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AGROFLORESTA Reconstruindo Paisagens Sustentáveis Jefferson Ferreira Lima Haroldo Borges Gomes Laury Cullen Jr. Tiago Pavan Beltrame Teodoro Sampaio 2003 Instituto de Pesquisas Ecológicas Ministério do Meio Ambiente - PROBIO

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AGROFLORESTA

Reconstruindo Paisagens Sustentáveis

Jefferson Ferreira LimaHaroldo Borges GomesLaury Cullen Jr.Tiago Pavan Beltrame

Teodoro Sampaio2003

Instituto de Pesquisas Ecológicas

Ministério do Meio Ambiente - PROBIO

Fone/Fax (55 18) 3282 3924

www.ipe.org.br

Rua Ricardo Fogaroli, 378 - Vl. S o Paulo

Teodoro Sampaio, SP 19280-000, Brasil

ã

Instituto de Pesquisas Ecológicas

AGROFLORESTA

Reconstruindo Paisagens Sustentáveis

Viveiristas

EducadoraAmbiental

Revisão

Projeto Gráfico

Ilustração

David Ferreira SoaresNivaldo Ribeiro CamposPaulo Ramos

Maria das Graças de Souza

Sandra Marques

Márcia Ditt CuryTeclagem Comunicação

Miriam Ikeda

Manual Agroflorestal

Este material foi elaborado a partir de experiências

que ocorreram junto a agricultores assentados pela

reforma agrária no Pontal do Paranapanema, extremo

oeste do Estado de São Paulo.

O projeto “Ilhas de diversidade como corredores

em paisagens fragmentadas” implementado pelo IPÊ

(Instituto de Pesquisas Ecológicas) com recursos do

PROBIO/MMA nos proporcionou experimentar a

possibilidade da adoção e do avanço da cultura

agroflorestal na região do Pontal do Paranapanema.

Neste convívio com os produtores e assentados

pudemos identificar os fatores que promovem o resgate

dos valores culturais das comunidades envolvidas no

projeto e ainda alguns pontos de estrangulamento que

ocorrem na dinâmica de mudança da atual paisagem

Num cenário de grande diversidade cultural na

relação homem e natureza, nasce um aprendizado que

transcrevemos para este manual. Essas informações são

apresentadas de forma direta, traduzidas para uma

leitura de fácil entendimento e de simples aplicação.

Este trabalho foi executado em parceria com

outras instituições: O Parque Estadual Morro do Diabo

do Instituto Florestal de São Paulo IF-SMA, a Fundação

ITESP (Fundação Instituto de Terras do Estado de SP), a

COCAMP/MST (Cooperativa dos Trabalhadores Rurais

Sem Terra do Pontal do Paranapanema), a ESALQ-USP

(Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz) e o

Wildlife Trust.

A relação

homem-terra

vem de longa

data. Esses conhe-

cimentos adquiridos são

repassados através das

gerações com as carac-

terísticas de seus costumes, religião,

folclore e a sabedoria popular deste

“ homem do campo”. Nes te

aprendizado em alguns casos criam-

se tabus, que se transformam em

barreiras na adoção de técnicas para

a condução de uma agricultura mais

diferenciada.

Podemos encontrar um

desses tabus quando se

Introdução

fala de uma agricultura com a presença de árvores.

Muitos agricultores afirmam que: “ onde tem árvore a

roça e o pasto não sai”. Esta afirmação merece atenção.

Com a agrofloresta é possível imaginar uma agricultura

associada a diversos tipos de plantas e animais em uma

mesma área e ao mesmo tempo. Quando bem estudada

e planejada essa associação entre árvores e agricultura

quase sempre resulta em uma exploração mais

equilibrada sem degradar os recursos naturais

disponíveis. Aumenta ainda a eficiência da exploração

da área gerando maior lucratividade.

Manual Agroflorestal .............................................

Introdução ............................................................

Agrofloresta ..........................................................

Vantagens de um Sistema Agroflorestal ...................

Implantando um Sistemas Agroflorestal ...................

1ºpasso ...............................................................

2ºpasso ...............................................................

3ºpasso ...............................................................

4ºpasso ...............................................................

5ºpasso ...............................................................

6ºpasso ...............................................................

7ºpasso ...............................................................

8ºpasso ...............................................................

Tabela de Espécies ................................................

Minhocultura ........................................................

Reflexão ............................................................

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SUMÁRIO

Agrofloresta

Agrofloresta é a mistura entre agricultura e

floresta. Neste sistema, as árvores são plantadas em

associação com as lavouras e/a pecuária. Essa mistura

nos permite explorar racionalmente uma área,

proporcionando, como na natureza, um desen-

volvimento equilibrado entre a presença de árvores,

animais e outras culturas.

Na agrofloresta os recursos naturais são

conservados de forma a contribuir principalmente com a

melhoria e a con-

servação do solo. A

cobertura de folhas e

galhos que se forma

junto à vegetação ras-

teira passa por um

processo de decom-

posição, transfor-

mando-se em adubo

orgânico, nutrindo as-

sim todas as plantas

encontradas na área. Essa cobertura morta ajuda

também a manter a umidade na terra. A quantidade de

água preservada no solo pela cobertura de folhas e pela

sombra das árvores é um dos fatores que podem ser

facilmente observados.

Uma planta bem alimentada, que pode conseguir

no solo os nutrientes necessários para o seu

desenvolvimento, tem mais resistência contra as pragas e

doenças.

Vantagens de um Sistema Agroflorestal

De fácil implantação, os sistemas agroflorestais

proporcionam inúmeras vantagens, rendendo ganhos

Criação de AbelhasCriação de Abelhas

MadeiraMadeira

MinhocasMinhocas

QuebraVento

QuebraVento

Adubaçãodo solo

Adubaçãodo solo

diretos e indiretos, tais como:

• Melhora a fertilidade dos solos;

• Aumenta a infiltração da água das chuvas,

diminuindo a erosão e degradação do solo;

• Resgata os nutrientes que se encontram na

camada de subsolo;

• Promove a descompactação do solo;

• Serve como quebra-vento;

•Cria um ambiente favorável para o desen-

volvimento de espécies que ajudam no controle de

pragas e doenças;

• Fornece alternativas de forragens para pecuária;

• Fornece sombra e bons frutos;

• E muitas outras como a possibilidade da criação

de abelhas e a própria extração da madeira.

Os sistemas agroflorestais podem ter diversas

configurações. Podemos criar vários desenhos, devendo

Implantando um Sistema Agroflorestal

ser utilizado para

isto os potenciais

existentes na pro-

priedade. Com o

plantio das árvo-

res, podem ser

consorciados os

mais diversos tipos de culturas anuais como: milho,

feijão, mandioca, arroz etc.

Como exemplo utilizaremos a cultura de milho,

desejando no final da sua implantação obter um sistema

com árvores e pastagens.

Preparo do solo: O preparo do solo deve ser feito

1º passo1º passo

de forma convencional, com aração e nivelamento.

Plantio da cultura: O plantio da cultura a ser

explorada deve obedecer ao modelo tradicional

utilizado pelo produtor (feijão, milho, mandioca,

algodão etc.), com espaçamento e correção do solo.

2º passo2º passo

Nesta área futuramente serão implantadas as linhas de

árvores.

Definição do espaçamento entre árvores: O

espaçamento a ser definido pode ser variado. Devemos

levar em consideração a espécie de árvore a ser utilizada

e para que fim será destinada.

Como neste caso esta-

mos propondo um

desenho de um siste-

ma que futuramente

será contemplado

com a implantação de

3º passo 3º passo

pastagem junto às árvores (sistema silvopastoril),

recomendamos que a distância entre as linhas de ár-

vores não seja menor que 5 metros. Dessa forma haverá

uma significativa entrada de luz para o desenvolvimento

da pastagem. O espaçamento das árvores na linha pode

variar de 2 a 4 metros.

Quando se faz a utilização de um espaçamento

muito pequeno, com um grande número de árvores por

ha., ocorrerá um comprometimento no desenvolvimento

das árvores, ficando com um baixo diâmetro de tronco e

com um menor valor comercial.

Abertura de covas e adubação: Recomenda-se

fazer uma abertura de cova com as seguintes dimensões:

4º passo4º passo

30cm largura x 30cm comprimento x 40cm de

profundidade. Árvores devem ser tratadas como uma

cultura normal, tendo também necessidade de fazer-se

uso de adubação. A utilização de adubo orgânico

(esterco de gado, galinha, suínos, húmus de minhoca,

compostagem etc.) nas covas possibilita uma grande

resposta no desenvolvimento das árvores.

5º passo

Plantio das árvores: Após a germinação da cultura

implantada, deve se fazer o plantio das espécies de

árvores escolhidas. O plantio preferencialmente deve

5º passo

ocorrer no período das

chuvas com o solo mo-

lhado.

Manejo: O cuidado

no desenvolvimento das

árvores torna-se essencial

para o sucesso da im-

plantação, principalmente

no seu período inicial de crescimento. As linhas das

árvores devem ser mantidas limpas. Recomenda-se o uso

de matéria seca para servir como cobertura morta, para

aumentar a umidade no solo e dificultar o crescimento de

ervas daninhas. O controle de formigas cortadeiras é de

suma importância para o sucesso do sistema.

Formas de controle de formigas: Existem formas

alternativas para o controle de formigas, com baixo

impacto ao meio ambiente e com menores riscos à

saúde. A reforma de pastagem e manutenção de boa

cobertura de solo são práticas que servem como

alternativa para diminuir a expansão e disseminação das

6º passo 6º passo

Manejo

formigas pela propriedade. A utilização de garrafas

plásticas de refrigerante, no entorno das mudas de

árvore (como um tubo), em seu estágio inicial, são

barreiras que impe-dem que as formigas consigam subir

e cortar as mudas.

Implantação

das pastagens: A

cultura de entre-

linha (milho, feijão,

7º passo 7º passo

mandioca etc.) pode ser cultivada por até 3 anos ou até o

momento em que as árvores atinjam um tamanho e

diâmetro que não venham a ser prejudicadas pela

presença do gado. Após a colheita da última safra da

cultura de entrelinha, deve se fazer a implantação da

pastagem por muda ou semente. A implantação da

pastagem deve seguir a recomendação apropriada para

a gramínea utilizada, considerando nível de Ph (acidez

do solo) e adubação.

C o n d u ç ã o e

manejo do sistema

silvopastoril: O gado

deve ser introduzido no

sistema a partir do

momento em que a

pastagem atingir o

tamanho indicado para

a gramínea. O bom

manejo da gramínea é

muito importante para o sucesso do sistema. Para isso

deve ser respeitada a capacidade de suporte da

pastagem. Devemos manter um número de animais por

área de forma que não se comprometa o rebrote da

gramínea.

O controle de formigas cortadeiras deve ser

mantido sempre que se observar a sua presença. Mesmo

depois do sistema estabelecido, as formigas cortadeiras

podem causar prejuízos significativos às árvores e à

pastagem.

8º passo8º passo

Tabela de Espécies Agroflorestais

Espécies não frutíferas

Espécies permanentesEspécies permanentes

Acácia (Acacia mangium)Albizia (Albizia lebeck)Alecrim (Holocalyx balansae) * Angico branco (Anadenanthera colubrina)*Angico do cerrado (A. falcata)*Cabreúva (Myroxylun peruiferum) * Café de bugre (Cordia ecalyculata) *Chuva-de-ouro (Cassia ferruginea) *Cedro (Cedrella fissilis) * Coração de negro (Poecilanthe parviflora)*Eucalipto (Eucalyptus spp)Farinha seca (Albizia hasslerii) * Ficheira (Schizolobium parahyba)Gliricídia (Gliricidia sepium)Gurucaira (Peltophorum dubium)*Ipê amarelo (Tabebuia chrysotricha) *Ipê amarelo (Tabebuia ochracea ) *Ipê roxo (Tabebuia heptaphylla) *Ipê tabaco (Zeyheria tuberculosa) *Jacarandá mimoso (Jacaranda cuspidifolia)*Louro pardo (Cordia trichotoma) *Óleo de copaíba (Copaifera langsdorffii)*Pau marfin (Balfourodendron riedelianum)*Pau jacaré (Piptadenia gonoacantha) *Paineira (Chorisia speciosa) * Pau de tucano (Vochysia tucanorum)*Sobrasil (Colubrina glandulosa) *Sombreiro (Clitoria fairchildiana)Sucupira (Pterodon emarginatus) *Tamboril (Enterolobium contortisiliquum)*

Principal função agroflorestal

le, po, qv, cs, tole, or, a, ap, av, cs, fa, fsmd, fa, ormd, cs, le, to, fs, memd, cs, le, to, fs, mem d md, or, as, fs, fa a, md, le, qv, cs, av, or, memd, ap, lemd, orle, md, me, po, qv, as, to, fale, as, a, av, md, or, or, fa, apa, ap, md, le, av, cp, cs, as, cvMd, as, or, famd, or, fa, apmd, or, fa, apmd, or, fa, apmd, oror, fa, mdmd, or, as, fsme, or, famd, le, ormd, le, me, apor, fa, fior, fa, mdmd, oror, mdmd, le, or md, or, as, fa

Principal função agroflorestal

a = alimentação/forragem animalap = apiculturaas = árvore sombra/consórcioav = adubação verdecp = controle pragascs = conservação solocv = cerca vivafa = uso faunísticofi = fibrafs = fertilidade solo

go = gomahu = consumo humanole = lenhamd = madeira/construçãome = medicinalol = óleoor = ornamentalpo = madeira polpaqv = quebra ventoto = madeira/toras

Legendas

Espécies frutíferas

Espécies permanentesEspécies permanentes

Acerola (Malpiguia glabra)Amora (Morus sp)Araça (Psidium araça) *Cajú (Anacardium occidentale)Carambola (Averrhoa carambola)Figueira (Ficus enormis) *Goiaba (Psidium guajava) *Inga de brejo (Inga uruguensis)*Inga liso (Inga laurina)*Jaca (Artocarpus heterophylus)Jambolão (Eugenia jambos)Jaracatiá (Jaracatia spinosa) *Jatobá (Hymenaea courbaril) * Jenipapo (Genipa americana)Mamão (Carica papaya)Manga (Mangifera indica)Mutambo (Guazuma ulmifolia) * Pindaíba (Duguetia lanceolata)*Pinha (Rollinia mucosa) Tamarindo (Tamarindus sp)Uvaia (Eugenia piriformis)*

Principal função agroflorestal

hu, fa, qvhu, fahu, fa, md, lehu, qv, ol, le, as, fahu, qv, orhu, fa, as, mdhu, fa, md, leap, md, a, le, as, to, qv, faap, md, a, le, as, to, qv, fahu, a, md, le, qv, fahu, fa, or, qvhu, fa, qv, ormd, hu, fa, or hu, fahu, a, mdhu, a, qv, fa, ashu, fa, fi, a, mdhu, fahu, fahu, a, cs, fs, fa, le, to, qvhu, fa, qv

Principal função agroflorestal

(*) Nativas da flora da região do Pontal

Minhocultura

O esterco de gado, galinha, suíno etc pode ser

transformado em um adubo de grande valor em

nutrientes: o húmus de minhoca utilizado no sistema

agroflorestal durante toda a condução do processo. A

criação de minhoca para a produção de húmus é

baseada em práticas simples e de baixo custo.

Primeiramente devemos observar os produtos

disponíveis na propriedade que poderão servir como

material fonte. Este material pode incluir estercos

diversos como também restos de culturas que passaram

pelo processo de decomposição. O local onde será

instalado o minhocário deverá possuir uma certa

inclinação do terreno para o escoamento da água das

chuvas. Selecionado o local, deve se estender sobre o

solo um pedaço de lona plástica ou material similar. Esta

lona plástica

deve ser per-

furara em to-

da sua área,

para que não

retenha muita água.

Esta lona evita a mistura do material com a terra

melhorando a qualidade do húmus. Depois da lona

colocada sobre o solo, devemos adicionar 1 a 2

carriolas de esterco. Este esterco deve ter passado pelo

processo de decomposição.

Em seguida devemos colocar as minhocas no

interior do material. Recomenda-se que o minhocário

seja coberto por palha ou mesmo um saco de estopa,

para manter a umidade, evitando o ressecamento do

material, servindo ainda como barreira para predadores

(pássaros, galinhas etc.).

O tempo de transformação do esterco em húmus

dependerá da quantidade de minhocas no minhocário

proporcionalmente à quantidade de esterco disponível.

Outro fator importante são as condições fornecidas para

o bom desempenho das minhocas, como:

•Boa umidade: O esterco não deve ser mantido

encharcado ou muito seco;

•Temperatura: A temperatura deve ser observada

principalmente no inverno, onde se recomenda que o

Boa umidade

Temperatura

minhocário não esteja em local sombreado. A baixa

temperatura diminui a eficiência das minhocas.

•Alimentação: Uma boa fonte de esterco é um

fator importante para a reprodução das minhocas.

Deve-se observar sempre o ritmo de alimentação das

minhocas, não podendo faltar esterco. Caso isto ocorra

muitas minhocas deixarão o minhocário em busca de

alimento.

A partir do momento que se observar a

transformação do material em húmus, deve se fazer a

retirada da minhoca para uma nova porção de esterco.

Isso pode ocorrer através da prática de peneirar o húmus

e retirando-se as minhocas. Outra forma é sim-

plesmente colocarmos uma nova porção de esterco

junto à porção já transformada. As minhocas na-

turalmente farão a migração para a nova porção de

alimento.

A produção de húmus de minhoca é uma prática

simples e eficaz. Se o produtor mantiver uma umidade

satisfatória, o fornecimento de alimento na quantidade

exigida e a ausência de predadores, o sucesso na

produção de húmus estará garantido.

Alimentação

Reflexão

Procure seguir esses passos e temos certeza de que

em breve terá muito orgulho de sua propriedade. A

agrofloresta mistura árvores na roça e nas pastagens,

embeleza a propriedade, traz mais saúde para a terra e

satisfação para todos os envolvidos nessa luta pela

conservação da vida e de toda sua diversidade.