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INDSTRIA CERVEJEIRA: um mercado em constante transformaoEmpresas buscam estratgias diferenciadas para superar desafios

2) Industrializao (organizadora do mercado) O mercado de cervejas constitudo por empresas do Alm da preocupao logstica de instalar indstrias final do sculo XIX, que sempre tiveram a promoo das em pontos estratgicos para distribuio e consumo, suas marcas e a compra de seus concorrentes como a deve haver disponibilidade de fontes naturais (como principal plataforma para seu desenvolvimento. Para a gua) e investimentos no desenvolvimento de novas compreendermos essa estratgia, necessrio primeiro idias para a produo da cerveja. observar a sua cadeia de valor, que pode ser estruturada 3) Distribuio e comercializao (importante em trs grandes etapas: elemento estratgico) - A distribuio um dos 1) Produo da matria-prima (principalmente a pontos-chave neste mercado. H um forte vnculo cevada) - A cerveja o resultado da fermentao entre a capacidade de distribuio e a promoo da alcolica de um mosto preparado com o malte da marca, j que a venda se concentra no cevada. Agregam-se ainda o varejo, principalmente em bares (grfico 1). lpulo, a levedura e a gua, mas a No basta ter uma As vendas realizadas por esses bares no principal matria-prima o malte, tima campanha de somente so as de maior relevncia em que representa cerca de 10% do marketing e forte termos de volume (50,6%), como tambm custo industrial (OLIVEIRA, 1996). investimento em A produo da matria-prima so as que representam maior valor cercada ainda de algumas (55,4%). J as vendas em auto-servio propaganda, se a aumentaram sua participao em 2001, mas controvrsias, principalmente no empresa no mantiver no representam tanto na composio do que se refere ao preo negociado um adequado entre os produtores de cevada e a valor de venda. Diante disso, ressalte-se que abastecimento no indstria de cerveja, varivel que no basta ter uma tima campanha de ponto-de-venda no est completamente sob o marketing e forte investimento em propaganda, se a empresa no mantiver um domnio dessa indstria. H forte adequado abastecimento no ponto-de-venda. Este dependncia do valor da commodity, j que boa parte da matria-prima importada, em razo das um dos grandes desafios desta indstria. Em termos de comercializao, a indstria de cerveja convive dificuldades de obter uma cevada nacional de boa com duas questes relevantes: a) a sazonalidade, qualidade (OLIVEIRA, 1996). Em 1996, por exemplo, os principais exportadores para o Brasil eram haja vista que o consumo de seus produtos se Canad, Blgica, Argentina e Austrlia. concentra em perodos de temperaturas mais quentes.

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Neste particular, destaque-se a estratgia da Kaiser ao lidar com essa sazonalidade, lanando a Kaiser Bock, um produto com maior teor alcolico e cujo consumo prprio para perodos de baixas temperaturas; b) a estagnao, basta observar que o mercado consumidor permaneceu estagnado de 1995 a 2001. Dados do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social) e da SINDICERV (Sindicato das Cervejarias) revelam: em 1995, o consumo per capita de cerveja no Brasil era de 50 litros por habitante; em 2001, este nmero era de 50,3.GRFICO 1 - VOLUME E VALOR DE VENDAS DE CERVEJAS POR TIPOS DE LOJAS BRASIL - 2000/2001 % do Volume 60 50 40 30 % do Valor 60 50 40 30

Administrativo de Defesa Econmica), a canadense Molson comprou a Bavria. Em fevereiro de 2003, a Molson teve aprovada sua inteno de venda de 20% do capital social das Cervejarias Kaiser Brasil S/A para a holandesa Heineken Internacional Bv. A prpria Heineken, que j prestava assistncia tcnica para a Kaiser desde 1984, agora estava efetivamente na luta pelo mercado brasileiro de cervejas junto com a Molson. Essa estratgia visava fortalecer a marca Kaiser pela juno de duas multinacionais, para competir com a Ambev no mercado nacional de cervejas. Essas negociaes entre as indstrias fizeram despontar duas grandes empresas: a Ambev, detentora das marcas Skol, Brahma e Antrtica, e a Kaiser, detentora das marcas Kaiser e Bavria. Esta detm participao de aproximadamente 15,7% e aquela, de 62%. Tambm vem crescendo a participao da Schincariol, que j detinha 9,1% em maro de 2002 (grfico 2).GRFICO 2 - PARTICIP AO NO MERCADO DE CERVEJAS POR MARCA (PIELSEN) - BRASIL - MAR 2002 13% 9% 11%

2000 Bares Tradicional

2001 Auto-Servio Bares

2000 Tradicional

2001 Auto-Servio

FONTE: ACNielsen

As principais estratgias para enfrentar esses desafios tm sido o aumento da concentrao de mercado, a fim de ganhar sinergias com as empresas incorporadas, principalmente quanto a custos e logstica, o desenvolvimento de estratgias de marketing de segmentao e a consolidao da marca.

3%

13%

30%

21% Antrtica Skol Schincariol Brahma Outras Kaiser

Concentrao de mercadoNa indstria cervejeira uma das estratgias utilizadas para ganhar competitividade a concentrao de mercado. A Antrtica e a Brahma, por exemplo, adquiriram vrios fabricantes de bebidas, entre elas a Astra, do Cear, Cibeb, da Bahia, Niger, de So Paulo e Polar, do Rio Grande do Sul. Alm disso, a Brahma entrou no mercado venezuelano ao comprar a Cervecera Nacional e firmou parceria na Argentina com a norte-americana Miller. Por outro lado, oito meses aps a fuso da Antrtica e da Brahma, resultando na Companhia de Bebidas da Amrica (Ambev), cuja negociao foi avaliada pelo CADE (Conselho

Bavaria FONTE: ACNielsen

EstratgiasOs principais vetores de concorrncia do mercado de cervejas esto concentrados na etapa de produo, distribuio e consumo e so: economias de escala e escopo; preo; segmentao de clientes; distribuio e fortalecimento da marca. As estratgias vinculadas etapa de produo so as de economia de escopo e de escala. Enquanto a primeira51r e v i s t a F A E B U S I N E S S , n.6, ago. 2 0 0 3

se refere aos ganhos obtidos com a produo de itens diferentes na mesma fbrica, a segunda est relacionada produo em grande volume. Para ter economias de escopo, os fabricantes de cerveja produzem outras bebidas, principalmente refrigerantes, e tm neste tipo de estratgia economias fundamentais para seu negcio. J a economia de escala obtida, nas etapas da cadeia de valor, com ganhos na: negociao e compra de maior volume de matriaprima; produo, por meio de maior produtividade a partir de um volume maior produzido por planta; distribuio, pela reduo dos custos logsticos e de propaganda por volume negociado.

As principais estratgias, para enfrentar os desafios desse mercado, tm sido a concentrao de mercado, o marketing de segmentao e a consolidao da marca

A Ambev segue com mais vigor a estratgia de economia de escala e de escopo. Hoje ela pode ser considerada uma multinacional brasileira e j est entre os maiores fabricantes de bebidas do mundo (quadro 1). A fuso que resultou na Ambev e a compra da Quilmes (Argentina) propiciaram forte estrutura a esta empresa que, por meio de sinergias dessa fuso, conseguiu aumentar seu lucro de 2001 a 2002 em 92%. Os fatores que levaram a esse crescimento, segundo Felipe Dutra (diretor financeiro da Ambev) foram: melhor gerenciamento das receitas, crescimento do consumo per capita (refrigerantes), desenvolvimento, de forma rentvel, do segmento de refrigerantes, aumento da eficincia da rede de distribuio e reduo de custos (UEDA e SAITO, 2003). Ou seja, estes fatores esto relacionados basicamente a economias de escala e de escopo, a partir do crescimento da empresa pela prtica de fuses e aquisies.QUADRO 1 - RANKING DOS MAIORES FABRICANTES MUNDIAIS DE BEBIDAS - 2002 FABRICANTES Coca-Cola Anheuser-Busch/Budweiser Ambev/Quilmes Carlsberg MILHES DE HECTOLITROS 233,5 125,8 100,8 88,2 87,3

As estratgias de economia de escala e de escopo so seguidas principalmente pela Ambev e pela Schincariol. Esta ltima busca ganhar mercado a partir da implantao e ampliao de fbricas. Um exemplo a ampliao da produo na fbrica de Maranho, em Caxias. Esta fbrica iniciou suas operaes em setembro de 2002 e em janeiro deste ano j trabalhava com 90% da capacidade de produo 1,5 milho de hectolitros de cerveja por ano (MONTELES, 2003). A expectativa da empresa, em razo do mercado estagnado, como mencionado anteriormente, ganhar participao de seus concorrentes em mercados ainda no desenvolvidos. Ainda est sendo avaliada a implantao de uma nova fbrica da Schincariol em Santa Catarina ou Rio Grande do Sul. O investimento seria em torno de R$ 150 milhes, para a produo de 1,5 milho de hectolitros, e geraria 300 empregos diretos (MEURER, 2003). Tais aes representam a sua principal estratgia de mercado: preo baixo.

Interbrew

FONTE: Ambev (citado por PFEIFER; VILARDAGA, 2002) NOTA: Inclui a produo de cervejas e refrigerantes por fabricante.

A estratgia de preo foi adotada mais eficazmente pela Schincariol. RIBEIRO (2002) argumenta que a participao de mercado desta cervejaria foi conquistada em boa parte graas ao baixo preo, mas a empresa tambm resolveu apostar em uma nova marca para agregar valor. A marca desta cerveja a Primus e est relacionada estratgia de segmentao do mercado. Segundo Arajo, gerente de marketing da cervejaria, enquanto a Schin custa em torno de R$ 0,85 a garrafa padro no comrcio, a Primus ir custar em torno de R$ 1,60 ( RIBEIRO , 2002). A Ambev tambm busca a segmentao de mercado por meio do fortalecimento de marcas com alto valor agregado (como a Boehmia) e ganhos na diferenciao de produtos (como a Boehmia

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Escura, lanada em 2002, cujo preo deveria ser em torno distribuio, venda e marketing. Esses foram os principais de R$ 5,00). Essa estratgia est focada na atrao de vetores de concorrncia almejados pela empresa, que no consumidores das classes A e B, cujo conseguia se posicionar pelos baixos consumo atualmente no ultrapassa 42 preos, como a Schincariol, e no havia As negociaes litros per capita, enquanto o consumo das ganhado sinergia, como a Ambev. entre as indstrias classes C e D chega a 55 litros per capita. Nota-se, ento, que a indstria fizeram despontar Tais informaes alimentam a estratgia cervejeira ainda extremamente duas grandes de agregao de valor, focada dinmica, apesar da forte concentrao empresas: a Ambev, principalmente na segmentao de de mercado, aps a fuso da Ambev. detentora das produtos e em propaganda e distribuio. Cada empresa vem buscando seu nicho marcas Skol, Brahma A Kaiser foi a primeira empresa a de mercado, focando-se em estratgias e Antrtica; e a aplicar a estratgia de segmentao de diferenciadas na cadeia de valor, para mercado, criando a Kaiser Bock, para atuar num mercado em constante Kaiser, detentora minimizar o problema de sazonalidade transformao.n das marcas Kaiser enfrentado pela indstria de cervejas. e Bavria Quando comprada pela canadense Molson, a Kaiser iniciou um processo de reestruturao e anunciou o fechamento de suas fbricas Christian Luiz da Silva economista, doutor em Engenharia de mais antigas. Alm de fechar essas fbricas, a cervejaria Produo pela UFSC e professor da FAE Business School. concentrou investimentos em aspectos relacionados E-mail: [email protected]

REFERNCIASMEURER, Elmar. A Schincariol planeja nova fbrica no Sul. Gazeta Mercantil, So Paulo, 19 jan. 2003. MONTELES, Franci. Schincariol j estuda ampliar produo de fbrica no Maranho. Gazeta Mercantil, So Paulo, 13 jan. 2003. OLIVEIRA, Maria Helena de (Resp.). Cerveja. BNDES, Rio de Janeiro, abr. 1996. Disponvel em: . Acesso em: jul. 2002. Informe Setorial. PFEIFER, Ismael; VILARDAGA, Vicente. Com a Quilmes, AMBEV j a 3 do mundo. Gazeta Mercantil, So Paulo, 3 a 5 maio 2002. RIBEIRO, Marili. Cervejarias ensaiam a segmentao. Gazeta Mercantil, So Paulo, 19 jun. 2002. RIBEIRO, Marili. Kaiser fecha suas fbricas mais antigas. Gazeta Mercantil, So Paulo, 21 a 23 jun. 2002. UEDA, Daniela; SAITO, Ana Carolina. O lucro da AMBEV cresce 92%... Gazeta Mercantil, So Paulo, 23 fev. 2003.

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