a realidade do sistema prisional no brasil: gt 7 conflitos, direitos ... · a realidade do sistema...

13
A REALIDADE DO SISTEMA PRISIONAL NO BRASIL: Um dilema entre as penas e os direitos humanos GT 7 Conflitos, Direitos Humanos e Segurança Pública Autoras Josiane Marques Lindalva Barreto Ludmila dos Santos Solange Silva P. Santos Santos Valdicleide Dias Mato Grosso RESUMO: Este trabalho trata-se de uma análise do sistema sócio jurídico com recorte sobre o sistema penitenciário brasileiro frente às previsões contidas na Lei de Execução Penal, fazendo um resgate histórico do surgimento das prisões, sua utilização como pena propriamente dita e a realidade atual dos presídios com foco no processo de ressocialização como forma de garantir a reabilitação dos detentos levando em consideração a promoção dos Direitos Humanos. Para tanto, traça um paralelo entre o que se encontra na Lei de Execução Penal, onde estão expressos os direitos e os deveres dos condenados e dos presos provisórios e o que de fato são efetivados, um enfoque entre a realidade e a previsão normativa. Palavras-chave: Direitos Humanos; sistema penitenciário; ressocialização, Lei de Execução Penal. Trabalho apresentado no V Seminário da Pós Graduação em Ciências Sociais: Cultura, Desigualdade e Desenvolvimento - realizado entre os dias 02, 03 e 04 de dezembro de 2015, em Cachoeira, BA, Brasil Josiane Marques (Universidade Federal do Recôncavo da Bahia UFRB, e-mail: [email protected]); Lindalva Barreto (Universidade Federal do Recôncavo da Bahia UFRB, e-mail: - UFRB, e-mail: [email protected]); Ludmila dos Santos (Universidade Federal do Recôncavo da Bahia UFRB, e-mail: [email protected]); Solange Silva P. Santos (Universidade Federal do Recôncavo da Bahia UFRB, e-mail: [email protected]); Valdicleide Mato Grosso (Universidade Federal do Recôncavo da Bahia UFRB, e-mail: [email protected]).

Upload: lamkiet

Post on 16-Nov-2018

218 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

A REALIDADE DO SISTEMA PRISIONAL NO BRASIL: Um dilema entre as

penas e os direitos humanos

GT 7 – Conflitos, Direitos Humanos e Segurança Pública

Autoras

Josiane Marques

Lindalva Barreto

Ludmila dos Santos

Solange Silva P. Santos Santos

Valdicleide Dias Mato Grosso

RESUMO:

Este trabalho trata-se de uma análise do sistema sócio jurídico com recorte sobre o

sistema penitenciário brasileiro frente às previsões contidas na Lei de Execução

Penal, fazendo um resgate histórico do surgimento das prisões, sua utilização como

pena propriamente dita e a realidade atual dos presídios com foco no processo de

ressocialização como forma de garantir a reabilitação dos detentos levando em

consideração a promoção dos Direitos Humanos. Para tanto, traça um paralelo entre

o que se encontra na Lei de Execução Penal, onde estão expressos os direitos e os

deveres dos condenados e dos presos provisórios e o que de fato são efetivados, um

enfoque entre a realidade e a previsão normativa.

Palavras-chave: Direitos Humanos; sistema penitenciário; ressocialização, Lei de

Execução Penal.

Trabalho apresentado no V Seminário da Pós Graduação em Ciências Sociais: Cultura,

Desigualdade e Desenvolvimento - realizado entre os dias 02, 03 e 04 de dezembro de 2015, em

Cachoeira, BA, Brasil

Josiane Marques (Universidade Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB, e-mail:

[email protected]); Lindalva Barreto (Universidade Federal do Recôncavo da Bahia –

UFRB, e-mail: - UFRB, e-mail: [email protected]); Ludmila dos Santos (Universidade

Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB, e-mail: [email protected]); Solange Silva P. Santos

(Universidade Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB, e-mail: [email protected]);

Valdicleide Mato Grosso (Universidade Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB, e-mail:

[email protected]).

INTRODUÇÃO

Considerando que a pena de prisão tem por objetivo a proteção da sociedade

contra o crime, entende-se também que esse objetivo só pode ser alcançado se

quando, durante o processo de reclusão, ao preso sejam proporcionadas condições

mínimas no qual ele compreenda que, após o cumprimento da pena, ao reingressar

na sociedade, o mesmo terá que, não somente respeitar a lei, mas principalmente de

auto sustentar-se diante da sociedade. Desta forma, o preso terá como direito as

condições que possibilitem o seu processo de ressocialização.

Essas condições, referentes ao processo de ressocialização, estão ligadas

diretamente aos diversos instrumentos de Direitos Humanos que são observados no

tratamento a ser dado às pessoas privadas de sua liberdade. Esses direitos, além de

estarem contidas nos princípios legais dos Direitos Humanos, como a Declaração

Universal dos Direitos Humanos, o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e

Políticos, encontram-se detalhados em vários outros instrumentos internacionais, dos

quais o Brasil é membro, como também, nos nacionais, que tratam especificamente

de pessoas presas e em condições de detenção.

Entre esses instrumentos destaca-se aqui, os Estatutos Penitenciários e a Lei

de Execução Penal (LEP) onde no Capítulo IV – Dos Deveres, dos Direitos e da

Disciplina - Art. 41 constituem direitos como: alimentação suficiente e vestuário;

atribuição de trabalho e sua remuneração; assistência material, à saúde, jurídica,

educacional, social e religiosa; entre outros.

O discurso jurídico penal brasileiro apresenta uma ideologia no qual, as

palavras chaves são prevenção, retribuição e ressocialização, mas numa melhor

compreensão sobre o sistema prisional, o que podemos observar é que apenas a

palavra retribuição faz parte do contexto. Assim, o sistema penitenciário brasileiro é

alvo de críticas por parte da sociedade, organizações nacionais e mesmo

internacionais de Direitos Humanos, pelas suas deficiências que ao invés de

proporcionar a ressocialização dos presos, acaba por aumentar o número de

infratores e reincidentes.

HISTÓRICO DO SISTEMA PRISIONAL

Em tempos atrás, os réus não eram condenados especificamente pela perda

da liberdade por algum período. Eram punidos com morte, suplício, açoite,

amputação de membros, trabalhos forçados, etc. Para viabilizar a punição imposta,

permaneciam presos durante um período necessário enquanto aguardava o

julgamento. Assim, o encarceramento era um meio, não o fim da punição. Nesse

contexto, não existia preocupação com a qualidade do recinto nem com a própria

saúde do prisioneiro.

A partir do século XVIII, a prisão torna-se, então, essência do sistema

punitivo. A finalidade do encarceramento passa a ser isolar e recuperar o infrator. O

atual cárcere insalubre, capaz de fazer adoecer seus hóspedes e matá-los antes da

hora, como simples acessório de um processo punitivo baseado no tormento físico,

apresenta a ideia de um estabelecimento público, severo, regulamentado, higiênico,

intransponível, capaz de prevenir o delito e ressocializar quem o comete.

O processo passa por uma mudança histórica significativa, ainda que muitas

vezes essas últimas características só estejam asseguradas no papel, por isso,

geralmente, o desenvolvimento da prisão é associado ao humanismo.

O sistema prisional atual, ao invés de proporcionar a reabilitação do preso,

acaba por criar novos infratores, mais violentos e revoltados com a sociedade. A

falta de projetos de ressocialização para os detentos e a própria infraestrutura dos

presídios torna o cárcere um ambiente vulnerável e propício à proliferação de

doenças e epidemias e todo tipo de degradação humana, quando deveria oferecer as

devidas assistências previstas na lei, que visa a garantia mínima dos Direitos

Humanos. Assim:

O sentimento de injustiça que um prisioneiro experimenta é uma

das causas que mais pode tornar indomável seu caráter. Quando se

vê assim exposto ao sofrimento que a lei não ordenou nem mesmo

previu, ele entra em estado habitual de cólera contra tudo que o

cerca; só vê carrascos em todos os agentes de autoridade: não

pensa mais ter sido culpado, acusa a própria justiça (FOUCAULT,

2009, p 252).

Essa falta de compromisso do poder público, dentre tantos outros problemas,

demonstram o fracasso do atual sistema penitenciário brasileiro. Essa situação crítica

que são submetidos os presos, sem que ocorra de fato a ressocialização e, portanto,

incentivando ao retorno à criminalidade, nos leva a observar o descaso com os direitos

humanos. “A prisão torna possível, ou melhor, favorece a organização do meio de

delinquentes, solidários entre si, hierarquizados, pronto para todas as cumplicidades

futuras” (FOUCAULT, 2009, p 222).

Um aspecto preocupante do sistema penitenciário brasileiro é a superlotação,

a falta de atendimento à saúde, rebeliões e fugas, corrupção, ineficiência na

reabilitação, entre outros, o que impossibilita o retorno, adequado, do apenado ao

convívio em sociedade. A pena é aplicada e cumprida, mas em condições

inadequadas, em condições degradantes e contrárias ao princípio da dignidade

humana e dos Direitos Humanos, verifica-se, portanto, a necessidade de mudanças.

OS DIREITOS HUMANOS SOB O OLHAR DA SOCIEDADE

Como padrões de referência da vida civilizada, os Direitos Humanos mantêm

relação intrínseca com o exercício da cidadania. É importante citar que, a Constituição

Federal de 1988 incorporou alguns preceitos enunciados nas declarações relativas aos

Direitos Humanos, entre outros, a Proteção de Todas as Pessoas contra a Tortura e

Outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes.

Ainda que, a maioria da população afirme que os Direitos Humanos devem

abarcar a todos, quando o assunto diz respeito à criminalidade no país, tais afirmativas

caem em contradição quando os mesmos declaram ser a favor das duras penas postas

aos indivíduos em conflito com a lei. Visualiza-se, nesse cenário, a concepção de que,

os Direitos Humanos só devem ser garantidos às pessoas “direitas”, e que, portanto,

quem infringe uma lei não se torna “digno” de possuí-los. Como se o desrespeito aos

direitos dos criminosos resultasse na preservação dos direitos de toda sociedade,

incitando-se, assim, a violência nas abordagens policiais, ou pior, a intensificação de

execuções sumárias.

No país existe uma população que não se dá conta da realidade vivida no seu

dia-a-dia, ao desconhecer a existência da legislação que norteia decisões importantes

de suas próprias vidas. Ficando, portanto, subjugado ao controle dos órgãos de

comunicação que funcionam como meio de manipulação, através dos quais é “feita a

cabeça” da maioria, que é levada pela forte influência da mídia. Temos um sistema

de comunicação que dizem o que bem entendem, a ponto de produzirem fatos a

serviço de suas versões.

É fato marcante de nossa sociedade que o sistema de comunicação e

informação são fontes relevantes de poder, portanto, irá sempre influenciar a opinião

pública e assim despertar o sentimento de vingança. É normal ao senso comum,

(influenciado também pela mídia) nutrir um desejo intrínseco de vingança e não de

justiça real, dando uma impressão de que a justiça não passa de uma vingança

formalizada com foco e ditada pelas normas morais e sociais movida pelo desejo de

proporcionar ao outro o que julga que lhe seja merecida.

Permeiam essas sentenças, uma concepção restrita que, considera que os

Direitos Humanos direcionam-se unilateralmente à defesa dos “direitos de

bandidos”. Dessa forma, vê-se que os “direitos não são universais nem automáticos,

mas restritos apenas àqueles que os merecem ou, quando menos, àqueles que não

fizeram nada para perdê-los.” (VENTURI, 2010, p.67). Neste sentido a sociedade

vive em busca de soluções e alternativas em sentido amplo, advindas por parte do

sistema sócio jurídico, no que se refere ao real significado das penas privativas de

liberdade.

O SISTEMA PRISIONAL ATUAL

Como pensar o sistema prisional numa sociedade desigual como a brasileira,

na qual as pessoas são condenadas (ou não) conforme seu statusquo, sendo que o

acesso à justiça é restrito e são utilizadas “formas inquisitórias de produção da

verdade jurídica e desigualdade jurídica?” (LIMA, 2004, p.49). Também não se pode

esquecer o sistema de privilégios do qual goza quem possui instrução superior e as

autoridades governamentais. Vê-se, portanto, que a igualdade perante a lei é apenas

formal, ainda que, como afirma Dias (2005) “o sistema jurídico assegura tratamento

isonômico e proteção igualitária a todos os cidadãos no âmbito social”.

Assim, o princípio constitucional da igualdade fica subsumido à interpretação

que os profissionais do direito fazem dos marcos jurídicos. Entretanto, é importante

destacar que, a cidadania não pode se restringir a princípios dogmático-formais sendo

que os direitos civis têm por premissa a proteção dos indivíduos. Vale destacar que, a

igualdade e a liberdade foram os primeiros Direitos Humanos a serem reconhecidos

enquanto tais.

O sistema prisional atual faz parte de uma política penitenciária e de segurança

pública que, ao invés de proporcionar a reabilitação do preso, acaba por criar novos

infratores, mais violentos e revoltados com a sociedade. A superlotação das prisões, a

falta de projetos de ressocialização dos detentos, a insalubridade dos presídios tornam

o cárcere um ambiente vulnerável e propício à proliferação de doenças e epidemias.

Essas faltas de compromisso do poder público, entre tantos outros problemas,

resultam no fracasso do atual sistema penitenciário brasileiro. Essa crítica situação a

que são submetidos, sem que ocorra de fato a ressocialização, acaba incentivando o

retorno à criminalidade, nos leva a observar o descaso com os Direitos Humanos.

Dessa forma,

A prisão não pode deixar de fabricar delinquentes. Fabrica-os pelo

tipo de existência que faz os detentos levarem: que fiquem

isolados nas selas, ou que lhe seja imposto um trabalho inútil, para

o qual não encontrarão utilidade, é de qualquer maneira, não

“pensar no homem em sociedade; é criar uma existência conta a

natureza inútil e perigosa”; queremos que a prisão eduque os

detentos, mas um sistema de educação que se dirige ao homem

pode ter razoavelmente como objetivo agir contra o desejo da

natureza? A prisão fabrica também delinquentes impondo aos

detentos limitações violentas; ela se destina a aplicar as leis e

ensinar o respeito por elas; ora, todo seu funcionamento se

desenrola no sentido do abuso do poder. (FOCAULT, 2009, p

252)

Nesse sentido, a prisão em si não passa de uma reles instituição falida, sem

mesmo conseguir cumprir seu principal dever. Vários fatores contribuíram para um

precário sistema prisional, o abandono, a falta de investimento e o descaso do poder

público. Sendo assim, a prisão na atualidade, não é senão, uma escola de

aperfeiçoamento do crime, além de ter como característica um ambiente degradante

e pernicioso, acometido dos mais degenerados vícios, sendo impossível a

ressocialização de qualquer ser humano.

ASPECTOS E FINALIDADES DA ATUAL LEI DE EXECUÇÃO PENAL

BRASILEIRA (LEP)

A Lei nº 7.210 de 1984 institui a Lei de Execução Penal - LEP na qual estão

estabelecidas as normas fundamentais que regerão os direitos e obrigações do

sentenciado no curso da execução da pena tem como finalidade atuar como um

instrumento de preparação para o retorno ao convívio social do recluso. Em seu

artigo 1º, a lei deixa claro que seu objetivo baseia-se em dois fundamentos: o estrito

cumprimento dos mandamentos existentes na sentença e a instrumentalização de

condições que propiciem a reintegração social do condenado.

O Brasil apresenta uma população carcerária que só faz crescer conforme

demonstra o gráfico abaixo:

1. Gráfico da Evolução da População Carcerária (2000 – 2010)

Dados atualizados até 07/out/2010 pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

FONTE: DADOS EXTRAÍDOS DO DEPEN (DEPARTAMENTO PENITENCIÁRIO BRASILEIRO)

E DO CNJ (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA).

Por não existir Políticas Públicas efetivas, percebe-se que o sistema prisional

não atende se quer a demanda de assistir os carcerários. Isso acontece porque na

política de Execução Penal existem muitas falhas que começa na execução-gestão e

na falta de controle dos recursos públicos.

A LEP afirma que as resoluções de sentenças criminais têm como meta

garantir a integração social do condenado, porém, seguindo o pensamento do autor

Venturi, essa Lei nada fala sobre a realidade da superpopulação carcerária e sobre

alternativas efetivas para ressocialização do preso, além de outras garantias legais

que são esquecidas.

Analisando alguns dados extraídos do Formulário Categoria e

indicadores Preenchidos, do InfoPen (Sistema Integrado de

Informações Penitenciarias), do Departamento Penitenciário

nacional do Ministério da Justiça (DEPEN/MJ), referente a junho

de 2009, constata-se que a população carcerária nacional era de

469.546 internos, sendo 409.287 custodiados no sistema

penitenciário e 60.259 nas policiais e no sistema de segurança

pública. O número total de vagas, tanto no sistema penitenciário

quanto nas policiais e no sistema de segurança pública, era apenas

299.392 unidades, gerando um déficit momentâneo de 170. 154

acomodações. Em termos percentuais, significa que temos uma

excedente população de 57%, ou seja, para cada cúbico de quatro

camas, colocam-se dois presos ou mais para dormir no chão,

quadro atual da realidade carcerária brasileira no que diz respeito

ao número de vagas. (MAGALHAES, 2010, p 82)

65% 66% 66%

55%52% 54%

57% 57% 56% 56% 56%

35% 34% 34%

45%48% 46%

43% 43% 44% 44% 44%

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010*

Condenados

Provisórios

Podemos considerar que existe uma legislação, no entanto, não há garantia

na efetividade das leis, presencia-se uma população carcerária esquecida sem

nenhum tipo de assistência que possa pelo menos garantir um local adequado com

uma estrutura que possibilite atender a demanda desta população.

2. Gráfico da População Carcerária x Vagas no Sistema Prisional (2000 – 2010)

Dados de outubro de 2010.

FONTE: DADOS EXTRAÍDOSMDO DEPEN (DEPARTAMENTO PENINTENCIÁRIO

BRASILEIRO – MINISTÉRIO DA JUSTIÇA).

Significativa parcela da sociedade brasileira desconhece a função da LEP e

do Presídio. Para a população, as leis e o presídio servem somente para garantir a

prisão do condenado, sem acessibilidade de outros direitos que possibilite seu

retorno à sociedade. A própria LEP mostra que existe um conjunto de leis que

objetiva garantir serviços de saúde, assistência social, material, educacional,

religiosa e jurídico. Acontece que esses serviços encontra-se em deficiência, até

mesmo o atendimento jurídico gratuito (Defensoria Pública) visto que tal instituto

não consegue atingir o fim visado que seria o de prestar todo o auxílio às pessoas

necessitadas para a promoção de universalização do acesso eficiente à justiça.

Segundo Magalhães (2010), “para isso acontecer, deve ser o papel do Estado

garantir uma efetivação destes direitos”.

Percebemos que a LEP foi criada com base nos Direito Humanos, que tem

como finalidade garantir ao presidiário a possibilidade de ressocialização para um

futuro retorno a sociedade. Entretanto, as leis que surgiram para a garantia desses

72%66%

53%

72%

59%

67% 66%

54% 52%

61%64%

38%34%

47%

28%

41%

33% 34%

46% 48% 49%

36%População Carcerária

Vagas no Sistema Prisional

direitos, de fato não garantem uma efetivação dos mesmos. Nesse contexto, o Estado

surge como estrutura de poder institucional negligente porque não consegue resolver

o problema dos carcerários. Com base nisso, entendemos que o sistema prisional

brasileiro encontra-se defasado por não realizar uma política efetiva de

ressocialização.

Quanto aos direitos do homem, não basta fundamentá-los ou

proclamá-los. Nem tampouco basta protegê-los. O problema de

sua realização não é filosófica nem moral, mas tampouco é um

problema jurídico. É um problema cuja solução depende, não do

âmbito filosófico, mas do âmbito político. (BOBBIO, 1992, p 45)

Neste contexto, o Estado brasileiro apresenta um avanço com a criação da

Lei de Execução Penal, porém, presenciamos um país legal que possui leis que

foram criadas para ser executadas. Do outro lado um país real que mostra que as leis

são feitas, mas elas não são aplicadas ou efetivadas, quando vemos a realidade do

carcerário, encontramos uma situação que vai de desencontro aos Direitos Humanos.

Retomando a ideia de senso comum da população brasileira, - de que os

Direitos Humanos só devem ser garantidos às pessoas “direitas” - isso ocorre porque

muitos cidadãos não possuem informações adequadas para entender o papel do

Estado que é de garantir um direito ou de efetivar uma lei. Segundo Cano (2010), “a

população brasileira apresenta uma sensação de insegurança, devido à percepção de

que existe uma incapacidade do Estado de garantir a proteção ao cidadão”.

Fazendo um comparativo com os novos dados divulgados pelo Infopen, em

Junho de 2015, analisando os dados até 2014, houve um avanço nos números da

população carcerária de forma alarmante o que deixa a população jurídica,

acadêmica e sociedade em geral em estado de alerta.

O Brasil hoje ocupa a quarta posição com uma população carcerária de

607.731 pessoas presas, ficando atrás apena de Estados Unidos, China e Rússia,

tomando como base o ano de 2000, com 239 mil a população carcerária brasileira

tem obtido um crescimento anual de 7%. Um dado que reflete na superlotação das

celas em 2014, que alcança um déficit de 231 mil vagas o que deixa os presídios

com uma media de 1.6 por vaga, e em alguns com maior gravidade de 2.0 por vaga.

O relatório divulgado pelo Infopen aponta um valor de 1.1 de milhão

investidos pelo governo em construção de novos presídios, descentralizando cada

vez mais estas construções dos grandes centros, mas que se mostra um equívoco no

direcionamento das medidas.

Segundo Renato de Vitto (2015), diretor-geral do Depen, órgão que assina o

relatório, em entrevista à Revista Carta Capital:

É preciso analisar a 'qualidade' das prisões efetuadas e o perfil das

pessoas que têm sido encarceradas, para que seja

possível problematizar a 'porta de entrada' e as práticas de gestão

dos serviços penais, desde a baixa aplicação de medidas cautelares

e de alternativas penais até a organização das diversas rotinas

do cotidiano das unidades prisionais.

Nesta proporção de crescimento o Brasil chegará em 2022, com 1 milhão de

pessoas encarceradas e em 2075 a proporção é de 1/10; Com o agravamento de que

as pessoas mantidas nos presídios aguardando julgamento chega a uma proporção de

4/10. Dos presídios, 84% são para os chamados presos provisórios, mas também

abrigam condenados.

O perfil dos encarcerados continua o mesmo, mantem-se a baixa

escolaridade, uma referência que identifica essas pessoas como vítimas das mazelas

sociais e de pouco investimento na educação antes mesmo de cometerem algum

delito. De acordo com alguns dados (Carta Capital, 2015), predomina a raça negra

com 2/3 dos internos, sendo que deles 54% não tem ou não completaram o ensino

fundamental e para confirmar o que a imprensa em geral tem mostrado, 56% são de

jovens entre 18 e 29 anos e em maior número do sexo masculino.

Dos dados apresentados neste relatório merece uma maior atenção o

crescimento da população feminina nos presídios, o Infopen/mulheres fez um

levantamento dos números, embora haja uma lacuna de alguns anos sem colher

essas informações específicas. Foram utilizados dados de 1.424 unidades, onde estão

incluídos os dados das pessoas custodiadas em cárceres de delegacias ou similares

do Sistema de Segurança Pública.

Segundo os números coletados junto a Secretaria Nacional de Segurança

Pública e Ministério Público em junho de 2014 há 27.950 mil custodiados em

carceragens dos 607.731 total de detentos. Dessa população prisional, 37.380 são de

mulheres representando 6,4% dos encarcerados. O que deixa o Brasil na posição do

5º lugar mundial atrás de Estados Unidos com 205.400; China com 103.766; Rússia

com 53.304 e Tailândia com 44.751.

É importante destacar que o objetivo da LEP é fazer com que o criminoso

cumpra sua pena e que ao cumprir o mesmo não venha cometer outro delito.

Portanto sua finalidade é de ressocializar o preso para que o indivíduo tenha uma

nova chance de permanecer na sociedade e que este não venha a praticar novamente

ilicitudes. Porém a contatação de que a pena de reclusão (por si só) não se revelou

como solução eficaz para ressocializar o detento está no elevado índice de

reincidência dos criminosos oriundos do sistema carcerário. Presume-se, apesar de

não haver números oficiais, que no Brasil, cerca de 90% dos indivíduos que foram

presos, quando retornam à sociedade voltam a cometer crimes/delitos, e

consequentemente, acabam retornando à prisão.

A sociedade e as autoridades devem conscientizar-se de que a efetivação do

que esta previsto na Lei de Execução Penal é a principal solução para a garantia de

direitos da população prisional e o melhor caminho para proporcionar a integração

social dos detentos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A exclusão social produz presidiários, e o Estado, por sua vez, é incapaz de

promover condições dignas de cumprimento de pena. Assim, conclui-se que as

palavras prevenção e ressocialização não fazem parte do universo jurídico penal, o

Estado não oferece instrumentos reais, sólidos para enfrentar a questão. Além da

fragilidade do Estado, temos ainda uma sociedade pouco esclarecida em que a

população é levada a acreditar que confinar as pessoas seja a única solução possível

para se evitar o caos e a desordem que só tem crescido cada vez mais.

Como medida para solucionar o grave problema do sistema penal brasileiro,

temos o APACS - Associação de Proteção e Assistência aos Condenados - força

nacional da Defensoria Pública, mas ainda é muito pouco, pois essas práticas sofrem

os entraves burocráticos de leis na medida em que o Estado não viabiliza

instrumentos para a eficácia desse aparato legal. O Estado ao invés de viabilizar os

recursos para o cumprimento dessas leis em vigor preocupa-se em editar novas

regras (emenda) como forma de repressão.

Outra alternativa para solucionar a questão dos encarcerados seria a

efetivação de políticas públicas na garantia de uma educação escolar, que aliás,

encontra-se na LEP – Da Assistência Educacional - no qual garante a instrução

escolar e a formação profissional, o art. 20 mostra que as ações e atividades

educacionais poderão ser conveniada com as organizações públicas e privadas que

podem oferecer cursos especializados, já o art. 21 garante até uma biblioteca nos

estabelecimentos prisionais.

A crise no sistema prisional brasileiro vem se agravando com o decorrer dos

anos. As questões da violência e da criminalidade não são apenas problemas que se

restringem ao campo da segurança pública, trata-se, fundamentalmente, de

manifestações das graves carências que apresenta o perfil das políticas sociais e das

modalidades de (des) proteção social no Brasil, em áreas estratégicas da provisão de

serviços, tais como as que se referem à saúde, educação, moradia, emprego.

No momento contemporâneo, o sistema prisional tem se convertido em

dispositivo que, além de punir, serve ao propósito de tornar socialmente mais

invisíveis os fatores envolvidos na produção social da criminalidade, isso acontece

simplesmente confinando e abandonando nesse confinamento àqueles que

transgrediram a lei, desprovidos das formas mais elementares de proteção social e do

exercício de direitos que correspondem à condição humana.

As prisões são cenários constantes de violações dos direitos humanos. Os

principais problemas enfrentados entre muitos outros são: a superlotação; a

deterioração da infraestrutura carcerária; a falta de apoio de uma legislação digna

dos direitos do preso; e a reincidência que é de vital importância para as vistas da

sociedade. Todos estes problemas demonstram que o sistema prisional brasileiro

está aniquilando qualquer possibilidade de o preso se recuperar.

Se fosse efetivada integralmente, a Lei de Execução Penal certamente

propiciaria a reeducação e ressocialização de uma parcela significativa da população

carcerária atual. No entanto, o que ocorre é que, assim como a maioria das leis

existentes em nosso país, a LEP permanece satisfatória apenas no plano teórico e

formal, não tendo sido cumprida por nossas autoridades públicas.

REFERÊNCIAS:

ACSELRAD, Gilberta (Org.). Avessos do prazer: drogas, Aids e direitos

humanos. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2005.

BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Rio de Janeiro, Campus 1992

BRASIL. Ministério da Justiça. Levantamento Nacional de Informações

Penitenciárias – INFOPEN Mulheres. Junho/2014. Disponível em:

http://www.justica.gov.br/seus-direitos/politica-penal/relatorio-infopen-mulheres.pdf

Acesso em 20 de novembro de 2015

CANO, Ignácio. Direitos humanos, criminalidade e segurança pública. In:

VENTURINI, Gustavo (Org.). Direitos Humanos: percepções da opinião pública.

Brasília: Secretaria de Direitos Humanos, 2010, p.65-75.

CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. Rio de

Janeiro: Civilização Brasileira, 2002.

DEPEN- Departamento Penitenciário Nacional; Infopen Mulheres. Disponível em:

<http://www.justica.gov.br/seus-direitos/politica-penal/relatorio-infopen-

mulheres.pdf>, acesso dia 20 de Novembro de 2015.

DIAS, Maria Berenice. União homossexual, o preconceito e a Justiça. 3. ed. Porto

Alegre: Livraria do Advogado, 2005.

DOTTI, Rene Ariel. Bases alternativas para um sistema de penas. 2. ed. São

Paulo. Revista dos Tribunais, 1998.

FOUCAULT; Michel. Trad. VASSALO; Ligia M. Ponde. Vigiar e Punir:

nascimento da prisão. Rio de janeiro: Vozes, 1984.

JESUS, Damásio E. de. Sistema penal brasileiro: execução das penas no Brasil.

Revista Consulex. Ano I, n. 1, p. 24-28, Jan. 1997.

LIMA, Roberto Kant de. Direitos Civis e Direitos Humanos: uma tradição

jurídica pré-republicana? Revista São Paulo em Perspectiva. São Paulo, 2004, p.

49-59.

MOURA, Evânio; MAGALHÃES, Carlos Antônio de. Direitos humanos, pena de

morte e sistema prisional. VENTURINI, Gustavo (Org.). Direitos Humanos:

percepções da opinião pública. Brasília: Secretaria de Direitos Humanos, 2010, p.

77-91.

THOMPSON, Augusto. A Questão penitenciária. 3. ed. Rio de Janeiro. Forense,

2002.

PORTAL EDUCAÇÃO. Disponível em: <http://www.portaleducacao.com.br/

direito/artigos/24787/historia-das-prisoes#ixzz2S08zXCy8> Acesso: 30.05.2013 às

22:37:09

Revista Carta Capital publicada na internet em 23/06/2015. Disponível em:

<file:///C:/Users/Usu%C3%A1rio/Desktop/Brasil%20possui%20a%20quarta%20ma

ior%20popula%C3%A7%C3%A3o%20prisional%20do%20mundo%20%E2%80%9

4%20CartaCapital.html>. Acesso em 19 de Novembro de 2015.