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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ CENTRO DE HUMANIDADES PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM LINGUÍSTICA APLICADA MARCUS RODNEY PORTELA CYSNE A MONOTONGAÇÃO DO DITONGO /ej/ NO FALAR POPULAR DE FORTALEZA FORTALEZA CEARÁ 2016

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  • UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEAR

    CENTRO DE HUMANIDADES

    PROGRAMA DE PS GRADUAO EM LINGUSTICA

    APLICADA

    MARCUS RODNEY PORTELA CYSNE

    A MONOTONGAO DO

    DITONGO /ej/ NO FALAR POPULAR DE FORTALEZA

    FORTALEZA CEAR

    2016

  • MARCUS RODNEY PORTELA CYSNE

    A MONOTONGAO DO

    DITONGO /ej/ NO FALAR POPULAR DE FORTALEZA

    Dissertao apresentada ao Programa de Ps-

    Graduao em Lingustica Aplicada (PosLA)

    da Universidade Estadual do Cear, como

    requisito parcial para a obteno do grau de

    Mestre em Lingustica Aplicada.

    rea de Concentrao: Linguagem e Interao

    Orientadora: Prof. Dr. Aluza Alves de

    Arajo.

    FORTALEZA CEAR

    2016

  • Dados Internacionais de Catalogao na Publicao

    Universidade Estadual do Cear

    Sistema de Bibliotecas

    Cysne, Marcus Rodney Portela.

    A monotongao do ditongo /ej/ no falar popular de

    Fortaleza [recurso eletrnico] / Marcus Rodney Portela Cysne.

    2016.

    1 CD-ROM: il.; 4 pol. CD-ROM contendo o arquivo no

    formato PDF do trabalho acadmico com folhas, acondicionado

    em caixa de DVD Slim (19 x 14 cm x 7 mm).

    Dissertao (mestrado acadmico) Universidade Estadual

    do Cear. Programa de Ps-Graduao em Lingustica Aplicada,

    Fortaleza, 2016.

    Orientao: Prof. Dra. Aluiza Alves de Arajo.

    1. Monotongao. 2. Socioligustica Variacionista. I. Ttulo

  • Ao meu filho Arthur Amorim Portela Cunto.

    minha esposa Lacia Gretha Amorim

    Portela.

    Aos meus pais Luiz Carlos Cysne e Maria do

    Rosrio de Ftima Portela Cysne.

    A todos os meus familiares que torceram por

    mim.

  • AGRADECIMENTOS

    Ao meu bom Deus, que me guiou e me acalmou nos momentos em que pensei no conseguir

    vencer.

    Aos meus pais, Luiz Carlos Cysne e Ftima Portela Cysne, por terem sempre me instrudo no

    bom caminho, incentivando-me e proporcionando-me as condies para a conquista dos meus

    objetivos.

    A minha adorvel, dedicada e incentivadora esposa, Lacia Amorim Portela, que mesmo

    trabalhando e fazendo o seu doutorado, assumiu muitas responsabilidades da casa e do nosso

    filho para que eu tivesse a tranquilidade e a dedicao impostas pelo mestrado.

    Ao nosso filho Arthur Amorim Portela Cunto, que desde de novinho, com seu sorriso, sua

    motivao de criana e seu interesse pelas letras e nmeros me ensinou a ser pai dedicado,

    assim como incentivou cada dia que dediquei a esse trabalho.

    A minha profa. orientadora Dra. Aluza Alves de Arajo, com quem tive o primeiro contato

    ainda na disciplina de sociolingustica na graduao, que acreditou em minha capacidade e me

    deu a oportunidade de prosseguir nos estudos ps-graduados e com quem pude contar em

    todos os momentos do mestrado, disponibilizando-me material de estudo, auxiliando-me na

    reviso de texto e no manuseio do programa estatstico GoldVarb X, pois sem sua ajuda eu

    no teria conseguido avanar, tudo sempre com muito humor, seriedade e dedicao.

    Aos professores Dr. Valdecy de Oliveira Pontes da IES/UFC e Dr. Wilson Jnior de Arajo

    Carvalho da IES/UECE, por aceitarem participar da banca de defesa e contriburem com suas

    anlises, observaes e sugestes para a concluso exitosa desta dissertao,

    Aos professores Dr. Mrcio Santiago, da Universidade Federal do Cear, e Prof. Dr. Expedito

    Elosio Ximenes do Posla/UECE pelas valiosas contribuies na minha qualificao.

    coordenao do Programa de Ps-Graduao em Lingustica Aplicada, em nome do Prof.

    Dr. Wilson Jnior de Arajo Carvalho e aos funcionrios sempre solcitos.

    Fundao Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico (FUNCAP).

    A minha irm, Carla Portela Cysne, que, na distncia do Canad, torce, reza e confia na minha

    conquista deste ttulo.

    minha av paterna, Ivincia Cunto Cysne, por poder presenciar a minha vitria e aos meus

    avs que j se foram, mas que me deixaram o legado de seus ensinamentos.

    Aos meus tios e padrinhos Jaime Cunto Machado e Maria Aparecida Damasceno, por estarem

    sempre preocupados e interessados no meu xito profissional e intelectual.

  • Esperei ansiosamente pelo SENHOR, e ele se

    inclinou para mim e ouviu o meu

    clamor." (Salmo 40:1)

    Toda lngua muda e varia. O que hoje visto

    como certo j foi erro no passado. O que

    hoje considerado erro pode vir a ser

    perfeitamente aceito como certo no futuro da

    lngua. (MARCOS BAGNO 2000, p.143)

    O servio mais til que os linguistas podem

    prestar hoje varrer a iluso da deficincia

    verbal e oferecer uma noo mais adequada

    das relaes entre dialetos padro e no

    padro1. (WILLIAM LABOV, 1972, p. 202)

    (Traduo nossa).

    1 The most useful service which linguists can perform today is to clear away the illusion of verbal deprivation and to provide a more adequate notion of the relations between standard and nonstandard dialects.

  • RESUMO

    A monotongao um fenmeno lingustico muito produtivo no portugus oral brasileiro, em

    que ocorre a reduo de um ditongo a uma vogal simples. No intuito de contribuir com a

    descrio do portugus atual, este estudo teve o objetivo de descrever e analisar a realizao

    varivel do ditongo oral decrescente /ej/ no falar popular do fortalezense, como observado

    em: peixe~pexe, com base na abordagem terico-metodolgica da Sociolingustica

    Variacionista (LABOV, 2008; WEINREINCH; LABOV; HERZOG, 2006). Para averiguar-se

    como ocorre a monotongao do ditongo /ej/ na norma popular da cidade de Fortaleza -

    Cear, recorreu-se a uma amostra de 54 informantes, extrada do corpus do banco de dados do

    Projeto Norma Oral do Portugus Popular de Fortaleza (NORPOFOR) (ARAJO, 2011).

    Deste banco de dados, analisamos, dentre os seus trs tipos de registro: Dilogo entre

    Informante e Documentador (DID), Dilogo entre dois informantes (D2) e Elocuo Formal

    (EF), apenas o primeiro tipo. Para a anlise estatstica dos dados, foi utilizado o programa

    computacional GOLDVARB X (2005), responsvel pelo clculo da influncia de fatores

    lingusticos e extralingusticos. Do total de 1491 dados analisados, 1020 (68%) favoreceram a

    monotongao de /ej/, ao passo que 471 (32%) mantiveram o ditongo. Foram selecionados

    para serem analisados pelo programa estatstico nove fatores: seis lingusticos (contexto

    fontico seguinte, contexto fontico precedente, tonicidade da slaba, extenso do vocbulo,

    natureza morfolgica e classe de palavras) e trs sociais (sexo, escolaridade e faixa etria).Os

    resultados da quarta rodada (melhor anlise) mostraram serem os seguintes fatores

    lingusticos que mais favorecem a regra: classe de palavras (nomes), extenso do vocbulo

    (disslabas), tonicidade (tnica) e a varivel social: escolaridade (0-4 anos). A quinta rodada

    foi efetuada para os menos escolarizados e o resultado indica a manuteno dos mesmos

    fatores lingusticos. A ordem desses fatores, porm, foi alterada, passando a ser: tonicidade

    (tnica), extenso do vocbulo (disslabas) e classe de palavras (nomes). As anlises dos

    dados demonstram que o comportamento varivel do fenmeno da monotongao de /ej/,

    aps se isolar e avaliar, separadamente, cada fator que influencia a ocorrncia do fenmeno,

    que so os substantivos e adjetivos disslabos tnicos na fala dos informantes com baixa

    escolarizao.

    Palavras-chave: 1. Monotongao. 2. Socioligustica Variacionista

  • ABSTRACT

    The monophthongization is a very productive linguistic phenomenon in oral Brazilian

    Portuguese, due to the phonological process in which there is a reduction of a diphthong to a

    simple vowel. In order to contribute to the description of the current Portuguese, this study

    aimed to describe and analyze sociolinguistically the variable realization of oral decreasing

    diphthong /ej/ in the popular speaking of Fortaleza, as noted in: Peixe ~ Pexe, based on the

    theoretical and methodological approach of the Variationist Sociolinguistics (LABOV, 2008;

    WEINREINCH; LABOV; HERZOG, 2006). In order to check how the monophthongization

    of the diphthong /ej/ in the popular standard speaking of Fortaleza community occurs, a

    sample of 54 informants extracted from a corpus called Popular Oral Standard Portuguese

    Database Project of Fortaleza/Ce-Brasil (NORPOFOR) (Arajo, 2011) was used. The

    distribution of NORPOFOR informants have based the variables of gender, age, education

    and out of the three types of voice records: Dialogue between Informant and Documenter

    (DID), Dialogue between two Informants (D2), and Formal Elocution: EF, we used only the

    (DID). For the statistical analysis of description of variable phenomena, we used the computer

    program GOLDVARB X (2005), responsible for calculating the influence of linguistic and

    extralinguistic factors. From a total of 1491 data analyzed, 1020 (68%) favored the

    monophthongization of /j/, whereas 471 (32%) kept the diphthong. Nine factors were selected

    and tested after the submission of data to the analysis of the statistical program GOLDVARB

    X. The results of the fourth round (better analysis) showed the linguistic factors which best

    favor the monophthongization, such as: word class (names), word extension (two syllables),

    stress (tonic) and the social variable schooling (0-4 years). A fifth round was taken for the less

    educated people and the result indicates the maintenance of the same linguistic factors.

    However, the order of these factors has been amended to be: stress (tonic), word extension

    (two syllables) and word class (names). The Analyses of the data collected show the variable

    behavior of the monophthongization phenomenon of /j/ after isolating and evaluating

    separately each factor influencing the occurrence of the phenomenon, that are the two syllable

    stressed nouns and adjectives in the speech of the informants with low schooling.

    Keywords: 1. monophthongization. 2. sociolinguistic variationist

  • LISTA DE ILUSTRAES

    Grfico 1 - Frequncias gerais do uso de /ej/ e /e/ nos estudos variacionistas 33

    Grfico 2 - Frequncia de uso das variantes analisadas 73

    Figura 1 - Distribuio dos estudos variacionistas no territrio brasileiro 35

    Figura 2 - Distribuio dos informantes nas regionais de Fortaleza 62

    Quadro 1 Distribuio dos informantes do NORPOFOR 55

    Quadro 2 Distribuio dos bairros de Fortaleza por Regionais no NORPOFOR 55

    Quadro 3 Distribuio dos informantes em nossa amostra por gnero/sexo, idade

    e escolaridade

    58

    Quadro 4 Distribuio dos informantes da amostra por n do inqurito, sexo,

    idade, escolaridade, bairro, Secretaria Executiva Regional (SER) e

    atividade exercida

    59

  • LISTA DE TABELAS

    Tabela 1 - Distribuio das ocorrncias com nocaute no grupo contexto

    fontico seguinte

    74

    Tabela 2 - Distribuio das ocorrncias com nocaute no grupo contexto

    fontico anterior

    74

    Tabela 3 - Distribuio das ocorrncias com nocaute no grupo natureza

    morfolgica

    75

    Tabela 4 - Distribuio das ocorrncias com nocaute para o grupo classe de

    palavras

    75

    Tabela 5 - Distribuio das ocorrncias com nocaute para o grupo extenso do

    vocbulo

    76

    Tabela 6 - Atuao das variveis contexto fontico seguinte, contexto fontico

    anterior, extenso do vocbulo e classe de palavras

    76

    Tabela 7 - Atuao das variveis contexto fontico seguinte, classe de palavras,

    extenso do vocbulo e tonicidade

    78

    Tabela 8 - Atuao da varivel classes de palavras sobre a monotongao de [ej] 80

    Tabela 9 - Atuao da varivel extenso do vocbulo 82

    Tabela 10 - Atuao da varivel tonicidade 83

    Tabela 11 - Atuao da varivel escolaridade 83

    Tabela 12 - Atuao das variveis tonicidade, extenso do vocbulo e classe de

    palavra sobre os pouco escolarizados

    84

    Tabela 13 - Atuao das variveis tonicidade, extenso do vocbulo e classe de

    palavra para os pouco escolarizados

    85

  • LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

    CVC Consoante, vogal, consoante

    PCNs Parmetros Curriculares Nacionais de Lngua Portuguesa

    NORPOFOR Norma Oral do Portugus Popular de Fortaleza

    DID Dilogo entre Informante e Documentador

    D2 Dilogo entre dois informantes

    EF Elocuo Formal

    VARSUL Variao Lingustica Urbana do Sul do Pas

    PORCUFORT Projeto Portugus Oral Culto de Fortaleza

    ALIPA Atlas Geo Sociolingustico do Estado do Par

    VALPB Projeto Variao Lingustica do Estado da Paraba

    PROCOTEXTO/

    UNISUL

    Projeto de Coleta de Textos/Universidade do Sul de Santa Catarina

    GoldVarb X Programa estatstico - pacote Varbrul para Mac e Windows

    desenvolvido por David Sankoff

    P.R. Peso Relativo

  • LISTA DE SMBOLOS

    [p] : bilabial oclusiva

    [b] : bilabial oclusiva

    [m] : bilabial nasal

    [t] : oclusiva, dental, surda

    [d] : oclusiva, dental, sonora

    [v] : fricativa, labiodental, sonora

    [s] : oclusiva, dental, sonora

    [z] : fricativa, alveolar, sonora

    [l] : lateral, alveolar, sonora

    [n] : nasal, alveolar, sonora

    [k] : oclusiva, oral, velar, surda

    [] : fricativa, palato-alveolar, sonora

    [] : tepe (ou flepe) alveolar

    [] : fricativa, oral, palato-alveolar, surda

    [h] : fricativa, glotal

    [f] : fricativa lbio-dental

    [g] : oclusiva velar

    [] : nasal palatal

  • SUMRIO

    1 INTRODUO 14

    2 A VARIAO DO DITONGO ORAL DECRESCENTE /ej/ 20

    2.1 ESTUDOS VARIACIONISTAS 20

    3 A TEORIA DA VARIAO E DA MUDANA LINGUSTICA 36

    4 METODOLOGIA 50

    4.1 TIPO DE PESQUISA 50

    4.2 COMUNIDADE DE FALA: A CAPITAL CEARENSE 51

    4.3 O CORPUS 54

    4.4 AS ENTREVISTAS 56

    4.5 A AMOSTRA E OS INFORMANTES 58

    4.6 DEFINIO DAS VARIVEIS 62

    4.6.1 Varivel dependente 62

    4.6.2 Variveis independentes 63

    4.6.2.1 Variveis lingusticas 63

    4.6.2.2 Variveis extralingusticas 66

    4.7 COLETA E CODIFICAO DOS DADOS 67

    4.8 O PROGRAMA ESTATSTICO: GOLDVARB X 68

    5 ANLISE E DISCUSSO DOS RESULTADOS 73

    5.1 RODADAS EXPERIMENTAIS 73

    5.1.1 Primeira Rodada 73

    5.1.2 Segunda Rodada 77

    5.1.3 Terceira Rodada 79

    5.2 QUARTA RODADA (MELHOR ANLISE) 81

    5.2.1 Classe de Palavras 81

    5.2.2 Extenso do vocbulo 82

    5.2.3 Tonicidade 83

    5.2.4 Escolaridade 84

    5.3 RODADA S PARA OS POUCO ESCOLARIZADOS 84

    6 CONCLUSO 86

    REFERNCIAS 88

    APNDICES 93

    APENDICE A - CHAVE DE CODIFICAO DA MONOTONGAO 94

    ANEXOS 97

    ANEXO A - TABELA DOS SMBOLOS FONTICOS UTILIZADOS

    NESTA PESQUISA (2005)

    98

    ANEXO B - PARECER CONSUBSTANCIADO DO COMIT DE TICA

    (CEP) DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEAR UECE

    99

  • 14

    1 INTRODUO

    Com o surgimento da Sociolingustica, ainda nos anos de 1960, protagonizada por

    William Bright e sistematizada por William Labov, muitos estudos sobre as descries das

    lnguas naturais com suporte de dados de fala foram produzidos, levando os linguistas a um

    novo modo de encarar as regras variveis das lnguas2, alm do modelo normativo, e a

    oferecer outras maneiras de se fazer anlise lingustica que trouxeram contribuies valiosas

    ao desenvolvimento da teoria lingustica.

    Labov (2008) analisou a relao entre lngua e sociedade e observou que h

    inmeras variantes3 na lngua falada e, por meio de estudos que consideram fatores

    extralingusticos (alm dos lingusticos), como classe social, idade, sexo, escolaridade etc,

    remeteu-nos interdependncia do contedo lingustico dos falantes em relao ao meio

    social em que vivem.

    Com as suas ideias, o autor nos forneceu uma das grandes contribuies para o

    avano dos estudos sociolingusticos, ao verificar a importncia de estudar a lngua como

    objeto de elaborao social, sem os estigmas de "certo" e "errado", considerando as variaes

    nela encontradas, s quais estamos expostos e utilizamos na lngua em uso.

    Na perspectiva de Tarallo (2007), a lngua um veculo de comunicao e

    informao entre as pessoas que denota variantes diversas e o fato de ela ser varivel nos

    proporciona distintas formas de dizer uma determinada coisa com o mesmo valor de verdade4

    (LABOV, 1978); e isso um fator muito importante na identificao de grupos em sua

    configurao e na demarcao das diferenas sociais de uma dada comunidade de fala, cuja

    caracterstica principal o compartilhamento de normas e atitudes sociais em relao a uma

    lngua ou variedade lingustica (LABOV,1972) .

    Dentre os inmeros fenmenos lingusticos em variao na lngua portuguesa do

    Brasil, a forma varivel como os ditongos orais decrescentes se mostra nos motivou a iniciar

    esta investigao. A reduo desses ditongos est to disseminada e recorrente nas

    2 Categorizao de regras lingusticas proposta por Labov - variveis e semicategricas - que se constituram em

    meio facilitador da proposio de perfis que caracterizariam o que costuma ser tratado, independentemente do

    quadro terico adotado, como parmetros gramaticais ou tipos lingusticos diversos. (LABOV, 2003) 3 Variantes "[...] so diversas maneiras de se dizer a mesma coisa em um mesmo contexto e com o mesmo valor

    de verdade. A um conjunto de variantes d-se o nome de varivel lingustica (TARALLO 1986, p. 8). O uso de

    uma ou de outra variante influenciado por fatores lingusticos (estruturais) ou sociais (extralingusticos). 4 Comunidade de fala, segundo Labov (1972 [2008]): [...] pela participao no conjunto de normas compartilhadas; estas normas podem ser observadas em tipos de comportamentos avaliativos explcitos e pela

    uniformidade de padres abstratos de variao que so invariantes no tocante a nveis particulares de uso.

  • 15

    variedades do portugus, por ser uma regra por demais produtiva, que j se configura como

    parte do vernculo mais geral do brasileiro (BAGNO, 2007).

    O interesse para a realizao desta pesquisa surgiu da nossa inquietude e de nosso

    interesse pessoal em saber como ocorre a monotongao do ditongo /ej/ no portugus popular

    falado na cidade de Fortaleza-CE. A monotongao a simplificao do ditongo a uma

    simples vogal, como nas formas (beijo-bejo), (deixe-dexe), (enfermeira-enfermera), sendo

    este um fenmeno varivel e muito produtivo na fala dos brasileiros, mas que ainda carece de

    descrio em muitas regies do Pas, a exemplo do Centro-Oeste, onde no se verificou

    estudos dessa natureza.

    Esse fenmeno, que tem origem ainda no latim, como atesta Coutinho (1976),

    manteve-se no portugus de Portugal, como possvel constatar na maior obra pica

    portuguesa, Os Lusadas5, de Cames, que denotava palavras com apagamento de

    semivogais, como um fenmeno natural e espontneo, ou seja, Cames j apagava, em uma

    srie de palavras, as semivogais /j/ e /w/ em ditongos orais no portugus do sculo XVI

    (PEREIRA, 2004).

    Portanto, intrigante saber que a monotongao date da poca do latim vulgar e

    que o pocesso ainda carea tanto de estudos. H, ento, uma lacuna preocupante a respeito do

    conhecimento da regra varivel do ditongo /ej/ nas regies brasileiras, principalmente no

    Nordeste do Brasil, j que os trabalhos reunidos no captulo seguinte desta pesquisa no

    cobrem todas as capitais brasileiras, pelo simples fato de elas no existirem.

    Os estudos variacionistas sobre a monotongao de /ej/, cuidadosamente,

    selecionados por ordem cronolgica para embasar esta pesquisa foram: Veado (1983), para

    Minas Gerais; Meneghini (1983), para o Rio Grande do Sul; Ribeiro (1990), para o Paran;

    Bisol (1994), para Porto Alegre; Coelho e Naumann (1994) para as capitais da regio Sul

    (Curitiba - PR, Florianpolis - SC e Porto Alegre RS); Paiva (1996), para o Rio de Janeiro;

    Cabreira (1996), para Santa Catarina, Paran e Rio Grande do Sul; Silva (1997), para o Rio de

    Janeiro; Arajo, M. (1999), para o Maranho; Arajo, A. (2000), para o Cear; Lopes (2002),

    para o Par; Farias e Oliveira (2003), para o Par; Silva (2004), para a Paraba; Pereira (2004),

    para Santa Catarina; Amaral (2005), para o Rio Grande do Sul; Carvalho (2007), para Recife;

    Farias (2008), para o Par; Brescancini (2009), para Santa Catarina; Santos e Chaves (2010),

    5 A obra Os Lusadas, publicada em 1572, um poema pico dividido em dez cantos, que tem por temas a

    viagem de Vasco da Gama em busca do caminho martimo para as ndias e a histria portuguesa, desde a luta

    contra os mouros invasores at a consolidao do Estado luso e as grandes navegaes (PEREIRA, 2004).

  • 16

    para o Acre; Toledo (2011) para o Rio Grande do Sul e Arajo, A. (2013) para as regies

    Norte e Sul do Projeto Atlas Lingustico do Brasil (ALiB).

    Embora Arajo (2000) tenha produzido um estudo sobre o ditongo em questo na

    norma oral culta da capital cearense, no se sabe sobre o seu comportamento varivel na

    norma oral popular de Fortaleza. Portanto, esta pesquisa pretende suprir, nesta comunidade de

    fala (LABOV, 2008), a lacuna na norma popular, que a realizao do ditongo /ej/ em

    contexto CVC (consoante, vogal, consoante). Esta pesquisa junta-se aos estudos da regio

    Nordeste (ARAJO, M., 1999; ARAJO, A.; 2000; SILVA, 2004; CARVALHO, 2007).

    Com a descrio sistemtica da variao/mudana lingustica do fenmeno em pauta,

    conhecemos melhor, cada vez mais, o falar do fortalezense, contribumos com a descrio do

    portugus oral brasileiro e fornecemos uma fotografia sociolingustica atualizada desse

    processo da lngua portuguesa.

    De acordo com Hora e Henrique (2013), as pesquisas de base sociolingustica

    variacionista, sobre o uso varivel do ditongo /ej/, demonstram resultados categricos em

    favor da sua monotongao, revelando mudanas na lngua dignas do diagnstico e da

    sistematizao.

    Assim sendo, um estudo desta natureza na Capital cearense mandatrio e

    tambm relevante, j que o monotongo to recorrente e antigo no portugus oral e pouco se

    conhece sobre essa regra na regio Nordeste, onde so registradas apenas quatro pesquisas:

    Arajo, M. (1999), Arajo, A. (2000), Silva (2004) e Carvalho (2007).

    Mesmo com a publicao de trabalhos sobre variao lingustica, uma vasta

    literatura crtica demonstra que o ensino do portugus brasileiro ainda visa tradicionalmente a

    reformar ou consertar a lngua adquirida pela pessoa no meio social, o que deve,

    provavelmente, resultar do pouco uso dos estudos sobre variao lingustica no mbito

    educacional, como parte das polticas lingusticas e das concepes de lngua.

    Consoante Bagno (2007), desprezar o conhecimento da lngua que a pessoa

    adquire em sua atividade lingustica com a famlia e com o grupo social desconsiderar o uso

    intuitivo, eficaz e criativo dos seus recursos, propiciando, assim, a alienao social da pessoa

    e fomentando o preconceito lingustico. Alm disso, a falta de explicao e orientao clara e

    direcionada sobre os fenmenos variveis de fala ensejam dificuldades no letramento.

    Camacho (2001) tambm sugere, como pressuposto da Pedagogia da lngua

    materna, que o professor deve valorizar e respeitar o contexto social do educando e ensinar-

    lhe a utilizar o registro mais adequado em cada situao comunicacional, propiciando o seu

  • 17

    acesso aos bens simblicos mais variados, como as variedades padro e no padro,

    cumprindo assim o seu papel scio-poltico-educacional.

    O que poderia mais aproximar os estudantes de lngua portuguesa do uso real da

    lngua seriam os livros didticos, as gramticas, uma melhor qualificao dos professores e as

    condies de trabalho. De acordo com Coelho (2007), entretanto, os livros didticos pouco se

    preocupam em demonstrar um panorama descritivo mais atual do portugus falado no Brasil,

    o que indica desarticulao editorial com a proposta lingustica educacional que interfere,

    diretamente, na publicao desses livros. O mesmo ocorre com as gramticas, intituladas

    novas ou modernas, que ainda restringem o estudo dos ditongos orais a encontros voclicos.

    Nestas circunstncias, os estudantes ficam prejudicados, por no possurem um

    material que realmente descreva o portugus falado em seu pas. Parece haver um

    distanciamento entre o que est prescrito sobre a lngua e como esta realmente se manifesta

    nas situaes reais de uso, como no caso da monotongao.

    Ademais, os estudos de variao lingustica possuem previso legal nos

    Parmetros Curriculares Nacionais de Lngua Portuguesa - PCNs (BRASIL, 1998). Este

    documento acentua que o domnio da lngua materna envolve o desenvolvimento da

    competncia comunicativa da pessoa, de forma a convergir tal competncia ao pleno domnio

    e uso da lngua(gem), que, na modalidade oral, implica o conhecimento das variedades

    lingusticas, as quais, quando negligenciadas, tornam a lngua vazia como meio de interao.

    Dell Hymes (1972a) apud Bortoni-Ricardo (2005, p. 61) explica o conceito de competncia

    comunicativa: [...] um membro de uma comunidade de fala tem de aprender o que dizer e

    como diz-lo apropriadamente, a qualquer interlocutor e em quaisquer circunstncias.

    , portanto, com origem em trabalhos como o desta pesquisa que alunos e

    professores podem conhecem melhor a diversidade lingustica brasileira para lidar com as

    inmeras situaes de heterogeneidade da lngua que se deparam cotidianamente.

    Deste modo, este estudo pretende trazer contribuies para os estudos de

    Sociolingustica Variacionista, alm de prover subsdios para o ensino de Lngua Portuguesa

    no Brasil, pois, ao descrever como a monotongao do ditongo /ej/ se manifesta na cidade de

    Fortaleza, possvel conhecer-se melhor a realidade lingustica local, o que permite fornecer

    dados importantes para uma educao lingustica mais heterognea, que compreenda tanto a

    tradio gramatical quanto as descries baseadas no uso real da lngua por seus falantes.

    Nosso objetivo principal analisar o comportamento varivel do ditongo /ej/ em

    contexto CVC (consoante, vogal, consoante) no falar popular de Fortaleza. Como hiptese

    geral, assumimos o argumento de que o fortalezense monotonga mais nesse contexto diante

  • 18

    de tepe no contexto fontico seguinte e que essa monotongao condicionada por outros

    fatores lingusticos e sociais. (WEINREINCH, LABOV; HERZOG (2006); LABOV (1994;

    2008, 2010). Como hipteses secundrias, elaboradas com base nos estudos de autores a

    quem recorremos nesta pesquisa, acreditamos que a supresso da semivogal [j] seja

    favorecida, principalmente por

    fatores lingusticos (tepe) nos contextos fonticos anterior e posterior,

    extenso do vocbulo (trisslabas e polisslabas), classe de palavras (verbos e

    no verbos), tonicidade da slaba (slaba tnica), natureza morfolgica

    (radical); e

    a) fatores extralingusticos, como escolarizao (0-4 anos); idade (15-25 anos) e

    sexo (homens).

    Alm dessas hipteses, ainda acreditamos que estamos diante de um caso de

    mudana lingustica6 em curso a favor do monotongo.

    Para isso, utilizamos uma amostra do corpus do projeto Norma Oral do Portugus

    Popular de Fortaleza - NORPOFOR, de onde foram retiradas entrevistas do tipo Dilogo entre

    Informante e Documentador (DID) para anlise. O NORPOFOR um banco de dados do falar

    popular de Fortaleza, coordenado pela professora Aluza Alves de Arajo, que teve suas

    entrevistas realizadas no perodo de 2003 a 2006 (ARAJO, 2011). Esta data-base utilizada

    no Projeto Fotografias Sociolingusticas de Fortaleza, vinculado ao Programa de Ps-

    Graduao em Lingustica Aplicada da Universidade Estadual do Cear, do qual esta

    dissertao faz parte. Os 54 informantes selecionados foram estratificados de acordo com as

    variveis sociais: sexo (homens e mulheres), escolaridade (0-4 anos; 5-9 anos e 9-11 anos) e

    faixa etria (15-25 anos; 26-49 anos e 50 em diante).

    Esta investigao foi organizada em seis captulos: o primeiro refere-se

    introduo e apresenta o objeto de estudo, as hipteses, os objetivos de pesquisa, os motivos

    pelos quais decidiu-se pesquisar este objeto, alm de sua relevncia. O segundo segmento

    prov a descrio dos estudos variacionistas sobre a monotongao do ditongo /ej/ no

    portugus do Brasil. O terceiro mdulo destina-se a apontar a Teoria da Variao e Mudana

    Lingustica, como aporte terico e metodolgico dessa investigao. O quarto captulo traz a

    6 Sobre mudana lingustica, Weinreich, Labov e Herzog ([1968]2006) indicam que ela ocorre quando h uma diferenciao ordenada em uma generalizao de uma alternncia particular, num determinado subgrupo da

    comunidade de fala, no havendo associao entre estrutura e homogeneidade, pois a estrutura lingustica inclui

    exatamente essa diferenciao ordenada dos falantes e dos estilos. Toda mudana lingustica, para os autores,

    implica que ocorrem variabilidade e heterogeneidade, embora o contrrio nem sempre suceda. Como explicam, a

    generalizao da mudana lingustica envolve a covariao de mudanas associadas durante, nas mais das vezes,

    longos perodos, que se refletem na distribuio de isoglossas por reas geogrficas.

  • 19

    metodologia de pesquisa adotada; ao passo que o quinto privilegia a descrio dos dados e a

    discusso dos resultados. Por fim, no sexto captulo so apresentadas as concluses do

    trabalho.

  • 20

    2 A VARIAO DO DITONGO ORAL DECRESCENTE /ej/ NO PORTUGUS

    BRASILEIRO

    2.1 ESTUDOS VARIACIONISTAS

    Dentre os autores que j estudaram a reduo do ditongo /ej/ sob a perspectiva

    variacionista, o maior nmero de trabalhos produzidos sobre esse fenmeno est na regio

    Sul, onde encontramos quatro artigos, Bisol (1994), Coelho e Naumann (1994), Amaral

    (2005) e Brescancini (2009), e cinco dissertaes de mestrado, Meneghini (1983), Ribeiro,

    (1990), Cabreira (1996), Pereira (2004) e Toledo (2011). No norte do Pas, h quatro

    trabalhos, sendo dois artigos, Farias e Oliveira (2003) e Santos e Chaves (2010), e duas

    dissertaes de mestrado, Lopes (2003) e Farias (2008), todos produzidos no incio deste

    sculo. No Nordeste, h tambm quatro estudos, a saber: Arajo, M. (1999), Arajo, A.

    (2000), Silva (2004) e Carvalho (2007). No Sudeste, encontramos os trabalhos pioneiros de

    Veado (1983), de Paiva (1996) e de Silva (1997). Arajo, A. (2013) produziu mais um estudo,

    comparando as capitais brasileiras das Regies Norte e Sul do Projeto Atlas Lingustico do

    Brasil (ALiB).

    A seguir, estes estudos sero brevemente descritos, de acordo com a ordem

    cronolgica e conforme a regio, destacando-se apenas os resultados mais importantes para o

    ditongo [ej].

    Na Regio Metropolitana de Belo Horizonte, Veado (1983) produziu um estudo

    acerca da reduo dos ditongos /ej/7 e /ow/ no portugus brasileiro. A autora avalia a

    realizao varivel de /ej/ em amostras de variadas situaes de fala na Capital Mineira. A

    amostra foi dividida em trs partes, cada uma delas apresentando uma situao de fala

    diferente, tais como: fala coloquial, fala cuidada e leitura de palavras e de texto. Na fala

    coloquial, de 737 dados, apenas sete palavras no foram monotongadas, deduzindo-se que a

    fala casual altamente favorecedora da reduo de /ej/ e que a reduo desse ditongo nesse

    tipo de fala no est ligada a fatores lingusticos nem a fatores sociais, ou seja, encontrou-se

    nesse contexto de fala um alto ndice de reduo, quase 100% para a realizao de [e],

    independentemente da influncia de quaisquer fatores.

    A acentuao, posio do ditongo na palavra e segmento consonantal seguinte

    foram fatores que atuaram em relao alternncia de [ej] em relao a [e]. Sobre o primeiro

    7 Esta a forma de apresentar o ditongo da prpria autora. Sempre usaremos o modo de transcrio escolhido pelos autores.

  • 21

    fator, o trao + acento foi mais favorecedor da monotongao do que o trao - acento.

    Relativamente posio do ditongo no item lexical, em posio interna, a reduo de quase

    50%.

    O segmento consonantal posterior, como o tepe alveolar, denotou o maior nmero

    de ocorrncias e foi o que teve o maior percentual de reduo. Em situaes de leitura, os

    informantes se comportaram de maneira semelhante ao registro na fala de noticirios e

    entrevistas. Os altos ndices percentuais de reduo nos nveis de fala mais rebuscada,

    incluindo a leitura, demonstram para a autora a estabilidade e a consistncia da reduo em

    lngua portuguesa.

    Em Ibia-RS, Meneghini (1983 apud TOLEDO, 2011; AMARAL, 2005) estudou

    todos os ditongos orais decrescentes do Portugus, com o objetivo de identificar quais deles

    estavam sujeitos perda da semivogal e quais variveis lingusticas e sociais influenciariam o

    seu uso. Destes ditongos, o autor descreveu a monotongao somente de trs, que se

    mostraram sujeitos ao apagamento da semivogal, [aj], [ej] e [ow].

    A amostra, constituda por 115 informantes de nvel fundamental completo ou

    incompleto, foi estratificada segundo a escolaridade, o sexo, a idade e a zona urbana ou zona

    rural (TOLEDO, 2011). Foram controlados os fatores: contexto fontico posterior e

    tonicidade.

    Foram analisados 9.233 dados (AMARAL, 2005) e os fatores lingusticos

    favorecedores da monotongao do ditongo /ej/ foram: o tepe e a fricativa palatal, no contexto

    fonolgico seguinte e, quanto tonicidade, somente a slaba tona se mostrou um fator

    relevante para aplicao da regra. No houve varivel social selecionada como relevante sobre

    o fenmeno em estudo.

    Ribeiro (1990) analisou a supresso dos ditongos [aj], [ej] e [ow] na fala do

    Sudoeste paranaense, em cinco municpios: Santo Antnio do Sudoeste, Marmeleiro,

    Renascena, Clevelndia, Chopinzinho e Nova Prata do Iguau. No total, foram colhidos

    6902 dados, oriundos de 22 informantes do Projeto Fontes Culturais para o Ensino, sendo

    3864 de /y/8 e 3038 de [w], resultando em 2338 itens monotongados, estratificados de acordo

    com a faixa etria (30 a 59 anos e acima de 60 anos) e o sexo.

    Sobre o volume vocabular, percebe-se que a supresso do ditongo /ej/ entre

    monosslabos categrico. Outro fato que a levou a questionar a relevncia do fator extenso

    8 Fonte fontica utilizada pela autora.

  • 22

    da palavra na reduo do ditongo foi a quantidade de palavras polisslabas em que o iode

    aparece seguido de flape.

    Sabe-se que, no caso do /y/, o flap se mostra categrico no apagamento da

    semivogal. O subfator extenso do vocbulo est sujeito ao contexto fonolgico seguinte

    semivogal na maior parte dos dados analisados. O estudo tambm revela que os adjetivos tm

    caractersticas idnticas aos substantivos por serem classes prximas.

    No contexto fonolgico precedente, /y/ suprimido quando precedido de /e/,

    considerando, ento, esse apagamento como um fenmeno de assimilao. J, para o contexto

    fonolgico posterior, os subfatores que mais influenciaram a supresso de /y/ foram o flap e o

    palato-alveolar. Nenhum fator social interferiu na supresso do iode.

    Na cidade de Porto Alegre - RS, Bisol (1994) avaliou a realizao do ditongo /ej/

    na fala de sete informantes, controlando apenas a varivel contexto seguinte, que expressa os

    seguintes resultados: palatal, tepe, labial, velar, alveolar, vogal para o apagamento de [j]. Com

    esses dados, a autora assegura que, diante de consoante palatal e de vibrante simples, a

    variante sem glide a de uso geral, fazendo com que ela defenda a ideia de que, nestes

    contextos, o ditongo denote apenas uma vogal na forma implcita, configurando o falso

    ditongo.

    Para Bisol, h duas vogais no verdadeiro ditongo, que sempre aparecem na fala.

    Nesta anlise, demonstra-se que tanto a insero do glide quanto o seu apagamento

    constituem um processo que ocorre variavelmente na estrutura de superfcie, por derivar da

    expanso de traos secundrios da consoante. A autora assinala que, na realizao de /ej/,

    considerando o contexto pr-consonntico em palavras com consoante palatal e de vibrantes

    simples, a semivogal /j/ quase totalmente suprimida.

    Sobre a metodologia de coleta de dados e a respeito da composio da amostra

    nesse estudo, nele no encontramos maiores esclarecimentos, contudo parece que no era

    objetivo de Bisol fazer uma anlise propriamente quantitativa dos dados, pois, na verdade,

    estes so apenas indcios para uma discusso a respeito da origem do glide diante da

    consoante palatal.

    Coelho e Naumann (1994) investigaram a realizao do ditongo [ej] nas capitais

    do Sul (Curitiba - PR, Florianpolis - SC e Porto Alegre - RS), com origem em 36

    informantes do Projeto VARSUL (Variao Lingustica Urbana do Sul do Pas)9, sendo

    9 O projeto VARSUL tem por meta descrever o portugus falado e escrito de reas socioculturalmente

    representativas do Sul do Brasil, constituindo-se de: Banco de Dados VARSUL (Formado por 288 entrevistas de

    zonas urbanas, distribudas igualmente entre quatro cidades de cada um dos trs estados da regio Sul do Brasil),

  • 23

    estratificados de acordo com a localidade (12 de cada municpio), idade (menos de 50 anos e

    mais de 50 anos) e escolaridade (ginasial, primrio e colegial).10 A natureza do segmento

    seguinte (/r/, flap e /s/, palato-alveolar) e a extenso da palavra (trisslabos) foram os

    condicionamentos lingusticos mais relevantes na supresso do [y]. Dentre as variveis

    sociais, foi selecionada a regio geogrfica (Florianpolis) como aliada da regra.

    Quanto ao segundo, os informantes de menos de 50 anos beneficiam a

    monotongao, ao contrrio dos que possuem idade acima disso. E, com relao ao ltimo, os

    falantes do colegial, os mais escolarizados, empregam menos a variante monotongada,

    enquanto os do ginsio e do primrio, os menos escolarizados, empregam mais a reduo do

    ditongo. As autoras concluem que a supresso de [j] um processo fontico determinado pela

    natureza do segmento seguinte.

    Cabreira (1996) analisou a monotongao dos ditongos [aj], [ej] e [ow] nas

    capitais do Sul do Brasil, Curitiba- PR, Florianpolis- SC e Porto Alegre- RS, partindo de

    uma amostra constituda por 36 informantes do Projeto VARSUL, estratificada de acordo com

    a idade (25-50 anos e de 51 anos em diante); grau de escolaridade11 (primrio, ginsio e 2

    grau); sexo (masculino e feminino) e variedade geogrfica (Porto Alegre, Florianpolis e

    Curitiba).

    As variveis lingusticas levantadas foram: vogal do ditongo, sonoridade do

    elemento seguinte, posio do elemento seguinte quanto a slaba, tonicidade e natureza

    morfolgica. De um total de 1.512 dados, foram obtidas 483 ocorrncias da monotongao do

    ditongo [ej], o que equivale a 32%. Seu estudo mostra que a semivogal [j] dos ditongos [aj] e

    [ej] s suprimida quando seguida por fricativa palato alveolar ou tepe.

    Em razo desse ltimo segmento, a regra de monotongao quase categrica.

    Em face disso, o autor realiza duas anlises: uma para os ditongos [ej] e [aj], seguidos por

    fricativa palatal surda e sonora, e outra somente para o ditongo [ej], seguido por tepe. Os

    fatores selecionados como condicionadores da regra de monotongao na primeira anlise

    foram: posio do elemento seguinte, a escolaridade, a sonoridade do elemento seguinte, o

    sexo e a variedade geogrfica.

    Amostra Digital VARSUL (constituda por trechos de udio entre 5 e 15 minutos de 40 entrevistas) e Banco

    de Dados Diacrnico (composto por textos de fontes diversas). A sua finalidade de oferecer: 1. subsdios para a

    descrio do portugus falado e escrito no Brasil; 2. condies para teste e desenvolvimento de teorias

    lingusticas; 3. condies para formao de novos pesquisadores; 4. subsdios para programas educacionais,

    promovendo o conhecimento e o respeito s variedades lingusticas. (COELHO; NAUMANN, 1994) 10 A nomenclatura utilizada sobre os graus de escolaridade a citada pelas autoras. Primrio, ginsio e 2 grau

    representam, nos dias de hoje, respectivamente, quatro, nove e onze anos de estudo. 11 As expresses primrio, ginsio e 2 grau utilizadas pelo autor equivalem respectivamente a fundamental 1,

    fundamental 2 e ensino mdio.

  • 24

    Na segunda anlise, os fatores mais relevantes foram: a natureza morfolgica

    (radical), o grau de escolaridade (primrio), o sexo (feminino) e a variedade geogrfica

    (Curitiba). Nas duas avaliaes, a pouca escolaridade (primrio) e o sexo feminino so

    representativos para a monotongao. Para o autor, os falantes de Florianpolis so os que

    mais aplicam a regra, comparados aos falantes de Porto Alegre e de Curitiba.

    Paiva (1996) abordou a supresso de [y] no Rio de Janeiro e categrica ao

    afirmar que esse fenmeno em determinadas condies fonticas na fala do carioca quase

    norma. Foram utilizados dados de 44 entrevistas do Projeto Censo da Variao Lingustica

    do Rio de Janeiro, dos quais 2111 itens consistem de ditongo /ej/ em interior de palavra.

    Considerando que, em final de palavra, a ocorrncia deste ditongo indica a manuteno de [y],

    visto que esta posio se mostrou categrica, tal contexto foi descartado da pesquisa.

    Para a autora, a supresso da semivogal do ditongo decrescente /ej/ um

    fenmeno sistmico que no recebe influncia de fatores externos e que tambm no

    demonstra diferena diastrtica. Foram examinados os seguintes fatores: o contexto seguinte

    semivogal quanto ao ponto de articulao e ao modo de articulao, a tonicidade da slaba do

    ditongo, a extenso da palavra e a estrutura interna da palavra. Os fatores ponto e modo de

    articulao do segmento subsequente so os que influenciam a supresso de [j], seguidos por

    extenso e estrutura interna do vocbulo. A tonicidade mostrou-se irrelevante no processo. Os

    segmentos velares e palato-alveolares favorecem a reduo de /ej/.

    O flap se mostrou o segmento que mais aplica a monotongao, seguido das

    consoantes fricativas. As palavras polisslabas, trisslabas e disslabas so aliadas do

    fenmeno. A supresso de [j] ocorre com maior frequncia no sufixo. Vale frisar, no entanto,

    que a supresso de [j] em eiro, que est diante de flap (contexto favorecedor do

    cancelamento de [j]), pode ocorrer em virtude da influncia do segmento seguinte ao ditongo

    /ej/ e no morfologia deste sufixo. As variveis sociais foram pouco significativas nesta

    pesquisa, ratificando a hiptese da autora de que a reduo desse ditongo quase no

    influenciada por elementos externos.

    Silva (1997) investigou a monotongao de /ej/ e /aj/ nos falares fluminenses, com

    base nos dados do Projeto Atlas Etnolingustico dos Pescadores do Estado do Rio de

    Janeiro12, cuja coleta se deu com suporte no recolhimento de questionrios aplicados a

    12 O Projeto do Atlas Etnolingustico dos Pescadores do Estado do Rio de Janeiro (APERJ) possui um corpus

    com 178 horas de gravao no Norte-Noroeste do Estado do Rio de Janeiro, correspondente a entrevistas com 78

    informantes, realizadas em 13 localidades daquela regio. O corpus vem sendo ampliado para atingir as regies

    das Lagunas Litorneas, Metropolitana e Sul do Estado do Rio de Janeiro, prevendo-se a incluso de 36 outras

    comunidades. O Projeto est sendo desenvolvido no s por meio da recolha sistemtica de dados (constituio

  • 25

    informantes dilogos entre locutores e documentadores da pesquisa, estratificados de acordo

    com o sexo (masculino), grau de escolaridade (baixo nvel ou analfabetos) e faixa etria A

    (18-35 anos), B (36-55 anos) e C (56-70 anos).

    Foram controladas as variveis: localidade de origem do pescador, faixa etria,

    tonicidade da slaba do ditongo, extenso do vocbulo, posio do acento na palavra,

    qualidade do segmento imediato semivogal; como modo e ponto de articulao e posio do

    ditongo no radical ou no sufixo em palavras derivadas. Para o ditongo /ej/, das 4072

    ocorrncias analisadas, 1354 (33%) mantm o ditongo, ao passo que 2718, (67%) do total

    reduzem a semivogal, predominando a variante monotongada.

    Observou-se que os fatores mais relevantes para a ocorrncia do fenmeno so o

    modo e o ponto de articulao do segmento posterior semivogal. Em seguida, a autora

    menciona as variveis tamanho da palavra e acentuao como favorecedoras na primeira

    rodada, porm, posteriormente, Silva informa que tais grupos de fatores no se mostraram

    realmente significativos, e, por fim, a faixa etria (faixa C) dos informantes. No contexto

    ponto de articulao, as pr-palatais so altamente favorecedoras da monotongao, assim

    como as labiais.

    Arajo (1999) descreveu a monotongao do ditongo [eI] no portugus falado em

    Caxias, no Maranho, com base em 801 dados de gravaes de 24 entrevistados. Os fatores

    selecionados pelo programa, conforme a ordem de importncia foram: o segmento seguinte, a

    velocidade de fala, a escolaridade, a tonicidade da slaba e a idade. A estratificao foi feita

    com base no sexo (A- masculino e B- feminino), no grau de instruo (C- analfabetos e D- de

    nove a dez anos) e na idade dos falantes (de 15 a 25 anos e mais de 50). No possvel dizer

    nada sobre a implementao desse fenmeno no dialeto da cidade, segundo os resultados da

    pesquisa.

    Para o grupo de fatores segmento seguinte, a monotongao do ditongo [eI] est

    bastante avanada nos contextos [r] e [a]. Quanto varivel velocidade de fala, o segmento

    semivoclico mais facilmente perdido nas sequncias de falas produzidas mais rapidamente.

    No tocante escolaridade, os falantes escolarizados aplicam menos a monotongao. Para a

    tonicidade da slaba, conclui-se que o glide mais apagado nas slabas tnicas. Com relao

    faixa etria, os falantes mais velhos aplicam mais a regra.

    do Arquivo Sonoro referente fala de 49 localidades do Estado) e pela elaborao de cartas lingusticas, mas

    tambm pela realizao de estudos nas linhas sociolingustica variacionista e especificamente dialetolgica,

    visando descrio e anlise de aspectos fontico-fonolgicos, morfossintticos e lxicos da fala popular do Rio

    de Janeiro. (SILVA, 2009).

  • 26

    Quanto ao sexo, no h diferenas significativas entre o comportamento de

    homens e mulheres. Os falantes de classe baixa so os que mais usam a forma monotongada

    do ditongo [eI]. A autora acentua que a regra demonstra diferena diastrtica, podendo ser

    objeto de restries em relao modalidade-padro e a no-padro.

    Arajo (2000) analisou a monotongao dos ditongos [aj], [ej], [ow] nos dados do

    Projeto Portugus Oral Culto de Fortaleza PORCUFORT. As entrevistas ocorreram no

    perodo de agosto de 1993 setembro de 1995. Nesta pesquisa, foi utilizada uma amostra

    constituda por 74 informantes. Das 2181 ocorrncias para [ej], 1476 aparecem

    monotongadas, o que equivale a 68% de aplicao da regra.

    Foram testadas as variveis lingusticas: contexto fontico posterior, contexto

    fontico anterior, dimenso da palavra, tonicidade da slaba, natureza morfolgica do ditongo

    e as extralingusticas: sexo (homens e mulheres), faixa-etria (22 a 35 anos), (36 a 50 anos) e

    (51 anos em diante), e tipo de registro (DID - Dilogos entre Informante e Documentador, D2

    - Dilogo entre Dois Informantes e EF - Elocuo Formal).

    Desses fatores, os que se revelaram relevantes na monotongao do ditongo [ej]

    foram: contexto fontico posterior (a fricativa palatal e o tepe), natureza morfolgica do

    ditongo (morfema lexical e morfema derivacional), tonicidade da slaba (slaba tnica),

    dimenso da palavra (disslabos, trisslabos e polisslabos), tipo de registro (DID e D2) que

    possuem o menor grau de formalidade e sexo (homens).

    Lopes (2002) investigou a realizao dos ditongos [ej] e [ow] no portugus falado

    na cidade de Altamira-PA. Sua amostra foi retirada do banco de dados do Projeto ALIPA

    (Atlas Geo-Sociolingustico do Estado do Par)13, sendo constituda por 40 informantes,

    estratificados de acordo com as variveis: idade (15-25 anos, 26-45 anos e 46-70 anos) sexo,

    nvel de escolarizao (no escolarizado, ensino fundamental e ensino mdio) e renda (baixa e

    mdia). Do total de dados coletados, 1456 pertencem ao ditongo /ej/, dos quais 54%

    favorecem a reduo de /ej/ a /e/.

    13 O ALIPA um projeto de pesquisa da Universidade Federal do Par, cuja finalidade a construo do Atlas Geo-Sociolingustico do Estado e vem sendo ampliado na identificao, anlise e mapeamento da variao

    sociolingustica do portugus da regio. O estado foi dividido em 57 pontos de inqurito que foram agrupados

    em 6 mesorregies. A pesquisa possui uma metodologia que divide o estudo em rea urbana (Belm, Bragana,

    Camet e Abaetetuba) e rea rural. A estratificao dos informantes na zona urbana se d de acordo com o sexo

    (masculino e feminino), a faixa etria (15 a 25, 26 a 49, +50 anos), a escolaridade (analfabetos, 1 grau completo

    e 2 grau) e a renda (baixa, mdia e alta), no total de 42 indivduos. Na zona rural, de cada municpio, sero

    selecionados 2 homens e 2 mulheres, todos alfabetizados at a 4 srie e distribudos, igualitariamente, em duas

    faixas etrias (18a 30 anos e 40 a 70 anos). (LOPES, 2002).

  • 27

    Das variveis lingusticas testadas (classe morfolgica do vocbulo em que ocorre

    o ditongo, posio do ditongo no vocbulo, natureza morfolgica, tonicidade, contexto

    fontico seguinte, contexto fontico precedente, tipo de vocbulo e status fonolgico do

    ditongo) e sociais (sexo, idade, escolaridade e renda), foram relevantes para a monotongao

    de [ej]: contexto fontico seguinte (reduo categrica diante de tepe e favorecimento diante

    das fricativas palato-alveolares desvozeada e vozeada), a localizao do ditongo na estrutura

    morfolgica da palavra (radical), a natureza da origem do vocbulo (palavras comuns) e a

    escolaridade (menos escolarizados).

    Farias e Oliveira (2003) examinaram a reduo dos ditongos [ej] e [ow] no

    Nordeste do Par, na zona rural, tomando, para anlise, dados da fala de 22 informantes do

    Projeto ALIPA (Atlas Geo Sociolingustico do Estado do Par) que se caracteriza pela

    aplicao do questionrio Semntico-Lexical, que est dividido em treze campos semnticos,

    distribudo em 256 perguntas.

    Foram selecionados cinco municpios (Vigia, Capanema, Bragana, Baio e

    Camet) da mesorregio do Nordeste Paraense. De cada localidade, foram extrados quatro

    informantes, estratificados, igualitariamente, de acordo com o sexo (masculino e feminino) e a

    faixa etria (A: 18 a 30 anos; B: 40 a 70 anos). Os resultados obtidos para o ditongo [ej]

    evidenciam que

    a) o tepe e as fricativas palatais em contexto posterior ao ditongo favorecem o

    apagamento do glide;

    b) a varivel extenso da palavra tambm se mostrou favorecedora (polisslabos),

    ou seja, quanto maior a palavra mais chances de monotongao, bem como

    c) a varivel posio do ditongo no item lexical (no meio da palavra tem mais

    chances de ser monotongado).

    Nenhum fator social relevante para a aplicao da regra. As autoras no

    exprimem a frequncia de uso geral da aplicao da regra pois, o que elas fornecem so os

    ndices para cada fator individualmente, como, por exemplo: das 352 ocorrncias de [ej]

    diante da consoante tepe alveolar localizada aps a varivel, 97,7% tiveram a semivogal

    apagada.

    Silva (2004) analisou a monotongao de: [aj], [ej] e [ow] no falar da comunidade

    de Joo Pessoa- PB. A amostra utilizada faz parte do corpus que integra o Projeto VALPB14,

    14 O VALPB um banco de dados de 1993 que apresenta uma amostragem do portugus falado na Paraba,

    colhida na perspectiva variacionista, com base nas entrevistas de 60 informantes. Nele encontram-se

    armazenados dados de fala em fitas de udio estratificados, conforme as variveis: 1) Sexo (30 informantes do

  • 28

    estratificada de acordo com o sexo, anos de escolarizao e faixa etria dos informantes, que

    so as variveis sociais controladas, alm dos fatores lingusticos: contextos fonolgicos

    seguinte e precedente, valor fonemtico do ditongo, posio do elemento seguinte quanto

    slaba, vogal do ditongo, natureza morfolgica e tonicidade. Das 4902 ocorrncias de [ej],

    houve 2150 aplicaes, correspondendo a 44%. Dentre os fatores controlados, os segmentos

    condicionadores da regra foram: contexto fonolgico seguinte (vibrante, fricativa [] e [])15.

    Novamente, temos que o tepe e as palatais condicionam o apagamento quando em

    contexto seguinte, por assimilao. O ditongo [ej], tambm quando pretnico, se mostrou

    favorecedor da monotongao. Quanto escolaridade, os falantes com menor grau de

    escolarizao so os mais inovadores da regra. Segundo a autora, de acordo com os ndices de

    reduo, este provavelmente um caso de mudana lingustica consumado.

    Pereira (2004)16 realizou um estudo sobre o apagamento dos ditongos /aj/, /ej/ e

    /ow/ na fala dos habitantes de Tubaro, em Santa Catarina. A autora discute os resultados de

    sua pesquisa em quatro corpora, no entanto, traremos apenas dados do primeiro, que atende o

    propsito desta pesquisa por exprimir textos recolhidos da fala espontnea. Deste corpus, a

    autora analisa textos orais de 14 informantes tubaronenses estratificados de acordo com o

    sexo, a faixa etria e a escolaridade, pertencentes ao PROCOTEXTO/UNISUL. De um total

    de 1220 dados, ocorreram 573 monotongos para /ej/.17, ou seja, 47%.

    As variveis lingusticas escolhidas pelo programa foram: classe de palavra, tipo

    de vogal do ditongo (a, e, o), contexto anterior (anterior ao ditongo), contexto posterior (ou

    contexto seguinte ao glide /j/). As variveis extralingusticas controladas foram: localizao

    geogrfica, idade (12-16 anos, 25-49 anos e mais de 50 anos) e escolaridade (1 a 4 sries

    iniciais, 5 a 8 srie ginasial e 1 a 3 srie do ensino mdio)18. A anlise deste corpus

    expressou o contexto fontico seguinte (palatal e tepe) como o nico favorecedor da variante

    monotongada do ditongo [ej] e revelou tambm que nenhum fator social condiciona a regra.

    Amaral (2005) abordou a reduo do ditongo [ej] em trs municpios do Rio

    Grande do Sul - So Borja, Panambi e Flores da Cunha - utilizando dados da fala de 42

    informantes do VARSUL. As variveis lingusticas controladas foram:

    sexo masculino e 30 informantes do sexo feminino); 2) Faixa etria (20 informantes de 15 a 25 anos, 20

    informantes de 26 a 49 anos e 20 informantes com mais de 50 anos); e 3) Anos de escolarizao (12 informantes:

    nenhum; 12 informantes: 1 a 4 anos; 12 informantes: 5 a 8 anos; 12 informantes: 9 a 11 anos; 12 informantes:

    mais de 11 anos). (HORA; PEDROSA, 2001). 15 A fonte fontica utilizada da prpria autora. 16 No houve percentual geral de /ej/, pois a autora fez uma anlise dos trs ditongos em conjunto. 17 O total de dados tambm inclui ocorrncias de /aj/ e /ow/. 18 A autora utilizou a nomenclatura sobre a varivel escolaridade vigente na poca de sua pesquisa.

  • 29

    a) classe de palavras;

    b) contexto fontico seguinte;

    c) posio do ditongo e tonicidade; alm das

    d) variveis extralingusticas,

    - faixa etria (menos de 50 anos e mais de 50 anos);

    - grupo geogrfico (Flores da Cunha, Panambi e So Borja),

    - de etnias diferentes, sendo a primeira cidade de colonizao italiana, a

    segunda de colonizao alem e a ltima uma cidade fronteira com a

    Argentina, razes pelas quais foram selecionadas; e

    - a escolaridade (primrio, ginsio e 2 grau).

    Neste estudo, so apontadas como relevantes aplicao da regra as seguintes

    variveis: contexto fonolgico seguinte (fricativa palato alveolar e o tepe), tonicidade (slabas

    tonas) e classe de palavra (formas no verbais). A nica varivel social selecionada como

    relevante foi a faixa etria (menos de 50 anos), que indicou os mais jovens como aliados da

    regra, em oposio aos mais velhos (mais de 50 anos). De acordo com a autora, a

    monotongao condicionada mais por fatores lingusticos (contiguidade do segmento) do

    que por fatores sociais.

    Carvalho (2007)19 pesquisou o apagamento dos ditongos decrescentes orais /aj, ej,

    oj, aw, ew, ow na comunidade de fala do Recife, dos quais levaremos em conta apenas os

    dados e resultados relativos ao ditongo /ej/. A autora entrevistou 48 pessoas, divididas em

    dois grupos: falantes do subrbio e falantes de bairros centrais da Capital pernambucana,

    metade dos quais com escolaridade de nvel superior e metade com baixo grau de

    escolaridade (at quatro anos e mais de quatro anos), todos devidamente distribudos em trs

    faixas etrias (a-17-25; b-26-49 e c- de 50 em diante). O corpus exprimiu o total de 1135

    ocorrncias, das quais 659 com o glide /j/.

    As variveis estruturais testadas foram: posio do ditongo, tonicidade, contexto

    precedente, contexto seguinte e classe gramatical e as sociais: sexo, idade, escolaridade e

    local de moradia. A autora aponta os seguintes fatores lingusticos como motivadores do

    apagamento do glide /j/ no ditongo /ej/ na fala do recifense: contexto fonolgico precedente

    (vogal posterior), que se destacou em relao aos outros fatores; contexto fonolgico seguinte

    (tepe e palatais) e classe de palavras (nomes, verbos e outros).

    19 A pesquisadora no traz a frequncia geral de uso de /ej/, apenas a taxa de /ej/ em relao a /ow/.

  • 30

    Para a pesquisadora, as variveis sociais no so condicionantes para do glide do

    ditongo /ej/, ou seja, os condicionantes do processo de apagamento so de ordem estrutural.

    Os resultados alcanados na pesquisa levaram a autora constatao de que a supresso do

    glide foi praticamente categrica diante de palatal e tepe.

    Farias (2008) investigou a variao do ditongo [ej] na fala do Estado do Par,

    partindo de uma amostra constituda por dados extrados de questionrios do ALiB (Atlas

    Lingustico do Brasil)20. Ao todo, foram utilizados 20 informantes, sendo dez homens e dez

    mulheres, estratificados de acordo com o sexo, a faixa etria (1 e 2), o grau de escolaridade

    (ensino fundamental e ensino superior) e a localidade (Belm, Bragana, Soure e

    Jacarecanga).

    Foram selecionados oito informantes da Capital, Belm, e quatro de cada uma das

    outras cidades. Os condicionadores lingusticos analisados foram: segmento fontico seguinte,

    tonicidade da slaba, estrutura silbica da palavra, posio do ditongo na palavra e classe de

    palavra que contm o ditongo. Do total de 869 dados, 58% pertencem monotongao de

    21. Das variveis controladas, a mais relevante reduo do ditongo foi o segmento

    seguinte ao ditongo (tepe e oclusiva velar sonora).

    Tambm exercem papel importante no condicionamento da regra: o tamanho da

    palavra (polisslabos e trisslabos, principalmente o primeiro), posio do ditongo no interior

    da palavra (meio), classe de palavra (adjetivo e substantivo). Os fatores sociais favorecedores

    da monotongao foram: a escolaridade (nvel fundamental) e a localidade (Bragana e Soure,

    principalmente, a primeira) mostraram-se favorecedoras do processo, enquanto o sexo

    (masculino) e a faixa etria (jovens) apresentaram resultados pouco significativos.

    Brescancini (2009) investigou a monotongao dos ditongos decrescentes

    seguidos por fricativa em coda na comunidade de Florianpolis. Para isso, utilizou uma

    amostra de 48 informantes do VARSUL, 22 homens e 26 mulheres, distribudos pelas faixas

    etrias (15-20 anos, 25-40 anos, 41-60 anos, 61 anos ou mais) e anos de escolarizao (0-5

    anos, 6-9 anos, 11 anos, 14 anos ou mais).

    Os fatores lingusticos testados foram: a posio do /S/ no vocbulo: final absoluta

    ou final diante de vocbulo; contexto seguinte ao /S/ (coronal, labial, dorsal ou zero);

    20 Em 1996, teve incio o Projeto Atlas Lingustico do Brasil (ALiB), cujo objetivo a descrio do portugus no

    Brasil, a partir dos dados de 250 pontos de inquritos de vrias partes do pas. A estratificao dos informantes

    se d de forma homognea de acordo com a faixa etria (1. De 18 a 30 anos e 2. de 50 a 65 anos de idade) e o

    sexo (masculino e feminino). Nas capitais, a varivel escolaridade possui 08 informantes, sendo 04 com nvel superior e 04 com grau fundamental, j nos outros municpios, so 04 respondentes, todos de nvel fundamental. Os questionrios ainda esto sendo aplicados aos informantes dessas cidades brasileiras. (FARIAS, 2008). 21 Forma de apresentar o ditongo da autora.

  • 31

    sonoridade da fricativa ([+ voz], [- voz]); papel morfolgico do /S/ (parte do radical, flexo

    nominal, flexo verbal). Do total de 875 ocorrncias obtidas com o auxlio do programa

    computacional Varbrul 2S, a reduo do ditongo diante de /S/ no aoriano-catarinense ocorre

    em 27%, dos dados, ao passo que 73% so de manuteno da regra.

    Os resultados revelaram como estatisticamente relevantes pelo programa as

    variveis: papel morfolgico do /S/ (flexo verbal) e sexo (feminino). Para a autora, tal

    resultado parece indicar que, embora a fricativa palato alveolar favorea a reduo do ditongo

    que a antecede, h de fato outros condicionamentos estruturais e lexicais que intervm no

    processo, ou seja, a reduo do ditongo decrescente diante de /S/ um processo condicionado

    lexicalmente, mas que ainda denota resqucios de condicionamento estrutural,

    especificamente o de cunho morfolgico. Quanto ao sexo, tanto para homens quanto para

    mulheres, h ausncia de correlao entre reduo e prestgio.

    Santos e Chaves (2010) pesquisaram sobre a monotongao dos ditongos /ey/ e

    /ow/ por meio de questionrio especfico de entrevista aplicado na zona urbana do Municpio

    de Plcido Castro, no Acre. A amostra foi constituda por 33 informantes, distribudos

    segundo o sexo (masculino e feminino), a faixa etria (de 20 a 45 e de 46 a 74 anos) e a

    escolaridade (nveis fundamental, mdio e superior). As variveis estruturais observadas

    foram:

    a) modo ou maneira de articulao da consoante seguinte;

    b) ponto de articulao da consoante seguinte;

    c) nmero de slabas das palavras em que ocorre o ditongo;

    d) tonicidade da slaba em que o ditongo se encontra e a ambincia pr-voclica

    do ditongo /ey. O corpus foi composto por 1.501 produes, das quais 519

    foram de [ey], tendo sido eliminado 1 vocbulo contendo /ey/ por ser

    inadequado para os objetivos da pesquisa.

    Do total das ocorrncias de /ey/, com todos os contextos correlacionados, 55%

    foram de favorecimento da monotongao, contra 45% de realizao do ditongo.

    So fatores favorecedores da reduo de [ey]:

    a) quanto ao modo e ao ponto de articulao, o tepe, aps o ditongo, o maior

    favorecedor da regra; e

    b) quanto ao nmero de slabas da palavra em que ocorre o ditongo, os vocbulos

    polisslabos tambm atuam no sentido de condicion-la.

    As autoras constatam que o apagamento de [j] parece no ser alvo de motivaes

    de natureza social e concluem que o fenmeno condicionado por fatores internos.

  • 32

    Toledo (2011) investigou a regra de monotongao de [ej] na fala da cidade de

    Porto Alegre RS, com esteio na seleo de 14 informantes de nvel superior, oito homens e

    seis mulheres do banco de dados do Projeto NURC (Projeto de Estudo da Norma Lingustica

    Urbana Culta)22, entrevistados nos anos de 1970 e recontatados no final de 1990 pelo Projeto

    VARSUL.

    A amostra, que de recontato, foi estratificada segundo as variveis sociais sexo

    (masculino e feminino) e idade (A: 20-29 anos (NURC); 47-56 anos (VARSUL) B: 30-39

    anos (NURC); 57-66 anos (VARSUL) C: 40-49 anos (NURC); 67-76 anos (VARSUL) D:

    mais de 50 anos (NURC); mais de 77 anos (VARSUL). Do total de 28 entrevistas, foram

    coletados 179123 dados (760 do Projeto NURC e 1031 retiradas do Projeto VARSUL), dos

    quais apenas 667 (37%) favoreceram a monotongao de [ej].

    Os fatores lingusticos favorveis a monotongao de [ej] no sul do Brasil foram:

    o contexto fonolgico seguinte (tepe e fricativa palatal), constituindo-se o principal motivador

    da reduo do ditongo; a natureza morfolgica (radical) e a classe de palavra (no verbos).

    Para o autor, nenhum fator social favoreceu a regra e, ao comparar os dois bancos de dados,

    constata que no h indcio de mudana lingustica em progresso referente reduo de [ej],

    concluindo que o fenmeno analisado um caso de variao estvel. Aps essas anlises, o

    autor comparou os seus resultados aos estudos de Cabreira (1996) e Amaral (2005),

    concluindo que estes trabalhos convergem parcialmente.

    Arajo (2013) tratou do comportamento varivel do ditongo [ej] para as capitais

    brasileiras da Regio Norte (Manaus, Belm, Macap, Boa Vista, Porto Velho, Rio Branco) e

    Sul (Curitiba, Florianpolis e Porto Alegre) do Projeto Atlas Lingustico do Brasil (ALiB). A

    amostra, estratificada em funo: da faixa etria (I 18 a 30 anos e II- 45 a 60 anos), sexo

    (masculino e feminino), escolaridade (at a 8 srie do fundamental e ensino superior),

    constituda por 56 informantes, oriundos destas nove capitais.

    De cada uma destas localidades, foram coletados dados de oito informantes.

    Foram analisados, do Questionrio Fontico-Fonolgico (QFF) do ALiB, os seguintes itens

    lexicais: prateleira, travesseiro, torneira, peneira, manteiga, teia, peixe, prefeito, bandeira,

    22 Em 1969, comeou a ser desenvolvido em cinco capitais brasileiras (Porto Alegre, So Paulo, Rio de Janeiro,

    Recife e Salvador), o projeto Norma Lingustica Urbana Culta (NURC), com o objetivo de descrever o falar

    culto brasileiro. Com um total de 1870 gravaes de 1570 Horas, o corpus, constitudo por informantes com

    nvel superior completo e est estratificado de acordo com as variveis sociais: monitoramento estilstico

    (Dilogo entre Dois Informantes, Dilogo entre Informante e Documentador e Elocuo Formal), faixa etria

    (22-35 anos, 36-55 anos e 56 anos ou mais) e sexo (masculino e feminino). (TOLEDO, 2011). 23 A frequncia de Toledo (2011) no grfico 1 engloba o total dos dois corpora, por ser amostra composta dos

    mesmos informantes reduplicados.

  • 33

    correio, companheiro, peito, meia e beijar. Foram realizadas duas anlises: a primeira,

    composta de 956 ocorrncias, das quais apenas 377 demonstram a variante monotongada.

    A segunda rodada resultou em 825 ocorrncias, das quais 377 foram

    monotongadas. Os grupos de fatores controlados neste trabalho foram: contexto fonolgico

    seguinte, tamanho da palavra, sonoridade do segmento seguinte, sexo, escolaridade, faixa

    etria e localidade. A reduo do ditongo [ej] recebe interferncia dos seguintes fatores:

    contexto fonolgico seguinte (o tepe), escolaridade (os menos escolarizados), localidade

    (Florianpolis e Manaus) e sexo (homens). Os resultados obtidos indicam que a reduo do

    ditongo [ej] um caso de variao estvel nessa amostra.

    A seguir, no grfico 1, est a frequncia geral do uso de /ej/ dos estudos reunidos

    neste captulo que nos forneceram os percentuais de aplicao e no aplicao da regra

    varivel.

    Grfico 1 Frequncias gerais do uso de /ej/ e /e/ nos estudos variacionistas

    Fonte: elaborado pelo autor

    Com esse panorama, possvel observar como o fenmeno se comportou nos

    ltimos 30 anos em mbito nacional. Esses resultados preliminares confirmam que a

    supresso de [j] configura um caso de variao estvel, embora Veado (1983) tenha

    demonstrado haver uma mudana lingustica em curso que favorece a queda do glide, j que

    em seu estudo a regra categrica, com 99% de monotongao.

    Os resultados posteriores, contudo, como os de Ribeiro (1990), Silva (1997),

    Arajo (1999), Arajo (2000), Lopes (2002) e Santos e Chaves (2010) divergem da

  • 34

    constatao de Veado (1983) e mostram que h uma disputa entre a aplicao da regra

    varivel e a manuteno do ditongo, com percentuais variando de 61% a 68%, em favor da

    aplicao da regra, ao passo que as taxas de Lopes (2002) e Santos e Chaves (2010) revelam

    uma disputa mais acirrada entre as duas variveis, tendo o primeiro estudo um percentual de

    54% de monotongao contra 46% de manuteno do ditongo,

    J os resultados das outras cinco pesquisas demonstram percentuais que

    desfavorecem a queda do glide, como pode ser conferido ainda no grfico 1, com: Cabreira

    (1996) 68%, Amaral (2005) 67%, Brescancini (2009) 73%, Toledo (2011) 63% e

    Arajo (2013) 54%. Destaca-se a noo de que o estudo de Toledo (2011) foi produzido

    com amparo em amostras de recontato dos bancos de dados do NURC E VARSUL e os

    percentuais obtidos formam o somatrio das duas amostras.

    Em relao ao trabalho realizado por Arajo (2013), sobre a conduta de /ej/ nas

    regies Norte e Sul do Brasil, com suporte nos dados do ALIB, de nove capitais, o ditongo se

    mantm resistente na batalha, embora a diferena de uso seja apenas de 8% tambm, mas em

    favor do ditongo, ao contrrio do que aconteceu em Lopes (2002).

    A reviso da literatura do estudo sob relatrio serviu para reunirmos as nossas

    variveis, alm de nos proporcionar uma viso panormica do fenmeno em estudo no

    Territrio Brasileiro. Tambm vimos que os grupos mais relevantes para a monotongao

    foram: contexto fontico seguinte (tepe e palatais) como confirmados por Lopes (2002), Faria

    e Oliveira (2003), Silva (2004), Carvalho (2007), Farias (2008) e Toledo (2011); extenso do

    vocbulo (disslabos e trisslabos), por Ribeiro (1990), Paiva (1996), Arajo, A. (2000), Farias

    e Oliveira (2003) e Farias (2008); localizao do ditongo na estrutura morfologia da palavra

    (radical), por Cabreira (1996) e Toledo (2011); classe de palavras (no verbos), por Amaral

    (2005) e Toledo (2011); escolaridade (baixo nvel escolar), por Coelho e Naumann (1994),

    Cabreira (1996) e Arajo, M. (1999); faixa etria (mais jovens) por Amaral (2005) e sexo

    (homens) Arajo, A. (2000), Arajo (2013).

    O conhecimento destas pesquisas propiciou-nos melhor entendimento sobre a

    regra em foco, demonstrando-nos que tanto fatores lingusticos quanto sociais influenciam na

    aplicao da monotongao e tambm nos revelou a carncia de um estudo descritivo sobre a

    regra na fala popular do fortalezense. Com base nisto e no intuito de contribuir com a

    descrio do portugus atual, este experimento teve como objetivo principal descrever e

    analisar, com base na Sociolingustica Variacionista (LABOV, 2008), a realizao varivel do

    ditongo oral decrescente /ej/ no falar popular do habitante de Fortaleza, cuja contribuio

  • 35

    cientfica desta pesquisa se mostra no desvelamento de como ocorre a monotongao do

    ditongo citado na norma popular da Capital cearense.

    A seguir, na Figura 1, encontra-se a distribuio dos estudos variacionistas no

    Territrio Brasileiro selecionados para esta pesquisa.

    Figura 1. Distribuio dos estudos variacionistas no Territrio Brasileiro.

    No captulo seguinte, delineamos a teoria que embasou as pesquisas referidas em

    nossa reviso de literatura e consequentemente serviu de pilar para fundamentar esta pesquisa

    de base variacionista.

    Estudo comparativo: Arajo (2013)

    Regio Norte

    Farias e Oliveira (2003); Santos e Chaves

    (2010); Lopes (2003); Farias (2008).

    Regio Nordeste:

    Arajo, M. (1999),

    Arajo, A. (2000), Silva

    (2004) e Carvalho (2007).

    Regio Sudeste

    Veado (1983); Paiva

    (1996); Silva (1997).

    Regio Sul

    Bisol (1994), Coelho; Naumann (1994), Amaral (2005) e Brescancini (2009);

    Meneghini (1983); Ribeiro, (1990);

    Cabreira (1996); Pereira (2004) e Toledo

    (2011).

    Regio Sudeste

    Veado (1983); Paiva

    (1996); Silva (1997).

  • 36

    3 A TEORIA DA VARIAO E DA MUDANA LINGUSTICA

    O conceito de variao/mudana lingustica mais bem compreendido, ao

    fazermos um breve histrico das vises de lngua que a Lingustica j viu desfilar em seu

    campo. A Lingustica se estabelece como cincia, ao ter seu objeto de estudo e mtodo

    investigativo pelo pesquisador suo Ferdinand de Saussure, do final do sculo XIX ao incio

    do sculo XX, o qual delimitou o objeto, a lngua e desenvolveu um mtodo de investigao

    lingustica, o estruturalismo. Como resultado desses estudos de Ferdinand Saussure e marco

    da Lingustica como cincia, em 1916, foi publicado o Curso de Lingustica Geral, pelos

    alunos do autor Bally e Sechehave, tornando-se um modelo terico reproduzido por vrias

    correntes durante dcadas.

    Saussure (2009) tinha como objeto de investigao a lngua dos membros de uma

    comunidade lingustica, independentemente da pessoa e abstrada da sua existncia histrico-

    social, sendo estudada como algo homogneo, pois no era a lngua falada no dia a dia, ou

    seja, a lngua real. Em seu legado, o Linguista suo props a distino entre langue (lngua) e

    parole (fala). A primeira, unitria e homognea, a parte essencial para a Lingustica,

    contrapondo-se segunda, a fala (varivel e heterognea), manifestada como linguagem

    individual e, consequentemente, recheada de variao. Saussure (2009) props a segunda

    dicotomia: sincronia vs. diacronia. Desta forma, o Pesquisador v a lngua como abstrao em

    que ela imobilizada num certo momento, opondo-se ideia de considerar as suas mudanas

    ou sua histria.

    Saussure, ao explicitar o seu recorte metodolgico, o delimita e o define, clara e

    objetivamente, idealizando-o ao mesmo tempo em que o cria. Na sua abordagem, percebe-se

    que a lngua apresentada como uma essncia em que h a subordinao do objeto a uma

    determinada perspectiva metodolgica. A metodologia saussureana de distino da lngua da

    fala, separa o que geral e social do que particular e, exclusivamente, individual. Essa

    inequvoca idealizao, complementada na noo de sistema de relaes, que cria um objeto

    cientfico, ao mesmo tempo em que possibilita separar o essencial, prprio da lngua, do que

    acessrio e acidental, prprio da fala, os chamados aspectos externos, Saussure cria um objeto

    de estudos de natureza estritamente lingustica, a langue, como o objeto da Cincia

    Lingustica.

    Para Saussure, a langue constitui-se como um sistema de signos valioso e

    essencial, por ser homognea e social, que vai se acumulando no crebro dos falantes com

    procedncia das suas prticas da fala, diferente da parole que heterognea, acessria e

  • 37

    acidental, sendo um ato individual de vontade, consistindo em uma manifestao concreta da

    langue.

    Alm dos estudos pioneiros do Genebrino sobre a langue, outro linguista que

    buscou demonstrar que a pessoa j nasce dotada de estruturas mentais que sustentam a

    competncia para o desempenho lingustico foi Chomsky (1980), pesquisador estadunidense,

    ainda nos anos 1950, inspirado no racionalismo e na tradio lgica dos estudos da

    linguagem. Ele exprime uma teoria a que chama de Gramtica, cuja funo no ditar regras,

    mas envolver todas as frases gramaticais que pertencem lngua.

    dessa maneira que surge a Gramtica Gerativa, uma gramtica universal, com

    escopo na qual, por meio de estruturas cognitivas, as pessoas concebem a estrutura da lngua

    (qualquer lngua) e assim a aquisio da linguagem acontece. Nesse sentido, os estudos da

    linguagem parecem ainda enfocar o inatismo24.

    Na verdade, a obra de Chomsky, embora tenha sido intitulada de gerativista (gerar

    criar frases) porque permite, desde um nmero limitado de regras, ensejar um nmero

    infinito de sequncias, no se afastou do estruturalismo, haja vista o estudo das estruturas de

    superfcie e bases profundas, ou seja, estudo da sintaxe e exame da semntica das lnguas.

    Chomsky retoma a dicotomia saussureana langue x parole, quando distingue competence x

    performance, por considerar a competncia o conhecimento lingustico interiorizado por um

    falante ideal, oriundo de uma comunidade de fala homognea, negando, ento, que neste

    objeto de estudo da Lingustica seja observada a linguagem dentro da sociedade.

    Portanto, mesmo com ideias que o levaram a ser reverenciado em mbito

    acadmico como o pai da Lingustica moderna, a relao entre sistemas heterogneos ainda

    no havia ocorrido, se levadas em conta a histria da lngua amplamente, a interao do seu

    processo constitutivo e a sociedade, as ideologias e a cultura. Um sistema heterogneo,

    constitudo por unidades e regras variveis, um mecanismo (modelo) da Sociolingustica

    24 O inatismo uma concepo psicolgico-filosfica, defendida pelo linguista Noam Chomsky nos anos de 1950 (1980) sobre o desenvolvimento da linguagem com objetivo de explicar as manifestaes lingusticas

    decorrentes dos primeiros anos de vida. Na sua tese, Chomsky (1981) afirma que o ser humano dotado de uma

    gramtica inata, nascendo programado biologicamente para determinados conhecimentos e que assinala que as crianas possuem um dispositivo de obteno da linguagem conatural (DAL) que ativado com trabalhos que

    vem a partir de sentenas (input), e que a gramtica deriva da lngua na qual as crianas esto expostas.

    Chomsky defende a existncia da mente e argumenta que que para se explicar e entender como ocorre dado

    processo de aquisio da linguagem necessrio ir alm dos mecanismos fisiolgicos; assim, a linguagem no

    resultado da conveno, mas uma caracterstica da herana gentica humana. Para mais informao consultar:

    CHOMSKY, Noam. Reflexes sobre a linguagem. Lisboa: Edies 70, 1975.

    . Regras e representaes. Rio de Janeiro: Zahar, 1981.

    ______. O conhecimento da lngua: sua natureza, origem e uso. Trad. de A. Gonalves e A. T. Alves. Lisboa:

    Editorial Caminho, 1994. v.2. (Original publicado em 1986).

    ______. Aspects of the theory of sintax. Cambrige, Massachussetes: M.I.T Press, 1965.

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    para formalizar analiticamente os estudos dos padres de comportamento lingustico

    observveis ocorrente em uma comunidade de fala. Seu objetivo buscar respostas referentes

    mudana lingustica e que tem base em dois princpios tericos fundamentais:

    a) para desempenhar plenamente as suas funes, tanto a comunidade quanto o

    sistema lingustico que a serve devem ser heterogneos e plurais, o que os

    difere com a abordagem tradicional de identificao entre funcionalidade e

    homogeneidade; e

    b) a variao ocorrida em cada momento nos padres de comportamento

    lingustico observados em uma comunidade de fala que atualizam os

    processos de mudana que se verificam nessa comunidade, ressaltando-se que

    se ocorrer variao (cf. LABOV, 1972, 1974 e 1982 e 1994; e WEINREICH,

    LABOV e HERZOG, 1968). LABOV, 1972, 1974 e 1982 e 1994; e

    WEINREICH, LABOV e HERZOG, 1968) motivada por mudana, a variao

    no implica necessariamente mudana em curso.

    Estudos sociolingusticos variacionistas tm como interesse central descrever, de

    modo fundamentado e estatisticamente, um fenmeno varivel, para analisar, apreender e

    sistematizar variantes lingusticas usadas por uma comunidade de fala. Para isto, toma em

    considerao a influncia de fatores, interno ou externo ao sistema lingustico, que tem uma

    ou outra variante. Pela anlise de variveis sociais, a Sociolinguista intenta definir o quadro

    de variao observado em uma comunidade de fala, identificando a dicotomia entre variao

    estvel e mudana em progresso.

    Embora tal heterogeneidade no tivesse surgido ainda, Coelho (2007) argumenta

    que uma das grandes preocupaes do Crculo Lingustico de Praga (de 1926) era o de

    relacionar os estudos das funes da lngua com a sociedade, objetivando dar mais solidez

    compreenso fictcia que os estruturalistas/gerativistas tinham da lngua, ou seja, um conceito

    de lngua mais relacionado com sua funo social, seu funcionamento real e a sua existncia

    concreta.

    Sendo assim, o avano nos postulados estruturalistas de lngua da poca urgia,

    passando ao binmio lngua e sociedade, sinalizando assim que a Lingustica comeava a se

    preocupar com a lngua em uso, ou seja, com as manifestaes dela em sociedade e, sendo

    esta ltima, objeto de interesse da Sociologia, a ligao entre essas duas reas nos anos de

    1950 e 1960 deu origem Sociolingustica, ramo da Lingustica que se interessa pelas

    relaes entre as variaes da lngua e as sociolgicas (COELHO, 2007).

  • 39

    Considera Coelho (2007) ser nesse momento que a mudana25 retoma o seu lugar

    dentro da Lingustica, pois a Escola de Praga contribuiu muito para isso, desenvolvendo uma

    teoria estrutural para a diacronia, buscando superar assim o postulado saussureano da

    incongruncia: histria X estrutura.

    Um dos estudiosos que tenta conceituar e definir a Sociolingustica nesse perodo

    foi William Bright (1966), quando ministrou uma conferncia nos Estados Unidos, em maio

    de 1964, na Universidade de Los Angeles (UCLA), ao defender um trabalho sob o ttulo

    Sociolinguistics. Nessa poca, o californiano se encarrega da publicao das atas dessa

    reunio, que contou com a presena de William Labov, Dell Hymes, John Gumperz, Charles

    Ferguson, entre outros, todos unidos pela vontade generalizada de oferecer a alternativa ao

    crescente prestgio e predomnio mundial de uma Lingustica cada vez mais formal,

    representada pelas pesquisas de Chomsky (SALOMO, 2011).

    Foi nesse contexto que Bright buscou formalizar e sintetizar uma escola terica

    sociolingustica, cujo objeto de estudo a diversidade lingustica26, em que fatores

    condicionantes esto relacionados identidade social27 do falante, identidade social do

    destinatrio e ao contexto.

    Apesar do esforo de Bright, contudo, em delimitar o campo de atuao da

    sociolingustica, suas teorias tiveram menor impacto do que as pesquisas desenvolvidas por

    25 Mudana lingustica diz respeito a conceitos tericos sobre os diversos processos pelos quais mudam os

    elementos e sistemas lingusticos na dimenso diacrnica e que indicam haver trs diferentes formas de

    desequilbrio ou rupturas da continuidade lingustica a substituio de uma variedade, a unio de variedades e a

    ciso de uma variedade. A teoria da mudana lingustica trata das condies gerais da estrutura para que a

    mudana inerente ao sistema possa se realizar, do processo de transio com suas fases intermedirias, do

    encaixamento de uma inovao no sistema lingustico e no contexto sociolingustico, da importncia da

    avaliao para o processo de generalizao das variaes e da anlise do problema de como se inicia um

    processo de mudana. 26 Os termos variao lingustica ou diversidade lingustica, introduzidos na literatura lingustica,

    principalmente a partir da dcada de 1960 e que se constituram em objeto de estudo da Sociolingustica,

    definida [...] como o fenmeno que envolve mltiplos e concomitantes usos de formas com o mesmo significado lingustico, marcado por diferentes significados sociais, segundo o contexto em que ocorrem

    (COSTA, 2012 p.5), com base no conceito de variao Consequncia da propriedade da linguagem de nunca ser

    idntica em suas formas atravs da multiplicidade do discurso (COSTA, 2012 p.5). Mais detalhes ver:

    COSTA, Catarina de Sena Sirqueira Mendes da. Variao/diversidade lingustica, oralidade e letramento:

    discusses e propostas alternativas para o ensino de lngua materna. In: SIELP. Anais do... Uberlndia: EDUFU,

    2012. v.2, n. 1.Disponvel em:

    http://www.ileel.ufu.br/anaisdosielp/wpcontent/uploads/2014/06/volume_2_artigo_062.pdf 27 A identidade uma relao social cuja definio - discursiva e lingustica - est sujeita a vetores de fora, a

    relaes de poder. Ochs (1996, p. 289) define identidade social, como um termo que pode abranger uma

    gama de personas sociais que um indivduo pode reclamar para si ou atribuir aos outros ao longo da vida, no

    sendo, portanto, fixa nem categrica, pois um indivduo pode evidenciar aspectos diferentes de sua identidade

    social, como faixa etria, sexo, profisso etc., dependendo com quem se est interagindo e da situao comunicativa na qual se encontra.

    http://www.ileel.ufu.br/anaisdosielp/wpcontent/uploads/2014/06/volume_2_artigo_062.pdf

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    Labov, pois, ao persistir na inovao, formulou apenas vagas ideias sobre a relao entre

    lngua e sociedade e concebe a Sociolingustica como uma abordagem subordinada aos

    fatores da lngua, que viria apenas complementar a Lingustica ou a Sociologia e a

    Antropologia, mas esta subordinao foi aos poucos sendo superada por Labov.

    Em 1961, o pesquisador de Nova Jersey, William Labov, aps dez anos

    trabalhando como qumico, decidiu investigar sobre a lngua inglesa e retornou

    universidade, onde percebeu, ao se aproximar da Lingustica, que os pesquisadores da rea

    tiravam das suas cabeas os resultados de suas pesq