ridin’ julian perretas star -experienciando realidade aumentada em videoclipe

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O presente artigo faz uma reflexão teórica sobre os sistemas de Realidade Aumentada(RA) a partir da revisão de estudiosos da área de tecnologia e da observação do clipe em RA, Ride My Star, do cantor Julian Perreta. Discutimos essa recente invenção, seus usos educacionais, industriais, publicitários, artísticos, dentre outros. Entendemos a utilização cada vez mais freqüente dos dispositivos de RA não somente como puro e automático progresso técnico, mas principalmente como evidência da reconfiguração de campos cognoscitivos e sensoriais humanos.

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Ridin’ Julian Perreta's Star1 Experienciando Realidade Aumentada em videoclipe

João ARAÚJO2 Marcel AYRES3

André CERQUEIRA4 Marcelo LIMA5 Caio MARTINS6

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA Resumo O presente artigo faz uma reflexão teórica sobre os sistemas de Realidade Aumentada (RA) a partir da revisão de estudiosos da área de tecnologia e da observação do clipe em RA, Ride My Star, do cantor Julian Perreta. Discutimos essa recente invenção, seus usos educacionais, industriais, publicitários, artísticos, dentre outros. Entendemos a utilização cada vez mais freqüente dos dispositivos de RA não somente como puro e automático progresso técnico, mas principalmente como evidência da reconfiguração de campos cognoscitivos e sensoriais humanos. Palavras-chave: Realidade Aumentada – Videoclipe – Espaços intersticiais – Cibercultura – Ciberespaço

1. Introdução

Este artigo analisa o videoclipe Ride My Star7, do cantor britânico Julian Perreta,

lançado em maio de 2009 na internet, inicialmente no site oficial do próprio cantor8. O

clipe permite ao espectador interagir com o vídeo tridimensional utilizando uma folha

de papel onde é impressa uma imagem que pode ser lida por uma webcam comum,

através do uso da Augmented Reality. A Realidade Aumentada (RA) consiste na

1 Artigo de conclusão da disciplina COM104 (Comunicação e Tecnologia), do Grupo 1, 2009.1 2 Graduando do curso de Comunicação Social – Jornalismo da Universidade Federal da Bahia e bolsista do Programa de Educação Tutorial (PET). jesilvaraujo@gmail.com 3 Graduando do curso de Comunicação Social – Jornalismo da Universidade Federal da Bahia, membro do Grupo de pesquisa em análise da fotografia (GRAFO) e bolsista do Observatório de Publicidade em Tecnologias Digitais – UFBA/Propeg. marcel.ayres@gmail.com 4 Graduando do curso de Comunicação Social – Jornalismo da Universidade Federal da Bahia. andremorro@gmail.com 5 Graduando do curso de Comunicação Social – Jornalismo da Universidade Federal da Bahia e bolsista do Programa de Educação Tutorial (PET). marcelocaterpillar@gmail.com 6 Graduando do curso de Comunicação Social – Jornalismo da Universidade Federal da Bahia, membro do Grupo de Análise Fílmica (PEPA) e bolsista do Programa de Educação Tutorial (PET). csatelles@gmail.com 7 Disponível em http://www.julianperretta.com/download/ 8 Um mês depois, um usuário postou no youtube um vídeo de alguém interagindo com o clipe. O vídeo no youtube, que já conta com mais de 10 mil exibições, pode ser acessado através do endereço http://www.youtube.com/watch?v=Z_bj1GTH9UA.

sobreposição de elementos digitais a um ambiente físico, promovendo para o usuário

uma experiência interativa em relação com o espaço intersticial9.

Cabe, desde já, esclarecer o porquê do uso da dicotomia digital/físico em

contraposição àquela cotidianamente apresentada entre real e virtual.

Pierre Lévy (1996) argumenta que o conceito de virtual não faz sentido se

colocado em oposição ao de real. Retomando dos escolásticos a Deleuze, Lévy põe o

virtual numa relação binária com o atual, desconstruindo a corriqueira (e equívoca)

associação sinonímica entre virtual e possível. “A árvore está virtualmente presente na

semente”, argumenta (idem, p. 16), e diz ainda que o possível - ao contrário - já está

construído, não tem devir. O possível é um real latente, ao qual só falta existência,

enquanto o virtual é complexo, problemático e pede um processo de resolução, de

atualização. Lévy põe luz também sobre o fato de que

O leitor de um livro ou de um artigo no papel se confronta com um objeto físico sobre o qual uma certa versão do texto está integralmente manifesta. Certamente ele pode anotar nas margens, fotocopiar, recortar, colar, proceder a montagens, mas o texto inicial está lá, preto no branco, já realizado integralmente. Na leitura em tela, essa presença extensiva e preliminar à leitura desaparece. O suporte digital (disquete, disco rígido, disco ótico) não contém um texto legível por humanos mas uma série de códigos informáticos que serão eventualmente traduzidos por um computador em sinais alfabéticos para um dispositivo de apresentação. A tela apresenta-se então como uma pequena janela a partir da qual o leitor explora uma reserva potencial (ibidem, p. 39, grifos nossos).

Posto isso, ao se tratar de Realidade Aumentada, é interessante antes de partir

para um referencial teórico mais específico, discorrer um pouco sobre a cibercultura, na

qual a Realidade Aumentada está inserida. A cibercultura é definida por Lévy (1999, p.

17) como “o conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de

modos de pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento

do ciberespaço10. No mesmo livro, o autor define ciberespaço como “o espaço de

comunicação aberto pela interconexão mundial dos computadores e das memórias dos

computadores” (idem, p. 92) e que “Essa definição inclui o conjunto dos sistemas de

comunicação eletrônicos (aí incluídos os conjuntos de redes hertzianas e telefônicas

clássicas), na medida em que transmitem informações provenientes de fontes digitais ou

destinados à digitalização” (ibidem).

9 Chama-se espaço intersticial o espaço híbrido entre o espaço físico e o digital, “com ênfase não apenas nos fluxos de informação para dentro e para fora do espaço físico em conexões inconsúteis, mas também nas novas formas de socialização que aí emergem” (Santaella, 2008b). Nos deteremos mais neste conceito adiante. 10 O conceito aparece pela primeira vez no romance Neuromancer, de William Gibson

Por fim, Lemos (2006) relaciona ainda a cibercultura à liberação do pólo da

emissão (“pode tudo na rede”), ao princípio em rede (“O computador é a rede”) e à

reconfiguração (“tudo muda mas nem tanto”). A cibercultura seria, portanto, uma

cultura em que informações abundantes e circuladas de maneira virótica fazem emergir

infinitas vozes e discursos a partir das reapropriações de antigas práticas, mídias e

espaços devido ao fato do mundo estar cada vez mais conectado, posto que “As novas

tecnologias parecem caminhar para uma forma de onipresença, misturando-se de

maneira radical e quase imperceptível ao nosso ambiente cultural através do devir micro

(tornar-se invisível) e do devir estético (tornar-se belo)” (Lemos, 2008a, p. 17).

2. Alguns aspectos da linguagem de videoclipe

A nova configuração do quadro de tecnologias disponíveis oferece novas

perspectivas técnicas aos procedimentos criativos que procuram conjugar os elementos

de imagem e som. O desenvolvimento do aparato tecnológico que alimenta a criação de

produtos audiovisuais acaba por redefinir as práticas de consumo, por exemplo, da

música, através da produção de videoclipes. Esse gênero surgiu a partir de novas

apropriações de mecanismos materiais que estimularam a reconfiguração dos modelos

tradicionais de narrativa. De acordo com Arlindo Machado

O sistema digital dá o modelo estrutural para o videoclipe, liberando-o dos modelos narrativos ou jornalísticos que constituem a substância da programação habitual de TV, de modo a situá-lo como um espaço de experimentação e descoberta no seio da televisão. (1997; p.169)

A importância que o aparato técnico-material tem sobre a produção de gêneros

que trabalham com imagem e som conjugados, como os videoclipes, indica que as

ferramentas tecnológicas aplicadas ao processo criativo não só se fazem sentir na forma,

mas são um dos aspectos responsáveis pela própria estruturação de conteúdo. O

videoclipe apropria-se de inúmeras possibilidades criativas que lhe conferem maior

potencial de experimentação em um movimento dialógico, seja ela de continuidade ou

ruptura com os padrões estéticos clássicos de narração, montagem, edição de imagem e

som. Dessa maneira, esse gênero audiovisual contemporâneo apresenta possibilidades

inovadoras de uso das matérias imagéticas e sonoras em sua construção.

Por conta de algumas características que rompem padrões, a exemplo da

montagem fragmentada, é corrente um discurso de que o videoclipe, em termos de

produção audiovisual, reduz-se a um mero produto de transgressão, esvaziado das

regras tradicionais que norteiam a narrativa clássica. Acusar que o videoclipe padece do

exagero das vanguardas por conta do apelo a mecanismos de fragmentação e

antirealismo é uma atitude um tanto conservadora. A construção da trama de um

videoclipe que se pretenda narrativo - ou a construção plástica de um não-narrativo -

não busca necessariamente a afetação estilística que abusa das novas tecnologias em

imagem e som que amparam sua produção, mas procura significar e, assim, uma

quantidade expressiva de videoclipes com pretensões ficcionais pode ser considerada

prenunciadora de um novo formato de narrativa. Não se trata apenas de uma montagem

desconexa aplicada no produto somente com finalidades sensoriais. A linguagem

própria que esses videoclipes que se pretendem ficcionais desenvolvem convocam

novos mecanismos de narração que, mais uma vez, denunciam o caráter experimental

desse gênero.

O enquadramento dos videoclipes em classificações com limites bem definidos é

uma tarefa praticamente impossível devido à impureza do fenômeno e à grande

interpenetrabilidade, em um mesmo produto, das possíveis características que

estancariam as particularidades de cada uma dessas categorias. Apesar da grande

diversidade técnica e estética dos videoclipes, sugestões de categorização já foram

propostas.

Durá-Grimalt (1998) estabeleceu três dimensões distintas para a categorização

dos videoclipes, de acordo com o seu grau de obediência aos modelos narrativos

tradicionais. O primeiro grupamento proposto por ele alinha videoclipes que obedecem

à estruturação clássica da ficcionalidade, com a cartilha de tramas previsíveis em que a

história é inicialmente apresentada, depois o conflito é instalado e posteriormente a

solução sinaliza um epílogo. À segunda categoria pertencem videoclipes que elegem

como critério a construção histórias de estruturas não-lineares. Nesse caso, a

apresentação introduz uma trama sempre entrecortada ou sem desfecho. À terceira e

última classificação sugerida por Durá-Grimalt permanecem ancorados os videoclipes

não-narrativos, ou cujas narrativas vão de encontro às prescrições tradicionais dos

relatos.

Data-se de 1975 a primeira produção audiovisual que se encaixa no conceito

atual de videoclipe. Nesse ano, a banda inglesa Queen lançou o Bohemian Rhapsody,

clipe em que se destaca a multiplicação de imagens para ilustrar a sobreposição de

vozes gravadas separadamente e depois mixadas em estúdio. A prática, porém, só viria a

se difundir nos anos 80. A partir dos anos 2000, quando se mostra bastante acentuada a

“liberação do pólo da emissão” da qual fala Lemos em sua primeira lei da ciber-cultura-

remix, é possível entender uma nova forma de produção e consumo de videoclipes.

Softwares como o Adobe Flash Player tornam vídeos acessíveis para aqueles que

possuem computador e acesso à internet, e a facilidade atual de produção e distribuição

faz com que vídeos amadores coexistam com produções profissionais, todos no mesmo

espaço e com os mesmo direitos de circular, embora com estratégias de publicidade bem

distintas.

3. Realidade Aumentada: Definição e aplicações

Atualmente, vivenciamos uma nova fase da sociedade da informação (Lemos,

2008a), na qual o ciberespaço é marcado pelo download de informações para pessoas,

objetos e lugares, ou seja, uma intersecção entre o espaço eletrônico e o espaço físico.

Estamos permeados por dispositivos híbridos, móveis, portáteis que configurariam a

denominada “Era das Conexões” (Weinberger, 2003), regida pela localização,

mobilidade, portabilidade, ubiqüidade e convergência.

É a partir do desenvolvimento desses dispositivos, aliados ao uso massivo da

rede, que surge o conceito de Realidade Aumentada (RA). De acordo com Bimber e

Raskar, no livro Spatial Augmented Reality (2005), em contraste com os ambientes de

Realidade Virtual (RV), na Realidade Aumentada o ambiente físico não é totalmente

suprimido. Uma RA insere elementos sintéticos em um ambiente físico ou, por

exemplo, em um vídeo ao vivo do ambiente físico.

Os mecanismos de realidade aumentada funcionam por meio do que Lúcia

Santaella (2008a) denomina de hibridização ou hibridismo dos espaços físicos de

circulação com os espaços eletrônicos de informação. Cada vez mais são desenvolvidas

tecnologias, com destaque para aquelas que são móveis, que permitem a criação de

espaços que misturam o mundo físico com o digital. Dessa maneira, a Realidade

Aumentada pode ser definida como uma sobreposição de elementos digitais gerados por

computador em um ambiente físico, proporcionando uma experiência - em tempo real -

de um espaço híbrido (intersticial). Notamos como certos dispositivos já incorporados

ao nosso cotidiano podem provocar sensações de mescla entre real e virtual como os

videogames, computadores e webcams.

Segundo Ronald T. Azuma, em A Survey of Aumengted Reality (1997), os

sistemas de Realidade Aumentada são constituídas por três características básicas: 1)

Sistemas que combinam elementos reais e virtuais. 2) Interatividade em tempo real. 3)

Registro em 3-D. Em uma Realidade Aumentada, as interações entre usuário e ambiente

ocorrem em tempo real e direto, oferecendo condições para a que o mesmo se torne um

elemento participativo e ativo através da emissão de comportamentos que atuam sobre

os objetos do cenário. Uma das formas mais simples de realizar uma aplicação de

Realidade Aumentada é através de um microcomputador com uma webcam, executando

um software que, através de técnicas de visão computacional e processamento de

imagens, mistura a cena do ambiente físico, capturada pela webcam, com imagens

digitais gerados por computador.

Os já mencionados espaços intersticiais, característicos da Augmented Reality,

rompem a tradicional distinção entre espaços físicos e eletrônicos separados e opostos

(Santaella, 2008c), e ainda que esse conceito seja voltado especialmente para as

tecnologias móveis, é possível pensar num espaço intersticial mesmo para os objetos de

realidade aumentada que são vistos fora dessas tecnologias, através de uma webcam

simples num PC. Para presenciar a realidade aumentada é necessário que o indivíduo

também esteja dentro do espaço digital, é preciso “um espaço no qual a informação não

é externa a nós, mas sim um espaço que nos coloca dentro da informação” (Novac,

1993, p. 207).

Além de permitir a sobreposição de imagens digitais no espaço físico, a

Realidade Aumentada, em alguns casos, também possibilita o manuseio desses objetos

com as próprias mãos, permitindo que o usuário tenha uma interação atrativa e

motivadora com o ambiente e/ou objeto. No entanto, para que esses objetos sobrepostos

sejam visualizados e manipulados, é necessária a utilização de algum software e

dispositivo tecnológico para mediar a experiência.

Nesse sentido, o local e o espaço tornam-se conceitos muitos importantes.

Muitos teóricos referem-se a espaço como geograficamente dado e local como um

espaço modificado socialmente. Ou ainda, dizem que “o lugar é a fixação enquanto que

o espaço é a abertura” (Tuan apud Lemos, 2003). Mas, talvez a melhor definição para

entender a importância da territorialidade é aquela que André Lemos defende sobre o

local sendo

fundador da relação com o mundo do indivíduo, mas igualmente da relação com o outro, da construção comum do sentido que faz o vínculo social. Sua irredutibilidade se funda numa diferenciação radical entre a co-presença e a comunicação através dos dispositivos e artefatos... (Lemos, 2008b)

Os limites digitais (digital borders), encontrados nesses espaços informativos

em que o físico e o digital se hibridizam, criam um continuum entre eles. Continuum

representado pela imagem digital na webcam que mostra o indivíduo em aliança

indivisível com um dispositivo de realidade aumentada.

Hoje, é notável o uso de sistemas de Realidade Aumentada nos mais diversos

segmentos da sociedade, tais como: medicina, publicidade, educação, comunicação,

entre outros (Kirner e Tori, 2004)

Com a previsível demanda crescente por novas aplicações de Realidade Virtual e

Realidade Aumentada, as pesquisas e desenvolvimentos nessas áreas se multiplicarão e

surgirão muitas oportunidades para aqueles que dominarem não só essa tecnologia

como também essa nova mídia. Tal domínio requer competências e equipes

multidisciplinares, nas quais a engenharia e a ciência da computação se unam à

comunicação e artes, para a criação de personagens virtuais cada vez mais parecidos

com o ser humano, para a elaboração de narrativas adequadas aos ambientes virtuais

interativos e para o desenvolvimento de estratégias que unem o corpo real ao ambiente

virtual, transformam sonho em realidade, e esta em fantasia, de tal forma que só um

artista poderia conceber.

3.1. Exemplos de aplicações de Realidade Aumentada

1) Publicidade

O The Webcam social Shopper, da agência digital Zugara, é um exemplo do uso

de Realidade Aumentada em campanhas publicitárias. Nesse caso, o cliente posiciona

uma imagem em frente à webcam e visualiza digitalmente a roupa selecionada, podendo

efetuar compras online.

2) Educação

"LIRA – Livro Interativo com Realidade Aumentada: Ao colocar o livro em

frente a uma webcam, o usuário verá as ilustrações 3D animadas e sonorizadas sobre o a

imagem do livro que aparece no monitor. Quando o usuário manipular o livro, a

ilustração 3D irá junto." (Wagner et al. 2008).

3) Institucional

A General Electric (GE) utilizou um sistema de Realidade Aumentada para

divulgar a campanha Ecomagination, que mostra, a partir de animações interativas, os

benefícios das energias renováveis para o planeta.

4) Entretenimento

A empresa de card games esportivos Topps, em parceria com a empresa

francesa Total Immersion, lançou uma linha chamada Topps 3D Live de cards em

realidade aumentada. Cada card traz um avatar em 3-D que interage com o jogador que

o utiliza e avatares de outros cards.

5) Redes Sociais

A Doritos lançou em 2009 a campanha Doritos Sweet Chili, integrando um

sistema de Realidade Aumentada à uma rede social na web. Para obter a experiência

completa, o usuário deve posicionar a embalagem do Chips em frente à webcam e, logo

após, é gerado um avatar 3-D. O usuário pode interagir com outros avatares através do

Orkut.

4. Análise

Ride my Star começa com o espectador vendo em seu monitor a imagem

capturada pela sua webcam. Nada acontece além do espectador ver a si mesmo e o

espaço ao seu redor, até que o tracker – nome dado pelo próprio site à folha de papel

com os desenhos que eles disponibilizam impressos em sua superfície – seja

posicionado na frente da câmera. A figura no centro da folha que o espectador segura,

contudo, logo se torna no monitor bem diferente do que está no papel. Na tela, é como

se o desenho impresso fosse a tampa de uma espécie de “caixa” e caísse, deixando-a

aberta. Da “caixa”, surge um livro. Como plano de fundo, no lugar onde no papel se

encontra a imagem central, no monitor, surge uma espécie de rosto formado por

estrelas, lembrando figuras zodiacais, mas não é esse rosto de fundo que importa, e sim

o livro que saiu de onde agora o rosto se encontra.

Figura 1. Tracker do video clipe “Ride my Star”, de Julian Perreta.

O livro se abre e, em três dimensões, paisagens saltam no monitor, conforme as

páginas do tomo vão sendo viradas, assemelhando-se de alguma forma a um livro

infantil com figuras em 3D. É importante mencionar que o passar das páginas é

automático, o espectador não tem qualquer controle sobre ele. O que se pode controlar é

apenas o ponto de vista que se tem das imagens que dançam na tela. Este varia

conforme a folha vai sendo movida na frente da câmera (pode ser tudo aproximado ou

afastado, virado de cabeça pra baixo ou simplesmente inclinado). “As mediações

cognoscitivas, como a própria capacidade de percepção, são alteradas devido às

possibilidades tecnológicas de transmissão e consumo de informação e principalmente

de imagens” (Orozco-Goméz, 2006, p. 89). Logo, o lugar onde se encontrava o rosto

formado por estrelas é tomado por um plano de fundo cheio de verde, com um céu azul

repleto de nuvens brancas, paisagem que interage melhor com as figuras que saltam do

livro.

Figura 2. Cena do clipe “Ride my Star”

Podemos dizer que, apesar de não se poder controlar muito do clipe, o Ride My

Star, comparado aos videoclipes de formato clássico, embora traga muitas

continuidades com as formas mais tradicionais dos videoclipes narrativos, possui uma

importante ruptura: o fato do espectador poder controlar o ângulo de que se vê o

desenrolar das cenas. Apesar disso poder a princípio não parecer tão relevante, é um

passo gigantesco em direção à virtualização, esquecendo aqui a falsa dicotomia entre

real e virtual e entendendo que

A virtualização não é uma desrealização (a transformação de uma realidade num

conjunto de possíveis), mas uma mutação de identidade, um deslocamento do centro de

gravidade ontológico do objeto considerado: em vez de se definir principalmente por

sua atualidade (uma "solução"), a entidade passa a encontrar sua consistência essencial

num campo problemático. Virtualizar uma entidade qualquer consiste em descobrir uma

questão geral à qual ela se relaciona, em fazer mutar a entidade em direção a essa

interrogação e redefinir a atualidade de partida como resposta a uma questão particular

(Lévy, 1996, p. 17-18).

Ride My Star sem dúvida desloca algo no centro de gravidade dos videoclipes,

muda algo na sua identidade: permite a escolha do ângulo do qual o espectador o verá,

tirando a imagem de uma posição fixa tradicional e virtualizando a angulação, um dos

elementos intrínsecos à própria linguagem audiovisual. Assim sendo, muda a própria

percepção do que é um clipe.

Quanto à classificação proposta por Durá-Grimalt, podemos dizer que o

videoclipe do Perreta pode ser encaixado no terceiro grupamento, por conta de sua não-

narratividade, embora ele possua uma característica muito comum em vídeos do

primeiro grupo e já uma marca da linguagem tradicional dos clipes, que é a de fazer

desfilar imagens do que vai sendo narrado/descrito na letra da canção.

Figura 3. Desenrola-se em 3D o que é narrado na letra

Comprova-se, pelo menos para o vídeo do Perreta, a tese de Bimber e Raskar de

que na Realidade Aumentada o ambiente físico não é suprimido, e os espaços são de

fato hibridizados – intersticiais. O vídeo também possui as características que Azuma

propõe como necessárias para uma experiência de Realidade Aumentada (combina

elementos físicos e digitais, proporciona interatividade em tempo real e possui registros

em 3D), e um espectador ativo é requerido o tempo todo: sem os movimentos de quem

assiste, o videoclipe sequer é executado

5. Breve conclusão

O videoclipe de Julian Perreta, aqui trazido como um exemplo fortuito do tipo

de experiência que se vem chamando de Realidade Aumentada, traz a tona a forte noção

de que o uso – cada vez mais freqüente – dos dispositivos de Augmented Reality não

podem ser encarados como mero progresso técnico, mas principalmente como evidência

da reconfiguração de campos cognoscitivos e sensoriais humanos, posto que “a

percepção está no centro das transformações presentes e futuras, no âmbito da

comunicação, cada vez mais estimulada pela mediação tecnológica” (Orozco-Goméz,

2006, p. 89).

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