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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE SANTA CRUZ - UESC DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO – DCIE NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - NEAD
AQUISIÇÃO DA LEITURA: PERCURSOS E PERCALÇOS NO DECORRER
DO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO
Ana Paula Souza Báfica Universidade Estadual de Santa Cruz - UESC
Maria D’Ájuda Alomba Ribeiro1 Universidade Estadual de Santa Cruz - UESC
RESUMO
Aprender a ler nas séries iniciais é um dos grandes desafios que a educação tem encontrado. Por esse motivo, o presente artigo traz os resultados de um estudo acerca do(s) fator(es) determinante(es) para a não aprendizagem da leitura, utilizando para isso, a técnica de observação participante e uma pesquisa bibliográfica focada nas contribuições de alguns teóricos como: Cagliari (1994), Koch e Elias (2006), Mortatti (2000 e 2004), Pinheiro (1994), entre outros. Para iniciar, aborda acerca do percurso histórico da alfabetização no Brasil, falando sobre as dificuldades encontradas no decorrer da história, e, em contrapartida, enfoca os avanços no que concerne à alfabetização. Em seguida, discorre sobre as questões socioeconômicas e suas influências no processo e explana sobre leitura e processamento cognitivo, citando a dislexia como um distúrbio frequentemente encontrado nas crianças de séries iniciais. Por fim, ressalta que muitos são os percalços presentes no processo de aquisição da leitura. Entre eles, as condições materiais e estruturais oferecidas para que esse aprendizado aconteça. No entanto, se todos os envolvidos (professor/escola/família) continuarem se empenhando, com certeza, a leitura passará a fazer parte de realidade de muitos.
Palavras-chave: Leitura. Aprendizagem. Questões socioeconômicas. Processamento cognitivo. INTRODUÇÃO
Quando pensamos em leitura, vem à mente um processo onde une-se
apreensão e compreensão de uma informação que nos é dada nos mais
1 Profa. Orientadora. Doutora em Linguística Aplicada pela Universidade de Alcalá, Departamento de
Filologia (2005) e coordenadora do Colegiado do Mestrado em Letras: Linguagens e Representações.
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diferenciados contextos. No entanto, para chegar a essa capacidade, o
indivíduo percorre um caminho que muitas vezes é permeado por desafios e
dificuldades.
Dentro dessa perspectiva, fica fácil compreender a definição de Cagliari
(1994) quando diz que a leitura é a atividade fundamental desenvolvida pela
escola, sendo mais importante ler do que escrever. Por isso, ressalta que a
complexidade do ato de ler envolve problemas semânticos, ideológicos,
filosóficos e fonéticos.
Nessa direção, partindo da definição dada pelo supracitado autor,
quando diz que “a leitura é a realização do objetivo da escrita” (p.149), e
sabendo que esse mundo do letramento é complicado e caótico, faz-se
relevante a realização do presente estudo. Um trabalho que surgiu das
inquietações do cotidiano, quando eram realizadas análises da prática docente
e da experiência em turmas de primeiro ano do Ensino Fundamental I.
Nesse universo educacional, muitas vezes nos vemos esbarrando em
percalços envolvendo o processo de aquisição da leitura, pois, por mais que a
educação tenha evoluído, suas tecnologias, seus recursos e inovações
pedagógicas, ainda enfrentamos (docente/discente) muitas dificuldades no que
concerne ao desenvolvimento dessa capacidade.
Todos os desafios presentes na escola e muitas vezes fora dela, podem
ser divididos em dois momentos: as dificuldades relacionadas aos fatores
socioeconômicos e aquelas que partem do processamento cognitivo. Porém,
questionamentos ficam pairando no ar, pois, como sabermos quando a
dificuldade não advém de distúrbios de aprendizagem? Qual a resolução para
os problemas financeiros e culturais que atrapalham esse processo? O que
fazer quando os dois entraves aparecem interligados?
Enfim, perguntas são muitas, mas as respostas fazem parte dos anseios
da maioria dos docentes desse nível de ensino. Por esse motivo, o presente
estudo foi realizado, tendo como ponto de partida a observação do cotidiano
escolar de algumas crianças que se encontram no primeiro ciclo de uma escola
pública do município de Canavieiras na Bahia, sendo que uma apresenta uma
dificuldade de aprendizagem ligada ao cognitivo, enquanto a outra não
demonstra ter tais complicações. Tendo uma pesquisa elaborada em torno de
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descobrir qual dos fatores é o mais determinante para a não aprendizagem da
leitura.
Desse modo, visando entender o que foi citado acima, essa pesquisa
será sintetizada em três momentos: primeiro, fazer uma abordagem acerca do
percurso histórico da alfabetização no Brasil; em seguida, discorrer sobre as
questões socioeconômicas e suas influências no processo e explanar sobre
leitura e processamento cognitivo; num terceiro momento, serão feitas
considerações em torno do que foi encontrado, refletindo se os
questionamentos levantados foram respondidos ou não.
1. PERCURSO HISTÓRICO DA ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL
Todas as discussões em torno do processo de alfabetização inicial no
Brasil giram em torno das questões ligadas à escolha dos métodos utilizados
para que a criança venha fazer parte desse mundo da cultura letrada.
Esses debates tem tornado-se cada vez mais fortes e frequentes nos
espaços educacionais e também fora deles. De acordo com Mortatti (2000) foi
a partir do final do século XIX, mais precisamente com a proclamação da
República, que a educação começou a se configurar em um sonho para a
modernidade.
Nesse sentido, Gumperz-Cook (2008) aponta que dentro de uma
perspectiva histórica, a alfabetização começou a ser foco central no espaço
educacional no período moderno, onde passou a ser entendida como virtude
moral que está ligada a seu uso. Portanto, uma pessoa letrada era, e ainda é,
vista como alguém capaz de exercer julgamento bom ou razoável.
Partindo desse pressuposto, nos permitimos entender o letramento
como a capacidade de discernir entre o que é realmente válido e satisfatório
para nossa construção do conhecimento. No entanto, se levarmos em conta
que a proposta de educação no Brasil visa uma unicidade de cidadão, onde
todos são vistos como “iguais perante a lei”, percebemos que vários
questionamentos podem ser levantados acerca desse processo histórico, de
uma alfabetização que está sempre centrada em métodos. Uma metodologia
que vê os indivíduos como iguais, sem levar em conta suas especificidades.
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Para tanto, Gumperz-Cook (2008) destaca que os escritos literários da
década passada contribuíram para a construção de um conceito de
alfabetização como multifacetada. Uma perspectiva que auxiliou as primeiras
pesquisas na adoção de uma visão centrada no Ocidente. Esses tratavam o
desenvolvimento social e o uso de literaturas como centrais à própria história,
desencadeando uma distorção do conceito de letramento.
Esse conflito na formulação de conceitos traz para o centro da
discussão, a necessidade de perceber a alfabetização como um processo, e
não como um todo pronto e acabado. E nessa perspectiva, surgem críticas
acerca dos métodos definidos como únicos para um procedimento que precisa
ser dialógico e diferenciado.
Nessa direção, cabe citar que num dado momento da história da
alfabetização, mais precisamente no início do século XX, começou uma
acirrada disputa, por parte dos revolucionários, em torno do método analítico
(processos de palavração, setenciação), e a luta para a extensão do método
tradicional. Outra discussão frequente nas disputas educacionais nesse
período era com relação à letra adequada a ser utilizada na escrita (cursiva,
imprensa, maiúscula, minúscula). (MORTATTI, 2000).
Quando refletimos acerca da supracitada afirmação, vêm à tona
realidades atuais com relação à escolha do método e da letra a ser utilizada na
escrita, as quais ainda estão sendo temas de debates em encontros
educacionais. Por isso, essa revolução, pensada desde os primórdios das
pesquisas voltadas para o processo de alfabetização inicial, faz-se extremante
necessária.
Para dar continuidade, no decorrer da história da alfabetização, Mortatti
(2000) fala sobre a fundação de uma nova tradição no ensino de leitura e
escrita, o que viria propor uma “alfabetização sobre medida”, ou seja, as
questões didáticas estariam subordinadas às questões psicológicas. Com isso,
a escrita continuou sendo vista como dependente de habilidade caligráfica e
ortográfica, sendo ensinada concomitantemente à habilidade de leitura. No
entanto, era necessário um período preparatório permeado por exercícios de
coordenação motora, viso-motora, posição de corpo e membros entre outros.
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É importante ressaltar, que segundo Mortatti (2004), num outro
momento, mais precisamente início da década de oitenta, surgem
questionamentos com relação a essas tradições e outras urgências de ordem
política e social. Tudo isso deu ênfase à apropriação da teoria construtivista,
fundando uma nova tradição chamada desmetodização da alfabetização.
Passou-se então, a enfatizar quem aprende e como aprende a lecto-escrita.
Ainda nesse período, inicia-se uma emergência no pensamento
interacionista em alfabetização, o qual vê o texto como unidade de sentido da
linguagem, devendo ser tomado como objeto de leitura e escrita. E é a partir
daí que é gerada a disputa entre os defensores dessa teoria e os do
construtivismo, o que foi acabando com o passar do tempo, devido à
conciliação entre aspectos de uma e de outra concepção (MORTATTI, 2004).
Dando um salto no período histórico, chegamos aos tempos atuais e,
ainda observamos semelhanças e permanências no decorrer do processo,
mesmo com a urgência de discussões que tirem o foco dos métodos de ensino
e voltem as atenções para o processo de aprendizagem dos educandos. De
acordo com Mortatti (2004), esse fato é justificado por novas tendências, como
as contribuições de Emília Ferreiro acerca da Psicogênese da Língua escrita.
É possível concluir esse breve percurso histórico, destacando que foi
feita uma tentativa de resumir destaques de diferentes épocas da alfabetização
no Brasil, as quais podem ser entendidas como progressivas. Pois, mesmo
esse processo tendo sido marcado pela questão dos métodos de ensino, pela
ruptura com o modelo tradicional e da concepção de educação como
esclarecimento, vemos uma busca em dirimir as dificuldades que nossas
crianças enfrentam para adentrar no mundo da cultura letrada.
2. QUESTÕES SOCIOECONÔMICAS E INFLUÊNCIAS NO PROCESSO DE
ALFABETIZAÇÃO
A leitura é uma prática que não é exclusiva da escola, ela é necessária e
imprescindível para o cotidiano de todos os seres que integram a sociedade.
Nessa perspectiva, Cagliari (1994) afirma que saber ler tem mais importância
do que o próprio diploma, pois essa habilidade é entendida como a extensão
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da escola na vida dos indivíduos. Ou seja, quando aprendemos a ler, e mais do
que isso, nos tornamos bons leitores, nossa formação é muito mais perfeita do
que aqueles que não criam esses “vínculos afetivos” com os livros.
No entanto, muitos entraves acometem esse processo, fazendo com que
se torne, muitas vezes, um desafio para alguns. Porém, essas barreiras não
são apenas advindas de falhas no processamento cognitivo, pois muitas outras
dificuldades podem ocorrer, entre elas estão as questões socioeconômicas, as
quais, em muito influenciam nesse percurso.
Quando falamos em percalços no processo de aquisição da leitura,
Almeida (2009) traz para as discussões, a possibilidade de traumas de cunho
emocional presenciado ou vivenciado pela criança, da não afetividade entre
educando e educadores, sejam eles pais ou professores e as causas
pedagógicas, ou seja, escolha de métodos e técnicas que não condizem com o
potencial dos discentes.
Desse modo, a necessidade de entender o processo e os anseios dos
alunos é o essencial para aqueles que fazem parte desse universo
alfabetizador, pois, às vezes, a escolha feita para efetivação dessa prática
alfabetizadora pode atrapalhar, deixando as crianças sem os conhecimentos
básicos para seguir sua vida escolar. É o que Almeida (2009) confirma quando
diz que “nestes casos, não se trata de uma dificuldade de aprendizagem do
aluno, mas de uma gama de problemas apresentados pelas escolas e pelos
atores que a compõe”. (p.12)
Muitos dos fracassos nas práticas leitoras dos alunos ocorrem por
dificuldades que podem ser entendidas como um percurso. Ou seja, a criança
vem de uma realidade de vida dura e desmotivadora, morando em local
desestruturado, tendo, muitas vezes, como única refeição, a merenda escolar.
Quando chegam à escola, não conseguem desenvolver-se a contento e inicia-
se uma barreira entre docente e discente, desencadeando a falta de
afetividade. Desse modo, fica quase impossível ocorrer a aprendizagem.
Outro fator frequente quando trata-se de aquisição da leitura é a
ansiedade por parte dos pais, do professor e dos alunos que querem a todo
custo ver resultados positivos. Sobre esse assunto, Cagliari (1994) vem falar
que o ensino/aprendizagem forçado por quem quer que seja, resulta em
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leitores maus formados e com péssimos hábitos de leitura, entre eles: a
soletração (ler em ritmo silábico), a deturpação fonética e a não compreensão
do que é lido (falta de controle do pensamento).
Ainda enfocando os entraves ambientais, Barbosa (1990) fala sobre o
medo do desconhecido que, com frequência, acomete os alunos. Seria um
fator que muitas vezes leva as crianças a não querer aprender, pois elas
sentem-se receosas de não serem capazes, têm medo de não poder errar e,
com isso, acabam desenvolvendo um bloqueio que dificulta a aprendizagem.
Enfim, se a escola cobra demais o acerto, é possível que elas não tenham
disposição para aprender.
Uma das conclusões chegada pelo autor acima, é que a criança pode
decidir por não se esforçar para aprender. E isso, envolve várias razões. No
entanto, cabe aos envolvidos no processo de formação desse indivíduo,
perceber quando isso ocorre. Pois, muitas são as causas disso: a falta de
motivos para aprender a ler, devido às práticas fracassadas de leitura ocorridas
na escola; a urgência de outros fatores (alimentação, carinho, moradia); a
ausência de ambiente alfabetizador, de métodos conquistadores, de materiais
de leitura envolventes, entre outros.
Por isso, o professor torna-se um integrante essencial para auxiliar
nesse processo, porque, ele, muitas vezes, é o único adulto mediador e
incentivador. Portanto, cabe a ele deixar de ser o “transmissor de conteúdos”,
aprofundar-se nas questões referentes à leitura e conhecer a fundo as crianças
que lhes são confiadas, levando sempre em conta a realidade social de cada
uma (BARBOSA, 1990). Mas, não podemos eximir a responsabilidade dos
outros atores, canalizando apenas para o docente, pois, a educação das
crianças não é encargo unilateral.
3. LEITURA E PROCESSAMENTO COGNITIVO
A leitura tem muitas definições, porém é consenso entendê-la como
produção de sentido. Quando uma criança aprende a ler, ela entra em contato
com um mundo cultural que lhe possibilita interagir nos mais diferentes
espaços e contextos. Esse fato acontece, porque a leitura é entendida como
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objeto de desejo de muitos, pois ler é participar das atividades sociais de
prestígio.
Diante dessas perspectivas, Koch e Elias (2006) destacam que a leitura
envolve experiências do indivíduo e funcionamento neurológico, ou seja, ler
está muito além de ser um processo simplificado. Essa capacidade vai desde a
decodificação até a reflexão e compreensão do que está sendo lido. As
mesmas autoras falam que ler não é somente memorizar, é também,
depreender sentidos e realizar inferências para possível entendimento do que
não está explícito no texto.
No entanto, essa habilidade pode ser seriamente comprometida quando
vem aliada a dificuldades de aprendizagem de cunho cognitivo. Pois, sabe-se
que esses chamados distúrbios, ainda são o “bicho-papão” da escola. Isso
acontece por diversos fatores, que vão desde a falta de informação e preparo
dos profissionais envolvidos no processo, até a escassez de recursos para
trabalhar com esses casos.
Quando falamos em dificuldades envolvendo o cognitivo e o neurológico
somos levados a pensar na dislexia, distúrbio sem explicação aparente, que se
não for o principal, é um dos principais problemas que envolvem crianças em
séries iniciais e que muitas vezes só é detectado tardiamente. Porém, um aluno
disléxico que é diagnosticado a tempo, não tem a sua aprendizagem
comprometida.
Nessa direção, Almeida (2009) enfatiza que:
Para tratar das dificuldades em leitura e escrita de causas orgânicas, as mais complexas, uma série de atitudes é imprescindível. Porém, qualquer que seja o método de tratamento ou de intervenção, nenhum deles irá desconsiderar a necessidade de se avaliar toda a dimensão que caracteriza o problema. Por isso, avaliar a situação psicológica, social, emocional e, até mesmo, financeira da família é uma das mais importantes tarefas no início de um tratamento rumo ao sucesso das intervenções que serão desencadeadas (p.12).
A citação acima vem trazer um norte para o trabalho que deve ser
desenvolvido pelo docente, pois se ficar clara a necessidade de intervenções
diárias com as crianças que apresentem dificuldades na aquisição da
lectoescrita, os resultados serão obtidos com mais rapidez, o que auxiliará na
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manutenção da autoestima do discente, sendo este aspecto uma das principais
implicações nesses casos.
Enfim, as dificuldades de leitura orgânicas necessitam ser
diagnosticadas assim que são percebidos os primeiros sinais, sendo
necessária uma equipe multidisciplinar para isso. No entanto, Almeida (2009)
fala em intervenções que podem ser feitas pelo próprio docente, desde que
realizadas com responsabilidade e estudo. Uma dessas é o método fônico que
consiste em atividades de desenvolvimento da consciência fonológica e
linguística.
3.1 Dislexia: o que é?
Diferente da fala que é socialmente construída, a leitura é ensinada. E
isso, pode parecer um problema quando estamos tratando com pessoas que
apresentam dislexia. A palavra “Dislexia” é formada pela contração das
palavras gregas: dis = difícil, prejudicada, e lexis = palavra, e caracteriza-se por
uma dificuldade na área da leitura, escrita e soletração, sendo normalmente
identificada durante o processo de alfabetização, em salas de aula, podendo
provocar uma defasagem inicial no aprendizado.
Para Pironatto (2008), a dislexia, num sentido epistemológico, configura-
se por uma alteração nos neurotransmissores cerebrais, os quais prejudicam o
aprendizado e compreensão da leitura. Para esta autora, trata-se de um
problema na base cognitiva, que impede o desenvolvimento das habilidades
linguísticas, associadas à leitura e à escrita.
Quando está aprendendo a ler, a criança associa fonema a grafema, ou
seja, memoriza e associa letras a seus sons. A partir disto, ela passa a analisar
as palavras e percebê-las em sílabas. Todo este processo parte do
desenvolvimento cerebral, que tem a função de construir uma memória
permanente que reconheça termos familiares. Portanto, à proporção que a
criança vai dominando este processo de leitura, o esforço cerebral vai
diminuindo (PINHEIRO, 1994).
Nesta direção, Pironatto (2008) destaca que com os disléxicos, este
processo não ocorre desta maneira, devido a falhas nas conexões cerebrais.
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Por consequência, os disléxicos apresentam dificuldades em diferenciar
fonemas de sílabas, o que o impede de reconhecer palavras que já tenham
sido estudadas, tornando a aprendizagem da leitura um grande esforço.
Esta mesma autora ressalta que para os disléxicos, a aquisição da
leitura pode apresentar um déficit de dois anos em relação à idade cronológica,
podendo ainda, apresentar “erros” ortográficos, grafia ilegível e escrita
espelhada. Um agravante, é que esse distúrbio não tem cura, portanto,
tratamentos que ajudem à criança criar estratégias que lhe ajudem a ler e
escrever são indispensáveis.
No entanto, essa desordem na aquisição da leitura e/ou escrita não é
tarefa fácil de ser identificada. Portanto, o ponto de partida para esta
identificação é compreender os meios pelos quais as crianças adquirem tais
habilidades. Para ajudar a compreender esse processo de aquisição, Pinheiro
(1994) diz entender ler e escrever como um processo cognitivo que passa por
três momentos: primeiro a palavra é vista como um todo, em seguida inicia-se
o desenvolvimento da consciência fonológica, ou seja, o momento de
corresponder grafema/fonema (é a fase alfabética) e por fim, chega-se à fase
ortográfica, que é o momento de analisar a estrutura e regras da língua
estudada.
Nessa perspectiva, devido aos desafios desse processo, Pironatto
(2008) afirma que é normal uma criança enfrentar dificuldades no primeiro ou
segundo ano escolar, porém, espera-se que nos anos seguintes ela atinja o
nível básico de desenvolvimento. Se isso não ocorre, deve-se realizar o
diagnóstico de dificuldade específica de leitura, que se baseia no grau de
atraso da leitura e não em erros cometidos pela criança. Passa-se então, a
uma avaliação global.
Para a supracitada autora, “avaliação global é um processo em que a
natureza exata da dificuldade de aprendizagem da criança é estabelecida”.
Neste momento, avalia-se o potencial e dificuldades da criança de forma
específica, planejando-se então, métodos apropriados de tratamentos.
Dentre os métodos utilizados, Pestun (1999) fala no “método de
exclusão”, afirmando ser, ainda hoje, um dos mais empregados. Este método
visa excluir déficit intelectual, sensorial, orgânico, motivacional e instrucional,
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que podem ser causadores de dificuldade na aquisição da leitura, para, a partir
deste ponto, iniciar a investigação acerca do dano na rota fonológica, e, só
então, selecionar as intervenções que mais se adéquam ao quadro.
Deste modo, identificar esta dificuldade de aprendizagem é trabalho
complexo, que requer uma anamnese, avaliação apropriada e recomendação
de um plano de tratamento feito por profissionais capacitados para tal fim.
No entanto, muitos tratamentos têm sido adotados. Entre eles, a
assimilação de fonemas, desenvolvimento do vocabulário, fluência e
compreensão na leitura é o que afirma Pegorin (2009). Esta autora defende
que esses métodos ajudam o disléxico na identificação de sílabas, letras,
palavras, sons e frases, visto que a memória recente é um problema para eles.
A mesma autora aconselha a leitura em voz alta, para que as correções
sejam feitas no momento. Outro fator importante é iniciar estes tratamentos
desde cedo, pois, ajudam a corrigir falhas nas conexões cerebrais.
Alguns disléxicos, por serem forçados a pensar e aprender de forma
diferenciada, muitas vezes, tornam-se mais criativos e inovadores que pessoas
não disléxicas. E mesmo não sendo curadas, as pessoas que tem dislexia tem
direitos assegurados por lei como: refazer provas orais, ter uma hora a mais
nas provas escritas e usar a calculadora livremente (PEGORIN, 2009).
A autora supracitada destaca que crianças disléxicas, quando tratadas
cedo, superam o distúrbio e se assemelham às não disléxicas. Além disso, este
não atraso na aprendizagem da leitura evita problemas como: baixa
autoestima, falta de confiança em si mesmo e evasão escolar, que são normais
em pessoas com dislexia.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As considerações acerca desse trabalho são muitas e com certeza
parciais, pois é sabido que entender esse processo que envolve a aquisição da
leitura é tarefa infinda e de difícil conceituação. No entanto, não podemos
deixar de lado os anseios por resolver os problemas que acometem nossos
alunos, fazendo dessa etapa inicial, um desafio imenso.
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Quando essa pesquisa foi iniciada, muitos questionamentos mentais
foram levantados, entre eles estavam: Como a alfabetização é processada?
Em que se baseia o debate entre hereditariedade e ambiente no que concerne
à aquisição da leitura e da escrita? O acesso às situações de aprendizagem é
responsabilidade do lar ou da escola? Se o ambiente social é essencial na
aprendizagem da língua, qual o papel da família e da escola?
No intuito de tentar respondê-los, muitos caminhos foram percorridos. O
primeiro momento foi entrar em contato com crianças que apresentam
maneiras diferenciadas de aprender e de fazer uso do que é ensinado pela
escola. Nesse momento, começou-se a perceber que a dislexia, dificuldade de
aprendizagem fácil de ser encontrada em crianças em fase inicial de
alfabetização e que não tem cura, não é o determinante para que se aprenda
ou não a ler. Pois, os disléxicos aprendem sim, em tempo diferenciado, mas
aprendem.
Nessa direção, ao fazer uma comparação entre a criança disléxica e a
não disléxica, foi percebido que, mesmo sem dificuldades de aprendizagem de
cunho orgânico, a segunda criança apresentava um desenvolvimento aquém à
que possui a disfunção. Nesse momento, ficou aparente que as questões que
envolvem afetividade, relação familiar, alimentação e motivação intrínseca e
extrínseca podem determinar o grau de aprendizado do sujeito.
Nesse sentido, o caminho a ser traçado foi em direção de levantar os
dados do histórico escolar desses dois alunos, percebendo o avanço de um
(aluno com dislexia) e o retrocesso do outro. Esse fato pode ser percebido em
registros de anos anteriores, levando a confirmar as contribuições de diversos
autores, quando dizem que não é a dificuldade de aprendizagem que
determina o aprendizado. E sim, as condições materiais e estruturais
oferecidas para que esse aprendizado aconteça com sucesso.
Com isso, para confirmar o quadro exposto, partiu-se então para a
observação das atividades de leitura e as intervenções feitas com esses alunos
e os demais da turma na qual eles faziam parte. E ficou claro que a questão
não era metodológica, visto que a docente dessa turma faz uso de métodos
eficazes e propostos por teóricos que estudam as estratégias de leitura, ou
seja, aplica atividades que envolvem inferência, antecipação e verificação.
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Desse modo, pode ser percebido que, mais uma vez, a motivação
interna foi determinante para o avanço das crianças. E é a partir daí que
começamos a responder os questionamentos iniciais que foram citados no
início desse texto, pois o processamento da leitura se dá de forma diferenciada
visto que os seres são diferentes. Seria a afirmação de que cada um tem seu
tempo e modo de aprender.
Nessa direção, não cabe pensar em hereditariedade quando pensamos
em aprendizagem da leitura. No entanto, cabe e muito, pensar em ambiente.
Mas, devemos falar em ambientes (no plural), pois o ambiente familiar
determina, o ambiente escolar determina, o ambiente da sala de aula
(alfabetizador) determina, enfim, os ambientes que a criança frequenta e as
interações que faz é o determinante para o desenvolvimento dela, em qualquer
aspecto que seja.
Por esse motivo, quando nos propomos a estudar aquisição da leitura,
precisamos fazer um trabalho de exclusão, que consiste em ir excluindo os
aspectos que não fazem parte da realidade da criança analisada, para depois
começarmos a pensar no que realmente é necessário para sua aprendizagem,
e quais as intervenções que se adéquam à dificuldade apresentada por ela.
Enfim, o que fica de tudo o que foi lido, estudado e registrado é a certeza
de que o aluno é o principal ator, é por ele que a escola existe, portanto, é para
ele que a educação é construída. Desse modo, cabe pensar um ensino voltado
para o alcance dos objetivos de cada discente (individualmente), pois não
estamos tratando de homogeneidade. É certo que alfabetizar não é tarefa fácil,
mas se nós professores continuarmos buscando, envolvendo a família nesse
processo e adequando métodos, com certeza essa dificuldade será dirimida e a
leitura passará a fazer parte da realidade de muitos.
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