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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANA
Faculdade de Cillncias Humanas, Letras e Artes
Curso de Pedagogia
A LEITURA, A ESCRITA E A REESCRITA SOB A OTICA DO
LETRAMENTO
CURITIBA
2003
LlSOLETE CARDOSO GOMES
A LEITURA, A ESCRITA E A REESCRITA SOB A GTICA DO
LETRAMENTO
Monografia apresentada como requisito parcial de conclusAo
do Curso de Pedagogia, dOl Faculdade de Ci6ncias Humanas.
Letras e Artes, da Universidade Tuiuti do Parana - UTP.
Orierrtadora: Mestra Maria Evanilda Tome Valenca.
CURITIBA
2003
UNTVERSIDADE TUlUTl DO PARANAFACULDADE DE CI~NCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
CURSO DE PEDAGOGIA
TERMO DE APROVACAo
NOME DOALUNO: LISOLETE CARDOSO GOMES
TiTULO: A LElTURA, A ESCRlTA E A REESCRlTA SOB A onCA DO
LETRAI\illNTO
TRAIIAI.HO Ill, 'ON 'I.USAO Ill' 'UR, 0 APllOVAIlO COMO RI'()lIISITO PARCIAl.
PAll..A 1\ OBTENt;:AO DO GRAD DE LICENCIAD EM PEDAGOGiA. Cl.fRSO DE
PEDAUOG!A DA fACULD}·.DE DE ClENCIAS HUM_A_NAS, LETKA-S E ARTES. DA
UNNERSIDADE TUlUTf DO PARANA.
MI'MllI{O~ IlA L'OMIS$A, AVALIAIlORA:
:~~~~::,~:";:
PROP,DlCLEJA!v~A SCHAffELj;llii;iiiKO Di\. BANCA
DATA: 30/01/2004.
MED1A:__ 9.'-'1",5',---
CURlTIBA· PARANA
AGRADECIMENTOS
Obrigado Senhor pela vida e pela oporlunidade de ampliar meus conhecimentos
e ascender como ser humano.Agradel,(D imensamente aos meus pais que, amigos e guias etemos,
incentivaram e auxiliaram nesta jornada repleta de alegrias e recheada de dificuldades.
Agraderyo as minhas filhas que, com toda compreensao e carinho, me
acompanharam e motivaram com seu sorriso e olhar calorosos.Agrade90, em especial, Ii querida amiga, Professora e Mestra Maria Evanilda
Tome Valen"" que contribuiu com todo 0 seu conhecimento. suas ideias e sua
dedicar;;aoe que sempre me apoiou em todos as momentos.E, finalmente, agrade90 aos colegas de curso que sempre tiveram uma palavra
de apoio e auxilio.Meu muito obrigada!
iii
"A educa9110 e um alo de amor e partanlo, um alo de coragem. Nao pode
lemer 0 debale, a aml/ise da realidade; nllo pade fugir da discussllo
criadora, sob pena de ser uma farsa .•
(Paulo Freire)
iv
SUMARIO
TERMO DE APROVAc;:Ao
AGRADECIMENTOS ...
EPIGRAFE ..
RESUMO ...
INTRODUc;:Ao ..
...........................................................ii
. iii
. iv
. vi
. 8
ALFABETIZAyAO OU LETRAMENTO: 0 QUE SE TEM PRATICADO NA ESCOLA? ........ 8
APROFUNDANDO CONCEITOS: ALFABETIZAc;:AO E LETRAMENTO 11
A LEITURA NA 6TICA DO LETRAMENTO 15
A PRODUc;:Ao ESC RITA NA 6TICA DO LETRAMENTO. . 18
A IMPORTANCIA DO TRABALHO DE REFACC;:AO NA PRODUc;:AO E NA ANALISELlNGOISTICA DOS TEXTOS ESCRITOS .. 21
APRENDENDO A LER E ESCREVER EM PRATICAS DE LETRAMENTO: UMAEXPERENCIA VIVIDA QUE DEVE SER CONTADA.. 23
SOBREA ATIVIDADE pRATICA EM SEU TODO.. . 23SOBRE os SUJEITOS E SOBRE 0 CONTEXTO ESCOLAR ONDE OCORREU A ATiVIDADE 24
SOBRE os PROCEDIMENTOS METODOL6GICOS E os RESULTADOS 24
CONSIDERAQOES A RESPEITO DA pRATICA ANALISADA . . 31
CONCLusAo. . 34
REFERENCIAS . ...... 35
ANEXOS .. ...................................................... 37
ANEXO 1 ..ANEX02 ..ANEXO 3 ..ANEXO 4.
. 38. 39
... ~....................................................... 42
RESUMO
A pr;itica essencial do "elaborar", ou seja, do "saber pensar" e do "aprender aaprender", tem sido uma exigencia cada vez mais cobrada dos sujeitos, no mundoatual. Em fun<;1!odessa nova necessidade, esta pesquisa monografica tem comoobjetivo analisar e renetir a respeito de como 0 trabalho com 0 ensino/aprendizagem dalingua materna ou estrangeira vem sendo desenvolvido na escola. Para tanto, eapresentada uma refiexilo que trata de duas abordagens do ler e do escrever: arespeito da alfabe/iza9~0 - proposta ja ha tempo conhecida e empregada nasinstituiy6es escolares, e a respeito do Jetramento - uma nova perspectiva do aprender.No caso especifico do trabalho com a lingua, a perspectiva do letramenta defende quea aprendizagem da leitura e da escrita deve superar 0 conceito de que 0 lar e sin~nimode decifrar/decodificar e de que 0 escrever significa codificar palavras e frases. Ler eescrever desse modo correspondea urn aprender alar e escrever apenas comoaquisi<;1!ode uma tecnologia (decodificar/codificar a lingua escrita). Muita mais do queessas a¢es, 0 mundo contempor~neo requer uma aprendizagem da lingua enquantoapropria<;1!o,ou seja, que alem do saber ler e escrever. e preciso que tambem se fa98uso competente e frequente da leitura e da escrita. Para aprofundar essa novaperspectiva do ler e do escrever, sao propostos tres t6picos especificos: dois deles,abordando sobre 0 ate de ler e 0 ate de escrever na otica do letramento, e um outro,tratando da refac<;1!oescrita. Apresenta-se, ainda. uma experillncia pratica deensino/aprendizagem da Lingua Portuguesa, a partir da perspectiva do letramento.
Patavras-chave: LETRAMENTO - LEITURA - ESCRITA - REFACCAO
vi
INTRODUc;Ao
Alfabetizac;lio ou letrarnento: 0 que se tern praticado na escola?
Primeiramente precisamos entender a abrangemcia dos termos "affabetizagtJo' e
"fetramento', na atual conjuntura da sociedade, para que fique clara a perspectiva sob a
qual pretendemos desenvolver este trabalho.
De acordo com Leda V. TFOUNf, 0 termo "alfabetizagao' tem sido conceituado
de duas formas: a) como 'processo de aquisigao individual de habilidades requeridas
para a leitura e a escrita"; ou b) como 'um processo de representa.,ao de objetos
diversos, de naturezas diferentes." (TFOUNI, 2000: 14). Essas duas formas de
conceber ou de considerar 0 sujeito alfabetizado ja nao correspondem as necessidades
do mundo contempor~neo, que passou a exigir outros efeitos do ate de ler e escrever.
Analisemos, primeiramente, 0 conceito que considera 0 "estar a/fabetizado", em a) -
como ato de adquirir individuafmente habifidades para a fer e a escrever. Tal conceito
nao responde as necessidades do mundo atual que, alem de uma maior capacita.,ao do
sujeito em seu desempenho, quando II! e escreve, carece de maior solidariedade.
Assim, as bases das competencias do futuro construir-se-ao de fata, macic;as e
eficazes, cada vez mais que saberes e saber-fazer evolutivos sejam adaptados a
civilizagao cognitiva. E esses saberes, de acordo com DELORS (1996), devem basear-
se em quatro pilares do conhecimento: aprender a conhecer, aprender a fazer,
aprender a viver juntos e aprender a ser. Logo, alem de adquirir conhecimentos e
instrumentos da com preen sao e agir sobre 0 maio que a envolv8, 0 ser humane
necessita aprender a participar, cooperar com as Qutros nas atividades humanas,
interagindo socialments. E, para isse, precisa aprender a ser, ou seja, ter as suas ideias
e seus valores, mas, principalmente, respeitar a opiniao dos outros, fazendo uma troca
de opini6es, e construindo novas ideias sem perder seu individual e sua personalidade.
Nesse sentido, 0 ate de alfabetizar por uma proposta de aquisi,ao individual do ler e do
escrever nao corresponde ao que se argumenta no relat6rio de DELORS para a
educagao do seculo XXI. Conforme aponta esse relat6rio, e indispensavel explorar a
nogao de "competimcia' como caracteristica de um novo perfil de ser humano, cujo
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resultado demonstra-se na combinayao de conhecimentos e habilidades como um
"coquetel individual' composto por: a) qualificayao adquirida pel a forma<;lio teenica e
profissional; b) comportamento social; c) aptidao para 0 trabalho em equipe; d)
capacidade de iniciativa; e) gosto pelo risco" (OELORS, 1998: 94). Assim, pela visao de
alfabetizayao como aquisiyao individual de habilidades da leitura e da escrita, a
preoeupayao da escola nao e com 0 letramento - pmtiea social - mas com um tipo de
pratica da alfabetizayao significando apenas um processo de aquisiyao de c6digos
(alfabetieo, numerico) coneebido em termos de competencia individual, necessaria
somente aD suceSSQ e promoyao na escola. Com issa, as praticas especfficas dealfabetiza<;lio da escola tem, talvez inconscientemente, disseminado a cultura de
elassifica<;lio dos sujeitos pela dicotomia a/fabetizado ou ntla-a/fabetizado. Esse modo
de entender 0 ato de alfabetizar representa "apenas urn tipo de pratica - de fato
dominante - que desenvolve alguns tipos de habilidades e nao outros, e que determina
uma forma de utilizar 0 conhecimento da escrita." (KLEIMAN, 1995: 19).
Do mesmo modo, se fizermos uma analise da citayao de TFOUNI (2000: 14), ja
comentada anteriormente, sobre a outra forma como a 'alfabetiza<;lio" tem sido
considerada - urn processo de representa,tlo de objetos diversos, de naturezas
diferentes - veremos que tal conceituayao esta relacionada aquilo que SOARES (1998:
39) denomina apenas como uma "tecnologia" do ler e do escrever. Ou seja, a mera
codificayao e decodificayao da lingua escrita. Assim, alfabetizado e aquele que
'aprende" a utilizar-se dos simbolos da escrita no cotidiano, nao compreendendo as
linhas e entrelinhas do contexte politico-s6cia-cultural e hist6rice. (SOARES, 2000: 01).
Ao contrario dessa forma de ver 0 ato de ler e escrever, 0 fenbmeno do
letramento vai alem do modo cemo as instituiq6es oficiais se encarregam de introduzir
formal mente os sujeitos no mundo da leitura e da escrita. Eo por isso que SOARES
(1998: 39) esforqa-se em chamar a aten9aO para a grande diferenqa que existe entre
os termos a/fabetiza,~o e letramento.
Como resposta ao questionamento apresentado nesta introdu<;lio - alfabetiza,tlo
ou letramento: 0 que se tern pratieado na escola? - podemos concluir que a forma
como, de modo geral, 0 direcionamento do processo de ensinolaprendizagem do ler e
10
do escrever tem sido incompleto (TFOUNI, 2000: 20), pois esta mais ligado a instru~o
formal, proporcionando apenas vivlmcia de um processo, pelo qual os sujeitos obtem
um c6digo de transcri9iio grafica de unidades sonoras. Ao contrario disso, a pratica
educativa escolar deve voltar-se para uma forma~o sedimentada na perspectiva do
letramento que envolve as -aspectos s6cio-historicos da aquisic;ao da escrita-, par uma
sociedade.
Por esse prisma, a lingua e vista como um sistema de representa9iio que evolui
historicamente e que e inerente as praticas sociais e culturais humanas. Logo, umaperspectiva de ensino/aprendizagem da Hngua, a luz do letramento, exige urn
conhecimento amplo da sociedade, de seus simbolos lingOisticos, de sua historia, seus
costumes e cren98s. S6 assim 0 aprendiz desenvolvera sua percep~o s6cio-politica-
hist6rica do mundo, a partir da qual conseguira falar, argumentar e escrever com
clareza e coerlmcia sobre qualquer tema.
E sobre as questoes do ler e do esaever no mundo atual, sobre as reflexoes dos
conceitos de "Ietramento" e "alfabetiza~o" e seus reflexos no ensino/aprendizagem dalingua que esta trabalho monogratico estara refJetindo. Esperamos que as reflex6esnele apresentadas possam contribuir para 0 crescimento da aprendizagem de
professores de lingua e, por conseqOencia, para um aprendizado mais efetivo de seus
alunos.
APROFUNDANDO CONCEITOS: ALFABETIZACAo E LETRAMENTO
A educayljo, desde sua epoca mais primitiva, nunca concebeu 0 aluno como
elemento essencial do processo pedag6gico. Esse era visto como tabua rasa, que
vinha a escola para aprender de forma igual a de todos, ou seja, deveria aprender os
mesmas conteudos da masma maneira, nao interessando a conhecimento tacitc do
educando, aquele trazido por ele a partir de suas experii'mcias. Atualmente, procura-se,
alem disso, que 0 fazer pedag6gico encare 0 aluno como sujeito do processo de
ensino/aprendizagem, respeitando as diferen"as de cada um. Essa valoriza<;;aoda
individualidade de cada sujeito aprendiz esta embasada em teorias cientificas, cujos
defensores comprovam a legitimidade das diferenc;.asindividuais. Dentre asses te6ricospodemos citar GARDNER (1993a), segundo 0 qual ha varios tipos de inteligencias e
cada indivfduo as manifesta de forma passeal, segundo sua forma de compreender eaprender os conhecimentos. Por isso, desenvolve com maior facilidade aquales
conhecimentos que se ajustam as areas em que esta mais apto, de acordo com suas
habilidades e capacidades proprias e que podem ser diferentes de outras pessoas.
Em funyao dessas novas descobertas, a escola obrigou-se a rever seus
canceitos a raspaito dos sujeitos aprendizes. No conjunto dessas novas reflexOes,como todas as demais areas, a area de Ungua Portuguesa tambem teve que S8
reformular. Assim, os profissionais da educac;ao envolvidos com 0 trabalho com a
linguagem, tomando como ponto de partida 0 sujeito aprendiz com suas diferen"as,
passaram a refletir sobre novas possibilidades de aprendizagem, novas caminhos
metodologicos, novas possibilidades de avaliayljo.
lodas essas refiexees foram apontando outros aspectos da formac;ao
educacional. Como refiete SOARES (1998), 0 surgimento de fatoslfenbmenos novas
fazem com que surjam tambem novas necessidades, em func;ao das novas carenciassociais, culturais, econcmicas e cognitivas apresentadas na realidade do mundo de
nossa apoca.
No caso da aprendizagem da lingua, percebeu-se que 0 aprender a tecnica de
manejar simbolos, ler e escrever, ser alfabetlzado tern se revelado insuficiente. HOje, epreciso ultrapassar essa simples aquisiyljo do c6digo, e necessario usar a leitura e a
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escrita no dia-a-dia, apropriar-se da fun9ao social destas praticas, e preciso letrar-se.
(SOARES, 199B). Ou seja, no mundo contemporlmeo, muito rna is que 0 dominic da
tecnologia do ler e do escrever, e fundamental compreender 0 que esta sendo dito,
interpretar, analisar, adequar 0 discurso ao contexte e, principal mente, fazer-se
entender de maneira clara e coesa.
Essa nova perspectiva do ler e do escrever fez com que 0 termo "alfabetiza9<io",
da forma como, de modo geral, estava sendo compreendido, nao mais correspondia as
necessidades do mundo atual. E, entao, urn termo que abrangia 0 significado do
fenomeno que estava ocorrendo no ensina do idioma aplicado de acordo com 0
contexte socio-politico-cultural surgiu - sendo este "Ietramento".
Logicamente, nao S9 trata de uma simples traca de terminologias, uma vez que
nao sao as tamlOS que promovem as mudam;as da sociedade, muito menos, na
forma9iio educacional. 0 que nao podemos nos esquecer e que as palavras nao sao
neutras; junto com elas estao implicitas as cren98s e valores, as formas de a9iio, os
conceitos formadores de opiniao. Desse modo, ao se prop~r a palavra "Ietramento", nao
S8 asta pretendendo apenas substituir urn termo par Dutro, mas, sim, criar urn novo
conceito que aborde as a¢es do ler e do escrever integradas as praticas sociais e
culturais da vida cotidiana.Se assim 0 e, 0 conceito de letramento que aqui se defende nao se refere aquele
ate entao abordado em dicionarios de portugues. Magda Soares cita, como exemplo, 0
conhecido diciomlrio Aurelio, onde os termos letrado e iletfado se encontram definidos
da seguinte forma: "LETRADO: versado em letras, erudito"; "ILETRADO: que nao tern
conhecimentos literarios". SOARES (199B: 32). Essa forma desfocada de a nossa
sociedade atual conceituar os termos acima, justifica 0 fato de 0 termo "Ietramento"
ainda nao estar dicionarizado em portugues. Por isso, fomos busca-Io da tradu9iio do
termo literacy - do ingles - que significa: "condi9iio de ser letrado." Do mesmo modo, 0
sentido de literate e: "educado; especificamente, que tern a habilidade de ler e escrever.
SOARES (1998: 35 e 36). A referida autora fornece-nos esclarecimentos a respeito da
palavra "Ietramento":
~\DAn~"\, '
Assim, se literate refere-se aquela pessoa que domina a leitura e a eScrita,
literacy "designa 0 estado ou condic;aodaquele que e literate, daquele que nao s6 sabe
ler e esc rever mas tambem faz uso competente e freqUente da leitura e da escrita.
(SOARES, 1998: 36, negrito nossa).
Logo, ler e escrever sob a perspectiva da alfabetizac;ao e diferente a do
letramento, pois estar e fazer uso competente da leitura e da escrita e envolver--secom
suas praticas e viver no estado ou condit;llo de quem sabe ler e escrever e pratica a
leitura e a escrita, compreendendo 0 que Ie e tala, analisando e concluindo suas ideias,
interpretando sua realidade e adequando seu discurso ao contexto em que vive.
Para que essa diferenciac;aofique clara e que se compreenda adequadamente 0
termo "Ietramento", SOARES defende a importancia de 58 ressaltar 0 sentido dos
termos estado ou condi,;jo. Segundo ela, pela perspectiva do letramento, "quem
aprende a ler e a escrever e passa a usar a leitura e a escrita, a envolver-se em
praticas de leitura e de escrita, torna-se uma pessoa diferente, adquire urn outro estado,
uma outra condit;llo. [...] muda a fugar social, seu modo de viver na sociedade, sua
insert;llo na cultura - sua relac;aocom as outros, com a contexto, com as bens culturais
e torna-se diferente: (1998: 36 e 37).
Assim, conclui-se que fetramento
l! 0 resultado da ac;Jode 1etrar-se", se dermos ao verba "Ietrar.,se" 0 sentido de8tomar-se letrado". Letramento l! 0 resultado da ayao de ensinar e aprender as
praticas sociais de leitura e escrtta. 0 ~ au ~ que adquire um grupoSOcial ou um individuo como consequ!ncia de ter-se apropriado da escrita e desuas praticas sociai$. (SOARES, 1999: 38 e 39).
Com base no exposto, fica claro que, pelo processa de letramento, tem--se 0
objetivo de diferenciar as estudos sobre a impacto da escrita na sociedade dos estudos
14
sobre a chamada alfabetiza<;:8o,no sentido de que leitura e escrita seiam orientadas
nao apenas pelo pracesso de escolariza9iio, mas tambem pela experiencia previa dos
uses da leitura e da escrita, exterior a escola. Alem disso, tais uscs do ler e do escreverdevem S8 constituir numa das formas de potencializar 0 cidadao para lidar com as
estruturas de poder da sociedade. E por isso que, segundo KLEIMAN, "nos estudos
sobre 0 letramento que se voltam para a transforma9iio social, ou seia, para praticas e
eventos culturais relacionados ao usa, fun~o e impacto da escrita na sociedade. Par
esse prisma, a palavra de ordem e "potencializar atraves do letramento' (1995: 8).
A LEITURA NA OTICA DO LETRAMENTO
Segundo CAGLIARI (1993:149). "a leitura e a realiza9iio do objetivo da escrita", e
como censeqOencia, a escrita e 0 objetivo da leitura e ler e uma atividade
extrema mente complexa que envolve problemas semanticos, culturais, ideol6gicos,filosofices, foneticcs. (CAGLIARI, 1993).
o ate de ler exige do leitor varias habilidades, dentre elas, a assimila~o do
conhecimento. sua interiorizayao e compreens~o,alem da apresentayao de opinioosproprias sobra 0 que leu. Assim teramos um leitor letrado. ou saja, que, a partir do texto
lido, interfere na leitura de acordo cem 0 seu mundo interior, seu cenhecimento tacito.
Em Qutras palavras, urn sujeito que faz usc da leitur8 de forma integrada as suas
pr6prias praticas socia is e culturais de tato vivenciadas. E nesse sentido que a leituradeve constituir-se em a~o produtora de sentidos por parte dos sujeitos, segundo suas
experi~ncias sociais e culturais exteriores a escola. Esse senti do atribufdo ao ato de tere confirmado por LAJOLO, 1982: 59), segundo a qual, ler, a partir do texto, "e ser capaz
de atribuir-Ihe significado, e conseguir relaciona-Io aos demais textos, reconhecendonele a leitura que 0 autor pretendia, entregando-se a leitura ou rebelando-se e
propondo uma nova ideia, sando dono da pr6pria vontade" (fala).
Como se percebe, pela 6tica do letramento, 0 ate de ler vai alem da
decifra~oldecedifica~o de simbolos e reconhecimento de informayOes. Logo, 0 leitor
parte da ideia do autor e reconstr6i 0 texto na sua leitura, sob a sua 6tica e a partir de
suas experiencias e conhecimentos. Isso ratifica-se 0 cenceito de SILVA (2000), 0 qual
defende que 0 ate de ler e a demonstra~o do quanto se cempreende 0 mundo, pois 0
leitor, diante do texto, transforma-Q e transforma-se. Essas praticas do ler exigem doleitor, segundo DEMO (1996), a necessaria centra-Ieitura que significa compreender a
proposta do texto na amplitude de sua argumenta~o, testar e contestar as cenceitos 18
apresentados, para, entao, ser capaz de escrever cem palavras prOprias. Segundo esse
autor, quando lemos, refletimos, cemparamos as teorias lidas cem os conhecimentos
previamente adquiridos e reestruturamos nossas ideias e conceitos.Tudo isso faz com que, alem da decedifica9iio do texto (primeiro centato cem 0
ler), atribua-se a uma leitura cempetente outras ayOes fundamentais: de detec<;iio das
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ideias implicitas no texto (compreender as entrelinhas e suas pressuposi96es), a
confronta"ao das ideias nele contidas com outros pontos de vista (intertextualidade), a
exlrapola<;ao das ideias do texto lido. dando um toque pessoal a interpreta"ao
(reelabora"ao do que 0 autor defende a partir de seus conhecimentos pessoais, como
leitor).
Assim, a ler n~opade ficar simplesmente no entender, assimilar passivamente 0
que e repassado. engolir 0 texto. Faz-se necessario compreender, interpretar. ir alem
do taxto e, principalmente, reescrever 0 taxto com SU8S pr6prias palavras, inserir seus
apontamentos, interligando-os as ideias lidas au ouvidas.Os argumentos em favor de uma leitura produtora de sentidos, rnarcada pelas
praticas sociais e culturais pr6prias de cada leitor, ja vem sendo apregoada ha algum
tempo. Sa observarmos as obras e autores aqui atadas, perceberemos que datam-se
na decada de 90, mas essas discussOes iniciaram bem antes, na decada de 80. Uma
das obras responsaveis pelo inicio desse debate foi livro "0 texto na sala de aula",
organizado par Joao Wanderley Geraldi, publicado pela editora Assoeste, em 1982.
Como se pode perceber, ja se passaram mais de 20 anos e, infelizmente, parece
que pouca coisa mudou em termos de resultados efetivos quanto a capacidade de
realmente ler. 1550 e comprovado pelo Sistema de testes de rendimento escolar, 0
PISA'. Conforme defende Claudio de Moura e Castro (VEJA, 2002), os resultados do
PISA mostram que nos brasileiros nao sabemos ler. nao aprendemos a ler
corretamente. Segundo ele, '0 PISA mostra que os alunos brasileiros oonseguem
apenas decifrar 0 texto e ter uma ideia geral sobre 0 que ele esta dizendo. Dai para a
frente empacam".(VEJA, 2002: 20). Argumenta CASTRO, que tal deficiencia de leitura e
resultado de urn ensina sistematicamente errado. Em Qutras palavras, a dificuldade em
ler nao asta relacionada apenas 80S atunos das camadas pobres da sociedade, pais,
segundo 0 PISA, as alunos do ensino privado. que tem os 'melhores" professores, nao
tem atua<;aomelhor que os das escolas publicas. Logo, a incapacidade de ler texlos
nao se deve apenas a pobreza, mas tambem (e, talvez, principalmente) a um erro
sistemioo, au seja, a uma deficiimcia na pr6pria forma<;aoescolar, seja ela publica ou
I Sistema orgl.nindo po!"pal~f:SmMlbWI dOl Orgzminc;:.lopari Cooperaqil\o e DeMn\fol"imefito ~n&nico (OCOE).
17
privada. Salienta CASTRO: "Lemos como poetas e nQocomo cientistas. Mas antes da
hora de ler poesia, apes 0 jantar, ha que ler contratos, cartas, bulas de remedios,
embalagens [...J. A revoluyao posslvel na competencia em leitura de nossa gente nos
permitira galgar outro patamar de desenvolvimento". (VEJA, 2002: 20).
Por fim, gostariamos de concluir que 0 texto e 0 lugar onde encontram-se autor e
leitor: logo, 0 trabalho da leitura deve caminhar de forma paralela e simultanea aprodu<;ljoescrita, porque unem-se 0 que se tem a dizer com as estrategias do dizer. Em
outras palavras. a leitura esta integrada ao processo de produ<;ljoescrita. pOis,no dizer
por escrito, estQo embutidas as interpreta<;oos: lendo a palavra do outro, que
contraposta a do leitor, podera levar a construyiio de novas maneiras do dizer. Alinal,
56 se produz bons textos a partir da pratica de leitura: e ela que fornece materia-prima
para a escrita (0 que escrever) e contribui para a constitui<;ljo de modelos (como
escrever).(GERALDI,1991).
A PRODUC;Ao ESCRITA NA OTICA DO LETRAMENTO
Escrever, de acerdo cem 0 diciomirio HOUAISS (2001:1210), significa
"representar par maio de caracteres au escrita; fazer tetras; narrar, descrever, contarpar maio da escrita; exercer 0 oficio de escritor". Mas, esse conceito de escrever
abrange 0 saber utilizar-se de caracteres, narrar, centar, descrever? E cemo pode ser
interpretada a expressao "exercer 0 oficio de escritor"? Apesar de sar passlvel
relacionar lal expressfio ao uso cempetente da escrita, ela, da forma em que esla
elaborada, pode ser interpretada apenas cemo 0 exercicio profissional de escritor
Assim, as sentidos apresentados ao que e escrever, no referido dicionario, parace estarmais voltado ao sentido de escrever em favor da perspectiva de alfabelizac;ao do que
de lelramento.
Do ponto de vista do letramento, escrever vai muito alem da tecnologia de
celocar lelras no papel: desse modo, implica a apropriac;ao da competencia escrita,
apropriar-se dela cemo competlmcia propria. GERALDI (1997) ha muito ja tem
defendido que a produc;aoescrta envolve saber a qutl, para que, para quem e como
escrever Afinal, no exercicio de escrita que envolve a autoria, a criac;ao, 0
sujeilo/escritor precisa saber articular tados esses pianos: do conteudo (0 que dizer) e
da expressfio (como dizer), da motivac;ao (para que dizer) e da perspectiva de seu(s)
interlocutor(es) (para quem dizer).
Segundo DEMO (1996: 1), "0 que nao se elabora nfio se muda". Nesse senlido,
e preciso ter em mente que a reflexao passa pelo trabalho elaborativo. No espas:o
profissional, por exemplo, logo que se relata por escrito uma ideia, 0 texto sera
submetido a outros profissionais para a analise. E no contexte escolar, onde 0 ensino
da lingua tem como objetivo desenvolver a habilidade de leitura e escrita no aluno
tomando-o urn leitor e urn escritor competente, infelizmente, isso nao ocorre. Aprendera escrever com compet~nciaexige leitura, pesquisa e compreensao do tema a sar
exposto e, para isso, e preciso dedicar-se ao assunto do qual se vai discutir e redigir;
logo, e necessario permitir ao aluno a busca de informa<;6essobre 0 tema, para que ele
tenha conhecimento sobre 0 assunto. Afirma DEMO (1996) que "Ier e escrever" e ainda
mais: escrever tambem e ler, porque 56 conseguimos compreender, analisar e tirar
19
conclus6es daquilo que conhecemos e escrevemos a respeito. Mas, na escola, a
professor propOea reda9<'§oe espera que a educando a fa9" e ponto final, sem ter feito
leitura previa au estudado a tema. Com isso, esquece que e por meio da escnta do
Qutro que, durante as pn:ilticas de produyao, cada aluno vai desenvolver seu estilo, suas
preferencias, tomando suas as palavras do outro (BACKTHIN, 1992). E, para aprender,
e preciso ultrapassar a mero olhar ao que esta escrito. Afinal, assimilar passivamente a
conteudo nao basta, porque a leitura inciui a desenvolvimento da competencia de
compreender que S8 constitui em: interpretar, refazer e reelaborar a que foi lido.(DEMO, 1996). Assim, nos tornamos competentes em qualquer assunto, pais, a
dominio da lingua e fundamental para a exercicio da cidadania, porque e atrav"'s do
usa competente da lingua que a homem se comunica, se expressa, defende seus
pontos de vista, obtem a informa9<'§oe produz novas conhecimentos.
Ai esta a nova proposta de ensino: ensinar para a vida e para 0 exercicio da
cidadania, conhecimento para ser utilizado ah"m dos muros escolares. Desse modo,
ratifica-se a conceito de texlo atribuido par GERALDI (1997:135): "e no texlo que a
lingua se revela em sua totalidade, quer enquanto conjunto de formas e de seu
reaparecimento, quer enquanto discurso que remete a uma relac;ao intersubjetiva
constituida no pr6pno processo de enunciac;ao marcada pela temporalidade e suas
dimensOes."Tudo isso quer dizer que a escrita deve ter significado para 0 educando, uma
necessidade intrinseca deve ser despertada nela, e a escrita deve sar incorporada a
uma tarefa necessaria e relevante para a sua vida. S6 assim, poderemos estar certos
de que a escrita representara, para ale, nao urn mera exercicio de maDS e dedas, mas
uma forma nova e complexa de linguagem. (VYGOTSKY, 1994).
A escola, como instituic;ao educacional, no que toca a disciplina de Lingua
Portuguesa, e mais especificamente, com relac;aoa produc;aoescrita, tern por objetivo,
segundo as PCN's (2000: 65), "formar escntores competentes capazes de produzir
taxtes coerentes, coesos e eficazes," E 0 que sen a um escritor competente?
Urn escritor competente ~ alguem que, ao produzir um discurso, conhecendopossibilidades que e5110 postas cutturalmente, sabe selecionar 0 gAnero no qual seu
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discurso se realizara escolhendo aquele que for apropriado a seus objetivos e :.circunst~ncjaenunciativa em quest:lo. [... J Urn escritor competente ~ alguem que planejao discurso e consequentemente 0 tex:\:oem fun~o do seu objetivo e do leitor a que sedestina, sem desconsiderar as caracteristicas especificas do gAnero. ~ alguem que sabeelaborar urn resumo au tomar notas durante numa exposir;:t.o oral; que 5abeesquematizar suas anota¢es para estudar urn assunto; que sabe express.ar par escrito
seus sentimentos, experi!ndas ou opiniOes. Urn escritor competente ~, tamb~m,capazde olhar para 0 pr6prio texto como objeto e verificar se esta confuse, ambiguo,redundante, obscuro au incompleto. E ainda urn leitor competente, capaz de recorrer,com sucesso, a outros textas quando precisa utilizar fontes escritas para CIsua pr6priaprodu~o (idem, 2000:65 e 66).
Analisando a citayao aeima: sera que nossos alunos aprendem a fazer usa da
linguagem eserita e, alem disso, com competeneia? Para isso, precisamos de urna
proposta de trabalho com temas contextualizados a realidade do educando e de um
caminhar de professor e aluno com 0 objetivo de desenvolver a habilidade de escrever.
o professor precisa, ent~o, mostrar ao aluno, no texto - como tentamos fazer na
experiencia de trabalho apresentada nesta monografia - onde e preciso ·consertar",
refazer 0 texto e por que as arrumat;:6esfazem-se necessarias. Assim, 0 aluno tera
censciencia de suas dificuldades e desenvolvera a competEmcia escrita com maior
aten9Bo e eficacia, ao transmitir uma mensagem, produzindo textos daros, coerentes,
ceesos, bern como atentando-se para os aspectos relevantes de ordem mais
especificamente gramaticais.
~<;\DAO,..
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A IMPORTANCIA DO TRABALHO DE REFAC~Ao;~.:~~~lcAOE NA ANALISE LlNGUISTICA DOS TEXTOS ESCRITOS
Ao falar em formar um escritor competente, sabe-se que, para se alcan<;:aresse
objetivo, faz-se necessario um trabalho arduo, continuo e comprometido nao 56 com 0
acumulos dos conteudos, mas principalmente, as pniticas e usos desses conteudos na
vida social e cultural dos sujeitos.
Como ja vista, escrever e compreender, reelaborar e produzir conhecimentos. Arespeito do ato de escrever, 0 primeiro aprendizado do aluno Ii saber que um texto nao
se faz numa primeira versao, ou seja, nao Ii escrever e ponto final. Eo neste ponto que
se encontra 0 trabalho de refa~o que ocorre de duas formas.
a) a refarx;tio na produr;ao escrita - aquelas arruma<;iies (reescritas) que ocorrem
durante as sucessivas voltas ao escrito, no momento em que 0 texto esta sendo
produzido;
b) a refarx;tio na analise IingOistica - a volta ao taxto escrito, depois de algum tempo
(geralmente, alguns dias), para fazer a analise do mesmo, efetuando, individual ou
coletivamente, as reelaborac;aesirefaet;Oesnecessarias.
Como e fundamentado nos PCN's (1998: 80 e 81), a respeito do trabalho com a
refac,tio na analise lingOistica, 0 professor podera seguir alguns procedimentos:
1. Selecionar um dos textos produzidos pela turma, 0 qual represente dificuldades
coletivas e apresentar possibilidades para discussao dos aspectos priorizados, bern
como 0 encaminhamento de soluyoes.
2. Apresentar 0 texto para leitura, transcrevendo-o no quadro-negro, reproduzindo-o,
usando papel, transparlmcia ou a tela do computador.
3. Analisar e discutir os problemas selecionados. Como nao e possivel explorar todos
as aspectos de urna 56 vez, 0 professor deve selecionar urn assunto para sar
estudado em cada atividade de refarx;ao, propondo atividades que orientem 0
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trabalho e, principalmente, fazendo cem que 0 aluno cempreenda 0 centeudo, Por
isso, e interessante apresentar sem cerre<;iio apenas aquele aspecto que sera
analisado e reelaborado, Com isso, a cencentra<;iio do aluno estara voltada apenas
para a aprendizagem do conteudo selecionado para aquele trabalho de refaa;ao,
4, Registrar as respostas apresentadas pelos alunos as quest6es propostas e discutir
as diferentes possibilidades em fun<;iio de criterios de legitimidade e de efic<icia
comunicativa. E fundamental, nessa etapa, que 0 aluno tenha a disposic;ao material
para censulta (diciomirios, gramaticas, entre outros) para que se aprofunde a
respeito do tema estudado, Se 0 objetivo da refaa;ao for explorar aspectos
morfossintaticos, 0 professor pode selecionar trechos de textos de autores
diferentes, a fim de desenvolver 0 assunto cem mais profundidade,
5, Reelaborar 0 texto, incerporando as altera90es propostas,
6. Depois de as atunos estarem familiarizados com a refacc;.ao coletiva, 0 professor
pode, progressivamente, propor a realiza<;iio em duplas e em grupos,
encaminhando-os para a autocerreyljo,
7, Professor tambem pode, ao trabalhar a refac<;iic, propor oficinas, onde cada equipe
au dupla desenvolva urn assunto espectfico e depois apresente-o a turma.
Alem dos encaminhamentos acima, vale ressaltar outro aspecto importante:
(pCN's, 1998: 81): na atividade de refaa;ao cem os alunos, 0 professor precisa
sensibilizar-se para as fatos linguisticos, sem discriminar a linguagem dos alunos. Para
tal, devera tomando-se alguns cuidados estabelecer um vinculo de confian9a com a
turma, a fim de nao provocar nenhum constrangimento au estigma e preconceito.Com todo esse trabalho 0 professor estara centribuindo para a amplia<;iio da
cempreens;;o do uso adequado da linguagem escrita e da leitura e, certamente, 0
educando tera cendi¢es de produzir seus textos cem auto-criticidade, cem
compet1mciae cem maior conscilmcia da funyljo do ler e do escrever.
APRENDENDO A LER E ESCREVER EM pRATICAS DE LETRAMENTO:UMA EXPERENCIA VIVIDA QUE DEVE SER CONTADA
Tendo ficado claramente compreendido os diferentes sentidos dos termos
affabetiza,~o e fetramento, bern como os resultados que cada urn pode produzir a
respeito do ler e do escrever, passaremos a analisar uma experi~ncia pratica de
trabalho na disciplina de Lingua Portuguesa, cuja intenyllo, foi a de ser desenvolvida a
partir da perspectiva do fetramento.
Sobre a atividade pratica em seu todo
Resumidamente, este trabalho foi desenvolvido a partir da explora~o e analise
de urn livro literario, escolhido pelos proprios alunos, e de diferentes embalagens
(sabao em po, cereais) trazidas tambem por eles (nome, logomarca, slogan, itens
necessarios: validade, indicac;6es, modo de usar etc.). A partir dai, iniciou-se umaatividade que envolveu praticas de feitura, de produ~o escrita e de refacqJo textual, da
seguinte forma:
Praticas de feitura - por meio da leitura do livro escolhido e das embalagens, suas
interpretaqaes e analise critica das informaqaes contidas em ambos.
Pratica de produ,t!o escrita - a partir do contato com os materiais escritos (Iivros
literarios escolhidos e embalagens de produtos), produziu-se textos onde se abordou
sobre os itens lidos e estudados nas embalagens, bern como sobre as ideias do livro
lido.
Pratica de refacqtJo - proporcionou-se atividades de refacyllo por meio das quais osalunos foram levados a relerem trechos e fazerem as reformula90es necessarias embusca do aprendizado dos aspectos mais gerais do texto como, por exemplo, clareza,coesao, coerencia, enriquecimento do Yocabulario, born nivel argumentativD,adequayllo ao estilo de texto (texto literario e texto publicitario), ao estilo de linguageme aos interlocutores. Buscou-se tambem 0 aprendizado de topicos mais voltados a
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diferencia.,ao entre as modalidades oral e escrita do portugues (adequa.,ao pronominal,concordancia, pontua9~o, etc.).
Sobre os sujeitos e sobre 0 contexto escolar onde ocorreu a atividade
A experiencia aqui relatada e analisada desanvolvau,se em um coh;gio particular
da regiao metropolitana de Curitiba, cuja clientela pertence a uma classe social
economicamente abastada.Os alunos a que sa refere 0 estudo sao estrangeiros, normalmente, falantes do
alemao, do ingles e/ou do franres. Portanto, a Lingua Portuguesa n~o se constitui como
lingua materna, mas como segunda, terce ira e ate quarta lingua a ser aprendida. Nestecaso, 0 trabalho com a Lingua Portuguesa e desenvolvido em aulas que se
caracterizam como extras (muitas vezes, com urn sentido per nos conhecido de aulas
particulares), e em turmas pequenas, pois alguns possuem um nivel de letramento
praticamente nulo, em portugues (em termos mais antigos, sao praticamente
"analfabetos" neste idioma). Em lace dessa realidade, 0 pequeno nemero de alunos por
turma nao e um privilegio, mas uma necessidade, pois sa trabalhar 0 portugues como
lingua materna ja Ii tarela ardua e dincil, as dificuldades s~o ainda maiores quando
essa e trabalhada como lingua estrangeira. Alem disso, essas turmas, apesar de
pequenas, sao "multisseriadas", ou seja, nelas participam alunos de varias series
simultaneamente.lodas essas informa""es explicam 0 lato de a atividade que aqui sera relatada
ter sido realizada com 05 alunos do Ensino Fundamental, especificamente, dois alunos
de terceira serie, urn aluno de quarta sene e duas alunas de saxta serie.
Sobre os procedimentos metodologicos e os resultados
o trabalho teve 0 seguinte encaminhamento:
Primeiramente, em torno de 15 dias antes da atividade propria mente dita, foi
solicitado que cada aluno fosse a biblioteca e escolhesse urn livro literario de seu
gosto, dando-Ihe um prazo para a leitura previa.
2. Durante esses quinze dias, alern de outros ati.•••idades escolares, solicitou-se que
trouxessem embalagens vazias (de sabao em po ou de cereais - caixas) para que se
realizasse 0 seguinte trabalho:
a) leitura das embalagens - observac;:.aode quais eram e como estavam di .•••ididos os
itens apresentados (nome do produto, recomendayaes, informac;Oes,
composiyao, validade, fabricac;ao, c6digo de barras);
b) lodas as informayaes e opinioes foram transcritas na lousa;
c) analise das ilustrac;oes contidas nas embalagens;
d) discussllo da importancia de cada item: para que eles servem, qual a funt;ao de
cada urn e 0 que cada urn indica .•••a ao consumidor;
e) as embalagens desses produtos analisados, para servirem de maldes, fo~am
desmontadas, desenhadas em cartolina ou papel cartao, recoriadas, dobradas e
guardadas para posterior uso (num trabalho que seria integrado a leltura dos
livros lidos).
Apresentamos, na seqOencia, 0 exemplo dos moldes obtidos.
-+ - --- - -~ - - -f - - - - - ~ - - ~,II,
1I
I I I,: I: :,- - -- -r ---;--- - ---i---
3 Ap6s esses 15 dias, foj solicitada a adaptac;.ao dos itens, daqueles produtos
analisados, para um outro tlpO de produto - a livro lido par eles - refletindo-S8 sabre
os seguintes aspectos: infOrma90es ao leitor, recomenda~es ao leitor, validade,
c6digo de barras, titulo, logomarca, produtor, autor, editora. lodas essas
informac;6es fcram relatadas no caderno. Infelizmente, devido as ferias escolares,
nao foi passive I apresentar partes do trabalho realizado no caderno, porque os
alunos estao ern seus paises de origem.
4. A professora analisou os textos produzidos, indicando, por escrito, quais as
rnodificac;6es se fariam necessarias e par que. Abaixo apresentamos urn exemplo de
produy;3:o, ern primeira versa.o, e com as observa<;6es da professora. Os demais
exemplos encontram-se ern anexo 1.
27
e"'iglli
5. as aluno5 reesaeveram as textos, incorporandoas altera¢es necessarias,desenvolvendo, assim, 0 trabalho de refacyao (quantas fizeram-se necessarias). 1
Segue 0 exemplo de produ~o final, ap6s as refa~6es feitas, a partir de observa<;6es
da professora. Os demais examplos encontram-se em anexo 2.
6. Ap6s 0 trabalho de refacyao em que os textos foram devidamente reescritos, foi
solicitado que fizessem ilustra~6es e elaborassem jogos/diversoes (em papeis
\ A respefto das atividades 5 II 6, ver r"fl~l!io re:aliuda sobre refaoolo, tratadas anteriormente.
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colondos: criativa paperlbloco criativo) para serem incluidas na embalagem que fizeram
(a partir dos moldes). Foi oomentado a raspeito da linguagem grafica, ou seja, trata-sa
de um tipo de linguagem muito importante para a venda de um produto: a importancia
das cores e dos dasenhos numa embalagem no mercado; porque agu98m a
curiosidade e fazem com que 0 consumidor busque saber 0 que ha em seu interior, etc.
7. Em seguida, tiveram que colar as ilustra9iies, os jogos a os texlos que elaboraram na
embalagem previa mente preparada e reservada para esse fim.2 Abaixo estao uma das
ilustra9iies e um dos jogos criados por um aluno para ilustrar a embalagem com 0 tema
de seu produto, sendo as demais mostradas no anexo 3.
, ·····C.O~~O ..~-.• ' .. u .. _· .•• ·••
J",.
8. Apos toda a atividade, cada aluno teve a oportunidade de, no idioma portugues, talar,
expor e explicar sabre seu trabalho 80S demais, mostrando a sua embalagem. Abaixo
apresentamos duas fotos das embalagens prontas, as Qutras est~o no anexo 4.
31
9. Para concluir esse trabalho, os alunos e a professora realizaram uma analise
avaliativa, por meio da qual apontou-se, tambem no idioma portugues, o(s)
argumento(s) e explicayao(6es) mais convincentes e, por conseqOencia, mais passiveis
de "vende~' a ideia do produto (no caso, a mensagem do livro).
Consider.~oes• respeito d. pratic. analls.da
Nossa inten9ilo, com a analise da experilmcia anteriormente apresentada, foi a
de colocar em pratica, com alunos aprendizes de portugues como lingua estrangeira. 0
desenvolvimento de atividades do ler e do escrever voltadas para situa90es sociais e
culturais efetivas, buscando, ao maximo, 0 envolvimento e a participayao concreta de
cada urn.
Gostariamos de deixar registrado que, submeter tal experiencia a avaliayao do
leitor, fOi,para n6s, um desafio, ja que nosso compromisso foi 0 de que ela pudesse ser
correspondida ao que propOea perspectiva de letramento.
Por outro lado, 0 que nos tranqOiliza e a crern;a de que essa experiEmcia, no
minimo, possa ser considerada uma tentativa de se buscar uma proposta de trabalho
sob tal perspectica. Alem disso, qualquer experiencia, par melhor que possa parecer,
esta sujeita as falhas e aos deslizes.
De qualquer modo, sejam quais forem esses deslizes, temos a convicyao de que
se trata de uma proposta altemativa de trabalho bastante rica e com resultados bem
positiv~s. Afinal, 56 em atividades do ler e do escrever voltadas a praticas sociais e
culturais de leitura e escrita e que hit 0 compromisso com a intertextualidade que, em
nosso caso, ocorreu pela explorayao do texto literario (com 0 livro escolhido) e do texto
publicitario (com 0 estudo e trabalho com as embalagens).
Temos a convicyao de que, com esse trabalho, os alunos puderem aprender, por
intermedio da pratica efetiva, varias coisas, como, por exemplo:
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a) Sobre diferentes formas de dizer e de como dizer (pela transformayao da linguagem
literaria do livro em linguagem publicitaria, na busca de convencer 0 outro a respeito de
seu produtolmensagem).
b) Sobre as diferentes modalidades de linguagem - literaria e de propaganda -
podendo, pela comparayao, reconhecer e compreender as caracteristicas de cada uma.
c) Sobre 0 ate de interpretar e compreender 0 mundo, de forma critica e consciente, por
meio da leitura do livro e das embalagens. Eles tiveram a liberdade de selecionar 0 que
queria dizer sobre 0 livro que leu, utilizando-se da modalidade eserita publicitaria,
tiveram a liberdade de analisar criticamente 0 conteudo das embalagens, podendo
avaliar 0 produto em questilo saber e optar pelo que mais chamou a atenyao.
d) Sobre sua expressilo eriativa pessoal, seu desenvolvimento na leitura. elemento
enriquecedor para sua capacidade argumentativa escrita. em busca do convencimento.
Por exemplo, ao selecionar os dados/argumentos importantes sobre a historia lida que
pudessem ser decisivos na "venda" de seu produto, eles tiveram que par a prova sua
propria competencia como eseritores, quanto a op<;iio palo discurso a ser usado, de
acordo com a linguagem publicitaria e com 0 publico alvo.
e) Sobre a reelaborayao/refacyao do texto. Com essas atividades de refac<;iio, tiveram
a oportunidade de perceber que 0 verdadeiro texlo se faz em sucessivas versoes, alem
poder explorar outros aspectos espacificos da modalidade eserita, incluindo
conhecimentos referentes ao todo do texto e determinados conteudos gramaticais.
De nossa parte, foi uma atividade que, alem de prazerosa, tambem nos
oportunizou aprender muito. Por isso, concluimos com uma receita, onde podemos
comparar 0 que e alfabetizar e 0 que e letrar e, tamoom, 0 porque optamos pelo letrar,
pois assim certamente teremos cidadaos aptos a participar dignamente numa
sociedade letrada.
CONCLusAo
Este trabalho de pesquisa rnonografica permitiu~nos refletir sabre aspectos de
extrema relevancia a respeito daquilo que de fata tivemos a intem;Ao de tratar como
"aprender a ler e aprender a escrever'" a aprender a ler e escrever sob a 6tica do
letramento.
De forma mais especffica, tivemos a oportunidade de fefletir sabre a fata de que
aprender a e/aborar por escrito, pela perspectiva do letramento, naD e apenas copiar;
muito mais que iS50, supoe escrever e reescrever para tamar a ideia viiwel e passivel
de ser concretizada. Do mesma modo, aprender a fer, muito alam do mera ata de
decodificar as simbolos que eslao explicitos no papel, significa interpretar,
compreender, analisar, concluir e extrapolar 0 lido, segundo a realidade culturalmente
contextuatizada. (DEMO, 1996).
Nessa mesma linha de pensamento, vimos que, apesar de as praticas do ler e do
escrever requererem diferentes conhecimentos e habilidades, elas se complementam,
pais a leitura e fundamental para a ampliac;:ao da escrita, assim como, quanta mais se
escreve, rnais se refon;;:a a que se aprendeu lendo. Escrever comparece, assim, como
realiza980 palpavel da autonomia do sujeito, que encontra na leitura a "demonstra9ao
concreta de que e possivel saber pensar para melhor intervir." (DEMO, 1996: 3).
Somando-se a essas reflexOes, tivemos a oportunidade de tarnbern fazer urna
analise sabre a imprescindivel reelabora~o'refaC92o do texto. Virnos que a verdadeiro
texto se faz ern sucessivas vers6es, no momenta em que S8 esta escrevendo (refac~o
na escrita) e em momentos posteriores a Produ980 escrita (refac980 na analise
lingDistica).
Na tentativa de ir alem das reflexoes apenas de cunha teorico, trouxemos, para
analise critica do leitor, urna experiencia pratica de trabalho, a qual esfon;:amo-nos para
que fosse desenvolvida, sob a perspectiva do letramento.
Em conclusao, esperamos que as abordagens teoricas e praticas refletidas e
analisadas neste trabalho possam se constituir em oportunidade real de crescimento e
aprimoramento pessoal e profissional dos professores, tanto de lingua materna quanta
de lingua estrangeira.
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