universidade cÂndido mendes pÓs-graduaÇÃo lato …dificuldades de aprendizagem e relaÇÕes...
Post on 13-Oct-2020
2 Views
Preview:
TRANSCRIPT
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM E RELAÇÕES
FAMILIARES
Por: Maria Aparecida da Matta Andrés
Orientadora
Profa. Ana Claudia Morrissy Machado
Rio de Janeiro
2009
2
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM E RELAÇÕES
FAMILIARES
Apresentação de monografia ao Instituto A Vez do
Mestre – Universidade Cândido Mendes como
condição prévia para a conclusão do curso de Pós-
Graduação Lato Sensu em Psicopedagogia.
Por: Maria Aparecida da Matta Andrés
3
AGRADECIMENTOS
Ao meu marido Newton pelo
companheirismo, apoio e incentivo.
Aos meus filhos, Paula e Rodrigo por me
ensinarem a educar.
4
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a todas as crianças que por mim foram atendidas e
aquelas que ainda serão.
A amiga, fonoaudióloga e psicopedagoga Regina Amaral por apostar em
mim, abrindo as portas de sua clínica criando a oportunidade de recomeço da
minha carreira.
A amiga – irmã, neuropediatra Maria Regina Augusto de Andrade,
presente em todos os momentos importantes da minha vida por me incentivar,
confiar e acreditar no meu trabalho.
Aos meus filhos Rodrigo e Paula, que mesmo sem saber, me motivaram
a aprofundar meu conhecimento nas áreas da cognição e do comportamento
humano.
Ao meu marido Newton, companheiro há 20 anos que sempre me
incentivou e amparou, inclusive financeiramente, demonstrando seu carinho e
sua paciência em todos os momentos de nossa vida em comum.
5
RESUMO
Quando uma criança ou adolescente apresenta uma dificuldade na
escola quase sempre é sugerido um acompanhamento especializado e ela é
encaminhada ao fonoaudiólogo, psicopedagogo, psicólogo, neurologista ou
psiquiatra. O problema é visto como sendo da criança ou do adolescente, tem
causa biológica e deve ser corrigido na criança. Se o comportamento da
criança se torna inadequado ela se transforma num problema ainda maior para
a família. O presente trabalho aborda o tema dificuldade de aprendizagem
dando ênfase às relações familiares. O atendimento à família é tão importante
quanto ao dedicado à criança/adolescente. É necessário orientar, educar e
treinar a família a manejar o comportamento da criança e a se relacionar
melhor com ela. A maneira como os pais se comportam irá determinar o tipo de
relação ensino/aprendizagem que se estabelece na família e na vida escolar da
criança. A pouca flexibilidade dos pais e suas inabilidades sociais podem gerar
ou agravar os problemas de aprendizagem dos filhos. Por outro lado, se há
empatia na relação entre pais e filhos, se a criança sente-se acolhida e
respeitada por seus pais, as dificuldades relacionadas à aprendizagem e os
conseqüentes problemas emocionais possivelmente desencadeados por estas,
poderão ser superados com maior facilidade. O educador, seja ele pai ou
professor, precisa estar consciente de sua influência positiva ou negativa e de
como seu comportamento e suas atitudes, positivas ou negativas, poderão
determinar o comportamento futuro da criança/adolescentes.
6
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO............................................................................................. 07
CAPÍTULO I – Dificuldades de Aprendizagem......................................... 09
CAPÍTULO II – As Famílias Diante dos Problemas de Aprendizagem... 17
CAPÍTULOIII – Questões Emocionais e Comportamentais das
Crianças/Adolescentes com Dificuldade de Aprendizagem................... 25
CONCLUSÃO................................................................................................32
BIBLIOGRAFIA.............................................................................................34
FOLHA DE AVALIAÇÃO..............................................................................36
7
INTRODUÇÃO
Este trabalho foi desenvolvido a partir de pesquisa bibliográfica,
buscando embasamento teórico para estabelecer a relação entre a importância
da participação da família no processo de aprendizagem e a superação das
dificuldades de aprendizagem de crianças e adolescentes.
Minha maior motivação para dissertar sobre este tema reside em minha
experiência como mãe de um menino, hoje com 16 anos que, desde o início de
sua escolaridade, apresentou dificuldades e ainda hoje apresenta e, na minha
atuação como psicóloga clínica e mediadora de PEI - Programa de
Enriquecimento Instrumental -, um programa voltado para desenvolvimento do
pensamento, das habilidades mentais e das funções cognitivas do indivíduo.
Trabalhar com o PEI me aproximou de uma realidade que hoje encaro com
muito mais otimismo. Hoje acredito na capacidade se superação do indivíduo
porque a minha prática vem provando que isso é possível.
No entanto, não podemos esquecer que o sucesso não depende só da
nossa vontade de ajudar, nem da família querer e se dispor investindo tempo e
dinheiro no tratamento. É necessário que haja motivação interna por parte da
criança e do adolescente. Essa motivação precisa ser estimulada, alimentada e
mantida pela família desde muito cedo, quando é estabelecida uma relação
positiva com a aprendizagem, criando um ambiente familiar de segurança e
respeito mútuo.
A falta de comportamento alteritário nas famílias, ou seja, famílias onde
as diferenças não são aceitas e não é estimulada a autoria do pensamento,
problemas de aprendizagem podem ser desencadeados ocorrendo, até
mesmo, seu agravamento.
Não me espanta que um tema tão discutido e pesquisado ainda cause
tanto transtorno às famílias de crianças que sofrem com alguma dificuldade
para aprender. Não é fácil aceitar que seu filho ou sua filha não irá
8
corresponder às suas expectativas. Ele dificilmente será o médico, o advogado
ou o arquiteto que sua família sonhou.
Aceitar as diferenças, flexibilizar o pensamento, desenvolver habilidades
sociais, praticar a empatia com seu filho, são o primeiro passo para ajudá-lo
desenvolver suas próprias habilidades.
Espero que este trabalho possa ser uma leitura ao mesmo tempo
agradável e instrutiva e, que ao final, possa ajudar a compreender melhor as
dificuldades de aprendizagem, suas causas (etiologia) e, quem sabe, promover
alguma reflexão ou mudança na modalidade de ensino/aprendizagem de
alguma família.
9
DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM
Falar sobre a dificuldade de aprendizagem implica falar sobre como
aprendemos e desde quando começamos a aprender. Ao nascermos, no seio
materno, estamos iniciando o longo processo de aprendizagem que se
estenderá por toda nossa vida. É na família que ocorrem os primeiros
processos de aprendizagem. “ Munhoz (2005,p.180) diz que é observando a
interação existente entre os membros da família que podemos compreender
como se dá a circulação do conhecimento e o acesso à aprendizagem...”,
(Sampaio,2009, p.69).
O que significa aprender e como aprendemos
Numa visão psicológica e mais acadêmica, Campos afirma que (citando
Cannon e o conceito de equilíbrio vital) toda aprendizagem resulta na busca do
restabelecimento de um equilíbrio vital (homeostase). Ao enfrentarmos uma
situação nova, esse equilíbrio é rompido e, para restabelecê-lo, precisamos
agir ou reagir até obtermos uma resposta adequada à nova situação, então,
esta fará parte de um repertório de respostas integrando nosso equipamento
de comportamentos adquiridos. (Campos, 1983, p.33)
Aprender é um processo contínuo, dinâmico, global, pessoal, gradativo e
cumulativo.
“A aprendizagem envolve o uso e o desenvolvimento de todos os
poderes, capacidades, potencialidades do homem, tanto físicas, quanto
mentais e afetivas. Isto significa que a aprendizagem não pode ser considerada
somente como um processo de memorização ou que emprega apenas o
conjunto das funções mentais ou unicamente os elementos físicos ou
emocionais, pois todos estes aspectos são necessários”. (Campos, 1983, p.33)
Segundo as teorias de Reuven Feuerstein sobre a Experiência de
Aprendizagem Mediada e sobre a Modificabilidade Cognitiva e muito bem
definido por Beauclair (2008, p.35), “aprender é saber desenvolver nossos
10
potenciais para mudança, visando alcançarmos maior flexibilidade para
a apreensão das diferentes situações formais e informais presentes em nosso
cotidiano: quando aprendemos, melhoramos nossas possibilidades de adquirir
novos conceitos e ampliar antigos, generalizando-os. Aprender é saber
promover transferências de aprendizagens anteriores para situações novas,
expandindo nossos sentimentos de competência. Aprender é, ainda, controlar
nossas impulsividades diante das complexidades presentes em nosso viver,
modo essencial à promoção de nossa auto-estima, fundamental para a
construção de uma auto-imagem que seja, realmente, positiva.”
Sabemos, então que para aprender precisamos de um organismo
preparado, habilitado e capaz de reproduzir, elaborar e reelaborar respostas de
acordo com as diversas situações impostas pela vida e, também, àquelas
outras situações problemas que esperamos solucionar ao longo da vida
escolar. “Quando aprendemos, aumentamos e modificamos nossas estruturas
cognitivas e, com isso, as possibilidades se ampliam, nossa exposição aos
estímulos e às experiências cotidianas produz melhores resultados, vamos nos
tornando pessoas capazes de organizar e a usar informações obtidas de modo
melhor, visto que mais relevante do que saber é aprender como utilizar, cada
vez mais e melhor, este saber”. (Beauclair 2008, p.36)
São as dificuldades encontradas para solucionarmos os problemas
relacionados ao aprendizado na escola que serão objeto de estudo neste
capítulo.
O que são e o que significa dificuldade para aprender
Os conceitos de dificuldades de aprendizagem são diversos e
apresentam definições, por vezes, contraditórias. Mas, se faz necessário definir
o que queremos dizer com a expressão.
Como se pode determinar se uma criança apresenta ou não uma
dificuldade de aprendizagem? Apesar de todos os esforços de pesquisa e de
muitas tentativas para defini-la, ainda não há uma definição operacional geral
sobre os distúrbios de aprendizagem que seja aceita. “Segundo Hooper e Willis
11
(1989) isto se dá em virtude da heterogeneidade dos grupos de dificuldades
dos distúrbios de aprendizagem”. (Dockrell e Mc Shane, 2000, p.13)
Segundo Reuven Feuerstein, a privação cultural (isto é a falta de
experiência de aprendizagem mediada - EAM) pode ser determinada por
fatores exógenos - condições ambientais em que os pais e/ou demais grupos
de relacionamento não transmitem a cultura, ou seja, não oferecem mediação -
ou fatores endógenos, quando a mediação não alcança o sistema mental
devido a condições fisiológicas internas. Seja qual for a etiologia, o fato é que a
falta de EAM diminui a plasticidade e a flexibilidade mental tornando mais difícil
adaptações a novas condições de vida por um processo de aprendizagem.
Para estes indivíduos e para que superem suas dificuldades será necessário
um nível de intensidade maior de EAM.
O sistema de classificação das dificuldades de aprendizagem por
etiologia apresenta duas desvantagens. A primeira diz respeito àquelas
dificuldades de etiologia desconhecida e que serão classificadas “de causa
desconhecida”, a segunda desvantagem, diz respeito ao fato de que origens
semelhantes se manifestam diferentemente e, como conseqüência necessitam
de diferentes estratégias de intervenção.
No sistema de classificação funcional as crianças são separadas em
dois grupos. O primeiro grupo, de crianças com nível intelectual inferior à média
são denominadas “lentas” e nos casos mais graves ”deficientes mentais”. O
segundo grupo, com nível intelectual considerado normal, mas que apresentam
dificuldades em tarefas específicas. Na avaliação, as crianças com dificuldades
específicas, por exemplo, em leitura, apresentam grande discrepância entre a
realização e a habilidade na área de dificuldade, Essas crianças são
classificadas como tendo uma “dificuldade específica de aprendizagem”.
(Dockrell e Mc Shane, 2000)
As dificuldades de aprendizagem ocorrem por várias razões. A criança
apresenta alguma dificuldade cognitiva e, por isso, seu aprendizado se torna
mais difícil do que o normal. Ocorre que algumas dificuldades são
conseqüência de problemas na estrutura educacional ou proveniente do
12
ambiente em que vive a criança e não estão relacionados às habilidades
cognitivas da criança. Ou seja, estratégias educacionais ineficientes, fracasso
escolar precoce pode levar a perda da autoconfiança com conseqüências no
aprendizado e, uma série de variáveis relacionadas ao ambiente familiar
também contribuem para as dificuldades de aprendizagem. Algumas vezes
todos os fatores estão interligados. “Mas, independente da causa primária, as
crianças com dificuldades de aprendizagem estão defasadas em relação a
seus colegas no que diz respeito a importantes aspectos do aprendizado.”
(Dockrell e Mc Shane, 2000, p.17)
A importância dada aos problemas de aprendizagem e a variedade de
problemas aumentou bastante nos últimos tempos, pois, esses dados são
quantificados baseados no fato de que o sucesso do indivíduo é medido a partir
de seu desempenho escolar. Em outras palavras, quem fracassa na escola
apresenta algum tipo de problema de aprendizagem, com algum grau de
intensidade.
“O quadro das dificuldades de aprendizagem é cada vez mais uma
“esponja social” que cresceu muito rapidamente, exatamente porque foi
utilizado para absorver uma diversidade de problemas educacionais acrescidos
de uma grande complexidade de acontecimentos externos e eles inerentes”.
(Porto, 2009, p.58)
Para Feuerstein, a figura do mediador é fundamental no processo de
aprendizagem. Segundo ele, a criança não aprende porque seu mediador
(entende-se por mediador seu professor, seus pais ou, até mesmo, outra
criança) não foi competente para transmitir adequadamente o conteúdo da
informação ou estimular o desenvolvimento da habilidade necessária à
aprendizagem. De acordo com a sua ‘Teoria da Modificabilidade Cognitiva’,
todos nós podemos ampliar nossos potenciais de inteligência, desde que bem
mediados.
Segundo Gardner (1995) e a ‘Teoria das Múltiplas Inteligências’, a
inteligência é um conjunto de capacidades humanas diferenciadas, talentos
e/ou habilidades intelectuais. Todos os seres humanos são inteligentes, o que
13
varia são as combinações das diferentes inteligências, dentre elas: musical,
espaço temporal, cinestésica-corporal, lingüística, lógico-matemática e
interpessoal. Esta definição considera as origens biológicas e, também, as
origens culturais. As inteligências têm herança genética que se manifestam
independente da educação e da cultura, mas as influências culturais são
determinantes no grau em que esse potencial intelectual irá se manifestar. Há
uma relação entre fatores genéticos e nível de inteligência, o que poderá impor
limites ao desenvolvimento evidenciando uma deficiência cognitiva e
intelectual. No entanto, nem todas as crianças que apresentam alguma
dificuldade para aprender não são inteligentes. Muito ao contrário, algumas são
até inteligentes demais. As dificuldades podem estar relacionadas a questões
de ordem familiar ou escolar, quando a escola é deficiente ao mediar o
conhecimento e estimular o desenvolvimento de habilidades cognitivas.
O distúrbio de aprendizagem se caracteriza por uma disfunção do
sistema nervoso central, já a dificuldade escolar está relacionada
especificamente a um problema de ordem ou origem de método de ensino.
Para, Dockrell & McShane (2000), como já foi pontuando anteriormente, as
dificuldades de aprendizagem podem ser decorrentes de déficits cognitivos que
prejudicam a aquisição de conhecimentos como também, na maioria delas, são
apenas resultantes de problemas educacionais ou ambientais que não estão
relacionados a um comprometimento cognitivo.
Desse modo, vamos tratar de definir os principais problemas de
aprendizagem ou dificuldades específicas da aprendizagem ou transtornos da
aprendizagem segundo a Classificação Internacional de Doenças – CID 10 e o
Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – DSM-IV,
resumidamente. (http://www.plenamente.com.br/diagnosticos7.htm)
Em seguida, no segundo capítulo, serão abordados os aspectos
relacionados aos comprometimentos cognitivo-educacionais desencadeados
ou agravados pelas relações familiares.
14
QUAIS SÃO OS TIPOS DE TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM?
Tanto o CID-10, como o DSM-IV apresentam basicamente três tipos
de transtornos específicos: o Transtorno da Leitura, o Transtorno da Matemática, e o
Transtorno da Expressão Escrita. A caracterização geral destes transtornos não difere muito
entre os dois manuais.
Transtorno da Leitura
O Transtorno da Leitura, também conhecido como dislexia, é um
transtorno caracterizado por uma dificuldade específica em compreender palavras escritas.
Dessa forma, pode-se afirmar que se trata de um transtorno específico das habilidades de
leitura, que sob nenhuma hipótese está relacionado à idade mental, problemas de acuidade
visual ou baixo nível de escolaridade.
O DSM-IV classifica como critérios diagnósticos para o Transtorno da
Leitura:
• Rendimento da capacidade de leitura, como correção,
velocidade ou compreensão da leitura, significativamente inferior a media para a idade
cronológica, capacidade intelectual e nível de escolaridade do indivíduo.
• A dificuldade de leitura apresentada pelo indivíduo interfere
de modo significativo nas atividades cotidianas que requeiram habilidades de leitura.
• Sob a presença de algum déficit sensorial, as dificuldades de
leitura excedem aquelas habitualmente a este associadas.
• A leitura oral se caracteriza por distorções, substituições ou
omissões, e junto com a leitura silenciosa vem acompanhada por lentidão e erros na
compreensão do texto.
•
Transtorno da Matemática
O Transtorno da Matemática, também conhecido como discalculia,
não é relacionado à ausência de habilidades matemáticas básicas, como contagem, e sim,
na forma com que a criança associa essas habilidades com o mundo que a cerca.
A aquisição de conceitos matemáticos e outras atividades que exigem
raciocínio são afetadas neste transtorno, cuja baixa capacidade para manejar números e
conceitos matemáticos não é originada por uma lesão ou outra causa orgânica. Em geral, o
Transtorno da Matemática é encontrado em combinação com o Transtorno da Leitura ou
Transtorno da Expressão Escrita.
O Transtorno da Matemática, segundo o DSM-IV, é caracterizado por:
• A capacidade matemática para a realização de operações
aritméticas, cálculo e raciocínio matemático, encontra-se substancialmente inferior à média
15
esperada para a idade cronológica, capacidade intelectual e nível de escolaridade do
indivíduo.
• As dificuldades da capacidade matemática apresentadas pelo
indivíduo trazem prejuízos significativos em tarefas da vida diária que exigem tal habilidade.
• Em caso de presença de algum déficit sensorial, as
dificuldades matemáticas excedem aquelas geralmente a este associadas.
• Diversas habilidades podem estar prejudicadas nesse
Transtorno, como as habilidades lingüisticas (compreensão e nomeação de termos,
operações ou conceitos matemáticos, e transposição de problemas escritos em símbolos
matemáticos), perceptuais (reconhecimento de símbolos numéricos ou aritméticos, ou
agrupamento de objetos em conjuntos), de atenção (copiar números ou cifras, observar
sinais de operação), e matemáticas (dar seqüência a etapas matemáticas, contar objetos e
aprender tabuadas de multiplicação).
Transtorno da Expressão Escrita
Um transtorno apenas de ortografia ou caligrafia, na ausência de
outras dificuldades da expressão escrita, em geral, não se presta a um diagnóstico de
Transtorno da Expressão Escrita. Neste transtorno geralmente existe uma combinação de
dificuldades na capacidade de compor textos escritos, evidenciada por erros de gramática e
pontuação dentro das frases, má organização dos parágrafos, múltiplos erros ortográficos
ou fraca caligrafia, na ausência de outros prejuízos na expressão escrita.
Em comparação com outros Transtornos de Aprendizagem, sabe-se
relativamente menos acerca do Transtorno da Expressão Escrita e sobre o seu tratamento,
particularmente quando ocorre na ausência de Transtorno de Leitura. Existem algumas
evidências de que déficits de linguagem e percepto-motores podem acompanhar este
transtorno.
O Transtorno da Expressão Escrita, de acordo com os critérios
diagnósticos do DSM-IV, são:
• A capacidade das habilidades de expressão escrita
encontram-se significativamente inferior a media para a idade cronológica, capacidade
intelectual e nível de escolaridade do indivíduo.
• A dificuldade na expressão escrita apresentada pelo indivíduo
interfere de modo significativo nas atividades cotidianas que requeiram habilidades de
escrita, como escrever frases gramaticamente corretas e parágrafos organizados.
• Na presença de algum déficit sensorial, as dificuldades de
escrita excedem aquelas habitualmente a este associadas.
• O problema se caracteriza por dificuldades na composição de
textos, erros de gramática e pontuação, má organização dos parágrafos, erros freqüentes de
ortografia e caligrafia precária.
16
Nestes casos, após avaliação criteriosa, a criança ou adolescente
deverá ser encaminhado para um tratamento, preferencialmente,
multidisciplinar que quase sempre envolve uma intervenção psicopedagógica
e/ou fonoaudiológica; acompanhamento médico especializado de um
neurologista ou psiquiatra, quando for necessário, dependendo da gravidade
do caso; aconselhamento e orientação da escola com sugestões para o uso de
técnicas e tecnologias apropriadas; e, atendimento familiar, orientando quanto
ao manejo do comportamento da criança/adolescente que muitas vezes é
afetado e se modifica causando problemas para toda família. A família deve ser
informada através de psicoeducação sobre o transtorno, seus sintomas, suas
causas e conseqüências.
17
AS FAMÍLIAS DIANTE DOS PROBLEMAS DE
APRENDIZAGEM
“Alicia Fernandez, (1990) em vários momentos do seu livro A Inteligência
Aprisionada, nos traz uma visão mais global das Dificuldades de
Aprendizagem. Ela diz: Se pensarmos no problema de aprendizagem como só
derivado do organismo ou só da inteligência, para sua cura não haveria
necessidade de recorrer à família. Se, ao contrário, as patologias no aprender
surgissem na criança ou adolescente somente a partir de sua função
equilibradora do sistema familiar, não necessitaríamos, para seu diagnóstico e
cura, recorrer ao sujeito separadamente de sua família.” (Polity.
www.pedagobrasil.com.br/pedagogia/dificuldadeaprendizagem.htm)
As dificuldades de aprendizagem podem gerar e agravar problemas
emocionais. Se o rendimento da criança na escola for regular ou sofrível,
dependendo da cultura escolar, ela pode ser considerada um fracasso pelos
professores ou colegas, e até pela própria família. Infelizmente, muitas dessas
crianças desenvolvem uma baixa auto-estima e uma auto-avaliação negativa
que poderia ser evitada, com o auxílio da família e, com a escolha de uma
escola mais adequada ao perfil da criança/adolescente.
A dificuldade de aprendizagem, quando de origem biológica, é bastante
clara o que nos leva a sugerir que a área emocional e o ambiente familiar não
tiveram nenhuma participação no seu aparecimento e determinação. Mas,
mesmo assim, a dinâmica familiar e o comportamento dos pais diante do
problema e de suas manifestações, pode acentuar, ainda mais, o problema da
criança/adolescente. A criança hiperativa se tronará mais hiperativa, a
deprimida mais deprimida, a autista mais autista, a agressiva mais agressiva.
“A criança em idade escolar sabe que precisa ter sucesso nos estudos.
Isso é exigido por seus pais, familiares, colegas, professores, pela sociedade
como um todo. O sucesso opõe-se ao fracasso, e este implica num juízo de
valor, num julgamento que deve corresponder a um ideal.
Esse ideal normalmente é ditado por valores familiares que são transmitidos de
18
geração em geração. Há famílias de engenheiros, que se espera do filho
mais velho que também o seja. Há famílias de advogados, de médicos ou de
negociantes, onde o destino da criança já está selado nem bem ela nasceu.
Pode-se observar aqui o papel dos mitos familiares que tentam a construção de
uma realidade irreal desejada para a continuação da história familiar”.
Cada grupo familiar introduz expectativas e valores sobre como o filho
deve ser, como deve se comportar e transferem, mesmo sem saber, seus
sonhos sobre a vida profissional futura da criança. Desde seu nascimento
começam as profecias (acho que ele será um grande economista, como o avô),
os mandatos (somos uma família de advogados, esperamos que ele siga a
mesma profissão;), as comparações (ele deve se esforçar para tirar notas boas
como o irmão), as lealdades (meus pais são analfabetos, acho que também
não preciso estudar muito) os segredos (minha mulher e eu achamos melhor
não lhe falar nada sobre a adoção). Todas estas situações marcam
profundamente o desenvolvimento futuro da criança impondo-lhe tarefas que
estão em desarmonia com suas capacidades, aptidões ou mesmo desejos.
(Polity. www.pedagobrasil.com.br/pedagogia/dificuldadeaprendizagem.htm)
Uma criança precisa se sentir segura, amada e compreendida para se
sentir capaz de aprender e se perceber aprendendo e se reconhecer
pertencente ao seu grupo familiar. É na família que a criança pode encontrar
um ambiente favorável ou desfavorável que irá influenciar e interferir no
processo de aprendizagem. “É na família que são absorvidos os primeiros
saberes, e onde se aprofundam os vínculos humanos”. (Revista
Psicopedagogia 2007; 24(74): p.184). Num ambiente hostil, a criança estará
propensa a apresentar comportamentos hostis e se auto-avaliar negativamente
o que poderá dificultar seu aprendizado.
“A família é responsável pelo processo de amadurecimento psíquico e
proporciona uma sustentação necessária à individuação. A individuação é um
processo que passa pela diferenciação, por uma condição de auto-expressão.
Teoricamente, a criança ou adolescente são membros garantidos no grupo,
visto que nascem e crescem nesse meio. Mas, não basta nascer e crescer,
essa criança ou adolescente necessita do apoio da família e de um lugar na
19
relação parental. Nesse sentido, o sujeito vai constituindo sua maturidade e
iniciando o processo de individuação”. (Revista Psicopedagogia 2007; 24(74):
p.184)
Esclarecendo melhor as questões relativas à individuação e a
diferenciação: “diferenciação do self, segundo teoria de Bowen (1978)
desenvolvida por Kerr (1981-84) é descrita como grau de controle de cada
indivíduo sobre os pensamentos e sentimentos, critérios próprios que o levam a
escolher suas ações e responsabilizar-se por elas. Os bons resultados da
diferenciação do self demonstram a capacidade de pertencer e, ao mesmo
tempo, estar separado do meio familiar”. (Revista Psicopedagogia 2007;
24(74), p.154)
Para Fernandez, a falta de comportamento alteritário é marca registrada
de famílias facilitadoras de problemas de aprendizagem. O comportamento
alteritário é aquele que permite que o aprendente * faça escolhas diferentes do
ensinante*. Famílias com ausência de comportamento alteritário apresentam
dificuldade para aceitar as diferenças e as opiniões contrárias são entendidas
como agressão. “A alteridade na família favorece relações saudáveis com a
aprendizagem, resulta em espaço de autonomia de pensamento”. (Revista
Psicopedagogia 2007; 24(74), p.152)
“Algumas famílias podem ser vistas como cerceadoras da autoria de
pensamento, pois não permitem à criança realizar experiências e ter a vivência
de satisfação de ter conseguido realizá-la por si mesma e, conseqüentemente,
reconhecer-se autora de sua produção, construindo a confiança em sua
capacidade pensante”. (Revista Psicopedagogia 2007; 24(74), p.154)
Se a família não oferece apoio, não é acolhedora a criança poderá
manifestar através de algum tipo de dificuldade de aprendizagem a falta ou
carência de afeto nas relações familiares. Com as relações familiares abaladas,
as crianças procuram suprir sua carência de afeto chamando a atenção de
seus pais de forma negativa. No caso de adolescentes, essa carência é por
*Aprendente e Ensinante são termos usados por Alicia Fernandez e equivalem a relação aluno e professor, mas, também, a outros vínculos como pais e filhos, amigos-amigo.
20
vezes perigosa, pois o adolescente poderá buscar supri-la integrando outros
grupos fora da família e, nos dias de hoje, não podemos negligenciar questões
como violência urbana e drogas e, as influências das tão comentadas más
companhias.
“... Embora não exista uma concordância quanto ao papel
desempenhado pelos afetos no processo de conhecer, é consenso o fato de
que os estados afetivos interferem no cognitivo. Também parece haver uma
certa concordância quanto ao fato de que as funções afetivas e cognitivas são
de natureza distintas, embora indissociáveis, uma vez que não existe conduta
afetiva sem elementos cognitivos, nem tão pouco elementos cognitivos
desvinculados do afeto”. (Revista Psicopedagogia 2007; 24(74), p.184)
Assim, é sabido que as dificuldades de aprendizagem têm diversas
causas orgânicas, e pode estar associada a fatores externos e internos do
indivíduo, mas, seja qual for a causa, o fato é que a família tem papel
fundamental na manutenção ou solução do problema apresentado.
“... As qualidades que de início pertencem a uma relação familiar e dela
emergem, com o passar do tempo, se tornam qualidades intrínsecas do
indivíduo. Portanto, alteridade, autoria de pensamento e família estão
entrelaçados.” (Revista Psicopedagogia 2007; 24(74), p.155)
Existem, ainda, outros entrelaçamentos, o ensino-aprendizagem e a
modalidade de aprendizagem da criança entrelaçada a modalidade de
aprendizagem da família. “A modalidade de aprendizagem do sujeito também
é o resultado de uma história de experiências do indivíduo em interação com o
grupo familiar, onde importa: como ocorreram as experiências e como foram
interpretadas pelo indivíduo e pelos seus pais. A aprendizagem acontece na
produção das diferenças dos pais e dos filhos, apoiada no significado que o
aprender tem para o grupo.” (Munhoz. Revista Psicopedagogia 2007; 24(74);
p.156)
As maneiras como os pais se comportam e reagem a autoria de
pensamento da criança/adolescente irá determinar o tipo de modalidade de
ensino da família. O que irá determinar uma modalidade de
21
ensino/aprendizagem patogênica é a rigidez ou a falta de flexibilidade de
pensamento desses pais.
O reconhecimento da autoria de pensamento nasce no meio familiar,
que podemos descrever como propício quando existe alteridade nas relações.
É importante que os pais aceitem as diferenças e as características individuais
de seus filhos, respeitando-os e amando-os como são propiciando modalidades
de ensino e aprendizagem sadias.
Com o objetivo de afirmar e comprovar o acima exposto, relato a seguir
um resumo do resultado de pesquisas realizadas por Marturano e cols.
(1997,1998,1999), conduzidas no Núcleo de Estudos em Problemas de
Aprendizagem da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP.
Observou-se que os problemas de aprendizagem quase sempre
antecedem as dificuldades de aprendizagem na escola.
Participaram da pesquisa crianças com idade entre 7 e 12 anos, de
séries escolares correspondente ao 1º. Ciclo do ensino fundamental e suas
respectivas mães ou responsáveis. O percentual de meninos oscila entre 65%
e 70% nas diferentes amostras.
O perfil da Demanda diz que 70% das crianças apresentam capacidade
intelectual em torno da média, porém com baixo rendimento escolar confirmado
através de teste psicométrico, em 84% dos casos. Prejuízos discretos em
indicadores de Inteligência verbal e processamento da linguagem oral
aparecem quando as crianças são comparadas aos colegas sem dificuldades
escolares. Por outro lado, quando comparadas com colegas que também
apresentam baixo desempenho escolar, as crianças encaminhadas ao serviço
de saúde mostram potencial cognitivo e lingüístico equivalente, porém, maior
prejuízo em leitura e escrita. ( Marturano e cols. 1977; Benzoni e cols.1998;
Elias, 2002)
O conjunto dos resultados sugere que o desempenho atual dessas
crianças está aquém do seu potencial de aprendizagem e realização.
22
A pesquisa adotou uma linha de investigação, guiada por questões
relativas ao suporte parental para o progresso escolar e abordam a natureza e
extensão do suporte oferecido, sua dependência em relação a fatores
socioeconômicos e educacionais, diferenças individuais no acesso aos
recursos e o grau que o suporte parental efetivamente favorece o desempenho
escolar da criança, partindo do pressuposto de que a ativação e a
potencialização de recursos presentes no ambiente familiar pode contribuir
para melhor capitalização do potencial cognitivo das crianças.
Foram quatro áreas identificadas nos relatos das famílias quanto aos
recursos facilitadores do progresso escolar: suporte para desenvolvimento e
aprendizagem; relacionamento pais-criança; clima emocional e práticas
educativas.
As conclusões das pesquisas, aqui apresentados qualitativamente, são
um resumo dos estudos desenvolvidos por Marturano e cols. nos anos de
1997, 1998 e 1999.
Os resultados obtidos sugerem que o progresso na aprendizagem
escolar, indicado seja pela ausência de atraso ou pela qualidade de produção
escrita, esta associado à supervisão e à organização das rotinas no lar, a
oportunidades de interação com os pais e à oferta de recursos no ambiente
físico. A escolaridade materna não foi um preditivo direto de medidas de
realização escolar.
O atraso escolar se vincula mais fortemente à menor estruturação do
tempo em casa, a menos oportunidades de interação com os pais e à presença
de situações adversas, sinalizando condições psicossociais que podem
interferir com a integração da criança na escola. Essa combinação de baixos
níveis de suporte com alta incidência de estressores ambientais configura uma
condição de vulnerabilidade ( Dubois e cols.,1992; Dubow e Tisak, 1989;
Marten e cols, 1988). Os resultados da análise de regressão mostraram que a
adversidade crônica mantém relação com o atraso escolar, mesmo quando
controlado estatísticamente o fator idade.
23
O delineamento do estudo apenas permite detectar relações de co-
ocorrência e não de causalidade. Dentro desses limites, a coerência entre os
resultados obtidos junto a essa clientela de uma clínica-escola brasileira e
aquelas derivados de investigações conduzidas na população geral em outros
países, sugerindo que recursos ambientais familiares, favorecedores do
desempenho escolar, incluem presença de materiais educacionais e
envolvimento dos pais, em forma de participação e organização das rotinas.
Não raro usamos a expressão a vida imita a arte. Mas, o filme ‘Somos
todos Diferentes’ com certeza é uma lição de vida e retrata muito bem o
sofrimento de uma criança para ser aceita por sua família e pela escola. Até
mesmo detectar o problema da criança, nesse caso a dislexia, foi complicado,
pois a família não aceita o filho com problemas, a escola rotula a criança de
desatento e desinteressado, a família prefere reconhecer o filho como um
preguiçoso do que portador de um transtorno específico de aprendizagem de
origem biológica e que se agrava devido a desinformação e falta de orientação.
No filme, o personagem principal, um menino indiano de 8 anos,
cursando a 4ª. série fica deprimido, se isola de tudo e de todos depois que é
levado pela família para um colégio interno. Um professor de Artes que
também é disléxico condoído em ver aquele menino tão triste resolve investigar
sua história visitando a família. Quando revela o problema aos pais e a escola
ocorre o grande milagre, aquele garoto ‘burro’ que não conseguia ler nem
escrever, com a ajuda, a acolhida e o afeto desse professor se revela um
menino inteligente, criativo e consegue desenvolver as habilidades necessárias
para seguir sua vida escolar e se reintegrar familiar com sucesso e alegria.
Bem, estamos falando de uma ficção com final feliz, uma história triste
que nos enche de emoção, mas também nos remete a muitos casos como
esse na vida real e que nem sempre têm um final tão feliz como o deste filme.
Então, se esbarrarmos com uma criança triste devemos investigar e, se
houver uma única chance, devemos buscar ajuda para ela. Caso seja algum
tipo de dificuldade de aprendizagem cabe a indicação de um tratamento para a
criança que considere importante intervir junto aos pais ou cuidadores para
24
orientação e esclarecimento quanto ao problema. Quem sabe assim, não
mudamos um pouco o rumo de muitas histórias fadadas a uma vida cheia de
percalços e fracassos.
25
QUESTÕES EMOCIONAIS E COMPORTAMENTAIS DAS
CRIANÇAS/ADOLESCENTES COM DIFICULDADE DE
APRENDIZAGEM.
A Universidade Federal do Paraná - PROEC ( Pró-Reitoria de Extensão
e Cultura) aprovou para 2009/2010, dentre mais de 300 bolsas, o Projeto
Reconectar- reabilitação neuropsicológica para crianças e adolescentes. São
promovidos encontros semanais com as crianças/adolescentes, intercalados
com orientações aos responsáveis e atividades de interação entre eles. Além
dos encontros, crianças e pais realizam em conjunto tarefas de casa diárias.
Os pais são orientados e informados sobre os problemas de aprendizagem de
seus filhos e espera-se que compreendam os déficits e as potencialidades dos
mesmos, auxiliem na reabilitação das deficiências cognitivas destes e
percebam as necessidades orgânicas, afetivas e de socialização da criança.
Em relação à criança, espera-se que ela supere ou reduza seus
comprometimentos, aumente a utilização de recursos auxiliares às suas
dificuldades e melhore a auto-estima bem como sua competência social.
O projeto investe na intervenção com os pais, o que considera fator
essencial, não só orientando-os, como também estimulando-os a uma auto
análise quanto aos seus comportamentos em relação aos seus filhos;
intervenções com a criança/adolescente para que aumente o repertório de
habilidades sociais. O desenvolvimento das habilidades sociais da criança
melhora não somente as relações familiares, como também o seu ajustamento
em relação à escola. O projeto se embasa teoricamente no programa de
desenvolvimento de habilidades sociais de Del Prette & Del Prette: a criança
deve ser capaz de pedir e aceitar auxílio na realização das tarefas escolares;
iniciar, manter e concluir conversação com colegas, irmãos e pais; expressar
suas opiniões aos professores, amigos e familiares; recusar-se a fazer o que
não quer como destruir materiais de outros colegas e cabular aulas por
influência de amigos; analisar situações conflitantes bem como formas de
26
resolvê-las, tais como brigas entre colegas e acusações injustas por parte de
professores e pais.
Projetos como esse fazem a diferença não só por que presta assistência
uma camada da população mais carente, mas, por que entendem que uma boa
parcela do problema pode ser resolvido se houver uma ação direta junto a
família da criança/adolescente com dificuldade de aprendizagem.
Se prestarmos bastante atenção, as propostas de tratamento para pais e
filhos, ajudam e ensinam os pais a educarem seus filhos.
Sabemos que educar não é fácil e demanda tempo, paciência e bastante
informação. Educar não é só prover as necessidades básicas, físicas e
emocionais da criança/adolescente é, antes de tudo, estar provido dessas
necessidades. O educador seja ele pai ou professor precisa estar consciente
de sua influência positiva ou negativa e de como seu comportamento e suas
atitudes, positivas ou negativas, poderão determinar o comportamento futuro
da criança/adolescentes.
Para educar é necessário que haja diálogo e maturidade por parte dos
pais, respeito entre pais e filhos, aceitação por parte dos pais das diferenças
individuais e liberdade para ser e permitir ser.
Educar é ser empático. Quando demonstramos que compreendemos
nossos filhos, sem críticas, sem sermões, apenas ouvimos com atenção o que
estão dizendo eles se sentem amparados, sabem que podem contar conosco.
E, é assim que acontece como num passe de mágica, nossos filhos começam
a confiar em nós, nos contam seus problemas. Nesse momento da relação, os
pais podem exercer seu poder de ensinar, ajudando seu filho a resolver
problemas. Parece simples e é simples. Difícil é colocar em prática. (Gottman,
1999, p.79)
Crianças ou adolescentes com dificuldade de aprendizagem quase
sempre desenvolvem, em conseqüência de sucessivos fracassos escolares e
por não corresponderem as expectativas dos pais e professores, uma baixa
auto-estima e diversos pensamentos disfuncionais sobre si mesmos. Podem se
isolar dos colegas, evitando que pensamentos e sentimentos negativos ativem
27
a crença de que são incompetentes e inadequados (não se enquadram no
grupo) ou, não raros os casos, se tornam agressivos se comportando de forma
desafiadora junto aos adultos.
Segundo Young “um esquema é um padrão extremamente estável e
duradouro que se desenvolve durante a infância e é aperfeiçoado durante toda
a vida do indivíduo. Nós vemos o mundo por meio dos nossos esquemas”.
(Young. 2003, p.75) Um esquema não está no nível da consciência e pode ser
disparado por acontecimentos, sentimentos e por pensamentos. Os esquemas
são autoperpetuadores e muito resistentes a mudança. Daí a importância de
uma intervenção, um tratamento visando enfraquecer ao máximo os esquemas
iniciais desadaptativos (Young. 2003 p.81), de desenvolver habilidades sociais
e outras ‘habilidades de pensamento’ necessárias à vida escolar e pessoal
(social e família).
Greene (2007, cap.6) defende a tese de que crianças e adolescentes
com comportamento explosivo precisam desenvolver habilidades de
pensamento que os tornem mais flexíveis, mais tolerantes as frustrações e
mais capazes de solucionar os problemas no dia a dia. Por outro lado, é
enfático ao orientar os pais a adotarem um plano para o manejo desses
comportamentos que se baseia na capacidade de observação dos pais em
identificar os desencadeadores, os acontecimentos que servem de estopim
para um comportamento agressivo da criança e qual ou quais habilidades de
pensamento devem ser ensinadas à criança.
Os pais devem desenvolver suas habilidades empáticas, a fim de ajudar
seus filhos a solucionar problemas, ensinando-os a identificar o fator estressor,
a definir o problema e, finalmente convidando-os a solucionar o problema
examinando todas as possibilidades viáveis.
O mais interessante é que normalmente esses pais apresentam muita
dificuldade em serem empáticos e precisam ser treinados, orientados e
estimulados a persistirem, pois, até que a criança ou adolescente se acostume
ao novo padrão de resposta, seus pais necessitarão de muita persistência, de
muita consistência e constância em suas ações.
28
Quanto às habilidades, Greene (2007, cap.3) as classifica em
habilidades de execução, de processamento da linguagem, de regulação
emocional, de flexibilidade cognitiva e, finalmente as habilidades sociais.
Habilidades de Execução:
A maioria das crianças diagnosticadas com TDAH encontra dificuldades
em relação às habilidades de execução.
1. Mudança de Padrões Cognitivos
• Capacidade de mudar eficientemente de uma atitude mental para outra.
Ex. Mudar de ambiente – recreio/aula
2. Organização e Planejamento
• São fundamentais para que a criança possa avaliar as opções sugeridas
e para que lide com problemas ou frustrações do dia a dia.
• Quando estamos diante de uma frustração precisamos resolver o
problema que nos frustra. Isso exige muita organização e planejamento:
1) identificar o problema; 2) considerar uma série de possíveis soluções;
3) prever as prováveis conseqüências dessas soluções; 4) tomar uma
atitude.
3. Separação do sentimento
• Capacidade de separar suas reações emocionais diante de um
problema no momento em que precisa imaginar algo para solucioná-lo.
Esta habilidade permite que a pessoa “deixe de lado” suas emoções.
• Uma criança sem essa habilidade tende a reagir mais emocionalmente
do que racionalmente às frustrações.
Habilidades Específicas da Linguagem:
• Categorização e expressão das emoções;
• Identificação e articulação das próprias necessidades;
• Resolução de problemas.
29
Problemas mais freqüentes: vocabulário reduzido; dificuldade de
expressar verbalmente as sensações; pouca experiência anterior. As
habilidades de Linguagem são fundamentais para nos ajudar a refletir, auto-
regular, estabelecer metas e controlar nossas emoções.
Habilidade de Regulação Emocional:
• A capacidade de ser flexível e de ser tolerante diante das frustrações
Alterações de humor, irritabilidade, agitação, indisposição e cansaço são
sentidos com maior intensidade na ausência desta habilidade.
Habilidade de Flexibilidade Cognitiva:
• Capacidade de pensar relativo; considerar as exceções a regra e formas
alternativas de encarar os fatos.
São crianças que pensam de modo extremo e ficam paralisadas em um
mundo relativo/abstrato. Em geral, preferem a previsibilidade e a rotina.
Habilidades Sociais
Poucas habilidades humanas exigem tanto pensamento complexo,
processamento rápido e flexibilidade do que as interações sociais.
• Dificuldade para prestar atenção aos indícios sociais e suas nuanças,
• Não interpreta bem os indícios da linguagem não verbal – “ele me
odeia”, “ninguém gosta de mim”, “todos me perseguem”;
• Não consegue associar os indícios com experiências passadas;
• Não conseguem avaliar como gostariam que conduzisse suas interações
sociais;
• Tem um repertório limitado de reações e acabam utilizando reações
idênticas (risos afetados, empurrões) em situações inadequadas;
• Pouca habilidade para perceber como as pessoas estão interpretando o
que ela faz ou fala;
• Pouca habilidade para perceber até que ponto seu comportamento afeta
outras pessoas;
30
• Apresenta dificuldade para iniciar uma conversa, ingressar em um
grupo, compartilhar.
Segundo Del Prette & Del Prette (2005) existem sete classes de habilidades
sociais fundamentais ao desenvolvimento interpessoal da criança. São elas:
1. autocontrole e expressividade emocional, do qual fazem parte o
reconhecimento
2. de suas próprias emoções, a dos outros e o lidar com as
mesmas; civilidade, no qual se incluem o cumprimentar, o
despedir-se e o agradecer;
3. empatia, como capacidade de interessar-se pelo outro e
expressar compreensão pela experiência alheia;
4. assertividade, do qual integra o expressar sentimentos e opiniões;
5. fazer amizades; fazer, perguntas, responder perguntas, dar
informações;
6. solução de problemas interpessoais; pensar e acalmar-se antes
de agir, escolher a melhor estratégia de solução, avaliar as
conseqüências;
7. habilidades sociais acadêmicas, seguir regras orai, prestar
atenção, reconhecer e elogiar o desempenho do outro, aguardar
a vez para falar;
Essas habilidades sociais se bem desenvolvidas possibilitam uma boa
competência social que irá repercutir no comportamento e nas relações sociais.
“Competência social é a capacidade de articular pensamentos, sentimentos e
ações em função de objetivos pessoais e de demandas da situação e da
cultura, gerando conseqüências positivas para o indivíduo e para a sua relação
com as demais pessoas”. (Del Prette & Del Prette. 2006 p.33) É de extrema
importância, portanto, atentar para o desenvolvimento das habilidades sociais
das crianças e dos adolescentes.
31
Podemos concluir que as dificuldades de aprendizagem, de causa
biológica ou não, podem ser agravadas se apenas o problema da criança for
tratado. A família, os pais, professores e cuidadores devem ser orientados e
tratados paralelamente. Os problemas de aprendizagem podem acentuar os
problemas emocionais trazendo grande prejuízo por toda a vida do indivíduo.
Não devemos negligenciar as questões de ordem emocional e muito menos as
de ordem cognitiva. Portanto, faz-se necessário um trabalho multidisciplinar,
que envolve o uso de técnicas eficazes (como descrito acima o uso da
empatia) e a atuação da família, da escola e de uma equipe de profissionais,
dependendo da gravidade do caso.
32
CONCLUSÃO
As dificuldades de aprendizagem ocorrem por várias razões. Podem ter
diversas causas orgânicas e, estarem associada a fatores externos e internos
do indivíduo. A criança apresenta alguma dificuldade cognitiva e por isso seu
aprendizado se torna mais difícil, mais lento do que o normal. Tais dificuldades
podem ser decorrentes de déficits cognitivos ou resultantes de problemas
educacionais ou, até mesmo, ambientais, que não estão relacionados a um
comprometimento cognitivo. A família tem papel fundamental na manutenção
ou na solução do problema apresentado pela criança.
Estratégias educacionais ineficientes e fracasso escolar precoce pode
levar a perda da autoconfiança com conseqüências no aprendizado e, uma
série de variáveis relacionadas ao ambiente familiar também contribuem para
as dificuldades de aprendizagem. Algumas vezes todos estes fatores estão
interligados.
A dinâmica familiar e o comportamento dos pais diante das dificuldades
de aprendizagem pode acentuar, ainda mais, o problema da
criança/adolescente. A criança hiperativa se tornará mais hiperativa, a
deprimida mais deprimida, a autista mais autista, a agressiva mais agressiva.
É importante e indispensável uma avaliação criteriosa da criança ou
adolescente para diagnosticar o problema ou levantar hipótese diagnóstica.
Preferencialmente, o tratamento proposto é multidisciplinar que, quase sempre,
envolve uma intervenção psicopedagógica e/ou fonoaudiológica; neurologista
ou psiquiatra; aconselhamento e orientação à escola; e, atendimento familiar,
orientando quanto ao manejo do comportamento da criança/adolescente.
Crianças ou adolescentes com dificuldades de aprendizagem quase
sempre desenvolvem, em conseqüência de sucessivos fracassos escolares e
por não corresponderem as expectativas dos pais e professores, uma baixa
auto-estima e diversos pensamentos disfuncionais sobre si mesmos. É comum
o isolamento, a agressividade, o comportamento desafiador principalmente em
33
relação aos adultos como pais, professores, diretores e coordenadores de
escolas.
Nestes casos, escola e família devem ser preparados e treinados em
técnicas comportamentais específicas. O uso de reforçador positivo é muito
mais eficaz do que o uso da punição. A punição pode agravar e aumentar a
freqüência do comportamento indesejado.
Pais de crianças com dificuldade de aprendizagem precisam aceitar as
diferenças individuais de seus filhos. Precisam exercer a liberdade para ser e
permitir ser. É necessário que haja diálogo e maturidade por parte dos pais
para que haja respeito entre pais e filhos.
Ser empático parece ser a solução. Os pais devem aprender e praticar a
empatia e a estabelecer relações de empatia com os filhos, a fim de ajudá-los
na solução de seus problemas. Quando os pais se tornam próximos dos filhos,
demonstrando compreendê-los, evitando punições e privilegiando o reforço do
comportamento desejado, os filhos se sentem amparados, mais próximos de
seus pais. Assim, fica mais fácil desenvolver as habilidades sociais,
normalmente comprometidas, em crianças com dificuldades de aprendizagem
e, muitas vezes, nos próprios pais.
A eficácia de um tratamento multidisciplinar não depende apenas da
intervenção junto à criança, mas também, e, paralelamente, na família e na
escola.
34
BIBLIOGRAFIA
1. Beauclair J. Do fracasso Escolar ao Sucesso na Aprendizagem:
proposições psicopedagógicas. Rio de Janeiro, Ed. WAK, 2008.
2. Braga, S. da S; Scoz, B.J.L. e Munhoz, M.L.P. Problemas de
Aprendizagem e suas Relações com a Família. Revista Psicopedagogia
2007; 24(74): 149-59
3. Campos D. M. de S. Psicologia da Aprendizagem. Petrópolis, Ed. Vozes,
1983.
4. Casarin, N. E. F. ,e Ramos, B.J.R. Família e Aprendizagem Escolar.
Revista Psicopedagogia 2007;24(74):182-201
5. Del Prette Z.A.P. e Del Prette A. Psicologia das Habilidades Sociais na
Infância Teoria e Prática. Petrópolis. Ed. Vozes, 2005.
6. Dockrell J. e McShane J. Crianças com dificuldades de aprendizagem
Uma abordagem cognitiva. Porto Alegre, Ed. Artmed, 2000.
7. Gottman, J e DeClaire J. Inteligência Emocional e a Arte de Educar
Nossos Filhos. Rio de Janeiro, Ed. Objetiva, 1997, p.79.
8. Greene R.W. A Criança Explosiva. São Paulo. Integrare Editora, 2007.
9. Novaes M. A. F. P., Ruschel S. H. P., Bôer S.Transtornos de
Aprendizagem. http://www.plenamente.com.br/diagnosticos7.htm
10. Marturano, E.M., Linhares, M.B. Martins e Loureiro S.R. (Organizadoras)-
Vulnerabilidade e Proteção. Indicadores de Desenvolvimento Escolar.
Cap.9 A criança com queixa Escolar e sua Família. Casa do Psicólogo,
1999.
11. Polity E. Dificuldade de Aprendizagem e Família: construindo novas
narrativas www.pedagobrasil.com.br/pedagogia/dificuldadeaprendizagem.htm)
12. Porto O. Bases da Psicopedagogia Diagnóstico e Intervenção nos
problemas de aprendizagem. Rio de Janeiro, Ed. WAK, 2009.
35
13. Riechi,T.I.J. et al. Família e dificuldades de aprendizagem: Uma reflexão
sobre a relação pais e filhos. Laboratório de Neuropsicologia - Departamento
de Psicologia; Universidade Federal do Paraná. Artigo apresentado no 4º
ENEC- Encontro de Extensão e Cultura da UFPR, 2005.
14. Sampaio S. Dificuldade de Aprendizagem - a psicopedagogia na
relação sujeito, família e escola. Rio de Janeiro, Ed. WAK, 2009.
15. Young J.E. Terapia Cognitiva para Transtornos da Personalidade Uma
abordagem Focada no Esquema. Porto Alegre. Artmed Editora, 2003.
Filme: Somos Todos Diferentes. (Taare Zameen Par, Índia 2007). Diretor e
Produção Aamir Khan.
top related