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31 APOIO AO ENSINO DE QUÍMICA DO ENSINO MÉDIO DA REGIÃO DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO Lídia Maria de Almeida PLICAS 1 Resumo: A Química utiliza uma linguagem própria para a representação do real usando de modelos microscópicos para a descrição do modelo macroscópico através de símbolos, fórmulas, equações químicas, convenções e códigos. A constatação de que estudantes do ensino médio apresentam deficiências na transposição do macroscópico para o microscópico torna necessário que o aluno desenvolva competências adequadas para reconhecer e fazer uso da linguagem química, sendo capaz de entender e empregar a representação simbólica dessas transformações. O domínio desta linguagem presta-se para o estabelecimento de relações lógico- empíricas, lógico-formais, hipotético-lógicas e de raciocínio proporcional. Este trabalho relata o desenvolvimento de um projeto em ensino de Química visando o processo de significação de conceitos e conteúdos através da realização de experimentos simples contextualizados com o panorama tecnológico atual e com fenômenos do cotidiano. A experimentação tem função pedagógica, a qual por si só não soluciona o problema de ensino-aprendizagem em Química, porém, conduz à formação de conceitos e estabelecimentos de princípios, levando o aluno a um preparo autêntico. Palavras-chave: ensino de Química; ensino médio; experimentação. INTRODUÇÃO Com o grande volume de informações gerado pelo crescente e acelerado desenvolvimento tecnológico dos últimos 30 anos e considerando as necessidades atuais do mundo globalizado, o Ministério da Educação, através da Secretaria da Educação Média e Tecnológica, organizou um projeto de reforma do Ensino Médio como parte de uma política mais geral de desenvolvimento social, que prioriza as ações na área da educação buscando a implementação da qualidade no ensino público formal. Propõe-se ao nível do Ensino Médio, a formação geral, o desenvolvimento da capacidade de pesquisar, buscar informações, analisá-las e selecioná-las, a capacidade de aprender, criar, formular, ao invés do simples exercício da memorização. São estes os princípios gerais que orientam a reformulação curricular do Ensino Médio expressos na nova Lei das Diretrizes e Bases da Educação - Lei 9.394/96. A LDB, em vigor, explicita, no seu artigo 36, que o Ensino Médio é a etapa final da educação básica. Passando a ter a característica da terminalidade, assegura a todos os cidadãos a oportunidade de consolidar e aprofundar os conhecimentos adquiridos no Ensino Fundamental, aprimorando o educando como pessoa humana dentro da ética e do desenvolvimento do pensamento crítico afinado ao projeto da sociedade em que se situa e engajado na conservação, recuperação e melhoria do meio ambiente. 1 Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas.

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APOIO AO ENSINO DE QUÍMICA DO ENSINO MÉDIO DA REGIÃO DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO

Lídia Maria de Almeida PLICAS1

Resumo: A Química utiliza uma linguagem própria para a representação do real usando de modelos microscópicos para a descrição do modelo macroscópico através de símbolos, fórmulas, equações químicas, convenções e códigos. A constatação de que estudantes do ensino médio apresentam deficiências na transposição do macroscópico para o microscópico torna necessário que o aluno desenvolva competências adequadas para reconhecer e fazer uso da linguagem química, sendo capaz de entender e empregar a representação simbólica dessas transformações. O domínio desta linguagem presta-se para o estabelecimento de relações lógico-empíricas, lógico-formais, hipotético-lógicas e de raciocínio proporcional. Este trabalho relata o desenvolvimento de um projeto em ensino de Química visando o processo de significação de conceitos e conteúdos através da realização de experimentos simples contextualizados com o panorama tecnológico atual e com fenômenos do cotidiano. A experimentação tem função pedagógica, a qual por si só não soluciona o problema de ensino-aprendizagem em Química, porém, conduz à formação de conceitos e estabelecimentos de princípios, levando o aluno a um preparo autêntico.

Palavras-chave: ensino de Química; ensino médio; experimentação.

INTRODUÇÃO

Com o grande volume de informações gerado pelo crescente e acelerado

desenvolvimento tecnológico dos últimos 30 anos e considerando as necessidades atuais do

mundo globalizado, o Ministério da Educação, através da Secretaria da Educação Média e

Tecnológica, organizou um projeto de reforma do Ensino Médio como parte de uma política mais

geral de desenvolvimento social, que prioriza as ações na área da educação buscando a

implementação da qualidade no ensino público formal. Propõe-se ao nível do Ensino Médio, a

formação geral, o desenvolvimento da capacidade de pesquisar, buscar informações, analisá-las e

selecioná-las, a capacidade de aprender, criar, formular, ao invés do simples exercício da

memorização. São estes os princípios gerais que orientam a reformulação curricular do Ensino

Médio expressos na nova Lei das Diretrizes e Bases da Educação - Lei 9.394/96.

A LDB, em vigor, explicita, no seu artigo 36, que o Ensino Médio é a etapa final da

educação básica. Passando a ter a característica da terminalidade, assegura a todos os cidadãos

a oportunidade de consolidar e aprofundar os conhecimentos adquiridos no Ensino Fundamental,

aprimorando o educando como pessoa humana dentro da ética e do desenvolvimento do

pensamento crítico afinado ao projeto da sociedade em que se situa e engajado na conservação,

recuperação e melhoria do meio ambiente. 1 Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas.

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Considerando-se o contexto da globalização e da revolução tecnológica, buscou-se

construir novas alternativas de organização curricular para o ensino médio, alterando-se, portanto,

os objetivos de formação, priorizando-se a formação ética e o desenvolvimento da autonomia

intelectual e do pensamento crítico.

Dentro das metas da reestruturação curricular, a aprendizagem na área das ciências

busca a compreensão e a utilização dos conhecimentos científicos, para explicar, planejar,

executar e avaliar ações de intervenção na realidade. Para fazer a ponte entre teoria (fundamentos

científicos-tecnológicos) e a prática (processo produtivo), é preciso estabelecer relações entre o

aprendido e o observado, seja no cotidiano ou no contexto específico de um trabalho laboral.

Contudo, observa-se que a ênfase na memorização, a ausência de experimentação

e a falta de correlação entre o conteúdo químico e a vida diária do aluno têm sido as principais

características do ensino de química no Brasil. Um processo que vem, lentamente, sendo alterado

com cursos de aperfeiçoamento e capacitação de professores do ensino médio, principalmente

com a apresentação de conceitos filosóficos e teorias da qualidade e suas ferramentas para

sistematização de processos na área educacional. Dessa forma o ensino em geral, e em particular

o ensino de química, tem contribuído de forma efetiva tanto para o desenvolvimento intelectual dos

estudantes, quanto para a formação de cidadãos mais conscientes.

Com a aprovação da nova Lei que reorienta o ensino a nível nacional, e com a

instituição de uma política nacional de educação ambiental na educação formal, faz-se necessário

a modernização do sistema de ensino, quais sejam: obter resultados avaliáveis, ajustar o ensino

às necessidades do mercado de trabalho, da economia, dos programas de qualidade de gestão da

educação e incorporar o conhecimento e o domínio dos princípios científicos e tecnológicos. A

nova reforma de ensino justifica-se também pela busca de uma melhor qualidade de ensino, o qual

pode ser determinado por: efetividade, eficiência, eficácia, pertinência, suficiência, atualidade e

aceitabilidade pelos seus “usuários” internos e externos, com elevados índices de satisfação para

ambos.

É sabido que a qualidade de ensino depende, sobretudo, de um professorado

motivado e comprometido profissionalmente, com condições de trabalho adequadas que

favoreçam o desenvolvimento contínuo de práticas pedagógicas de ensino e aprendizagem, com

boa fundamentação teórica, e recursos materiais. Porém, tem-se observado que é praticado, na

maioria das Escolas Públicas, o ensino de caráter simplesmente informativo, sem a devida

preocupação pela formação de uma mentalidade científica que tenha aplicação em qualquer

atividade profissional à qual, futuramente, o estudante possa se dedicar quer seja na produção de

conhecimento (ensino ou pesquisa) ou na produção de bens e serviços.

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O ensino de Ciências Naturais, freqüentemente conhecido como “ensino teórico”,

não favorece nem permite uma aprendizagem real. Este ensino teórico inadequado pode esterilizar

e invalidar a mentalidade dos estudantes. Assim, a realização de experiências, como também o

uso de observações cotidianas das transformações que ocorrem no ambiente para introduzir e

ilustrar os diversos itens do programa das disciplinas relacionadas às ciências, conduz quando

bem orientadas, a uma formação de conceitos e estabelecimento de princípios, levando o aluno a

um preparo autêntico.

Durante o percurso através dos diversos níveis de ensino, é natural que se alterem

as estratégias para acompanhar a crescente capacidade de abstração dos estudantes, portanto, a

minuciosidade na observação e o planejamento cuidadoso das atividades de experimentação e de

estudo devem ser levados em consideração. Em todos eles deverão estar presentes o espírito de

indagação e o esforço para explicar e concluir, embora guardando as limitações e direcionamentos

ditados pelas diferenças nos conhecimentos teóricos e pela capacidade de abstração do aluno.

As diretrizes nacionais propostas na LDB/96, que visam nortear as várias áreas de

conhecimento abordadas no ensino médio, enfatiza que a interdisciplinaridade pretendida não

anula a disciplinaridade do conhecimento, pelo contrário, deve complementá-la. Deixa claro

também que cada disciplina desenvolva conhecimentos contextualizados para que se possam

atingir competências e habilidades que sirvam para o exercício de intervenções e julgamentos

práticos, essenciais à vida contemporânea.

Especificamente a Química deve dar ênfase às transformações geradoras de novos

materiais e deve ser reconhecida pelo fato de estar presente nas mais diversas atividades

humanas, do ar que respiramos, passando pelos inúmeros materiais utilizados diariamente, com

todos os seus riscos e benefícios, até a interação do ser humano com o meio. Assim, o

conhecimento químico deve ser interpretado como uma construção da mente humana e por isso

em contínua mudança e sujeito a avaliações de natureza ética.

Percebe-se na educação, em especial no ensino da química, uma forma própria e

ensinar e conscientizar, motivando os nossos jovens à busca de um pensamento crítico e de

estratégias para uma melhor qualidade de vida.

É inquestionável que o aprendizado das disciplinas relacionadas às ciências é muito

melhor quando, além das aulas expositivas, os alunos têm a oportunidade de aplicarem em

experimentos os conceitos cognitivos e adquiridos. O interesse dos alunos é despertado e o

aproveitamento das aulas expositivas torna-se mais acentuado sempre que o assunto em pauta é

desenvolvido em laboratório, ou demonstrado em sala de aula através de experimentos.

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De acordo com levantamento realizado junto às escolas de ensino Médio de São

José do Rio Preto verificou-se que a maioria dos professores do ensino de química não conduz

aulas experimentais. Diante dessa realidade este projeto se propôs a fornecer subsídios para o

aprimoramento do aprendizado em química, com atuação direta junto aos professores e alunos

nas escolas, elaborando programas experimentais adequados às condições do local,

equipamentos e tempo de que disponha cada professor visando a inter-relação entre o

macroscópico, a representação simbólica e a abstração ao microscópico do educando,

promovendo a associação entre teoria e prática caracterizando-se, portanto, como um projeto de

intervenção direta na realidade escolar.

O planejamento cuidadoso das atividades de estudo e experimentação que

incentivem a minuciosidade na observação devem ser considerados, pois estimulam o processo

de indagação e o esforço para explicar e concluir.

OBJETIVOS

Gerais

Buscar a transformação dos conceitos; a inclusão de procedimentos vinculados à

realidade; perceber, apreciar e valorizar a diversidade social, cultural, política e ambiental, pois

alunos com diferentes histórias de vida podem desenvolver e apresentar diferentes leituras ou

perfis conceituais sobre os fenômenos químicos. Por fim, contribuir para o desenvolvimento dos

valores humanos que são objetivos concomitantes do processo educativo.

Específicos

Mapeamento das necessidades cognitivas dos alunos no que se refere ao emprego

da linguagem apropriada para descrição dos fenômenos e das transformações químicas;

desenvolvimento de experimentos que possibilitem a familiarização da visão macroscópica dos

diferentes fenômenos químicos e estimulem a descrição dos mesmos na forma mais adequada,

através do formalismo que melhor corresponda aos modelos microscópicos. Apresentação de

modelos microscópicos por meio de animação audiovisual visando o desenvolvimento de modelos

mentais.

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METODOLOGIA

Coleta de dados

Questionários aplicados aos alunos para estabelecimento do nível de aprendizado e

capacidade de descrição dos fenômenos, processos e transformações químicas em linguagem

apropriada bem como o modelo dos fenômenos em nível microscópico.

Para o desenvolvimento do projeto

Adaptação dos experimentos à escolaridade dos alunos, visto que o projeto

envolveu alunos de todas as séries do Ensino Médio. Especial atenção foi prestada aos alunos da

1ª série, pois, pretende-se que o projeto seja desenvolvido em três anos.

Avaliação

Relatórios dos experimentos, observações pessoais e análise de aproveitamento

dos alunos em todas as atividades de avaliação propostas por seus professores.

DESENVOLVIMENTO DO PROJETO

O projeto foi aplicado na forma de módulos tomando por base a atual proposta

curricular da disciplina para cada série, como exposto a seguir:

Série Conteúdo Programático

1ª Matéria e Energia; Estrutura da matéria; Estrutura do átomo; Classificação

periódica; Ligações químicas e Funções inorgânicas.

2ª Reações químicas; Estequiometria; Gases; Soluções; Termoquímica;

Cinética química; Equilíbrio; Eletroquímica e Radioatividade.

3ª Química orgânica; Funções orgânicas; Reações orgânicas e Isomeria.

Participaram alunos de todas as séries do ensino médio, quando uma vez por mês,

as aulas expositivas foram substituídas por atividades propostas no projeto. Para todas as séries

trabalhadas propusemos a discussão dos conteúdos dos livros didáticos quanto à sua

apresentação e linguagem, a forma como são ministrados pelo professor, a compreensão e o

entendimento. Desenvolveram-se também aulas experimentais buscando a contextualização da

química com os fatos do panorama histórico.

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Atividades conjuntas: palestras sobre a problemática ambiental visando

sensibilização e conscientização e visitas de campo como proposta de continuidade à

contextualização da química com fatos e fenômenos atuais. Estimulo ao desenvolvimento de Feira

Multidisciplinar com ênfase às atividades pertinentes às ciências.

Das atividades desenvolvidas com alunos da 1ª Série, destacamos os erros comuns

mais freqüentes com relação aos conceitos de átomo, moléculas e ligações químicas. Ao ser

questionado quanto à definição de átomo, o aluno respondeu:

“os átomos são como uma célula com uma membrana e o núcleo”,

“os elétrons circulam o átomo com planetas ao redor de uma estrela”,

“a camada de elétrons protege o núcleo como a casca de ovo protege a

gema”,

“a nuvem eletrônica é como uma nuvem de chuva, com elétrons suspensos como

as gotas de água”

Primeiramente, percebe-se que o aluno estabelece a correlação com outros

conceitos de seu conhecimento cognitivo relacionados principalmente, com os conteúdos das

Ciências Biológicas, porém os conceitos químicos permanecem equivocados. Os conceitos

corretos seriam: O núcleo da célula e o núcleo de átomo não são sinônimos, os átomos vibram

devido à sua energia interna térmica, mas não têm características dos seres viventes. Os elétrons

não seguem um caminho circular simples ao redor do núcleo. As camadas eletrônicas não são

físicas, como a casca de ovo, são regiões ao redor do núcleo, onde os elétrons podem ser

encontrados. Os elétrons não estão suspensos sem movimento na nuvem eletrônica, ao contrário,

estão constantemente em movimento através da “nuvem”, a qual não é constituída de qualquer

outro tipo de matéria.

Pode-se perceber que o professor, por várias razões, suas próprias limitações,

falta de material apropriado, falta de tempo ou por subjugar a capacidade de entendimento e

abstração dos alunos não usa dos modelos apropriados para que o aluno entenda a química ao

nível microscópico, de maneira que o aluno vai se arranjando com o seu próprio senso modo de

fazer seus conceitos abstratos.

Quando perguntados sobre o conceito de moléculas, responderam:

“moléculas são entidades básicas, simples e indivisíveis”,

“moléculas de sólidos são duras e de gases são leves”,

“moléculas expandem quando aquecidas”.

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Novamente, pode-se perceber a correlação com o conhecimento adquirido

anteriormente, porém, neste caso a analogia é bastante simplória sem nenhuma tentativa de

embasamento científico. Verifica-se que o aluno não foi capaz de aplicar os conceitos de átomos,

mesmo que equivocados, para formular uma definição de molécula, fato este mais preocupante,

pois as correlações entre os conceitos de química não estão sendo alcançadas.

As associações corretas seriam: moléculas são constituídas de entidades menores

(átomos) que se organizam de forma diferente em diferentes moléculas, nota-se aqui, que o

conceito de ligação química não foi requerido, uma vez que este conceito é posterior à definição

primária de molécula. Portanto, moléculas são divisíveis. Tipo, tamanho e massa de moléculas não

variam entre as fases sólida, líquida e gasosa. Mudanças de estado são variações físicas. As

moléculas propriamente não expandem, mas afastam-se mais e mais umas das outras quando

ocorre uma mudança de estado.

Com relação às ligações químicas, geralmente o termo “unidos” e o mais simples

utilizado pelo professor para introduzir esse assunto, assim facilmente o aluno relaciona “unidos”

com “colados” ou “grudados” gerando o estabelecimento do um conceito errado. É necessário que

o professor use termos como “mantidas presas ou seguras, juntas” por forças de atração e então

explicar os diversos tipos de atração que estão envolvidos nas ligações químicas entre átomos.

Com o desenvolvimento de atividades de apresentação de recursos audiovisuais

com animação, com o propósito de corrigir os conceitos equivocados formulado pelos alunos,

pode-se perceber que a maioria dos alunos conseguiu entender e assimilar os conceitos corretos

de átomos, moléculas e ligação química.

Das atividades desenvolvidas com alunos de 2ª e 3ª Série, verificou-se que a

grande dificuldade residia no uso da simbologia e linguagem químicas apropriadas para a

descrição dos fenômenos químicos principalmente, no uso das equações químicas e

estequiometria para a representação das reações químicas e conseqüentes cálculos quantitativos,

quando necessário. Foi dada ênfase aos processos químicos e às reações químicas, às fases em

que reagentes e produtos se encontram no meio e ao tipo de reação, buscando sempre fazer com

que o aluno pudesse raciocinar em relação à geometria e polaridade de moléculas, quebra e

formação de ligações químicas, formação de íons e moléculas e reação entre estes. Usamos como

exemplo os experimentos:

Líquidos Imiscíveis

Procedimento: colocar na proveta cerca de 2 mL de glicerina, solução de CuSO4

saturada, 2 mL de água colorida, 2 mL de óleo de cozinha e 2 mL de álcool.

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Observar e explicar. Agitar o sistema, esperar alguns segundos, observar e explicar.

Conceitos explorados: propriedades físicas de alguns líquidos, misturas, densidade,

massa, número de fases do sistema, polaridade de moléculas.

Neste experimento os alunos puderam verificar que líquidos constituídos por

moléculas polares e apolares não se misturam e em função de sua densidade dispõem-se uns

sobre os outros. A solução saturada de CuSO4 por ser mais densa que a água colorida num

primeiro momento, não se mistura a esta, porém após a agitação do sistema, observou-se a

diminuição do número de fases presentes, a mistura da solução de CuSO4 com água colorida e

etanol e que, líquidos mais leves tendem a posicionar sobre os líquidos mais pesados.

Produzindo Um Polímero

Procedimento: colocar partes iguais de cola branca e água num pote de vidro e agitar com o

palito até dissolver a cola. Juntar aproximadamente 10 gotas de solução saturada de bórax e

continuar mexendo até o aparecimento de uma massa elástica que adere ao palito. Retirar a

massa do palito e manuseá-la fazendo os mais diversos modelos. Se necessário acrescente mais

bórax.

Conceitos explorados: reação de polimerização, polímeros, catalisadores e borracha sintética.

A cola é uma solução de poli (acetato de vinila) em água. As moléculas unitárias

chamadas de monômeros(...CH2CH2CH2 ...) estão dissolvidas na água e podem

O C O CH3 mover-se livremente. Ao adicionar o bórax, altera-se a consistência do material. O bórax,

catalisador, une as diversas cadeias poliméricas fazendo com estas não possam mais se mover

independentemente das vizinhas. As ligações cruzadas entre uma cadeia polimérica e suas

vizinhas deixam muito espaço para que a água fique presa entre as cadeias, conferindo ainda um

certo grau de maleabilidade ao novo material. Um polímero com este tipo de ligação é chamado de

reticulado, pois as cadeias estão ligadas como em uma rede. Pode-se usar como exemplo o caso

do álcool polivinílico. Quando se coloca o bórax na água este irá juntar as diferentes cadeias em

uma rede, formando ligações cruzadas entre as cadeias e a água ficará presa entre as cadeias na

rede, conforme figura 1 abaixo.

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Figura 1. Representação da formação de ligações cruzadas entre cadeias poliméricas do

álcool polivinílico por ação do bórax.

Procedimentos como estes, exemplificados acima, foram aplicados a todos os

experimentos e atividades relacionadas aos conceitos de química. Em outras atividades como

palestras e visitas de campo a contextualização com a química foi destacada e sempre que

possível, os processos e as reações químicas envolvidas mais importantes foram abordados de

maneira similar.

A seguir apresentam-se as principais dificuldades apontadas por professores e

alunos quanto ao ensino de química.

Dificuldades relacionadas aos professores:

1 – Dificuldades em cumprir o programa da disciplina: número reduzido de aulas

destinadas à disciplina, o programa da série inicial é muito abstrato, de maneira que o aluno não

consegue formular modelos mentais para seu entendimento, recorrendo então à memorização.

Quando o tópico permite a ilustração por meio de atividades diversas da aula expositiva verifica-se

a falta de habilidade do professor.

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2 – Dificuldades em ministrar aulas experimentais: local inadequado, falta de um

auxiliar para a prévia de preparação da aula e limpeza do material, falta de material, insegurança

do professor, imaturidade dos alunos, classes numerosas.

3 – Dificuldades em realizar atividades extramuros: disponibilidade de transporte,

pouco domínio do assunto por parte do professor, contextualização com a química.

Dificuldades relacionadas aos alunos:

1 – Dificuldades relacionadas à disciplina: relatam que a disciplina requer muita

memorização, é muito abstrata, não conseguem contextualizar com fatos e fenômenos do

cotidiano, quando o professor o faz não atingem nível de compreensão necessário para o seu

pleno entendimento.

2 – Aulas experimentais: são inexistentes, quando não, são apenas experimentos

demonstrativos em sala de aula ou em laboratório, porém devido a falta de material tornam-se

também demonstrativos, desta forma os alunos são meros espectadores não podendo

desenvolver eles próprios os experimentos.

3 – Infra-estrutura: salas numerosas o que gera a indisciplina atrapalhando o bom

andamento do cronograma dos conteúdos e a inexistência de local adequado para realização de

experimentos.

4 – Contextualização com o panorama tecnológico atual: o tema em voga é a

questão ambiental, limita-se à pesquisa na Internet sobre poluição ambiental, à redação de um

trabalho escrito e/ou a apresentação na forma de cartazes onde os próprios alunos expõem aos

colegas, sem a devida orientação do professor, principalmente na correlação com o assunto que

está sendo abordado em sala de aula e em cada série.

5 – Atividades extramuros: quando são possíveis, os professores são meros

acompanhantes responsáveis pela disciplina da turma, deixando para os responsáveis pelo local

visitado a incumbência da explicação das atividades e processos ali desenvolvidos. dos alunos são

cobrados relatórios simples da vista sem a preocupação da contextualização com a química.

6 – Desenvolvimento de Feiras Multidisciplinares: geralmente os alunos procuram a

Universidade para que esta os ofereça experimentos prontos para serem apresentados.

Infelizmente, a prática desta atividade, entretanto, tem recaído sobre atividades culturais firmadas

em habilidades individuais dos alunos, tais como peças teatrais, música, desenho, dança etc.

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CONCLUSÕES

A Química envolve a interpretação de mudanças observáveis da matéria ao nível

macroscópico concreto em termos de mudanças imperceptíveis na estrutura e processos em nível

microscópico, imaginário. Essas mudanças são então representadas em um nível simbólico

abstrato de duas formas: qualitativamente, usando notação específica, linguagem, diagramas, e

simbolismos; e quantitativamente, usando a matemática (equações e gráficos). Muitos professores

da disciplina de química atuam no nível macro e simbólico, mas é sabido que conceitos errados

em química provém da inabilidade para visualizar estruturas e processos ao nível sub-micro ou

molecular. No entanto, eles não podem mudar o modelo mental dos estudantes desse nível,

simplesmente apresentando a eles um diferente, embora melhor, modelo de animação áudio-

visual de átomos e moléculas. Animações do nível molecular podem ser uma fonte de ensino

efetiva e convincente, mas devem ser construídas e apresentadas com grande cuidado para

encorajar os alunos a focar as representações chaves, e não permitir generalizações ou ainda

reforçar os conceitos errôneos.

É importante apresentar ao aluno fatos concretos, observáveis e mensuráveis, uma

vez que os conceitos que este traz para sala de aula advêm principalmente de sua leitura do

mundo macroscópico. O uso de observações cotidianas das transformações que ocorrem no

ambiente ao seu redor e no mundo e, as realizações de experimentos e atividades

contextualizadas contribuem para o desenvolvimento das competências e habilidades cognitivas e

afetivas no ensino de Química auxiliando o aluno a tomar suas próprias decisões, contribuindo

assim para o desenvolvimento do educando como pessoa humana e como cidadão.

A perspectiva de ensinar Química ligada à sobrevivência e ao desenvolvimento

sócio-ambiental sustentável oferece a oportunidade para aprofundar a interdisciplinaridade entre

os conhecimentos de química, física, biologia e etc., visando a aprendizagem ativa e significativa.

A abordagem dos temas deve ser realizada através de atividades que provoquem a especulação,

a construção e reconstrução de idéias, dessa forma, constroem-se conceitos e se desenvolvem

habilidades e competências.

Neste 1º ano de projeto desenvolvido pode-se concluir: a contribuição para o efetivo

exercício de aulas experimentais, a melhoria do domínio da linguagem química, melhoria do

aproveitamento escolar, o estimulo ao desenvolvimento de atividades interdisciplinares com outras

ciências e viabilização da aplicação do tema transversal Educação Ambiental. Parcerias com a

Universidade são bem-vindas, pois possibilitam a integração de alunos e professores do ensino

médio com a Universidade e promovem o exercício das competências e habilidades do graduando.

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O presente projeto tem proporcionado aos alunos a melhor aceitação da disciplina,

desmistificando a pecha de difícil, “chata”, desnecessária, desconexa. Percebe-se que as

atividades desenvolvidas provocam a especulação, tornando o aluno mais participativo facilitando

a construção e reconstrução de idéias e conceitos e, aos professores a oportunidade de melhorar

suas competências e habilidades.

Os objetivos têm sido alcançados principalmente com alunos da terceira série

quando estes, num primeiro momento reconhecem o conceito que foi aprendido em aula teórica,

num segundo momento, entende o conceito e consegue inter-relacionar diversos conceitos e

realizar a abstração para a o entendimento de fatos e fenômenos do cotidiano que estão sob

investigação na atividade em desenvolvimento como também explicá-los. Por fim, o aluno foi

capaz de propor uma explicação a fatos e fenômenos ainda não abordados nas atividades em

desenvolvimento. Desta forma, o estímulo à observação e especulação científica facilita a

construção e reconstrução de idéias, constroem-se conceitos ou definições que serão abordados

em sala de aula.

Com os alunos da primeira série foi possível verificar que os conceitos de átomo,

moléculas, ligações químicas e fenômenos químicos e físicos foram alicerçados em modelos

microscópicos plenamente aceitáveis. A proposta para o próximo ano é desenvolver com os

alunos agora na segunda série a simbologia e linguagens próprias da química para o bom

entendimento das reações químicas, promover a interdisciplinaridade no resgate dos conceitos de

matemática para a quantificação dos processos químicos qualitativa e corretamente representados

anteriormente na aplicação em estequiometria, ao estudo de gases, definição e preparação de

soluções e demais tópicos relacionados aos conteúdos da segunda série do ensino médio.

Para os alunos da terceira série, deve-se fazer o resgate dos conceitos de ligação

química para o estabelecimento da química do carbono. Funções orgânicas é um assunto rico

para estabelecer a contextualização com exemplos do cotidiano do aluno, o simbolismo e

linguagem da química serão muito utilizados, os conceitos de reações químicas e sua

representação serão muito requisitados, a interdisciplinaridade com a física e biologia deverá ser

explorada.

É importante o contínuo incentivo às pesquisas de caráter disciplinar ou

interdisciplinar e projetos sobre intervenções na realidade das escolas no tocante�ao�ensino de

ciências para que possamos consolidar uma prática educativa que desenvolva novos valores em

relação à forma como vemos, sentimos e vivemos; onde a cidadania, a inclusão, o respeito, a

alteridade, a convivência harmônica e a tolerância sejam uma constante na prática educacional.

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