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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),
Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X
A PRODUÇÃO TÊXTIL E A PRESENÇA FEMININA NO INSTITUTO DE
ARTE CONTEMPORÂNEA (IAC), ESCOLA DE DESENHO INDUSTRIAL
DO MASP (1951-1953).
Ana Julia Melo Almeida1
Resumo: O trabalho tem como intuito investigar a atuação feminina na área têxtil da Escola de
Desenho Industrial no Instituto de Arte Contemporânea (IAC) do Museu de Arte de São Paulo
(MASP). Para isso, pretende-se compreender a participação de mulheres no ensino e em projetos
desenvolvidos pela escola tomando como agentes centrais Klara Hartoch, responsável pela oficina
de tecelagem; e Luiza Sambonet, que coordenou o Projeto da Moda Brasileira, em 1952.
Palavras-chave: Design. Moda. Produção têxtil. Espaço feminino.
Introdução
Esta pesquisa tem como intuito investigar a participação feminina na área têxtil da Escola de
Desenho Industrial no Instituto de Arte Contemporânea (IAC) do Museu de Arte de São Paulo
Assis Chateaubriand (MASP). A Escola de Desenho Industrial foi estruturada por Pietro Maria
Bardi, diretor do MASP na época, e por Lina Bo Bardi, que coordenou o curso de desenho
industrial. A trajetória da arquiteta tem sido amplamente estudada e documentada por muitos
pesquisadores do campo da arquitetura e do design, evidenciando sua importância para o
pensamento e prática do design elaborados no IAC. No entanto, não se encontram muitos registros
sobre a atuação das demais mulheres que participaram dessa inciativa.
A presença das mulheres no curso de desenho industrial do IAC será estudada por meio de
documentos, com o intuito de analisar a participação feminina no campo do design no período de
funcionamento do Instituto. Um dos principais objetivos é discutir e analisar a participação da
mulheres na experiência de ensino do IAC, marco e referência para o campo de ensino do design no
Brasil. Para isso, pretende-se compreender e documentar a atuação de mulheres no ensino e em
projetos desenvolvidos pela escola tomando como agentes centrais Klara Hartoch, professora
responsável pela oficina de tecelagem, e Luiza Sambonet, que coordenou o Projeto da Moda
Brasileira, apresentado em 1952.
1 Doutoranda em Design, Universidade de São Paulo, São Paulo, Brasil. E-mail: [email protected].
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Figuras 1 e 2: Klara Hartoch, professora de tecelagem, no tear [imagem à esquerda]. Luiza Sambonet no Instituto de
Arte Contemporânea – IAC [imagem à direita]. Fonte: Revista Habitat, 1952.
Este trabalho busca, também, resgatar a história das mulheres, muitas vezes esquecidas, que
participaram da construção do pensamento e prática de design no Brasil para pensar o papel atual da
mulher no campo do design. Indaga-se o lugar do design têxtil no campo do design brasileiro e
também de que maneira esse fazer está atrelado e é visto como prática feminina e, talvez por isso,
marginalizado e pouco documentado. Por fim, este levantamento pretende verificar e documentar a
participação feminina, compreender suas produções para estimular uma discussão para o campo.
1. A experiência do IAC e o ensino de desenho industrial no Brasil
A criação do Instituto de Arte Contemporânea (IAC) em 1951, quatro anos após a fundação
do MASP, foi de grande importância para o campo do design no Brasil. Vários pesquisadores têm
se dedicado ao estudo da contribuição e repercussão da Escola de Desenho Industrial do IAC para a
institucionalização do campo, que vai ocorrer de forma efetiva na década seguinte (Cardoso, 2005;
Leon, 2006; Niemeyer, 2007).
Os anos de experimentação entre a abertura do Instituto de Arte Contemporânea do Masp,
em 1951, e a inauguração da Escola Superior de Desenho Industrial (Esdi), em 1963,
marcam uma mudança fundamental de paradigma. Surgiu nessa época, não o design
propriamente dito – ou seja, as atividades projetuais relacionadas a produção e ao consumo
em escala industrial –, mas antes a consciencia do design como conceito, profissao e
ideologia. (CARDOSO, 2005, p.7)
O IAC funcionou entre os anos de 1951 e 1953 no MASP. A duração curta do Instituto não
diminui a relevância de sua influência para o campo do design no Brasil, indo muito além da
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experiência de três anos. A iniciativa colaborou tanto para o ensino quanto para a formação do
pensamento sobre esta atividade no Brasil.
Figuras 3 e 4: Alunos no Instituto de Arte Contemporânea (IAC) no terraco do edificio dos Diarios Associados, na rua
7 de abril [imagem à esquerda]. Fonte: Leon, 2006. Alunos em sala de aula no Instituto de Arte Contemporânea (IAC)
[imagem à direita]. Fonte: Biblioteca e Centro de Documentação do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand.
Segundo Pietro M. Bardi (1986, p.74), a escola foi planejada por Lina Bo Bardi. Entre os
objetivos do programa, que levavam em conta os precedentes da Bauhaus, estava a vontade de
contribuir, por meio das artes aplicadas, com a conscientização da função social da arte. A Escola
de Desenho Industrial do IAC foi inspirada simultaneamente na Bauhaus e no Institute of Design,
de Chicago. Os propositos, que constam no programa da escola, foram documentados por Leon:
O Instituto de Arte Contemporanea e uma iniciativa do ‘Museu de Arte’ de Sao Paulo. Tem
por objetivo incrementar o estudo e as pesquisas no terreno das artes aplicadas. Adota uma
orientacao nitidamente contemporanea. Procura orientar a producao industrial, a fim de que
os objetos de uso comum e de alcance coletivo, atinjam um nivel estetico elevado e em
coerencia com a epoca atual. Assim, o Instituto esta convencido de contribuir, atraves das
artes aplicadas, para a formacao de uma consciencia clara da funcao social da arte.
(Programa do Instituto de Arte Contemporânea, in LEON, 2006, p.21)
A estrutura do curso se constituía em duas etapas - um curso preliminar e um curso de
especialização. O primeiro era desenvolvido a partir de seis disciplinas básicas: História da arte,
Elementos de arquitetura, Composição, Conhecimentos de materiais e processos técnicos, Desenho
a mão livre e pintura e Geometria descritiva. Como continuação, os alunos seguiam para os cursos
de especialização por um período de um ano. Esta etapa final visava a aplicação dos conhecimentos
adquiridos por meio do projetos de objetos em vários materiais. Entre eles, havia a oficina de
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tecelagem, que era ministrada por Klara Hartoch e abordava técnica e criação de padronagens
(Leon, 2006; Fernandes, 2011).
Figuras 5 e 6: Encarte contendo a estrutura e o programa do Instituto de Arte Contemporânea – IAC. Fonte: Biblioteca
e Centro de Documentação do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand.
2. A produção têxtil e o fazer feminino
A relação entre a produção têxtil e o espaço feminino vem de longa data (Chadwick, 1996 e
Simioni, 2010). As autoras abordaram que esse processo também está relacionado à exclusão da
arte têxtil como uma prática menor e desvalorizada no campo das artes. Para Chadwich (1996), o
processo de exclusão das mulheres ao longo da história da arte é percebido tanto nos espaços
institucionais de ensino quanto no mercado. Na tradição ocidental, as artes aplicadas foram o
território encontrado e destinado ao feminino, por já ser uma área vista como inferior, enquanto
disciplina.
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Segundo Simioni (2010, p.3), a desvalorização que as obras de arte desenvolvidas em
suportes têxteis passaram ao longo do tempo está associada a um fenômeno que ultrapassa questões
estilísticas. É importante mencionar que o espaço em que essas obras estão situadas atrela-se a um
terreno mais amplo, de hierarquias construídas socialmente, relacionando-se com fazeres
feminilizados.
A partir do questionamento proposto pelas autoras acerca da ligação da arte têxtil ao
universo feminino e a um espaço considerado menor, indaga-se neste trabalho o lugar do design
têxtil no campo do design brasileiro e também de que maneira esse fazer em tecidos está atrelado e
é visto como prática feminina e também por isso, marginalizado e pouco documentado.
Assim como a produção têxtil, os estudos sobre a moda no Brasil foram deixados de lado
nas pesquisas acadêmicas, já que esse não era considerado um objeto digno de ser analisado. Um
importante marco para esse campo foi a tese de doutorado de Gilda de Mello Souza, defendida na
departamento de Sociologia da Universidade de São Paulo em 1950 e orientada por Roger Bastide2,
com o título “A moda no seculo XIX - ensaio de sociologia estetica”.
Por muito tempo, o trabalho ficou desconhecido e foi publicado em forma de livro apenas
em 1987, portanto trinta e sete anos depois. A forma pioneira como Souza analisou o fenômeno da
moda na sociedade brasileira, em específico, na cidade de São Paulo, contribui para legitimar a
moda como objeto de estudo de importância para a compreensão das relações e dos grupos sociais
na modernidade, relacionando tanto com a divisão em classes quanto com a divisão sexual da
sociedade.
Acerca desta obra, Simioni (2008b, p.64) argumenta que nos anos de 1950, a moda não
constituía um objeto comum nos estudos acadêmicos brasileiros, sendo considerada fútil, indigna e
também associada ao universo feminino, seria uma “coisa de mulher”, o que contribuía para a sua
exclusão.
O ano em que o livro “O espirito das roupas - a moda no seculo XIX” foi publicado (1987)
coincide com o início da institucionalização do ensino em moda. O primeiro curso superior é
ofertado pela Faculdade Santa Marcelina (FASM), o Bacharelado em Desenho de Moda, em São
Paulo. Ao longo dos anos de 1990 e 2000, há uma grande expansão da oferta de cursos superiores
em moda. O campo de estudo em design de moda no Brasil é recente e ainda em fase de
2 Roger Bastide (1898-1974) chegou ao Brasil em 1938 para ocupar a cátedra de Sociologia I, no Departamento de
Ciências Sociais da Universidade de São Paulo. Bastide se dedicou à pesquisa e escrita sobre o Brasil, deixando uma
obra importante sobre a cultura e a sociedade brasileira. Há registros da participação de Roger Bastide em atividades no
Instituto de Arte Contemporânea (IAC) do MASP. Sobre sua trajetória no Brasil, ver mais em: Pereira de Queiroz,
1994; sua participação no IAC pode ser encontrada em: Leon, 2006.
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estruturação e construção de seus conceitos teóricos3, além de na maior parte dos casos ter sua
produção conduzida por pesquisadoras, principais responsáveis pela estruturação dessa área hoje no
país, o que evidencia que a moda é tanto praticada quanto analisada predominantemente por
mulheres.
Andrade e Rebello (2009) relatam que os estudos sobre a participação feminina no campo
do design ainda são muito precários. As autoras destacam o papel de Lina Bo Bardi e Carmem
Portinho, ambas ligadas à gênese do design no Brasil, porém observam serem necessárias pesquisas
que compreendam a importância de mais mulheres na área.
3. A produção têxtil e a presença feminina no IAC
Ao procurar estudos acadêmicos e registros históricos sobre a oficina de tecelagem da
Escola, percebe-se a ausência de material mais detalhado sobre como se configurou o ensino de
projeto na produção têxtil, quais alunos fizeram parte e se esse espaço estava atrelado a uma prática
feminina.
Algumas pesquisas registraram que a oficina de tecelagem era ministrada pela alemã Klara
Hartoch, que orientava desenhos de padronagens para tecidos e projetos de tecelagem, conforme
depoimento das ex-alunas do IAC Estella Aronis e Irene Ruchti a Leon (2006). Segundo a
pesquisadora (idem, 2014, p.2), Hartoch foi apresentada aos alunos por P. M. Bardi como ex-aluna
de Anni Albers4, da Bauhaus, o que não chegou a se confirmar. No entanto, é possível estabelecer
algumas semelhanças nos trabalhos de tear do IAC com os que eram produzidos por Albers, na
escola alemã.
Na Bauhaus, a oficina de tecelagem era um espaço relacionado ao feminino e o design têxtil
ocupava um papel secundário e artesanal, sem muito prestígio se comparado aos ateliês modernos
de práticas industriais, como esclarece Droste (2004). A autora comenta, em seu estudo sobre a
escola no período de 1919 a 1933, que a entrada das mulheres era dificultada e que quando elas
conseguiam, eram encaminhadas para a tecelagem. Seus trabalhos nessa área não ganhavam
3 Em 2004, o Ministério da Educação aprovou as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em
design e neste documento orientou os cursos ofertados na área de moda a seguirem em seus currículos as diretrizes
educacionais do ensino em design. Hoje a grande maioria dos cursos ofertados na área de moda segue as diretrizes
educacionais do ensino em design e mudou a nomenclatura para “design de moda”, incluindo disciplinas do repertório
teórico de design (Pires, 2002; Bonadio, 2010). 4 Anni Albers (1899-1994) foi designer da Bauhaus. Sua produção utiliza linhas retas e cores sólidas, experimentando
novos materiais na tecelagem. É considerada um dos maiores nomes do design têxtil do século XX.
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destaque, sendo rejeitados pelos homens por serem femininos ou artesanais. Sobre isso, Weltge
explica:
A escola dividia-se em ateliês, os quais, por sua vez, ocupavam posições diversas de
prestigio em seu interior. De um lado, estavam os ateliês mais nobres – aqueles
considerados industriais, como os de vidro e de metais, nos quais os produtos eram
modernos, feitos por designers, que englobavam os alunos da instituição; de outro lado
estavam os ateliês mais marginalizados, cujo trabalho era mais manual e tradicional, como
os de cerâmica e de tecelagem, considerados mais artesanais e apropriados para as artistas
do sexo feminino. (WELTGE, 1999 apud SIMIONI, 2010, p.6-7)
É possível visualizar nos documentos do acervo do MASP a lista de alunos inscritos para
integrar a Escola de Desenho Industrial, assim como as fichas de inscrição. Nos arquivos, há
registros de uma proporção significativa de alunas na composição do curso. Como docentes,
encontramos os nomes de Lina Bardi, Elizabeth Nobiling e Klara Hartoch.
Klara Hartoch foi a professora responsável pela oficina de tecelagem, que fazia parte dos
cursos de especialização do segundo ano da escola. Não foram encontrados registros sobre quais
alunos participaram da oficina de tecelagem, que era dividida em três fases: 1ª fase – Conhecimento
do tear, Cálculos técnicos e Trabalho prático; 2ª fase – Trabalhos práticos (fazendas para vestidos,
estofamentos, casimiras; tecidos para moveis, tapetes e gobelins, etc.), Conhecimentos das matérias
e Composições artísticas; 3ª fase – Teoria, Desenho, Criações, História cultural de tecidos e seu
papel nas artes.
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Figura 7: Matéria publicada no Jornal Diário de São Paulo sobre a oficina de tecelagem do IAC. Fonte: Biblioteca e
Centro de Documentação do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand.
Outra iniciativa importante do MASP no mesmo período e que estava vinculada ao ateliê de
tecelagem foi o Projeto da Moda Brasileira. Ele resultou em um desfile realizado em 1952 na
Pinacoteca do MASP, contando com cerca de cinquenta peças confeccionadas nos ateliês do museu.
Luiza Sambonet esteve à frente da iniciativa, cujo objetivo era contribuir para a criação de uma
moda adequada às características locais com desenho e corte moderno, além de aproximar arte e
indústria. Em revista da época, a autora escreveu sobre as intenções do projeto:
Há muito, o Museu de Arte vem se preocupando com a possibilidade de uma moda
nacional. Ali foi criada uma escola de tecelagem artística sob a orientação de Klara Hartoch
[...] O primeiro desfile da moda brasileira, assinala um momento de grande significação,
praticamente basta citar que as grandes firmas compreenderam imediatamente, que
qualquer trabalho nesse sentido só iria beneficiar o alto nível e maior independência da
indústria e do comércio [...] Procurou-se acima de tudo, na execução dos vestidos
idealizados e confeccionados no Museu, de não ir além do espírito dos motivos
tradicionais, de desfrutar ao máximo as possibilidades sugestivas de objetos e motivos
populares.5 (SAMBONET, 1952, p.66)
Foram produzidos tecidos, vestidos e acessórios a partir de materiais brasileiros e desenhos
de padrões com motivos populares. As roupas receberam nomes associados aos elementos da
cultura ou da natureza brasileira: carambola, fruteiro, favela, cuica, jangada, bala de côco,
5 O trecho foi extraído do artigo “ Uma moda brasileira”, publicado em 1952, na Revista Habitat.
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macumba, areião, etc. O trabalho foi realizado junto a artistas, professores e alunos do IAC, entre
eles: Klara Hartoch, Luiza Sambonet, Lilli Corrêa de Araujo, Lina Bo Bardi, Roberto Sambonet,
Roberto Burle Marx e Carybé. Após o desfile, as peças foram expostas e vendidas na Casa
Mappin6.
Figura 8: Convite para o desfile Moda Brasileira. Fonte: Biblioteca e Centro de Documentação do Museu de Arte de
São Paulo Assis Chateaubriand.
Figura 9 e 10: Croquis das peças desenvolvidas para o primeiro desfile da Moda Brasileira do MASP. (Coleção Moda
Brasileira, 1952). Fonte: Revista Habitat, 1952.
Como expõe Bonadio (2014), a valorização da produção nacional em detrimento da moda
unicamente calcada nas linhas propostas pelos costureiros parisienses, estava presente nas ações e
pensamentos que orientaram a iniciativa e contava com o aval do casal Bardi. Acerca disso, Cara
6 A Casa Mappin foi uma loja de departamento tradicional do século XX no Brasil. A primeira loja foi aberta no centro
de São Paulo em 1913. Na década de 1950, a Mappin era uma importante referência de modernidade e espaço
frequentado pela elite paulista.
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(2013, p.19) complementa que a iniciativa do MASP não se restringia à exposição ou desfile, mas
era ampliada à produção de roupas e acessórios que evidenciavam uma linguagem mais próxima
das nossas condições técnicas, históricas e estéticas, como tentativa de inaugurar uma discussão
para o surgimento de moda brasileira. Sambonet (1952) destacou as especificidades brasileiras,
como fundamentais para a construção de uma moda nacional:
Cada país tem necessidades diferentes. O clima inglês ou francês não podem sugerir
elementos a quem vive no Brasil. Quem mora sob o céu variável de São Paulo ou está a
mercê do sol carioca, tem que adaptar-se ao clima e não pode logicamente se restringir à
moda de París com suas quatro e bem características estações [...] O Museu de Arte de São
Paulo abriu um caminho livre a todos os que pensam que não seja utópica a frase moda
brasileira num Brasil que se orgulha de estar hoje na vanguarda entre as jovens nações do
mundo. (SAMBONET, 1952, p.66)
Por todos esses desdobramentos, a oficina de tecelagem estruturada dentro da Escola de
Desenho Industrial do IAC se configura uma oportunidade de compreender os espaços e os papéis
exercidos por mulheres no campo do design. Este artigo é parte de uma pesquisa ainda em
andamento que pretende, por meio da experiência pioneira do IAC, discutir o espaço feminino na
Escola, apresentando suas produções, contribuições e legados.
Nesse sentido, acredita-se que para pensar o papel atual da mulher no campo do design é
preciso resgatar a história das mulheres, muitas vezes esquecidas, que participaram da construção
do pensamento e prática de design no Brasil. É necessário verificar e documentar a participação
feminina, compreender suas produções para tornar o assunto visível e que estimule uma discussão
para o campo.
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The textile production and the womanly presence in the Instituto de Arte Contemporânea
(IAC), Escola de Desenho Industrial in MASP, Brazil (1951-1953)
Astract: This paper aims to investigate the womanly presence in the textile area of the School of
Industrial Design at the Institute of Contemporary Art (IAC, in Portuguese) in the São Paulo
Museum of Art (MASP, in Portuguese). For this purpose, we intend to understand the participation
of women in teaching and in projects developed by the School, taking as key figures Klara Hartoch,
responsible for the weaving workshop; and Luiza Sambonet, who coordinated the Brazilian Fashion
Project, in 1952.
Keywords: Design. Fashion. Textile. Womanly space.