monografia o d ireito do consumidor
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O DIREITO DO CONSUMIDOR
I - ORIGEM DO DIREITO DO CONSUMIDOR
Rudimentares normas jurídicas relativas a direito do consumidor existem
desde tempos muito remotos na História da Humanidade. Na civilização
mesopotâmica, o legislador babilônico, no Código do Rei Hamurábi, já eram
fixadas regras com este conteúdo, tais como que, existindo vício na obra de
embarcação, o construtor teria, por obrigação, que refazer com recursos próprios:
235. Se um armador construir um barco para outrem, não fizer um bom serviço e durante o mesmo ano aquele barco ficar à deriva ou for seriamente danificado, o armador deverá consertar o barco às suas próprias custas. O barco consertado deve ser restituído ao dono intacto.1 O código hindu, chamado Manu para homenagear um mítico muito
respeitado na Índia, que vigorou entre os séculos II a.C. até II d. C., em seu livro
oitavo, já configurava o ressarcimento por percas e danos, tendo em vista os vícios
redibitórios, decorrentes de venda de produto cujo gênero tivesse sido adulterado
ou a se o produto entregue fosse inferior ao outrora acertado.
O Direito Romano também se preocupou com os prejuízos dos
consumidores decorrentes de compra de produtos que continham vícios e, por
isso, delegou ao fornecedor toda responsabilidade advinda dos vícios da coisa
vendida, inclusive quando este não tinha tal conhecimento, deveria ressarcir o
dobro do valor cobrado pela coisa para o consumidor.
O Direito do Consumidor é considerado um direito moderno, tendo em vista
que a primeira legislação feita direcionada à proteção dos consumidores foi em
1910, na Suécia. Os direitos dos consumidores outrora tutelados eram postos
1 http://paginas.terra.com.br/arte/hammurabi/10.html - acesso em 02 de junho de 2007
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juntamente com outras legislações, como, exemplificadamente, demonstrou-se
acima.
Ocorre que este ramo do direito teve uma alavanca logo após a Revolução
Industrial, que se iniciou na Inglaterra, com influência dos Iluministas, na metade do
século XVIII. Durante este período, os trabalhadores tiveram seus lugares
ocupados por máquinas, e a produção, que era artesanal, tornou-se uma produção
em massa.
Nesta época, o Estado não intervinha nas negociações comerciais, e a
concorrência era feita de forma livre, ou seja, prevalecia a vontade das partes, uma
vez que estas tinham autonomia e igualdade. A contraio sensu, a realidade fática
era outra: a autonomia e a igualdade defendida pelos liberais não era respeitada,
tornando-se, apenas, uma abstração ficta, uma vez que não configurava a
realidade jurídica das relações comerciais.
No final do século XIX, o liberalismo evolui, formando o Estado Social,
decorrente das transformações sociais que estavam acontecendo. “O indivíduo é
substituído pelo grupo; as sociedades comerciais, notadamente as sociedades
anônimas, promovem a concentração dos meios produtivos; os produtores
organizam-se, fazendo acordos – posteriormente denominados cartéis - a fim de
limitar os efeitos da concorrência, vindo a criar situações de oligopólio e
monopólio.” 2
Desta forma, surge o capitalismo exagerado, submetendo à sociedade um
novo modelo de consumo, ou seja, um novo processo econômico que dá início a
surpreendentes modificações sociais.
2 DONATO, Maria Antonieta Zanardo – Proteção ao consumidor: Conceito e Extensão. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999.
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Em conseqüência da evolução do liberalismo, que criou um novo modelo
social e de consumo, a concorrência entre os produtores aumentou, fazendo com
que estes desenvolvessem novas técnicas para conquistar os consumidores,
demonstrando os benefícios e utilidades de seus produtos, aprimorando, ou seja,
novas técnicas de marketing, assim como novas formas de créditos, para que na
compra de seu produto pelo consumidor, este não desistisse da compra por não ter
o valor total para realizá-la.
Nesta perspectiva, o objetivo do comércio era vender e, por isto, voltava-se,
diretamente, para o consumidor. Portanto, é natural a idéia de que o consumidor
seria o maior beneficiário de todas as modificações que estavam ocorrendo na
época. Ocorre que a realidade não era essa. Em decorrência de comércio
fortalecido, o consumidor buscava cada vez mais produtos com melhor qualidade e
que trouxesse a ele maiores benefícios. Por conta disto, aquele que deveria ser
beneficiado por todas as mudanças que estavam acontecendo ocupava um lugar
frágil na sociedade de consumo, tornando-se vulnerável aos fornecedores e às
regras que estes impunham ao comércio.
Os ideais defendidos pela Revolução Francesa, que aconteceu em
decorrência da Revolução Industrial, ocupavam somente a realidade jurídica
positiva, não fazendo parte da realidade de fato. Isto porque não compreendia a
vivência da época igualdade, fraternidade e liberdade. Com a ascensão da classe
burguesa, em razão de deter o poder econômico, os burgueses não se igualavam
com os demais, regulavam a liberdade dos menos favorecidos economicamente,
não sendo, desta forma, fraternos.
Nos Estados Unidos, o crescimento da indústria foi ainda mais acelerado
que nos países europeus em virtude da ascensão da indústria durante a Segunda
Guerra Mundial. Para a produção de armas bélicas a serem utilizadas na guerra, a
tecnologia evoluiu com maior rapidez. No pós-guerra, toda essa tecnologia criada
teve reflexo nas indústrias, que aprimorou ainda mais seus produtos. O
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consumidor, na incansável busca pelo melhor produto, torna-se ainda mais fixo na
posição vulnerável na relação de consumo.
Frente a todas essas transformações ocorridas e suas inúmeras
conseqüências, Maria Antonieta Zanardo Donado elucida que “não poderia o
Direito – enquanto Ordem Jurídica – manter-se marginalizado e indiferente” 3, já
que o consumidor tem a necessidade de ser protegido por normas jurídicas, de ter
seus direitos garantidos pelo Estado.
Atendendo a essa necessidade dos consumidores, em 1962, o então
presidente dos Estados Unidos da América, John Fitzgerald Kennedy, consolidou
as normas inerentes ao consumidor, o tão esperado Código de Defesa do
Consumidor norte-americano. A partir disto, o consumidor passa a ser protegido
pelo direito através de normas, que se caracterizam pelo uso de, entre outros,
medidas preventivas, coercitivas e punitivas, tendo como finalidade a proteção à
saúde, à segurança, à liberdade de escolha e à igualdade de condições nos
contratos aos consumidores.
1.2 - DIREITO DO CONSUMIDOR NO BRASIL
Influenciado pelo Código de Defesa do Consumidor norte-americano, o
Brasil, tendo a carência de normas regulamentadoras da relação de consumo,
criou o seu próprio Código de Defesa do Consumidor.
Antes da criação do Código do Consumidor, no Brasil não havia leis
específicas para o consumidor. Tais leis faziam-se presentes somente na
legislação esparsa que se encontrava no Direito Civil, que beneficiava a economia
popular e a boa-fé do contratante.
3 DONATO, Maria Antonieta Zanardo – Proteção ao consumidor: Conceito e Extensão. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999.
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Ocorre que, com a primazia na Doutrina Brasileira do Princípio da
Autonomia da Vontade nas relações contratuais, o objeto protegido era a relação
contratual, e não o resultado advindo em virtude dela. Em virtude disto, a relação
de consumo era desequilibrada na maioria das vezes, sendo certo que, não muito
raro, era o fornecedor que elaborava as cláusulas e condições para a contratação
do serviço. Dependendo do serviço ou do bem, o consumidor acatava as condições
estabelecidas pelo fornecedor, que, quase sempre, beneficiavam este em
detrimento daquele, gerando, também, enriquecimento ilícito dos fornecedores de
má-fé.
Em 11 de setembro de 1990 foi sancionada no Brasil a Lei nº 8.078,
chamada de Código de Defesa do Consumidor, o primeiro regramento do mercado
de consumo no direito brasileiro, que tem por finalidade regular as relações de
consumo. Esta moderna lei influenciou outros países da América Latina a criarem
ou reformarem suas normas em defesa ao consumidor.
Embora ainda não exista a plena consciência na sociedade consumidora a
respeito de seus direitos, os órgãos de defesa ao consumidor – PROCON, IDEC,
entre outros – a Ordem dos Advogados do Brasil, o Ministério Público e a
imprensa, tanto escrita, quanto falada, prestam um serviço de valor inestimável,
para a conscientização dos consumidores sobre seus direitos.
1.3 - DIREITO DO CONSUMIDOR NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE
1988
O Código de Defesa do Consumidor é amparado por garantias
constitucionais 4 , o que não ocorria nas legislações anteriores dedicadas ao
consumidor.
4 Art. 5º, XXXII da CF: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País, a inviabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXXII – o Estado promoverá na forma da lei a defesa do consumidor”.
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A defesa do consumidor, tendo como princípio o interesse público e,
finalidade o bem-estar coletivo, por estar tutelada pela Constituição Federal, faz
com que o Estado zele e atue como fiscal e aplicador da lei, utilizando seus órgãos
competentes em suas atribuições cabíveis.
Vestido de constitucionalidade, o Código de Defesa do Consumidor se faz,
necessariamente, respeitável, em virtude de ser uma norma imperativa, obrigatória,
auto-aplicável, não podendo ser revogada por lei ordinária, mas somente por
reforma constitucional.
Para poder igualar a relação de consumo, a Carta Magna protege,
irredutivelmente os consumidores, o que resta explícito nos artigos 220, parágrafo
3º, e 221, da Constituição Federal de 1988:
“Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. (...)
§ 3º - Compete à lei federal:
I - regular as diversões e espetáculos públicos, cabendo ao Poder Público informar sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada;
II - estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art. 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente”.
“Art. 221. A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios:
I - preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas;
Art. 129, III, da CF: “São funções institucionais do Ministério Público: (...) III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”; Art. 170 da CF: A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...)V - defesa do consumidor”.
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II - promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação;
III - regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei;
IV - respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.
É facilmente perceptível que a Carta Magna colou o interesse público acima
dos interesses privado, podendo, inclusive demonstrar através do entendimento do
STF:
“Em face da atual Constituição, para conciliar o fundamento da livre iniciativa e do princípio da livre concorrência com os da livre iniciativa do princípio da livre concorrência com os da defesa do consumidor e da redução das desigualdades sociais, em conformidade com os ditames da justiça social, pode o Estado, por via legislativa, regular a política de preços de bens e de serviços, abusivo que é o poder econômico que visa o aumento arbitrário dos lucros.” 5
5 Ementa do acórdão do STF de 30 de março de 1993.
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II - PRINCIPOLOGIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
Princípios, conforme consta no Vocabulário Jurídico De Plácido e Silva6,
significa, literis:
“PRINCÍPIOS. No sentido, notadamente no plural, significa as normas elementares ou os requisitos primordiais instituídos como base, como alicerce de alguma coisa. E, assim, princípios revelam o conjunto de regras ou preceitos, que se fixam para servir de norma a toda espécie de ação jurídica, traçando, assim, a conduta a ser tida em qualquer operação jurídica. Desse modo, exprimem sentido mais relevante que o da própria norma ou regra jurídica. Mostram-se a própria razão fundamental de ser das coisas jurídicas, convertendo-as em perfeitos axiomas. Princípios jurídicos, sem dúvida, significam os pontos básicos, que servem de ponto de partida ou de elementos vitais do próprio Direito. Indicam o alicerce do Direito. E, nesta acepção, não se compreendem somente os fundamentos jurídicos, legalmente instituídos, mas todo axioma jurídico derivado da cultura jurídica universal. Compreendem, pois, os fundamentos da Ciência Jurídica, onde se firmaram as normas originárias ou as leis cientificas do Direito, que traçam as noções em que se estrutura o próprio Direito. Assim, nem sempre os princípios se inscrevem nas leis. Mas, porque servem de base ao Direito, são tidos como preceitos fundamentais para a prática do Direito e proteção aos direitos”.
Assim, deduz-se que os Princípios são anteriores às normas jurídicas
propriamente ditas, são as bases que foram consideradas para a elaboração
destas, estando, então, interligados. A norma jurídica deve ser respeitada tanto
quanto os princípios também devem.
Cada ramo do Direito tem seus princípios basilares. No Direito do
Consumidor, o professor Nelson Nery Junior ensina que “os princípios dividem-se
em informativos e fundamentais, sendo aqueles considerados como axiomas
(verdades) não necessitando de demonstração e, por isso, desprovidos de
conteúdo ideológico: lógico, jurídico, político, econômico. Os fundamentais ou
gerais são aqueles sobre os quais o sistema jurídico pode fazer opção,
considerando aspectos políticos e ideológicos”. 7
6 SILVA, De Plácido e – Vocabulário Jurídico, Editora Forense, Rio de Janeiro: 2002. 7 NERY JUNIOR, Nelson – Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, p. 21, Editora RT, 1992.
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A maior parte da doutrina admite que o Código de Defesa do Consumidor
tem como escopo alguns princípios básicos e as demais normas são, desta forma,
reflexos. As relações de consumo têm seus princípios elencados nos artigos 1º ao
7º do Código.
2.1 – PRINCÍPIO DA ISONOMIA
Antes da vigência do Código de Defesa do Consumidor, não muito raro, o
consumidor encontrava-se em desvantagem em relação ao fornecedor. Em seu
artigo 4º, o Código admite tal vulnerabilidade do consumidor nas relações de
consumo.
O princípio da igualdade ou da isonomia está previsto na Constituição
Federal, a qual determina “tratar os iguais de forma igual e os desiguais de forma
desigual8”, ou seja, desigualar para igualar.
Na relação de consumo, o consumidor configura a parte hipossuficiente,
por isso que a vulnerabilidade é a sua característica mais marcante, e, em
decorrência disto, o principal motivo para a criação do Código de Defesa do
Consumidor.
“Por ter a vulnerabilidade do consumidor diversas causas, não pode o Direito proteger a parte mais fraca da relação de consumo somente em relação a alguma ou mesmo a algumas facetas do mercado. Não se busca uma tutela manca do consumidor. Almeja-se uma proteção integral, sistemática e dinâmica. E tal requer o regramento de todos os aspectos da relação de consumo, sejam aqueles pertinentes aos próprios produtos e serviços, sejam outros que se manifestam como verdadeiros instrumentos fundamentais para a produção e circulação destes mesmos bens: o crédito e o marketing.
É com os olhos postos nesta vulnerabilidade do consumidor que se funda a nova disciplina jurídica. Que enorme tarefa, quando se sabe que esta fragilidade é multifária, decorrendo ora da atuação dos monopólios e oligopólios, ora da carência de informação sobre qualidade, preço, crédito e outras características dos produtos e serviços. Não bastasse tal, o consumidor ainda é cercado por uma publicidade crescente, não estando, ademais, tão organizado quanto os fornecedores.” 9
8 Artigo 4º, inciso I da Constituição Federal 9 GRINOVER, A.P., BENJAMIN, Antonio A. H. V., FINK, Daniel R, FILOMENO, José G. B, WATANABE, K., NERY JÚNIOR, N., DENARI, Z. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor; comentado pelos autores do anteprojeto, 6ª edição – Rio de Janeiro; Forense Universitária, 2000.
10
Vulnerável significa: que se pode vulnerar ou penetrar; designativo do lado
fraco de um assunto ou questão e do ponto por onde alguém pode ser atacado ou
ferido. 10
Desta forma, na relação de consumo, ser vulnerável designa ser o lado
fraco dentro da relação. O Código de Defesa do Consumidor, no artigo 4º, inciso
I 11 , reconheceu que ser vulnerável é estar em condição de inferioridade. O
consumidor é parte hipossuficiente, uma vez que o fornecedor possui todas as
informações referentes ao seu produto, bem como detém maior poder econômico,
o que concede a ele diversas facilidades, entre elas, contratar melhores
profissionais para lhe defender em juízo.
2.2 – PRINCÍPIO DE ACESSO A JUSTIÇA.
Princípio constitucional, previsto no artigo 5º, inciso XXXII da Constituição
Federal:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)
XXXII - O Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor.”
Outrossim, este princípio também tem respaldo no Código de Defesa do
Consumidor, no artigo 5º, em todos seus incisos e no artigo 6º, incisos VII e VIII:
“Artigo 5º. Para a execução da Política Nacional das Relações de Consumo, contará o Poder Público com os seguintes instrumentos, entre outros:
I – manutenção de assistência jurídica, integral e gratuita para o consumidor carente;
II – instituição de Promotorias de Justiça de Defesa do Consumidor, no âmbito do Ministério Público;
10 BUENO, Francisco da Silveira – Minidicionário da língua portuguesa, Editora FTD. São Paulo: 1996. 11 Artigo 4º: A Política Nacional de Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito a sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos nos seguintes princípios: I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo.
11
III – criação de delegacias de polícia especializadas no atendimento de consumidores vítimas de infrações penais de consumo;
IV – criação de Juizados Especiais de Pequenas Causas e Varas Especializadas para a solução de litígios de consumo;
V – concessão de estímulos à criação e desenvolvimento das Associações de Defesa do Consumidor.
Artigo 6º. São direitos básicos do consumidor: (...) VII – o acesso aos órgãos judiciários e administrativos, com vistas à prevenção ou
reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção jurídica, administrativa e técnica aos necessitados;
VIII – a facilidade da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências”.
O consumidor, na qualidade de hipossuficiente, decorrente da
vulnerabilidade reconhecida, encontra-se, na maioria das vezes, em situação de
desamparo, socorre-se, então, às defensorias públicas, que possuem a importante
função de orientação e de representação em juízo, caso haja necessidade.
As promotorias de justiça de defesa do consumidor consagram-se na
tarefa de defender o consumidor, seja no âmbito individual, com intuito de conciliar
interesses, seja no coletivo, através da instauração do inquérito civil e proposituras
de ações civis públicas, com fulcro na Lei nº 7.347/85.
Ensina Cecília Matos que:
a inversão do ônus da prova é direito de facilitação da defesa e não pode ser determinada senão após o oferecimento e valoração da prova, se e quando o julgador estiver em dúvida. É dispensável caso forme sua convicção, nada impedindo que o juiz alerte, na decisão saneadora que, uma vez em dúvida, se utilizará das regras de experiências a favor do consumidor. Cada parte deverá nortear sua atividade probatória de acordo com o interesse em oferecer as provas que embasam seu direito. Se não agir assim, assumirá o risco de sofrer a desvantagem de sua própria inércia, com a incidência das regras de experiência a favor do consumidor. 12
12 GRINOVER, Ada Pellegrini, BENJAMIN, Antonio Herman de Vasconcellos e, FINK, Daniel Roberto, FILOMENO, José Geraldo Brito, WATANABE, Kazuo, NERY JÚNIOR, Nelson, DENARI, Zelmo. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor; comentado pelos autores do anteprojeto, 6ª edição – Rio de Janeiro; Forense Universitária, 2000.
12
Assim, com base no Princípio de Acesso a Justiça, o Código de Defesa do
Consumidor não prevê somente que o consumidor tem direito a facilidade no
acesso da justiça, mas como também tem o direito de inversão de prova, para que
o fornecedor, detentor do poder econômico, produza provas a fim de demonstrar
que o produto não continha vícios. Essa tutela se faz necessária para que haja
isonomia na relação comercial e na busca de solução efetiva dos conflitos dela
inerentes.
2.3 – PRINCIPIO DA EFETIVA E INTEGRAL REPARAÇÃO DO DANO
Princípio também tutelado pela Carta Magna no artigo 5º, inciso V.:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem.
Princípio este também previsto no artigo 6º do Código de Defesa do
Consumidor:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
(...)
VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos.
Este princípio se baseia na responsabilidade do fornecedor em reparar o
dando causado pelo seu produto ao consumidor. Para poder seguir com este
pensamento, antes é adequado esclarecer o conceito de responsabilidade e
responsabilidade civil, conforme o Vocabulário Jurídico, literis:
13
RESPONSABILIDADE: Forma-se o vocábulo de responsável, de responder, do latim respondere, tomado na significação de responsabilizar-se, vir garantindo, assegurar, assumir o pagamento do que se obrigou ou do ato que praticou.
Em sentido geral, pois, responsabilidade exprime a obrigação de
responder por alguma coisa. Quer significar, assim, a obrigação de satisfazer ou
executar o ato jurídico, o que se tenha convencionado, ou a obrigação de satisfazer
a prestação ou de cumprir o fato atribuído ou imputado à pessoa por determinação
legal.
A responsabilidade, portanto, tem ampla significação, revela o dever
jurídico, em que se coloca a pessoa, seja em virtude de contrato, seja em face de
fato ou omissão, que lhe seja imputado, para satisfazer a prestação convencionada
ou para suportar as sanções legais, que lhe são impostas.
Onde quer, portanto, que haja a obrigação de fazer, dar ou não fazer
alguma coisa, de ressarcir danos, de suportar sanções legais ou penalidades, há a
responsabilidade, em virtude da qual se exige a satisfação ou o cumprimento da
obrigação ou da sanção.
A responsabilidade, desta maneira, tanto decorre da convenção como da
norma ou regra jurídica, em face das quais a obrigação se exige ou o dever se
impõe.
Na linguagem comercial, é comum o emprego do vocábulo na significação
de encargos, ônus, o que, em verdade, não se afasta do sentido originário de
obrigação a cumprir.
E nesta acepção entendem-se as expressões: O sócio Fulano tem a
responsabilidade do escritório; o sócio Beltrano tem as responsabilidades da
gerência; as responsabilidades são divididas entre os sócios.
E daí porque responsabilidade, exprimindo etimologicamente a qualidade
de ser responsável, a condição de responder, pode ser empregado em todo
14
pensamento ou idéia, na qual se queira determinar a obrigação, o encargo, o
dever, a imposição de ser feita ou cumprida alguma coisa.
Na linguagem jurídica, há espécies de responsabilidade, que se
apresentam devidamente determinadas: responsabilidade civil, responsabilidade
penal, responsabilidade contratual, responsabilidade administrativa ou funcional
etc.
Todas elas, porém, não fogem ao sentido geral de obrigação, encargo,
dever, compromisso, sanção, imposição.
“RESPONSABILIDADE CIVIL: É a expressão usada na linguagem
jurídica, em distinção à responsabilidade criminal ou penal.” 13
Designa a obrigação de reparar o dano ou de ressarcir o dano, quando
injustamente causado a outrem.
Revela-se, assim, ou melhor, resulta da ofensa ou da violação de direito,
que redunda em dano ou prejuízo a outrem.
Pode ter como causa a própria ação ou ato ilícito, como, também, o fato
ilícito de outrem, por quem, em virtude de regra legal, se responde ou se é
responsável.
O emprego da expressão universalizou-se, não somente para que se
distinga da responsabilidade penal. Porque, embora derivada de crime ou delito, é
a responsabilidade civil trazida à discussão em juízo civil, onde é indagada, litigada
e decidida.
Os princípios jurídicos em que se funda a responsabilidade civil, para
efeito de determinar a reparação do dano injustificadamente causado, provém da
velha máxima romana inserta no neminem laedere (não lesar a ninguém).
13 SILVA, De Plácido e – Vocabulário Jurídico, Editora Forense, Rio de Janeiro: 2002.
15
Por vezes, empregam a expressão para designar a responsabilidade
gerada da inexecução das obrigações, que se tenham assumido contratualmente.
Esta responsabilidade é, propriamente, contratual ou convencional,
distinguindo-se, por isso, da responsabilidade fundada no ato ilícito.
A responsabilidade civil é a que se apura para que se possa exigir a
reparação civil, que é a pena imposta ao agente ou responsável pelo ato ilícito.
Vide: Reparação civil
Ente uma e outra, há, no entanto, uma afinidade relativa à indenização do
dano ou ressarcimento das perdas ou prejuízos trazidos à pessoa.
Quando a responsabilidade decorre de ato próprio, diz-se direta. Quando
de ato ou fato alheio, indireta. 14
Analisando a responsabilidade civil prevista no Código de Defesa do
Consumidor, encontramos excludentes da responsabilidade elencadas de forma
taxativa nos artigos 12 e 14 do Código de Defesa do Consumidor:
Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.
(...)
§ 3° O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando provar:
I - que não colocou o produto no mercado;
II - que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste;
III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
14 SILVA, De Plácido e – Vocabulário Jurídico, Editora Forense, Rio de Janeiro: 2002.
16
Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
(...)
§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:
I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;
II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
Em virtude de existir excludente de responsabilidades ao fornecedor no
Código, alguns autores consideram que a responsabilidade civil objetiva é
mitigada, mas, para o professor Nery Junior, “trata-se de responsabilidade
absoluta, porque as excludentes não se referem nem decorrem do risco da
atividade.” 15
A reparação do dano ao consumidor é algo muito relevante para o Código
de Defesa do Consumidor. Assim, em seu artigo 28 e parágrafos, prevê a
desconsideração da personalidade jurídica do fornecedor, para que este não utilize
artimanhas a fim de ludibriar o pagamento da indenização. Ou seja, ainda que o
fornecedor dolosamente esconda seu patrimônio para frustrar o pagamento que é
devido, em forma de indenização ao consumidor, este pode ingressar no
patrimônio da pessoa física do fornecedor.
Isto posto, notoriamente, é dever, salvo nas exceções anteriormente
elencadas, do fornecedor arcar com os prejuízos sofridos pelo consumidor em
decorrência de compra de produto ou de serviço, podendo, inclusive, na falta de
patrimônio da pessoa jurídica do fornecedor, o consumidor ingressar na espera
particular daquele, ou seja, nos bens que tange sua pessoa física.
1.4 – PRINCÍPIO DA BOA-FÉ NA RELAÇÃO COMERCIAL
15 NOGUEIRA, Tânia Lis Tizzoni – A Prova no Direito do Consumidor, editora Juruá, 1ª edição. Curitiba: 1999.
17
Tendo em vista o artigo 170 da Constituição, que trata sobre a ordem
econômica, o Código de Defesa do Consumidor se manifestou em seu artigo 4º,
inciso III, e também no artigo 51, inciso IV:
Art. 4° - A Política Nacional de Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito a sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:
(...)
III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;
Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
(...)
IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade.
Este princípio é necessário, decorrente do desrespeito dado ao
consumidor. Ocupando este o posto de hipossuficiente na relação de consumo,
bem como, acreditando em todas as vantagens oferecidas pelo produto e detentor
de boa-fé, acabava por ser prejudicado, pois era ludibriado pelo fornecedor que
sempre visava mais lucros, mesmo que fosse ilícito. Para que o consumidor fosse
protegido e a sua boa-fé tutelada, o Código de Defesa do Consumidor o
incorporou, uma vez que este princípio sempre existiu, mas por não ser respeitado,
precisava de algo que exigisse este respeito, ou seja, de uma norma coercitiva
para que o respeito devido fosse concedido.
Desta forma, na elaboração do Código de Defesa do Consumidor, o
legislador se preocupou em dar ao consumidor proteção à sua boa-fé, impondo
sanções caso esta fosse desrespeitada, visando à harmonia entre as relações de
consumo.
18
III – PUBLICIDADE E PROPAGANDA 3.1 - GENERALIDADES
A sociedade em que vivemos na era da globalização é marcada pelo corre-
corre do dia-a-dia, e, em virtude disto, para que os fornecedores tenham maior
facilidade para apresentação de seus produtos aos consumidores, utilizam-se dos
meios de comunicação através da publicidade e propaganda. Tendo em vista que
estes meios influenciam significativamente o estado psicológico e emocional dos
consumidores em massa, não importando se são o alvo ou não, destarte, diante
deste quadro, percebe-se que a publicidade nos dias atuais é a natureza da
sociedade de consumo.
Para que a publicidade atinja seu fim, é necessário que chegue até os
consumidores. Para isto, é necessário que sejam utilizados os meios de
comunicação, que são de diversos tipos, como, por exemplo, imprensa escrita
(jornais, revistas), rádio, televisão, publicidade ao ar livre (cartazes, faixas,
“outdoors”).
A mensagem publicitária, a priori, tem como função a informação. Esta
função, no entanto, foi distorcida pela função de influenciar, convencer o
consumidor. Este, por sua vez, perde, em tese, a liberdade de construir sua própria
opinião, já que recebe idéias e opiniões prontas através dos veículos de
comunicação.
O destaque da mensagem do anúncio publicitário é invertido do produto
para o consumidor, como, por exemplo, a propaganda da Coca-Cola: “Beba Coca-
Cola e Viva o Lado Bom da Vida”.
Desta forma, considera-se a publicidade e a propaganda formas de
induzimento ao consumo, que são dirigidas aos consumidores de uma maneira
19
geral para que estes tenham necessidade de possuir o produto em apreço,
influenciando na sua escolha no ato da compra.
3.2 – CONCEITO DE PUBLICIDADE E A SUA DISTINÇÃO DE PROPAGANDA
Publicidade e Propaganda, apesar de serem, no dicionário da língua
portuguesa, sinônimos, no Código de Defesa do Consumidor, não foram adotadas
com o mesmo significado.
Para o Código de Defesa do Consumidor, a publicidade tem objetivo
comercial, com caráter lucrativo, uma vez que tem a finalidade de convencer o
consumidor da necessidade de possuir tal produto. Já a propaganda tem a função
de informação, com conteúdos culturais, sociais e educativos.
O que resta elucidado nos comentários do Código de Defesa do
Consumidor:
Não se confundem publicidade e propaganda, embora, no dia-a-dia do mercado, os dois termos sejam utilizados um pelo outro. A publicidade tem um objetivo comercial (“la finalité dún rendement économique par lê recrutement d’un public de consommateurs”), enquanto a propaganda visa a um fim ideológico, religioso, filosófico, político, econômico ou social.
A título exemplificativo, imagine, em primeiro momento, uma campanha do
Estado para a conscientização da população em limpar suas casas para acabar
com os focos do mosquito da dengue; e, em segundo, a veiculação de alguma
empresa de inseticida com o mesmo conteúdo, mas com a finalidade de persuadir
o consumidor a comprar uma marca específica. O primeiro caracteriza a
propaganda, enquanto o segundo, a publicidade.
3.4 – PRINCÍPIOS REGENTES DA PUBLICIDADE NA RELAÇÃO DE CONSUMO
3.4.1 – PRINCÍPIO DA IDENTIFICAÇÃO DA PUBLICIDADE
20
A publicidade tem que ser identificada, sendo vedada a publicidade
clandestina e a subliminar, uma vez que o Código de Defesa do Consumidor prevê,
no artigo 36, que a publicidade tem que ser clara. Um exemplo de publicidade
subliminar é, quando em algum filme, aparecem os personagens passando por
determinada loja, lanchonete, mostrando a sua marca, mas sem fazer qualquer
referência a ela.
Assim, a publicidade deve ser veiculada de forma clara o suficiente para que
o consumidor compreenda a real mensagem.
3.4.2 – PRINCÍPIO DA VINCULAÇÃO CONTRATUAL DA PUBLICIDADE
Conforme está previsto nos artigos 30 a 35 do Código de Defesa do
Consumidor, o consumidor tem o direito de exigir do fornecedor o integral
cumprimento do conteúdo do anúncio publicitário, pois se considera a publicidade
negócio jurídico unilateral.
3.4.3 – PRINCÍPIO DA VERACIDADE DA PUBLICIDADE
Este é um dos princípios fundamentais da publicidade, uma vez que tutela o
consumidor da publicidade enganosa prevista no artigo 37, § 1º, do Código de
Defesa do Consumidor.
3.4.4 – PRINCÍPIO DA NÃO-ABUSIVIDADE DA PUBLICIDADE
Este princípio visa que a propaganda não distorça os conceitos da
sociedade, não devendo ser, de qualquer maneira, discriminatória, vexatória ou
prejudicial ao consumidor.
21
Diferentemente da propaganda enganosa, a abusiva não causa prejuízo ao
bolso do consumidor, mas fere seus valores ínfimos.
3.4.5 – PRINCÍPIO DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA
Tendo em vista a vulnerabilidade do consumidor frente ao fornecedor,
aquele terá obstáculos, dificuldades em provar que foi enganado ou que foi
influenciado por uma propaganda publicitária distorcida.
Quando existe prejuízo ao consumidor em relação à publicidade do produto,
a inversão do ônus da prova é obrigatória, uma vez que alcança a veracidade do
anúncio bem como o abuso deste.
3.4.6 – PRINCÍPIO DA TRANSPARENCIA DA FUNDAMENTAÇÃO DA
PUBLICIDADE
Ao anunciar seu produto, o fornecedor tem o dever, como fundamento, usar-
se de elementos fáticos e científicos, uma vez que o anunciante deve zelar pelo
respeito para com o consumidor, bem como, fornecer apenas informações
verídicas.
3.4.7 – PRINCÍPIO DA CORREÇÃO DO DESVIO PUBLICITÁRIO
De acordo com a professora Ada Pellegrini, “uma vez que o desvio
publicitário ocorra, ao lado de sua reparação civil e repressão administrativa e
penal, impõe-se, igualmente, que os seus malefícios sejam corrigidos, ou seja, que
seu impacto sobre os consumidores seja aniquilado”.16
3.5 – DISPOSITIVOS SOBRE A DISCIPLINA CIVIL NA PUBLICIDADE NO
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
16
22
O Livro V do Código de Defesa do Consumidor, a partir do artigo 36,
regulamenta a publicidade na relação de consumo empregada no Brasil. Além do
Código, a publicidade também é regulamentada pelo Conar – Conselho Brasileiro
de Auto-Regulamentação Publicitária, que, em conjunto com o Estado, fiscaliza os
aspectos éticos e morais daquela.
O principal objetivo do legislador ao regulamentar a publicidade na relação
de consumo foi tutelar a boa-fé dos consumidores em geral, não considerando o
seu nível intelectual, uma vez que a publicidade é dirigida aos consumidores em
massa, que são de todas as classes sociais, com diferentes experiências, culturas
e níveis intelectuais. Sendo assim, o fornecedor é responsabilizado civilmente pela
publicidade enganosa de seu produto, não importando se houve dolo ou culpa,
uma vez que se considera o potencial de enganar o consumidor, mesmo que seja
uma pequena quantidade, aparentemente insignificante.
Em razão desta preocupação, o legislador dispôs sobre publicidade
enganosa, classificada em comissiva e omissiva, bem como sobre a abusiva,
conforme está disposto na Lei 8.078/90, no artigo 37.
3.5.1 – PROPAGANDA ENGANOSA
A propaganda enganosa está prevista no artigo 37, § 1º, no Código de Defesa do
Consumidor, verbis:
Art. 37. É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva. § 1° É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir ao erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços.
A propaganda enganosa ocorre quando induz o consumidor a comprar algo
que, se ele soubesse das reais condições do produto, não compraria, ou se
comprasse, não aceitaria pagar o valor estipulado.
23
Para caracterização da propaganda enganosa não é necessário a intenção
do fornecedor de ludibriar o consumidor, assim como não precisa que seja
comprovado o dano material ao receptor, bastando, apenas, a possibilidade de
instigar o consumidor a erro.
Existem dois tipos de publicidade enganosa, a omissiva e comissiva (por
ação). A publicidade enganosa omissiva ocorre quando são omitidas informações
importantes ao consumidor que poderiam levar este a não adquirir tal produto ou
serviço, ou, se adquirisse, não celebraria o negócio jurídico nas formas impostas
pelo fornecedor. Sendo, então, esta omissão de informações imprescindíveis
reprovada pelo Código, uma vez que é contrária ao princípio da transparência,
identificação, veracidade e informação que são as bases da publicidade na relação
de consumo, agredindo, desta forma, a boa-fé do receptor do anúncio, que
configura a parte hipossuficiente da relação.
Exemplos de publicidade enganosa omissiva são facilmente perceptíveis
nos anúncios feitos pelas empresas de telefones móveis, quando, na propaganda
publicitária, diz que poderão ser feitas ligações de graça do aparelho até o final do
ano, quando, na verdade, só serão gratuitas as ligações feitas para números da
mesma operadora e em horários específicos.
A publicidade enganosa comissiva decorre de uma ação do anunciante,
quando este disponibiliza no anúncio informação que não é condizente com a
realidade fática do produto ou serviço. Ocorre também quando há exagero no
anúncio, com a intenção de valorizar o produto, induzindo o consumidor a erro,
sendo, então, considerada mensagem falsa, irreal, inverídica.
O exagero só não é tido como publicidade enganosa por comissão quando
qualquer receptor do anúncio possa entender, possa perceber que se trata de
mensagem fantasiosa, que tem impossibilidade de virar realidade.
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Para encontrar um exemplo de publicidade enganosa por comissão não é
preciso procurar muito. Apenas com o acesso a alguns anúncios de pacotes de
turismos, poder-se-á perceber este tipo de ação enganosa para com o consumidor.
As empresas de turismo, não raramente, distribuem panfletos publicitários, nos
quais induzem o consumidor a acreditar que, se adquirir o referido pacote de
turismo, ficará hospedado em um hotel de alto nível, com as alimentações inclusas,
bem como todos os passeios. Mas, ao chegar ao destino, o hotel não é nem ao
menos parecido com o qual a empresa divulgou, assim como fornece aos
hóspedes somente cafés da manhã e somente os passeios públicos podem ser
feitos gratuitamente.
3.5.2 - PUBLICIDADE ABUSIVA
Esta modalidade de publicidade é regrada no artigo 37, § 2º, verbis:
Art. 37. É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva. § 2° É abusiva, dentre outras, a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança. De acordo com o exposto, publicidade abusiva é todo anúncio que visa,
dolosamente, ou não, ofender valores morais da sociedade. Assim como na
publicidade enganosa, não é necessário que seja ferido os valores sociais, apenas
que estes valores sejam expostos, de maneira que haja apenas a possibilidade da
concretização do dano.
Os casos elencados no artigo acima são meramente exemplificativos e não
um rol taxativo, uma vez que os valores sociais estão em constante mudança e são
distintos para a cada cultura regional do país.
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Ressalta-se que este tipo de publicidade não tem a finalidade de enganar o
consumidor sobre o produto e sim deturpar os valores éticos que a sociedade
preserva.
A prática deste tipo publicitário é visível na veiculação de anúncios de tele-
sexo, pela televisão ou pelo rádio, em período matutino ou vespertino, uma vez que
são horários nos quais as crianças estão assistindo à televisão ou escutando rádio,
com maior probabilidade. A exposição a estes anúncios influencia o despertar
prematuro da libido das crianças.
Assim, o legislador foi cauteloso no sentido de colocar limites aos anúncios
publicitários, para que este não fuja do objetivo de induzir o consumidor a adquirir o
produto, não permitindo, desta forma, que os valores da sociedade sejam
deturpados, ofendendo a dignidade da pessoa humana, o meio-ambiente, e
colocando em risco a segurança e a saúde do consumidor. Esta cautela faz-se
necessária uma vez que o meio publicitário tem grande facilidade em induzir
comportamentos, pensamentos, opiniões e valores, podendo, então, modificar as
condutas sobre determinado assunto, que a sociedade busca preservar.
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