ada p. grinover - controle de políticas públicas

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  • 8/4/2019 Ada P. Grinover - Controle de Polticas Pblicas

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    O cOntrOle das pOlticas pblicas

    pelO pOder JudiciriO

    Ada Pellegrini Grinover*

    ResumoEste artigo trata da questo fundamental das atividadesdos poderes do Estado e o cumprimento dos princpiose objetivos previstos na Constituio de 1988, a reali-zao adequada das polticas pblicas e seu controlepelo Poder Judicirio. Por meio da identificao dasatividades atribudas a cada poder, dos mecanismos descalizao e controle existentes na legislao nacionale da demonstrao da relevncia das aes do Poder Ju-dicirio em relao s atividades dos Poderes Executivoe Legislativo no que se refere prtica de aes siste-maticamente organizadas para a garantia do exercciodos direitos fundamentais pela populao, demonstra aimportncia da atividade jurisdicional para scalizao,controle e garantia da realizao de polticas pblicasque atendam s diretrizes constitucionais.

    Palavras-chave: Poderes do Estado Polticas pblicas Fiscalizao Controle.

    The JudiciaRys conTRol oveR Public Policies

    absTRacTThis paper deals with the fundamental issue of the statepowers activities and the fulllment of the principlesand goals contained in the 1988 Constitution, the proper

    * Professora Titular de Direito Processual da Universidade de So Paulo.

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    conduct of public policies, and the Judiciarys controlover them. Through the identication of activities as-signed to each power, the national legislations controland oversight mechanisms, and the demonstration of the

    Judiciarys actions regarding the Executive and Legislati-ve powers related to the practice of systematically orga-nized actions to the enforcement of fundamental rightsby the population, it shows the relevance of jurisdictionalactivities for the monitoring, control and guarantee ofpublic policies that meet constitutional guidelines.Keywords: Powers of the State Public policies Supervision Control.

    1. FundamenTo consTiTucional do conTRoleMontesquieu (2005, p. 54) condicionou a liberdade

    separao entre as funes judicial, legislativa e executiva,

    criando a teoria da separao dos poderes1 e armando que

    a reunio de poderes permite o surgimento de leis tirnicas,

    exequveis de forma igualmente tirnica2.

    Vale lembrar, com Dalmo Dallari (2007), que a teoria

    foi consagrada em um momento histrico o do liberalis-

    mo no qual se objetivava o enfraquecimento do Estado e arestrio de sua atuao na esfera da liberdade individual.

    Era o perodo da primeira gerao de direitos fundamentais,

    ou seja, das liberdades ditas negativas, em que o Estado s

    tinha o dever de abster-se, para que o cidado fosse livre para

    fruir sua liberdade. O modelo do constitucionalismo liberal

    preocupou-se, com exclusividade, em proteger o indivduo da

    ingerncia do Estado.Esse estado de coisas alterou-se com o fenmeno his-

    trico da Revoluo Industrial, em que as massas operrias

    assumem relevncia social, aparecendo no cenrio insti-

    tucional o primeiro corpo intermedirio, porta-voz de suas

    reivindicaes: o sindicato.

    A transio entre o Estado liberal e o Estado social pro-

    move alterao substancial na concepo do Estado e de suas

    nalidades. Nesse quadro, o Estado existe para atender ao1 Livro V, Cap. II.2 Livro XI, Cap. V.

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    bem comum e, consequentemente, satisfazer direitos funda-

    mentais e, em ltima anlise, garantir a igualdade material

    entre os componentes do corpo social. Surge a segunda ge-

    rao de direitos fundamentais a dos direitos econmico-sociais , complementar dos direitos de liberdade. Agora,

    ao dever de absteno do Estado substitui-se seu dever a um

    r, fr, prtr, por intermdio de uma atuao positi-

    va, que realmente permita a fruio dos direitos de liberdade

    da primeira gerao, assim como dos novos direitos.

    No Brasil, durante muito tempo os tribunais autolimita-

    ram-se, entendendo no poder adentrar o mrito do ato ad-

    ministrativo. Diversas manifestaes do Poder Judicirio, an-teriores Constituio de 1988, assumiram essa posio3.

    No entanto, a Lei da Ao Popular abriu ao Judicirio

    a apreciao do mrito do ato administrativo, ao menos nos

    casos dos arts. 4, II, b e V, b, da Lei n. 4717/65, elevando

    a leso condio de causa de nulidade do ato, sem neces-

    sidade do requisito da ilegalidade. E Jos Afonso da Silva

    preconizava que sempre se possibilitasse a anulabilidade

    do ato por simples lesividade (apud Ferreira Filho, 1978, p.

    478). Mas foi a Constituio de 1988 que trouxe a verdadeira

    guinada: em termos de ao popular, o art. 5, inc. LXXIII,

    introduziu a seguinte redao:

    Qualquer cidado parte legtima para propor ao popularque vise a anular ato lesivo ao patrimnio pblico ou de enti-dade de que o Estado participe, r trt,ao meio ambiente e ao patrimnio histrico e cultural, candoo autor, salvo comprovada m-f, isento de custas judiciais edo nus da sucumbncia. (Grifo meu).

    3 Vejam-se, exemplicativamente, STJ, RMS 15.959/MT, Sexta Turma, julga-

    do em 07.03.06, DJ 10.04.2006, p. 299; RMS 18.151/RJ, Quinta Turma,

    julgado em 02.12.04, DJ 09.02.05, DJ 09.02.2005, p. 206; MS 12.629/DF,

    Terceira Seo, julgado em 22.08.07, DJ 24.09.2007, p. 244. O STF, na

    dcada de 1960, aprovou em Sesso Plenria a Smula 339, com o seguinte

    enunciado: No cabe ao Poder Judicirio, que no tem funo legislativa,

    aumentar vencimentos de servidores sob o fundamento da isonomia.

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    Ora, o controle da rtrt, por via

    da ao popular, no pode ser feito sem o exame do mrito

    do ato guerreado. Trata-se, aqui, de mera lesividade, sem o

    requisito da ilegalidade.Cndido Dinamarco (2000, p. 434) tambm entende que

    foi a ao popular que abriu o caminho do Judicirio em

    relao ao controle do mrito do ato discricionrio, devendo-

    se a ela a desmisticao do dogma da substancial incen-

    surabilidade do ato administrativo, provocando sugestiva

    abertura para alguma aproximao ao exame do mrito do ato

    administrativo. Mas a Constituio de 1988 fez mais: no art.

    3, xou os jt ftda Repblica Federativado Brasil, da seguinte maneira:

    Art. 3: Constituem objetivos fundamentais da Repblica Fe-derativa do Brasil:I construir uma sociedade livre, justa e solidria;II garantir o desenvolvimento nacional;III erradicar a pobreza e reduzir as desigualdades sociais eregionais;

    IV promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raa,sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminao.

    E, para atingir esses jt ft (aos quais

    se acresce o princpio da prevalncia dos direitos humanos:

    art. 4, II, da CF), o Estado tem que se organizar no fre

    prtr, incidindo sobre a realidade social. a que o Es-

    tado social de direito transforma-se em Estado democrtico

    de direito. Mas, como atingir os objetivos fundamentais doEstado brasileiro? Responde Oswaldo Canela Junior4:

    Para o Estado social atingir esses objetivos, faz-se necessriaa realizao de metas, ou programas, que implicam o estabe-lecimento de funes especcas aos Poderes Pblicos, para aconsecuo dos objetivos predeterminados pelas Constituiese pelas leis [BONAVIDES, 1980]. Desse modo, formulado o

    4 Esta ideia e as que seguem so extradas do brilhante trabalho apresen-

    tado USP para qualicao de doutorado por Oswaldo Canela Junior, A

    efetivao dos direitos fundamentais atravs do processo coletivo: um novo

    modelo de jurisdio (orientador Kazuo Watanabe), indito, p. 17-19.

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    comando constitucional ou legal, impe-se ao Estado promo-ver as aes necessrias para a implementao dos objetivosfundamentais. E o poder do Estado, embora uno, exercidosegundo especializao de atividades: a estrutura normativa

    da Constituio dispe sobre suas trs formas de expresso: aatividade legislativa, executiva e judiciria.

    Arma o autor, com toda razo, que as formas de expres-

    so do poder estatal so, por isso mesmo, meros instrumen-

    tos para a consecuo dos ns do Estado, no podendo ser

    consideradas por si ss. O primeiro dogma do Estado liberal

    a ser quebrado foi o da atividade legislativa, como sendo a

    preponderante sobre os demais poderes. E, acrescente-se: o

    segundo dogma foi o da atividade jurisdicional prestada por

    um juiz que represente apenas . Continua

    Oswaldo Canela Junior:

    E assim a teoria da separao dos poderes (art. 2 da CFbrasileira) muda de feio, passando a ser interpretada da se-guinte maneira: o Estado uno e uno seu poder. Exerce ele

    seu poder por meio de formas de expresso (ou Poderes). Pararacionalizao da atividade estatal, cada forma de expressodo poder estatal exerce atividade especca, destacada pelaConstituio. No r t f fr pr pr tt trfr rpr: este osentido da pdos poderes.

    Mas os poderes, alm de independentes, devem tambm

    ser rentre si. Logo, os trs poderes devem harmo-nizar-se para que os objetivos fundamentais do Estado sejam

    alcanados. Por isso, ainda segundo Oswaldo Canela Junior,

    Pr Jr tr ft t

    t tt prtr jt ft r

    ctt (rt. 3 cF rr) (Idem, grifo meu).

    Trcio Sampaio Ferraz Junior (1994, p. 14) lembra que

    o objetivo do Estado liberal era o de trro Poder Ju-

    dicirio ante os demais poderes. Mas, no Estado democrtico

    de direito, o Judicirio, como forma de expresso do poder

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    estatal, deve estar alinhado com os escopos do prprio Es-

    tado, no se podendo mais falar numa tr

    t. Ao contrrio, o Poder Judicirio encontra-se consti-

    tucionalmente vinculado poltica estatal. Ainda no conceitoirrepreensvel de Oswaldo Canela Junior:

    Por poltica estatal ou polticas pblicas entende-se o con-junto de atividades do Estado tendentes a seus ns, de acordocom metas a serem atingidas. Trata-se de um conjunto denormas (Poder Legislativo), atos (Poder Executivo) e decises(Poder Judicirio) que visam realizao dos ns primordiaisdo Estado.

    Como toda atividade poltica (polticas pblicas) exercida peloLegislativo e pelo Executivo deve compatibilizar-se com aConstituio, cabe ao Poder Judicirio analisar, em qualquersituao e desde que provocado, o que se convencionou chamarde atos de governo ou questes polticas, sob o prisma doatendimento aos ns do Estado (art. 3 da CF), ou seja, emltima anlise sua constitucionalidade.

    o tr tt pt pp Pr Jr, prtt, f p pr-

    fr frt ctt p t Pr

    P, t pr tr tj t

    os ns do Estado. E continua o autor: Diante dessa nova

    ordem, denominada de j pt(muito dife-

    rente, acrescente-se, da pt Jr),

    [] contando com o juiz como co-autor das polticas pblicas,ca claro que sempre que os demais poderes comprometerema integridade e a eccia dos ns do Estado incluindo asdos direitos fundamentais, individuais ou coletivos o Poder

    Judicirio deve atuar na sua funo de controle.

    2. a Posio dos TRibunais bRasileiRos

    Nossos tribunais assim tm feito: O Supremo Tribunal

    Federal reconheceu o dever do Estado de fornecer gratuita-mente medicao a portadores do vrus HIV, sob o fundamen-

    to de que pr p prtr pt

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    jt prno art. 196

    da CF, invocando precedentes consolidados da Corte5.

    O mesmo entendimento foi adotado pelo Superior Tribu-

    nal de Justia em diversas oportunidades, salientando-se odireito integralidade da assistncia sade a ser prestada

    pelo Estado, de forma individual ou coletiva6. O Tribunal, em

    outra deciso, armou que a Administrao Pblica se sub-

    mete ao imprio da lei, t t

    prt t trt: uma vez demonstrada

    a necessidade de obras objetivando a recuperao do solo,

    cumpre ao Poder Judicirio proceder outorga da tutela es-

    pecca para que a Administrao destine verba prpria dooramento para esse m7.

    Tambm o Tribunal de Justia de So Paulo mostrou-se

    preparado na discusso a respeito da suposta interferncia do

    Poder Judicirio nos demais poderes. Em ao civil pblica

    ajuizada pelo MP em face da municipalidade paulistana, ob-

    jetivando a restaurao do conjunto arquitetnico do Parque

    da Independncia, a Corte manifestou-se no sentido de que

    pode e deve o Judicirio atuar na omisso administrativa.

    O Tribunal paulista decidiu que a omisso da administrao

    pode ser enfrentada pelo Judicirio, em decorrncia do con-

    trole que este exerce sobre os atos administrativos, no se

    tratando de interferncia na atividade do Poder Executivo8.

    Mas o posicionamento mais representativo em favor da

    interveno do Poder Judicirio no controle de polticas pbli-

    cas vem do Supremo Tribunal Federal, na ADPF 45-9, sendorepresentado pela deciso monocrtica do Ministro Celso de

    Mello, que assim se pronunciou:

    5 RE 271.286 e AgRg 271.286.6 REsp 212346 no Ag. 842866; REsp 814076; REsp 807683; AgRg no REsp

    757012; REsp 684646; REsp 658323; REsp 625329, MS 8895; REsp

    509753 MS8740; REsp 430526; REsp 338373.7 RSTJ 187/219, 2 Turma.8 Apel. 152.329.5/4.00-SP.

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    certo que no se inclui, ordinariamente, no mbito das fun-

    es institucionais do Poder Judicirio e nas desta Suprema

    Corte, em especial, a atribuio de formular e de implementar

    polticas pblicas (JOS CARLOS VIElRA DE ANDRADE, Os

    Direitos Fundamentais na Constituio Portuguesa de 1976,

    p. 207, item n. 05, 1987, Almedina, Coimbra), pois, nesse

    domnio, o encargo reside, primariamente, nos Poderes Legis-

    lativo e Executivo. Tal incumbncia, no entanto, embora em

    bases excepcionais, poder atribuir-se ao Poder Judicirio, se

    e quando os rgos estatais competentes, por descumprirem

    os encargos poltico-jurdicos que sobre eles incidem, vierem a

    comprometer, com tal comportamento, a eccia e a integridade

    de direitos individuais e/ou coletivos impregnados de estaturaconstitucional, ainda que derivados de clusulas revestidas

    de contedo programtico. Cabe assinalar, presente esse con-

    texto consoante j proclamou esta Suprema Corte que o

    carter programtico das regras inscritas no texto da Carta

    Poltica no pode converter-se em promessa constitucional

    inconsequente, sob pena de o Poder Pblico, fraudando justas

    expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de

    maneira ilegtima, o cumprimento de seu impostergvel dever,por um gesto irresponsvel de indelidade governamental ao

    que determina a prpria Lei do Estado (RTJ 175/1212-1213,

    Rel.Min. CELSO DE MELLO). []

    No deixo de conferir, no entanto, assentadas tais premissas,

    signicativo relevo ao tema pertinente reserva do possvel

    (STEPHEN HOLMES/CASS R. SUNSTEIN, The Cost of Rights,

    1999, Norton, New York), notadamente em sede de efetivao

    e implementao (sempre onerosas) dos direitos de segundagerao (direitos econmicos, sociais e culturais), cujo adim-

    plemento, pelo Poder Pblico, impe e exige, deste, prestaes

    estatais positivas concretizadoras de tais prerrogativas indivi-

    duais e/ou coletivas. []

    A meta central das Constituies modernas, e da Carta de

    1988 em particular, pode ser resumida, como j exposto, na

    promoo do bem-estar do homem,j pt prt t

    rr prpr ,que inclui,alm da proteo dos direitos individuais, tr t. Ao apurar os elementos fundamentais

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    dessa dignidade (o mnimo existencial), estar-se-o estabelecen-

    do exatamente os prrtrdos gastos pblicos. Apenasdepois de atingi-los que se poder discutir, relativamente

    aos recursos remanescentes, em que outros projetos se dever

    investir. o t, como se v, t-t prr rtr, p r

    prtt rr p.V-se, pois, que os condicionamentos impostos, pela clusula

    da reserva do possvel, ao processo de concretizao dos di-

    reitos de segunda gerao de implantao sempre onerosa ,

    traduzem-se em um pr, , (1) r prt / f

    Pr P , tr, (2) t p-nanceira do Estado para tornar efetivas as prestaes positivas

    r. [] que, se tais Poderes do Estado agirem de modo irrazovel ou

    procederem com a clara inteno de neutralizar, comprome-

    tendo-a, a eccia dos direitos sociais, econmicos e culturais,

    afetando, como decorrncia causal de uma injusticvel inrciatt prtt rt, aquelencleo intangvel consubstanciador de um conjunto irredut-

    vel de condies mnimas necessrias a uma existncia digna

    e essenciais prpria sobrevivncia do indivduo, a, ento,

    jtfr--, prtt j ft t pr r f prt t-jr ,

    p tr Pr Jr, r r, t, j fr j

    jtt r p et.(Grifos meus).

    Resumindo, percebe-se que a posio do STF, manifesta-

    da por um de seus mais sensveis ministros, a de que so

    necessrios alguns requisitos para que o Judicirio interve-

    nha no controle de polticas pblicas, at como imperativo

    tico-jurdico: (1) t f p t

    r rt ; (2) r prt

    / f Pr P (3)

    existncia de disponibilidade nanceira do Estado para tornar

    ft prt pt r. Examinem-se esses requisitos, que traam os limites para a interveno

    do Judicirio nas polticas pblicas.

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    3. limiTes inTeRveno do JudiciRio nas PolTi-

    cas Pblicas: a gaRanTia do mnimo exisTencial

    Os direitos cuja observncia constitui objetivo funda-

    mental do Estado (art. 3 da CF) e cuja implementao exigea formulao de polticas pblicas, apresentam um

    tr, que assegura o tnecessrio a ga-

    rantir a dignidade humana.

    O mnimo existencial considerado um direito s -

    t que exige presta-

    es positivas por parte do Estado: A dignidade humana e

    as condies materiais de existncia no podem retroceder

    aqum de um mnimo, do qual nem os prisioneiros, os do-entes mentais e os indigentes podem ser privados (TORRES,

    1990, p. 69-70).

    Para Ana Paula de Barcellos, o mnimo existencial for-

    mado pelas condies bsicas para a existncia e corresponde

    parte do princpio da dignidade da pessoa humana qual

    se deve reconhecer eccia jurdica e simtrica, podendo ser

    exigida judicialmente em caso de inobservncia (2002, p.248, 252-253).

    Costuma-se incluir no mnimo existencial, entre outros,

    o direito educao fundamental, o direito sade bsica,

    o saneamento bsico, a concesso de assistncia social, a

    tutela do ambiente, o acesso justia (ROCHA JUNIOR,

    2008, p. 21-24).

    esse ncleo central, esse mnimo existencial que, uma

    vez descumprido, justica a interveno do Judicirio nas pol-ticas pblicas, para corrigir seus rumos ou implement-las.

    Mas, de acordo com que critrios o Judicirio poder e

    dever intervir nas polticas pblicas? Imagine-se que a Prefei-

    tura decide construir um hospital num bairro pobre, que no

    tem saneamento bsico, sendo que em bairro prximo existe

    outro hospital. Qual mnimo existencial dever prevalecer?

    a que entra em ao o princpio da razoabilidade, que pode

    ser utilizado para corrigir uma poltica pblica equivocada.

    o que se passa a vericar.

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    4. segue: a Razoabilidade

    A razoabilidade mede-se pela aplicao do princpio cons-

    titucional da proporcionalidade. O princpio da proporcionali-

    dade signica, em ltima anlise, a busca do jt rentre os meios empregados e os ns a serem alcanados.

    Sobre o tema, Jos Joaquim Gomes Canotilho sustentou

    que o princpio da proporcionalidade em sentido amplo com-

    porta subprincpios constitutivos: a) prp fr

    (gtt), que impe que a me-

    dida seja adequada ao m; b) prp

    (erfrrkt) ou prp ou

    da r r p, que impe a idia de menor des-vantagem possvel ao cidado; c)prp prpr

    t rtrt (vrtkt) importando na justa

    medida entre os meios e o m. Conram-se suas palavras:

    O prp fr impe que a medi-da adoptada para a realizao do interesse pblico deve serprpr prossecuo do fim ou fins a ele subjacentes.

    Consequentemente, a exigncia de conformidade pressupe ainvestigao e a prova de que o acto do poder pblico ptpara e fros ns justicativos da sua adopo (zkfr-tt, zwktkt). Trata-se, pois, de controlar a rde adequao medida-m. []O prp , tambm conhecido como princpioda necessidade ou da menor ingerncia possvel, coloca atnica na ideia de que o cidado tem rt r t- p. Assim, exigir-se-ia sempre a prova de que, para a

    obteno de determinados ns, no era possvel adoptar outromeio menos oneroso para o cidado. []3) Prp prpr t rtrt (vrt-kt)Quando se chegar concluso da necessidade e adequao damedida coactiva do poder pblico para alcanar determinadom, mesmo neste caso deve perguntar-se se o resultado obtidocom a interveno proporcional carga coactiva da mesma.Est aqui em causa o prp prpr t

    rtrt, entendido como princpio da justa medida. Meios em so colocados em equao mediante um juzo de pondera-o, com o objectivo de se avaliar se o meio utilizado ou no

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    desproporcionado em relao ao m. Trata-se, pois, de umaquesto de medida ou desmedida para se alcanar um m:pesar as desvantagens dos meios em relao s vantagens dom. (CANOTILHO, 1996, p. 360, grifos meus).

    Alis, sob esse aspecto, vale lembrar o pensamento de

    Karl Larenz, para quem,

    no caso do princpio da proporcionalidade, na sua formula-o mais geral, em que requer ou exige apenas uma relaoadequada entre meio e m e que o dano que sobrevenha noesteja sem relao com o risco que devia ser afastado ( 228

    do BGB), trata-se de um princpio aberto, porque nestes casosno indispensvel uma valorao adicional. n trt tr jt , r, t t jt (1997, p.684, grifo meu).

    No mesmo sentido, escreveu Paulo Bonavides, com apoio

    em autorizada doutrina:

    Em sentido amplo, entende Muller que o princpio da propor-cionalidade regra fundamental a que devem obedecer tantoos que exercem quanto os que padecem o poder.Numa dimenso menos larga, o princpio se caracteriza pelo fatode presumir a existncia de relao adequada entre um ou vriosns determinados e os meios com que so levados a cabo.Nesta ltima acepo, entende Muller que

    prp prpr, rr rtr, t

    vez que os meios destinados a realizar um m no so por si prpr prpr tr e m particularmente evidente, ou seja, manifesta. (1980, p.357, grifo meu).

    Quanto sua natureza, Caio Tcito lembra que, no di-

    reito alemo, se confere ao princpio da proporcionalidade ou

    da proibio do excesso a natureza de r tt

    rt, que permite ao intrprete aferir a compatibilidadeentre meios e ns, de modo a evitar restries desnecessrias

    ou abusivas contra os direitos fundamentais (1996, p. 2).

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    E, nessa linha de raciocnio, Raquel Denize Stumm ressal-

    ta a atribuio, ao princpio da proporcionalidade, de princpio

    jurdico geral fundamental, tambm no direito ptrio:

    Em sendo um princpio jurdico geral fundamental, o princpioda proporcionalidade pode ser expresso ou implcito Cons-tituio. n rr, pr pr, t r rr tr. P f t, t t r t-t, f pt rptt. (1995, p. 121, grifo meu).

    No mesmo sentido, Paulo Bonavides escreveu:

    A importncia do princpio tem, de ltimo, crescido de maneiraextraordinria no Direito Constitucional. a prp r r t rt r tr tr ctt. A prevalece o entendimentoincontrastvel de que um sistema de valores via de regra faz aunidade normativa da lei maior. De tal sorte que todo princpiofundamental norma de normas, e a Constituio a soma detodos os princpios fundamentais. []u p prt t ptt prp prpr f trt trprt t rr t tr rt

    ft tr, pr prp tt prpr. (1980, p. 362-365-386/387, grifo meu).

    O princpio da proporcionalidade obriga a todos os Po-deres: legislativo, executivo e judicirio. A propsito lecionou

    Jos Joaquim Gomes Canotilho:

    O campo de aplicao mais importante do princpio da pro-porcionalidade o da rtrdos direitos, liberdades e ga-rantias por actos dos poderes pblicos. n tt, p prp prpr t-

    aos conitos de bens jurdicos de qualquer espcie. Assim, porexemplo, pode fazer-se apelo ao princpio no campo da relaoentre a pena e culpa no direito criminal. Tambm admissvel

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    o recurso ao princpio no mbito dos direitos a prestaes. ,por exemplo, o que se passa quando se trata de saber se umasubveno apropriada e se os ns visados atravs de suaatribuio no poderiam ser alcanados atravs de subvenes

    mais reduzidas.o prp pr p- t p t pr p. v r, -tr jr. (1996, p. 266, grifo meu).

    Especicamente com relao ao Poder Judicirio, oua-se

    a lmpida lio de Joo Batista Lopes:

    Pelo princpio da proporcionalidade o juiz, ante o conito levadoaos autos pelas partes, deve proceder avaliao dos interessesem jogo e dar prevalncia quele que, segundo a ordem jurdica,ostentar maior relevo e expresso. [] No se cuida, advirta-se, de sacricar um dos direitos em benefcio do outro, mas deaferir a razoabilidade dos interesses em jogo luz dos valoresconsagrados no sistema jurdico. (2001, p. 72-73).

    Por ltimo, cabe lembrar que o princpio da proporciona-

    lidade, ou da razoabilidade, tem sido amplamente reconhecido

    e aplicado pelo Supremo Tribunal Federal.

    Ainda sob a gide da Constituio de 1967, com Emenda

    de 1969, o Supremo aplicou o princpio da proporcionalida-

    de, embora sem esse nome, como critrio para a limitao de

    restries de direitos, deixando assentado que as medidas

    restritivas de direito no podem conter limitaes inadequa-

    das, desnecessrias e desproporcionais9. Referncia expressaao princpio, com a denominao de critrio de razoabili-

    dade, ocorreu no voto proferido pelo ministro Rodrigues

    Alkmin, considerado o em matria de aplicao

    do princpio: ao manifestar-se sobre a Lei n. 4116/62, que

    estabelecia exigncias para o exerccio da profisso de cor-

    retor de imveis, ficou assentado que o legislador somente

    poderia estabelecer condies de capacidade respeitando o

    critrio de razoabilidade, devendo o Poder Judicirio aferir

    9 HC 45.232, Rel. Min. Themstocles Cavalcanti, 1968 (RTJ 44/322).

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    se as restries so adequadas e justificadas pelo interesse

    pblico10.

    E em 1984, dois outros julgados do Supremo pautaram-

    se pelo princpio da proporcionalidade: as Representaes n.1077 e n. 1054, sendo relator o ministro Moreira Alves. Na

    primeira, tratava-se da elevao da Taxa Judiciria no Estado

    do Rio de Janeiro, sob o prisma da razoabilidade, entendendo-

    se que o poder de tributar no pode ser exercido de forma

    excessiva11. Na segunda, cuidava-se da constitucionalidade

    do art. 86 da Lei n. 5681, de 1971, que vedava o exerccio

    da advocacia aos juzes, membros do Ministrio Pblico e

    servidores pblicos civis e militares, durante o perodo dedois anos a contar da inatividade ou disponibilidade. Aqui

    tambm a questo foi decidida com suporte no princpio da

    proporcionalidade, sustentando-se que a restrio estabele-

    cida era desarrazoada12.

    Conclui-se da, com relao interveno do Judicirio

    nas polticas pblicas, que por meio da utilizao de regras

    de proporcionalidade e razoabilidade, o juiz analisar a si-

    tuao em concreto e dir se o administrador pblico ou o

    responsvel pelo ato guerreado pautou sua conduta de acordo

    com os interesses maiores do indivduo ou da coletividade,

    estabelecidos pela Constituio e nas leis. E assim estar

    apreciando, pelo lado do autor, r prt

    / f Pr P.E, por

    parte do Poder Pblico, t p tr

    rr. Conforme arma Eurico Ferraresi,em tesedefendida na Universidade de So Paulo,

    Vale dizer que, quando se discute t rr,discutem-se opes que devem ser tomadas pelo agente pblico,de forma equilibrada e harmoniosa []. Evidentemente, o juizno apenas p, , vericar se a escolha feita peloadministrador pblico respeitou os ditames legais. O que nopode ocorrer a alterao da escolha feita pelo agente pblico

    10 Rep.n. 930/DF, Rel. Min. Rodrigues Alkmin, DJU de 2.9.1977.11 Rep. n. 1077, Rel. Min. Moreira Alves (RTJ 112/34).12 Rep. n. 1054, Rel. Min. Moreira Alves (RTJ 110/967).

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    quando ela no se agure inapropriada. No momento em queo ordenamento jurdico permite ao agente pblico atuar comdeterminado campo de independncia, prt-, r-rt, r j p

    ft j rr [] (p.19/20, grifos meus).

    Nesse caso, conforme arma Celso Antonio Bandeira deMello, a censura judicial no implicaria invaso do mritodo ato (2001, p. 777). Em concluso, a interveno judicialnas polticas pblicas s poder ocorrer em situaes em que

    car demonstrada a irrazoabilidade do ato discricionrio pra-ticado pelo poder pblico, devendo o juiz pautar sua anlise

    em ateno ao princpio da proporcionalidade.

    5. segue: a ReseRva do PossvelA implementao de uma poltica pblica depende de

    disponibilidade nanceira a chamada rr p.E a justicativa mais usual da administrao para a omissoreside exatamente no argumento de que inexistem verbaspara implement-la.

    Observe-se, em primeiro lugar, que no ser sucien-

    te a alegao de falta de recursos pelo Poder Pblico. Estadever ser provada, pela prpria Administrao, vigorandonesse campo quer a regra da inverso do nus da prova (art.6, VIII, do Cdigo de Defesa do Consumidor), aplicvel poranalogia, quer a regra da distribuio dinmica do nus da

    prova, que exibiliza o art. 333 CPC, para atribuir a cargada prova parte que estiver mais prxima dos fatos e tivermais facilidade de prov-los13.

    Mas no s: o Judicirio, em face da insucincia derecursos e de falta de previso oramentria, devidamente

    comprovadas, determinar ao Poder Pblico que faa cons-tar da prxima proposta oramentria a verba necessria implementao da poltica pblica. E, como a lei oramen-tria no vinculante, permitindo transposio de verbas,

    13 Sobre a carga dinmica da prova e sua importncia no campo do controle

    das polticas pblicas pelo Poder Judicirio, ver ROCHA JUNIOR, 2008,

    p. 55-101.

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    o Judicirio ainda dever determinar, em caso de descum-primento do oramento, a obrigao de fazer consistente naimplementao de determinada poltica pblica (a construo

    de uma escola ou de um hospital, por exemplo). Para tanto,o par. 5 do art. 461 CPP servir perfeitamente para atingir

    o objetivo nal almejado.Desse modo, frequentemente a reserva do possvel pode

    levar o Judicirio condenao da Administrao a umaobrigao de fazer em duas etapas: primeiro, a incluso nooramento da verba necessria ao adimplemento da obrigao;e, em seguida incluso, obrigao de aplicar a verba para

    o adimplemento da obrigao.

    6. a obseRvncia dos limiTes como salvaguaRdaconTRa os excessos

    Os limites acima indicados so necessrios e sufi-

    cientes para coibir os excessos na interveno judicial empolticas pblicas.

    Tome-se o exemplo da sade: uma poltica pblica razo-

    vel (e, portanto, adequada) deve propiciar o atendimento aomaior nmero de pessoas com o mesmo volume de recursos.

    Merecem crticas, portanto por no atender ao requisito darazoabilidade , alguns julgados, em demandas individuais queconcedem ao autor tratamentos carssimos no exterior, ou aaquisio de remdios experimentais que sequer foram liberadosno Brasil. No se trata, nesses casos, de corrigir uma poltica

    pblica de sade que esteja equivocada. E no se pode onerar

    o errio pblico sem observncia da reserva do possvel.A estrita observncia dos limites interveno judicial,

    assim como o exato conceito de polticas pblicas (comoprogramas e aes tendentes ao atingimento dos objetivos doEstado brasileiro), sero sucientes para conter os abusos.

    7. sanes PaRa o descumPRimenTo da oRdemou deciso JudiciRia.

    Se, assim mesmo, o administrador descumprir a ordemou deciso judiciria, abrem-se diversas vias para a aplicao

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    de sanes: a) a aplicao de multa diria (trt) ou a

    ttulo de ato atentatrio ao exerccio da jurisdio; b) a res-

    ponsabilizao por ato de improbidade administrativa; c) a

    interveno no Estado ou no Municpio; d) a responsabilizaocriminal. Passamos a examinar essas tcnicas de coero.

    A mt r: medidas de coero patrimonial contra

    a Fazenda Pblica so legtimas, conforme j decidiu o STJ

    em sede de antecipao de tutela14. Todavia, conforme observa

    Eurico Ferraresi,

    no se pode esquecer o fato de que a multa diria recair, dire-tamente, no patrimnio pblico, bem de todos. E que, por isso,

    os efeitos de uma multa aplicada ao setor particular e ao setorpblico podem ser completamente diversos. [] A imposio demulta diria s tem efeito quando recai no patrimnio particu-lar do administrador pblico, pois, de contrrio, onerar-se-iaainda mais o errio. (p. 27).

    E continua anotando que, embora o montante da multa

    imposta a ttulo de trtpossa ser cobrada posteriormente

    do responsvel, seria necessria uma nova demanda judicial

    para a recuperao.

    Por outro lado, o montante xado a ttulo de multa, em

    ambos os casos, car inscrito como precatrio: o art. 100

    CF permite a requisio do pagamento da multa por esse

    instrumento.

    B Rp pr t pr -

    trt. A conduta do agente que descumpre deciso judicial

    subsume-se ao inc. II do art. 11 da Lei n. 8.429/92 Lei deImprobidade Administrativa que arma constituir ato de

    improbidade que atenta contra os princpios da Administrao

    Pblica retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de

    ofcio. ainda Ferraresi quem observa que o descumprimen-

    to de ordem judicial ofende a harmonia entre os Poderes, de

    modo que, havendo descumprimento, se deixa indevidamente

    de praticar ato de ofcio (p. 27).

    14 REsp. 790.175/SP, relator Jos Delgado, rel. p/ Acrdo Luiz Fux, 1

    Turma, j. 05.12.06, DJ 12.02.2007, p. 249.

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    C itr t p. O descumpri-

    mento da ordem judicial sujeita o estado ou o municpio a

    sofrer interveno poltico-administrativa, a m de corrigir a

    irregularidade. O art. 35, IV, CF estabelece que o Estado nointervir nos municpios, exceto quando o Tribunal de Justia

    der provimento a representao paraprr de lei,

    r j.Da mesma forma, a Unio

    no intervir nos estados ou no Distrito Federal, exceto para

    prr r j(art. 34, VI,

    CF). O Supremo Tribunal Federal deixou assentado:

    O dever de cumprir as ordens emanadas pelo Poder Judici-rio, notadamente nos casos em que a condenao judicial tempor destinatrio o prprio poder pblico, muito mais do quesimples incumbncia de ordem processual, representa uma in-contornvel obrigao institucional a que no se pode subtrairo aparelho do Estado, sob pena de grave comprometimento dosprincpios consagrados no texto da Constituio da Repblica.A desobedincia ordem ou deciso judicial pode gerar, emnosso sistema jurdico, gravssimas consequncias, quer noplano penal, quer no mbito poltico-administrativo (possibi-

    lidade de pt), quer, ainda, na esfera institucional(rt tr frnos estados-membrosou em municpios situados em Territrio Federal, ou de tr- tnos municpios.15 (Grifo meu).

    D cr rp . O

    teor do art. 1, inc. XIV, do Decreto-lei n. 201/67, constitui

    r rp prft p deixar de

    cumprir ordem judiciria, sem dar o motivo da recusa ou da

    impossibilidade, por escrito, autoridade competente.

    O STJ j decidiu que caracteriza o tipo descrito no art. 1,

    XIV, do Decreto-lei 201/67, o no cumprimento de ordem judi-

    cial, sem que o agente responsvel tenha justicado o motivo da

    recusa ou a impossibilidade de seu cumprimento, por escrito,

    autoridade competente16. Mas deve ser notado que, para a con-

    15 IF 590-QO, Rel. Min. Celso de Mello, j.17.09.98, DJ 9.10.98.16 REsp. 546.249-PB, Rel. Min. Felix Fischer, 5 Turma, j. 04.03.2004, DJ

    31.05.2004, p. 350.

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    gurao do crime de responsabilidade por descumprimento de

    ordem ou deciso judiciria, necessria a conduta dolosa do

    agente poltico. Nesse sentido, o STJ, na concesso de

    rp, visando ao trancamento da ao penal.17

    Mas, com relao ao r ,o STJ afas-

    tou a ilicitude penal por existir sano de natureza civil, pro-

    cessual ou administrativa aplicada em razo da omisso.

    Segundo a Corte, xada multa diria pelo descumprimen-

    to da deciso judicial, no caberia o oferecimento de denncia

    pelo crime de desobedincia, sendo o caso de trancamento

    da ao penal por atipicidade de conduta18. Mais longe ainda

    foi outro julgado do STJ:

    CRIME DE DESOBEDINCIA. PREFEITO MUNICIPAL. NOCONFIGURAO.1 Em princpio, diante da expressiva maioria da jurisprudncia,o crime de desobedincia denido no art. 330 do CP s ocorrequando praticado por particular contra a Administrao Pblica,nele no incidindo a conduta do prefeito municipal, no exercciode suas funes. que o prefeito municipal, nestas circunstn-cias, est revestido da condio de funcionrio pblico.2 Constrangimento indevido, representado pela clusulasob pena de incidir em crime de desobedincia ordem ju-dicial [].19

    Concluindo esse tpico, percebe-se que

    ,para faze face ao descumprimento da ordem ou

    deciso judicial pelo Poder Pblico, rp pr

    pr trt tr fr t

    et mp; , t t, pt-

    Prft mp r rp.

    17 HC 64.478/MT, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5 Turma, j.27.03.2008,

    DJ 12.05.08, p.1.18 HC 92.655/ES, Rel. Min. Napoleo Nunes Maia Filho, 5 Turma, j.

    18.12.2007, DJ 25.02.2008, p. 352.19 RHC 7.990/MG, Rel. Min. Fernando Gonalves, 6 Turma, j. 29.10.98,

    DJ 30.11.98, p.209.

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    8. a via PRocessual adequada PaRa PRovocaR o

    conTRole e a evenTual inTeRveno do Judici-

    Rio em PolTicas Pblicas

    O Cdigo Civil revogado asseverava, no art. 75: A todoo direito corresponde uma ao, que o assegura. Como bem

    aponta Kazuo Watanabe,

    No fosse a intransigncia doutrinria, surgida na fase em queo Direito Processual aspirava autonomia como um ramo da ci-ncia jurdica, o art. 75 do Cdigo Civil de 1916 poderia ter sidolido com explicitao, em nvel infraconstitucional, do prp ft tt jr pr.Para que dele se retirasse toda a conotao imanentista, basta-va que se lesse o texto como se nele estivesse escrito que a todaarmao de direito (e no um direito efetivamente existente)corresponde uma ao, que o assegura. O direito armado,como cedio, no a mesma coisa que direito existente.Alis, mesmo o texto constitucional (art. 5, no. XXXV) deveser lido com o mesmo cuidado, pois seu texto arma que alei no excluir da apreciao do Poder Judicirio leso ouameaa do direito, e sua leitura apressada poder conduzir auma concluso imanentista, quando na verdade o que nele searma que nenhuma armativa de leso ou ameaa a direitopoder ser excluda da apreciao do Poder Judicirio. (2007,p. 856, grifo meu).

    Mas o princpio expresso no Cdigo Civil revogado perma-

    nece em nosso ordenamento como decorrncia direta do art.

    5, inc. XXXV, da CF, e como manifestao do valor maior da

    efetividade do processo. E o Cdigo de Defesa do Consumidor

    abrigou-o expressamente, ao proclamar: Art. 83: Para a de-

    fesa dos direitos e interesses protegidos por este Cdigo

    t p p prpr

    ft tt (grifo meu).

    O legislador cuidou, assim, de tornar mais explcito ainda

    o princpio da efetiva e adequada tutela jurdica processual

    de todos os direitos consagrados pelo sistema. Nas sempreponderadas palavras de Kazuo Watanabe,

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    No se trata de mera enunciao de um princpio vazio eincuo, de um programa a ser posto em prtica por meiode outras normas legais. Cuida-se, ao revs, de norma au-toaplicvel, no sentido de que dela se podem extrair desde

    logo vrias consequncias. A primeira delas, certamente, ar pr rt t fr prp , pr r t fr p prtt, t rt, t t t rt r20. A segunda, que consectria da qualquer tipo deao coletiva, individual com efeitos coletivos ou meramenteindividual pode ser utilizada para provocar o Poder Judicirioa exercer o controle das polticas pblicas. E no importa a

    espcie de demanda: meramente declaratria, constitutiva oucondenatria, mandamental ou executiva t .Consequncia importante o encorajamento da linha dou-trinria, que vem se empenhando no sentido da mudana daviso do mundo, fundamentalmente economicstica, impreg-nada no sistema processual ptrio, que se procura privilegiaro ter mais que o ser21, fazendo com que t rt, ptr, prpt prtt , , tr f t pr(, t, r t.) t tt pr ft . (2007, p. 854-855, grifos meus).

    O princpio certamente aplicvel a todos os direitos einteresses, violados ou ameaados, mesmo fora das relaesde consumo. Alis, no custa lembrar que as disposiesprocessuais do Cdigo de Defesa do Consumidor aplicam-

    se tutela de qualquer direito ou interesse coletivo ( t

    ), por fora da correlao estabelecida pelo art. 90 doCDC (Aplicam-se s aes previstas neste Ttulo as normasdo Cdigo de Processo Civil e da . 7.347, 24 j

    20 Ver CHIOVENDA, Giuseppe. Dell azione nascente dal contratto pre-

    liminare, in Saggi di Diritto Processuale Civile (1930. v.1, p.110) e

    Instituies de Direito Processual Civil. (1942, v. I, p.84). Na busca da

    instrumentalidade substancial do processo, so igualmente vlidas tanto a

    perspectiva de Direito Material utilizados por alguns processualistas como

    a de Direito Processual de que se valem outros processualistas. A corretae equilibrada combinao dessas duas perspectivas, sem a intolerncia

    doutrinria que a nada conduz, a soluo que realmente se impe.21 Ver MOREIRA, 2007, p. 215-241.

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    1985, inclusive no que respeita ao inqurito civil, naquiloque no contrariar suas disposies [grifo meu]) e pelo art.21 da Lei 7.347/85 Lei da Ao Civil Pblica (Aplicam-se

    defesa dos direitos difusos, coletivos e individuais, no quefor cabvel, os dispositivos do Ttulo III da Lei que instituiu o

    Cdigo de Defesa do Consumidor). Isto quer dizer, em ltimaanlise, que o art. 83 do CDC, supra transcrito, aplica-se atodos os direitos difusos e coletivos, nos termos do art. 1,IV, da Lei da Ao Civil Pblica.

    E tem mais: certo que os direitos coletivos ( t )gozam de instrumentos processuais especcos de proteo: Lei

    da Ao Civil Pblica, Mandado de Segurana coletivo, Aopopular, Ao de Improbidade Administrativa. Mas certotambm que,pr tr , pr prt rt tr t t .

    Veja-se o seguinte exemplo: numa demanda individual,

    o autor pede autoridade pblica a interdio de um localnoturno, vizinho sua residncia, que infringe o direito aosilncio, tutelado pela lei. Trata-se de uma -

    , ft t, porquanto a interdio ouno do local ter efeitos sobre todos os membros da comu-

    nidade que vive na vizinhana. a r pr

    tt rt f.

    Outro exemplo: inconformado com a xao das mensali-

    dades de uma escola, um pai de aluno pede a correo da ta-

    bela de custos, para adapt-la aos critrios legais. Dependendo

    do pedido, portanto no apenas a reduo de sua mensa-lidade, mas a reviso da tabela que xou as mensalidades ,

    a tr ft t,beneciando, ou

    no, todos os estudantes da escola. a r

    pr tt rt t (trt ).

    Mais exemplos so trazidos por Kazuo Watanabe:

    Por exemplo, uma ao de anulao de deliberao assemblearde uma sociedade annima, que veicula matria de ordem geral,e no uma questo de interesse especco de algum acionista,ser uma t, mesmo que proposta por

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    apenas um ou alguns acionistas, e a respectiva sentena, sendoacolhedora da demanda, beneciar rt tt- t. Nessa espcie de conitos de interesses, noh lugar para a concomitncia de demandas individuais que

    objetivem o mesmo resultado prtico. suciente a propositura , pr t, prtp tt , p tt t, p p rpt tt t. No se negaa possibilidade de cada acionista ter uma pretenso individualespecca e diferenciada, pertinente somente a ele, em relao qual ser inquestionavelmente admissvel a demanda individual.Mas no fragmentvel em demandas individuais a pretenso

    anulatria, pois o provimento jurisdicional a ela correspondente

    tem pertinncia necessria totalidade dos acionistas.Para que semelhante distino que bem remarcada, cabe sermencionado um outro exemplo.A ao coletiva ajuizada com o escopo de se exigir a p t prt pr tr apta atutelar os interesses de toda a coletividade (interesses difusos,portanto). A ao individual que viesse a ser proposta por uma

    vtima, por exemplo, um morador da vizinhana, reclamando aindenizao pelos danos individualmente sofridos em virtudeda mesma poluio combatida na ao coletiva, veicularia umapretenso individual prpria e inconfundvel com a pretensocoletiva. Seria inegvel, nessa hiptese, a presena do requisitoda compatibilidade entre a pretenso coletiva e a individual.Mas, f prt - p, tr p t t. Suponhamos, para salientar bem essa distino, que

    outros moradores ajuizassem tambm aes individuais com amesma nalidade, qual seja, a de cessao da poluio. Todaselas estariam reproduzindo a mesma pretenso veiculada nademanda coletiva. s p t prpt pr , prt coletivo, pois benecia a totalidade das pessoas que se encon-tr t, t tr . Emsemelhante situao, seria suciente uma s demanda, sejaindividual ou coletiva. (2007, p. 799-800, grifos meus).

    Existem, portanto, demandas individuais com efeitos co-

    letivos, r tt tr rt f

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    t,conceituados no art. 81, I e II, do CDC,

    p t rt. 83 cdc, / rt. 21

    l a c P.

    Alis, tenho sustentado, em minhas aulas de ps-gradua-o22, que a conceituao de interesses difusos e coletivos, do

    art. 81, I, II e III do CDC, uma conceituao de rt t-

    r, pois antes mesmo que surja o processo, e independente-

    mente dele, pode nascer o conito sociolgico. E a norma de

    direito material dene quais so os direitos tutelados. tam-

    bm o que arma Kazuo Watanabe, com outras palavras:

    n p , o conito de interesses pode dizer respeito,a um tempo, a interesses ou direitos difusos e individuaishomogneos. Suponha-se, para raciocinar, uma publicidadeenganosa. Enquanto publicidade, a ofensa atinge um nmeroindeterminvel de pessoas, tratando-se em consequncia deleso a interesses ou direitos f. Porm, os consumidoresque, em razo da publicidade, tiverem adquirido o produto ouo servio ofertado, apresentaro certamente prejuzos indivi-dualizados e diferenciados, de sorte que estamos a diante de

    leso a interesses ou direitos .Limitando-se o autor da ao coletiva a postular, v.g., a retiradada publicidade enganosa, a tutela pretendida dos interessesou direitos difusos. ft tr tr pr. pr. o jt t pr, t p p, t t. (2007, p. 830, grifos meus).

    Mas h mais: tt jr -

    t p prp t p p prpr

    ft prt r rt tr.

    Vigora, nesse contexto, o postulado de tpda

    tutela jurisdicional, que foi bem salientado por Flvio Yar-

    shell. Conforme observou o processualista, a garantia da ao

    f rtr r t, pt r

    22 Disciplina de mestrado/doutorado Processos Coletivos, na Faculdade de

    Direito da USP; disciplina de mestrado, com o mesmo nome, na Faculdade

    de Direito de Vitria.

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    tr ( ) rt.

    Examinando a evoluo do conceito de ao, da perspectiva

    romana at a moderna, Yarshell bem observou que,

    rompendo com o sincretismo contido na tica do direito roma-no, cindiu-se o conceito da t, para se distinguir a existnciado direito, de um lado, e o poder de invocar a respectiva de-clarao ou atuao, de outro lado. Da porque se dizer que rt tpr t t t , rt, r tp(2006, p. 56-63, grifo meu).

    Ao tratar especicamente da atipicidade da ao no con-fronto com o interesse de agir (no indicador da via

    processual), observou o processualista: So frequentes as re-

    ferncias ao descabimento desta ou daquela ao, diante de

    certa situao de direito material armada pelo demandante,

    reputando-se este carecedor de ao por falta de interesse de

    agir (). O problema pode ser situado da seguinte

    forma: no momento em que o interessado valendo-se da

    garantia constitucional (ampla) da ao ingressa em juzo,

    precisa eleger a para a situao material

    que arma, isto , no deve se equivocar na escolha da

    pr. Advertiu Yarshell ser preciso tr pr

    tr, t tr pr, r

    r cuidando-se para que na

    passagem da ao constitucional (incondicionada) para a

    ao processual (condicionada, eis que exercida de formaconexa a uma dada relao material armada pelo deman-

    dante) no se perca o sentido e o alcance dessa primeira

    garantia. E mais:

    Quando se busca o tipo de ao cabvel para uma dada si-tuao de direito material (armada), deve-se levar em conta

    relativamente ao elemento adequao to-somente os

    seguintes dados: a) compatibilidade entre pedido (provimentoinvocado) e situao lamentada pelo demandante, de tal sorteque, em tese, a providncia alvitrada pelo autor seja idnea a

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    solucionar o mal de que se lamenta; b) compatibilidade entreo procedimento adotado pelo autor e a situao armada pelodemandante, de modo que os atos processuais, por seu enca-deamento, sejam aptos a conduzir o demandante ao ato nal

    que, como visto, (deve ser) idneo superao do estado decoisas exposto pelo autor.Sob um ngulo negativo, por assim dizer, a busca do tipode ao cabvel deve considerar: a) rr rt t ,

    pt ; b) que o equvoco quanto ao procedimento eleitono impede necessariamente que atinja o provimento (resultado)desejado, quer porque seja possvel adequ-lo ao procedimentocorreto, quer porque no existam diferenas expressivas entre o

    procedimento eleito e o procedimento corretamente ditado pelalei; c) que a invocao do fundamento legal no afeta o interes-se de agir e no vincula o rgo julgador, que deve consideraros fatos e fundamentos jurdicos expostos pelo demandante.(2006, p. 117/120, grifo meu).

    Verica-se, assim, que mesmo uma ao individual pode

    servir para a implementao ou a correo de uma poltica

    pblica: mas com a advertncia de se evitarem os excessos,conforme foi exposto no n. 6 supra. Disso tudo surge uma

    inarredvel concluso: r tp t, -

    ft t rt p r

    t pr prr Pr Jr rr tr

    p tr pt p.

    9. concluses

    Diante de todo o exposto, podem ser assentadas as se-

    guintes concluses:

    o Poder Judicirio pode exercer o controle das pol-1.

    ticas pblicas para aferir sua compatibilizao com

    os objetivos fundamentais da Repblica Federativa

    do Brasil (art. 3 CF);

    esse controle no fere o princpio da separao dos2.

    Poderes, entendido como vedao de interfernciarecproca no exerccio das funes do Estado;

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    consequentemente, o Judicirio pode intervir nas po-3.

    lticas pblicas entendidas como programas e aes

    do Poder Pblico objetivando atingir os objetivos

    fundamentais do Estado quer para implement-las,quer para corrigi-las quando equivocadas;

    h limites postos interveno do Judicirio em4.

    polticas pblicas. Tais limites so: . a restrio

    garantia do mnimo existencial; . a razoabilidade da

    pretenso individual/social deduzida em face do Po-

    der Pblico e a irrazoabilidade da escolha do agente

    pblico; . a reserva do possvel;

    a estrita observncia desses limites, assim como o5.correto entendimento do que sejam polticas pblicas,

    necessria e suciente para coibir os excessos do

    Poder Judicirio;

    para fazer face ao descumprimento da ordem ou6.

    deciso judicial pelo Poder Pblico, sem embargo da

    aplicao de trt pouco adequadas quando se

    trata da Fazenda Pblica , as sanes mais ecazes

    so a responsabilizao por improbidade administra-

    tiva e a interveno federal ou estadual no estado ou

    municpio; e, em mbito mais limitado, a imputao

    ao prefeito municipal o crime de responsabilidade;

    todas as espcies de aes coletivas, individuais7.

    com efeitos coletivos, ou meramente individuais so

    idneas a provocar o controle e a eventual interveno

    do Judicirio nas polticas pblicas.

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