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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
ACESSO À JUSTIÇA GRATUITA NO PROCESSO: RECURSOS E CONSEQUÊNCIAS DA CONCESSÃO
LUIZ VANDERLEI DA SILVA
Itajaí , Julho de 2006
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
ACESSO À JUSTIÇA GRATUITA NO PROCESSO: RECURSOS E CONSEQUÊNCIAS DA CONCESSÃO
LUIZ VANDERLEI DA SILVA
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Professor MSc. Jeferson Custódio Próspero
Itajaí , Julho de 2006
AGRADECIMENTO
A Deus, pela saúde e perseverança até aqui. A minha esposa, parceira e incentivadora; firme na sua insistência que me fez atingir um nível mais alto de conhecimento. Meus pais e irmãs, que mesmo de longe, torcem por meu sucesso. Sem esquecer daquele que, responsável pela orientação acadêmica, não mediu esforços para fazê-lo da melhor maneira possível.
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho de monografia ä minha esposa Simone, grande responsável por meu reingresso nos estudos. Parceira, crítica e incentivadora. Para você que também trilhou comigo todo este caminho, e , ao chegarmos juntos, provamos que nada se consegue sem esforço e perseverança. Amo-te, por tudo que você é.
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí , 04 de Julho de 2006
Luiz Vanderlei da Silva Graduando
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale
do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Luiz Vanderlei da Silva, sob o
título [Titulo da Monografia], foi submetida em 04 de julho de 2006 à banca
examinadora composta pelos seguintes professores:
Professor MSc. Jeferson Custódio Próspero - Orientador e Presidente da
Banca; Professor MSc. Arno Melo Schlichting – Membro da Banca; Professor
MSc. José Silvio Wolf – Membro da Banca e aprovada com a nota 9,8 (nove
vírgula oito).
Itajaí , 04 de Julho de 2006
Professor Msc Jeferson Custódio Próspero] Orientador e Presidente da Banca
................................................................................................. Coordenação da Monografia
ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CFRB/88 Constituição Federal da República do Brasil de 1988
LC Lei Complementar
CPC Código de Processo Civil
CLT Consolidação das Leis do Trabalho
LAJ Lei de Assistência Judiciária
OAB Ordem dos Advogados do Brasil
STF Supremo Tribunal Federal
STJ Superior Tribunal de Justiça
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.
Ação
É o direito ao exercício da atividade jurisdicional (ou o poder de
exigir esse exercício). Mediante o exercício da ação provoca-se a jurisdição, que por sua
vez se exerce através daquele complexo de atos que é o processo.1
Acesso ä justiça
A expressão "acesso à Justiça" é reconhecidamente de difícil
definição, mas serve para determinar duas finalidades básicas do sistema jurídico — o
sistema pelo qual as pessoas podem reivindicar seus direitos e/ou resolver seus litígios
sob os auspícios do Estado.2
Assistência judiciária
Na acepção restrita significa assistência técnica prestada por
profissional legalmente habilitado, que é o advogado, em juízo. Quando muito,
assistência prestada na fase pré-processual, mas sempre com vistas a uma demanda e à
pessoa com conflito de interesses determinado.3
Assistência jurídica
Na acepção ampla tem o sentido de assistência jurídica em juízo
ou fora dele, com ou sem conflito específico, abrangendo, inclusive, serviço de
informação e de orientação, e até mesmo de estudo crítico, por especialistas de várias
áreas do saber humano, do ordenamento jurídico existente, buscando soluções para sua
explicação mais justa e, eventualmente, sua modificação e, inclusive, revogação.4
1 CINTRA, GRINOVER E DINAMARCO, Teoria geral do processo, p. 247 2 PONTES DE MIRANDA, Francisco: Tratado das ações. Tomo I. Campinas: Ed. Bookseller,
1998, p.49. 3 PONTES DE MIRANDA, Francisco: Tratado das ações. Tomo I. Campinas: Ed. Bookseller,
1998, p.49. 4 WATANABE. Kazuo. Assistência Judiciária e o Juizado Especial de Pequenas causas, p.250
Beneficiário
Na justiça gratuita, é a parte que, não tendo condições de arcar
com as despesas do processo, fica dispensada de seu recolhimento, mediante
deferimento pelo Juiz do processo.
Conflito de interesses
(...) Há conflito entre dois interesses quando a situação favorável
para a satisfação de uma necessidade exclui a situação favorável para a satisfação de
uma necessidade diversa5.
Defensoria pública
Conforme art. 14 da CRFB/88 “A Defensoria Pública é instituição
essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a
defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV.”
Despesas processuais
(...)o código o emprega para abranger tudo o quanto deve ser
pago no processo, excluídos apenas os honorários advocatícios. As despesas
distinguem-se das custas ou dos emolumentos, como o gênero, da espécie.6
Direito processual civil
(...) o ramo do direito público que consiste no conjunto sistemático
de normas e princípios que regula a atividade da jurisdição, o exercício da ação e o
processo, em face de uma pretensão civil(..)7
Justiça gratuita (gratuidade processual ou gratuidade judiciária)
Por justiça gratuita, deve ser entendida a gratuidade de todas as
custas e despesas, judiciais ou não, relativas a atos necessários ao desenvolvimento do
processo e à defesa dos direitos do beneficiário em juízo.8
5GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro, p. 12 6 MARQUES, José Frederico. Manual de direito processual civil, p. 556 7 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro, p. 66 8 MARCANCINI, Augusto Tavares Rosa. Assistência Jurídica, Assistência Judiciária e Justiça
Gratuita, p. 31
Lei de assistência judiciária
Lei ordinária federal no. 1.060, de 05 de fevereiro de 1950, que
estabelece normas para a concessão da assistência judiciária aos necessitados, sendo
regra de natureza geral, tratando, tanto da assistência judiciária, quanto da justiça
gratuita.
Princípio da sucumbência
(...) consiste em atribuir à parte vencida na causa a
responsabilidade por todos os gastos do processo(...).9
Processo de conhecimento
(...) Quando o autor pede uma decisão ao juiz sobre o mérito de
sua pretensão,(...) e termina com uma sentença de declaração, constituição (modificação
de relações jurídicas) ou condenação.10
Sentença
São sentenças finais, ou simplesmente “sentenças” (segundo
terminologia do Código) as que encerram o processo”. (...)11
9THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual, p. 85 10 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro, p. 43 11 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual, p. 528
SUMÁRIO
RESUMO......................................................................................... XIII
INTRODUÇÃO ................................................................................XIV
CAPITULO 1 ...................................................................................... 2
O ACESSO À JUSTIÇA E O DIREITO PROCESSUAL 1.1 VALORES, INTERESSES E CONFLITOS ......................................................2
1.2 O ACESSO A JUSTIÇA...................................................................................4
1.3 BARREIRAS OU RESTRIÇÕES DO ACESSO À JUSTIÇA...........................8
1.4 DIREITO PROCESSUAL...............................................................................11
1.4.1 DIREITO PROCESSUAL CIVIL ....................................................................12
1.4.2 JURISDIÇÃO, AÇÃO E PROCESSO .............................................................13
CAPITULO 2 .................................................................................... 20
ASSISTÊNCIA JURÍDICA - ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA - JUSTIÇA GRATUITA 2.1 DA PREVISÃO DE GRATUIDADE NA LEGISLAÇÃO ESPARSA..............20
2.2 DA ASSISTÊNCIA JURÍDICA.......................................................................22
2.2.2 ASSISTÊNCIA JURÍDICA INTEGRAL PREVISTA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL ...23
2.2.3 CONCESSÃO DA ASSISTÊNCIA JURÍDICA ..................................................24
2.2.4 DEFENSORIA PÚBLICA............................................................................25
2.2.4.1 Conceito..................................................................................................26
2.2.4.2 Funções e formas de atuação........ 262.3 Assistência judiciária e a lei
1.060/50 ................................................................................................................28
2.3.1 DA PRESTAÇÃO DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA ..........................................28
2.3.2 CASOS DE USO DO TERMO “ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA” , NO SENTIDO DE
JUSTIÇA GRATUITA, NA LEI 1.060/50 ........................................................................30
2.3.3 ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA NO ÂMBITO DO ESTADO DE SANTA CATARINA ....31
2.4 JUSTIÇA GRATUITA ....................................................................................34
2.4.1 DESPESAS ALCANÇADAS PELO BENEFÍCIO ..............................................34
2.4.1.1 Taxa judiciária ........................................................................................36
2.4.1.2 Despesas – custas – emolumentos.....................................................37
2.4.1.3 Diligências do Oficial de Justiça..........................................................38
2.4.1.4 Honorários periciais...............................................................................39
2.4.1.5 Despesas das testemunhas ..................................................................41
2.4.1.6 Publicações oficiais...............................................................................42
2.5 DIFERENCIANDO OS INSTITUTOS.............................................................43
CAPITULO 3 .................................................................................... 46
A CONCESSÃO DA JUSTIÇA GRATUITA E CONSEQUÊNCIAS NO PROCESSO 3.1 BENEFICIÁRIOS E PROVA DA NECESSIDADE .........................................46
3.1.1 DO NECESSITADO E COMPROVAÇÃO DA NECESSIDADE ...............................46
3.1.1.1 Beneficiário - Pessoa natural ................................................................48
3.1.1.2 Beneficiário - Pessoa jurídica ...............................................................49
3.1.1.3 Beneficiário - Incapaz e revel ................................................................50
3.1.1.4 Beneficiário - Entes sem personalidade jurídica................................52
3.2 O PEDIDO DE JUSTIÇA GRATUITA E OS RECURSOS CABÍVEIS ...........52
3.2.1 MOMENTOS PARA O PEDIDO DE JUSTIÇA GRATUITA ..................................54
3.2.2 O DEFERIMENTO DO PEDIDO, IMPUGNAÇÃO E RECURSO CABÍVEL ...............55
3.2.3 DO INDEFERIMENTO DO PEDIDO E O RECURSO DO BENEFICIÁRIO ................58
3.2.4 DA REVOGAÇÃO DO BENEFÍCIO E O RECURSO CABÍVEL AO BENEFICIÁRIO ...59
3.3 CONSEQUÊNCIAS DA JUSTIÇA GRATUITA SOBRE AS VERBAS DA
SUCUMBÊNCIA ...................................................................................................60
3.3.1 PRINCÍPIO DA SUCUMBÊNCIA ....................................................................60
3.3.2 DA EXECUÇÃO DAS VERBAS DA SUCUMBÊNCIA...........................................62
3.3.2.1 Beneficiário vencedor............................................................................63
3.3.2.2 Beneficiário vencido ..............................................................................64
CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................. 68
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS .......................................... 72
RESUMO
O acesso à justiça é um tema que vem sendo discutido há
muito tempo, porém, a efetivação do acesso amplo é uma realidade que ainda não
existe.
A jurisdição é o meio, pelo qual, o Estado resolve os conflitos
de interesses, mediante a iniciativa da parte.
Para Garantia do acesso à justiça aos carentes de recursos
financeiros, a legislação brasileira prevê a existência de benefícios, como, a
assistência jurídica integral, a assistência judiciária e a justiça gratuita, cada um
com abrangência de benefícios diferentes.
A justiça gratuita, dispensa o beneficiário do pagamento das
despesas do processo, mediante simples declaração da impossibilidade de arcar
com as despesas do processo.
Enquanto persistir a condição de necessitado, o beneficiário
ficará isento do pagamento de todas as despesas que envolvem um processo,
inclusive nas verbas da sucumbência.
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto verificar as
consequências da concessão da justiça gratuita no processo judicial, no ponto em
que o beneficiário seja vencedor ou vencido no processo.
O seu objetivo é demonstrar que, na busca da solução de
conflitos, as pessoas recorrem à tutela jurisdicional do Estado. Este, por sua vez,
coloca à disposição dos necessitados, os meios de garantia de acesso gratuito,
cada qual com características distintas, conforme será estudado detalhadamente.
É na justiça gratuita, que se garante a dispensa de pagamento das despesas
processuais (sentido amplo), mediante declaração do necessitado.
Para tanto, principia-se, no Capítulo 1, tratando de mostrar a
necessidade do cidadão recorrer à jurisdição do Estado para resolver seus
conflitos de interesses.
Buscar-se-á estudar os principais institutos ligados ao Direito
processual, quais sejam, a ação, o processo e a jurisdição.
Quanto ao Direito Processual, um enfoque no Direito de
processo civil, e, referente ao processo, o trabalho foi desenvolvido tomando por
base o processo de conhecimento.
No Capítulo 2, tratando da diferenciação dos institutos da
assistência jurídica, assistência judiciária e justiça gratuita, que, como poderá ser
verificado no decorrer do trabalho, possuem conceitos e abrangência distintos,
embora, tratados como sinônimos.
A diferenciação é de fundamental importância no estudo do
acesso gratuito à justiça, visto que, por suas características, estarão a cargo de
diferentes órgãos, tanto estatais, quanto não estatais.
No Capítulo 3, Será tratado especificamente da justiça
gratuita, verificando o procedimento de concessão àquele que se declare
necessitado econômico.
A concessão poderá gerar uma reação da parte adversária,
que não é beneficiária da gratuidade. e, neste ponto, serão verificadas as formas
de recursos previstas para cada lado, ou seja, ao beneficiário e à parte adversa.
Também, as consequências jurídicas e econômicas
atribuídas às partes envolvidas no processo, mediante a concessão do benefício
da gratuidade.
O trabalho encerra-se com as Considerações Finais, nas
quais são apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da estimulação
à continuidade dos estudos e das reflexões sobre o acesso à justiça, as
diferenças existentes entre os institutos que concedem o acesso gratuito à justiça,
e as consequências atribuídas às partes envolvidas no processo, quando da
concessão da justiça gratuita.
Para a presente monografia foram levantadas as seguintes
hipóteses:
1. A assistência jurídica integral, a assistência judiciária e a
justiça gratuita, podem ser considerados institutos diversos perante a doutrina e a
legislação em vigor.
2. A concessão da justiça gratuita, isenta o beneficiário de
antecipar as despesas do processo, e, ao final, vencido, sua condição de
necessitado econômico o libera do pagamento das verbas da sucumbência.
3. A comprovação da perda da condição de necessitado,
caberá à parte contrária, tanto no decorrer do processo, quanto ao final, se
vencedor, para tornar exigível a sentença das verbas da sucumbência.
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que. na Fase
de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, e o Relatório dos Resultados
expresso na presente Monografia é composto na base lógica Indutiva.
Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as
Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa
Bibliográfica.
CAPITULO 1
O ACESSO A JUSTIÇA E O DIREITO PROCESSUAL
Neste primeiro capítulo, a abordagem será sobre a
necessidade da tutela do Estado na resolução dos conflitos.
O conflito de interesses leva à busca de uma solução, que
será obtida no poder de resolução de conflitos que tem o Estado.
Na resolução dos conflitos pela via judicial, será necessária
a iniciativa da parte, por meio de uma ação, que terá andamento pelo processo, e
uma resposta oficial, através da jurisdição.
Cabe ao Direito Processual, por sua vez, ditar as regras que
serão utilizadas na solução desses conflitos.
1.1 VALORES, INTERESSES E CONFLITOS
A necessidade do acesso à justiça, é gerado por conflitos,
que nascem, geralmente, por uma busca de valores, os quais, encontram a
resistência advinda de interesses contrários a sua pretensão.
Carnelutti, citado por Greco Filho, mostra claramente como
os conceitos de valor, interesse e conflito encontram-se interligados, ou seja:
(...) se interesse é uma situação favorável à satisfação de uma necessidade; se as necessidades são ilimitadas; se são, todavia, limitados os bens, isto é, a porção do mundo exterior apta a satisfazê-las, correlata à noção de interesse e de bens é a noção de conflito de interesses. Há conflito entre dois interesses quando a situação favorável para a satisfação de uma necessidade exclui
3
a situação favorável para a satisfação de uma necessidade diversa12.
Os homens possuem uma série de valores que provocam
interesses que, uma vez resistidos, geram conflitos.
De fato, os valores geram necessidades e interesses e estes, uma vez insatisfeitos, geram conflitos, dos quais não podemos escapar, e só nos resta criar mecanismos de solução que nos leve à paz social e à nossa realização, como homens, no seio da sociedade.13
A noção de “valores” está diretamente ligada aos “bens da
vida”, que os homens buscam realizar, tal como aponta Pontes de Miranda:
Já se disse que na distribuição dos bens da vida, incluindo-se neles o próprio viver, a liberdade, os direitos políticos, bem como a honra e a incolumidade individual, a vocação, os prazeres, as repulsas, grande parte dos direitos se conserva insubjetivada, constituindo domínio do direito objetivo puro, e outra parte se subjetiva. E a linha divisória entre direitos subjetivados e não subjetivados varia com os lugares e com o tempo.14
Assim, tal é a variedade de valores, nos dias atuais, que
surge um desequilíbrio entre as necessidades humanas e os bens disponíveis na
vida.
O interesse convergente sobre bens, portanto pode ser:
(a) individual, quando afeta uma pessoa; (b) coletivo, quando afeta um grupo de pessoas, representando a soma dos interesses individuais; (c) público, quando transcende, inclusive, a soma dos
12GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro, p. 12 13 BEZERRA, Paulo César. Acesso à Justiça: um problema ético-social no plano da
realização do Direito, p. 18 14 PONTES DE MIRANDA, Francisco: Tratado das ações. Tomo I. Campinas: Ed. Bookseller,
1998, p.49.
4
interesses individuais e afeta a sociedade como um todo, em seus objetivos básicos.15
Motivado pela escassez de bens suficientes à satisfação
dessas necessidades e pretensões, ou pela coincidência de pretensões de um
com as pretensões de outro, quanto ao mesmo bem, é que se diz que a
pretensão é resistida. Por consequência dessa resistência, surge o conflito.
Portanto, por tudo que foi visto até aqui, pode-se dizer que
conflito de interesses consiste na incompatibilidade de satisfação dos
interessados, uma vez que a plena satisfação de um, importa na exclusão da
satisfação do outro, e este embate de intenções acaba gerando os litígios entre
pessoas ou grupos.
1.2 O ACESSO A JUSTIÇA
A necessidade do acesso à justiça, pelo que se viu até aqui,
é gerada pelos conflitos de interesses não resolvidos .
Tema que pode ser verificado sob vários aspectos, e
debatido em todo o mundo, pois é tratado como um problema, qual seja, o
problema de atender a todas as camadas da população, sem distinção, o que,
para muitos, é missão impossível.
A expressão "acesso à Justiça" é reconhecidamente de difícil definição, mas serve para determinar duas finalidades básicas do sistema jurídico — o sistema pelo qual as pessoas podem reivindicar seus direitos e/ou resolver seus litígios sob os auspícios do Estado. Primeiro, o sistema deve ser igualmente acessível a todos; segundo, ele deve produzir resultados que sejam individual e socialmente justos.16
15 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. 1º V. 16ª ed. São Paulo: Saraiva,
2003, p. 13 16 CAPPELLETTI, Mauro e GARTH, Bryant, Acesso à Justiça, trad. de Ellen Gracie Northfleet,
p. 8
5
De acordo com a perspectiva do interessado, o estudo do
acesso à justiça terá conotações diferenciadas, conforme seja feita por um leigo,
um jurista, um sociólogo ou um filósofo.
Conforme Bezerra, para o cidadão comum, leigo das
ciências jurídicas, “(...)a visão leiga mira a mera oportunidade de estar perante o
juiz”17. Ou seja, o acesso ä justiça se restringe a oportunidade para estar em
juízo, pois ao cidadão comum não cabe delimitar o vasto campo de estudo deste
tema.
Numa perspectiva técnico-jurídica, portanto, mais ampla, em
relação à perspectiva leiga,
A visão e o tratamento técnico-jurídico do acesso à justiça passa pela análise do fundamento, pela efetividade e os conseqüentes obstáculos que devem ser vencidos, e enfim, pelo tratamento que as legislações dispensam à matéria.18
A visão sociológica, por outro lado, visa “(...)leis
sociologicamente fundadas, com eficácia real e plena, que viabilizem aos
aplicadores do direito, um maior leque de opções que permitam um efetivo acesso
à justiça.”19
Sobre Sociologia, Dourado de Gusmão, ao relacionar a
Ciência Jurídica com outras ciências, assim prescreve:
(...)é porque a Sociologia estuda os fatos sociais, ou seja, os fenômenos sociais. Ora, o direito é um fato social, resultante do impacto de diversos fatores sociais (religião, moral, econômico, demográfico, geográfico, etc.). A Sociologia versa sobre os costumes e as normas sociais; ora, é sabido que, em suas origens, o direito se apresenta sob a forma de costumes e, hoje,
17 BEZERRA, Paulo César Santos. Acesso à justiça: um problema ético-social no plano da
realização do direito, p. 125 18 BEZERRA, Paulo César Santos. Acesso à justiça: um problema ético-social no plano da
realização do direito, p. 126 19 BEZERRA, Paulo César Santos. Acesso à justiça: um problema ético-social no plano da
realização do direito, p. 145
6
costumes regulam o mercado juntamente com as normas jurídicas.20
E por último, mas não menos importante, podemos abordar
o acesso à justiça por uma ótica filosófica, “(...) neste sítio, o da filosofia, busca-se
traçar considerações sobre o acesso à justiça propriamente dita e não a justiça
feita pelos juízes.”21
O valor da filosofia reside mais nas perguntas – que são eternas – nas questões que suscita, do que nas respostas que dá historicamente. A pergunta é mais importante, lança a dúvida, quebra o gelo que encobre a realidade jurídica, abre novos horizontes, novas perspectivas, colocando em questão o estabelecido por respostas do passado.(...)22
A Constituição Federal de 198823 e a legislação
infraconstitucional24 concedem uma série de direitos e garantias àqueles que
necessitam da tutela jurisdicional. Porém, uma análise mais detida da realidade
demonstra que, apesar das garantias existentes no direito positivo, o acesso à
justiça não é amplo.
A efetividade perfeita, no contexto de um dado direito substantivo, poderia ser expressa como a completa "igualdade de armas" - a garantia de que a conclusão final depende apenas dos méritos jurídicos relativos às partes antagônicas, sem relação com
20 GUSMÃO, Paulo Dourado de, Introdução ao estudo do direito, p.24 21 BEZERRA, Paulo César Santos. Acesso à justiça: um problema ético-social no plano da
realização do direito, p. 147 22 GUSMÃO, Paulo Dourado de, Introdução ao estudo do direito, p.21 23 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF:
Senado, 1988. (Doravante, apenas Constituição Federal) 24 Em virtude da hierarquia das leis, temos como norma suprema a Constituição Federal e suas Emendas; depois, as leis complementares; a seguir, as leis ordinárias e tratados internacionais incorporados ao direito interno, e por fim, os decretos. Dentre as leis, as federais predominam sobre as estaduais e estas sobre as municipais, enquanto, a complementar prevalece sobre a lei ordinária.
7
diferenças que sejam estranhas ao Direito e que, no entanto, afeiam a afirmação e reivindicação dos direitos. 25
O efetivo acesso à justiça, seria a situação ideal, não só
pelo cidadão estar em juízo, mas também, possuindo todo um suporte de meios
na busca dos seus direitos.
A pretensão trazida pela parte ao processo clama por uma
solução que faça justiça a ambos os participantes do conflito e do processo. Por
isso é que se diz que o processo deve ser manipulado de modo a propiciar às
partes o acesso à justiça, o qual se resolve, na expressão da doutrina brasileira
recente, em "acesso à ordem jurídica justa".
Assim, (a) oferece-se a mais ampla admissão de pessoas e causas ao processo (universalidade da jurisdição), depois (b) garante-se a todas elas (no cível e no criminal) a observância das regras que consubstanciam o devido processo legal, para que (c) possam participar intensamente da formação do convencimento do juiz que irão julgar a causa (princípio do contraditório), podendo exigir dele a (d) efetividade de uma participação em diálogo —, tudo isso com vistas a preparar uma solução que seja justa, seja capaz de eliminar todo resíduo de insatisfação. Eis a dinâmica dos princípios e garantias do processo, na sua interação teleológica apontada para a pacificação com justiça.26
Conforme será verificado no decorrer deste trabalho, a
referida “igualdade de armas” não ocorre, mesmo quando existe a garantia do
acesso à justiça, pois, o Estado não tem estrutura para abranger todos os
benefícios que seriam necessários para a efetiva assistência aos necessitados.
Principalmente, quando é colocado ao particular, aos
serventuários extrajudiciais e judiciais, aos Advogados, peritos e assistentes, uma
obrigatoriedade de colaboração com a justiça, muitas vezes não devidamente
remunerados.
25CAPPELLETTI, Mauro e GARTH, Bryant , Acesso à Justiça, trad. de Ellen Gracie Northfleet, p.
15. 26 CINTRA, GRINOVER E DINAMARCO. Teoria geral do processo, p. 33
8
Tal colaboração de terceiros com o Estado, se dá pelo fato
de existir uma legislação bastante abrangente em direitos ao cidadão, mas ainda
não implementada na prática. Portanto, não foram criados os serviços estatais
necessários à concretização do efetivo acesso à justiça, daí, a necessidade da
participação de terceiros.
1.3 BARREIRAS OU RESTRIÇÕES DO ACESSO À JUSTIÇA
Muitos entraves ainda existem à efetividade do acesso à
justiça. Passando prioritariamente pela esfera socioeconômica, tais restrições
também possuem aspectos culturais, psicológicos e, na esfera do Direito,
jurídicas e procedimentais.
O primeiro grande problema sempre apontado como grande
entrave ao efetivo acesso à justiça, é a carência de recursos econômicos por
parte da população, para fazer frente aos gastos que implicam uma demanda
judicial. São custas judiciais, honorários advocatícios, longa duração dos
processos, entre outros que influenciam no custo do processo.
Do início ao fim do processo judicial, a parte deverá suportar
uma gama de despesas, que de acordo com César, podem ser resumidas da
seguinte forma:
(...) num primeiro momento, os honorários advocatícios ao advo-gado contratado para exercer o jus postulandi em juízo, depois, as custas de distribuição e quaisquer atos realizados a requerimento da parte, a instrução do processo com a produção de provas (perícias, diligências, etc.), o preparo de recursos eventualmente interpostos e, por fim, para aquele que tem improvidas suas alegações, os ônus da sucumbência, arcando com as despesas realizadas pela parte ex adversa, inclusive os honorários advocatícios de seus advogados.27
27CESAR, Alexandre . Acesso à justiça e cidadania, p.92
9
Por outro lado, no tocante aos aspectos sociais e culturais
das barreiras de acesso à justiça, Rodrigues resume em três, os pontos principais
de estrangulamento sócio-cultural ao acesso à justiça: “(...) o sistema
educacional, os meios de comunicação e a quase inexistência de instituições
encarregadas de prestar assistência jurídica preventiva e extrajudicial.”28
Ainda, a par de toda dificuldade, como citado acima, existe a
má utilização dos meios disponíveis, como mencionado por Bezerra:
(...) os mecanismos utilizados à guisa de facilitar o acesso à justiça como dispensa de custas, advogados dativos, dispensa de depósitos recursais, fomentam a enxurrada de ações trabalhistas e de ações de pequena causa, só porque seus autores sabem que isso não lhes acarreta nenhum custo econômico. Esquecem que, por outro lado, de forma dissimulada, acarretam custo social altíssimo que deve ser aqui considerado(...)29
A própria legislação, também pode ser vista como barreira,
dentro de uma visão socio-cultural, conforme destacado por Marinoni, quando
afirma que:
As legislações sucedem-se de forma rápida e tornam-se a cada dia mais herméticas; hermetismo, esse, que pode ser fruto da intensão de impedir o acesso crítico à legislação, o que distancia, cada vez mais, as normas da realidade social.30
Quanto ao fator psicológico, a maioria das pessoas tem
receio de estar em juízo. As pessoas, principalmente de rendas mais baixas,
temem, de certa forma, os Advogados e os membros do Ministério Público e da
Magistratura.
Procedimentos complicados, formalismo, ambientes que intimidam, como o dos tribunais, juizes e advogados, figuras tidas
28RODRIGUES, Horácio Wanderlei. Acesso à Justiça no direito processual brasileiro, p. 37 29BEZERRA, Paulo César Santos. Acesso à justiça: um problema ético-social no plano da
realização do direito, p.185/186 30 MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas do processo civil, p. 21
10
como opressoras, fazem com que o litigante se sinta perdido, um prisioneiro num mundo estranho.31
A própria demora na prestação jurisdicional, cria uma
barreira psicológica ao acesso, pois, o cidadão estando a par da morosidade na
solução dos conflitos, via judicial, será levado a medir as vantagens do uso dos
meios legais na solução de seu conflito.
A notória morosidade do aparelho judiciário, notadamente quando adotadas as vias processuais ordinárias, causa completa desesperança a quem busca o Judiciário, normalmente em uma atitude extrema e desesperada, já que esgotadas todas as tentativas de resolução extrajudicial do litígio.32
Algumas das principais questões neste âmbito são
elencadas por Horácio W. Rodrigues:
(a) existência, em determinadas situações, de excessivas espécies de recursos (em especial os agravos), procrastinando demasiadamente a resolução da lide; (b) a forma adotada para o procedimento sumariíssimo, que na prática não tem atingido suas finalidades; (c) a necessidade de simplificação do processo de execução; (d) o tratamento inadequado dado, em determinadas situações, ao processo cautelar, em especial no que se refere às denominadas cautelares satisfatívas; (e) o exagerado número de procedimentos especiais, (...); e (f) questões diversas, ligadas às exigências de formalidades excessivas, à forma de produção de provas e ao modo de efetivação das citações e intimações.33
Numa conclusão sobre as barreiras criadas pelos sistemas
jurídicos, verifica-se em Cappelletti & Garth:
Um exame dessas barreiras ao acesso, como se vê, revelou um padrão: os obstáculos criados por nossos sistemas jurídicos são
31 CAPELLETTI & GARTH, Acesso à Justiça, trad. de Ellen Gracie Northfleet., p. 24 32CESAR, Alexandre. Acesso à justiça e cidadania, p.100 33 RODRIGUES, Horácio Wanderlei. Acesso à justiça no direito processual brasileiro, p.45.
11
mais pronunciados para as pequenas causas e para os autores individuais, especialmente os pobres; ao mesmo tempo, as vantagens pertencem de modo especial aos litigantes organizacionais, adeptos do uso do sistema judicial para obterem seus próprios interesses.34
Portanto, pode-se dizer que as principais barreiras no
acesso à justiça, passa pela restrição econômica, no plano sócio-cultural, bem
como, de natureza psicológicas e jurídico-judiciais.
1.4 DIREITO PROCESSUAL
As funções do Estado, estão divididas em atividades
administrativas, legislativas e jurisdicionais.
Para cumprir a função jurisdicional, o Estado utiliza método
próprio, que é o processo, que recebe denominação de civil, penal, trabalhista,
administrativo etc., conforme o ramo do direito material perante o qual se
instaurou o conflito de interesses.
De forma ampla, pode-se dizer que Direito processual é o
“Ramo do direito público interno que estrutura os órgãos da Justiça e disciplina a
forma que devem tomar os processos judiciais. (...)”35, e estando diretamente
ligado ao processo, “(...)é o direito que disciplina o processo judicial, ou seja, a
seqüência de atos destinados a obter a sentença definitiva.”36
É no direito constitucional que o direito processual encontra
suas bases, conforme em Cintra et al:
O direito constitucional deita as bases do direito processual ao ins-tituir o Poder Judiciário, criar os órgãos (jurisdicionais) que o compõem, assegurar as garantias da Magistratura e fixar aqueles princípios de ordem política e ética que consubstanciam o acesso
34 CAPPELLETTI & GARTH, Acesso à Justiça, trad. de Ellen Gracie Northfleet, p. 28 35 ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário jurídico brasileiro Acquaviva, p.509 36 GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao estudo do direito, p.179
12
à justiça ("acesso à ordem jurídica justa ") e a chamada "garantia do devido processo legal" (due process of Law).37
Os principais conceitos atinentes ao direito processual, como
os de jurisdição, ação, defesa e processo, são comuns a todos os ramos distintos
do direito processual, autorizando assim a elaboração científica de uma teoria
geral do processo.
1.4.1 Direito processual civil
Primeiramente, convém frisar que, este ramo do direito
processual será utilizado no desenvolvimento deste trabalho, mais precisamente
no capítulo três, que tratará das consequências da justiça gratuita no processo
judicial, sempre focado no processo civil.
O direito processual está incluído no direito público, “uma
vez que governa a atividade jurisdicional do Estado” .
É dividido, conforme a matéria que trata, em civil, penal,
trabalhista, administrativo, etc.
Quanto à matéria a ser tratada, assevera Theodoro Júnior,
que:
“Conveniências de ordem prática, no entanto, levam o legislador a agrupar as normas processuais em códigos ou leis especializadas, conforme a natureza das regras aplicáveis à solução dos conflitos, e daí surgem as divisões que individuam o direito processual civil, o direito processual penal, o direito processual do trabalho, etc.”38
Pode-se conceituar direito processual civil, como:
37 CINTRA, GRINOVER E DINAMARCO. Teoria geral do processo. 15ª ed. São Paulo: Malheiros
Editores, 1999. p. 47 38 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, p. 6
13
(...) o ramo do direito público que consiste no conjunto sistemático de normas e princípios que regula a atividade da jurisdição, o exercício da ação e o processo, em face de uma pretensão civil (...)39
O direito processual civil é um ramo do direito público, pois a
jurisdição é sempre estatal e, portanto, pública.
Como um conjunto sistemático de normas e princípios, o
direito processual civil é composto por normas legais constantes do código e de
leis especiais, e interpretadas através do princípios do direito.
O campo de atuação do direito processual civil é bastante
amplo, e além de regular a aplicação jurisdicional do direito civil, regula também o
direito comercial, tributário, administrativo, constitucional, financeiro, ou seja,
sempre que não for de atribuição da justiça penal ou das justiças especiais.
O objeto do direito processual civil é a atividade jurisdicional,
o exercício do direito de ação e o processo. Estes três institutos fundamentais do
direito processual, serão tratados a seguir, com maiores detalhes.
1.4.2 Jurisdição, Ação e Processo
O Estado proíbe que se faça justiça com as próprias mãos,
(crime tipificado no art. 345 do nosso Código Penal)40. Portanto, a jurisdição é
monopólio estatal.
Podemos dizer que é uma das funções do Estado, mediante a qual este se substitui aos titulares dos interesses em conflito para, imparcialmente, buscar a pacificação do conflito que os envolve, com justiça. Essa pacificação é feita mediante a atuação da
39 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro, p. 66 40 Art. 345. Fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei permite.
14
vontade do direito objetivo que rege o caso apresentado em concreto para ser solucionado(...)41
Greco Filho, trata do conceito de jurisdição, como sendo ao
mesmo tempo; um poder, uma função e uma atividade, ao afirmar que:
A jurisdição é, em primeiro lugar, um poder, porque atua cogentemente como manifestação da potestade do Estado e o faz definitavamente em face das partes em conflito; é também uma função, porque cumpre a finalidade de fazer valer a ordem jurídica posta em dúvida em virtude de uma pretensão resistida; e ainda, é uma atividade, consistente numa série de atos e manifestações externas de declaração do direito e de concretização de obrigações consagradas num título.42
A função jurisdicional só atua diante de casos concretos de
conflitos de interesses, e sempre dependendo da iniciativa dos interessados. Daí
dizer-se que a jurisdição é atividade provocada e não espontânea do Estado.
Conforme dispõe o art. 2º do Código de processo Civil43
“Nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o interessado
a requerer, nos casos e formas legais.”
No processo judicial, o juiz atua em nome de uma entidade
que representa o Estado, de sorte que a justiça ocupa-se sempre de relações
materiais, das quais a instituição judiciária não faz parte.
O princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional , é
garantido pela Constituição de 1988, em seu art. 5°, inciso XXXV44, dispõe: "A lei
não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito".
41 CINTRA, GRINOVER E DINAMARCO. Teoria Geral do processo, p. 129 42 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro, p.167 43 BRASIL. Código de Processo Civil. Organização, seleção e notas Theotônio Negrão, com a
colaboração de José Roberto Ferreira Gouvêa. 33.ed. São Paulo: Saraiva, 2002. 44 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF:
Senado, 1988.
15
O princípio constitucional assegura, então, que nenhum
conflito poderá deixar de ser apreciado pêlos órgãos jurisdicionais, que darão a
solução final e definitiva para todo e qualquer litígio. Trata-se da garantia
constitucional do direito de ação.
A ação é o direito, ou ainda, a busca de uma satisfação,
entregue ao Estado, através do poder judiciário.
Invocação formal de uma pretensão, objetivamente tutelada
pela lei, perante o Poder Judiciário.(...)45
Daí por que, modernamente, prevalece a conceituação da ação como um direito público subjetivo exercitável pela parte para exigir do Estado a obrigação da prestação jurisdicional, pouco importando seja esta de amparo ou desamparo à pretensão de quem o exerce.46
Assim, uma vez provocado, o Estado deverá dar uma
resposta, usando de todos os meios disponíveis ao exercício da função.
Ação, portanto, é o direito ao exercício da atividade jurisdicional (ou o poder de exigir esse exercício). Mediante o exercício da ação provoca-se a jurisdição, que por sua vez se exerce através daquele complexo de atos que é o processo.47
De forma mais abrangente, Gusmão discorre sobre a ação,
já tratada como judicial, como meio de tutela do direito.
A forma correta de tutela das relações jurídicas, é portanto, a ação (judicial), que tem por objetivo declarar ou reconhecer determinado direito, reparar dano, fazer cessar ato antijurídico, condenar, e, enfim, possibilitar o exercício do direito impedido por
45ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário jurídico brasileiro Acquaviva, p.35 46 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, p. 50 47 CINTRA, GRINOVER E DINAMARCO, Teoria geral do processo, p. 247
16
alguém, ou então obrigar o cumprimento de obrigação legal ou contratual. (...)48
O direito de defesa, da mesma forma que o direito de ação,
é assegurado constitucionalmente.
Existe uma bilateralidade da ação, ou seja:
Em virtude da direção contrária dos interesses dos litigantes, a bilateralidade da ação e do processo desenvolve-se como contradição recíproca. O réu também tem uma pretensão em face dos órgãos jurisdicionais (a pretensão a que o pedido do autor seja rejeitado), a qual assume uma forma antitética à pretensão do autor.49
A defesa, portanto, é a forma de acesso ä justiça, garantida
constitucionalmente, porém, neste caso, é a manifestação em sentido contrário
ao autor da ação, mas que necessita de toda a proteção que foi garantida ao
primeiro.
Greco Filho, no tocante ao contraditório, afirma :
O contraditório se efetiva assegurando-se os seguintes elementos a) o conhecimento da demanda por meio de ato formal de citação; b) a oportunidade, em prazo razoável, de se contrariar o pedido inicial; c) a oportunidade de se produzir prova e se manifestar sobre a prova produzida pelo adversário; d) a oportunidade de estar presente a todos os atos processuais orais, fazendo consignar as observações que desejar; e) a oportunidade de recorrer da decisão desfavorável.50
Contraditório, resume-se então, na necessidade de
bilateralidade e na possibilidade de reação. O conteúdo do princípio constitucional
do contraditório é garantir aos litigantes, em igualdade de condições, o direito de
ação e o direito de defesa.
48 GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao estudo do direito, p. 257 49 CINTRA, GRINOVER E DINAMARCO, Teoria geral do processo, p. 269 50 GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro, p. 82.
17
Quanto ao processo, etimologicamente, significa “marcha
avante”, “caminhada” (do latim, procedere = seguir adiante). Assim, “o processo,
então, pode ser encarado pelo aspecto dos atos que lhe dão corpo e das relações
e igualmente pelo aspecto das relações entre os seus sujeitos.”51
O processo é indispensável à função jurisdicional exercida com vistas ao objetivo de eliminar conflitos e fazer justiça mediante a atuação da vontade concreta da lei. È por definição, o instrumento através do qual a jurisdição opera (instrumento para a positivação do poder).52
Através do processo, promove-se uma relação jurídica entre
os sujeitos envolvidos, melhor dizendo, uma relação jurídica processual.
Entre o pedido da parte e o provimento jurisdicional se
impõe a prática de uma série de atos que formam o procedimento judicial, isto é,
a forma de agir em juízo, e cujo conteúdo sistemático é o processo.
O processo também, como complexa ligação jurídica entre os sujeitos que nele desenvolvem atividades, é em si mesmo uma relação jurídica (relação jurídica processual), a qual, vista em seu conjunto, apresenta-se composta de inúmeras posições jurídicas ativas e passivas de cada um dos seus sujeitos: poderes, faculdades, deveres, sujeição, ônus.53
O princípio do devido processo legal, foi inserido entre as
garantias constitucionais, na Carta de 1988, em seu art. 5°, inciso LIV54: "Ninguém
será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal".
Por sua vez, o princípio da isonomia, aplicado ao processo,
implica o tratamento igualitário que deve ser atribuído a ambas as partes,
quaisquer que sejam as qualidades pessoais que detenham. O processo deve
51 CINTRA, GRINOVER E DINAMARCO, Teoria geral do processo, p. 275 52 CINTRA, GRINOVER E DINAMARCO, Teoria geral do processo, p. 275 53 CINTRA, GRINOVER E DINAMARCO. Teoria geral do processo, p. 280-281 54 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF:
Senado, 1988.
18
fornecer a ambas as partes os mesmos meios, aptos a permitir a demonstração
do direito que afirmam existir.
Além da garantia geral da isonomia, contida no art. 5°, caput,
da Constituição Federal55 - "todos são iguais perante a lei" -, há a promessa
contida no inciso LXXIV56: "O Estado prestará assistência jurídica integral e
gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos".
A igualdade perante a lei é premissa para a afirmação da igualdade perante o juiz: da norma inscrita no art. 5º, caput, da Constituição, brota o princípio da igualdade processual. As partes e os procuradores devem merecer tratamento igualitário, para que tenham as mesmas oportunidades de fazer valer em juízo as suas razões.57
Pode-se classificar o processo em três espécies distintas,
conforme a tutela jurisdicional posta à disposição das partes, ou seja, processo de
conhecimento, processo de execução e processo cautelar.
O primeiro, quando o autor pede uma decisão ao juiz sobre
o mérito de sua pretensão, e termina com uma sentença de declaração,
constituição (modificação de relações jurídicas) ou condenação.
Segundo a lição de Marques:
O processo de conhecimento é aquele em que a tutela jurisdicional se exerce na mais genuína de suas funções: a de dizer o direito (o ius dicere) e a do poder de julgar. Por isso nele se focalizaram, primacialmente, as grandes questões da doutrina processual quando, há mais de um século, esta se renovou e pôde conquistar conquistar foros da cidadania, para o Direito Processual Civil, nos domínios da ciência jurídica.58
55 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF:
Senado, 1988. 56 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF:
Senado, 1988. 57 CINTRA, GRINOVER E DINAMARCO, Teoria geral do processo, p. 275 58 MARQUES, José Frederico. Manual de direito processual civil, p. 1
19
Acrescentando ainda, Greco Filho, que traz com muito
acerto seu entendimento sobre o processo de conhecimento:
Será tutela jurisdicional de conhecimento quando o autor pede uma decisão ou sentença ao juiz sobre o mérito de sua pretensão, para que outrem, o réu, seja compelido a submeter-se ä vontade da lei que teria violado. Neste caso, o processo desenvolve-se com a produção de provas e termina por uma sentença de declaração, constituição (modificação de relações jurídicas) ou condenção.59
A Segunda espécie, refere-se ao processo necessário para
que seja o réu-condenado, compelido a cumprir o direito declarado na sentença.
O sistema processual ainda prevê a tutela cautelar, que tem
por fim, provisioriamente, garantir a permanência e integridade do direito até que
se concretize a sua execução.
20
CAPITULO 2
ASSISTÊNCIA JURÍDICA - ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA - JUSTIÇA GRATUITA
No capítulo anterior, foi verificado que, em virtude dos
conflitos gerados entre os indivíduos, cria-se a necessidade do acesso à justiça
para resolução desses conflitos, através da tutela jurisdicional do Estado.
Neste segundo capítulo, então, estará sendo tratado dos
instrumentos de acesso à justiça, previstos na Constituição Federal, na Lei
1.060/5060, que é de caráter geral na questão da assistência judiciária, e ainda em
leis específicas. Através destes dispositivos, o Estado prevê a possibilidade de
acesso ä justiça aos necessitados, por meio de serviços e gratuidades
específicas.
Conforme será verificado no decorrer deste capítulo,
existem três institutos tratando do acesso gratuito à justiça, qual sejam,
assistência jurídica, assistência judiciária e justiça gratuita, que serão
devidamente estudados e diferenciados.
Após um estudo aprofundado desses institutos, poderá ser
verificado que, em virtude de suas características e abrangências, trata-se de
institutos diversos, que não devem ser confundidos.
2.1 DA PREVISÃO DE GRATUIDADE NA LEGISLAÇÃO ESPARSA
A Lei nº 1.060/50 – Lei de Assistência Judiciária (LAJ), é de
caráter geral, prevendo a concessão do benefício da assistência judiciária gratuita
59 GRECO FILHO, Direito Processual Civil brasileiro, p.43 60 Lei 1.060, de 05 de fevereiro de 1950. Estabelece normas para a concessão da assistência
judiciária aos necessitados.
21
a quem provar não possuir recursos suficientes para demandar uma ação na
justiça sem prejuízo do sustento próprio ou da família.
Acontece que há previsões esparsas, nesse mesmo sentido,
em algumas leis especiais.
São alguns exemplos a Lei de Alimentos (Lei nº 5.478/68,
art. 1º, § 2º)61, o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (Lei nº 8.906/94,
art. 22, § 1º)62, a lei referente à Justiça Federal (Lei nº 9.289/96, art. 4º, II)63, a
Consolidação das Leis do Trabalho (Decreto-Lei nº 5.452/43, art. 514, b, e art.
790-A)64, a Lei dos Juizados Especiais (Lei nº 9.099/95, arts. 54 e 56)65, além
de previsão em Regimentos Internos, tais como o do STF (art. 62 )66 e do STJ
(art. 114 )67.
A lei de alimentos é aquela que prevê o procedimento
especial para a ação de alimentos, cuja finalidade é “(...)fornecer a um parente,
ex-cônjuge ou ex-convivente, aquilo que é necessário para sua
manutenção(...)”68, e devido a sua natureza, de atender ao necessitado de pensão
61 § 2º A parte que não estiver em condições de pagar as custas do processo, sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família, gozará do benefício da gratuidade, por simples afirmativa dessas condições perante o juiz, sob pena de pagamento até o décuplo das custas judiciais. 62 § 1º O advogado, quando indicado para patrocinar causa de juridicamente necessitado, no caso de impossibilidade da Defensoria Pública no local da prestação de serviço, tem direito aos honorários fixados pelo juiz, segundo tabela organizada pelo Conselho Seccional da OAB, e pagos pelo Estado. 63 Art. 4° São isentos de pagamento de custas: II - os que provarem insuficiência de recursos e os beneficiários da assistência judiciária gratuita; 64 Art. 514. São deveres dos sindicatos : b) manter serviços de assistência judiciária para os associados; Art. 790-A. São isentos do pagamento de custas, os beneficiários de justiça gratuita. (Incluído pela Lei nº 10.537, de 27.8.2002) 65 Art. 54. O acesso ao Juizado Especial independerá, em primeiro grau de jurisdição, do pagamento de custas, taxas ou despesas.
Art. 56. Instituído o Juizado Especial, serão implantadas as curadorias necessárias e o serviço de assistência judiciária. 66 Art. 62. A assistência judiciária, perante o Tribunal, será requerida ao Presidente antes da distribuição; nos demais casos, ao relator. 67 Art. 114. O requerimento dos benefícios da assistência judiciária, no Tribunal, será apresentado ao Presidente ou ao relator, conforme o estado da causa, na forma da Lei 1.060/50, com as alterações introduzidas pela Lei 7.510/86. 68 DINIZ, Maria Helena. Direito civil brasileiro, p. 487
22
alimentícia, já incorporou em seu texto a previsão da assistência judiciária ao
postulante.
O Estatuto dos Advogados, prevê o ressarcimento aos
Advogados que assistem os beneficiários da assistência judiciária, quando
nomeados. Tal remuneração será por conta do Estado, pois este é o responsável
pela assistência judiciária.
No âmbito da Justiça Federal, a pessoa que se declarar sem
condições de arcar com as despesas do processo, ou ainda, se já beneficiada
pela assistência judiciária, estará isenta das despesas para ingresso em juízo.
Na Justiça trabalhista, conforme previsto na CLT69, os
Sindicatos deverão prestar assistência judiciária aos sindicalizados, e em juízo, as
despesas do processo não serão exigidas daqueles beneficiados pela justiça
gratuita.
A Lei dos juizados especiais, não prevê a cobrança de
qualquer despesa no andamento dos processos .
Os Regimentos internos do STJ e STF, incorporaram em
seus textos a previsão da justiça gratuita, acompanhando o ordenamento da
CF/88 e da lei 1060/50 (Lei de assistência judiciária).
2.2 DA ASSISTÊNCIA JURÍDICA
Na Assistência Jurídica, o Estado, representa e auxilia o
necessitado em todos os campos, inclusive extrajudicialmente, com orientação,
informação, consultas, pareceres, etc.
Na acepção ampla tem o sentido de assistência jurídica em juízo ou fora dele, com ou sem conflito específico, abrangendo, inclusive, serviço de informação e de orientação, e até mesmo de
69 BRASIL. Consolidação das leis do trabalho. Decreto-lei n.º 5.452, de 1 de maio de 1943. Aprova
a consolidação das leis do trabalho.
23
estudo crítico, por especialistas de várias áreas do saber humano, do ordenamento jurídico existente, buscando soluções para sua explicação mais justa e, eventualmente, sua modificação e, inclusive, revogação. Mais adequado seria chamar-se serviço de semelhante amplitude de 'assistência jurídica', em vez de "assistência judiciária.70
A assistência jurídica é de conceito amplo, pois engloba
vários serviços, e na opinião de Marcancini, alcança a esfera extrajudicial, ou
seja,
(...)por envolver também serviços jurídicos não relacionados ao processo, tais como orientações individuais ou coletivas, o esclarecimento de dúvidas e mesmo um programa de informação a toda a comunidade.71
Do conceito de assistência jurídica, extrai-se que a
amplitude deste serviço ultrapassa os limites processuais.
2.2.2 Assistência jurídica integral prevista na constituição Federal
O artigo 5º , inciso LXXIV, da Constituição Federal72,
prescreve que "O Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que
comprovarem insuficiência de recursos."
(..)o adjetivo composto - jurídico-integral - constante no texto da Carta Maior possui dupla finalidade: a) a assistência transcende o Juízo, ou seja, é jurídica, efetivando-se onde estiver o Direito; b) a assistência é integral, não se esgotando na parte, na unidade, mas visa a integrar as seções e facetas de um todo; tem por
70 WATANABE. Kazuo. Assistência Judiciária e o Juizado Especial de Pequenas causas,
p.250 71 MARCANCINI. Augusto Tavares Rosa. Assistência Jurídica, Assistência Judiciária e Justiça
Gratuita, p. 33 72 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF:
Senado, 1988.
24
escopo, em uma palavra, coordenar os diversos grupos sociais, desintegrados do conjunto por sua marginalização.73
O amparo do Estado, não fica apenas na indicação de
profissional para assistência do necessitado em juízo.
A assistência jurídica da CF atual tem conceito abrangente que abarca a consultoria e atividade jurídica extrajudicial em geral, prestando informações no que pertine a aspectos legais, sobre comportamentos a serem seguidos diante de problemas jurídicos e, ainda, propondo ações e defendendo o necessitado nas demandas em face dele propostas74.
Sendo posto em prática o comando constitucional,
estaremos diante de um sistema completo, em que o Estado deverá atuar e
fornecer todos os meios para implementação do acesso à justiça.
Porém, como será verificado no decorrer deste trabalho,
esta obrigação estatal, acaba sendo transferida, em parte, para terceiros que, em
virtude de seu maior ou menor envolvimento, serão onerados pela insuficiência da
atuação do Estado.
2.2.3 Concessão da Assistência Jurídica
Para alcançar o benefício da assistência jurídica e, por
consequência, a judiciária, há a necessidade, primeiramente, de o postulante
fazer prova da insuficiência de recursos junto ao órgão administrativo incumbido
de prestá-las. Num primeiro momento, caberia à Defensoria Pública a prestação
do atendimento, desde que se encontre organizada no local da prestação da
assistência.
73 CARVALHO, Pedro Armando Egydio de. A defensoria Pública: um novo conceito de Assistência
judiciária, p.303 74 NERY, Nélson Júnior. Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, p.97.
25
Obtida a assistência jurídica pelo interessado, mediante a
comprovação da insuficiência de meios econômicos, se for o caso de propositura
de uma ação ou apresentação de uma defesa, deverá ele postular, também, só
que agora em juízo, a justiça gratuita.
Pertence a assistência jurídica ao direito público. É do ramo do direito administrativo, enquanto há relação entre o postulante e o Estado. Deste modo, não pode a parte, como afirma Pontes de Miranda, pré-excluir o direito de obtê-la e muito menos renunciar a ele.75
Pode-se dizer que, enquanto o art. 5°, inciso LXXIV76, da
Constituição Federal77, está endereçado para o órgão que presta assistência
jurídica, de modo que é ali que tem o postulante de fazer prova da insuficiência de
meios econômicos; o art. 4°, da Lei n. l .060/5078, refere-se ao processo em que
atuará o assistido.
Diante disso, claramente se vê que alguém pode obter
apenas consultoria jurídica, mas não necessitar de ajuda judicial, cabendo ao
postulante apenas comprovar, nesta hipótese, a sua insuficiência de recursos,
perante o órgão administrativo encarregado da assistência.
2.2.4 Defensoria Pública
Será este o órgão encarregado de prestar a Assistência
Jurídica prevista na CRFB/88.
75 CAMPO, Hélio Márcio. Assistência jurídica Gratuita, Assistência Judiciária e Gratuidade
Judiciária, p.64 76 Art. 5º, inciso LXXIV – o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. 77 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF:
Senado, 1988. 78 Art. 4º A parte gozará dos benefícios da assistência judiciária, mediante simples afirmação, na própria petição inicial, de que não está em condições de pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo próprio ou de sua família.
26
2.2.4.1 Conceito
A Defensoria Pública é instituição essencial à função
jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos
os graus, dos necessitados.
É o órgão estatal encarregado de prestar a assistência
jurídica integral, dotado de autonomia e considerado como serviço essencial ä
justiça.
Como se vê, entendeu o constituinte que, para prestar um serviço efetivo de assistência jurídica à população, deve ser instituído um organismo autônomo e independente. Deve-se assegurar a autonomia administrativa do órgão prestador e a independência dos membros que o compõem, daí ter o texto constitucional, desde logo, conferido aos defensores públicos uma garantia de independência - a inamovibilidade - e imposto uma vedação - o exercício da advocacia fora da função.79
É, assim, o órgão da administração pública a que se atribui,
por meio de seus agentes, a defesa, em juízo ou fora dele, das pessoas que não
têm condições de pagar honorários de advogado.
A Lei complementar nº 80, de 12 de janeiro de 199480, veio
regulamentar o art. 134 da CF81, prevendo sua atuação e o serviço a ser
prestado.
2.2.4.2 Funções e formas de atuação
Sob a rubrica de “funções essenciais ä justiça”, existem três
instituições públicas autônomas, conforme o interesse tutelado pelo Estado.
79MARCANCINI. Augusto Tavares Rosa. Assistência Jurídica, Assistência Judiciária e Justiça
Gratuita, p. 66 80 BRASIL. Lei complementar no. 80, de 12 de janeiro de 1994. Dispõe sobre a organização da defensoria pública. 81 Art. 134 A Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV.
27
Ao Ministério Público, nos termos do art. 127 da Constituição
Federal, incumbe “a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos
interesses sociais e individuais indisponíveis”.
A Advocacia-geral da União, bem como as Procuradorias
dos Estados, devem defender os interesses da União e dos respectivos Estados.
E, para a defesa dos interesses individuais daqueles que
não podem arcar com os custos dos serviços de atendimento jurídico, foi
instituída a Defensoria Pública.
Além da Defensoria Pública ter por função maior manter o
equilíbrio entre as classes sociais, o já referido art. 134 da Constituição Federal
delimita que é do ofício da instituição prestar assistência jurídica integral e gratuita
aos que comprovarem a insuficiência de recursos.
Esta assistência será no âmbito administrativo, quando o
serviço prestado se restringir a orientações e encaminhamentos; também
alcançará o âmbito judicial, quando o defensor público prestar assistência ao
necessitado em juízo.
O serviço de assistência jurídica compreende dois tipos de prestação de serviços jurídicos: o patrocínio judicial de causas, o que chamamos de assistência judiciária, e serviços jurídicos outros, extraprocessuais.82
A Defensoria Pública da União atua nos Estados, no Distrito
Federal e nos Territórios, perante a Justiça Federal, do Trabalho, Eleitoral, Militar,
nos Tribunais Superiores e, até mesmo, nas instâncias administrativas da União.
A Defensoria Pública dos Estados, atuará junto à Justiça e
serventias extrajudiciais locais, conforme dispuserem as leis de organização
judiciária do respectivo Estado, que terão suas bases assentadas na Lei
82 MARCANCINI. Augusto Tavares Rosa. Assistência Jurídica, Assistência Judiciária e Justiça
Gratuita, p. 70
28
Complementar n. 80/9483, já que podem legislar concorrentemente a respeito do
instituto.
2.3 ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA E A LEI 1.060/50
A assistência judiciária é o serviço estatal, prestado aos que
comprovarem a necessidade econômica, que tem por fim, a indicação de
advogado, para atuação em juízo.
Na acepção restrita significa assistência técnica prestada por profissional legalmente habilitado, que é o advogado, em juízo. Quando muito, assistência prestada na fase pré-processual, mas sempre com vistas a uma demanda e à pessoa com conflito de interesses determinado.84
A expressão “assistência judiciária” pode ser entendida em
várias acepções, e conforme poderá ser verificado mais adiante, a lei de
assistência judiciária emprega a expressão, tanto quando se refere a assistência
judiciária – serviço de nomeação de Advogado, quanto significando justiça
gratuita – não pagamento das despesas judiciais.
2.3.1 Da prestação da Assistência Judiciária
A prestação da assistência judiciária poderá ser efetivada
pela Defensoria Pública, Federal ou Estadual, bem como pela Ordem dos
Advogados do Brasil, ainda, por Advogado nomeado pelo juiz, e pelos escritórios-
modelo das faculdades de Direito.
Todo e qualquer Advogado que esteja legalmente investido
no cargo correspondente, estará habilitado a defender o assistido.
83 BRASIL. Lei complementar no. 80, de 12 de janeiro de 1994. Dispõe sobre a organização da
defensoria pública 84 WATANABE, Kazuo. Assistência Judiciária e o Juizado Especial de Pequenas causas,
p.250
29
Greco Filho afirma que “quem deve prestar assistência
judiciária é o Poder Público”85.
O art. 5.° da Lei 1.060/5086, autoriza o órgão judiciário
requisitar a indicação de advogado.
Primeiro, será solicitado à Defensoria Pública, porventura
organizada e mantida pelo Estado, que designará o defensor em dois dias úties
(art. 5.°, § 1.°)87.
No caso de não existir Defensoria organizada, será
solicitada à seção e à subseção da Ordem dos Advogados do Brasil, conforme o
caso, tratando-se de capital ou de município do interior (art. 5.°, § 2.°)88
O advogado dativo tem lugar onde não há atendimento da Defensoria Pública ou similares (v. g., escritórios-modelo de faculdades públicas. Ministério Público, Procuradorias do Estado ou do Município), como ocorre, por exemplo, no âmbito da Justiça Federal. Se na comarca houver serviço da Defensoria Pública ou similar, o juiz, em deferindo a assistência judiciária, determinará que o órgão indique o Defensor Público ou ocupante de cargo equivalente que patrocinará a causa, no prazo de dois dias (art. 5.°, § 1.°, Lei 1.060/50). Se não houver aquele serviço estatal, a nomeação de advogado dativo cabe à OAB (art. 5.°, §2.°, Lei 1.060/50).89
85 GRECO FILHO, Vicente .Direito processual civil brasileiro, p. 110 86 BRASIL. Lei 1.060, de 05 de fevereiro de 1950. Estabelece normas para a concessão da
assistência judiciária aos necessitados.
87 Deferido o pedido, o juiz determinará que o serviço de assistência judiciária, organizado e mantido pelo Estado, onde houver, indique, no prazo de 2(dois) dias úteis, o advogado que patrocinará a causa do necessitado. 88 2º Se no Estado não houver serviço de assistência judiciária, por ele mantido, caberá a indicação à Ordem dos Advogados, por suas seções Estaduais, ou Subseções municipais. 89DEMO, Roberto Luis Luchi. Assistência judiciária gratuita, p.736
30
Na hipótese de não haver subseção da OAB no local, "o
próprio juiz fará a nomeação do advogado que patrocinará a causa do
necessitado" (art. 5.°, § 3.°, da lei 1.060/50).90
Basicamente, a abrangência da Assistência Judiciária,
restringe-se na indicação ou nomeação de Advogado para atuação em juízo na
assistência do necessitado.
2.3.2 Casos de uso do termo “Assistência Judiciária”, no sentido de justiça
gratuita, na lei 1.060/50
A assistência judiciária e a justiça gratuita, conforme se
procura comprovar neste capítulo, são institutos diferentes, de abrangências
diversas.
Ocorre que, na lei 1.060/50, muitas vezes foram utilizadas
a expressão “assistência judiciária” , quando, na verdade, estava se referindo à
“justiça gratuita”.
Assim, temos no art. 3° que, "(...) a assistência judiciária
compreende as seguintes isenções: (...)". Na verdade, tais isenções, referem-se
à justiça gratuita, pois relacionam uma série de despesas previstas no decorrer de
um processo judicial.
No art. 4º91 , menciona as custas do processo e os
honorários de advogado, portanto, o texto do artigo deveria ser a parte gozará
dos benefícios da justiça gratuita e assistência judiciária...
O § 2° do mesmo artigo 4º, por sua vez, diz que "(...)a
impugnação do direito à assistência judiciária não suspende o curso do processo
e será feita em autos apartados".
90 3º Nos municípios em que não existirem subseções da Ordem dos Advogados do Brasil, o próprio juiz fará a nomeação do advogado que patrocinará a causa do necessitado. 91 A parte gozará dos benefícios da assistência judiciária, mediante simples afirmação, na própria petição inicial, de que não está em condições de pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo próprio ou de sua família.
31
Na verdade, a impugnação será intentada contra o
deferimento da justiça gratuita no processo judicial, isentando o beneficiário das
despesas.
O art. 6° determina que "(...) o pedido, quando formulado no
curso da ação, não a suspenderá, podendo o juiz, em face das provas, conceder
ou denegar de plano o benefício da assistência".
Igualmente equivocado, o art. 7°, menciona que "(...)a parte
contrária poderá, em qualquer fase da lide, requerer a revogação dos benefícios
de assistência, desde que prove a inexistência ou o desaparecimento dos
requisitos essenciais à sua concessão".
E, ainda, no art. 9°: "Os benefícios da assistência judiciária
compreendem todos os atos do processo até decisão final do litígio, em todas as
instâncias".
Em todos estes dispositivos, a expressão assistência
judiciária aparece no sentido de justiça gratuita, pois refere-se a concessão de
benefício relacionado às despesas do processo, portanto, não se trata
especificamente de serviço de assistência judiciária.
2.3.3 Assistência Judiciária no âmbito do Estado de Santa Catarina
O Estado de Santa Catarina, até a presente data, não
constituiu sua Defensoria Pública . Através da Lei Complementar Estadual
155/9792, criou-se um serviço de “Defensoria Dativa e Assistência Judiciária”,
prestado pela OAB/SC, para assistir, respectivamente, os casos de nomeações
de defensores na esfera criminal e assistência aos necessitados na área cível.
Através desta lei, o Estado presta atendimento de
assistência aos que comprovem necessidade, por meio de convênio com a
92 SANTA CATARINA. Lei complementar 155, de 15 de abril de 1997.Institui a Defensoria Pública
no Estado de Santa Catarina.DO. 15.655 de 15/04/97.
32
Ordem dos Advogados, prevendo os requisitos para obtenção do benefício e a
forma de retribuição aos Advogados (assistentes) envolvidos.
A Defensoria Pública é exercida pela “Defensoria Dativa e
Assistência Judiciária gratuita”, sendo que , para patrocinar causas cíveis é o
serviço de assistência judiciária gratuita, enquanto à defensoria dativa cabe o
patrocínio pelo advogado nomeado para promover a defesa do acusado na esfera
criminal.
O procedimento para obtenção da Assistência Judiciária,
previsto na LC 155/97, está contido nos arts. 7º e 8º, in verbis:
Art. 7º A remuneração pelo Estado ao Defensor Dativo e Assistente Judiciário, somente será devida quando a nomeação decorrer de pedido formulado pela parte interessada, por petição escrita, dirigida ao Juiz da Vara, verificada a insuficiência de recursos pelo magistrado ou autoridade judiciária competente para conhecer e julgar a pretensão civil ou criminal.
Art. 8º A petição deverá conter o nome, nacionalidade, estado civil, profissão, endereço completo, número de filhos, valor dos rendimentos mensais, se os tiver, e declaração de que não é filiado a entidade sindical, ou de classe, instruindo-a com os seguintes documentos:
I - declaração de rendimentos, se os tiver, expedida pelo empregador;
II - declaração de que possui, ou não, bens móveis e imóveis, firmada pelo requerente, e de que não tem condições de prover as despesas do processo e dos honorário advocatícios, sem prejuízo próprio ou de sua família.93
Note-se que, o serviço prestado, através da OAB/SC, é de
caráter de assistência em juízo, posto que, o pedido deverá ser encaminhado ao
Juiz, através de petição, contendo várias informações, para verificação da
necessidade da parte requerente.
93 SANTA CATARINA. Lei complementar 155, de 15 de abril de 1997.Institui a Defensoria Pública
no Estado de Santa Catarina.DO. 15.655 de 15/04/97.
33
Portanto, não alcança o serviço de assistência jurídica
integral, que deveria ser prestado por Defensoria Pública, e até o momento ainda
não encontra-se organizada no Estado de Santa Catarina.
Trata-se de serviço relevante prestado por profissionais do
Direito, que escolhidos pelo postulante ou indicado pelo juiz, aceitando o
encargo, terão direito a receber do Estado honorários fixados pelo juiz, nos
termos da tabela organizada pelo Conselho da Ordem dos Advogados do Brasil.
De outro lado, os Escritórios Modelo ou Núcleos de Prática
Jurídica das Universidades, vêm prestando assistência gratuita à população
carente. Contando com a colaboração de profissionais e estagiários dos cursos
de Direito , o rol de serviços, na área cível, criminal e trabalhista, vai desde uma
simples orientação até o ajuizamento de ações pertinentes aos casos trazidos ao
atendimento.
A prestação de assistência jurídica à população por estudantes de Direito desempenha uma função duplamente relevante para o aprimoramento das instituições jurídicas: de um lado, pelo próprio atendimento ao carente, permitindo a ele o acesso à justiça; de outro, pela contribuição à boa formação do profissional do Direito.94
Além da OAB/SC, a Universidade do Vale do Itajaí -
UNIVALI, através de seu Escritório Modelo de Advocacia, presta um serviço
comunitário de orientação, encaminhamentos, ingresso e acompanhamento em
juízo , e demais atividades dirigidas àqueles que se enquadrem em
determinados parâmetros .
Além de preparar os acadêmicos na prática jurídica, serve
para suprir a deficiência do Estado que, como se verifica em outras áreas, não
consegue cumprir as diretrizes contidas na legislação.
94 MARCANCINI, Augusto Tavares Rosa. Assistência Jurídica, Assistência Judiciária e Justiça
Gratuita. p. 70
34
2.4 JUSTIÇA GRATUITA
O benefício da justiça gratuita é direito à dispensa provisória
de despesas, exercível em relação jurídica processual, perante o juiz que promete
a prestação jurisdicional.
Tal dispensa é dita provisória, pois a partir do momento em
que seja verificada a mudança de condição econômica do beneficiário, serão
exigidos os pagamentos devidos às despesas do processo. Portanto, a justiça
gratuita ocorre enquanto permanecer a condição de necessitado.
Por justiça gratuita, deve ser entendida a gratuidade de todas as custas e despesas, judiciais ou não, relativas a atos necessários ao desenvolvimento do processo e à defesa dos direitos do beneficiário em juízo.95
Muitas vezes tomado por assistência judiciária, por influência
da redação da lei 1.060/50, a “justiça gratuita” encontra-se corretamente
mencionada no art. 19 do CPC96, que trata das despesas judiciais, portanto, daí
se pode conceituar este instituto, diretamente ligado a atividade jurisdicional.
2.4.1 Despesas alcançadas pelo benefício
O benefício da justiça gratuita permite ao necessitado estar
em juízo, independente do recolhimento das despesas que se fizerem
necessárias na atividade judicial.
Refere-se o art. 19 do Código de Pprocesso Civil, às
despesas judiciais, que é conceito mais amplo do que custas judiciais.
95 MARCANCINI, Augusto Tavares Rosa. Assistência Jurídica, Assistência Judiciária e Justiça
Gratuita, p. 31 96 Art. 19 - Salvo as disposições concernentes à justiça gratuita, cabe às partes prover as despesas dos atos que realizam ou requerem no processo, antecipando-lhes o pagamento desde o início até sentença final; e bem ainda, na execução do direito declarado pela sentença.
35
A relação contida no art.3º da lei 1.060/50, embora não
alcance todas as situações verificadas no decorrer do processo judicial, ainda
encontra-se em vigor.
Art. 3º A assistência judiciária compreende as seguintes isenções:
I – das taxas judiciárias e dos selos; II – dos emolumentos e custas devidos aos Juízes, órgãos do Ministério Público e serventuários da justiça; III – das despesas com as publicações indispensáveis no jornal encarregado da divulgação dos atos oficiais; IV – das indenizações devidas às testemunhas que, quando empregados, receberão do empregador salário integral, como se em serviço estivessem, ressalvado o direito regressivo contra o Poder Público federal, no Distrito Federal e nos Territórios; ou contra o Poder Público estadual, nos Estados; V – dos honorários de advogado e peritos; VI – das despesas com a realização do exame de código genético – DNA que for requisitado pela autoridade judiciária nas ações de investigação de paternidade ou maternidade.(Inciso incluído pela Lei nº 10.317, de 6.12.2001).
Na prática, a relação contida no art. 3º da lei 1.060/50, não é
exaustiva, pois, no decorrer do processo judicial, poderão aparecer despesas não
mencionadas na lei, mas indispensáveis ao andamento processual.
Em lugar de uma isenção genérica, envolvendo despesas e honorários, o art. 3º da Lei 1.060/50 discriminou o objeto da gratuidade. Melhor se conduziria o legislador, neste assunto, omitindo semelhante rol, porque o benefício não tolera limitações. E bastaria aplicar o art. 9º, segundo o qual “os benefícios da assistência judiciária compreendem todos os atos do processo até decisão final do litígio, em todas as instãncias”.97
De acordo com o art. 19 do CPC98, excetuando a justiça gratuita, cabe às partes
prover as despesas dos atos que realizam ou requerem no processo.
97 ASSIS, Araken de. Doutrina e prática do processo civil contemporâneo, p. 77 98Art. 19. Salvo as disposições concernentes à justiça gratuita, cabe às partes prover as despesas dos atos que realizam ou requerem no processo, antecipando-lhes o pagamento desde o início até
36
Amparado pela justiça gratuita, ficará o beneficiário isento da
antecipação das despesas efetuadas no processo. Conforme será verificado,
embora seja uma “dispensa” por parte do Estado, em muitos casos, tal benefício
será imputado à profissionais, serventuários e entidades, muitas vezes, por
imposição legal.
2.4.1.1 Taxa judiciária
O beneficiário da justiça gratuita ficará desobrigado de
antecipar a taxa judiciária, conforme previsto no inciso I, do art. 3°, da Lei n.
l.060/50.
Primeiramente, convém conceituar “taxa”, espécie do gênero
tributo, principalmente, por se tratar de despesa que não deve ser confundida
com as custas.
De um modo geral, tem-se entendido que a taxa configura uma obrigação legal cuja hipótese de incidência encontra-se vinculada a uma atividade estatal diretamente vinculada ao contribuinte. Esta atuação, consoante reza a regra-matriz das taxas (CRFB/88, art. 145, II), pode consistir num serviço público ou num ato de polícia.99
Conforme Araken de Assis: “trata-se do tributo dos litigantes
à Fazenda Pública pela iniciação ou terminação de cada feito, para os gastos que
tem com o serviço judiciário”.100
As taxas judiciárias não são propriamente custas judiciais, mas uma contribuição calculada sobre o valor da demanda que deve
sentença final; e bem ainda, na execução, até a plena satisfação do direito declarado pela sentença. 99 TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos do direito tributário, p. 68 100 ASSIS, Araken de. Doutrina e prática do processo civil contemporâneo, p. 77
37
ser paga, à Fazenda Pública, logo na propositura da ação ou no encerramento do feito.101
Uma vez que a taxa judiciária seria dirigida ao Estado,
através de sua Fazenda Pública, este, apenas deixa de arrecadar um tributo, ao
conceder a justiça gratuita.
2.4.1.2 Despesas – custas – emolumentos
A finalidade principal da gratuidade judiciária ou justiça
gratuita, consiste em isentar o necessitado das despesas do processo.
“Despesas”, portanto, podem ser tomadas de forma
genérica, englobando todo o dispêndio monetário envolvido no processo,
conforme preceitua o art. 20, § 2º do CPC.102
No dizer de Frederico Marques, quanto às despesas:
(...)o código o emprega para abranger tudo o quanto deve ser pago no processo, excluídos apenas os honorários advocatícios. As despesas distinguem-se das custas ou dos emolumentos, como o gênero, da espécie.103
As custas, por sua vez, são “(...)as verbas pagas aos
serventuários da justiça e aos Cofres Públicos, pela prática de ato processual,
conforme dispuser a tabela da lei ou regimento adequado.(...)”104
Na verdade, é preciso distinguir dois tipos de custas: as custas "stricto sensu" receita tributária do Estado, incidentes sobre a causa como um todo ou sobre determinados atos, que constituem a contribuição das partes para o custeio das despesas fixas do
101 CAMPO, Hélio Márcio. Assistência jurídica gratuita, assistência judiciária e gratuidade
judiciária, p. 79
102“As despesas abrangem não só as custas dos atos do processo, como também a indenização de viagem, diária de testemunha e remuneração do assistente técnico. 103 MARQUES, José Frederico. Manual de direito processual civil, p. 556 104 THEODORO JUNIOR, Humberto, Curso de direito processual civil, p. 84
38
Poder Judiciário; e os emolumentos, incidentes sobre determinados atos para ressarcimento dos gastos efetivamente ocorridos em decorrência da sua prática, que somente são exigidos quando tais atos tiverem de ser praticados e que se destinam à cobertura da despesa variável daí decorrente.105
A forma de pagamento das custas e o seu valor estão
disciplinados nos Regimentos de Custas baixados por leis estaduais no caso da
Justiça Estadual e por leis federais no caso da Justiça Federal e Justiças
especiais mantidas pela União.
Com relação aos emolumentos, estes “(...) constituem a
contraprestação pecuniária recebida por delegados do poder público, chamados
tradicionalmente de escrivães.”106
Tais emolumentos se referem aos valores devidos aos
Servidos não estatais, nas serventias extrajudiciais, tais como: Registros,
averbações, lavratura de escrituras, e demais ofícios do cartório, que tenham
relação com o processo a que tenha sido concedida a justiça gratuita.
2.4.1.3 Diligências do Oficial de Justiça
Aos oficiais de Justiça serão recolhidos os valores referentes
às diligências para cumprimento de atos próprios de seu cargo (intimações,
notificações, citações, etc.). Tais valores estão previstos em tabelas oficiais.
Para realização de ato que demande deslocamento do Oficial de Justiça, devem as partes recolher valor correspondentes as despesas com o deslocamento deste serventuário, que são a eles reembolsadas.107
105 GRECO, Leonardo. O valor da causa e as custas iniciais no mandado de segurança, p.21 106 VIDIGAL, Maurício. Lei de assistência judiciária interpretada, p. 28 107 MARCANCINI, Augusto Tavares Rosa. Assistência jurídica, assistência judiciária e justiça
gratuita, p. 38
39
Estes valores se prestam ao ressarcimento das despesas de
locomoção, pois estes serventuários não dispõem de viaturas ou veículos
próprios do poder judiciário para o cumprimento das diligências.
Se é certo que ao serventuário, como funcionário público que é, não pode ser exigido que cumpra as determinações judiciais as suas expensas, nem por isso deve o carente arcar com tais despesa. Ao Estado cumpre manter um sistema de caixa quanto a tais verbas, que permita reembolsar as despesas feitas pelo serventuário quando a parte for beneficiária, sem que esta tenha de suportar a antecipação das mesmas.108
Os beneficiários da justiça gratuita também estão
dispensados desta despesa processual, ou seja, de reembolsar os valores
necessários para locomoção do Oficial de Justiça ao endereço de realização do
ato processual.
2.4.1.4 Honorários periciais
Ao Perito que atuar no processo, serão devidos honorários,
em princípio, pela parte que requereu, ou ainda, quando requerida pelo Ministério
Público ou pelo Magistrado, a cargo do autor.
O termo “honorários”, segundo Acquaviva “(...) é o que se dá
em retribuição à prestação de um trabalho tido por nobre”.109
Sobre o conceito de perícia, temos em Acquaviva110 que é
“Espécie de prova consistente no parecer técnico de pessoa habilitada a formulá-
lo, visando firmar a convicção do juiz.”
O Perito é profissional de determinada área de
conhecimento, atuando como auxiliar do juiz, suprindo-lhe a falta de
conhecimentos específicos sobre o objeto da prova.
108 MARCANCINI. Augusto Tavares Rosa. Assistência Jurídica, Assistência Judiciária e Justiça
Gratuita, p. 38 109 ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário jurídico brasileiro Acquaviva, p. 707
40
Ocorre que, o adiantamento dos honorários periciais foram
alcançados pela isenção do beneficiário, e , ao final do processo, caberá tal ônus
ao "(...) não beneficiário, se vencido, ou ao Estado, ao qual incumbe a prestação
da assistência"111.
Todavia, parece injusto exigir do profissional que disponha
de seu tempo e dinheiro, quando atuar em colaboração com a justiça, conforme
opinião de Prudente, ou seja:
O Estado-Juiz não deve, sem amparo na sistemática legal, obrigar o perito, que se dispôs a auxiliá-lo, no deslinde da causa, a retirar de seus vencimentos ou salários, necessários à sua subsistência. as despesas que haverá de ter na realização da perícia, para ser ressarcido, ao final, pela Fazenda Pública (federal, estadual ou municipal e suas respectivas autarquias), através do instrumento injusto do precatório, com dilatado tempo, em parcelas.112
No caso dos honorários periciais ter sido originado por
requerimento de prova em favor do beneficiário da justiça gratuita, e estando este
isento do pagamento, ao perito restará aguardar ao final do processo, conforme a
sentença determinar a quem caberá tal ônus.
Em alguns Estados, o Judiciário dispõe de verba orçamentaria específica e o juiz da causa requisitará o pagamento, na maneira estipulada pêlos regulamentos locais. Fora dessa hipótese, não se dispondo a parte desobrigada a adiantar os honorários, voluntariamente, resta aguardar o oportuno pagamento do precatório ou a altruística colaboração do perito.113
A questão se acha bastante controversa, pois, mesmo
colaborando com a justiça, o perito nomeado para atuar na formação de prova em
benefício do necessitado, deverá arcar com as despesas inerentes ao cargo,
110 ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário jurídico brasileiro Acquaviva, p. 1007 111ASSIS, Araken de. Doutrina e prática do processo civil contemporâneo, p. 80 112 PRUDENTE, Antônio de Souza. Custas processuais, p. 18 113ASSIS, Araken de. Doutrina e prática do processo civil contemporâneo , p. 80
41
principalmente pelo comando do art. 14 da LAJ114, em que o perito estará sujeito
a multa, caso não aceite o encargo.
2.4.1.5 Despesas das testemunhas
A testemunha, por motivo de deslocamento até a sede do
juízo, bem como, em virtude de sua atividade profissional, quando não amparada
por vínculo trabalhista, poderá ter que enfrentar despesas para comparecimento
ao ato.
Quanto ao conceito de Testemunha, pode-se utilizar aquele
contido no dicionário Acquaviva:
Pessoa natural que, não sendo parte diretamente interessada no objeto de diereito, é convocada para atestar, judicialmente ou extrajudicialmente, a existência ou esclarecimento de ato ou fato que tenha conhecimento.(...)115
O art. 419 do Código de Processo Civil116 prevê indenização
às testemunhas por despesas de comparecimento à audiência.
Vidigal entende que, “(...)se a testemunha não pode cobrar
do beneficiário da assistência judiciária as despesas pelo comparecimento, tem o
direito de exigi-las do Estado”.117
Assim, a testemunha que efetuou despesas para
comparecimento à audiência, e tendo sido arrolada pela parte beneficiária da
114 Art. 14. Os profissionais liberais designados para o desempenho do encargo de defensor ou de perito, conforme o caso, salvo justo motivo previsto em lei ou, na sua omissão, a critério da autoridade judiciária competente, são obrigados ao respectivo cumprimento, sob pena de multa de mil cruzeiros a dez mil cruzeiros, sujeita ao reajustamento estabelecido na Lei nº 6.205, de 29 de abril de 1975, sem prejuízo de sanção disciplinar cabível. (Redação dada pela Lei nº 6.465, de 14.11.77) 115 ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário jurídico brasileiro, p. 1330 116 “Art. 419. A testemunha pode requerer ao juiz o pagamento da despesa que efetuou para comparecimento à audiência, devendo a parte pagá-la logo que arbitrada, ou depositá-la em cartório dentro de 3 (três) dias.” 117 VIDIGAL, Maurício. Lei de assistência judiciária interpretada, p.29/30
42
justiça gratuita, não terá sucesso no reembolso de sua despesa nos moldes do
art. 419 do CPC acima citado, pois a parte está isenta de tal pagamento.
Quanto ao seu direito de exigir o pagamento do Estado, em
vista da impossibilidade do beneficiário, tal previsão se dá porque o Estado é o
responsável pelo benefício concedido.
2.4.1.6 Publicações oficiais
Existem atos no processo judicial, cuja publicação na
imprensa é procedimento obrigatório, como requisito de publicidade dos atos
judiciais. Aos órgãos de imprensa, oficial ou não, serão devidos o pagamento
pelo serviço.
Para melhor atender aos beneficiários da justiça gratuita,
nos atos de publicação afeitos a estes, bastará a publicação no órgão de
imprensa oficial, conforme explica Vidigal:
Para a citação por edital, dispõe o § 2° do art. 232 do Código de Processo Civil que "a publicação do edital será feita apenas no órgão oficial quando a parte for beneficiária da Assistência Judiciária". Com relação ao edital que antecede a realização de hasta pública, o art. 687, § 1°, dispõe que "a publicação do edital será feita no órgão oficial, quando o credor for beneficiário da justiça gratuita".118
Portanto, a publicação de atos judiciais por meio da
imprensa oficial, é um meio de desonerar a imprensa privada, pois ao beneficiário
da justiça gratuita não será exigido o pagamento pela publicação.
118 MARCANCINI. Augusto Tavares Rosa. Assistência Jurídica, Assistência Judiciária e Justiça Gratuita. p. 46
43
2.5 DIFERENCIANDO OS INSTITUTOS
Por tudo que foi visto, com relação aos institutos ligados à
gratuidade, no processo ou fora dele, é comum verificar que, entre os operadores
do Direito, ocorre o uso de um instituto pelo outro como sinônimos, inclusive,
também verificado na legislação.
Portanto, ao serem apresentados separadamente, objetivou-
se a diferenciação existente entre a assistência jurídica, assistência judiciária
e justiça gratuita, que, conforme foi verificado, possuem reflexos distintos sobre
o recolhimento de custas, despesas processuais e pagamento de honorários.
No assunto, impõe-se distinguir três institutos: primeiro, a assistência jurídica integral, acima referida, e que compreende consulta e a orientação extrajudiciais, representação em juízo e gratuidade do respectivo processo; em seguida, a assistência judiciária, ou seja, o “serviço público organizado, consistente na defesa em juízo do assistido, que deve ser oferecido pelo Estado, mas que pode ser desempenhado por entidades não-estatais, conveniadas ou não com o poder público” ; e, finalmente, a gratuidade da justiça, “a gratuidade de todas as custas e despesas, judiciais ou não, relativas a atos necessários ao desenvolvimento do processo e à defesa dos direitos do beneficiário em juízo”, objeto da Lei 1.060, de 05.02.1950, sucessivamente alterada.119
Como bem anota Castro, quando se refere ao uso da
expressão assistência judiciária por justiça gratuita, “o equívoco tem origem nos
próprios textos legislativos, que empregam as duas expressões indistintamente,
como se tivessem o mesmo significado”.120
O texto da lei 1.060/50 (Lei da assistência judiciária), embora
já bastante modificado desde a sua origem, não obteve as alterações no tocante
a diferenciação dos institutos ligados a assistência judiciária e a gratuidade
processual aos necessitados, ocorrendo muitas vezes o uso de um termo pelo
outro, conforme será verificado mais adiante.
119 ASSIS, Araken de. Doutrina e prática do processo civil contemporâneo, p.75/76
44
Assistência é o termo designado, quando se menciona a
prestação de um serviço. No caso em estudo, serviço de assistência, prestado
pelo Estado, para pessoas que se enquadram na qualidade de necessitados.
A palavra assistência tem o sentido de auxílio, ajuda. Assistir significa auxiliar, acompanhar, estar presente. Assistência nos traz a idéia de uma atividade que está sendo desempenhada, de uma prestação positiva. E, neste sentido, por assistência judiciária deve ser entendida a atividade de patrocínio da causa, em juízo, por profissional habilitado.121
Dando maior amplitude ao termo “assistência”, a
Constituição Federal122 traz em seu texto o termo “Assistência jurídica integral”,
que prevê o serviço que deverá ser prestado pelo Estado, não só nos limites
judiciais, como também, no atendimento às mais variadas necessidades do
cidadão que busca orientação e encaminhamentos, também, fora do processo
judicial.
No âmbito do processo judicial, ou nas atividades
relacionadas a este, o Estado deverá conceder “isenções”, deixando de exigir
determinados pagamentos, que possibilitem o acesso à justiça daqueles que
comprovem não possuir condições de arcar com tais pagamentos.
A gratuidade processual é uma concessão do Estado, mediante a qual este deixa de exigir o recolhimento das custas e das despesas, tanto as que lhe são devidas como as que constituem crédito de terceiros. A isenção de custas não pode ser incluída no conceito de assistência, pois não há a prestação de um serviço, nem desempenho de qualquer atividade; trata-se de uma postura passiva assumida pelo Estado.123
120 CASTRO, José Roberto de. Manual de assistência judiciária, p. 25 121 MARCANCINI. Augusto Tavares Rosa. Assistência Jurídica, Assistência Judiciária e
Justiça gratuita, p. 8 122 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF:
Senado, 1988. 123 MARCANCINI. Augusto Tavares Rosa. Assistência Jurídica, Assistência Judiciária e
Justiça Gratuita, p. 8.
45
Assim, o termo justiça gratuita, gratuidade processual ou
gratuidade judiciária, se referem `a concessão aos necessitados de ingressar em
juízo, sem a exigência de pagamentos previstos para o andamento do processo.
Enquanto que, por assistência, deve ser entendida a
prestação de um serviço, que, sendo de forma ampla se configura na Assistência
jurídica, e de forma mais restrita, na Assistência judiciária.
46
CAPITULO 3
A CONCESSÃO DA JUSTIÇA GRATUITA E CONSEQUÊNCIAS NO PROCESSO
Este último capítulo, tratará da concessão da justiça gratuita
e as conseqüências judiciais e econômicas advindas dessa concessão.
Serão verificadas quais são os beneficiários e a forma de
provar a condição de necessitado.
Por outro lado, verificar-se-á os meios pelos quais a parte
adversa poderá contrariar referida concessão.
Por fim, será verificada a conseqüência da justiça gratuita,
quando da sentença, referente às verbas da sucumbência.
3.1 BENEFICIÁRIOS E PROVA DA NECESSIDADE
Como forma de garantir o acesso à justiçca, ampliou-se o
benefício além das pessoas físicas, conforme será verificado.
Quanto à comprovação, a lei exige apenas a declaração de
impossibilidade de arcar com as despesas do processo.
3.1.1 Do necessitado e comprovação da necessidade
Necessitado é aquele que pleiteia no processo judicial o
benefício da justiça gratuita, para tornar-se beneficiário desta e ficar isento de
todas as despesas previstas no andamento do processo.
No parágrafo único do art. 2° da lei 1.060/50, verifica-se :
47
Parágrafo único. Considera-se necessitado, para os fins legais, todo aquele cuja situação econômica não lhe permita pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família.
Porém, não se pode definir com exatidão a figura do
necessitado, e conforme aponta Vidigal, sobre a importância da verificação pelo
Magistrado quando da concessão do benefício da justiça gratuita:
Não há critério bem definido para o reconhecimento da necessidade que autoriza a concessão do benefício.(...) E impossível a estipulação de critério objetivo que possa ser usado nas hipóteses que surgem. A concessão ou o indeferimento do pedido estará sempre submetido a certa subjetividade do juiz.124
Pode-se diferenciar as figuras do necessitado econômico e
necessitado jurídico, conforme lição de Marcancini, que afirma:
Enquanto que, perante a Justiça Civil e para a prestação de serviços jurídicos extraprocessuais, levamos em consideração o conceito de necessitado econômico (aquele que não possa pagar pelo serviço, nem pelas despesas do processo, sem prejuízo do sustento próprio e de sua família), perante a Justiça Penal e quanto ao incapaz e revel, deve ser considerado o conceito de necessitado jurídico. 125
Portanto, é o necessitado econômico que estará sendo
beneficiado pela justiça gratuita no processo judicial.
Conclui-se: é beneficiário de assistência jurídica integral e gratuita quem não possui comprovadamente recursos suficientes, mas, para gozar dos benefícios da assistência judiciária e de justiça gratuita (tão-somente estes, que são regulados pela Lei 1.060/50), basta a declaração de insuficiência de recurso. Neste sentido, o STF já firmou a compatibilidade da assistência judiciária e justiça
124 VIDIGAL, Maurício. Lei de assistência judiciária interpretada, p. 13 125 MARCANCINI, Augusto Tavares Rosa. Assistência jurídica, assistência judiciária e justiça gratuita, p. 33
48
gratuita reguladas pela Lei 1.060/50 com o art. 5.°, LXXIV, CF/88.126
Quanto a comprovação da necessidade, em princípio,
baseia-se na declaração do requerente ao benefício, quanto a sua impossibilidade
de arcar com as despesas do processo. Trata-se de simples alegação na própria
petição inicial, conforme prescrito no art. 4º da lei 1.060/50.127
Todavia, mesmo sendo a declaração de pobreza prova
suficiente, o juiz, duvidando da situação de pobreza da parte, poderá requerer
mais provas, para então deferir o pedido.
Eis porque o juiz, no processo moderno, deixou de ser simples árbitro diante do duelo judiciário travado entre os litigantes e assumiu poderes de iniciativa para pesquisar a verdade real e bem instruir a causa.128
Além do ônus de defender-se, o réu tem, no sistema de
nosso código, o ônus de impugnar especificadamente todos os fatos arrolados
pelo autor.
3.1.1.1 Beneficiário - Pessoa natural
Também denominada pessoa física, numa primeira leitura
da lei de assistência judiciária (LAJ), parece que somente a pessoa natural será
agraciada com o benefício da gratuidade processual.
Conforme comentado por Campo:
(...) Vê-se claramente que o intuito do legislador de 1950 foi o de reservar o benenfício às pessoas físicas, reforçando-se mais esta situação quando se lê o art. 10 do mesmo estatuto, porquanto ali
126 DEMO, Roberto Luis Luchi. Assistência judiciária gratuita, p. 743 127 Art. 4º A parte gozará dos benefícios da assistência judiciária, mediante simples afirmação, na própria petição inicial, de que não está em condições de pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo próprio ou de sua família. 128 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, p. 386
49
está estabelecido que a assistência judiciária não se transmite ao cessionário do direito do beneficiário e o benelácito extingue-se com a morte daquele que o alcançou, de sorte ser intransmissível a gratuidade.129
Porém, como será visto a seguir, não só as pessoas
naturais são beneficiárias da gratuidade. Também, não há distinção, para ser
beneficiário, entre autor, réu, assistente, opoente ou litisconsorte.
Segundo Maria Helena Diniz, “pessoa natural é o ser
humano considerado como sujeito de direitos e obrigações”.130
O art. 2.°, caput da lei 1.060/50, menciona “os nacionais e os
estrangeiros residentes no País como beneficiários”.
Também será verificado adiante que se enquadram no
conceito de necessitado econômico, a pessoa jurídica, os entes sem
personalidade, bem como, o incapaz e o revel.
3.1.1.2 Beneficiário - Pessoa jurídica
As pessoas jurídicas não aparecem expressamente entre os
beneficiários da justiça gratuita.
Conforme Diniz, “(...)pessoa jurídica é a unidade de pessoas
naturais ou de patrimônios, que visa a consecução de certos fins, reconhecida
pela ordem jurídica como sujeito de direitos e obrigações.”131
No entanto, é admissível a concessão do benefício às
pessoas jurídicas tipicamente filantrópicas e aquelas sem fins lucrativos.
Também poderá ser beneficiária a empresa em nome
individual. Trata-se de um profissional, que usa da firma em nome individual para
129CAMPO, Hélio Márcio. Assistência jurídica gratuita, assistência judiciária e gratuidade
judiciária, p. 57 130 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. p. 103 131 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. p. 143
50
o exercício da sua atividade, em relação à qual descabe aplicar conceitos próprios
da pessoa jurídica.
Circunstância peculiar diz respeito às firmas individuais. Estas, inarredavelmente enquadram-se na hipótese do art. 2° da Lei n. 1.060/50, vez que são pessoas físicas, apesar de serem tratadas como jurídicas para fins de tributação.132
Quanto às pessoas jurídicas que não se enquadram na
modalidade “individual”, ou ainda, “sem fins lucrativos” ou “filantrópicas”, surge a
necessidade de comprovação, para obter o amparo legal da gratuidade.
O prejuízo do sustento próprio pode dizer também com pessoa jurídica, quando demonstra cabalmente a impossibilidade de arcar com as despesas do processo sem prejudicar a própria manutenção. Não basta a simples afirmação: é preciso a comprovação da necessidade.133
Assim, a pessoa jurídica com fins lucrativos poderá também
ser beneficiária da justiça gratuita, desde que comprove, através de seus ativos e
passivos, que não poderá arcas com as despesas do processo.
3.1.1.3 Beneficiário - Incapaz e revel
A representação do incapaz e do revel em juízo, será feita
pelo Curador Especial, nomeado pelo juízo, para garantia do devido processo
legal, para contestar a ação em nome do réu.
Curador especial é o representante, nomeado pelo juiz,
para defender, em determinado processo, interesses de incapaz, réu preso ou
revel.
132 CAMPO, Hélio Márcio. Assistência jurídica Gratuita, Assistência Judiciária e Gratuidade
Judiciária, p. 62 133 DEMO, Roberto Luis Luchi. Assistência judiciária gratuita, p.744
51
“A incapacidade é a restrição legal ao exercício dos atos da
vida civil, devendo ser sempre encarada estritamente, considerando-se o princípio
de que “a capacidade é a regra e a incapacidade a exceção”.134
“Ocorre a revelia ou contumácia quando, regularmente
citado, o réu deixa de oferecer resposta à ação, no prazo legal.”135
Ao curador incumbe velar pelo interesse da parte tutelada, no que diz respeito a todos os atos processuais, cabendo-lhe ampla defesa dos direitos da parte representada, e podendo, até mesmo, produzir atos de resposta como a contestação, a exceção e a reconvenção, se encontrar elementos para tanto, pois a função da curatela especial dá-lhe poderes de representação legal da parte, em tudo que diga respeito ao processo e à lide nele debitada.136
Conforme art. 9º do CPC137, trata-se do curador especial ou
curador à lide, cuja nomeação ocorre em alguns casos de incapacidade e de
revelia.
A curatela a lide é um múnus processual que não dá direito a exigir honorários da parte representada, mas os serviços profissionais do advogado podem ser reclamados da parte contrária, quando ocorra a sua sucumbência.138
Por ser obrigatória a figura do curador especial, não seria
plausível exigir a comprovação do estado de necessidade, pois se trata de suprir
uma necessidade jurídica ao incapaz e revel, pois não se cogita de sua real
condição econômica.
134 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. p. 105 135 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, p. 366 136 THEODORO JUNIOR, Humberto Curso de direito processual civil, p. 77 137 Art 9º O juiz dará curador especial: I – ao incapaz, se não tiver representante legal, ou se os interesses deste colidirem com os daquele; II – ao réu preso, bem como ao revel citado por edital ou com hora certa. 138 THEODORO JUNIOR, Humberto Curso de direito processual civil, p. 77
52
3.1.1.4 Beneficiário - Entes sem personalidade jurídica
Também, nos casos de entes sem personalidade jurídica,
poderá ser concedida a isenção das despesas atinentes ao processo.
“São entes que se formam independentemente da vontade dos seus membros ou em virtude de um ato jurídico que vincula as pessoas físicas em torno de bens que lhes suscitam interesses, sem lhes traduzir affectio societatis.”139
A lei processual civil, em seu art.12, confere capacidade de
ser parte os entes sem personalidade jurídica, condomínio de apartamentos,
massa falida, espólio, herança jacente e vacante, sociedades despersonalizadas
e outros .
Neste caso, a verificação da miserabilidade é feita conjugando a universalidade de bens e as pessoas a ela vinculadas: no caso de sociedade despersonalizada, verifica-se o ativo e o passivo da sociedade e o patrimônio dos sócios; no caso do espólio, a verificação acerca da alegada miserabilidade recairá sobre os herdeiros e o patrimônio deixado."140
Há que se verificar as informações relativas ao patrimônio
envolvido, ativo e passivo, bem como, a situação do herdeiro em relação à
herança envolvida.
3.2 O PEDIDO DE JUSTIÇA GRATUITA E OS RECURSOS CABÍVEIS
O pedido de justiça gratuita poderá ser proposto pelo autor,
réu ou interveniente, na primeira oportunidade em que se manifestarem no
processo, ou ainda, no decorrer deste.
139 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. p. 167 140DEMO, Roberto Luis Luchi. Assistência judiciária gratuita, p. 746
53
Quanto aos recursos, estes poderão ser opostos pelo
beneficiário, contra a decisão de indeferimento da justiça gratuita, e ainda contra a
decisão na impugnação e na revogação.
A parte adversária do beneficiário, também poderá impugnar
o deferimento do pedido, e ainda recorrer da impugnação contrária aos seus
interesses, além de provocar o pedido de revogação.
A lei 1.060/50 prevê, através de seu art. 17141 a “apelação”
como recurso das decisões emanadas na aplicação desta lei, com efeito apenas
devolutivo quando favorável ao beneficiário.
Porém, levando em conta as normas processuais, muitos
casos requerem recurso de agravo, pois oriundos de decisão interlocutória dentro
da ação principal. Aliás, somente quando autuado o pedido em apartado da ação
principal, poderia desafiar apelação da decisão do magistrado.
Então, poderá ser verificado que, de acordo com a situação
do processo e do momento em que acontecer, os recursos cabíveis em decisões
referente à justiça gratuita, desafiarão recurso de agravo ou apelação.
Da lição de Theodoro Júnior, extrai-se que:
São sentenças finais, ou simplesmente “sentenças” (segundo terminologia do Código) as que encerram o processo”. (...) “apelação, portanto, é o recurso que se interpõe das sentenças dos juízes de primeiro grau de jurisdição.142
Por outro lado, agravo é o recurso cabível contra as
decisões interlocutórias , ou seja, contra os atos pelos quais o juiz, no curso do
processo, resolve questão incidente.
141 Art. 17. Caberá apelação das decisões proferidas em conseqüência da aplicação desta Lei; a apelação será recebida somente no efeito devolutivo quando a sentença conceder o pedido. 142 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual, p. 528
54
Adiante serão verificadas as situações em que as partes
poderão se manifestar, conforme as decisões, ou seja, os recursos previstos na
Lei de Assistência Judiciária, e de acordo com o Código de processo Civil.
3.2.1 Momentos para o pedido de justiça gratuita
Não há um momento procedimental específico para autor,
réu ou interveniente, requerer o benefício da justiça gratuita, conforme art. 4º da
lei 1.060/50.143
Certa impropriedade, todavia, contém o caput do art. 4°, supra citado, embora não suficiente para impedir o correto entendimento da norma. Ao dizer "petição inicial" esqueceu-se o legislador que o réu, por óbvio, pode também requerer o benefício. O que se pode perceber, com isso, é que não houve grande apuro técnico ao elaborar-se a regra do art. 4° ora vigente. Em ambos os casos, seja formulando o pedido de gratuidade na petição inicial ou na contestação, não há autuação em separado. O pedido é resolvido nos próprios autos do processo. Este é o significado que podemos extrair do art. 4° da Lei n° 1.060/50.144
Requerido o benefício na primeira oportunidade, ou seja,
para o autor, na inicial, para o réu, na resposta, e para o interveniente, em sua
primeira manifestação processual , o feito é processado nos próprios autos. Se
requerido no curso do processo, a petição será autuada em separado (art. 6.°, Lei
l .060/50)145.
Não é possível o pedido formulado em sede de execução de sentença com a finalidade de se subtrair à ação executiva. Certo,
143 Art. 4º A parte gozará dos benefícios da assistência judiciária, mediante simples afirmação , na própria petição inicial, de que não está em condições de pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo próprio ou de sua família. 144MARCANCINI. Augusto Tavares Rosa. Assistência Jurídica, Assistência Judiciária e
Justiça Gratuita, p. 98 145 Art. 6º O pedido, quando formulado no curso da ação, não a suspenderá, podendo o juiz, em face das provas, conceder ou denegar de plano o benefício de assistência. A petição, neste caso, será autuada em separado, apensando-se os respectivos autos aos da causa principal, depois de resolvido o incidente.
55
o benefício pode ser concedido em qualquer fase do processo, mas para os atos processuais futuros e daquele processo mesmo (art. 9º, Lei 1.060/50). Se no processo de conhecimento a parte foi condenada na sucumbência, não pode, em sede de execução, pleitear o benefício para obstar a eficácia objetiva da coisa julgada, (...)146
Ha qualquer momento, portanto, poderá ser requerido o
benefício, assim que se verifique o surgimento da situação prevista na lei. Porém,
não será admitido o pedido como forma de impedir a execução da sentença, por
óbvio, seria geradora de prejuízo à parte vencedora.
Se foi postulado pelo réu ou por qualquer outro sujeito durante o curso da ação, o indeferimento do pedido, estando autuado em separado a petição (art. 6°, da Lei n. l .060/50), extingue o procedimento, cabendo, portanto, apelação cível, que será recebida em ambos os efeitos (art. 17, da Lei n. 1.060/50, c/c. o art. 520, do Código de Processo Civil).147
Postulado o benefício enquanto tramita o processo, o pedido
será autuado em apartado, cujo escopo legislativo é o de que o incidente não
venha a suspender o feito principal, pois estando apartado deste, poderá ser
apreciado no Tribunal, enquanto o feito principal continua com seu andamento
normal.
3.2.2 O deferimento do pedido, impugnação e recurso cabível
Uma vez requerida à gratuidade, caberá ao juiz pronunciar
sua decisão, acolhendo ou rejeitando tal pedido.
Pela facilidade de acesso ao benefício, nos moldes em que
se encontra a legislação, não terá o magistrado, num primeiro momento, motivos
146DEMO, Roberto Luis Luchi. Assistência judiciária gratuita, p. 749/750 147 CAMPO, Hélio Márcio. Assistência jurídica Gratuita, Assistência Judiciária e Gratuidade
Judiciária, p. 96
56
para indeferir o pedido, pela presunção de veracidade que goza a declaração do
requerente.
A decisão de caráter processual, que se coloca diante do Juiz, está relacionada com a concessão, ou não, da justiça gratuita, ou seja, da mera gratuidade processual, ou isenção de custas e demais despesas com o processo. Mesmo porque não pode o juiz proibir os órgãos prestadores de assistência jurídica de atender a parte.148
Referida decisão não possui caráter de sentença, uma vez
que não é definitiva, não extingue o processo.
Num primeiro momento, a parte não beneficiária da
gratuidade, poderá se insurgir contra a decisão que concedeu o benefício,
através de impugnação ao próprio juiz da causa.
Da decisão que concede o benefício da gratuidade prima facie não cabe recurso da parte contrária. Isto porque, nos termos da Lei, a concessão se faz sem a oitiva da parte contrária, que pode posteriormente oferecer impugnação em separado. Desta forma, sem que se apresente, primeiramente, tal impugnação, não se deve admitir o recurso contra a decisão concessiva da justiça gratuita. 149
É uma faculdade outorgada à parte contrária ao beneficiário,
ou ainda, o Ministério Público, de impugnar, após ter tomado ciência da
concessão requerida e, já anuída pelo juiz.
Pelo princípio do contraditório e ampla defesa, da
impugnação deverá ser dado ciência ao impugnado, e na falta de previsão na lei
especial, “deve o juiz ouvir o beneficiário em cinco dias, ante a inexistência de
outro prazo (art. 185 do CPC)”150.
148 MARCANCINI. Augusto Tavares Rosa. Assistência Jurídica, Assistência Judiciária e
Justiça Gratuita. p. 93 149MARCANCINI. Augusto Tavares Rosa. Assistência Jurídica, Assistência Judiciária e
Justiça Gratuita, p. 112 150 ASSIS, Araken de. Doutrina e prática do processo civil contemporâneo, p. 94/95
57
Contudo, o impugnante irá se deparar com uma tarefa difícil,
que é a prova da condição do impugnado. Isto porque, para se provar que o
mesmo possui condições de arcar com as custas do processo, se faria necessário
entrar na esfera íntima da parte, invadindo a privacidade do indivíduo. Há aí uma
situação claramente desvantajosa, pois dificilmente poderá o impugnante reunir
provas acerca de quanto ganha e quanto gasta aquele.
Ao desobrigar o postulante do benefício de qualquer prova, a lei provocou efeito colateral de graves reflexos. A lei colocou seu adversário em situação claramente desvantajosa. Dificilmente ele logrará reunir prova daquela equação entre receita e despesa que gera a figura do “necessitado”. Desse modo, enfraqueceu-se o controle judiciário e a concessão do benefício, quase automática, tornou-se, ao mesmo tempo, irreversível na maioria dos casos.151
O fato é que, pela facilidade na concessão e dificuldade do
ônus da prova, a impugnação é meio pouco utilizado, por todos os entraves aqui
verificados. E para que não se conceda benefício a quem não mereça, caberá ao
magistrado, dentro dos limites de sua subjetividade a verificação da real situação
do postulante. Conforme será verificado mais adiante, o juiz poderá revogar a
concessão “de ofício”, ou por provocação da parte no processo.
Da decisão que julga a impugnação, concedendo ou
denegando o benefício, cabe recurso da parte vencida.
Nos termos da jurisprudência do STJ, em se tratando de decisão versando o pedido de assistência judiciária gratuita, justiça gratuita ou as respectivas impugnações (deferindo, indeferindo ou revogando o benefício) nos próprios autos da ação principal, cabível o recurso de agravo. Se o requerimento for autuado em apartado (art. 6.°, segunda parte, e art. 7.°, par. ún.. Lei 1.060/50), a decisão do juiz se submete à apelação (ainda que de decisão interlocutória se trate), por disposição expressa do art. 17, primeira parte. Lei 1.060/50. Inviável a aplicação do princípio da fungibilidade. (grifei)152
151 ASSIS, Araken de. Doutrina e prática do processo civil contemporâneo, p. 88 152 DEMO, Roberto Luis Luchi. Assistência judiciária gratuita, p. 754
58
Portanto, embora o art. 17 da lei especial153 expressamente
se refira a recurso de apelação, poderá também ser utilizado o recurso de
agravo, quando a decisão estiver contida nos próprios autos da ação principal.
3.2.3 Do indeferimento do pedido e o recurso do beneficiário
Sendo indeferida a pretensão do postulante à justiça
gratuita, o juiz concederá prazo para que efetue o pagamento inicial, sendo ele
autor, ou antecipe a despesa, caso o pedido seja no decorrer do processo.
Pode o juiz denegar o benefício ex officio, independentemente da impugnação da parte contrária, se nos autos houver elementos suficientes para demonstrar a inexistência da situação de pobreza. Assim como há o interesse público em conceder o benefício a quem dele necessite, a fim de garantir o acesso de todos à Justiça, também há interesse público em não admitir que quem não seja pobre se utilize indevidamente do privilégio.154
Não se conformando com a decisão, conforme o caso,
poderá o postulante ingressar com recurso de apelação (art. 17 da LAJ), quando
a sentença originar-se em autos apartados do principal, ou, no caso de agravo,
se a decisão for prolatada nos autos principais. Em todo caso, será dado efeito
suspensivo, como forma de proteção ao beneficiário.
Por outro lado, exigir que o interessado adiante as despesas processuais até o julgamento do seu recurso, seja agravo de instrumento, seja apelação, criaria invencível impasse, porventura real e verdadeira a impossibilidade de suportar tais despesas sem prejuízo do sustento próprio ou da família.155
A questão é que, pelo espírito protecionista da lei especial e
da Constituição Federal, tanto um, como outro recurso, serão recebidos nos dois
153 BRASIL. Lei 1.060, de 5 de fevereiro de 1950. Estabelece normas para a concessão da
assistência judiciária aos necessitados. 154 MARCANCINI. Augusto Tavares Rosa. Assistência Jurídica, Assistência Judiciária e
Justiça Gratuita. p. 103 155 ASSIS, Araken de. Doutrina e prática do processo civil contemporâneo, p. 98
59
efeitos (devolutivo e suspensivo), para que o postulante à gratuidade não tenha
os efeitos da decisão de imediato.
3.2.4 Da revogação do benefício e o recurso cabível ao beneficiário
A qualquer momento do processo, o benefício concedido
poderá ser revogado, acaso se comprove a mudança nas condições do
beneficiário, ou ainda, se ficar comprovado ao magistrado que o postulante nunca
foi necessitado, caso em que o mesmo será enquadrado na multa prevista no art.
4º, §1º da lei 1.060/50.156
A simples afirmação de necessidade, requisito exigido para o deferimento do benefício, não impede a revogação do mesmo, se o juiz verificar, posteriormente, a ausência dos requisitos essenciais. A análise da situação de necessidade pode ser feita e revista a qualquer momento e de ofício, mas de forma individualizada e não por categoria profissional e dês que observado o contraditório (art. 8.", Lei l .060/50). Logo, a decisão que defere o benefício é clausurada pela rebus sic standibus e, assim como a antecipação de tutela (art. 273, § 4.°, CPC), é precária, i.e., não gera preclusão pró judicato.157
Havendo o desaparecimento ou a inexistência dos requisitos
essenciais à concessão da justiça gratuita, quer seja, pelo Juiz ex officio, quer por
provocação das partes interessadas, a sentença, a ser exarada em autos
apartados, deverá ser fundamentada, comportando apelação, que será recebida
em ambos os efeitos, conforme preceitua o artigo 520158 do Código de Processo
Civil.
Sucedendo a revogação por decisão transitada em julgado, poderão ser exigidas de imediato do antigo beneficiado o pagamento não feito anteriormente das custas, despesas e
156Art. 4º (...) § 1º Presume-se pobre, até prova em contrário, quem afirmar essa condição nos termos desta Lei, sob pena de pagamento até o décuplo das custas judiciais. 157DEMO, Roberto Luis Luchi. Assistência judiciária gratuita , p. 753 158 Art. 520. A apelação será recebida em seu efeito devolutivo e suspensivo. (...)
60
adiantamentos, em virtude da assistência judiciária deferida. Não atendida a determinação, o processo poderá ser extinto por falta de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido se o ato omitido tiver esse caráter (ex: pagamento de custas iniciais).159
Caso não concorde com a revogação, e ainda não tenha
transitado em julgado a decisão revocatória, o beneficiário poderá ingressar com
recurso de apelação, enquanto corre a ação principal.
3.3 CONSEQUÊNCIAS DA JUSTIÇA GRATUITA SOBRE AS VERBAS DA
SUCUMBÊNCIA
As conseqüências, aqui entendidas, aquelas envolvidas com
os reflexos jurídicos e econômicos, pois a condenação às verbas da
sucumbência, atribuirá ao vencido no processo a responsabilidade pelo
pagamento estabelecido na sentença judicial.
3.3.1 Princípio da Sucumbência
Pela sistemática do Código de Processo Civil, todas as
despesas processuais, e honorários advocatícios, ao final, serão pagas pelo
vencido, segundo o princípio da sucumbência.
Adotou o Código, assim, o princípio da sucumbência, que consiste em atribuir à parte vencida na causa a responsabilidade por todos os gastos do processo. Assenta-se ele na idéia fundamental de que o processo não deve redundar em prejuízo da parte que tenha razão. Por isso mesmo, a responsabilidade financeira decorrente da sucumbência é objetiva e prescinde de qualquer culpa do litigante derrotado no pleito judiciário. Para sua incidência basta, portanto, o resultado negativo da solução da causa, em relação à parte.160
159 VIDIGAL, Maurício. Lei de assistência judiciária interpretada, p. 60 160 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual, p. 85
61
A parte vencedora, também encontra na sentença que
encerrou o processo um título executivo judicial (art. 584, inc. I do CPC)161 para
exigir o reembolso das despesas antecipadas e honorários de seu advogado.
Assim, num processo em que uma das partes teve o benefício da justiça gratuita, poderemos ter ao final como credores de despesas: a) a Fazenda Pública, quanto à taxa judiciária; -b) órgãos públicos, que não a Fazenda, tais como a Ordem dos Advogados, quanto à taxa de juntada de instrumento de mandato, e cartórios extrajudiciais, pelas despesas de registros, averbações, extração de certidões; c) particulares, como peritos e testemunhas; d) a parte contrária ao beneficiário, pelas despesas que tenha adiantado, caso esta seja vencedora.162
Todavia, se o processo terminar por desistência ou
reconhecimento do pedido, as despesas e honorários serão pagos pela parte que
desistiu ou reconheceu, havendo proporcionalidade no caso de ser parcial a
desistência ou o reconhecimento. Se houver acordo entre as partes, e desde que
o acordo não disponha de maneira diversa, as despesas serão divididas por igual.
Quanto aos honorários advocatícios, a parte vencida no
processo judicial, deverá ser condenada ao pagamento referente os honorários
da sucumbência ao Advogado da parte vencedora.
Os honorários de advogado têm natureza indenizatória e são aditados à condenação ou, não havendo condenação, constituem condenação própria e autônoma. O seu valor, fixado pelo juiz, é absolutamente independente do eventual contrato de honorários que o advogado tenha com o seu cliente. Nos termos da Lei n. 8.906, de 4-7-1994, que dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil — OAB, art. 23,os honorários incluídos na condenação pertencem ao advogado: "Art. 23. Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo
161 Art. 584 – São títulos judiciais: I- a sentença condenatória proferida no processo civil. 162 MARCANCINI. Augusto Tavares Rosa. Assistência Jurídica, Assistência Judiciária e
Justiça Gratuita. p. 48
62
requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor". 163
Os honorários relativos à sucumbência, não estão incluídos
no conceito genérico de despesas processuais, sendo tratado no Código de
processo civil, como verba autônoma.
3.3.2 Da execução das verbas da sucumbência
Acaso não seja cumprida164 a sentença que condenou a
parte vencida ao ônus da sucumbência, esta será título judicial para execução do
vencedor na demanda contra o vencido.
A execução de sentença, neste momento, passando por
uma transição, após a aprovação da lei 11.232, de 22 de dezembro de 2005, que
entrará em vigor no dia 23 de junho de 2006, alterou o CPC, instituindo uma fase
de cumprimento da sentença no processo de conhecimento.
Santos, em matéria da Revista CONSULEX, relaciona
alguns pontos fundamentais de mudança no novo regime, dentre eles:
(...)a) a terminologia “cumprimento da sentença”, b) o fim do “intervalo” entre as atividades jurisdicionais de cognição e execução na cobrança de quantia certa; c) o acréscimo de multa de 10% sobre o total da obrigação, na hipótese de não haver seu cumprimento espontâneo por parte do devedor;(...)165
Anterior a nova lei, a execução de título judicial, é relação
processual autônoma. Conforme Theodoro Júnior “(...) terá sempre de ser iniciada
163 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro, p. 111/112 164 Com o advento da Lei no. 11.232, de 23 de dezembro de 2005 e entrada em vigor em 23 de junho de 2006, o “cumprimento da sentença” dentro do processo de conhecimento, alterando o processo de execução judicial. 165 SANTOS, Evaristo Aragão. A lei 11.232/05 e o código de processo civil. p. 39 revista 218
63
por provocação do credor em petição inicial, seguindo-se a citação do
devedor.”166
Seja como for, a sentença que condena o vencido nas
verbas sucumbenciais, deverá ser líquida, certa e exigível.
A Sentença, portanto, condenará o vencido ao pagamento
do principal, das despesas antecipadas pelo vencedor e honorários advocatícios.
Quanto aos honorários, o advogado terá autonomia para
pleiteá-los.
No tocante ao pedido principal, conforme Marcancini,
“(...)quanto ao julgamento em si, em nada difere das demais sentenças pelo fato
de ser o beneficiário vencido”167, e a sentença deverá ser cumprida pelo
beneficiário, caso contrário, será título hábil para execução.
Agora, tratando-se das verbas referentes às despesas
realizadas pelo vencedor, frente ao benefício da gratuidade, verifica-se que a
opinião mais forte é a da comprovação da perda da condição de necessitado
econômico, para posterior execução da sentença, a teor do art. 12 , 2ª parte , da
lei 1.060/50.168
3.3.2.1 Beneficiário vencedor
As verbas de sucumbência são compostas por duas rubricas
básicas: despesas antecipadas pela parte vencedora e honorários do Advogado
vencedor.
Vencendo a demanda o beneficiário da justiça gratuita, a
parte contrária, não-beneficiária da gratuidade, arcará com todas as despesas
devidas à Fazenda, aos órgãos públicos e aos particulares.
166 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, p. 25 167 MARCANCINI, Augusto Tavares Rosa. Assistência jurídica, assistência judiciária e justiça
gratuita, p. 60 168 Art 12 (...) Se dentro de cinco anos, a contar da sentença final, o assistido não puder satisfazer o pagamento, a obrigação ficará prescrita.
64
Conforme Vidigal, “(...) a disposição do caput é mera
aplicação das regras da sucumbência expressas hoje no Código de Processo
Civil.”169 Ainda acrescenta Assis “(...) de modo redundante, o art. 11, caput, da Lei
1.060/50, reafirma a responsabilidade do vencido(...).170
Mesmo não tendo dispendido qualquer despesa, o
beneficiário foi amparado pelo Estado que, de uma forma ou de outra, supriu a
necessidade processual, conseqüentemente ao vencido caberá o pagamento a
quem de direito.
Pelo princípio da sucumbência, previsto no art. 20 do
CPC171, o vencido deverá pagar ao vencedor as despesas que antecipou. E,
dependendo da maior ou menor complexidade do processo, poderão ter sido
envolvidos pessoas das mais variadas áreas, entre particulares, Advogados,
cartórios extra judiciais, serventuários, Fazenda Pública, aos quais serão devidas
as respectivas verbas.
Neste caso, não existe nenhuma dúvida quanto a
obrigatoriedade do vencido que, não sendo beneficiário da justiça gratuita, deverá
arcar com os pagamentos na forma da sentença. Obviamente, caso não efetue o
pagamento no prazo legal, correrão contra ele os respectivos processos
executivos.
3.3.2.2 Beneficiário vencido
Quando vencido o beneficiário da gratuidade judiciária, sua
condenação será condicionada, conforme será verificado adiante.
No decorrer do processo, muitas despesas foram efetuadas.
O ponto principal é saber se tais despesas serão pagas e por quem?
169 VIDIGAL, Maurício. Lei de assistência judiciária interpretada, p. 69 170 ASSIS, Araken de. Doutrina e prática do processo civil contemporâneo. p. 105 171 Art. 20. A sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocatícios. Essa verba honorária será devida, também, nos casos em que o advogado funcionar em causa própria.
65
a) A parte vencedora e não beneficiária da gratuidade,
quanto às despesas efetuadas no processo, poderá ter título judicial baseado na
“sentença condenatória proferida no processo civil” (art. 584, I do CPC)172;
b) “O crédito de serventuário da justiça, de perito, de
intérprete, ou de tradutor, quanto as custas, emolumentos ou honorários, que
forem aprovados por decisão judicial”,173 estão incluídas como título extrajudicial.
c) “Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento
ou sucumbência, pertencem ao Advogado, tendo este direito autônomo para
executar a sentença nesta parte”, conforme art. 23 da lei 8.906174. Se, todavia,
participou como assistente do beneficiário, “serão arbitrados pelo juiz até o
máximo de 15% (quinze por cento) sobre o líquido apurado na execução da
sentença”, conforme art. 11, § 1º da Lei 1.060/50175.
Assim, a relação de despesas e honorários acima referidos,
resumem o dispêndio de valores que é feito pela parte que não é beneficiária da
justiça gratuita, bem como, tudo que a parte beneficiária deixa de recolher.
Diante disso, é fundamental que seja especificado na
sentença a parcela condenatória relativa às despesas processuais e aos
honorários advocatícios, quando vencido o beneficiário, da qual poderá manejar o
vencedor ação de execução por título judicial.
Conforme previsto no art. 12 da lei 1.060/50:
Art. 12. A parte beneficiada pela isenção do pagamento das custas ficará obrigada a pagá-las, desde que possa fazê-lo, sem prejuízo do sustento próprio ou da família. Se dentro de cinco
172 Art. 584. São títulos executivos judiciais: I – a sentença condenatória proferida no processo civil; (...) 173 art. 585, V do CPC 174 BRASIL. Lei 8.906, de 4 de julho de 1994. Dispõe sobre o Estatuto da advocacia e a Ordem
dos advogados do Brasil (OAB). 175 Art. 11. Os honorários de advogados e peritos, as custas do processo, as taxas e selos judiciários serão pagos pelo vencido, quando o beneficiário de assistência for vencedor na causa. § 1º Os honorários do advogado serão arbitrados pelo juiz até o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o líquido apurado na execução da sentença.
66
anos, a contar da sentença final, o assistido não puder satisfazer tal pagamento, a obrigação ficará prescrita.
Estando a exigibilidade condicionada ä perda da qualidade
de necessitado, não tem o credor como pleitear seu direito em juízo, até que a
condição se verifique.
Deixou expresso o art. 12, 2ª parte, da lei 1.060/50 que a dívida do beneficiário – despesas e honorários -, originada pela derrota na causa (art. 20 do CPC), prescreverá em cinco anos. De prescrição, na realidade não cuida, pois a dívida é inexigível. Criou a lei um prazo de espera. Ele se contará do trânsito em julgado da sentença.176
Ao que tudo indica o prazo de cinco anos integra a condição.
Verificada a condição, ou seja, a perda da qualidade de carente, dentro deste
prazo, o direito se torna exigível, podendo ser cobrado pelo credor. Assim, se em
cinco anos perder a condição de necessitado, poderá ser exigido os pagamentos
relativos à sucumbência.
O ponto principal, é a verificação da perda ou não da
condição de necessitado. Ou ainda, com a sentença, o vencido será condenado
nas verbas da sucumbência, porém, não poderá ser exigida até que o beneficiário
perca a condição de necessitado econômico.
Para comprovar a mudança de fortuna do beneficiário (prova que deverá acompanhar a inicial da execução - art. 614, III, CPC) de forma expedita, poderá o vencedor se valer do incidente do art. 7.°, caput. Lei 1.060/50 e pleitear a revogação da gratuidade. Autuado em apenso o pedido, o juiz mandará ouvir o beneficiário, no prazo de cinco dias, colherá a prova pertinente e, em seguida, decidirá o incidente, desafiando apelação (art. 17, Lei 1.060/50). Através desse singelíssimo procedimento, o credor dotará o título executivo de exigibilidade, sem os percalços de uma ação de conhecimento pelo rito ordinário ou sumário.177
176 ASSIS, Araken de. Doutrina e prática do processo civil contemporâneo. p. 105 177 DEMO, Roberto Luis Luchi. Assistência judiciária gratuita , p. 759
67
Note-se que, novamente, a tarefa do vencedor – não
beneficiário da justiça gratuita – não será das mais fáceis, pois deverá comprovar
a perda da condição de beneficiário da parte adversa.
A questão é dotar o título judicial (sentença) de exigibilidade,
pois a sentença exequenda é condicional, e para isso, “(...) tem o credor de
instruir a sua petição executiva com a prova de que se verificou a condição(...)”178
sob pena de ter indeferida sua pretensão, por falta de procedibilidade.
Assim, a concessão da justiça gratuita àquele que se declara
necessitado econômico, ao mesmo tempo em que proporciona um direito ao
carente, acaba gerando à outra parte, não beneficiária, e quando vencedora, o
que o Desembargador Wilson Marques chama de “onerar o vencedor com os
efeitos da pobreza do perdedor”.179
Portanto, a proteção legal disponibilizada ao carente de
recursos, vai além da sentença final, pois, mesmo condenando-o na
sucumbência, acaba criando uma condição. E tal condição, somente se efetiva,
mediante comprovação do vencedor, de que o vencido possui condições
econômicas de arcar com referidas despesas e honorários a que foi condenado.
178 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, p. 142 179 MARQUES, Wilson. Assistência jurídica gratuita: ligeiras anotações em torno de algumas
questões polêmicas, p. 18
68
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao final deste trabalho de monografia, ciente de que não foi
esgotado o assunto sobre o tema, mas o conhecimento e aprofundamento sobre
o assunto foram obtidos.
A pesquisa foi baseada na legislação Federal e também
aquela que diz respeito ao Estado de Santa Catarina. Na parte doutrinária,
houve um grande aproveitamento dos artigos encontrados em revistas jurídicas.
O trabalho foi apresentado, através da divisão do tema em
três capítulos.
No primeiro capítulo, ficou evidenciado que, as pessoas têm
necessidade de levar seus conflitos de interesses ao poder judiciário. Com isso,
procurou-se abordar a importância da ação (com ela a defesa), a jurisdição e o
processo, diretamente ligados ao Direito Processual.
O Direito Processual, estabelece as regras que serão
seguidas por todos os envolvidos na função jurisdicional do Estado.
No que diz respeito à ação, esta é subjetiva, dependente da
vontade da pessoa, sendo o passo necessário para buscar seu direito.
A jurisdição é a atuação do Estado-juiz, desde que seja
acionada pelo interessado. A jurisdição é exclusiva do Estado, que deverá prestar
a tutela jurisdicional com a solução do litígio apresentado.
O processo é o meio pelo qual se efetiva os atos judiciais,
seguindo procedimentos previsto em lei.
No segundo capítulo, foram tratados os institutos ligados a
gratuidade judiciária, apresentados em tópicos distintos, e ao final, verificando a
distinção entre eles.
A assistência jurídica, é o mais atual, tendo sido previsto na
Constituição Federal, inclusive com a criação de um órgão exclusivo para sua
69
efetivação que é a Defensoria Pública. Esta assistência é de natureza
administrativa, pois efetivada por órgão da administração, e é perante a este que
deverá ser requerida.
A assistência judiciária, por sua vez, prevê um serviço de
menor amplitude, através da atuação de um Advogado em juízo, prestando
assistência profissional. Apesar dos requisitos prestados à entidade que presta a
assistência, este benefício deverá ser requerido ao Juiz, e terá reflexos no final
com a sentença, no tocante aos honorários advocatícios.
Quanto à justiça gratuita, que foi estudada mais
profundamente, esta é de natureza processual, pois obrigatoriamente requerida
ao juiz, e em todos os níveis do poder Judiciário. Diretamente ligado à
desobrigação do pagamento das despesas judiciais, no início, meio e final do
processo, inclusive com influência nos honorários.
Assim, comparando as características de cada um dos
institutos envolvidos na gratuidade, pôde ser verificado que são diversos uns dos
outros, e de alcance restrito `a sua natureza.
Por fim, no terceiro capítulo, foi aprofundado o estudo
quanto a justiça gratuita, que é (ou deveria ser) destinada às pessoas que se
declarem carentes econômicos, e que “não podem arcar com as despesas do
processo em prejuízo do sustento próprio e da família”, aliás, esta é a prova que
basta para o deferimento deste benefício.
Foi verificado também que o benefício, embora não previsto
expressamente, mas atende também as pessoas jurídicas e os entes sem
personalidade, estes, deverão comprovar o estado de necessidade, não bastando
a declaração.
Quanto à parte que não é beneficiária da justiça gratuita,
caberá fazer prova contrária ao beneficiário para desconstituir sua condição de
necessitado. Conforme foi verificado, é tarefa difícil, pois requer provas robustas,
e que são de difícil alcance, pois dizem respeito a intimidade do beneficiário.
70
Além dos pedidos de impugnação e revogação, e dos
recursos à instância superior, a parte contrária ao beneficiário, poderá contar com
certa subjetividade do juiz que, verificando não possuir a parte as condições para
obter o benefício, poderá indeferir no momento inicial, ou revogar, no decorrer do
processo aquele benefício.
Porém, ao final do processo, caso seja vencedora a parte
não beneficiária da justiça gratuita, esta terá uma nova “batalha”, pois, para
receber as despesas que efetuou no andamento do processo, encontrará uma
barreira na forma de condição. Ou seja, somente poderá exigir do vencido o
pagamento, mediante comprovação que este perdeu a condição de necessitado
econômico.
Acaso tenha sucesso, estará habilitado para exigir do
vencido o pagamento, mediante os instrumentos previstos. Porém, conforme já
verificado, pela dificuldade de fazer a prova contra o beneficiário, o vencedor
deverá arcar com o prejuízo por força dos dispositivos de proteção criados pelo
Estado.
Portanto, por tudo que foi aqui exposto, retoma-se às três
hipóteses levantadas no início do trabalho, às quais, pode-se afirmar que:
1. A assistência jurídica, a assistência judiciária e a justiça
gratuita, são institutos diversos, que não devem ser confundidos, pois, o primeiro
está previsto na Constituição Federal e deverá ser ´restado pela Defensoria
Pública; o segundo é o serviço gratuito prestado por Advogado; e o terceiro,
concede gratuidade aos carentes, quanto às despesas processuais.
2. A concessão da justiça gratuita libera o beneficiário das
despesas do processo. Ao final, mesmo condenado às verbas da sucumbência,
tal cobrança ficará suspensa, desde que sua condição de necessitado
permaneça.
71
3. Caberá à parte contrário fazer prova da perda de
condição de necessitado, tanto para revogar o benefício concedido, como para
tornar exigível o título judicial originado em sentença favorável.
Assim, restando comprovadas as hipóteses propostas no
início deste trabalho, cabe aqui salientar a importância do aprofundamento do
tema ligado aos meios de acesso gratuito à justiça e as conseqüências que
decorrem no processo.
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