homicÍdios em minas gerais: uma anÁlise sociolÓgica da construÇÃo do crime
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HOMICDIOS EM MINAS GERAIS:
UMA ANLISE SOCIOLGICA DA CONSTRUO DO CRIME
Juliana Neves Lopes Rodrigues
Belo Horizonte 2002
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JULIANA NEVES LOPES RODRIGUES
HOMICDIOS EM MINAS GERAIS:
UMA ANLISE SOCIOLGICA DA CONSTRUO DO CRIME
Monografia apresentada no VIII Curso Superior de Administrao Pblica da Escola de Governo da Fundao Joo Pinheirro como requisito parcial para obteno do grau de bacharel em Administrao Pblica sob orientao de Eduardo Cerqueira Batitucci e superviso de Marcus Vincius Gonalves Cruz
Belo Horizonte
Fundao Joo Pinheiro/Escola de Governo
2002
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Agradecimentos
Nenhum de ns trilha caminhos sozinhos. Precisamos sempre estar em companhia de algum, que nos conduza, que nos fortalea, que nos oriente...E por isso agora preciso agradecer queles que me emprestaram suas companhias para concretizar este trabalho.
Agradeo, inicialmente, ao maior de todos os companheiros: Deus, por ter-me ensinado
a acreditar em mim mesma. Agradeo tambm ao Batitucci, por ter aceitado caminhar comigo, me conduzindo com
carinho e oferecendo seus ensinamentos; ao Marcus, que mais do que me supervisionar, incentivou-me a vencer meus prprios limites e Ludmila, de uma forma muito especial, pois sem sua orientao e pacincia, esse trabalho jamais se concretizaria.
Agradeo de corao ao amigo Moura, funcionrio do Frum Lafayete, que carinhosamente cedeu-me os processos judiciais to preciosos para minha anlise. Moura, voc me forneceu a alma desta monografia. Da mesma forma, ao meu amigo Mrio, por
reconhecer que todas as pessoas tm seu valor e cuja ajuda material foi tambm fundamental na elaborao de meu texto.
A todos os meus queridos amigos por terem acreditado em mim e, assim, fizeram valer a pena at mesmo o cansao; em particular, ao Dani, Roberta, Jana e Aninha, porque seus ouvidos sempre estiveram abertos para me acolher, seus ombros para me consolar e suas palavras para compartilhar as alegrias e o cansao destes momentos. Amo muito vocs!
Ao meu pai, pois sua dignidade e carter estiveram presentes em cada linha deste trabalho, para que eu me lembrasse sempre que minha conduta deveria ser sempre tica, no
que quer que realize na vida. minha me, a quem mais do que agradecimentos, ofereo minha devoo,
simplesmente porque me amou incondicionalmente em todos os momentos, felizes e amargos. Me, a voc devo a maior de todas as lies: que um ser humano precisa ser amado
em sua plenitude, livre de todo e qualquer julgamento. minha querida Waldete, fonte incansvel de encorajamento no somente para este
trabalho, mas para toda a vida.
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Aos meus irmos Paulo, Marcelo e Mariana, pela pacincia e compreenso que tiveram
comigo durante todo este perodo. Ao meu querido Marcelo, que soube aceitar e suportar minha ausncia, transformando
os momentos mais difceis com seu amor. Amo voc! A todos vocs e aos que aqui no pude mencionar porque o espao no permitiu, todo o
meu carinho e agradecimento, pois
Na vida no vale tanto o que temos nem tanto importa o que somos. Vale o que realizamos com aquilo que possumos e, acima de tudo, importa o que fazemos de ns (Francisco Cndido Xavier)
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SUMRIO
APRESENTAO ................................................................................................................ 7
CAPTULO 1 ANLISE DESCRITIVA DOS HOMICDIOS NO BRASIL E NA RMBH.................................................................................................................................... 9 1.1 As causas externas no tempo ........................................................................................ 14 1.2 As causas externas segundo o sexo ............................................................................... 15 1.3 As causas externas segundo a idade ............................................................................. 16 1.4 As causas externas segundo o tipo................................................................................ 18
CAPTULO 2 HOMICDIOS EM MINAS GERAIS ....................................................... 25 2.1 Anlise regional dos homicdios no estado de Minas Gerais ....................................... 28
2.1.1 Regies com taxas ascendentes de homicdios.................................................. 29 2.1.2 Regies com taxas descendentes de homicdios................................................ 32 2.1.3 Regies com taxas relativamente estabilizadas de homicdios......................... 35
2.2 Anlise dos homicdios no estado de Minas Gerais por municpio ............................. 37
CAPTULO 3 CONTEXTUALIZAO DOS HOMICDIOS........................................ 43 3.1 Perfil do autor ............................................................................................................... 43 3.2 Perfil da vtima.............................................................................................................. 46 3.3 Contexto situacional...................................................................................................... 47 3.4 Regularidades e particularidades dos homicdios ....................................................... 48
3.4.1 Regularidades e particularidades para vtimas e autores................................... 49 3.4.2 Regularidades e particularidades para o contexto situacional ........................... 50
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CAPTULO 4 CONSTRUES DE REPRESENTAES DO SISTEMA DE JUSTIA CRIMINAL.......................................................................................................................... 52
CAPTULO 5.. A CRISE DO SISTEMA DE JUSTIA CRIMINAL E A PROPOSIO DE UMA NOVA ABORDAGEM PARA O TRATAMENTO DOS HOMICDIOS ........ 69 5.1 Organizaes policiais................................................................................................... 72 5.2 Preveno criminal e participao comunitria .......................................................... 76 5.3 Direitos Humanos, controle da atividade policial e promoo de servios em justia criminal ................................................................................................................................ 77
CAPTULO 6 CONSIDERAES FINAIS ..................................................................... 79
7 FONTES BIBLIOGRFICAS........................................................................................ 83
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APRESENTAO
Provavelmente um nmero muito pequeno de pessoas duvida da relevncia de se discutir e buscar solues para os problemas da criminalidade e violncia no Brasil, entretanto poucos so os debates pblicos na rea que, no sendo permeados pelas idias do
senso comum do que venham as ser as possveis solues para esses conflitos sociais, realmente estejam buscando combater a violncia, considerando-a sob uma perspectiva mais ampla que incorpore a sociedade e o Estado, conjuntamente.
At ento, temos convivido no pas com a idia de que violncia e segurana pblica so, conforme enfoca Batitucci (2001), assunto de polcia. Esta postura, alm de retirar do Estado e da sociedade a responsabilidade pela resoluo ou preveno da criminalidade,
atribui s organizaes policiais o nus de dar uma resposta social para a violncia, sem que existam condies tanto organizacionais quanto operacionais e financeiras para tal, visto que
estas mesmas organizaes vm passando por uma crise de identidade crescente. E nesse contexto, de dilema operacional e doutrinrio enfrentado pelas organizaes
policiais aliado presso social, que desponta cada vez mais no cenrio nacional a questo do crescente avano da criminalidade violenta, que encontra na categoria dos homicdios, uma
de suas maiores manifestaes. Embora pouco se conhea a respeito do tema, em virtude da incipiente base de dados e produo acadmica, preocupa o fato de que a vitimizao e
mortalidade tenham aumentado tanto, principalmente em grandes centros urbanos, a exemplo da Regio Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH).
Em vista disso, a presente pesquisa visa compreenso da lgica existente por trs dos
homicdios. Procurar-se- buscar evidncias que possam explicar substantivamente a construo deste crime enquanto fato social pelo Sistema de Justia Criminal. Atravs da
anlise de inquritos policiais e de processos judiciais, pretende-se identificar os perfis da vtima e do autor do homicdio, o contexto scio-econmico-cultural relacionados ocorrncia do crime, o trajeto percorrido pelo crime de homicdio no Sistema de Justia, bem como a escolha da melhor abordagem de poltica pblica referente ao tema para combat-lo.
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O projeto ser desenvolvido no estado de Minas Gerais enfatizando a anlise da RMBH e, utilizando-se, para tanto, de dados estatsticos em estudos que fazem referncia incidncia dos homicdios na regio pretendida. Dessa maneira, a primeira fase do trabalho constar da
anlise descritiva da criminalidade na categoria dos homicdios como problema principal a ser trabalhado, ressaltando a importncia do papel do Estado e da sociedade frente questo da segurana pblica e da violncia, acompanhada de uma anlise da situao dos homicdios no estado de Minas Gerais.
Posteriormente ser feita uma anlise contextual dos homicdios, considerando-se, alm de autor e vtima, o contexto situacional de oportunidades que levam ocorrncia destes, bem
como a identificao de regularidades e particularidades dos mesmos na rea analisada. A etapa seguinte consistir na anlise das representaes construdas pelo Sistema de
Justia Criminal acerca dos homicdios, de modo a correlacionar os fatores acima citados com indicadores scio-econmicos. Com isso, obter-se- uma tipificao dos homicdios no
Estado de Minas Gerais, o que, aliado posterior anlise dos valores da polcia, aspectos sociais, culturais e psicolgicos, fornecer a construo deste tipo de crime pelo Sistema de
Justia.
Somado a essas informaes, pretende-se abordar tambm a existncia ou no de polticas pblicas para o tratamento dos homicdios em Minas Gerais, bem como o contexto explicativo das mudanas que ocasionaram o aumento significativo da violncia. Sugerir-se-
uma melhor abordagem a ser seguida para o combate criminalidade violenta no que se referir aos crimes de homicdio, bem como proceder-se- a consideraes que ressaltem o
papel fundamental do trabalho conjunto Estado-sociedade para formulao de polticas pblicas que efetivamente combatam o homicdio. Feito este estudo, o trabalho se dar por concludo.
Finda a pesquisa cumpre ressaltar sua relevncia. A possibilidade de se pensar, refletir e debater a criminalidade, de uma forma madura, com interlocutores aptos a perceber as
dificuldades e possveis iniciativas de uma poltica pblica permitir demandar do Estado as providncias plausveis e necessrias para combater os crimes violentos, bem como fortalecer as bases de promoo de uma segurana pblica eficaz e eficiente.
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CAPTULO 1 ANLISE DESCRITIVA DOS HOMICDIOS NO BRASIL E NA RMBH
A violncia sempre esteve presente em todas as sociedades, porm o avano da mesma nas sociedades modernas tem mobilizado as pesquisas de vrios intelectuais com a inteno
de melhor compreender o fenmeno, bem como de elimin-lo do convvio social. E reconhecendo que esta mesma violncia encontra uma de suas maiores expresses na
manifestao crescente dos crimes contra a pessoa1, em especial os homicdios (que deteriora a qualidade de vida principalmente nos centros urbanos, bem como assola a sociedade pelo sentimento de insegurana constante), possvel compreender a relevncia desta anlise. Tudo isso, conforme exposto em momento anterior, associado a um contexto em que a
violncia muito mais considerada um assunto de polcia do que propriamente uma questo de ordem governamental e social.
Por isso, este estudo proceder-se- na busca de evidncias empricas, de cunho sociolgico, que melhor elucidem os impactos crescentes do tema na sociedade brasileira, em especial enfocando a RMBH, dado que exatamente nas regies metropolitanas que se percebe uma maior incrementao do fenmeno.
Inicialmente, portanto, e tomando-se como referncia os dados do Sistema Internacional de Mortalidade do Ministrio da Sade2 necessrio compreender que a violncia enquadra-
se, quando resulta em mortes, no que foi denominado pela Classificao Internacional de Doenas (CID) como causas externas e mortes por causas ignoradas em que no se sabe se as leses foram acidental ou intencionalmente infligidas; em outras palavras, compreendem as
mortes ocasionadas em virtude de acidentes (de trnsito e de trabalho), suicdios e homicdios; e em decorrncia de vir crescendo a passos alarmantes, principalmente em
1 Crimes contra a pessoa compreendem todos os crimes classificados como homicdio, tentativa de
homicdio e estupros 2 O SIM Sistema Internacional de Mortalidade apenas uma das bases que fornece dados sobre
mortalidade por homicdios. H ainda os dados referentes a outras instituies que no o Ministrio da Sade, tais como os dados disponibilizados pelas polcias Civil e Militar do estado de Minas Gerais.
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grandes centros urbanos, atualmente esta categoria de violncia vem sendo tratada nas
investigaes atravs dos estudos de mortalidade. Dada esta extrema precariedade das bases de dados para anlise da violncia, em virtude
de no serem coletados sistematicamente, ou mesmo disponibilizados para pesquisadores, conforme observaes de Batitucci 3 (1998), optou-se nesta parte da anlise pela utilizao do Sistema de Informaes sobre Mortalidade (SIM). Este se constitui de uma base de dados desenvolvida e implantada pelo Ministrio da Sade, em 1975 (Carvalho, 1997) e funciona baseado num modelo padronizado de atestado de bito, cujo preenchimento legal obrigatrio. Esta declarao de bito submetida avaliao de um mdico (legista ou perito) e posteriormente encaminhada a um cartrio para registro.
O SIM engloba atualmente cerca de 80% das mortes ocorridas no pas, sendo que os 20% restantes referem-se a bitos que no foram registrados ou enviados ao sistema pelos rgos competentes estaduais. , portanto, um sistema relativamente vantajoso, sob o ponto de vista quantitativo, sendo caracterizado por muitos autores como uma base estatstica universal. Uma vez que sua metodologia a mesma nacional e internacionalmente, permite
uma comparabilidade nica. Alm disso, considerado como a base de dados sistemtica com a maior srie histrica disponvel para o Brasil (Batitucci, 1998).
A despeito dessas vantagens, o SIM possui falhas no aspecto qualitativo. A qualidade destes dados afetada por bitos mal definidos em que, conforme colocaes de Minayo4
(1997), no houve assistncia mdica e que, portanto, possuem causa desconhecida. Tudo porque o sistema inclui informaes de mortalidade e morbidade, mas no que concerne s
causas externas percebe-se que os legistas, ao preencherem o atestado de bito, colocam muitas vezes a natureza das leses que ocasionaram as mortes, mas no especificam que tipo de violncia levou a estas leses, ou seja, a circunstncia do evento. Da a ocorrncia de bitos por causas de tipo ignorado e o maior problema deste tipo de procedimento que ele dificulta o estudo das mortes por violncia e sua conseqente preveno.
3 BATITUCCi, Eduardo Cerqueira. O homicdio em Minas Gerais: um programa de pesquisa. Belo
Horizonte, 2002. 4 MINAYO, Maria Ceclia de S.. : A violncia social sob a perspectiva da sade pblica. Caderno de
sade pblica . So Paulo: v 10, suplemento 1.1994.
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No entanto, embora muito utilizado o SIM no constitui a base exclusiva de dados para
avaliao da violncia. H ainda os dados registrados pelas polcias estaduais (militar e civil) que diferem muito entre si, bem como se comparados aos dados do SIM, de acordo com o
observado na tabela seguinte:
HOMICDIOS REGISTRADOS EM BELO HORIZONTE 1991-1997
Ano Polcia Militar
Polcia Civil Sistema de Informaes
sobre Mortalidade
1991 231 312 308
1992 196 286 280
1993 197 293 274
1994 218 295 261
1995 235 321 373
1996 259 323 ...
1997 271 326 ...
Fonte: Criminalidade Violenta em Minas Gerais (1986-1997). Belo Horizonte; Fundao Joo Pinheiro,Centro de Estudos Polticos e Sociais, 1997.
No que se refere s diferenas existentes entre os dados da Polcia Militar (PM) e os da Polcia Civil (PC)5:
As discrepncias observadas nos nmeros indicam que a PM e a PC medem coisas diferentes - supostamente ocorrncias e inquritos. (...), as primeiras representam uma resposta do aparelho policial deciso do cidado de comunicar um evento definido como criminoso, e os segundos resultam de deciso policial de processar a informao como instncia de dolo cometido. Nesse caso, haveria condies de comparabilidade das
5 O nmero de homicdios registrados pela PMMG sempre inferior aos apurados na Polcia Civil, dado
que ambas as instituies desempenham funes de naturezas diferentes (manuteno da ordem e investigao, respectivamente). Assim, uma tentativa de homicdio registrada pela PMMG pode tornar-se um homicdio consumado nas mos da Polcia Civil.
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duas estatsticas, que responderiam a produtos finais de segmentos diferentes do processo social de implementao da lei. (INDICADORES, 1987)
No entanto, mesmo reconhecendo estas discrepncias, preciso se ater ao fato de que os dados processados pelas organizaes policiais, em especial os referentes PM, so de extrema relevncia para a ratificao da importncia de se analisar esta categoria de crimes
violentos, em vista de seu alarmante crescimento, bem como para a compreenso da lgica existente na construo dos homicdios.
Neste sentido, algumas estatsticas produzidas pela PMMG so apresentadas a seguir, a ttulo de ilustrao, de maneira a se ter uma possvel dimenso da evoluo dos crimes de homicdios no estado de Minas Gerais. As mesmas foram escolhidas em virtude de permitirem uma melhor visualizao da distribuio espacial dos homicdios em municpios e
regies de Minas Gerais, bem como pelo fato de que atravs das mesmas pode-se perceber com maior clareza a evoluo da ocorrncia dos homicdios no estado.
HOMICDIOS REGIES ADMINISTRATIVAS DE MINAS GERAIS (Taxa bruta por 100.000 habitantes)
(INCIO) Regio Administrativa Taxa de Homicdio
1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 ALTO DO JEQUITINHONHA 13,62 15,07 15,26 19,14 14,62 13,81 11,81 13,75 13,06 7,49 9,42 13,29 14,20 11,58 13,29 ALTO PARANABA 11,48 8,73 10,32 10,49 7,92 9,46 6,12 11,27 8,78 5,59 10,01 3,94 4,84 8,35 9,14 ALTO RIO DAS VELHAS 11,92 8,57 7,15 11,59 9,77 13,88 10,00 11,16 10,91 6,66 7,80 9,54 8,99 9,72 8,10 ALTO RIO GRANDE 3,37 5,52 3,41 6,06 4,32 2,96 4,54 4,17 2,22 5,00 2,78 3,96 4,23 3,87 3,29 ALTO RIO PARDO 5,61 6,90 3,71 4,57 5,41 6,51 2,92 4,90 5,12 3,09 4,43 4,10 6,18 3,98 2,56 ALTO SO FRANCISCO 2,90 7,17 6,07 5,97 4,59 7,16 5,66 5,26 4,28 4,35 4,83 4,61 4,94 4,45 5,33 BAIXO SAPUCA 3,45 3,46 4,73 4,48 4,61 4,60 5,74 3,69 4,16 4,62 4,30 3,75 5,71 5,16 4,37 CAMPO DAS VERTENTES 6,04 5,99 3,47 6,40 3,42 3,40 5,30 0,96 2,85 2,36 6,08 7,43 3,20 3,62 3,70 CENTRAL 8,17 8,40 8,96 10,30 11,24 10,74 10,39 9,74 9,95 10,56 11,79 12,65 15,31 17,59 20,61 MATA 6,82 7,23 7,36 9,06 9,79 7,82 5,48 5,21 5,23 5,45 5,86 6,63 7,18 6,16 7,12 MDIO RIO GRANDE 3,91 7,43 4,19 7,22 5,08 7,56 4,67 4,14 7,72 2,69 7,96 6,12 3,79 6,05 7,90 MDIO SO FRANCISCO 17,14 10,20 11,07 12,40 14,18 14,99 8,83 10,60 15,08 13,13 8,08 9,79 10,56 11,58 14,39 NOROESTE 23,01 17,91 14,63 25,50 18,06 18,97 12,20 15,80 15,34 13,06 14,06 13,97 16,46 16,32 12,17 NORTE DE MINAS 12,14 12,01 13,30 14,38 11,70 10,08 11,60 10,37 9,07 10,43 9,94 6,55 8,27 8,39 9,65 SUDOESTE 4,00 4,09 6,08 4,02 7,31 4,62 5,22 2,58 5,10 3,79 6,24 5,55 4,84 2,98 6,27
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Regio Administrativa Taxa de Homicdio 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 VALE DO AO 18,13 17,45 19,15 18,43 16,22 19,68 12,75 13,09 10,86 12,78 12,94 10,64 11,05 8,58 10,44 VALE DO JEQUITINHONHA 15,44 11,09 11,94 11,22 10,94 14,84 12,95 14,67 14,47 12,35 13,86 9,18 9,50 12,07 12,42 VALE DO MUCURI 18,60 16,19 18,28 22,47 21,74 17,74 20,20 17,96 19,73 14,35 16,35 14,04 20,29 18,07 17,03 VALE DO PARANABA 10,99 10,66 8,47 9,49 10,72 10,20 11,06 8,62 10,56 10,13 11,36 10,70 8,42 11,83 10,34 VALE DO RIO DOCE 25,12 23,67 22,13 22,39 18,08 18,34 19,66 21,68 18,70 24,23 20,67 20,96 23,06 18,09 20,43 VALE DO RIO GRANDE 11,78 10,52 11,89 9,50 13,30 12,37 8,79 12,00 12,60 8,97 8,08 8,15 11,36 8,80 12,59 VALE DO RIO PIRANGA 11,81 10,05 11,37 12,40 12,87 10,88 11,43 12,52 8,71 9,52 9,25 13,05 12,58 16,05 11,66 VALE DO RIO POMBA 7,81 10,48 10,68 10,28 8,09 4,74 8,83 9,06 6,38 8,64 7,72 7,95 10,82 12,32 10,89 VALE DO SAPUCA 4,18 4,47 4,99 6,66 3,65 4,71 6,14 5,51 3,80 5,72 4,76 8,50 3,72 5,02 5,48 VERTENTE DO CAPARA 23,17 19,18 15,70 16,45 16,62 16,60 15,32 15,88 14,59 13,67 13,48 17,17 14,79 13,10 12,47
Fonte: Criminalidade Violenta em Minas Gerais (1986-1997). Belo Horizonte; Fundao Joo Pinheiro Centro de Estudos Polticos e Sociais (1997)
A dificuldade encontrada na anlise destes dados encontra-se, entretanto, nos graves
problemas de classificao e de impreciso estatsticos nela contidos. Nos prprios documentos da PM, denominados Diretrizes Auxiliares de Operao (DIAO), percebe-se o comprometimento da anlise estatstica baseada nas ocorrncias policiais, conforme citao a seguir:
A DIAO-01/94 estabelece que, na prtica de mais de uma infrao penal, o Boletim de Ocorrncia receber a classificao alusiva mais grave. H outras prticas no previstas na DIAO-01/94, mas que tm relevncia para a anlise estatstica: se um nico autor, numa s ocorrncia, cometer vrios crimes da mesma natureza, haver o registro de um nico crime. Se vrias pessoas praticam vrios crimes da mesma natureza ou no, numa mesma ocorrncia, os crimes do origem a um nico registro (CRIMINALIDADE VIOLENTA, 1986-1997).
Contudo, independentemente e apesar de todos os reais problemas envolvidos na questo de confiabilidade dos dados essencial se ater informao de que pela observao do aumento da mortalidade por causas externas que se pode ter um melhor esclarecimento da progressiva intensificao do fenmeno da violncia. Assim, tomando-se como referncia,
inicialmente, a mortalidade por causas externas revelada pelo SIM, possvel apresentar a seguir as principais variveis que interferem no desenvolvimento do processo de crescimento
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do nmero de homicdios e na forma como vem se efetivando na sociedade brasileira, em
especial nas regies metropolitanas, como dito anteriormente.
1.1 As causas externas no tempo
Considerando-se o perodo de anlise de Mello Jorge (1997) como compreendido entre os anos de 1977 e 1994, observou-se que as mortes por causas externas praticamente dobraram no Brasil em termos absolutos (1977: 55.240 1994: 107.292), enquanto que o mesmo no ocorreu com o crescimento populacional, demonstrando a importncia do crescimento deste tipo de mortes.
Em 1989, as mortes por causas externas j ocupavam a segunda posio na mortalidade geral do pas6, perdendo apenas para as doenas circulatrias e a partir da que alcanam patamares preocupantes. Coincidentemente este perodo da dcada de 80 foi considerado
excessivamente precrio para o Brasil, tanto do ponto de vista econmico quanto social, de modo que as desigualdades entre as camadas sociais mais extremas se intensificaram enormemente com aumento do nmero de pobres e indigentes, maior concentrao da renda e conseqente socializao da misria para mais da metade da populao (Souza, 1994).
Numa anlise mais detalhada, tomando-se como referncia o estado de Minas Gerais e restringindo ainda mais as observaes para a RMBH, a situao no se mostra muito
diferente. No perodo compreendido entre os anos de 1980 a 1995 Batitucci & Sapori (2000) observaram que a mortalidade por homicdios na RMBH representava, em mdia, 17% do total de mortes do grupo causas externas, proporo esta que, de acordo com estudos dos
autores, passou a apresentar tendncia de crescimento mais ou menos regular a partir da metade da dcada de 80.
As causas ignoradas na RMBH segundo os mesmos autores representaram, no mesmo perodo, em mdia, 12% dos bitos no total do grupo por causas externas sendo que em 1997 atingem um pico de 20,1% regredindo consistentemente at alcanar 2,9% em 1995.
6 Ver Batitucci (1998) e Minayo (1997).
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Quando se leva em conta o uso de armas de fogo neste tipo de mortalidade evidenciou-se ainda que as mesmas representaram 6,11% dos bitos por homicdios, em mdia, e 11,35% do total de homicdios onde houve uso de armas de fogo no perodo analisado.
1.2 As causas externas segundo sexo
H um consenso entre todos os pesquisadores utilizados para fins deste estudo de que
existe uma diferenciao quanto s mortes por causas externas em relao ao sexo, sendo que os homens possuem um coeficiente de mortalidade muito superior ao verificado para as mulheres. Os estudos de Mello Jorge (1997) demonstram que para todo o pas, em termos absolutos, houve uma sobremortalidade masculina bastante acentuada (coeficientes de 105 e 116/100.000 homens e de 23 e 24/100.000 mulheres), no perodo que abrange os anos 1984-1994, revelando que o sexo masculino corresponde a, aproximadamente, 4,5 vezes o valor do feminino.
A mesma autora, em pesquisa que identificou o perfil de mortalidade de jovens (15 a 24 anos) das cidades do Rio de Janeiro e So Paulo no perodo de 1930 a 1991, constatou que em torno dos 15 anos de idade o diferencial por sexo da mortalidade comea a se apresentar com maior intensidade, justificando a necessidade de se estudar as variaes de mortalidade separadamente para cada sexo.
Em pesquisa semelhante que incorporou as regies metropolitanas de Belo Horizonte, Porto Alegre, Rio de Janeiro e So Paulo, Batitucci7 (1998) chegou mesma concluso, ou seja, de que o sexo masculino o mais atingido pela mortalidade por causas externas. A exemplo da RMRJ (Regio Metropolitana do Rio de Janeiro), o autor encontrou taxas de mortalidade por causas externas atingindo, em mdia, 21% dos homens contra apenas 5,3% das mulheres. Afirma ainda que um fenmeno de redundncia mundial (Batitucci, 1998).
7 BATITUCCI, Eduardo Cerqueira. Anlise de homicdios em quatro regies metropolitanas. ANPOCS,
revista de Cincias sociais, nmero VII, ano de 1999.
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No tocante ao estado de Minas Gerais, Batitucci & Sapori (2000), com base no nmero absoluto de bitos por homicdios ocorridos constataram uma tendncia a um crescimento lento e progressivo, sendo que a populao masculina a principal vtima em 85,8% dos casos contra 13,9% do sexo feminino. De modo semelhante a RMBH, embora com taxas de mortalidade bastante superiores s do resto do Estado, tambm tende ao crescimento das ocorrncias de mortalidade por homicdios, acompanhando, da mesma forma, a diferenciao dos gneros na mortalidade: 87,61 % dos bitos referem-se ao sexo masculino e 12,29% ao feminino.
ainda importante ressaltar nesta anlise que somente o municpio de Belo Horizonte contribui com 64,3% dos homicdios ocorridos na RMBH, sendo que 87,54% envolvem vtimas do sexo masculino contra 12,46% de vtimas mulheres.
1.3 As causas externas segundo a idade
O mesmo consenso estabelecido com relao ao sexo, novamente ratificado para as faixas etrias: so os jovens entre 15 e 29 anos as vtimas preferenciais da mortalidade por homicdios, principalmente na RMSP e na RMRJ, atingindo, respectivamente, 58% e 37% do total de bitos por causas externas (Batitucci, 1998).
A pesquisa de Mello Jorge (1997) analisando dados de mortalidade demonstrou que somente a faixa etria de 15 a 19 anos responsvel por cerca de 65% dos bitos do pas e entre os anos de 1984 e 1994 os coeficientes de mortalidade analisados para essas idades subiram de 93,7 para 128,2. Considerando-se as faixas entre 20 e 29 anos os nmeros, para o mesmo perodo, passaram de 178,1 a 191,3, revelando que os jovens (e jovens das grandes regies metropolitanas) so realmente o pblico-alvo principal da mortalidade por causas externas.
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Concentrando esta anlise na regio pretendida de pesquisa, qual seja a RMBH, Batitucci & Sapori8 (2000) chegaram a concluses muito semelhantes s de Mello Jorge, isto , que os homicdios privilegiam vtimas jovens com uma faixa etria compreendida entre 20 e 29 anos; e ainda que o homicdio vitima proporcionalmente mais jovens na capital do que na rea metropolitana . Porm observa-se que na RMBH as vtimas masculinas de homicdios so essencialmente jovens (15 a 29 anos), enquanto as vtimas femininas possuem idade mais avanada, compreendida entre os 30 e 49 anos, no perodo de anlise (1980-1995).
Cumpre afirmar assim que o conceito de juventude adotado nesta pesquisa deriva de uma categoria essencialmente sociolgica, referindo-se ao processo de preparao para que
os indivduos assumam o papel social do adulto, tanto do ponto de vista familiar quanto profissional com plenos direitos e responsabilidades (Mello Jorge, 1996), de modo que a importncia crescente dos adolescentes e jovens como grupos relaciona-se com as mudanas cada vez mais rpidas que se processam no contexto social, econmico e cultural (Mello Jorge, 1996).
Portanto num contexto de intensa urbanizao, misria e marginalidade das periferias
das grandes cidades com suas baixas qualidades de vida somado ao desenvolvimento tecnolgico, s mudanas na estrutura produtiva, crise econmica que se estende ao longo das dcadas e se intensifica nos anos 80, ampliao do mercado das drogas, assim como os novos estilos de vida ou formas de comportamento o que se obtm um imenso conjunto de perdas sofridas pelos jovens que acabam por adotar estratgias de agressividade com a finalidade de sobreviver no meio social em que se inserem, conforme expem Mello Jorge
(1996) e Minayo (1994).
8 BATITUCCI, Eduardo Cerqueira; SAPORI, Lus Flvio. Anlise descritiva da incidncia de
homicdios na RMBH (1980-1995). Revista OFICINA. Belo Horizonte: ano VII, n. 11,
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1.4 As causas externas segundo o tipo:
At a dcada de 70 os acidentes de trnsito lideravam a lista de bitos por causas
externas de acordo com estudos de Mello Jorge (1997), porm na dcada de 90 os homicdios que passam a encabear tal lista. Somente no ano de 1994 os homicdios foram responsveis por cerca de 30% das mortes por causas externas sendo que nesta categoria houve um aumento que na dcada de 90 chegou a 160% e cuja tendncia de crescimento verificada na maioria das capitais brasileiras.
Mesmo em perodos anteriores j era possvel identificar a escalada dos homicdios para uma posio especial nos bitos por causas externas; eles perfizeram, de acordo com Souza (1994), em mdia, 22% das mortes por causas violentas entre 80 e 88. Os dados da sade, colhidos pela mesma autora, revelam que no perodo citado ocorreram 168.518 homicdios em termos absolutos no pas, sendo que 90,9% deles tiveram por vtimas pessoas do sexo masculino e apenas 9,1% foram vtimas do sexo feminino. Alm da constatao de que a maior concentrao dos homicdios para ambos os sexos se encontra na faixa de 20-29 anos.
Em seus estudos sobre homicdios em quatro regies metropolitanas, Batitucci (1998) demonstra ainda que os homicdios ocorridos no pas possuem uma concentrao geogrfica em torno das regies metropolitanas do Rio de Janeiro e So Paulo. Para se obter uma idia da evoluo dos homicdios nestas cidades cita-se o caso analisado do Rio de Janeiro. A
capital apresentava, em 1979, uma da taxa de aproximadamente 25 homicdios por grupo de 100.000 habitantes. Em 1995 a taxa passou a ser de 71 homicdios/100.000 habitantes; um aumento de 184%.
A capital de So Paulo apresenta taxas ainda mais surpreendentes: em 79 sua taxa de homicdios era da ordem de 13/100.000 habitantes. Dezesseis anos depois alcana um
patamar de 54 homicdios/100.000 habitantes, o equivalente a um aumento de 400%. E se verdade que nos maiores centros econmicos do pas que se verificam as
maiores taxas dessa categoria de crimes, no se pode afirmar, por outro lado que o fenmeno exclusivo dos mesmos. Capitais como Belo Horizonte e Porto Alegre, embora com menores taxas, acompanham a mesma tendncia de crescimento, fazendo-se uma ressalva apenas
fevereiro.2000.
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capital de Minas que, aparentemente alcanou uma estabilidade se considerada a anlise de
Batitucci (1998) para os anos de 1979-1995. Nesse contexto, porm, Souza (1994) chama a ateno para o fato de que as taxas de
homicdios podem apresentar-se de maneira diferente se considerado o uso de armas de fogo neste tipo de crime. A autora afirma que as armas de fogo tm um papel fundamental no crescimento das taxas de mortes violentas e sua presena aumenta dramaticamente a possibilidade de que um ou mais participantes sejam mortos em um conflito que as envolvam.
Na anlise do estado de Minas Gerais, Batitucci & Sapori (2000) perceberam que h uma tendncia de crescimento do nmero de homicdios em que se utilizam armas de fogo e
j em 1995 correspondiam a 38,6%, em mdia, do total de homicdios ocorridos em Minas. Tomando-se como referncia a RMBH essa proporo alcana 53,9% em mdia, o equivalente a 10,61 mortes/100.000 habitantes em 1980 e 9,59 mortes/100.000 habitantes em 1995.
Considerando-se a incidncia entre os sexos o que se evidencia tambm uma diferenciao em que os homens so mais atingidos: 40% do total dos homicdios contra
27,5% das mulheres e ao restringir as observaes de modo a se levar em conta somente os homicdios cometidos com o uso de armas de fogo, ter-se- que em mdia 92,7% das vtimas so do sexo masculino. Alm disso, as vtimas preferenciais esto compreendidas entre a faixa etria de 15 a 19 anos.
Soares 9(2000), na anlise dos factides que poderiam explicar o fenmeno dos homicdios no pas, verificou que o nmero de homicdios com armas de fogo tem aumentado
ano a ano, desde que as estatsticas disponveis comearam a ser computadas em 1979, detectando ainda que o nmero desses crimes cresce mais rapidamente do que a populao e que o nmero de homicdios com armas de fogo tem aumentado mais rapidamente do que os
homicdios cometidos com outros meios. No entanto, ressalta o autor, deve-se atentar para o fato de que as armas de fogo so entendidas apenas como fatores facilitadores para o aumento
dos homicdios e no como um motivo que o explique em sua totalidade.
9 SOARES, Glucio Ary Dillon Soares. Homicdios no Brasil: vrios factides em busca de uma teoria.
In: REUNIO LATIN AMERICAN STUDIES ASSOCIATION, Miami, Flrida. 2000.
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Semelhantemente aos autores anteriores, Batitucci (1998) demonstrou tambm que na RMRJ que este tipo de bito mais ocorre, sendo que 88% dos homicdios no ano de 1994 foram praticados com armas de fogo, sendo que as faixas etrias mais envolvidas neste
processo se encontram entre 15 e 29 anos e so em 90% dos casos pertencentes ao sexo masculino.
Embora os dados sejam contundentes a anlise dos homicdios pode ser caracterizada ainda como incipiente de modo que no possvel detectar com a necessria clareza as razes
que motivam essa categoria de criminalidade violenta. H uma vertente muito forte atualmente que vem freqentemente associando o aumento das taxas de homicdios nas
regies metropolitanas na dcada de 80 a questes macro tais como o aumento da pobreza e misria urbanas (sobretudo na populao em idade produtiva) vivendo e trabalhando nas ruas; falncia das instituies totais de assistncia e recuperao de menores (Souza & Minayo, 1994); consolidao da organizao do crime com uma economia e um poder paralelos, em conluio com o poder pblico e uma economia formal, constituindo uma rede articulada e difcil de ser combatida (Pinheiro, 1983; Zaluar, 1986; Batista, 1990) bem como consolidao de grupos de extermnio.
Todas essas colocaes merecem uma anlise mais minuciosa, visto que tm sido amplamente utilizadas como fator explicativo do aumento do nmero de homicdios no s por parte dos estudiosos do tema, mas tambm pelos que, detendo o poder pblico de agir
sobre a questo nas reas de segurana pblica e justia, empregam essa afirmao como forma de resposta social.
Segundo Soares (2000) h na criminologia brasileira um debate interessante acerca do poder explicativo que algumas variveis possuem em relao ao crime. Normalmente essas variveis envolvem questes como desigualdade e pobreza (como citado acima por Souza & Minayo), bem como encerram em si mesmas discusses de carter essencialmente econmico.
Diversos autores vm publicando estudos sobre o tema visando busca de evidncias que corroborem ou no a existncia de uma relao entre essas variveis e a violncia. As pesquisas de Cano & Santos (2001) so um exemplo. Os autores procuraram compreender se o nvel de renda ou sua distribuio poderiam se constituir em fatores importantes na
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determinao das taxas de homicdio. Sendo assim poderiam obter dois tipos de resposta:
uma favorvel, o que demonstraria que os homicdios deveriam ser combatidos com medidas sociais; e uma desfavorvel, evidenciando que as medidas de combate a esse tipo de crime
deveriam relacionar-se ao sistema de justia criminal (ex: melhoria do desempenho da polcia).
Em ambas as situaes depara-se com um dilema social pois ao estabelecer como positiva a relao renda-homicdios as implicaes sobre as polticas pblicas seriam
evidentes: tratar os homicidas com um padro decente de vida para que no tentem obter renda sem usar da violncia. Em outras palavras o que se estaria desnudando o conjunto de valores ticos que a questo suscita, pois ao considerar que no s a postura moral determinante para que se cometa o homicdio, mas tambm a posio da pessoa na estrutura social, ter-se-ia que pensar duas vezes antes de condenar quem quer que seja.
Por outro lado se a relao for tida como negativa, estaria bastante clara a
responsabilidade do Sistema de Justia Criminal frente ao combate dos homicdios. Tudo isso num contexto evidente de crise em que se encontram as organizaes policiais, aliado ao
ambiente de total desarticulao entre sociedade civil e Estado. Fato que Cano & Santos verificaram em seus trabalhos que em qualquer parte do
mundo h um tipo de relao entre condio econmica e violncia letal, seja por indicadores de renda ou ndices de desigualdade, mas renda e desigualdade no parecem apresentar um
efeito claro sobre as taxas de homicdios dos estados brasileiros; ao contrrio, a urbanizao que parece ter forte influncia. So os estados urbanos, tanto ricos quanto pobres, que
possuem as maiores taxas, sendo que estados rurais exibem as menores taxas dado que o controle social exercido nos mesmos mais intenso.
O grande problema reside no debate inerente a estas questes, pois a sociedade
brasileira habituou-se a considerar a questo violncia enquanto condicionada diretamente pelo desenvolvimento econmico, retirando assim da rea de segurana pblica a
responsabilidade por seu tratamento, conforme se observa na citao a seguir:
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H uma percepo generalizada na sociedade brasileira, em especial nos grandes centros urbanos, de que boa parte da violncia disseminada em nosso cotidiano est diretamente relacionada ao desemprego crnico que atinge amplos segmentos pauperizados da populao. Este argumento tem sido muito utilizado pelos membros de nossas organizaes policiais e por diversas autoridades polticas como forma de justificar a impossibilidade destas de reverterem a tendncia de crescimento dos ndices de violncia em boa parte de nossos centros urbanos. Como os nveis de desemprego so reflexo direto da atividade econmica, haveria muito pouco o que fazer por parte dos responsveis pela poltica de segurana pblica, dado que eles no controlam as reais causas do fenmeno, limitando-se a atuar sobre suas conseqncias (Sapori & Wanderley, 2001)
Sapori & Wanderley, em pesquisas semelhantes s de Cano & Santos, oferecem vrios subsdios empricos sobre a relao desemprego-violncia, porm em seus estudos no
aderem ao posicionamento de se considerar esta relao enquanto positiva, negativa ou nula; oferecem apenas a viso contida em diversas abordagens de maneira a relativizar o problema
da violncia levando-se em conta o contexto no qual ela se insere. o caso, por exemplo, da abordagem de Hagan (1996) citada pelos autores, segundo a qual a associao entre violncia e desemprego para ser caracterizada como positiva ou negativa depender dos nveis de agregao dos dados utilizados pelos pesquisadores:
Em outras palavras, h estudos que consideram a relao desemprego-crime a partir de indivduos, enquanto outros o fazem a partir de dimenses mais agregadas, como o caso das vizinhanas, cidades e mesmo pases. E conforme afirma Hagan, a influncia do desemprego sobre o crime, em nvel macro, diferente da influncia que se d em nvel micro (Sapori & Wanderley, 2001)
Citam ainda para explicar a mesma relao a teoria das oportunidades formulada por
Cantor e Land (1985) segundo a qual desemprego e violncia so considerados aqui no sob o aspecto motivacional para cometimento do crime, mas sob o ponto de vista das oportunidades para efetivao do ato criminoso, quais sejam: a) os ofensores motivados; b) alvos disponveis (indivduos ou propriedades); c) ausncia de proteo efetiva dos alvos.
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Trazendo o debate para o escopo de anlise do Brasil, Sapori & Wanderley no
encontraram indcios de que as variaes nas taxas de desemprego implicassem, necessariamente, variaes presentes ou futuras dos ndices de violncia nas quatro regies
metropolitanas estudadas: Rio de Janeiro, So Paulo, Belo Horizonte e Porto Alegre. Quanto associao feita atualmente entre a ocorrncia de homicdios e a questo do
trfico de drogas ou os grupos de extermnio, h autores que afirmam realmente existir algum tipo de conexo entre estes eventos:
Quando tomamos dados relativos a totalidade dos municpios mineiros, percebemos que a incidncia de ocorrncias relativa a drogas (uso e venda) mantm uma importante correlao com o nmero de crimes violentos (0.31), de maneira especialmente significativa nos crimes contra o patrimnio (0.53) (Beato, 1999)10
As prprias organizaes policiais apresentam a relao homicdios-crime organizado como verdadeira e plausvel, divulgando-a na mdia, pelos meios de comunicao de massa e
pela anlise de dados da Polcia Militar de Minas Gerais: somente no ano de 1998, pde-se verificar que das 66,5% ocorrncias registradas para o municpio de Belo Horizonte em que foi possvel averiguar as motivaes dos homicdios percebeu-se que estes acontecem preferencialmente entre pessoas conhecidas, em ambientes domsticos e em locais prximos
s suas residncias (Beato, 2000) e que desses, 25.4% referiam-se a mortes de envolvidos com drogas, porm, lembra o autor, em mais de 60% dos casos no foi possvel averiguar no local as motivaes envolvidas:
Esse alto percentual resulta do fato de que a PM, fundamentalmente encarregada do policiamento ostensivo, no faz investigao de casos de homicdio. Da a possibilidade de que o alto nmero de casos em que no possvel identificar a motivao possa estar ligado a drogas (Beato, 1999)
10 BEATO, Cludio Chaves. Conglomerados de homicdios e o trfico de drogas em Belo Horizonte de
1995 a 1999. [Sl.: sn., 200-]. Disponvel em: . Acesso em 16 de set. 2002
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O fato que as pesquisas acerca desta associao so muito recentes e nem sempre
permitem identificar o poder explicativo do crime organizado para compreenso do aumento das taxas de homicdios, principalmente em regies metropolitanas, mas mesmo assim vem
sendo utilizado com esta finalidade, de modo a apresentar para a sociedade que a discusso referente s causas dos homicdios se esgota quase em sua totalidade nos grupos de extermnio e no trfico de drogas e que, sendo assim, o combate aos crimes contra a vida fica adiado, uma vez que as organizaes do Sistema Judicirio e de Segurana Pblica no teriam
subsdios necessrios para atuar com eficincia para tal. De qualquer maneira, essa discusso ser realizada em captulo posterior quando, em
maiores detalhes e considerando o momento de crise enfrentado pelas organizaes acima citadas, ser possvel compreender por qu os homicdios vm sendo construdos e por qu sua construo vinculam-se eventos que mais do que se propondo a serem explicativos, so utilizados como uma resposta social a este tipo de criminalidade violenta.
Por hora o que se tentou evidenciar neste captulo foi a constatao real e absoluta de que os homicdios vm elegendo a cada dia um nmero maior de vtimas e adquirindo uma
importncia social que acaba por revelar a ineficincia dos mecanismos sociais que deveriam combat-lo e elimin-lo, expressos tanto na crise doutrinria e de identidade das organizaes policiais, quanto na crise de legitimidade do Estado brasileiro na conduo de suas polticas pblicas de segurana, justia e at mesmo de sade. E de uma maneira mais especfica procurou-se estender essa anlise especificamente ao estado de Minas Gerais, privilegiando a RMBH, onde se verifica maior incrementao do fenmeno.
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CAPTULO 2 OS HOMICDIOS EM MINAS GERAIS
Talvez a maior justificativa para a anlise dos homicdios resida, conforme exposto por Adorno & Crdia (2002), na acentuao do medo e insegurana coletivos frente ao aumento deste tipo de criminalidade, concomitantemente ao fato de que as polticas de justia e segurana pblica tradicionais e convencionais venham se revelando inadequadas e
ineficientes para garantir a lei e a ordem, bem como para promover os chamados direitos fundamentais da pessoa humana.
Neste cenrio, em que a coletividade da populao se sente ameaada e sem respostas do respectivo aparato judicirio pblico responsvel, tornou-se fundamental o processamento de estudos que orientem as aes sociais mais efetivas de controle desta categoria de crimes.
Assim, ser apresentada nesta parte da anlise o que se poderia denominar de uma breve
leitura situacional dos homicdios no estado de Minas Gerais, uma vez que esta pesquisa restringe seu escopo de explorao referida regio.
Em virtude de permitirem uma melhor visualizao da distribuio espacial de crimes violentos e neste caso especfico os homicdios, a anlise reportar-se- aos dados produzidos
pela PMMG, conforme anteriormente afirmado no captulo precedente. Se tomado o perodo compreendido entre os anos de 1986 a 1997, baseado no estudo de
criminalidade violenta11 promovido pela Fundao Joo Pinheiro (FJP) em conjunto com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), percebe-se que o estado apresenta uma tendncia ao aumento das taxas de criminalidade violenta, conforme evidenciado no grfico
2.1, a seguir:
11 CRIMINALIDADE VIOLENTA EM MINAS GERAIS (1986-1997), Cludio C. Beato F, Eduardo
Batitucci, Cel.Lcio Emlio Esprito Santo, Luis Flvio Sapori, Marcos A. C. Santos, Paulo Csar C. Morais, Renato Assuno, Srgio Luiz Flix da Silva
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GRFICO 2.1: TAXA DE CRIMES VIOLENTOS POR 100 MIL HABITANTES MINAS GERAIS 1986-1997
Fonte: Dados bsicos: Polcia Militar de Minas Gerais ( PMMG ) Elaborao: Fundao Joo Pinheiro (FJP), Centro de estudos Econmicos e Sociais
(CEES)
Somente entre os anos de 1986 e 1997 percebe-se um aumento de quase 100% na criminalidade, com observaes para o ano de 1991 em que o movimento ascendente se mostra mais bvio, atingindo sua maior expressividade para o ano de 1996 em diante. Porm, h que se atentar para o fato de que esta tendncia de crescimento observada se deve muito
mais aos crimes contra a propriedade do que propriamente aos cometidos contra a pessoa, nos quais se situam os homicdios.
Assim, so os crimes contra a propriedade os maiores determinantes da mudana no padro da criminalidade em Minas Gerais (CRIMINALIDADE VIOLENTA EM MINAS
0
50
100
150
200
250
1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997
ANO
Tax
a de
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s
-
27
GERAIS, 2000) o que decorre, essencialmente, do roubo a mo armada, delito que mais contribuiu para a tendncia a ascendncia da criminalidade violenta na regio.
Esta situao pode ser ilustrada pelo grfico 2.2 abaixo:
GRFICO 2.2: PARTICIPAO PERCENTUAL DE TIPOS DE CRIMES VIOLENTOS MINAS GERAIS 1986-1997
Fonte: Dados bsicos: Polcia Militar de Minas Gerais ( PMMG ) Elaborao: Fundao Joo pinheiro (FJP), Centro de Estudos econmicos e Sociais (CEES)
Outra ressalva, entretanto, importante, pois os homicdios se distribuem de forma
desigual no estado, de modo que as localidades com populao acima de 100 mil habitantes so caracterizadas como as mais violentas por suas maiores taxas.
crimes contra a pessoa
crimes contra a propriedade
0,00%
10,00%
20,00%
30,00%
40,00%
50,00%
60,00%
70,00%
80,00%
90,00%
100,00%
1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997
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2.1 Anlise regional dos homicdios no estado de Minas Gerais
O grfico 2.3 a seguir revela as taxas brutas de homicdios por 100.000 habitantes para
o estado de Minas Gerais, considerando-se como perodo de anlise os anos compreendidos entre 1986 e 2000:
GRFICO 2.3: TAXA DE HOMICDIOS POR 100.000 HABITANTES MINAS GERAIS 1986-2000
4,00
6,00
8,00
10,00
12,00
14,00
16,00
1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000
Ano
Tx de
H
om
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por
100.
000
habi
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Fonte: Dados bsicos: Polcia Militar de Minas Gerais ( PMMG ) Elaborao: Fundao Joo Pinheiro (FJP), Centro de estudos Econmicos e Sociais (CEES)
Atravs dele percebe-se a existncia de pequenas variaes anuais nas taxas o longo do perodo que se estendeu dos anos 1986 a 1997, com uma ressalva para os anos ps-1997 em que h notadamente uma tendncia ao crescimento das taxas de homicdio, que por sua vez no se distribui homogeneamente pela regio, mas antes se concentra em determinadas
localidades.
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Desta maneira, com a finalidade de se visualizar com maior clareza a distribuio do
fenmeno em Minas Gerais, possvel classificar a evoluo das taxas de homicdios por sua ocorrncia nas diversas regies administrativas do estado em trs grupos:
a) regies onde se verifica tendncia ao crescimento; b) regies onde se verifica tendncia ao declnio; c) regies onde se manteve constante.
2.1.1 Regies com taxas ascendentes de homicdios
Para o perodo delimitado entre os anos de 1986-2000, o estado registrou atravs dos dados da PMMG uma soma de 25112 ocorrncias relativas ao crime de homicdios, sendo que o ltimo ano isoladamente foi responsvel por 2073 ocorrncias, ultrapassando todos os
demais anos de anlise. Os mesmos dados da PMMG, agora tomados sob o aspecto de taxas, so apresentados
no mapa 2.1 a seguir e revelam a tendncia observada no estado acerca da distribuio espacial dos crimes contra a pessoa (considerando-se observaes compreendidas entre 1986-1997), em que se constata a concentrao das maiores taxas mdias de ocorrncia do crime numa faixa de municpios que se estende do noroeste do estado ao Vale do Rio Mucuri e Vale
do Rio Doce:
-
30
Mapa 4.6 Taxa corrigida de crimes violentos contra a pessoa, Minas Gerais - 1997
73 .7 to 166 (75) 55 .7 to 73 .7 (106) 44 to 55 .7 (134) 35 .5 to 44 (138) 11 .7 to 35 .5 (270)
Estendo-se a anlise at o ano 2000, possvel delinear as reas no estado que atualmente se encontram em ascendncia, considerando-se para efeitos desta anlise somente
os homicdios enquanto categoria de crime. So elas: Alto do Jequitinhonha, Alto do Paranaba, Alto So Francisco, Central, Mata, Mdio Rio Grande, Mdio So Francisco, Norte de Minas, Sudoeste, Vale do Rio Doce e Vale do Rio Grande. Essas regies, assim como observado at o ano de 1997 mantm a mesma tendncia de concentrao em municpios ao longo da direo noroeste, a exceo das regies que se concentram ao sudoeste do estado, como as localidades referentes ao Tringulo Mineiro.
Os grficos a seguir ilustram melhor a situao em que se encontram as regies administrativas mencionadas:
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31
GRFICO 2.4 : TAXA DE HOMICDIOS DE REGIES ADMINISTRATIVAS - MINAS GERAIS 1986-2000
0,00
5,00
10,00
15,00
20,00
25,00
1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000
ALTO DO JEQUITINHONHAALTO PARANABAALTO SO FRANCISCOCENTRAL
MATA
Neste grfico, a regio Central a mais expressiva na verificao do crescimento do
crime no estado com uma taxa bruta por 100.000 habitantes correspondente a 20,61 no ano de 2000. Alm disso, o crescimento se d prioritariamente em reas de maior densidade
populacional, como o caso da regio onde se situa a capital mineira, em que a populao ultrapassa os 500 mil habitantes, bem como o exemplo de Governador Valadares, no Vale do Rio Doce, conforme o grfico 2.5:
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32
GRFICO 2.5: TAXA DE HOMICDIOS DAS REGIES ADMINISTRATIVAS MINAS GERAIS 1986-2000
0,00
5,00
10,00
15,00
20,00
25,00
30,00
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
MDIO RIO GRANDEMDIO SO FRANCISCONORTE DE MINASSUDOESTEVALE DO RIO DOCEVALE DO RIO GRANDE
A regio do Vale do Rio Doce se destaca das demais conforme se observa por
possuir ao longo do perodo taxas bastante elevadas, chegando ao final de 2000 aos 20,43 (taxa bruta por 100.000 habitantes).
2.1.2 Regies com taxas descendentes de homicdios
As regies declinantes relativamente ao crime estudado compreendem: Alto Rio das Velhas, Alto Rio Grande, Alto Rio Pardo, Baixo Sapuca, Noroeste, Vale do Ao, Vale do Paranaba, Vale do Rio Piranga e Vale do Rio Pomba, sendo qus destas, a que
apresenta a menor o Alto Rio Pardo (2,56) e a maior, o Noroeste (12,17).
-
33
Tambm para efeitos de melhor visualizao e compreenso a seguir estas
localidades vm apresentadas sob forma grfica:
GRFICO 2.6: TAXA DE HOMICDIOS DE REGIES ADMINISTRATIVAS MINAS GERAIS 1986-2000
0,00
5,00
10,00
15,00
20,00
25,00
30,00
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
ALTO RIO DAS VELHASALTO RIO GRANDEALTO RIO PARDOBAIXO SAPUCANOROESTE
-
34
GRFICO 2.7: TAXA DE HOMICDIOS DE REGIES ADMINISTRATIVAS MINAS GERAIS 1986-2000
0,00
5,00
10,00
15,00
20,00
25,00
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
VALE DO AOVALE DO PARANABAVALE DO RIO PIRANGAVALE DO RIO POMBA
Chama-se a ateno para o Vale do Paranaba, regio que abriga o municpio de Uberlndia, no Tringulo Mineiro. Em anos anteriores, a regio mostrava tendncia de
crescimento, mas atualmente vem sofrendo uma queda, a despeito de possuir uma densidade populacional semelhante de municpios da regio Central.
O caso do Vale do Ao certamente o mais representativo dos acima exposto e evidencia o forte declnio sofrido pela regio ao longo de todo o perodo, com apenas
uma ressalva para o ano 2000 que apresenta certa tendncia ascendente, culminando com uma taxa bruta por 100.000 habitantes de 10,44.
-
35
2.1.3 Regies com taxas relativamente estabilizadas de homicdios
Das 25 regies administrativas do estado apenas 5 apresentaram tendncia aparente estabilidade, quais sejam: Campo das Vertentes, Vale do Jequitinhonha, Vale do Mucuri, Vale do Sapuca e Vertente do Caparo.
Considera-se o efeito de aparente estabilidade dada a percepo de que ao longo do perodo analisado tais localidades revelaram fortes oscilaes em suas taxas de
homicdios, o que no permite definir com exatido qual seria a tendncia de movimento em cada rea.
Semelhantemente s demais regies administrativas o grfico seguinte revela o movimento das taxas ao longo dos anos de 1986 a 2000. Para o ano de 2000 a taxa mais alta foi a do Vale do Mucuri (17,03) com uma tendncia decrescente verificada desde o ano de 1998, porm a localidade extremamente instvel, chegando a patamares muito dspares como no ano de 1988 (22,47) e 1997 (14,04).
O Vale do Jequitinhonha tambm bastante peculiar em seus movimentos. Da
mesma forma que na regio anterior, esta j registrou no ano de 1986 uma taxa de 15,44 e em 1997, apenas 11 anos depois o correspondente a 9,18, patamar que em 2000 alcana os 12,47.
Ainda assim, Vale do Jequitinhonha, Vale do Mucuri e Vertente do Caparo,
revelam taxas muito superiores as duas outras localidades, conforme visualizado no grfico a seguir:
-
36
GRFICO 2.7: TAXA DE HOMICDIOS DE REGIES ADMINISTRATIVAS MINAS GERAIS 1986-2000
0,00
5,00
10,00
15,00
20,00
25,00
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
CAMPO DAS VERTENTESVALE DO JEQUITINHONHAVALE DO MUCURIVALE DO SAPUCAVERTENTE DO CAPARA
-
37
2.2 Anlise dos homicdios no estado de Minas Gerais por municpios
Finda a anlise regional preciso elucidar que cada regio possui suas
especificidades em virtude de municpios que mais se sobressaem, determinando que tipos de movimentos sero resultantes para a regio se considerado o desempenho de cada uma isoladamente.
Assim, retomando a classificao anteriormente feita em que se subdividia o
estado segundo as regies de tendncia ao aumento, declnio ou estabilidade relativa dos homicdios, proceder-se- na anlise dos municpios mais relevantes que caracterizem
tais movimentos.
Com efeito, para as regies nas quais se averiguou um movimento de ascendncia os municpios de maior expresso so os mais urbanizados e populosos. A RMBH sem dvida alguma a que mais contribui, e portanto determinante direta, para
o crescimento das taxas na regio Central. o que mostra o grfico 2.9 para a capital mineira, que chegou, somente no ano 2000, a registrar uma taxa de 24,99:
-
38
GRFICO 2.9: TAXA DE HOMICDIOS POR 100.000 HABITANTES BELO HORIZONTE 1986-2000
0,00
5,00
10,00
15,00
20,00
25,00
30,00
1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000
Ano
Tx de
Ho
mic
dio
s po
r 10
0.00
0 ha
bita
nte
s
No s Belo Horizonte define o Movimento, mas os demais municpios que compem a RMBH, como Contagem, Ribeiro das Neves, Vespasiano, Santa Luzia, Betim, etc.
Igualmente se faz necessrio demonstrar movimento parecido nas regies do Vale do Rio Grande e Vale do Rio Doce, onde se localizam, respectivamente, os municpios de Frutal, com uma taxa que alcanou os 24,22 e Governador Valadares, com a alarmante taxa de 31,79:
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39
GRFICO 2.9: TAXA DE HOMICDIOS POR 100.000 HABITANTES BELO HORIZONTE 1986-2000
Governador Valadares
Com relao s regies com tendncia declinante s Taxas de homicdios o maior destaque certamente o Vale do Ao que at o ano de 1999 sofreu queda intensa nas taxas, chegando a registrar neste mesmo ano 5,21 para o municpio de Coronel Fabriciano, cujo movimento semelhante tambm percebido nos municpios de Ipatinga e Itabira, o primeiro com densidade populacional significativa.
-
40
GRFICO 2.10: TAXA DE HOMICDIOS POR 100.000 HABITANTES BELO HORIZONTE 1986-2000
0,00
5,00
10,00
15,00
20,00
25,00
30,00
35,00
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
Coronel Fabriciano
Curiosamente o Vale do Paranaba tambm merece destaque. Embora localizado
numa regio de tendncia ascendente para as taxas de homicdios, esta localidade do Tringulo Mineiro vem apresentando queda. O municpio de Ituiutaba um exemplo: no ano de 1999 registrou uma taxa bruta de 12,15 homicdios por 100 mil habitantes. Um ano depois, em 2000, o mesmo municpio apresenta o valor de 5,63 para a mesma taxa. Um declnio equivalente a mais de 100%, como sugerido no grfico 2.11:
-
41
GRFICO 2.11: TAXA DE HOMICDIOS POR 100.000 HABITANTES BELO HORIZONTE 1986-2000
0,00
2,00
4,00
6,00
8,00
10,00
12,00
14,00
16,00
18,00
1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000
Ituiutaba
As taxas relativamente estabilizadas seguem o mesmo raciocnio, segundo o qual os municpios por ela compostos refletem os movimentos da regio como um todo. o caso do municpio de Tefilo Otoni, com taxas que j oscilaram entre 21,60, em 1993 at 9,49 em 1995, num movimento quase que constante de declnio e aumento, de acordo com as observaes do grfico 2.12:
-
42
GRFICO 2.12: TAXA DE HOMICDIOS POR 100.000 HABITANTES BELO HORIZONTE 1986-2000
0,00
5,00
10,00
15,00
20,00
25,00
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
Tefilo Otoni
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43
CAPTULO 3 CONTEXTUALIZAO DOS HOMICDIOS
Precedendo a anlise em que se averiguar a construo dos homicdios se faz necessrio contextualizar os mesmos, tanto sob o ponto de vista que se refere aos perfis de
autor e vtima destes crimes quanto ao prprio contexto situacional no qual ambos se inserem. Tudo isso para que seja possvel identificar particularidades e regularidades dos homicdios verificadas em funo destes agentes envolvidos, bem como dos contextos acima referidos e assim embasar a discusso acerca da construo propriamente dita destes crimes no e pelo Sistema de Justia Criminal.
Tal contextualizao, h que se observar, foi realizada com base em visitas ao Frum
Lafayette em Belo Horizonte no 1o Tribunal do Jri, onde se procedeu ao estudo de 10 (dez) processos judiciais para conseqente formao dos perfis mencionados.
3.1 Perfil do autor
Da totalidade dos processos analisados verificou-se que, entre os dez homicdios
estudados, apenas dois foram perpetrados por mulheres, sendo que os outros oito restantes so de autoria de homens morenos12 (conforme qualificado nos autos), ou seja, em 80% dos casos os autores de homicdios foram perpetrados por pessoas do sexo masculino e embora a
amostra para a pesquisa tenha sido extremamente pequena e possa estar sujeita margens de erros, possivelmente retrata a realidade pelo perfil aqui gerado pois em dados verificados por
outros pesquisadores, conforme abordado anteriormente, chegou-se a propores semelhantes.
12 Entenda-se tal referncia como aludindo populao negra.
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44
Alm da diferenciao entre sexos corroborada acima, verificou-se tambm entre os
homicdios analisados que o estado civil correspondente maior parte dos autores o de solteiro (em oito dos dez processos analisados) e que as faixas etrias variaram entre 24, para o autor mais jovem, e 40 anos para o mais velho. Esta constatao difere da retratada no primeiro captulo por diversos estudiosos do assunto, pela qual concluiu-se que a maior parte dos agentes ativos dos homicdios, ou seja, os que cometem o crime, situam-se, de forma equivalente ao caso das vtimas, em faixas etrias inferiores s ento apuradas.
Em apenas trs casos os autores se encontravam desempregados, sendo que dos efetivamente ocupados a maior renda mensal verificada foi de R$ 500,00 constituindo-se uma exceo, pois preciso esclarecer que 90% dos autores possuem renda inferior a R$ 250,00 sendo o rendimento responsvel por sustentar cerca de 4 pessoas que deles dependam economicamente, do que se depreende que a maior parte dos homicdios ocorridos na RMBH praticada por populaes de baixa renda, considerando-se a amostra pesquisada como
representativa. Isso tomado em funo, inclusive, da verificao das condies de moradia (barracos situados em morros, sem rede de saneamento pblico adequada, etc) relatadas nos processos em que se somam o nmero de dependentes que da renda do autor fazem uso para sobreviver.
Neste sentido torna-se importante a apresentao de outro elemento, qual seja o nmero de filhos haja vista o fato de poder ser usado como atenuante na aplicao da pena, caso seja condenado o autor. Em 80% dos casos, mesmo no estando casados, os autores possuem filhos em nmero que varia de 1 a 6 por autor.
Os locais de residncia, bem como aqueles nos quais o crime foi efetivado, esto situados em regies perifricas da RMBH de maneira que 60% dessas localidades compreendem as favelas da capital. Alm disso, em 30% dos casos os delitos se consumaram
dentro da prpria residncia dos autores. A quase totalidade dos homicidas no conseguiu concluir sequer o primeiro grau, com
exceo de apenas um caso em que a autora chegou a concluir o segundo grau. Dos que freqentaram escolas 60% so capazes de ler e escrever normalmente e 40% escrevem somente o prprio nome, porm lem com dificuldade. H somente um caso de analfabetismo.
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45
No tocante s profisses essas so bastante variadas compreendendo comerciantes,
vendedores ambulantes, pedreiros, carpinteiros, porteiros e vigias noturnos. Em 70% dos casos o autor afirmou fazer uso de bebidas alcolicas, sendo que em
aproximadamente 43% deles o prprio indivduo afirma ingerir este tipo de bebidas freqentemente, tendo-as por vcios, isto , podem ser caracterizados como alcolatras. Em todos os sete casos os autores admitiram a possibilidade de ficarem agressivos quando do uso de tais substncias.
H ainda os que fumam e os que jogam, correspondendo respectivamente a 10% dos casos cada um, porm sem maiores implicaes aparentes para o desenrolar do processo no
que concerne sua absolvio ou condenao. Em se tratando do envolvimento com substncias entorpecentes em apenas 20% dos
casos foi observada a presena, sendo que de acordo com relatos dos prprios autores o uso de substncias como maconha, ento classificada pela OMS (Organizao Mundial da Sade) enquanto entorpecente, destinou-se apenas a consumo prprio. Em nenhum caso, entretanto, a utilizao da droga esteve diretamente ligada ao homicdio, sendo apresentada como
substncia de eventual consumo, o que no foi qualificado sequer como vcio. Por fim, um dos aspectos mais marcantes na descrio do perfil dos homicidas: o fato de
que em 50% dos casos analisados o homicdio foi cometido com o uso de armas de fogo que pertenciam aos autores, porm no continham registros. Essa afirmao confirma tambm os
estudos anteriores realizados acerca da descrio dos perfis de autores e vtimas que matam e morrem, respectivamente, em funo de disparos com armas de fogo e, segundo estas
pesquisas, h uma tendncia crescente de que tais instrumentos estejam cada vez mais sendo utilizados nessas categorias de crime.
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46
3.2 Perfil da vtima
Semelhantemente ao que ocorre com autores de homicdios, as vtimas preferenciais
deste tipo de crime, segundo a anlise dos processos, so os homens morenos. Eles correspondem nesta anlise 100% dos casos, isto , em todos os processos as vtimas foram homens e homens solteiros sendo que 30% dos mesmos possuam filhos,estando dois destes (20%) amasiados.
As faixas etrias destas vtimas variam de 16 a 29 anos, o primeiro correspondendo vtima mais jovem e o segundo mais velha. A nica exceo constitui-se do caso de um detetive assassinado, cuja idade corresponde a 34 anos. Infere-se, por conseguinte, que as vtimas de homicdios na RMBH so essencialmente jovens confirmando as pesquisas de estudiosos no assunto relatadas em momento inicial do texto.
Em que pese a situao econmica, constatou-se que 20% das vtimas estavam
desempregadas ou fazem bico quando esses surgem. Os 80% restantes estavam empregados informalmente (camels e serventes) e formalmente em funes as mais diversas possveis: vigilante, balconista, comerciante e detetive. Suas condies scio-econmicas no diferem, contudo, das apresentadas para o caso dos autores do crime, podendo ser caracterizadas, dessa maneira, como sendo precrias.
Os locais de residncia situam-se em reas perifricas, em conformidade com os
verificados para os autores do delito. As mesmas propores foram encontradas: 60% das localidades constituindo-se das favelas e destas, 30% como ambientes em que o homicdio
consumou-se.
Em apenas dois casos foi possvel identificar o grau de escolaridade das vtimas, sendo que estas possuam o primeiro grau incompleto. Nos relatrios produzidos no decorrer do
processo pelas polcias militar e civil, bem como nas instncias judicirias por que passaram as vtimas somente configura a informao de que lem e escrevem.
Os que bebem constituem 20% dos casos analisados e foram apresentados nos processos de maneira a se inferir que pudessem ser qualificados como alcolatras, sendo que em um destes casos a ingesto de bebidas alcolicas esteve diretamente ligada prtica do homicdio.
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H um caso em que se apresentou a vtima como uma pessoa que tinha por vcio roubar
e outros dois casos em que se caracterizou o uso de cigarros como vcio. O envolvimento com substncias entorpecentes esteve presente em 5 dos dez casos
estudados de modo que em 3 casos a vtima era apenas usurio da substncia e nos outros dois, alm de utilizar-se da mesma tambm traficava. Em nenhum homicdio, porm, estabeleceu-se uma relao de causa-efeito direta sobre o crime pelo uso ou trfico de drogas.
3.3 Contexto situacional
Traados os perfis de autor e vtimas de homicdios resta ainda caracterizar o contexto no qual ocorreram em virtude de ser o mesmo de extrema importncia para a compreenso de
como e por qu tais crimes so construdos. A idia de contexto situacional para anlise da criminalidade, em especial para os
homicdios, remonta aos estudos de vrios autores, dentre eles Cantor & Land (1985) que acreditam existir condies mnimas necessrias para que um ato criminoso ocorra, de maneira que h elementos no crime que independem do delinqente como as situaes, os alvos e as vtimas. Da mesma forma, estudos de Silva (2001) demonstram que:
Em Belo Horizonte pode-se verificar que, a partir das 19 horas, ocorre um incremento na incidncia dos homicdios at o cair da madrugada, por volta das duas horas da manh. Nesses horrios vtimas tornam-se alvos mais fceis; passamos a viver situaes que propiciam uma maior ocorrncia deste tipo de delito. As interaes do-se em um ambiente onde, na maioria das vezes o uso do lcool est sendo feito pelas pessoas, os bares e ambientes semelhantes so altamente freqentados (Silva, 2001)
Isto se evidencia claramente nos processos analisados pois em sete deles as mortes ocorreram no perodo da noite: uma s 20 horas, aproximadamente, e as outras seis no
perodo da madrugada.
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Os bares respondem por 40% dos locais em que se desenrolaram os homicdios; as ruas
foram responsveis por 30% dos casos e os outros 30% se deram nas prprias residncias onde moravam autores e vtimas conjuntamente.
Uma caracterstica notvel dos crimes contra a pessoa revelada nos processos reside, contudo, no fato de que em 90% dos casos autor e vtima se conheciam e mais ainda, dos nove casos em que tal foi observado, os envolvidos possuam relao harmoniosa, sendo que alguns eram tidos por amigos. Somente em dois caso, autor e vtima viviam na mesma casa e
tinham problemas de relacionamento. Por fim e sem a menor sombra de dvida a circunstncia que mais propiciou a
consumao do homicdio, em 50% dos casos, foi a utilizao de armas de fogo, como j dito anteriormente, em que chama a ateno o fato de que as vtimas morreram instantaneamente aps os disparos. Os outros 50% ficam a cargo de facadas e marretas, sendo possvel, em alguns casos a chegada das vtimas aos hospitais para os quais foram encaminhadas ainda
com vida.
3.4 Regularidades e particularidades dos homicdios
Tanto no que se refere a autores, vtimas e/ou contextos pode-se observar certas regularidades e particularidades na ocorrncia dos homicdios que sero abordadas,
subdividindo-as em dois grupos:
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3.4.1 Regularidades e particularidades para vtimas e autores
As constataes anteriores revelaram uma regularidade no perfil de quem comete
homicdios: so prioritariamente homens, em sua maior parte solteiros, com baixos rendimento econmico e escolaridade, bem como residentes de reas perifricas situadas na RMBH, as quais so melhor conhecidas pelo nome de aglomerados ou mais comumente favelas.
Semelhantemente, as vtimas destes crimes obedecem tambm a um padro sob o qual possvel traar simetrias: constituem-se de pessoas do sexo masculino, solteiros, com um
nvel muito baixo de instruo ou quase nenhum, tambm residentes em reas perifricas da regio em estudo. Em ambos os casos h que se ressaltar (pela prpria observao de fotos inseridas nos inquritos policiais bem como pela descrio apresentada nos mesmos) que as condies de moradia e conseqentemente scio-econmicas so bastante precrias.
Some-se a isso tudo o evidente processo de desagregao familiar por que passam vrias famlias atualmente, inclusive as acima citadas, em que se verificou determinado caso
cuja me de um dos autores do crime declarou trabalhar durante todo o dia e portanto no teve tempo de criar o filho no podendo testemunhar contra ou a favor do mesmo j que no sabia de seu paradeiro. Isso revela uma ausncia de vigilncia informal. Da depreender-se destas caractersticas que sejam potencializadoras de situaes que resultam em mortes violentas uma vez que a falta de controle social acaba por induzir uma cultura desviante num ambiente j tambm degradado. Resumindo: onde h baixa interao social h forte propenso ao cometimento de crimes violentos o que no se aplica somente aos homicdios. Em outras palavras corresponderia a afirmar que a falta de proteo social, de um Estado que assista esse tipo de populao induz ao crime de homicdio.
As particularidades relativas s observaes feitas sobre o perfil traado para ambos os envolvidos tende a enfatizar a variedade na idade dos autores que cometem tal crime, pois
ainda que a explicao das baixas interaes sociais acima citadas possam responder a essa questo, a varincia constatada destoa do concludo por diversos pesquisadores do tema, em que os autores de homicdios situam-se numa faixa etria inferior depreendida nos autos.
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50
Isso d margem possibilidade de que os homicdios possam, sim, estar ligados a
determinantes tambm culturais.
3.4.2 Regularidades e particularidades para o contexto situacional
No que concerne ao contexto as principais regularidades observadas foram: autores e vtimas j mantinham, na maioria dos casos relacionamentos anteriores, sendo portanto pessoas conhecidas; as mortes ocorreram prioritariamente no perodo inicial da noite e madrugada em bares e nas ruas (70% dos casos); e com a utilizao de armas de fogo em 50% dos casos.
Esta padronizao explicitada na anlise dos autos permite que se faa algumas
inferncias acerca do que est por trs deste contexto e, para tanto, retomar-se- neste momento a teoria das oportunidades de Cantor e Land (1985) no sentido de fornecer uma explicao social que esteja incitando esta categoria de criminalidade.
A teoria mencionada considera o crime no sob o ponto de vista motivacional, mas sim das oportunidades para efetivao do ato criminoso, bastando para tanto que haja trs elementos: a) os ofensores motivados; b) alvos disponveis (indivduos ou propriedades); c) ausncia de proteo efetiva dos alvos. Assim, a pessoa que supostamente decidisse praticar o crime o faria por meio de uma escolha racional, baseando-se numa relao de custo-benefcio,
de maneira que, uma vez optando pela convenincia de se cometer o crime, o mesmo s poderia no ocorrer caso um dos elementos fosse retirado.
Ora, essas observaes, tambm compartilhadas por Cohen & Felson (1979) mostram que caractersticas como local de residncia dos ofensores e das vtimas (becos de favelas), relacionamento entre atores e vtimas (passando de amigvel a hostil), local de contato (geralmente bares ou mesmo a rua) e idade das vtimas (maior parte composta de jovens), tudo isso se relaciona ao cometimento dos crimes
Aplicando-se ainda mais a teoria aos casos estudados, o que se infere : a) a maior atividade criminosa ocorreu em perodo noturno sendo bem sucedida porque no havia a
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51
presena dos ofensores (tomados no somente por policiais, mas as prprias comunidades locais); b) os alvos estavam disponveis na medida em que mesmo havendo interveno de terceiros eles durante a noite pouco interfeririam no conflito, principalmente se considerado o
uso de amas de fogo no delito; e c) havia motivao do agente autor em todos os casos, mesmo que por motivos diferentes e individualizados.
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CAPTULO 4 CONSTRUES DE REPRESENTAES PELO SISTEMA DE JUSTIA CRIMINAL
Homicdios so crimes especialmente importantes no s pela caracterstica de atentar
contra a vida violentamente, mas principalmente devido ao fato deste tipo de violncia letal estar aumentando significativamente.
Este tipo de crime j predominou no Brasil na dcada de 30, quando da imigrao ocorrida no pas, conforme constataes de Fausto (1984), contudo a lgica inverteu-se e no perodo que se seguiu ps-30 at meados da dcada de 80, a maior incidncia criminolgica passou a ser de crimes contra o patrimnio. Somente agora, pelo aumento das taxas de
vitimizao e mortalidade, que se percebe a categoria de homicdios retornando ao rol dos crimes violentos que ocupam posio de destaque.
A grande questo levantada ento, feita esta constatao, : por que essa situao vem ocorrendo? Que espcie de motivao poderia ser usada para explicar a incidncia cada vez maior desses crimes? Em outras palavras, qual seria a lgica de ocorrncia dos homicdios hoje?
Esta parece ser uma pergunta de difcil resposta, pois, at ento, vinculou-se a ocorrncia de homicdios, de acordo com estudos de Fausto (1984) e Batitucci (2002), a questes de honra, ao efeito de bebidas alcolicas, deficincia de carter ou a disputas tradicionais com forte determinao cultural. Entretanto, essas mesmas questes parecem estar sendo insuficientes, na atualidade, para esclarecer a situao e esto dando margem ao
surgimento de uma nova resposta: o crime organizado, que vem sendo usado para explicar a ocorrncia e conseqente crescimento do nmero de homicdios.
Mas, em que medida essa explicao vem sendo utilizada pelas organizaes policiais para se abster da responsabilidade de investigar a materialidade dos crimes de homicdio cometidos, considerando-se para efeitos dessa pesquisa que esta categoria de crimes violentos construda dentro e pelo Sistema de Justia Criminal?
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53
Se considerarmos a dimenso de crise por que vm passando as organizaes policiais
brasileiras, desde o nvel operacional, passando pelo aspecto doutrinrio e envolvendo a questo da identidade, at possvel compreender essa associao (homicdios - crime organizado). Pressionados pela necessidade de cumprir seu dever de proteger a sociedade, as organizaes policiais acabam por construir a representao social responsvel pela justificao do tipo de crime aqui citado.
Neste sentido, importante observar que:
Mesmo se nos ativermos ao plano do consciente, convm lembrar que os autos no constituem um documento norteado pela busca da verdade, pelo contrrio, como disse Mariza Corra, constituem a pulverizao do fato originrio, por iniciativa do aparelho policial-judicirio e dos envolvidos, tendo como objetivo o enquadramento positivo ou negativo dos personagens em identidades sociais idealizadas. (Fausto, 1984)
A pulverizao a que se refere Fausto na citao acima j foi, inclusive, constatada em estudos recentes de outros crimes violentos, como os crimes sexuais. Estes merecem ser aqui abordados pela semelhana de tratamento que recebem por parte da polcia se comparados aos casos de homicdio.
Vargas (2000), pesquisando a respeito da construo destes chamados crimes sexuais, instada na Delegacia de Defesa da Mulher de Campinas, constatou atravs das observaes das atividades dirias das policiais e das conversas informais com os funcionrios, que so
as referncias a conhecimentos do senso comum que conferem sentido e continuidade s interaes, bem como so esses mesmos conhecimentos que oferecem os esquemas de interpretao utilizados pelas polcias para identificar e categorizar objetos, indivduos e comportamentos.
Tal qual os crimes sexuais so os crimes contra a pessoa no aspecto de construo acima referido. Os fatos so criados de maneira a conformar-se a um modelo do que um fato deva ser, concluindo-se da que esto sujeitos a negociao constante, imposio e manipulao de significados, alm de serem privados do sentido que lhes foi conferido inicialmente. O problema desse processo que o suposto autor do homicdio pode perder, ao
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54
longo de sua culpabilizao as prerrogativas de ser reconhecido como sujeito de direito (Vargas, 2000).
Ainda em relao a esse processo de construo dos homicdios, afirma Mariza Corra:
A morte de uma pessoa pela outra imediatamente despojada de seu peso concreto, espesso, da espessura que possui sua esfera de ao e transformada numa parbola, numa fbula, onde esto contidas todas as mortes possveis de acontecer neste mundo para o qual se volta a viso jurdica, uma viso que ordena a realidade de acordo com as normas legais (escritas) preestabelecidas, mas tambm de acordo com normas sociais (no escritas) que sero debatidas perante o grupo julgador. (Corra, 1983).
Assim, quando se quebra a norma do no matar torna-se mais ntida a separao entre os que detm o poder e os que a ele se submetem, ao mesmo tempo em que o concreto perde
espao para os atores jurdicos que promovero o debate acerca do que consideram como real naquela situao de crime praticado e desse real, processado, que resultar o modelo de culpa e o seu correspondente modelo de inocncia, ou seja:
O objetivo dos julgamentos, (...), no a elucidao dos determinantes contextuais e sociais da quebra das normas. O desdobrar dos processos deixa claro que o que est em questo a defesa de um sistema de normas visto tanto como universal, quanto como absoluto. Da mesma forma, como supostamente todos so iguais perante a lei um dos mecanismos ideolgicos que obscurece o fato de que na sociedade de classes de fato alguns so mais iguais do que outros a lei se aplica igualmente a todos. Conseqentemente, a quebra da lei em um certo nvel, a agresso ou o homicdio, ser julgada conforme o grau de adequao da conduta prvia dos acusados e das vtimas moral estabelecida. (Stolke & Corra, 1983).
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Em suma: os crimes de homicdios so representaes construdas por todo o Sistema
de Justia Criminal com a finalidade de oferecer uma resposta social num contexto de crise policial e de segurana pblica.
O objetivo deste captulo corroborar esta afirmativa, fornecendo atravs da anlise do comportamento do fluxo do mesmo sistema (para crimes contra a pessoa) o subsdio para tal. Sero enfatizadas as representaes construdas por cada ator inserido no processo judicial, desde o autor do crime, passando pelas polcias militar e civil, Ministrio Pblico e Defensor,
at chegar ltima instncia de julgamento, qual seja o Juiz, na sentena final. Inicialmente, portanto, faz-se necessrio esclarecer o que so os processos judiciais, de
onde as informaes para confirmar o dito acima sero tiradas. Os chamados autos configuram em sua essncia o fluxo de um crime atravs do Sistema de Justia Criminal, que pode ser subdividido em cinco momentos, de acordo com estudos de Ribeiro (2002), conforme evidenciado no esquema abaixo:
FLUXO DO SISTEMA DE JUSTIA CRIMINAL
Arquivo
Arquivo Polcia civil
Ministrio Pblico
DEFESA Processo Judicirio
condenao absolvio
Boletim de ocorrncia
Inqurito
Denncia
sentena
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O primeiro momento, do denominado Boletim de Ocorrncia (BO), inaugura a fase policial do processo e consiste no registro da queixa feito por um policial militar com base em relatos das testemunhas sobre o acontecido no local do crime (se este existir). Uma vez verificado que no houve crime o BO arquivado, mas se o mesmo for detectado procede-se abertura do inqurito.
Uma vez iniciado o inqurito (segundo momento), cuja responsabilidade fica a cargo da polcia civil, h uma tentativa de reunio de todos os documentos, testemunhos e demais
provas aptas a formarem o suporte probatrio mnimo acerca da materialidade e autoria do delito (Ribeiro, 2002) de modo que o Ministrio Pblico (MP) possa oferecer a denncia.
O inqurito deve ser realizado em dez dias se o ru estiver preso ou em trinta na hiptese dele livrar-se solto, quando ento, com base num relatrio elaborado pelos detetives que contenha os exames de corpo delito direto (com vestgios) e indireto (sem vestgios), h o fechamento do inqurito e seu conseqente encaminhamento ao Juiz, que abre novo prazo de
10 (ru preso) ou trinta dias (ru solto) para que o MP manifeste ou no a denncia. O MP, de posse do inqurito, pode arquiv-lo, pedir novas diligncias autoridade
policial por no haver suporte probatrio mnimo ao oferecimento de denncia ou, ainda, oferecer a denncia no prazo de cinco dias do recebimento do inqurito (ru preso) ou 15 dias, quando o ru livrar-se solto (terceiro momento).
Feito isso, a denncia encaminhada ao Juiz que pode aceit-la ou recus-la. Uma vez
aceita, h um prazo de dez dias para que o ru seja interrogado e trs dias, aps este fato, para que o mesmo ou seu defensor (pblico ou particular) apresente defesa prvia (quarto momento). Por outro lado, o juiz pode tambm entender que no houve crime e recusar a denncia.
O prximo passo consiste, portanto, no interrogatrio do ru, cujo comparecimento para tal pode ser espontneo (quando preso) ou pela intimao. Quando o acusado no comparece, nem mesmo quando for citado por edital, o processo suspenso, podendo o juiz determinar a produo antecipada das provas, bem como decretar a priso preventiva. Caso o acusado deixe de comparecer por qualquer motivo e no justifique, o processo segue sem sua presena.
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Seguindo-se h a inquirio das testemunhas pelo juiz, que somadas s alegaes finais do Ministrio Pblico e do defensor, incorrero na pronncia (ou no) do acusado. Uma vez pronunciado, o processo segue para o tribunal do Jri, onde haver a produo da defesa, por
parte do defensor, e o libelo-crime, por parte
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