a responsabilidade civil do erro mÉdico em cirurgia

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Anais do I Congresso Acadêmico de Direito Constitucional da FCR Porto Velho/RO 23 de junho de 2017 P. 377 a 397 A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ERRO MÉDICO EM CIRURGIA PLÁSTICA E O TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO-TCLE Isabelle Galvão Maia 1 Alex dos Reis Fernandes 2 RESUMO O presente artigo científico tem por objetivo analisar a responsabilidade civil do médico cirurgião plástico à luz do Código Civil, demonstrando que o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido não isenta o médico responsável por cirurgia plástica embelezadora ou reparadora, quando o mesmo agir com imperícia, imprudência ou negligência. Atualmente, o Judiciário possui inúmeras ações de indenização decorrentes de erro médico, buscando a responsabilização civil do cirurgião plástico por resultado insatisfatório e consecutivos danos gerados em seus procedimentos. Diante disso, o simples fato do paciente ter assinado o termo de informação não desobriga o profissional de reparar possíveis danos. Palavras-chaves: Responsabilidade Civil Médica. Erro Médico. Cirurgião-Plástico. Obrigação. ABSTRACT The objective of this scientific article is to analyze the civil responsability of the plastic surgeon on the light of the Civil Law, demonstrating that the Informed Consent Form does not exempt the doctor responsible for embellishing or repairing plastic surgery, when the same acts with malpractice, recklessness or negligence. Nowadays, the Judiciary has numerous indemnity lawsuits resulting from medical malpractice, seeking the civil responsability of the plastic surgeon for the unsatisfactory result and consecutive damages generated in its procedures. Therefore, the simple fact that the patient has signed the information term, does not release the professional to repair for possible damages. Keywords: Medical Responsability. Medical error. Plastic surgeon. Obligation. ¹ Acadêmica do Curso de Direito da Faculdade Católica de Rondônia. E-mail: [email protected]. 2 Docente da disciplina de Direito Civil do Curso de Direito da Faculdade Católica de Rondônia. E- mail: [email protected].

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Page 1: A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ERRO MÉDICO EM CIRURGIA

Anais do I Congresso

Acadêmico de Direito

Constitucional da FCR

Porto

Velho/RO

23 de

junho de

2017

P. 377 a 397

A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ERRO MÉDICO EM CIRURGIA PLÁSTICA E O

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO-TCLE

Isabelle Galvão Maia1

Alex dos Reis Fernandes2

RESUMO

O presente artigo científico tem por objetivo analisar a responsabilidade civil do médico cirurgião plástico à luz do Código Civil, demonstrando que o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido não isenta o médico responsável por cirurgia plástica embelezadora ou reparadora, quando o mesmo agir com imperícia, imprudência ou negligência. Atualmente, o Judiciário possui inúmeras ações de indenização decorrentes de erro médico, buscando a responsabilização civil do cirurgião plástico por resultado insatisfatório e consecutivos danos gerados em seus procedimentos. Diante disso, o simples fato do paciente ter assinado o termo de informação não desobriga o profissional de reparar possíveis danos.

Palavras-chaves: Responsabilidade Civil Médica. Erro Médico. Cirurgião-Plástico.

Obrigação.

ABSTRACT

The objective of this scientific article is to analyze the civil responsability of the plastic surgeon on the light of the Civil Law, demonstrating that the Informed Consent Form does not exempt the doctor responsible for embellishing or repairing plastic surgery, when the same acts with malpractice, recklessness or negligence. Nowadays, the Judiciary has numerous indemnity lawsuits resulting from medical malpractice, seeking the civil responsability of the plastic surgeon for the unsatisfactory result and consecutive damages generated in its procedures. Therefore, the simple fact that the patient has signed the information term, does not release the professional to repair for possible damages.

Keywords: Medical Responsability. Medical error. Plastic surgeon. Obligation.

¹ Acadêmica do Curso de Direito da Faculdade Católica de Rondônia. E-mail: [email protected]. 2 Docente da disciplina de Direito Civil do Curso de Direito da Faculdade Católica de Rondônia. E-

mail: [email protected].

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Anais do I Congresso Acadêmico de Direito Constitucional

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INTRODUÇÃO

O presente artigo aborda o tema de responsabilidade civil do médico cirurgião

plástico que atua na área de estética, bem como, observa se há necessidade ou

obrigatoriedade do cirurgião plástico obter de seu paciente um Termo de

Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), baseando-se na ideia de ser uma

exigência ética ou uma exigência legal.

Nos dias que correm, o Judiciário contém inúmeras ações de indenização

desinente de erro médico, buscando a responsabilização civil do profissional em

cirurgia plástica, pelo resultado insatisfatório e consecutivos danos gerados em seus

procedimentos. Existe entendimento divergente entre os doutrinadores e

jurisprudência é acerca de qual obrigação o profissional médico cirurgião plástico

assume diante prestação de serviço, se seria essa de meio ou de resultado, e se o

TCLE com sua ausência já acarreta o dever de indenização, caso o fim tenha sido

desagradável ao paciente.

Tais danos podem ser graves, irreversíveis ou até mesmo levar o paciente à

óbito. Por esses motivos o médico deve agir com toda cautela e perícia que o cargo

lhe estatui, fazendo tudo que estiver ao seu alcance, para que o paciente esteja

ciente/informado dos possíveis danos.

Dessa forma, ainda que ocorram reações adversas, devido ao biótipo do

paciente, como por exemplos, as queloides, estando o paciente informado e ciente

dos possíveis riscos decorrentes da cirurgia plástica, tanto embelezadora ou

reparadora, o resultado alcançado seria de acordo com Termo de Consentimento

Livre e Esclarecido obtido ao paciente, e isto não implicaria na mudança do tipo de

obrigação assumida pelo médico, continuando a ser obrigação de resultado.

Contudo, o simples fato do paciente ter assinado o termo de informação, não

isentará do profissional a reparação por possíveis danos, como omissão, imperícia,

negligência ou imprudência. Com o propósito de que seja devidamente

caracterizado o erro médico, devendo considerar o dano, estabelecer o nexo causal

e analisar o motivo em que constatou o ato médico e a culpa.

Este trabalho científico segue o método bibliográfico de pesquisa com base

no estudo feito a partir de doutrinas, revistas, casos concretos, jurisprudência, sites e

outros trabalhos científicos como fonte de pesquisa e enriquecimento deste artigo.

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A pesquisa traz a problemática relacionada ao Termo de Consentimento Livre

e Esclarecido (TCLE). Destarte, questiona-se se o TCLE isenta o médico cirurgião

plástico da responsabilidade civil, bem como, analisar possíveis divergências entre

jurisprudência, casos concretos e doutrinadores sobre o tema.

Além de verificar a importância da relação do Médico e Paciente, e por fim,

averiguar se a obrigação, em cirurgias plásticas, é de meio ou de resultado.

1. RESPONSABILIDADE CIVIL: OBRIGAÇÃO E RESPONSABILIDADE

Para que se possa conceituar o tema responsabilidade civil, deve-se

primeiramente fazer uma distinção a respeito do que é uma responsabilidade e uma

obrigação. Segundo o doutrinador Carlos Roberto Gonçalves (2015, p. 24), a

“obrigação é sempre um dever originário; enquanto responsabilidade é um dever

jurídico sucessivo, consequentemente à violação do primeiro.”

Caso um profissional proporcione seus serviços e estes venham a ser

aderidos por uma pessoa, perpetra-se na celebração do negócio jurídico, a

obrigação originária. Assumindo esta obrigação, o devedor, neste caso o prestador

de serviços, estará obrigado a concluir com perfeição aquilo que fora acordado, sob

a sanção de afrontar o dever jurídico originário, estabelecendo, com isso, a

responsabilidade e, consequentemente, o dever de restaurar o dano causado.

Assim, tem-se considerado que responsabilidade é a sucessão de uma

obrigação originária derivada da conduta humana, à qual vincula um credor e um

devedor numa relação jurídica onde a Lei imputa responsabilização pela

inadimplência de um dever legal, tendo a restauração de um direito violado como

finalidade e solução jurídica.

Em função de algumas peculiaridades dogmáticas, faz-se mister estabelecer

uma classificação sistemática, tendo como base a culpa e a natureza da norma

jurídica violada. Sendo assim, classifica-se em: responsabilidade subjetiva e

objetiva, respectivamente.

A responsabilidade subjetiva encontra sua justificativa na culpa ou no dolo,

por ação ou omissão, lesiva a determinada pessoa. Deste modo, a prova da culpa

do agente será necessária para que surja o dever de reparar, conforme artigo 186

do Código Civil (BRASIL, 2002), o qual dispõe que “aquele que, por ação ou

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omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causa dano a outrem,

ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

Já a responsabilidade objetiva baseia-se no fato de haver o agente causado

prejuízo à vítima ou a seus bens, sendo irrelevante a conduta culposa ou dolosa do

causador do dano, uma vez que bastará a existência do nexo causal entre o prejuízo

sofrido pela vítima e a ação do agente para que haja o dever de indenizar. Conforme

preconiza o artigo 927 do CC/2002:

Art. 927. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. (BRASIL, 2002)

Contudo, somente após a análise desses elementos citados, como culpa ou

dolo, ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, é que poderá ser

cogitada a hipótese de responsabilidade subjetiva.

2. RESPONSABILIDADE DOS MÉDICOS CIRURGIÕES PLÁSTICOS:

OBRIGAÇÃO DE MEIO OU DE RESULTADO

Como regra geral, as obrigações assumidas pelo médico perante o paciente

são conceituadas como obrigação de meio. Ou seja, esse profissional utiliza de

todos os seus conhecimentos científicos e profissionais para obter um determinado

resultado, com sem se obrigar a alcançá-lo.

Em que pese, a obrigação de resultado é aquela em que se exige do sujeito a

consecução de determinado fim a qual está subordinado o respectivo adimplemento.

Ou seja, o devedor se exonera somente quando o fim prometido é alcançado de

fato. É o caso, por exemplo, dos cirurgiões plásticos, cuja atuação não se limitaria ao

acompanhamento do paciente com todos os deveres de cautela, mas sim, ao

desenvolvimento de uma conduta especificamente para a obtenção de um resultado

no plano da realidade.

Não o fim não sendo almejado, é considerado inadimplente, devendo

responder pelos prejuízos decorrentes do insucesso. Para os doutrinadores e alguns

juristas:

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Dizem a doutrina e a jurisprudência que a cirurgia plástica constitui obrigação de resultado. Deve o profissional, em princípio, garantir o resultado almejado. „Há, indiscutivelmente, na cirurgia estética, tendência generalizada a se presumir a culpa pela não obtenção‟ (Kfouri Neto, 1998, p.165). Não resta dúvida de que a cirurgia estética ou meramente embelezadora trará em seu bojo uma relação contratual. Como nesse caso, na maioria das vezes, o paciente não sofre de moléstia nenhuma, e a finalidade procurada é obter unicamente um resultado estético favorável, entendemos que se trata de obrigação de resultado. Nessa premissa, se não fosse assegurado um resultado favorável pelo cirurgião, certamente não haveria consentimento do paciente. (VENOSA, 2013, p.101)

O cirurgião deve explicar a técnica a ser utilizada, a necessidade ou não de retoque, os cuidados que o paciente deve adotar antes e depois de cirurgia. A prova de haver o cirurgiã esclarecido de forma ampla o paciente não isentará de reponsabilidade o médico que agir com imperícia, imprudência ou negligência. (NETO, 1998, p.59)

O Desembargador Miguel Kfouri Neto (BRASIL, 2007) esclarece o tema em

seu relato sobre o julgamento da Apelação pelo TJ/SP (in RT 638/90):

O Tribunal de Justiça de São Paulo (in RT 638/90) julgou apelação manifestada contra sentença que condenara o cirurgião plástico a reparar os danos causados à paciente, consistentes em deiscência de sutura e cicatrizes do tipo queloide. Asseverou o relator: "No tocante a queloides, não existe a comprovação de que o médico advertiu a cliente (que, sendo a autora de raça amarela, apresenta maiores problemas com queloides) dos perigos da cicatrização". Mas, neste caso, além da inexistência de prova do consentimento, reconheceu o Tribunal existir, também, culpa do médico.

Em que pese a cirurgia plástica embelezadora tratar de obrigação de

resultado, a nobre jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça orienta sobre a

medida em que a responsabilidade do cirurgião plástico é subjetiva. Ou seja, a

responsabilidade quando se esteia na ideia de culpa, cabe a ele provar que os

episódios danosos advém de razões externas à sua atuação.

Um caso semelhante é apresentado no acórdão abaixo:

DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO. CIRURGIA PLÁSTICA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. SUPERVENIÊNCIA DE PROCESSO ALÉRGICO. CASO FORTUITO. ROMPIMENTO DO NEXO DE CAUSALIDADE. 1. O requisito do prequestionamento é indispensável, por isso inviável a apreciação, em sede de recurso especial, de matéria sobre a qual

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não se pronunciou o Tribunal de origem, incidindo, por analogia, o óbice das Súmulas 282 e 356 do STF. 2. Em procedimento cirúrgico para fins estéticos, conquanto a obrigação seja de resultado, não se vislumbra responsabilidade objetiva pelo insucesso da cirurgia, mas mera presunção de culpa médica, o que importa a inversão do ônus da prova, cabendo ao profissional elidi-la de modo a exonerar-se da responsabilidade contratual pelos danos causados ao paciente, em razão do ato cirúrgico. (...) 4. Recurso especial não conhecido”111. (BRASIL, 2012)

Salienta-se que a obrigação de meio e de resultado na responsabilidade civil

médica, decorre de um elo entre as partes (médico e paciente) em que há deveres a

serem percebidos por ambos. No contrato, o médico assume a obrigação de realizar

a prestação de serviço, já o paciente assume o dever de custear tal serviço e

cumprir com as orientações a ele passada, tendo assim, o êxito. Caso não seja

cumprido nenhum desses deveres ou obrigações, caberá a responsabilidade civil

pelo descumprimento dos mesmos.

Se alguém se compromete a presta serviços profissionais a outrem, assume uma obrigação, um dever jurídico originário. Se não cumprir a obrigação (deixar de prestar serviços), violará o dever jurídico originário, surgindo daí a responsabilidade, o dever de compor o prejuízo causado pelo não cumprimento de obrigações. Em síntese, em toda obrigação há um dever jurídico originário, enquanto que na responsabilidade há um dever jurídico sucessivo. (FILHO, 2010, p.02)

Já acerca das cirurgias plásticas, persistem discussões entre as doutrinas,

referentes às obrigações que o médico cirurgião plástico assume diante desta

prática, se esta é de meio ou de resultado.

Nas obrigações de resultado, a execução considera-se atingida quando o devedor cumpre o objetivo final; nas de meio, a inexecução caracteriza-se pelo desvio de certa conduta ou omissão de certas precauções, a que alguém se comprometeu, sem se cogitar do resultado final. Como bem distingue a doutrina, na obrigação de resultado a essência da prestação é o bem jurídico almejado, ao passo que na obrigação de meio o devedor se obriga a envidar esforços para atingir certo objetivo, não se comprometendo, no entanto, a obtê-lo. (PEREIRA e GAMA, 2010, p. 47 e 48)

A maior polêmica que persiste entre as doutrinas é que se aplica na obrigação

de resultado, a inversão do ônus da prova. Caso contrário, para a obrigação de

meio, caberia ao paciente a comprovação de culpa médica.

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Portanto, na obrigação de meio o credor (paciente) deve provar que o devedor (médico) não teve o grau de diligência dele exigível; ao contrário, na obrigação de resultado, essa prova incumbe ao médico, visto recair sobre ele uma presunção de culpa, que poderá ser elidida, mediante demonstração de causa diversa. (NETO, 1998, p. 160)

No entanto, percebe-se, que se faz desnecessária essa discussão, pois o

paciente, na condição de consumidor, destinatário final da prestação do serviço, se

torna vulnerável em relação ao médico, quem contém todo o conhecimento,

aprendizado, informações, técnicas e formação sobre o assunto.

Pois o consumidor, no caso o paciente, não contem conhecimentos

suficientes para provar a culpa do profissional, não havendo qualquer fundamento

para tal discriminação, razão pelo qual é imprescindível a inversão do ônus da prova.

3. ÓRGÃOS REGULADORES DOS PROFISSIONAIS DE MEDICINA

Para se tornar um profissional liberal exige-se mais do que a formação na

área em que se atua. É preciso ter responsabilidade com o trabalho a ser prestado

para a população, essencialmente quando esse serviço está vinculado com a área

médica, regida por um código de ética profissional.

É salutar que todo profissional liberal se responsabilize pelo serviço que

oferece, independentemente da área em que atua. Mas quando se trata de um

profissional da área médica, sua responsabilidade se intensifica.

Os profissionais liberais são registrados e licenciados por um Órgão

Regulador que os credenciam a operar sua atividade com responsabilidade. Tal

órgão regulador atua em âmbito federal através do Conselho Federal de Medicina

(CFM) e em âmbito regional através do Conselho Regional de Medicina (CRM).

Ambos têm o dever de instruir, fiscalizar, supervisionar e, quando necessário, aplicar

punições administrativas.

Quando fica comprovado para o CRM o erro do médico, este é julgado,

condenado e punido administrativamente. Porém, ao ser condenado, o médico terá

o direito de se defender e recorrer da decisão que lhe impôs a culpa do fato danoso.

Quando denunciado, o médico é condenado pelo Conselho, podendo recorrer junto

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ao CFM, que é o órgão competente para julgar os recursos das ações movidas

contra os profissionais liberais na área médica.

Destarte, o médico, quando comete algum ato ilícito no exercício de sua

profissão, seja por negligência, imprudência ou imperícia, terá que arcar com o ônus

de reparar o dano que ocasionou ao seu paciente. Sendo o médico cirurgião-plástico

condenado pelo CRM ou pelo CFM, isso não o isentará de sofrer uma condenação

na Justiça Estadual, pois a condenação do Órgão Regulador é administrativa e não

impede que o médico seja processado e condenado nas Varas Cíveis e Criminais,

protegendo a vítima do direito de obter uma reparação indenizatória, se comprovada

a culpa do médico.

4. TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) é um documento que

visa proteger a autonomia dos pacientes, no qual atestam estar cientes de suas

condições, como sujeitos de pesquisa ou submetendo-se a procedimentos médicos

considerados invasivos, além de ser um documento de valor inestimável para a

proteção dos médicos no tocante às ações judiciais.

O paciente, ao assiná-lo, concorda com a realização do procedimento -

mesmo que lhe possa causar efeitos não desejados, mas previstos e previamente

explicitados pelo médico – e dá uma declaração escrita da boa-fé do profissional,

assumindo a responsabilidade conjunta da escolha do tratamento. Quanto ao

médico, necessário faz-se ressaltar que se isenta de erros, mas divide a

responsabilidade da escolha do tratamento e compartilha com o paciente os

prováveis resultados.

O documento tem validade relativa. É presumidamente válido, mas pode ser

impugnado em eventual processo judicial. Fato que não lhe retira a importância, haja

vista que para desconfigurar a presunção de validade, é preciso comprovar que o

TCLE, apesar de assinado, não foi obtido de forma legítima.

O princípio da liberdade que tem o paciente de, esclarecida e

conscientemente, escolher o tratamento, a terapêutica e o procedimento a que

pretende se submeter ou ser submetido, encontra respaldo no artigo 5º, inciso II da

Constituição Federal de 1998.

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Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei.

Com o advento do Código Civil Brasileiro, o artigo 15 particularizou o princípio

fundamental da liberdade de ação e de livre escolha do paciente, estatuindo que

“ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento

médico ou a intervenção cirúrgica.”

Antes de qualquer tipo de tratamento, conduta terapêutica ou qualquer que

seja a intervenção em seu organismo, o paciente tem o direito a esclarecimentos

sobre todas as possibilidades alternativas, suas consequências, vantagens e

desvantagens de cada uma delas em relação às demais, para, somente depois de

totalmente informado e esclarecido, livremente optar e autorizar o médico a realizá-

la.

É dever do médico esclarecer, e, é direito do paciente escolher, optar e

decidir. A última palavra deverá ser sempre do paciente. Caso o médico aja sem o

consentimento esclarecido do paciente, e do seu agir venha a ocorrer um resultado

danoso ao paciente, o médico responderá por perdas e danos por ter realizado

alguma intervenção no organismo do paciente sem a sua autorização. Nesse caso, o

médico assume o risco de produzir o efeito danoso ou resultado nefasto. O

tratamento forçado, mesmo em situação de emergência, fere os direitos de

personalidade do paciente.

O art. 147 do Código Civil (BRASIL, 2002) preceitua que “nos atos bilaterais o

silêncio intencional de uma das partes, a respeito de fato ou qualidade que a outra

parte haja ignorado, constitui omissão dolosa, provando-se que sem ela não se teria

celebrado o contrato”.

Não basta que o médico obtenha o consentimento do paciente. É necessário,

indispensável, fundamental e inafastável que tenha havido um prévio e total

esclarecimento ao paciente. A obtenção de consentimento, sem que o paciente

tenha sido plenamente esclarecido, acarretará a responsabilidade do profissional,

salvo em situação de emergência, onde não há oportunização de tais formalidades.

A omissão na informação correta ao paciente pode acarretar responsabilidade

profissional. O princípio a ser levado em conta é que, quanto mais arriscada a

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intervenção do profissional, seja com tratamento, seja com cirurgia, tanto mais

necessárias tornam-se a advertência e informação ao paciente.

Por fim, o fato de o paciente assinar o TCLE, no entanto, não isenta o médico

da responsabilidade sobre o procedimento a ser realizado. A responsabilidade do

médico sempre prevalecerá, caso tenha agido de forma dolosa ou culposa,

provocando danos ao paciente. O TCLE e o prontuário, juntos são, na maioria das

vezes, as melhores peças de defesa para o médico, pois indica que o paciente sabia

de todos os riscos a que estaria sujeito e, mesmo assim, aceitou o procedimento

para preservar ou restabelecer a sua saúde.

Sobretudo, o TCLE não exonera o médico do seu dever de cautela, zelo,

cuidado e empenho para que a vida e a saúde do paciente sejam preservadas ou

restabelecidas.

5. A APLICAÇÃO DO CDC NA RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE

De acordo com o inciso XX do Capítulo I do Código de Ética Médica, que trata

dos Princípios Fundamentais, a relação entre médico e paciente não se enquadra

como relação de consumo, por ser de natureza personalíssima da profissão.

Todavia, atualmente, doutrina e jurisprudência vêm entendendo que a relação

médico paciente é consumerista, aplicando-se o art. 14, §4º do Código de Defesa do

Consumidor – CDC (BRASIL, 1990), levando em consideração que a classe médica

encontra-se como profissionais liberais:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

[...] §4° A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será

apurada mediante a verificação de culpa.

Tal entendimento é mais condizente com a boa-fé nas relações contratuais e

a vulnerabilidade, condição na qual o paciente geralmente se encontra, não só em

relação à sua condição psicofísica, mas também devido à informação técnica que o

profissional médico detém. Desse modo, para garantir a isonomia das partes em

possível litígio, principalmente no caso de pedido de indenização, caberia ao médico

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provar que não agiu com culpa, seja com dolo ou culpa em sentido estrito, e,

provando o paciente a sua hipossuficiência, aplicar-se-ia, portanto, o inciso VII do

art. 6º do CDC:

Art. 6º. São direitos básicos do consumidor: VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a

inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências.

Há ainda, autores que entendem que se aplicando o Código de Defesa do

Consumidor, na relação médico-paciente, adota-se também a regra geral da

responsabilidade desta lei, a responsabilidade objetiva. É o pensamento de Maria

Helena Diniz (2011, p.112), nos casos de cirurgias plásticas estéticas:

O médico que atende a um chamado determina, desde logo, o nascimento de um contrato com o doente ou com a pessoa que o chamou em benefício do enfermo. Há, portanto, um contrato entre o médico e seu cliente, que se apresenta como uma obrigação de meio e não de resultado, por não comportar o dever de curar o paciente, mas sim o de prestar-lhe cuidados conscienciosos e atentos conforme os progressos da medicina, procurando sempre obter seu consentimento prévio e esclarecido. Há casos em que se supõe a obrigação de resultado com sentido de cláusula de incolumidade, como ocorre na cirurgia plástica estética ou no contrato de hospitalização, em que o médico assume o dever de preservar o enfermo de acidentes, hipóteses em que sua responsabilidade civil será objetiva e não subjetiva.

Alude Carlos Roberto Gonçalves (2010, p. 257):

A prova da negligência e da imperícia constitui, na prática, verdadeiro tormento para as vítimas. Sendo o médico, no entanto, prestador de serviço, a sua responsabilidade, embora subjetiva, está sujeita à disciplina do Código de Defesa do Consumidor, que permite ao juiz inverter o ônus da prova em favor do consumidor (art. 6º, VIII). Deve ser lembrado, ainda, que a hipossuficiência nele mencionada não é apenas econômica, mas precipuamente técnica.

Também a jurisprudência minoritária parte do entendimento que, no caso da

cirurgia embelezadora, a responsabilidade civil é objetiva. Já decidiu o Tribunal de

Justiça do Rio Grande do Sul, da seguinte forma:

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Ementa: APELAÇÃO CIVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. CIRURGIA PLÁSTICA. RESPONSABILIDADE DE RESULTADO. PROVA PERICIAL. TÉCNICA UTILIZADA INDICADA. Não se conhece do agravo retido interposto quando ausente pedido de apreciação expresso em relação aos fundamentos que pretende ver modificado. Em se tratando de cirurgia estética, a responsabilidade do médico é objetiva. A tarefa médica do cirurgião, portanto, não se caracteriza como obrigação de meio, mas verte obrigação de resultado. Em se tratando de procedimento puramente estético, como na hipótese dos autos, objetivando apenas o embelezamento, o contrato médico-paciente é de resultado, não de meio. A perícia produzida deixou inconteste que o procedimento adotado pelo médico foi o correto. Verifica-se que os réus agiram dentro da conduta coerente e prudente que era esperada, não havendo motivo para ser imputada à responsabilidade que está sendo postulada pela parte autora. AGRAVO RETIDO NÃO CONHECIDO. APELO DESPROVIDO.” (BRASIL, 2011).

Diante a confusão de parte da doutrina e jurisprudência entre obrigação de

meios e de resultado, e responsabilidade civil subjetiva e objetiva, deve-se ressaltar

que os casos de responsabilidade civil objetiva sempre decorrem de menção legal

expressa, o que não se aplica aos profissionais médicos, ao contrário das

instituições hospitalares e clínicas, nas quais exercem suas atividades.

No entanto, vale ressaltar que a relação do médico com o paciente modificou-

se com o tempo. Sendo, construída espontaneamente. Porém sua qualidade

depende de esforços e habilidade do profissional de saúde de adequar-se às

características subjetivas de cada paciente. É extremamente fundamental, já que o

resultado do trabalho médico depende bastante da forma como que esta relação foi

construída.

Destarte, uma relação médico-paciente pouco comunicativa pode implicar em

danos físicos e morais irreparáveis ao doente, além de punições severas aos

médicos recorrentes de processos judiciais. Acusações processuais contra médicos

multiplicam-se hoje devido ao comportamento não mais passivo dos pacientes que

agora se informam facilmente, pelos meios de comunicação, sobre as patologias que

eventualmente lhe interesse. Deve o médico, desta forma, atuar de maneira a

respeitar a autonomia do paciente e utilizar seu conhecimento científico a favor da

elaboração de propostas que buscam a melhor orientação e tratamento de seu

paciente.

O tratamento médico é atualmente alcançado pelos princípios do Código de

Defesa do Consumidor. O paciente coloca-se na posição de consumidor, nos termos

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do artigo 2º da Lei 8.089/90. O médico ou pessoa jurídica que presta o serviço

coloca-se como fornecedor de serviços, de acordo com o artigo 3º da referida Lei.

Com efeito, nos termos do inciso III do artigo 6º do CDC:

São direitos básicos do consumidor a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem. (BRASIL, 1990)

Sendo assim, é dever do médico explicar a natureza da moléstia e os riscos

do tratamento ou terapia, devendo aclarar sobre as consequências normais de

determinada conduta.

A obrigação de resultado encerra obrigação acessória consistente no dever

de informar (arts. 30 e 31 do CDC), tendo por fundamento o princípio da boa-fé, que

se traduz na honestidade e lealdade da relação jurídica. O paciente deve ter exata

compreensão das vantagens e desvantagens que a intervenção cirúrgica estética

envolve, para poder decidir-se sobre a submissão ao tratamento. O descumprimento

desse dever dá lugar à indenização.

Não obstante a previsão contida no § 4º do art. 14 do CDC, no sentido de que

a responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a

verificação de culpa, entende-se que, em se tratando de obrigação de resultado, há

presunção de culpa em desfavor do agente causador do dano, a quem incumbe

afastar a culpa em face do sistema de inversão do ônus da prova.

6. ANÁLISE DE JURISPRUDÊNCIA

Verifica-se que nos tribunais, as decisões, em sua maioria, têm sido a favor

dos pacientes quanto à reparação de danos causados pelos médicos cirurgiões-

estéticos de embelezamento, as quais são tratadas como obrigação de resultado. No

que se refere à cirurgia plástica, tem-se alguns exemplos de jurisprudência.

6.1. JURISPRUDÊNCIA 1: NÃO ISENÇÃO DA CULPA MÉDICA

CIVIL E PROCESSUAL. CIRURGIA ESTÉTICA OU PLÁSTICA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO (RESPONSABILIDADE CONTRATUAL OU OBJETIVA). INDENIZAÇÃO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. I - Contratada a realização da cirurgia estética

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embelezadora, o cirurgião assume obrigação de resultado (responsabilidade contratual ou objetiva), devendo indenizar pelo não-cumprimento da mesma, decorrente de eventual deformidade ou de alguma irregularidade. II - Cabível a inversão do ônus da prova. III - Recurso conhecido e provido (STJ - RECURSO ESPECIAL : REsp 81101 PR 1995/0063170-9 - BRASIL, 1999).

Constata-se que foi estabelecida a responsabilidade do médico como

obrigação de resultado, e por não ter atingido o que era pretendido pelo paciente, o

médico-cirurgião foi julgado como culpado e o magistrado julgou procedente o

pedido de indenização. Compreende-se que os danos causados ao paciente, como

irregularidades e deformações, prova para o juízo o não cumprimento do contato,

sendo o médico, assim, condenado a pagar indenização.

6.2. JURISPRUDÊNCIA 2: ISENÇÃO DA CULPA MÉDICA PELO TCLE

PACIENTE QUE, APÓS O ATO CIRÚRGICO, APRESENTA DEFORMIDADES ESTÉTICAS. CICATRIZES SUPRA PÚBICAS, COM PROLONGAMENTOS LATERAIS EXCESSIVOS. Depressão na parte mediana da cicatriz, em relação à distância umbigo/púbis. Gorduras remanescentes. Resultado não satisfatório. - Embora não evidenciada culpa extracontratual do cirurgião, é cabível o ressarcimento. A obrigação, no caso, é de resultado, e não de meio. Consequentemente, àquele se vincula o cirurgião plástico. Procedência parcial do pedido, para condenar o réu ao pagamento das despesas necessárias aos procedimentos médicos reparatórios. Dano estético reduzido. Ressarcimento proporcional. Custas e honorários de 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação. (2ª Vara de Itanhaém SP-BRASIL, 1993)

Nessa situação, o médico-cirurgião plástico está sendo acusado de culpa

pelos danos causados na cirurgia. No entanto, o juízo, em análise dos autos,

interpretou que o mesmo não teve culpa, pelo motivo de que a paciente concordou e

tomou ciência dos riscos da cirurgia ao assinar o termo de consentimento. Ficando

assim, decidido apenas ressarcimento dos danos causados.

Além disso, há casos na jurisprudência em que o paciente acusa o médico de

erro, porém não consegue provar:

Ementa: DANOS MORAIS E ESTÉTICOS - Alegação de erro médico em cirurgia plástica - Constatação de ínfima alopécia em região cicatricial - Perícia que indica que a técnica cirúrgica empregada foi corretamente utilizada e que a existência de cicatriz é inerente ao procedimento cirúrgico - Exclusão do nexo causal - Não configuração do erro médico - Recurso improvido. (TJ-SP - Apelação

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APL 02492800620078260100 SP 0249280-06.2007.8.26.0100 TJ-SP -BRASIL, 2013)

Nota-se que o magistrado deliberou uma perícia onde averiguou que a técnica

usada pelo profissional foi a correta e que a cicatriz adquirida em sua recuperação,

no pós-operatório, não tem nada a ver com o procedimento realizado, pois foi natural

do corpo.

6.3. JURISPRUDÊNCIA 3: CONFIGURAÇÃO DE ERRO MÉDICO

Na jurisprudência em seguida, nota-se que o paciente teve impasses no

resultado de sua cirurgia plástica (lipoaspiração e abdominoplastia) a qual, são

caracterizados como embelezadora. Diante disso, entrou com ação para requere

indenização por danos materiais, morais e estéticos, por ter ocorrido “acentuação de

imperfeições físicas”. Ou seja, o resultado da cirurgia piorou o quadro de

imperfeições antigas do paciente. Vejamos:

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. CONSUMIDOR. APELAÇÃO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, MATERIAIS E ESTÉTICOS. CIRURGIA PLÁSTICA. INTERVENÇÃO ESTÉTICA (LIPOESCULTURA E ABDOMINOPLASTIA). OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. ACENTUAÇÃO DE IMPERFEIÇÃO FÍSICA. AUSÊNCIA DE CONSENTIMENTO INFORMADO. CULPA PRESUMIDA. DANO MORAL CONFIGURADO. CARACTERIZAÇÃO DO DANO ESTÉTICO. DANO MATERIAL PARCIALMENTE ACOLHIDO. DEVER DE INDENIZAR. QUANTUM. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. ARTIGO 20, § 3º E ARTIGO 21, PARÁGRAFO ÚNICO, AMBOS DO CPC. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O objetivo da cirurgia plástica estética é a correção da beleza plástica. Dessa feita, tanto na doutrina quanto na jurisprudência pátrias, o entendimento prevalente é o de que a obrigação do profissional médico que realiza cirurgia plástica é de resultado, e não apenas de meio. 2. Nesse contexto, em se tratando de cirurgia plástica estética, o resultado do procedimento cirúrgico pode ser frustrante tanto para o médico quanto para o paciente, caso este mostre descontentamento com o resultado da cirurgia. [...]3. [...]conforme artigo 14 do CDC e pelas disposições dos art. 186, 187, 927 e 932, III, e 951, todos do CC. 4. Configurada a culpa do médico responsável pelo procedimento cirúrgico em relação ao resultado inesperado, não há como afastar-se a obrigação da parte ré em arcar com as despesas para a realização de novo procedimento cirúrgico com vistas a corrigir

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as imperfeições experimentadas pela parte autora, inclusive os custos de internação, anestesia e outros procedimentos necessários à realização do ato cirúrgico, bem como ao pagamento de indenização por dano moral e estético. 5 [...]. 6. Considerando que a parte apelante obteve sucesso na maioria dos seus pedidos e ante a sua sucumbência mínima, a teor do art. 21, parágrafo único, do CPC, condeno a parte ré ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios no importe de 10%, em consonância com os parâmetros do art. 19, § 3º do CPC. 7. Recurso conhecido e parcialmente provido.” (TJ-DF - Apelação Cível : APC 20110110027039 DF 0001102-05.2011.8.07.0001).

Por sua vez, o jurista em sua decisão enumerou os pontos da sua

fundamentação, os quais serão expostos a baixo, e posteriormente comentados:

a) A obrigação de resultado do médico plástico estético embelezador

sobressai à obrigação de meio: se dá porque na cirurgia plástica está em seu

contrato, que é determinante para o seu cumprimento, a concretização de um

resultado específico, sem o qual não haveria razão da sua realização. Ficando o

médico obrigado a indenizar o paciente pelo fato de não ter realizado o resultado

esperado;

b) O médico deve utilizar a melhor técnica terapêutica com segurança e

informar ao paciente todos os riscos que podem ocorrer, tanto no pré quanto

no pós-operatório, bem como a possibilidade de não alcançar o resultado

esperado, solicitando que o mesmo assine o termo de consentimento somente

se concordar com todas as possibilidades explicadas: o TCLE é documento de

relevante importância na relações médico-paciente, pois não estando o paciente

informado dos possíveis danos, o mesmo poderá solicitar a reparação de danos.

Todavia, ao assiná-lo, ambos ficam cientes dos danos que possam vir a ocorrer,

ficando este como prova na defesa do médico, podendo o magistrado inverter o

ônus da prova, quando assim ficar provado, que através da assinatura do TCLE, o

paciente que teve culpa;

c) O artigo 14 do CDC: Pretexta sobre a responsabilidade civil dos profissionais

liberais, como no caso dos médicos, em geral. Como dispõem os § § 3º e 4º, que o

fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar que o problema

não existe ou que a culpa foi exclusiva do consumidor ou de terceiros, caso

contrário, o mesmo deverá sempre responder pela reparação de quaisquer danos

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393

causados aos consumidores relativos à prestação dos serviços, e também por

informações insuficientes ou inadequadas, mesmo não tendo sido culpado.

Destarte, referente à análise e comentário da decisão do jurista, observa-se

que o médico foi declarado culpado pelo resultado, culpa presumida, por contatar-se

que o paciente não assinou o TCLE. Isso acarreta em que o médico não informou o

paciente de forma clara/esclarecida os posteriores riscos advindo do procedimento

cirúrgico.

Assim, o hospital e o médico foram condenados a pagarem nova cirurgia

plástica, arcando com todas as despesas do procedimento, a fim de corrigir os

danos deixados no paciente, bem como, o pagamento de indenização por danos

morais e estéticos, além de custas e honorários sucumbenciais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme pesquisa apresentada, conclui-se que foi possível atingir os

objetivos, no qual observou-se que o médico cirurgião plástico que realiza cirurgias

plásticas embelezadoras é responsável pelo resultado.

Diante o posicionamento da legislação vigente, bem como dos doutrinadores

e jurisprudências, relatam que este tem como obrigação garantir o resultado final,

pois quando o paciente opta por fazer tal procedimento, deposita, assim, toda sua

confiança na capacidade do profissional.

Diante disso, podemos entender que antes de realizar tal procedimento, a

relação médico-paciente tem que ser de altíssima confiança, havendo transparência

principalmente por parte do cirurgião sobre tudo que pode vir acontecer durante e

após o procedimento cirúrgico. E quando o mesmo não fornece todas as

informações necessárias ao paciente, viola um dos direitos básicos previstos no

CDC, que é o direito à informação sobre os riscos que poderão ocorrer ao optar pela

cirurgia plástica, tanto embelezadora quanto reparadora. Pois ao ocultar tal

informação, o médico compromete sua carreira como também coloca à vida do

paciente em risco.

Assim, nos dias que correm, o Judiciário contém inúmeras ações de

indenização desinente de erro médico, buscando a responsabilização civil do

profissional em cirurgia plástica, pelo resultado insatisfatório e consecutivos danos

gerados em seus procedimentos.

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Anais do I Congresso Acadêmico de Direito Constitucional

394

Conforme jurisprudências, cada caso é um caso que deve ser analisado em

sua totalidade para que o magistrado tome sua decisão, baseando-se nos devidos

códigos, no intuito de responsabilizar corretamente a parte que agiu de forma

incorreta, de acordo com a legislação.

Tais danos podem ser graves, irreversíveis ou até mesmo levar o paciente a

óbito. Por esses motivos, o médico deve agir com toda cautela e perícia que o cargo

lhe estatui, fazendo tudo que estiver a seu alcance, para que o paciente esteja

ciente/informado dos possíveis danos.

Ainda que ocorram reações adversas, devido ao biótipo do paciente, como

por exemplos, as queloides, estando o paciente informado e ciente dos possíveis

riscos decorrentes da cirurgia plástica, tanto embelezadora ou reparadora, o

resultado alcançado seria de acordo com termo de consentimento livre e esclarecido

obtido ao paciente. E isto não implicaria na mudança do tipo de obrigação assumida

pelo médico, continuando a ser obrigação de resultado.

Ou seja, o simples fato do paciente ter assinado o termo de informação, não

instará do profissional de responder por possíveis danos, como omissão, imperícia,

negligencia ou imprudência. Com o propósito de que seja devidamente

caracterizado o erro médico, deverá considerar o dano, estabelecer o nexo causal e

analisar o motivo em que constatou o ato médico e a culpa.

Contudo, vale salientar que é importante o valor dessa pesquisa, em que

pese nos dias correntes os números de mortes terem crescido exorbitantemente,

tudo pela negligência, imprudência ou perícia do profissional.

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