao quem serve de guia para a arte moderna, mas a arte moderna :OIl::;ULl.U a experiencia formal sem a qual nao e possivel entender :;;;:!:itlliallrta corrsciencia ou por c(:)rrlo'problema a arteantiga: Se' o homem comum, diante de urn Rafael ou de um Caravaggio, se mais pelos valores de forma e cor do que pela docura ou pela dos rostos, 0merito desse maior acerto da avaliacao remonta ao ou a cultura da qual ele partiu e cujo ambito ampliou ilimitada- . Os pr opr ios teo ri cos d o cu bis mo , c omo Gl ei zes e Lhot e, sent ir am a de rec onst ru ir s egund o a nova e xper ien cia for ma l 0 percurso da arte, chegando a conclusao de que 0cubismo representa a de fi nit iv a do r omant ismo e a reva lor iz acao da ide ia cl ass ic a, ou valor eterno da forma. Ve-se dai como 0cubismo, propondo-se ger al da art e, impl ica uma f uncao c ri ti ca n a f unca o e xpre ssi - de todo carater Imaginative ou fantastico: toda nova obra de in nuce [ em e mb ri ao l, c omo a bs ol ut a novidade for mal, a critica de a rt e a nt er io r. S6 assim ela pode realmente ser umJato novo, que se na serie temporal como puro presente. "Tudo 0que fiz", garante "sempre foi para 0presente, na esperanca de que permaneca no presente." carater de critica em ato, ao mesmo tempo destrutiva e recons- conferido a obra de arte como superacao e renovacao dos esque- visao, explica como, por mais de um aspecto, 0cubismo cabe no da grande renovacao da teoria da arte conhecida pelo nome de d a v is ib il id ad e p ur a". Qu an do se nega c at eg or ic ame nt e 0conceito como expressao de um conteudo (que atribui a invencao um secundario e aplicativo, obrigando-a a aderir a algo dado), e se pr in cip io da fo rma c omo at e aut onomo da cons cie nci a, e c la ro q ue e fim da atividade artfstica e a criacao de formas, que apenas del a al canc arn a exi st enci a" ( Fied ler ). 0 in ter ess e s e con cent ra . es sa na me nt e no Jazerdo artista, na atividade do olho e da mao; ja nao separar 0momento ideativo do executive, a obra de arte deixa de renroducao de objetos, e se torna ela mesma objeto. A r elacao entre as cu bis tas e as teorias da v is ibi li dad e n ao e d ir et a c omo seria, pou- mais tarde, a relacao entre as ideias de Fiedler e a didatica formal 529 CYBfERCOPY COPIADORA ILAN H O US E E L AN C H ON E TE o GUB/SMO Ha vinte anos, Ozenfant e ]eanneret declararam que tudo fei to na ar te fi gur at iva , de 1912 em diante, foi feito em nome ou contra ele; de fato, nenhuma corrente artfstica d e a lg uma surgiu, nas ultimas quatro decadas, sem partir direta ou renovacao total das leis da visao realizada pelos pintores revolucao, que nao tern igual na historia da arte desde 0n-_UGL>L exerceu sua influencia sobre toda a esfera das atividades poesia a rmisica, da arquitetura ao teatro. Seu ambito abrange e fenomenos multo dessemelhantes e amhide pertencentes a r ent es, mas t odo s dependentes do principio de que a arte, s er re pre sent aca o cat art ic a e Ii ber ador a da rea li dade ext er ior , consciencia que poe e constr6i a realidade, portanto ate de pleno, inclusive no sentido humane e social. A propria posicao no mundo adquire urn novo valor. "Os grandes poetas e os grandes tern a missao social de renovar continuamente as aparencias que reza assume aos olhos dos homens. Sem os poetas e os artistas os se aborreceriam logo da monotonia natural: a ideia sublime que u ni ve rs e d ec ai ri a c om r ap id ez v er ti gi no sa " ( Ap ol li na ir e) . PREMI SSAS TEORICAS DO CUBISMO o cubisrno nao promulgou uma nova estetica, ao contrario, pas a toda estetica possfvel, como teoria do bela natural, urna f az er a rt is ti co , e a concepcao da forma como transcendencia, a da forma como i rnan enci a abso lut a. Sua at it ude e revolucionaria, subversiva: rejeita 0principio da imitacao e nega 0valor eaa

Upload: historiaculturaearte

Post on 09-Jul-2015

195 views

Category:

Documents


2 download

TRANSCRIPT

Page 1: Argan. Cubismo (Cap)

5/10/2018 Argan. Cubismo (Cap) - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/argan-cubismo-cap 1/8

528

como realidade revelada, mas justamente por isso realca a

da arte e investiga e valoriza os process os pelos quais, no

da hlstoria, essa criatividade se realizou: linha, forma, cor etc.ja

o cubismo e ele tambern, ao grau maximo, pintura de museu

da inteno;;:ao,a objecao nao e infundada nem ofens iva. Na reali-

L;U. . .. ." ,. •• - pas as bases de uma nova figuracao, que nao descende

da experiencia historica; mas se reflete nela e a clariflca: nao

quem serve de guia para a arte moderna, mas a arte moderna

:OIl::;ULl.U a experiencia formal sem a qual nao e possivel entender:;;;:!:itlliallrtacorrsciencia ou por c(:)rrlo'problema a arteantiga: Se'

o homem comum, diante de urn Rafael ou de um Caravaggio, se

mais pelos valores de forma e cor do que pela docura ou pela

dos rostos, 0merito desse maior acerto da avaliacao remonta ao

ou a cultura da qual ele partiu e cujo ambito ampliou ilimitada-

.Os proprios teoricos do cubismo, como Gleizes e Lhote, sentiram a

de reconstruir segundo a nova experiencia formal 0percurso

da arte, chegando a conclusao de que 0cubismo representa a

definitiva do romantismo e a revalorizacao da ideia classica, ou

valor eterno da forma. Ve-se dai como 0cubismo, propondo-se

geral da arte, implica uma funcao critica na funcao expressi-

de todo carater Imaginative ou fantastico: toda nova obra de

in nuce [em embriaol, como absoluta novidade formal, a crit ica dearte anterior. S6 assim ela pode realmente ser umJato novo, que se

na serie temporal como puro presente. "Tudo 0que fiz", garante

"sempre foi para 0presente, na esperanca de que permaneca

no presente."

carater de critica em ato, ao mesmo tempo destrutiva e recons-

conferido a obra de arte como superacao e renovacao dos esque-

visao, explica como, por mais de um aspecto, 0cubismo cabe no

da grande renovacao da teoria da arte conhecida pelo nome de

da visibilidade pura". Quando se nega categoricamente 0conceito

como expressao de um conteudo (que atribui a invencao um

secundario e aplicativo, obrigando-a a aderir a algo dado), e se

principio da forma como ate autonomo da consciencia, e claro quee fim da atividade artfstica e a criacao de formas, que apenas

dela alcancarn a existencia" (Fiedler). 0 interesse se concentra

.essanamente no Jazerdo artista, na atividade do olho e da mao; ja nao

separar 0momento ideativo do executive, a obra de arte deixa de

renroducao de objetos, e se torna ela mesma objeto. Arelacao entre as

cubistas e as teorias da visibilidade nao e direta como seria, pou-mais tarde, a relacao entre as ideias de Fiedler e a didatica formal

529

CYBfERCOPYCOP I A DORA IL A N H O US E E L AN C H ON E TE

oGUB/SMO

Ha vinte anos, Ozenfant e ]eanneret declararam que tudo

feito na arte figurativa, de 1912 em diante, foi feito em nome

ou contra ele; de fato, nenhuma corrente artfstica de alguma

surgiu, nas ultimas quatro decadas, sem partir direta ou

renovacao total das leis da visao realizada pelos pintores

revolucao, que nao tern igual na historia da arte desde 0n-_UGL>L

exerceu sua influencia sobre toda a esfera das atividades

poesia a rmisica, da arquitetura ao teatro. Seu ambito abrange efenomenos multo dessemelhantes e amhide pertencentes a

rentes, mas todos dependentes do principio de que a arte,

ser representacao catartica e Iiberadora da realidade exterior,

consciencia que poe e constr6i a realidade, portanto ate de

pleno, inclusive no sentido humane e social. A propria posicao

no mundo adquire urn novo valor. "Os grandes poetas e os grandes

tern a missao social de renovar continuamente as aparencias que

reza assume aos olhos dos homens. Sem os poetas e os artistas os

se aborreceriam logo da monotonia natural: a ideia sublime que

universe decairia com rapidez vertiginosa" (Apollinaire).

PREMISSAS TEORICAS DO CUBISMO

o cubisrno nao promulgou uma nova estetica, ao contrario,

pas a toda estetica possfvel, como teoria do bela natural, urna

fazer artistico, e a concepcao da forma como transcendencia, a

da forma como irnanencia absoluta. Sua atitude e revolucionaria,subversiva: rejeita 0principio da imitacao e nega 0valor e a a

Page 2: Argan. Cubismo (Cap)

5/10/2018 Argan. Cubismo (Cap) - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/argan-cubismo-cap 2/8

530

tradi~ao de pintura. "Urn quadro nao e pensado e prepa-

muda enquanto e feito, como mudam nossos pensamentos,

ta acabado continua mudando, adequando-se a condicao dees . f' dde qualquer urn que 0olhe." Se antes 0pintor, uma vez rxa a

numa imagem mental, interrompia 0ritmo de sua existencia, se

ao impulso de novas sensacoes e; s~mpre contemplando ~quela

a repetia na tela 'mediante uma tecruca meramente executrva ou

agora 0perfodo da operacao artfstica passa a ser uma faseC)I.~.:)L~•• -.-, durante a qual as relacoes com 0mundo nao apenas

IHIJ-U •• mas tambem se intensificam, porque 0fazer artisti-

todo fazer, e estabelecer novas relacoes com 0mundo, ou seja,

no tempo e no espaco. A obra de arte ja nao e uma experiencia

transmitida como exemplar, mas experiencia que se curnpre, se

supunha-se que a obra de arte fosse sempre uma aproxirnacao

a uma Imagem mental irrealizavel em sua integridade, agora a

-ooorciona sempre algo a mais do que a intuicao inicial; e esse algo

existircomo coisa ou objeto da realidade. Picasso deelara nao

no corneco do quadro, senao urna vaga ideia de forma, que se defi-

corpo no decorrer do trabalho, com maior precisao, Juan Gris

que a emocao se verifica apenas quando 0q?adro esta aca~ado.!:

emocionada e substituida pela forma ernocionante; a realidade Ja

de partida, mas de chegada, por se produzir de fato na obra de

nao pode mais ser imitacao ou representacao de uma realidade ja

Arealidade que e descoberta gracas a obra de arte e necessaria-

distinta da nocao, do mesmo modo que a verdade descoberta gracas

e distinta da aparencia, como a ciencia, a arte nao interpreta ou

o dado, mas poe ou institui concretamente a realidade.

entanto, seria urn erro julgar que 0cubismo marca simplesmente

de urn espritdegeometriesobre 0romantico espritdefinesse; ao

, como virnos, ele visa colo car a . arte como funcao vitaL 0 pro-

artfstico como todo ate da existencia, tern urn desenvolvimento no

e no tempo, que ja nao sao pensados como categorias ~istint:s,

unidade inseparavel. Todo valor resulta de urna deslgnacao

rnesmo tempo espacial e temporal: a intensidade da sensacao ~ue

pode ser avaliada tanto como extensao quanta como duracao.

processo, no entanto, se diferencia de todos os outros processos da

por urn carater mais marc ado de criatividade - e born Iern-

. . .. .0ca.rater.... .••.. da

novo e rnais puro. Teriteriics reconstruir 0processo:

. de natureza (porque, pelo menos na prirneira fase, ~ita analit~ca

_ . _ " . ' ~ . _ . = ,0cubismo nao pode renunciar a partir do objeto), 0pm-

de Gropius e de seus colaboradores da Bauhaus; mas vale

novas teorias da visao nascem na tentativa de sistematizar a

primeira pintura impressionista e que essa e tambem a -... .- . .. ..a.u

do cubismo, ainda que referida particularmente a Cezanne.

pode se deixar de indicar, entre as correntes de ldeias que

duzir a espiritualidade romantica aoprofissionalismo positivo

poetica de Mallarme, que assume a palavra como valor em si, e

a esse valor fixa seu lugar no contexto, da mesma maneirara cubista, a cor possui urn valor pict6rico em si, ----.r-.

representacao da coisa colorida.

o conceito do artista-artesao ja e por si mesmo indicativo

hist6rica do cubismo. A arte deixa de ser ars liberalis, como

bida do Renascimento em diante, para se tornar mechanica,

concebida na Idade Media, de acordo com a escolastica; isso

o cubismo considera encerrado 0cielo humanista que 0

abrira e encamp a a revalorizacao da Idade Media promovida,

do seculo passado, por Ruskin e Morris em nome de uma

plena da arte como expressao de urn ethos' coletivo. A primeira

~ao hist6rica conduzida por Gleizes a partir dos fundamentos da

cubista diz respeito a arte rornanica e gotica, Maritain funda na

moderna sua tese de uma renascenca da estetica escolastica,garia a desenvolver sobre prernissas cubistas a proposicao de

arte religiosa. 0 conceito do artista-artesao modiflca SUUC:>CGU'-L o.U!

funcao atribufda ao artista pela sociedade burguesa, como

sua espiritualidade insatisfeita e inefavel, em que deveria ser

ou redimido 0rnaterialismo arido de seus interesses capitalistas; e.

duz 0artista para lima funcao nao apensa representativa, mas

mente ativa ou produtiva.

Negando ao artista toda iniciacao ou inspiracao, toda

especial de emocao perante arealidade, enfim, toda "artisticidade"

ri, coloca-se oproblerna do que realmente seriao processo

forma, pelo qual se inicia e conelui a atividade artistica. Sobre esse

Picasso foi muito explicito. Admite que os cubistas nao tinharn

intencao de mudar 0sentido dos signos ptctorfcos.riem de sair da

tecnica ou operativa da pintura: "0 cubismo semprese manteve

do limite da pintura, nunca pretendendo ir alem dele: desenho,

cor sao entendidos e aproveitados pelo cubismo no mesmo

que sao praticados e entendidos nas outras escolas" . 0 ponto de

c.=portanto, sao os signos ou valores pictoricos (linha, cor etc.), nao

principia individuation isgracas aos quais a experiencia empirica e

ralizada ou universalizada, mas como meios expressivos Cl<:lUJ!GI.uy

531

Page 3: Argan. Cubismo (Cap)

5/10/2018 Argan. Cubismo (Cap) - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/argan-cubismo-cap 3/8

tor recebe uma sensacao dominante, por exemplo, de

uma area de cor cuja extensao e duracao corresponde a

partir desse momento, objeto (ou modelo natural) e

viver junto: as sensacoes que continuam chegando do

que filtradas pela sensacao da cor ja posta, que modificam

vez mo~ifi~~da.s por ela. E claro que, de fato, cada sensa~ao'e duracao ilimitadas, se outras sensacoes nao

-la. No termino dessa sobreposicao e interferencia "U~C:1jtiI1J"~

coes, nao apenas0

aspecto, mas0

proprio

, por destruir a distincao tradicional de pintura e escultura,

descritiva seria desprovida de qualquer eficacia se, em ultima

psc~rr:LDl)~'~"~'C; numa figuracao axonometrica do objeto ou em sua

esquematica por divers os pontos de vista. Aanalise, de fato,

sobre 0objeto (figura, copo, guitarra) na condicao de coisa

no espa~o e distinta dele como 0conteudo do recipiente: exerce-

as relacoes entre os varios objetos que preenchem 0espaco,

sobre 0espaco, como realidade que se da apenas nas

~..,.....""',.."as coisas que 0preenchem ou 0saturam, maspor Isso nao se na LVl.a.U.ua.UC:

a existencia do quadro como objeto aut6nomo e Uo'-LC;J.!HiUclaa

pelo fato de que ele esvaziou, exauriu, destruiu e substituiu

natureza. A arte nao e senao essa destruicao de urn objeto

uma nocao, e a criacao de urn novo objeto, ou de uma .~"LUa..,,,

narmos mais aprofundadamente esse processo, perce

consiste em livrar a sensacao pura, vital, atual, da riocao

convencional; ou seja, livrar do passado 0presente absoluto .

que se oferece apenas no esforco do fazer e que, nao admitindo

de categorias da experiencia, se realiza na unidade de

outros termos, mediante 0processo que desacredita e destrol a

como patrimonio de nocoes adquiridas, vlsa-se recuperar,

dade do passado ou da historia, uma possibilidade de P1"np,rii30, ..,.,;.

ofirn desse processo, ou a realizacao do objeto artistico, e

quando as sensacoes sucessivas, subjugadas e as vezes '-U-UJ<::i

pressao das novas, voltam a emergir e se fixam na forma, ou seja,

todas 0mesmo grau de atualidade e evidencia, isto e: quando a

do objeto se conclui na sintese da forma. Picasso declara. CIa-" '>ULCUa

sornatorlo de destruicoes, Eu faco urn quadro, depois 0destruo:

te, como nada se perde, 0vermelho que tirei de urn lugar

outro lugar".

o carater desse processo e a tensao extrema do artista para

ver a maior potencia expressiva a partir de seus meios explicarn

criacao da forma artfstica nao acontece por uma metodica e fria

si~ao e recomposicao do objeto segundo novas leis da visao (a

de canones flxos, como a proporcao aurea e similares, rnarcara 0

prernissas cubistas e 0declinio rumo a urn mere decorativismo), e

urn esforco operativo desesperado, uma especie de furorpictorico.

Por esse vies e mais facil avaliar urn dos princfpios rnais connec

do cubismo: sua pretensao de tnformaro espectador, nao sobre 0

mutavel e exterior, mas sobre averdadeira forma do objeto, que s6

relevada renunciando ao ponto de vista fixo e girando em voltadele.

e tal totalidade nao pode se realizar se a visao for efetuada por

pontos de vista. Teoricamente, a forma realiza uma visao do

como poderia ser proporcionada por todos os infinitos pontos do

espa~o; por isso, e ao mesmo tempo externa e interna, distante e

frontal, lateral e em escor~o, de cima e de baixo etc.; e, enfim,

""jrpr1r~OU integral.

espaco, como se sabe, era tradicionalmente representado nas tres

de altura, largura e profundidade, esta ultima e notoriamente

porque nela os objetos se apresentam segundo uma deforma-

o escorco. 0 carater convencional dessa terceira dimensao

obviamente sobre as outras duas, por exemplo, impedindo

representa~ao formal aquern de urn primeiro plano, que e0mais pro-

daqueles que cabem numa escala de valores que tern seu extremo

no mere ponto, 0ponto defuga. Estabelece-se assim uma sepa-

entre 0pintor (ou 0espectador, que devera reviver sua ernocao)

""II-'a\;o~ representduel, ou seja, entre 0espaco da vida ou da acao e 0

da conternplacao ou da representacao. Os cubistas nao apenas

do pressuposto de que 0espaco da existencia e 0espaco da visao

sao de forma alguma separaveis, mas sentem que 0espaco em que se

. 0azer pictorico e 0mesmo que, gracas a esse fazer, toma corpo na

artistica, portanto, e impossfvel distinguir a sensacao que vern de

daquela que vern de dentro, ou a representacao da intuicao criativa

'~"'I-'a' ..~, Como a.sensacao que vern de urn ponto distante pode ser mais

e urgente que outra que vern de urn ponto proximo, e aquilo que 0

quer expressar e justamente essa vivacidade e urgencia, a forca des-

. apelo a consciencia, nada impede que a notacao formal correspondente

.pnmeira assuma no quadro uma situacao central, e a segunda, uma situa-

periferica, subvertendo toda nocao espacial habitual.

Alern disso, ja que cada coisa e ao mesmo tempo eIa mesma e 0

ou 0conjunto das coisas que 0preenchem, a forma, que e sempre

do espaco, e resultado da interpenetracao ou da coexistericia de

532 533

Page 4: Argan. Cubismo (Cap)

5/10/2018 Argan. Cubismo (Cap) - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/argan-cubismo-cap 4/8

534

conjunto, a movimento artistico do cubismo, reduzindo toda

nrc:Jllbb1,Ul,l<",l .:lL.,." do artista, tende a determinar em novas termos a .arte no mundo, como atividade produtiva de forma: arte, entao,

que, eliminando qualquer nocao preconcebida e naturalis-

e institui a forma da realidade, nao de uma realidade abstrata ou

mas da realidade atual, em que vivemos e operamos. Ela desem-

,'tarefa de livrar a consciencia do sedimento inerte das nocoes con-

e de devolver a ela a capacidade de sensacao ou de experiencia

nao preconceituosa. Inserindo-se no circulo da produtividade

a arte deixa de servir as grartdes ideaisconstitufdos, ou as grandes

, . . "L . l "" " " para setornar ato e instrumento de progresso, forca ativa num

de llberacao do mundo de todo dogma au convencao.

arte poetica enquanto tal" , escrevia Schiller a Goethe, "torna pas-

coisa presente e afasta toda coisa proxima mediante a idealida-

cubismo, recusando toda poetica, reflete a instancia oposta: engajar

no presente e em todos os problemas que se agitam no plano' da

absoluta. Para Breton, 0valor de uma obra de arte e dado por

aL"U-~ revolucionario: enquanto esta em curso uma revisao geral

, seria absurdo reconhecer outros valores "senao aqueles que

de tal natureza que acelerem essa revisao". Por isso, a cubismo abre

que perdura ha quarenta anos, da arte "de vanguarda", isto e, daque representa uma forca de ruptura contra toda inercia conservadora

forca propulsora de toda acao revolucionaria,

todas as coisas que preenchem a espaco com seus inf .. , ' mltos

que antes constituta a fundo, que de fato nao era senao

co~vencional do espaco para tornar possfvel a representas;:ao "

se incorpora como elemento pictoricamente ativo na~~U.:lLlI,111

. au na reducao dos proprios objetos a funcao espacial.Mas

~o - a esp~s;:o a~tentic~ da sens~s;:ao viva e nao a da no~ao,

matual- nao existe senao na realidade formal do quadro '

000 tambern voltamos ao conceito de valor daobra de arte

em si indepe?d~nt~ das coisas representadas, como urn novo ,,",

par consequencia, a caracterizacao do artista, nao mais como

da natureza, mas como 0produtor de objetos artisticos.

, Podemos conduir, portanto, que 0cubismo pretende ser

mente, no sentido mais rigidamente profissional, pur apintura

ro, escultura ou arquitetura). nao pintura (ou escultura au

como rneio de representacao, mas pintura (ou escultura au

como coisa em si. Juan Gris escreveu:

urn pin~ora~go meu disse: nao se fazum prego com urn prego,

ferro. Smto discordar dele, mas acredito no exato contrario. Urn

com a prego, porque se a ideia da possibilidade do prego nao

correrfamos a risco, utilizando a mesma materia, de fabricar urnurn ferro de frisar cabelo. Nao basta pegar telas, pinceis e tintas

p~tura. Assimse faz uma paisagem, uma mulher nua, panelas que

trtangulos au quadrados; nao se faz. pintura se a ideia da pintura

a priori. Portanto, e preciso tentar entender em que consiste a pintura

e sua origem.

E ainda.

urn objeto se torna espetaculo logo que river urn espectadQr que 0

ple. Pode-se.conternplar urn objeto de diferentes maneiras. Umamesa'

ser julgada por uma dona de casa em relacao a urn fim rnaisou

tario. Urnmarceneiro observaria a maneira em que e feita e a -a-r- _

madeira utilizada para :5uaJabricac;ao.Urnpoeta --,--mau poeta-

emvolta dela a paz do Iar etc. Para urn pintor sera simplesmente urn

de formas planas coloridas. Insisto sabre as forrnas planas, porque

rar aquelas formas de maneira espacial e tarefa do escultor.

Apesar dos enunciados teoricos que se acumularam sabre a cubismo,

Jbl.<:UILl'J constitui-Io em sistema, ele permaneceu urn movimento arns-

e como tal quer primeiramente ser justificado numa historia da arte, ..

E oportuno Iernbrar que, analogamente, a escultura nascida da

rl€!ncia cubistivis'a adetermina~ao"de 'iimaplasuc:a "emsi.','e'a ,.,

a deterrninacao de uma estruturacao ou funcionalidade construtiva

ou seja, ao esclarecimento dos meios e dos processes da determinacao

Pode-se considerar a historia da pintura francesa do seculo XIX como

historia de uma progress iva reducao do valor e da funcao da natureza

relacao a atividade do artista. Se a arte neoclassica idealizava a 11.0s;:ao,'"

constituindo-a em valores estaveis e eternos, a romantismo,

Ul~J-<:l11I.J.U a ernocdo na base do process a artfstico, defendia a necessida-

da experiencia direta, individual. A impressdo reduz ulteriormente 0

eo alcance da nos;:ao: ela e sim apreensao sensorial, mas no estado

de Bergson, definiria a impression veritable como a de quem, acor-

e enxergando pela janela uma faixa azul, receba dela uma plena

535

Page 5: Argan. Cubismo (Cap)

5/10/2018 Argan. Cubismo (Cap) - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/argan-cubismo-cap 5/8

536

o qual e projetado e condensado, tomando forma, 0sentimen-

que de outra maneira permanec~ria in~efinfvel; mas_o_objeto

como suporte da Imagem colonda, atras da compostcao, que

compor de maneira decorativa os diferentes elementos de que

para expressar seus sentimentos" (Matisse). Na harmonia

"todo detalhe superfluo assumiria na consciencia do espec-

de outro detalhe essencial" (Matisse): cada cor, nao mais

limite na aparencia da coisa colorida, se define apenas em

area de cor- os.' ... ... nao mais acierentes ao ... .' se!

537

sensacao espacial e cromatica, sem, no entanto, nem

se pertenceria ao ceu ou ao mar). Cezanne nao aceita

como autentica, e aponta para a pura sensacao, que nern

esfera da nocao, nao tern nenhuma relacao com 0objeto,

nos termos formals e crornaticos nos quais se substitui a

expressa na tela; ja e, in nuce, a inruicao de urn processo

restituia sensacao (que, de fato, s6 corneca a existir na

lificando-se como forma e cor), mas a produz. Na sensa~ao

distincao entre forma e cor, como entre substantivo e..tal-distineao implicaa referencia ao objeto: r<>rl<> rr'''' ''iQrl

pr6pria qualidade, quantidade e duracao, fixa a petite

o valor absoluto que a tradicao classica atribufa a forma

mais segura e estavel representacao das coisas. A famosa

Cezanne (que com demasiada frequencia e citada Como

litteram de uma hipotetica teoria cubista) a respeito da po'ssibil

reduzir as aparencias naturais as formas elementares do cone

nao deve ser interpretada (como amiude se ouve repetir) como

a forma plastica, ou se]a, a certeza e autoridade do objeto,

trario, como tendencia a generalizar, portanto a dissolver as

naturais, a se desinteressar do objeto como tal, a resolve-lo no

e, na esfera das sensacoes luminosas e cromaticas. Sabe-se que

nao considerava acabado 0quadro senao quando toda notacao

por menor que fosse, nao estivesse inclufda numa densa trama

nao se interligasse com todas as outras, nao exercesse sua

fosse de fato "presente" em cada ponto da superffcie.

A exigencia fundamental de superacao da nocao esta tarnb

base da pintura de Seurat que, partindo das pesquisas do

sobre a composicao da luz, busca uma definicao formal ou

sensacao lurninosa; de Gauguin, que interpreta a natureza nao

espetaculo, mas como pura naturalidade humana ou natureza

(naturefidelement imagineen de VanGogh, para 0qual a cor ja

qualidade das coisas, mas urn meio direto para expressar 0"CCLlLLUH:;lJ

pela primeira vez, osentimento deixa de ser sentimento da ru;n.I.r<>7:1

torna sentimento moral); de Toulouse-Lautrec, que visa a expressao

de conteudos humanos e sociais.

omovimento dosfauves, que reline em 1905 Matisse,

Derain e Friesz, aos quais se juntariam rnais tarde Braque, Rouault e

quet, rnarca uma ruptura aberta tanto com a natureza, quanto com

t6ria. Sua aspiracao e atingir a arte fora da emotion directe dos

nistas, por une technique coloree(Friesz), ou seja, pela posse plena,

exclusiva dos meios pict6ricos. 0objeto subsiste, mas apenas como

abesco,Scromaticos. Essa arte, que pressupoe uma extrema vio-

J(:l"''L'J'''~ ou uma descarga vlolenta de energia interior, desemboca

altfssima decoracao, porque a paixao inicial se esgota totalmente

processo pict6rico: buscar urn pathos na obra concluida seria

a carga explosiva de uma bomba ja detonada.

cubismo nasce em 1908, como reacao a subjetividade pura dos

mas, dos dois maiores representantes do movimento, urn, Braque,

. do grupo dos fauves, outro, Picasso, se formara sobre a pintu-

utrec e com os fauves mantinha rnais de urn ponto de'.1 UU11,J'-'''''' ··....~

come~ando pelo entusiasmo pela arte negra. A aspiracao inicial

foi alcancar uma liberdade ainda mais completa do que ados

no emprego dos meios pict6ricos: 0objetivo era elirninar deflniti-

"0 referente exterior e fazer realmente quadros, e nao mais flgu-

imitativas" (Ozenfant). 0proposito, no entanto, era irrealizavel: "a

das formas naturais nao poderia ser inteiramente elirninada,

u,~_u~'v por enquanto; nao se pode elevar a arte de chofre ate a efu-

" (Gleizes e Metzinger). 0objeto deixa de ser 0anteparo oca-

que produz 0choque e a deflagracao em que se fundem 0mundo

e 0exterior; e dado ou fenorneno sem 0qual nao seria possivel

a funcao e 0valor da consciencia. Devolvendo a arte urna funcaoadmite-se que 0conhecimento autentico nao pode se produzir

a superacao do conhecimento nao autentico, ou nocao. Como toda

o cubismo nao se situa fora da historia, mas age dentro da his-

e a transforma. Pretende, sem duvida, reagir a emotion directe dos

LC""l..l111"""" mas reconhece que a reacao e surtout technique, e que 0

e continuar 0irnpressionismo sur un autre plan.

DA ESCULTURA NEGRA

Dois elementos riovos concorreram para a determinacao dessa crise

da arte europeia: a pintura do douanierRousseau e a escultura

Page 6: Argan. Cubismo (Cap)

5/10/2018 Argan. Cubismo (Cap) - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/argan-cubismo-cap 6/8

la para a abstracao pura, e sim conferir-Ihe uma funcao

isso, 0cubismo recusa os convites a evasao, nao rejeita a

civiliza~ao conternporanea, pode ate se propor a encarnar os

civiliSation rnacbiniste (Metzinger, Lurcat, Leger; em arqui-

; a instancia dos fauves, de superar a historia pondo a

tempo, 0cubismo opoe a tentativa de superar urn historicisrno

e inerte, fundado sobre a autoridade dopassado, em prol de

l<ILLau~ ativa ou de uma plena, indiscriminada modern ida de.

rolvilnc:nt:o rapidfssimo das premissas cubistas no periodo

anterior a Primeira Guerra Mundial nao se explicaria sem a

que liga na pesquisa formal duas personalidades profun-

diferentes como Braque e Picasso. Braque e 0primeiro a fazer

direta as obras tardias de Cezanne, propondo-se reconstruir a

do espa~o-sensa~ao. As naturezas-mortas e as paisagens pin-

1908 e 1910 refletem uma busca de clarificacao em relacao

fauve anterior: 0objeto se dissolve totalmente no espaco,

de cor resulta da sobreposicao de camadas mais distantes e mais

que, aflorando na superffcie, deterrninam a estrutura cromatica;

de cor e plenamente resolutiva, nao apenas do objeto, mas do

e da luz. Por isso, a cor de Braque permanece substancialmente

sensacao em sinao existe, so nasce da relacao de valores. Nas cola-arnbem, que refletiriam mais tarde a necessidade de assumir a pro-

como urn dado inseparavel de uma materia e de definir de maneira

a relacao materia-valor, 0recorte e 0enxerto serao tecidos numa

'perteitade relacoes, suspensos no ponto certo nesse novo espaco de

do qual se pretende certificar a realidade efetiva.iate demonstrar

JaClua,uc: de ele se situar ou assirnilar coisas indiscutivelmente existen-

•de transformar fragmentos de objetos em materia de pintura.

Fielao principio da "regra que corrige a emocao", a pintura de Braque

rigorosa reelaboracao e reajuste dos meios expressivos da pintura

lLl'-llj·la.l;ma nova poetica aica.£l~ada pela depuracao progressiva d()

pictorico, urn artesanato de altissima eleicao, enfim, inteiramente

na alquimia das cores e das formas.

. esta para Braque como no seculo XVI Michelangelo estava

Rafael, inclusive pela intensa dramaticidade de seus conteudos: em

pintura ha sempre uma ideia que transcende a forma, deixando-a,

certo sentido, inacabada ou aberta, urn desenho que age como gera-

ideal e conserva seu ritrno apesar das diferentes determinacoes for-

C:1I..JJI::nt~1l'-':la que em Braquese deca:r:ita e purifiCaaflora:r:idOa

"OrF~~;:o em Picasso se destroi na furta expressiva, no "somatorio de

com que a obra se realiza. Ja em suas prirneiras obras cubis-

negra. 0 neoprimitivismo de Rousseau e0exemplo d

de pura e sem condicionamentos, independentemen~e d~

formal preconcebido: uma pintura sem estfmulos

, por si- figuras, paisagens, narrativas - e cujas im~a·.o.gLe'Cn'·lslU.<l

espac;;:o exclusivamente fantastico, que elas proprlas

forma e como cor. Para a arte negra 0problema e- .. ' . malS

, fauves, na esteira de Gauguin, viam nela a concretiza ao

recorrer ao alegorismo formal tipico da arte .ocidental Je religioso na forma pura ou na pura decoracao, e a 0

potencia direta, toternica da forma. Mas em Les ae'm(Jisell.f'!.~

que Picasso pinta em 1907 e que representa 0 primeiro

cubismo, aflora uma interpretacao totalmente nova da art

~uas figuras a direita os planos ganham saliencia pela dire~a~

signos, corr::o por urn trabalho de entalhe coriduztdo no viv

crornatica. E.antecipada, assim, a interpretacao que Roger 0

dez anos mars tarde, como forma concebida e realizada

tres dimensoes, e que nao resulta, como toda a arte ocidental

sicao de varies perris. Por serem os perris os confins entre a '

C ; ; : O , a arte ocidental busca definir na forma urn principio de

entre a coisa e0espaco, enquanto a arte negra realiza uma

absoluta entre uma e outro. A experiencta direta, objetiva, dae , portanto, 0elemento determinante da crise do objeto: a

momento, a arte mira exclusivamente ao espaco, em sua

totalidade, em seu continuo devir e transmudar; os objetos ja nao

de funcoes espaciais.

BRAQUE, PICASSO, GRIS

Se0elemento de ponta, na fase inicial do cubismo e PicassoBraque o merito de ter estruturado 0movimento renovador sobre ,

historica do irnpressionismo. Com 0prirneiro cubismo, a licao de

que era principalmente uma licao de civilizacao ou de cultura

impoe definitivamente sobre a rebeliao, ainda essencialmente

dos fauves. Reconhece-se que a arte nao escapa de certas

historicas. desliga-la dos tradicionais conteudos naturalistas

tradicoes nacionais que se concretizam sempre em diferentes '

sentira natureza, nao significa solta-la de toda justificativa historica e

=fina-la numa pre-historia edenlca, esirii enquad1":l-la numa rustoncio

mais ampla, internacional; da mesma maneira, alforriar a arte do

dos sentidos nao significa necessariamente entrega-la a impulsos

Page 7: Argan. Cubismo (Cap)

5/10/2018 Argan. Cubismo (Cap) - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/argan-cubismo-cap 7/8

540

or,ugH11HG<nternacional do cubismo, como superacao critica das

figurativas nacionais numa linguagem formal de valor universal,

repercussoes fora da Franca: a mais importante, a mais pro-

, a mais original foi sem duvida 0futurismo italiano. A fase

movimento foi brevissirna: Boccioni e Sant'Elia, que foram seus

protagonistas, morreram na guerra; Carra, Soffici, Severini e todos

que enxergaram no futurismo um impulso revolucionario capaz

artfstica.italiana, -se r-distanciaram.logo ...o- ....~_c

Reagindo a urna sltuacao de inercia, 0futunsmo nao podia nao

uma postura violentamente subversiva em relacao a tradicao. Mas

ligado ao objetivo de sua polernica: as esculturas de Boccioni

entanto, representam 0maior resultado artistico alcancado pelo

conservam, apesar da decornposicao violenta das formas, uma

obsessiva do monumentalismo michelangelesco. Em relacao

a situacao do futurismo e complexa e contraditoria, aceita a

radical da visao e 0principio da unidade de coisas e espaco,

enxel:ga na analise cubista urn elemento estatico e formalista, contra 0

pretende reagir atribuindo a forma urn carater dinamico. A analise do

,que estava na base das premissas cubistas, e assim completamente

.-C:11LC;UUl ....

,G<. velocidade, que0

futurismo assume como principio defigurac;ao, nao resolve 0problema da relacao entre objeto e espaco,

no maximo, impoe a ambos uma condicao comum. Coloca-se assim

origem do processo artfstico 0"estado de espfrito", que implicitamente

a deforrnacao das aparencias objetivas por uma condicao subjeti-

Afusao objeto-espaco, entao, nao e 0produto de uma nova

- . " < " " ' T < I concepcao da realidade, mas uma ilusao derivada de urn alto

de concitacao emotiva. 0artista nao quer modificar radicalmente sua

perante a realidade, passando da passiuidade da representacao

a atiuidade da acao. limita-se a registrar ou a traduzir a concitacao

da vida moderna, como a agulha do sismografo registra e trans creve

.movimentos teltiricos. A arte permanece questao de sensibilidade ou

emocao, a tarefa do artista e colher no presente os aspectos do mun-

que 0historiador reflete no passado. E facil entender as contradicoesque agitam 0futurismo, como todo movimento de tipo puramen-

subversivo, e que determinam seu rapido declinio e seu curto raio de

anuencia, Ele parte da polemica anti-impressionista do cubismo, mas, fal-

.uU'-_ .u~ uma experiencia concreta do impressionismo e de seu significa-

hlstorico, confunde motivos marcadamente impressionistas (exaltacao

valores luminosos e cromaticos) e motivos anti-irnpressionistas (busca

tas, a forma e 0produto de uma deflagrac;ao do objeto no ......

interessa especialmente 0pintor e justamente a decompo . _.. . . Sls;aofimrepen~mo do objeto, Sua postura e revolucionaria a priori

o severo interesse humane das primeirissimas obras, do'

rosa, nao 0abandonaria nas mais tens as pesquisas formais:

maos urn instrumento terrfvel, 0desenho, que desintegra 0

a forma nua da consciencia, nao da consctencta em abstrato

ciencia no atimo em que desintegra e destroi 0objeto. E '

quantos preconceitos destruidos a cada objeto engolido por

,. .Ocprocesso.expresstvo, ofurorpiGt6ricopossui opoder ....~r,l\.,U

o artista para 0nstante da atualidade absoluta, no ponto FV1rr=.~_

da historia: por isso, ele estara sempre, na primeirlssima fila,

momentos dramaticos da historia europeia. Guernica sera

que uma profecia, sera uma testemunha e uma condenas;ao

uma historia que precede 0fato pelo julgamento, a certidao de

urn mundo que sucumbe a sua propria violencia.

Mais limitada, mas extremamente precisa e a poslcao de

Ele mesmo a definiu com surpreendente precisao crftica: seu

a reconstrucao pictorica do objeto, a criacao de formas que

existencia senao na pintura. "Cezanne faz de uma garrafa urn

parto do cilirtdro para criar urn ser de urn tipo espacial, faco

uma garrafa, e uma determinada garrafa. Cezanne vai para a

eu parto da arquitetura." Seus dados nao sao os objetos, mas

como principios em abstrato da pintura; seu objetivo nao e

objeto em cor, mas a cor em objeto ("colo co urn branco para que

uma carta de baralho, e urn preto para que se torne uma .:>V.'ULna.

ele, apintura e uma atividade em si, com urn processo proprio e

tado proprio; esse processo, como todo processo operativo,

sas reais que nao poderiam ser produzidas por process os (liiopr'Fn~F<:

a importancia de juntar a urn novo sistema urn rnetodo tradicional

la methode je ne veux pas m 'evader du Louure" lquanto ao rnetoco

pretendo escapar do Louvre]). 0 esforco construtivo, 0

o offcio pictorico, 0desinteresse para com os grandes problemas,

mitacao rigorosa do problema a uma questao de meiospictoricos

Juan Gris da angtistia dos problemas que 0proprio cubismopelos quais seria logo ultrapassado, pelo menos em seus

base; ate a morte permaneceria fiel a Intencao orlglnaria do

renovar radicalmente aprofissdo do artista e de realizar uma r"j'nrrn<l

funda da pintura, como forca viva da sociedade,

I- - 1

<,

541

Page 8: Argan. Cubismo (Cap)

5/10/2018 Argan. Cubismo (Cap) - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/argan-cubismo-cap 8/8

GEORGES BRAQUE

de uma nova plasticidade e espacialidade). Reage ao

cultura artistica italiana e aspira a urn encontro com as

tes figurativas europeias, mas, por se opor '~'~""-"H.l1Ilaa.an

tradicao e por aflrrnar 0livre direito criativo do genio,

da genialidade italiana contra toda influencia estrangeira.

situacao polftica paralela. aposta-se na guerrairninente para

mente a Italia no sistema das grandes forcas europeias e

··1;10 sentimento nacional para promover a participa~ao no

toda forma de romantismo e exalta justamente os valores desensibilidade que eram fundamentais na estetica romantica.

violenta polemics antiburguesa e exalta a civiliza~ao medinica

expressao das burguesias modernas. Defende a espilritt.lal.idad

prestigio supremo do genic criativo, e confia a expressao a

dos estados de espirito, ao arbftrio psicol6gico. Exalta a forca

criacao artistica, e admite que, .serido a vida moderna artificial,refletir essa artificialidade.

A atitude social positiva e 0esforco reconstrutor do

cam e enrijecem assim numa polemica politica, entre

nalista, entre revolucionana e reacionaria, que explica por

guerra, esgotados os impulsos ideol6gicos iniciais, '-L.....n.:u\..a.LLU

me1hores homens, 0movimento futurista acaba numa

mais que tolerada) propaganda da pseudorrevolu~ao fascista.

Portanto, se e meritodo futurismo ter quebrado 0circulo

provincianismo artistico italiano e estabelecido urn contato com

correntes figurativas europeias, remonta sem duvida ao extremism

rista e a estreiteza ideol6gica de sua polernica a responsabilidade

sucessivo movimento quereconduz a arte italiana, atraves do

rnetaffsico e do falso hfstorlcismo do Novecento, a exaltacao dos

tradicionais e a urn novo e maior distanciamento das correntes

europeias.

[1950]

as correntes artisticas do seculo xx, ao nascer, se declararam

.Georges Braque gastou seu longo e constante entusiasmo

LVpLL~a'·r·a·-d-emonstrarue essascorrentes, come~ando.pelo cubismo,

revolucionarias, masparticipavam dodesenvolvunento natural

figurativa e pertenciam com pleno direito a hist6ria da visao. - ! ' -

que os novos processos de visao, necessariamente ~squema-

. em seus infcios, tenham se aberto gradativamentennlrpl1lClClS humanos sempre mais concretos ediferenciados e para

sempre mais m6vel e rica de valores qualitativos. Certamente,

nr.nn,(")_c; reconduzir a arte moderna ao bojo de uma tradicao arbi-

identificada com uma serie determinada de fatos artisticos do

mas demonstrou como toda a tradicao, em sua fenomenologia

·econst:antemente rnutavel, prossegue e se desenvolve na arte

,a..:,'- .....'-' em 1882 em Argenteuil, comecou seus estudosna escola de

e . '. ..• . de decoracaodo-pai Charlesr+

1900 e i' .requentouem Paris os cursos da Academie Humbert

Leon Bonnatna Ecole des Beaux-Arts; insatisfeito, decidiu estudar

Louvre. Adrnirava. profundamente os impressionistas, mas se

.:•......·tarnb~rn·sobreCorot, Chardin, Poussin, a arte do Egito antigo e

arcaica. Teve: seus primeiroscontatos cOrnas correntes de van-

. .M~rieLaure"uchI, Picabia e 0escultor Manolo; mas foi por

de Dufy e; sobretudo, de Othon Friesz que 0impressionismo

obras se transformouno colorismo vivo .dos fauves.

Ern1907,ap6s uma estada em l'Estaque, sua escolhaestilfstica se

o grande mestre, 0que intuiu e instituiu os problemas fundamen-