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A IMPORTÂNCIA DO RESGATE DA HISTÓRIA LOCAL NAS ESCOLAS

PÚBLICAS DE SANTA HELENA: a passagem da Coluna Prestes por Santa Helena

Velha

Autor: Célio Pinto De Oliveira1

Orientadora: Edina Rautenberg2

Resumo

O presente artigo trata sobre o trabalho do educador frente a questões históricas que envolveram a comunidade de Santa Helena, município do oeste paranaense, por ocasião da passagem da Coluna Prestes, movimento desencadeado pelo descontentamento de militares em relação ao privilégio dado às oligarquias agrárias, em detrimento da classe trabalhadora, cada vez mais explorada. Em agosto de 1924, a Coluna chega ao oeste paranaense e ali permanece por cerca de oito meses. Em Santa Helena, sua relação com as famílias ali instaladas não é das melhores. Essa visão negativa permanece até hoje, mas a maioria dos moradores transmite essa negatividade sem mesmo conhecer o que foi o movimento em questão e qual sua importância no cenário político do país. O trabalho com os educandos da Escola Estadual Graciliano Ramos objetivou esclarecer sobre o fato histórico e levá-los a buscar nos acervos do município dados mais particulares a respeito, ou seja, a visão dos moradores, para fazer um contraponto com a versão oficial constante nos livros didáticos.

Palavras-chave: Coluna Prestes; Educandos; Resgate da história local.

1 Professor de História da Rede Pública Estadual de Educação, incluso no Plano de Desenvolvimento Educacional (PDE) do Estado do Paraná.

2 Professora Orientadora. Mestre em História pela UNIOESTE. Destacamos que o trabalho de PDE iniciou sob a orientação do professor Marcos Smaniotto, sendo concluído com o auxílio da professora Edina.

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1 A importância de se discutir a história nas escolas

Para se construir como sujeito histórico há que se aprender sua própria

história por meio da memória registrada pelos antepassados, repassada por meio de

registros escritos ou mesmo pela cultura oral, e aprender a intervir na própria

realidade, fazendo parte da construção histórica da comunidade e, ao mesmo

tempo, construindo-se historicamente.

Segundo Fábio Pestana Ramos (2010, p. 1) a história só pode ser concebida

como resultado de sujeitos históricos, percebida através da trama traçada pelas

relações sociais no tempo, envolvendo as ações dos indivíduos. Assim, o sujeito

histórico não estaria presente nas ações individuais, mas, ao contrário, estaria

configurado a partir das inter-relações complexas e contraditórias.

As escolas brasileiras, nos anos finais do ensino fundamental, para o sexto ao

nono anos, o conteúdo nos livros de História é generalizante; trata-se dos mesmos

registros para todas as regiões. Assim, não se oferece aos educandos uma

discussão sobre a realidade local, sobre um segundo ponto de vista acerca de fatos

históricos marcantes, dos quais a sua localidade teria participado. Convivendo com a

comunidade de Santa Helena – PR, percebe-se que o tema Coluna Prestes tem

parca divulgação junto aos moradores novos e mesmo entre os mais antigos do

município. No decorrer da história, a comunidade foi repassando, sobre o

acontecimento histórico em questão, conceitos negativos, os quais foram difundidos

como um fato sobre o qual não há de que se orgulhar.

Desta forma, entendeu-se como necessário construir um estudo que

mostrasse a Coluna Prestes com maior clareza, destacando-a como um episódio

histórico de repercussão nacional, com seu valor político.

Nesse sentido é que se propôs a investigação, com alunos do ensino

fundamental, do 9º ano, da Escola Estadual Graciliano Ramos, de Santa Helena –

PR, sobre a passagem da Coluna Prestes pela chamada Santa Helena Velha, hoje

município de Santa Helena, localizado no oeste paranaense.

Segundo Le Goff (1992), a palavra história vem do grego antigo historie,

forma que deriva da raiz que indica ver e procurar. Procurar para ver e dar

significação constituiu-se no objeto de estudo e aplicação da unidade didática A

Coluna Prestes em Santa Helena Velha: Memórias e Conflitos, pois muitos dos

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moradores de Santa Helena, dentre eles alunos da escola pública aqui apontada,

aludem ao fato, sobre o qual tomaram conhecimento através de narrativas orais de

pais ou avós.

O projeto, portanto, não se dispôs a provar cientificamente se os locais por

onde passou a Coluna Prestes pertenciam ao espaço em que hoje é o município de

Santa Helena, mas sim pretendeu abordar a questão para resgatar a memória

coletiva dos moradores, relacionando-a aos dados históricos registrados.

O trabalho de pesquisa e aplicação colocou cada educando na condição de

pequeno pesquisador, visto que se buscou levantar os registros no acervo municipal

e também entrevistar descendentes das testemunhas do fato histórico aqui

abordado.

Nesse sentido, quando da participação no Plano de Desenvolvimento

Educacional (PDE), formação implementada pela SEED – PR, é que ocorreu a ideia

de se discutir sobre a Coluna Prestes, pois é inquietante como os moradores do

município de Santa Helena comentam sobre a negatividade do fato histórico aqui

abordado sem conhecer detalhes importantes a ele relacionados. Nesse sentido, as

inquietações partiram de um indivíduo, no caso o professor, que suscitou o coletivo,

a turma de alunos.

Sobre a passagem da Coluna Prestes por Santa Helena Velha já se

produziram pesquisas e foram publicadas obras, demonstrando que a inquietação

vem de longa data.

Na disciplina de História é importante o diálogo do presente com o passado.

Como seres históricos que somos, e porque muitos não têm consciência deste fato,

é que cabe ao educador suscitar o estudo, na contemporaneidade, da história que

nos antecedeu. No caso do fato histórico aqui suscitado, que marcou a realidade

local, é importante que se trabalhe para que se saiba o que e como aconteceu,

principalmente para desmitificar algumas colocações equivocadas. Isto não significa

que no projeto implantado só se valorizou a versão oficial, constante nos livros

didáticos e outros específicos, mas sim se propôs um diálogo entre as duas fontes.

Nesse sentido, colaboram as palavras de Marcelo Badaró Mattos (1998):

[...] de um lado, o historiador, no processo cognitivo, procura explicações racionais, objetivando o conhecimento verdadeiro de um dado período ou problema histórico. Por outro lado, ao formular os problemas, ao escolher os

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períodos e os temas, atua também intervindo na vida social do mundo que lhe é contemporâneo. (MATTOS, 1998, p. 36).

O trabalho do educador, levando em conta seu papel social, é despertar seus

educandos para a pesquisa, não somente repassar dados específicos resumidos e

datas exatas, como número de mortos nos combates, quem os venceu, quando,

suas possíveis causas, heróis das guerras, dentre outros.

Segundo Graziela Rollemberg (2009, p.27),

[...] tanto no campo como na cidade, as tradições e o dia a dia das pessoas se transformaram ao longo do tempo, entretanto, apesar das mudanças, ainda convivemos com elementos típicos do passado e, portanto, é preciso conhecê-lo.

Os educandos por si sós não procuram saber o passado histórico, visto que

vivem no imediatismo, absorvem a cultura de massa e colocam como prioridade seu

prazer material, imediato. No entanto, se estimulados pelo educador, podem

produzir conhecimento, podem aprender, discutir e dar novo sentido àquilo que só

liam e estudavam para saber na avaliação, para depois esquecer.

2 Breve histórico do Tenentismo e da Coluna Prestes

Na década de 1920, período em que nasce e se desenvolve a chamada

Coluna Prestes, o Brasil era dominado pelos coronéis da chamada República Velha.

Nessa época, já se desenvolvia a ordem capitalista no Brasil, que perpassou

a transição da Monarquia para a República. Essa ordem capitalista estava baseada

num novo conceito de trabalho, por meio do qual se buscava o lucro desenfreado,

extraindo o máximo da capacidade física do trabalhador para o enriquecimento

rápido do patrão e da elite burguesa. Conforme consta em Colodel (1998, p. 120):

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Começam a cair por terra as mentiras sobre as mudanças em benefício do povo. Estava claro para a sociedade brasileira que „o Império havia apenas sido derrubado, enquanto regime propriamente dito, mas o Brasil ainda era regido pela mesma elite dominante que a havia conduzido o processo do período Monárquico‟.

A República que se instaurara baseava-se, segundo Sônia Regina Mendonça

(1990, p. 229), em uma “democracia e liberalismo excludente”, que, ao invés de

propiciar uma melhoria das condições de vida da população, privilegiou, no campo, a

existência das oligarquias.

Conforme palavras de Victor Nunes Leal (1975, p. 63) “as oligarquias

consistiam numa minoria composta por donos de terras (coronéis) e governantes,

que controlavam hegemonicamente o poder no Brasil durante a República Velha”.

A política oligárquica tinha como sustentação a estrutura agrária, se

caracterizando pelo compadrismo, pela troca de favores, pelo pacto e pela proteção

entre governos estadual e federal para com as oligarquias locais; os coronéis

organizavam e mandavam em tudo, especialmente no processo político,

vergonhoso, do voto de cabresto, que consistia na cedência do Estado, ao coronel,

de “carta branca” para atuar em sua região; este, por sua vez, além de sempre

reforçar a figura presidencial em tempos eleitorais, retribuía os favores com os votos

conquistados por ele. Assim, o poder governamental ia se perpetuando com a

sucessão alternada da Política do Café-com-leite, entre lideranças de São Paulo e

Minas Gerais, com o apoio de oligarquias de outros estados.

Nas cidades, a industrialização crescia, a mão-de-obra assalariada era

explorada ao máximo, sem leis trabalhistas que defendessem os trabalhadores. O

Estado procurava não intervir nas relações patrão e empregado, mas não deixou de

exercer a sua função policial, através dos seus aparelhos repressivos, no sentido de

proteger os interesses da burguesia industrial emergente e em detrimento das

classes trabalhadoras. Assim, com o controle social, pretendeu-se criar uma

sociedade trabalhadora, submissa, disciplinada, que produzisse mais para que os

patrões obtivessem mais lucros, conforme a ordem capitalista.

Os militares, durante a Guerra do Paraguai (1865-1870) e com a Proclamação

da República (1889), que experimentaram e participaram da vida política do país,

achavam-se ao mesmo tempo responsáveis pelas conquistas republicanas e

desprezados por esse Governo. O exército, que tinha sido um dos principais

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protagonistas do levante que instalou a República no Brasil, manteve-se durante boa

parte da conjuntura histórica da República Velha nos seus bastidores. Portanto, os

militares reivindicavam “seu lugar” no cenário político nacional, na condução do

governo. Segundo Colodel (1998, p. 140):

Esses militares apareciam, dessa maneira, como uma nova opção ideológica e de contestação dentro dos efetivos do Exército. A visão do papel que poderiam desempenhar era reforçada pela política das oligarquias que, com suas fraudes e conflitos na ânsia de tomarem o poder, eram vistas como imorais e contrárias aos interesses nacionais. As constantes crises econômicas e o processo inflacionário que recrudescia também eram alvos de críticas desses setores de militares – muitos deles provenientes das camadas médias dos centros urbanos – que se solidarizavam com os civis em seus protestos contra o altíssimo custo de vida.

Conforme Ricardo Maranhão (1989, p. 37), “os militares descontentes vão

expressar uma insatisfação em relação ao governo republicano”. Algumas de suas

reivindicações coincidem com as do operariado e classes médias urbanas,

principalmente no que diz respeito às “oligarquias como o inimigo comum”. Mas eles

não representavam nenhuma das camadas populares, não acreditavam na

capacidade dessa camada, justamente porque eram oriundos de famílias de

militares e da elite em decadência.

Os tenentes viam-se como regeneradores da sociedade, defensores da

pureza, lutavam pelo povo, pois o viam apático, inerte e espoliado, incapaz de lutar

pelos seus direitos. Segundo Ítalo Tronca (1993, p. 75), “tratava-se de uma

preocupação sincera com a miséria das massas, mas vinha carregada de uma visão

elitista que não acreditava na capacidade das mesmas massas para lutarem por

seus próprios interesses”.

Os tenentes tinham como objetivo:

Assegurar um regime leal a Constituição republicana; estabelecer em todo o país o ensino primário e a instrução profissional e técnica gratuita; assegurar a liberdade de pensamento; unificação da justiça, colocada sob a égide do Supremo Tribunal Federal; unificação do Tesouro; assegurar a liberdade municipal; castigar os dilapidadores do patrimônio público; abolir a anomalia pela qual políticos profissionais prosperam às custas do bolso dos

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cidadãos; economia rigorosa dos dinheiros públicos para dar ajuda eficiente às forças econômicas do país. (MARANHÃO, 1989, p. 38).

E, ainda, defendiam a centralização da política nacional e, conforme

Maranhão (1989, p.36), “propostas de tipo nacionalista em defesa das riquezas

nacionais contra o capital estrangeiro”. O pensamento nacionalista era mal definido,

tinha importância secundária. Reduzia-se a alguns ataques ao capital estrangeiro.

Uma das debilidades do movimento deveu-se ao fato da inexistência de um

programa claramente definido para que os tenentes pudessem se apoiar. Eles

criticavam a excessiva autonomia dos Estados (cujos governantes eram

representantes das oligarquias regionais), pregava a reforma do ensino, o sistema

eleitoral (voto secreto) e do sistema tributário, mantinham a defesa do federalismo e

se posicionavam contra a cúpula do exército, acusada de conivente com o poder

político corrupto.

Assim, surge a Coluna Prestes, em 1924, em decorrência do

descontentamento da média e baixa oficialidade militar desde os primeiros anos da

República, momento em que foram privilegiadas as altas chefias militares que se

agregaram ao governo de Hermes da Fonseca, dando apoio às oligarquias

predominantes na época. Segundo Maranhão (1989, p. 36),

Do descontentamento destes oficiais surge do que comumente chamamos de „tenentismo‟, sistema em que os „jovens „tenentes‟ atacavam a alta oficialidade, na sua maioria comprometida com o regime e considerada corrupta‟. Desse descontentamento surgem várias revoltas como é o caso da conhecida „Revolta do Forte de Copacabana‟, de 05 de julho de 1922.

Em um segundo momento, o tenentismo tenta ligar-se às políticas locais e

regionais, deixando de lado apenas a esfera militar. Com tal perspectiva, em 05 de

julho de 1924, um grupo de militares, sob a liderança do General Isidoro Dias Lopes

(escolhido entre eles), tomaram a cidade de São Paulo e ali ficaram por 22 dias.

Quando estavam cercados pelas tropas do governo, abandonaram a cidade paulista

em 27 de julho de 1924. A saída não significava o fim do movimento; estes

investiriam em outras tentativas, acabando por se instalarem no Oeste do Paraná.

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Simultaneamente, no sul, especificamente no Rio Grande do Sul, Luís Carlos

Prestes encabeçava um levante para o qual contariam, conforme Anita Leocádia

Prestes (1991, p. 118) “com o apoio dos caudilhos ligados a Assis Brasil, que

começaram a ver nos tenentes um possível aliado contra as arbitrariedades

cometidas contra os maragatos pelo governo de Borges de Medeiros”.

Ainda conforme Prestes (1991, p. 119), “em outubro de 1924 tropas de

gaúchos libertadores, os maragatos, de lenço vermelho no pescoço, incorporavam-

se às diversas unidades rebeladas” para o levante nas regiões missioneira e

serrana, juntamente com Luís Carlos Prestes, João Alberto, contando com a ajuda

do tenente coronel Juarez Távora e do tenente Siqueira Campos.

No mês de dezembro do mesmo ano, conseguindo furar o bloqueio numa

“manobra audaciosa” para despistar o inimigo, Prestes e sua Coluna Gaúcha vão

em direção ao Paraná para encontrar a Coluna Paulista. Após o encontro da Coluna

Gaúcha com a Coluna Paulista, em abril de 1925, ambas formaria a “Coluna

Prestes”, que marcharia pelo Brasil cerca de 30 mil quilômetros. Luís Carlos Prestes

convence os demais para ser adotada uma “Guerra de movimento”, estratégia já

adotada por ele desde a saída de suas tropas do Rio Grande do Sul, tendo êxito

nesta tática, pois iam conseguindo despistar as tropas legalistas que os perseguiam,

ao contrário da Coluna Paulista, que, por ter ficado vários meses no Paraná

esperando o reforço da Coluna Gaúcha, sofrera grandes baixas, como foi o caso da

conhecida “Queda de Catanduvas”, na qual os revolucionários ficaram encurralados

pelas tropas legalistas, perdendo muitos soldados.

Temendo novas represálias por parte do inimigo, o alto comando

revolucionário se reuniu na cidade de Foz do Iguaçu, em 12 de abril de 1925, para a

tomada de decisões urgentes com relação ao futuro da marcha.

Na passagem pelo Mato Grosso, a Coluna deparou-se várias vezes com os

inimigos, enfrentando-os, despistando-os ou recuando, pois, consoante Prestes

(1991, p. 188), “Prestes era estratégico em suas ações e considerava necessário

saber recuar no momento certo, evitando, assim, maiores perdas para os rebeldes”.

Neste estado, há uma reorganização no comando da Coluna. Neste, os “rebeldes”

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também se abasteceram com alimentos, vestimentas, como também adquiriram

cavalos para os soldados gaúchos realizarem as potreadas3.

Indo em direção ao norte, a Coluna Prestes marchou pelos estados de Goiás

e Minas Gerais; nestes, a Coluna travou vários combates com as tropas inimigas.

Nos respectivos estados, os “rebeldes” não foram bem aceitos pela população.

Deve-se a isso as constantes propagandas feitas pelo governo contra a “revolução”.

Lourenço Moreira Lima4 relata durante a marcha o que o governo dizia em relação

aos revolucionários. Conforme afirmação de Lourenço Moreira Lima (1979, p. 137),

“o governo apregoava que não passávamos de grupos desorganizados, que apenas

visavam ao roubo, armados pessimamente de revólveres e que não resistíamos a

menor reação, aconselhando o povo a nos agredir”.

Prosseguindo a marcha, a Coluna Prestes adentrou nos Estados de

Maranhão e Piauí. Nestes, de acordo com Moreira Lima (1979, p. 204), “os rebeldes

foram recebidos com simpatia e entusiasmo pela população, que entendeu o

propósito dos revolucionários, não importando as propagandas feitas pelo governo

em relação à Coluna”.

Nesses dois Estados, houve a incorporação à Marcha de muitos voluntários,

como declara o próprio Moreira Lima (1979, p. 205), o qual afirmou que “as cidades

e as vilas acolheram-nos como amigos, confiando na seriedade das nossas tropas e

reforçando-as com a incorporação de numerosos voluntários”. Continuando a

marcha, a Coluna passou pelo sul do Ceará, enquanto um destacamento

atravessava o norte do Piauí, adentrando no norte do Ceará, com o intuito de atrair

as forças governistas para lá e, assim, permitir ao grosso revolucionário atravessar

tranquilamente o sul do estado.

De acordo com Prestes (1991, p. 244), após terem conseguido tal intento, os

“rebeldes” atravessaram o Rio Grande do Norte, invadindo a Paraíba e depois

passando por Pernambuco, onde abandonaram a “cavalhada”, “por estar muito

enfraquecida e ser difícil o seu transporte através do rio”. De Pernambuco partiram

3 Potreada: trata-se de um termo usado pelos gaúchos, que consistia num sistema de informações, no qual um determinado grupo de soldados se afastava do “grosso da coluna”, levando informações ao comando sobre o terreno, sobre o inimigo, para definição posterior da tática a ser adotada pela Coluna.

4 O bacharel Lourenço Moreira Lima participou da Coluna Prestes como secretário, relatando os acontecimentos em um diário, o qual mais tarde virou obra.

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para a Bahia, despistando, assim as tropas governistas que se encontravam, na

época, mais ao norte.

A Coluna atravessou a Bahia, indo para o norte de Minas Gerais em abril de

1926, onde os militares começaram a empreitada de retorno, passando novamente

pela Bahia, Pernambuco, Piauí, Goiás, até o Mato Grosso, penetrando na Bolívia em

fevereiro de 1927, onde ficariam exilados, dando por encerrada a Grande Marcha.

A marcha tinha como objetivo fazer uma propaganda da Revolução para

posterior tomada do poder. Por isso andavam pelo interior do Brasil tentando cativar

o povo, fazendo com que o mesmo apoiasse a causa tenentista. Por isso, segundo

Maranhão (1989, p. 50),

[...] destruíam os troncos, as gargalheiras e correntes que encontravam nas prisões, libertavam os presos e nas escolas davam sumiço às palmatórias usadas para esbordoar as crianças. Examinavam processos e destruíram todos aqueles que não estavam de acordo com as regras mais elementares da jurisprudência.

Mas, apesar do empenho dos “tenentes” em conseguir uma adesão popular, e

pelas práticas contraditórias adotadas, essa não ocorreu, haja visto que o governo

investiu em propagandas enganosas a respeito da Coluna. Sem a adesão popular,

desarmados e desgastados fisicamente, os membros da Coluna acham-se sem

forças para a efetivação do plano que era a tomada do poder no Rio de Janeiro, indo

para o exílio na Bolívia, voltando a participar da política brasileira alguns anos

depois, com a “Revolução de 1930”.

3 O imaginário coletivo dos santa-helenenses em relação à Coluna Prestes

A Coluna Prestes, depois da unificação, adota como estratégia a guerra de

movimentos, pois com pouco armamento, a escassez de comida e com o inimigo

muito próximo, seria a melhor tática a ser adotada. Desse modo, a saída para a

Coluna Prestes seria partir em direção ao norte, indo primeiramente ao Paraguai,

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através do rio Paraná, com o navio a vapor “Assis Brasil”, para posteriormente

retornar ao Brasil entrando no Mato Grosso.

A primeira tarefa a ser realizada era a total concentração de todos os esforços

revolucionários em Santa Helena, conforme afirma Colodel (1998, p. 171):

Durante todo o período em que as tropas revolucionárias estiveram presentes na região Oeste paranaense combatendo as forças legalistas, enviadas para reprimi-las, grande foi a agitação por que passaram as inúmeras localidades que nessa região estavam implantadas. Em Santa Helena, um pequeno porto situado na margem do rio Paraná, a situação não foi diferente.

Aqui começa a estadia em Santa Helena Velha, especificamente no porto ou

próximo dele; ali eles desenvolvem as ações necessárias para a organização das

tropas que vão receber o nome do novo comandante Luiz Carlos Prestes ou Coluna

Prestes, como é conhecida em todo o mundo. Ele a assumiu por acreditar na força

dessa revolução e também após a renúncia dos velhos líderes que foram para o

exílio (Argentina, Bolívia e outros).

A relação entre a comunidade de Santa Helena Velha e os militares da

Coluna Paulista, durante o tempo em que os mesmos ficaram ali acampados,

perpetuou-se no imaginário coletivo dos moradores.

A falta de víveres para suprir suas tropas fez com os revolucionários lançassem mão de tudo que pudessem conseguir. Após terem se reunido com o Estado-Maior rebelde, Prestes e Miguel Costa tiveram seu plano aprovado e suas tropas começaram a se concentrar em Santa Helena. (COLODEL, 1998, p. 172).

Com a chegada das tropas revolucionárias em Santa Helena, não tardou a

correr o boato de que os revolucionários estavam destruindo e se apossando dos

bens dos moradores, assaltando e cometendo as maiores barbáries. Conforme

Colodel (1998, p.173), “[...] os moradores dos sítios escondiam seus animais,

cavalos, potros e bois para que não fossem tomados pelas tropas da Coluna”.

Tal passagem foi marcante para as vidas das famílias que viviam na

comunidade, sem contar que a presença das tropas revolucionárias teve

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consequências para a desarticulação do sistema de Obrages, o qual se firmava na

retirada de erva mate e madeira da região.

As tropas revolucionárias comprometeram bastante economicamente os

interesses das Obrages e do Obrageiro. Conforme Colodel (1998, p. 171), “[...] para

os moradores foi desagradável a passagem das tropas no caminho de Mato Grosso,

pois, para os obrageiros, Santa Helena servia somente como um porto de embarque

de mercadoria”.

Outro fato que prejudicou as Obrages foi a queima da Ponte sobre o Rio São

Francisco Falso, para atrasar a marcha das tropas legalistas. E que posteriormente

tornou-se um símbolo desse momento histórico para a região Oeste e para todos os

santa-helenenses que presenciaram, para seus descendentes e para toda a

população. Hoje, ela é conhecida como Ponte Queimada; perto da mesma, ergueu-

se um monumento à Coluna.

Para os moradores de Santa Helena, que na época contava “com cerca de

seis famílias, além dos peões e empregados da obrage”, conforme Colodel (2006,

p.21), não importavam os interesses da Coluna, que seriam também interesses do

povo brasileiro como um todo; importavam seus bens, que não eram muitos, sua

sobrevivência, seu trabalho, sua paz, ou seja, não queriam ser incomodados; sua

avaliação sobre o fato histórico partiu de uma visão imediatista e individualista. Não

podem, é claro, ser criticados por isso, visto que se tratava de sua vida, naquele

momento, e a coluna veio para acabar com a rotina, com a calmaria, trouxe

preocupação. Assim que deixou Santa Helena Velha, na última semana de abril de

1925, as coisas progressivamente voltaram ao normal.

4 Implantação do projeto para discutir a história da passagem da Coluna

Prestes por Santa Helena Velha

Conforme Morin (1979, p. 104) é fundamental criar ambientes desafiadores

em que se pesquise, debata o desconhecido, pois "conhecer é negociar, trabalhar,

discutir, debater-se com o desconhecido, que se reconstitui incessantemente,

porque toda solução produz nova questão".

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Para o trabalho de pesquisa, que se originou na formação do PDE – PR,

organizou-se um projeto de implantação a ser trabalhado na Escola Estadual

Graciliano Ramos, de Santa Helena, com alunos do 9.º ano, com o intuito de

despertar as discussões sobre o fato histórico, também por meio de pesquisa.

Levando-se em conta a necessidade de contextualização, ambientação dos

educandos sobre o tema Coluna Prestes em Santa Helena, elaborou-se uma

unidade didática com o intuito de despertar os alunos para discussões sobre o fato

histórico, captar suas opiniões e o que sabiam de antemão sobre o mesmo. Nesta

Unidade Didática constaram dados sobre o imaginário coletivo dos santa-

helenenses, captados através de metodologias diversas, textos explicitando as

relações de trabalho entre obrageiros e mensus na região de Santa Helena,

questionamentos diretos de interpretação textual, produção de textos de opinião

acerca do fato histórico, etc.

Conforme palavras de Mattos (1998), citadas anteriormente sobre o trabalho

do historiador que procura explicações racionais e acaba por intervir na vida social

do contexto contemporâneo, também no projeto aplicado levou-se em conta o

resgate da história e a intervenção na atualidade. Quando se mobilizaram os alunos

para a pesquisa de um fato longínquo ao seu presente, efetuou-se uma intervenção

social nesse presente. E, ainda, este fato, embora longínquo no tempo, faz parte do

imaginário da comunidade e, para não ficar somente no imaginário, fez-se possível

resgatá-lo com os documentos e monumentos ainda preservados. Neste sentido,

possibilitamos o exercício de resgate da história já registrada por historiadores,

unidas e modificadas, no caso da intervenção, pelo imaginário coletivo, conforme já

resgatado anteriormente.

Além da unidade didática com ênfase ao resgate histórico, também foram

implementadas outras duas atividades, baseadas nas premissas do Método de

Pesquisa Descritiva, o qual, de acordo com Jerry R. Thomas, Jack K. Nelson e

Stephen Silverman (2007), “tem por premissa buscar a resolução de problemas

melhorando as práticas por meio da observação, análise e descrições objetivas,

através de entrevistas para a padronização de técnicas e validação de conteúdo”.

Thomas e Nelson (2002, p. 280) relatam que “o valor da pesquisa descritiva

tem por base a premissa de que os problemas podem ser resolvidos e as práticas

melhoradas através de observação, análise e descrição objetivas e completas”.

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Dois instrumentos oferecidos pelo Método Descritivo foram escolhidos: o

resgate de entrevistas já realizadas, registradas e armazenadas no acervo municipal

e o questionário direcionado aos educandos, para facilitar a observação, o registro e

a análise dos dados.

Sobre o acervo municipal, levando-se em conta sua tamanha importância, o

fato de os educandos procurarem dados relevantes para sua pesquisa fez com que

se falasse a respeito dos arquivos, sua importância para a história do município e,

principalmente, para a história nacional. Levou-os também a questionarem sobre as

condições em que se encontram, os porquês de estar de certa forma esquecido e

desvalorizado, de quem seria a responsabilidade por sua conservação e estudo:

Somente o poder público? A comunidade como um todo?

Quando da visita ao acervo, a conclusão a que se chegou é que o poder

público não acondiciona de forma adequada os documentos. Por outro lado,

observou-se que, se não houver uma consciência da comunidade sobre o seu

devido valor, por que é que os responsáveis pelo acervo, que também são membros

da comunidade, atribuir-lhe-ão o devido valor e cuidarão para que não se perca?

Quando a escola propõe trabalhar o conhecimento é que a consciência

coletiva sobre determinado ponto começa a ser formada. Acredita-se que o projeto

despertou a questão e há o desejo de que os estudos continuem também para

resolver o problema detectado em relação à conservação do acervo.

Quanto ao questionário, visou mais especificamente à obtenção de dados

sobre a visão dos educandos a respeito do conteúdo Passagem da Coluna Prestes

por Santa Helena Velha: o que já sabiam, o que esperavam das discussões a

respeito, se conheciam pontos geográficos dos conflitos. O mesmo contou com 09

questões fechadas, múltipla escolha, e uma subjetiva. Para a primeira questão,

sobre o município de origem, 100% indicaram ser de Santa Helena.

Para o segundo questionamento: “Você já havia ouvido falar sobre a

Passagem da Coluna Prestes por Santa Helena antes das discussões em sala de

aula, referentes ao projeto?”. Responderam que já haviam ouvido de pais, avós e

conhecidos mais velhos 56% dos educandos; de professores em outras séries 13%.

Responderam que não haviam ouvido sobre o fato histórico aqui abordado 39%.

Observa-se que a soma não fecha em 100%, visto que alguns responderam

que ouviram falar do fato histórico em casa e na escola. A indicação de 39% que

não ouviram falar do fato em questão demonstra a falta de um trabalho que resgate

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a história do município e lhe dê o devido valor. Por outro lado, a totalidade de 59%

dos entrevistados colocarem que já sabiam algo a respeito e que a comunidade foi

quem lhe passou é positiva. Nesse sentido, acertada ou erroneamente, já possuíam

um conhecimento prévio.

O fato de resgatar o conhecimento prévio foi uma das maneiras de se iniciar o

conteúdo a ser trabalhado. Quando se dá oportunidade de o educando dizer o que já

sabe ou se ainda não sabe sobre determinado assunto, se valoriza o que ele tem a

dizer. Assim, os educandos do projeto inseriram-se nas discussões sobre o tema,

direcionando alguns dos rumos a serem tomados na Unidade Didática.

Sobre a positividade ou negatividade do fato, obtiveram-se os seguintes

resultados: 85,7% afirmaram ter ouvido que a Passagem da Coluna Prestes por

Santa Helena foi positiva e, como negativa, 14,3% dos alunos.

Uma das entrevistas resgatadas no acervo municipal, que também foi

publicada na obra de Colodel (1998, p. 175), mostra a visão negativa dos

moradores, uma visão diferente daquela oferecia pelos textos oficias sobre a

passagem da Coluna prestes em Santa Helena e a permanência dos militares. Nas

palavras de Olga Agostini (apud COLODEL, 1998, p. 175):

O Prestes mesmo botou um soldado na porta que deixava entrar no negócio‟ só um por vez. Então ele queria um pedaço de sabão pra tomar banho [...] um pedaço de fumo pro cigarro [...]) mas depois nós fomos embora para o Paraguai, daí eles comeram os porcos ou levaram embora.

Segundo Olga, havia certo receio quanto à estada da Coluna nesse local, isto

porque eles representavam um movimento um tanto quanto desconhecido pela

população de Santa Helena, por tomarem decisões por muitas vezes autoritárias e

sigilosas, além do fato de que a presença destes elementos representava para a

população local a perda de alguns pertences, especialmente aqueles relacionados a

produção alimentícia. Neste sentido, podemos perceber a visão negativa de alguns

indivíduos da comunidade quanto à passagem da Coluna.

Infere-se que a preponderância das respostas dos alunos de ver o fato como

positivo não reflete o imaginário coletivo do município sobre o fato histórico aqui

abordado. Visto que a grande maioria afirmou ter ouvido informações vindas de

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professores, e a visão repassada foi de que o movimento representava um fato

importante e significativo para a história do país, mesmo que, para os munícipes da

época, ter significado um incômodo, a mudança de sua rotina, o medo de perder

seus pertences.

Quando os educandos acessaram os depoimentos presentes no acervo,

comparando com os textos já trabalhados em sala de aula, puderam perceber que a

história oficial traz uma versão, mas os anônimos que fizeram parte da mesma

tinham também a sua história para contar: que imagem ficou para eles quando

ocorreu o fato histórico, e os porquês dessa visão diferenciada. Os participantes do

projeto puderam se imaginar na pele daqueles anônimos e seus descendentes, os

quais, conforme documentos do acervo manifestaram suas opiniões e contaram

detalhes do que passaram.

A questão 04 do questionário, sobre o interesse dos educandos acerca da

discussão do fato histórico, revelou que 9% se mostraram muito interessados, e 81%

declararam-se interessados. Nenhum aluno assinalou a resposta: nada interessado,

o que, para o educador, mostra que seu trabalho está no caminho certo.

Neste sentido, observa-se que o encaminhamento dado ao trabalho foi

acertado. Se o educador consegue despertar o interesse pelo objeto de estudo, já

conseguiu o primeiro ponto essencial para a aprendizagem.

Sobre se conheciam o Monumento à Coluna Prestes, localizado no interior do

Município de Santa Helena, formulou-se a seguinte questão: “Você já havia visto o

Monumento à Coluna Prestes?” Como resultado, obteve-se a percentagem de 52%

para: sim, mas não sabia do que se tratava; e 26% para: sim, e sabia do que se

tratava. Responderam que não tinham conhecimento do monumento em questão

22% dos educandos.

Observa-se que a grande maioria ou ainda não conhecia ou, ainda que

conhecesse, não sabia do que se tratava. Neste sentido, vê-se que há uma falta

completa de trabalho da comunidade em relação ao resgate da história, tanto por

parte dos educadores como um todo, quanto das políticas educacionais e culturais

do Município. Apesar de o monumento e a Ponte Queimada estarem muito próximos

da área urbana, cerca de 16 quilômetros, cuja estrada de acesso é pavimentada

com pedras irregulares, praticamente não é visitado, talvez por ele não representar

nenhum significado de identificação ou importância para os moradores da cidade.

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Os monumentos históricos são uma forma de perpetuar o passado, mas sua

simples existência não garante o conhecimento do passado. Cabe à comunidade

encontrar maneiras de se conhecer a história indicada pelo monumento. A escola,

nesse ponto, considerando-se o contexto já descrito neste artigo, constitui-se no

instrumento cujo poder de transmissão e resgate é maior. Assim, partindo do

trabalho do educador, com apoio da escola e, posteriormente, com o apoio da

comunidade escolar, é possível mudar esse quadro com iniciativas simples e

eficazes, como por exemplo a organização de palestras ministradas pelos próprios

alunos, após terem trabalhado com eficácia o assunto em questão, dirigidas

primeiramente a alunos de outras séries e em seguida para pais e demais

interessados da comunidade. É uma maneira de valorizar o trabalho do educador, o

empenho dos educandos e a própria comunidade, que se sentirá parte do processo

educacional, visto que se trata da sua história.

Quanto à visita que realizamos com os alunos ao Monumento e à Ponte

Queimada, ambos no interior do município, um próximo ao outro, os educandos

colocaram o que sentiram: “Achei interessante e importante”; “Eu fiquei muito

interessada para saber como era a história e com o tempo eu fui sabendo cada vez

(sic) mais e sempre quando eu vou lá eu procuro imaginar como foi”; “Eu fiquei

emocionado com o local e a importância disso”; ”Me interessei e fiz várias perguntas

de por que seria o monumento e saber mais sobre esses pontos turísticos”; “Fiquei

emocionado”.

Além de estudar os conteúdos relacionados ao fato histórico aqui abordado,

houve um momento em que os educandos foram inseridos no espaço geográfico em

que ocorrera o conflito. As respostas revelaram que tal iniciativa foi acertada, visto

que proporcionou algo para além do ambiente escolar, uma vivência maior do

conteúdo.

Sobre o fato de resgatar o fato histórico do qual o município fez parte, a

grande maioria, 91,4%, afirmou ser importante, e só 8,6% afirmaram ser de pouca

importância. Ressalta-se aqui o papel do educador que deve estimular a pesquisa, a

curiosidade de seus educandos; ao invés de somente repassar dados históricos,

deve instigá-los a procurar, a querer saber mais.

No projeto implantado, houve essa busca por contextualizar o presente para

buscar o passado histórico. Neste sentido, conforme as colocações de Ramos

(2010), já citadas, há uma indicação de que a história para os educandos é algo que

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lhes desperta o interesse, visto que começaram a entender-se como parte de um

processo histórico, que começou muito antes de existirem. Houve a percepção de

que não são sozinhos e que ninguém constrói a história isoladamente; há um

processo de inter-relações complexas e contraditórias.

A última questão direcionada: “Você gostaria que o nome do município de

Santa Helena aparecesse com destaque como uma das passagens da Coluna

Prestes?”, revelou que 100% dos educandos veem como positivo. Leve-se em

consideração o fato de o município constar nos livros como pertencente à Foz do

Iguaçu, já que era na época. Como justificativa à resposta positiva tem-se algumas

opiniões: “Para mais destaque”; “Para ser reconhecido em nível nacional”; “Porque é

muito importante o nosso município ser reconhecido”; “Santa Helena é um município

muito pequeno e precisa crescer, e eu acho que isso vai mudar Santa Helena para

ser conhecida em nível nacional”; “É muito importante por o nome do município no

livro”; “É muito importante o nosso município ter um acontecimento para que todos

conheçam a nossa história, que é muito importante”.

Conforme as opiniões observa-se que há um desejo de que Santa Helena

seja reconhecida. As respostas não foram diferentes do esperado, pois, após todas

as discussões e as análises, observou-se que os educandos incorporaram a ideia de

que o fato histórico foi muito importante para o cenário nacional e, então, por que

não o município ser projetado como tal? Essa valorização perpassa pelo trabalho do

educador. Se a escola não for à referência cultural de uma comunidade, não estará

desempenhando seu papel. Todo o trabalho foi direcionado para o resgate, a

valorização e a criação de uma memória coletiva, cujo trabalho perpassa pelo papel

principal da escola: seu aspecto social.

Segundo Resende (1998), a escola é responsável pela promoção do

desenvolvimento do cidadão, no sentido pleno da palavra. Então, cabe a ela definir-

se pelo tipo de cidadão que deseja formar, de acordo com a sua visão de sociedade.

Cabe-lhe também a incumbência de definir as mudanças que julga necessárias

nessa sociedade, através das mãos do cidadão que irá formar. Com o projeto

implantado, acredita-se que o papel social da escola tenha sido levado em

consideração.

O questionário, como um todo relacionado às atividades implementadas,

revelou que os alunos têm interesse sobre a história local e responderam

positivamente às atividades propostas.

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Ao participarem das atividades: visitas, pesquisas, interpretações e produções

textuais, os educandos conseguiram entender o que é história, o fazer histórico, e

como é importante fazer parte disto, de forma consciente.

5 Considerações Finais

O estudo mencionado neste artigo foi significativo para que educador e seus

educandos dessem mais valor à pesquisa e ao resgate da história local, cuja

importância não se restringe aos limites do município, mas sim, saliente-se, é de

importância nacional. Mostrou que ficou, conforme pesquisas aos depoimentos

constantes no acervo municipal, de certa forma, uma aura negativa sobre a

passagem da Coluna, visto que foi propagada por poucas famílias, pois havia

poucos moradores na época, os quais se sentiram prejudicados pelos militares.

Observou-se que os educandos mostraram interesse pelo estudo e que os

resultados, do ponto de vista do educador em relação aos mesmos, foram positivos,

visto que levaram à discussão, à visita ao acervo municipal, ao Monumento e à

Ponte Queimada, quando puderam juntar as teorias acerca do fato histórico à prática

da pesquisa e ao conhecimento do espaço geográfico em que ocorreu a história.

Durante as pesquisas, observou-se que o acervo sobre a Coluna não está

devidamente conservado e não se lhe dá a devida importância, no sentido de

acondicioná-lo mais adequadamente e divulgá-lo, dada sua importância histórica

para o município e para o país.

O projeto mostrou também que, apesar de o município ter um monumento à

Coluna, inaugurado na época do então Presidente Fernando Henrique Cardoso, não

há um trabalho que estimule os munícipes a conhecê-lo efetivamente, que difunda a

outras comunidades o local e sua importância histórica. Neste sentido, observe-se

que cabe às escolas e às políticas municipais de educação e cultura considerarem

esta questão.

Por fim, sabemos que este trabalho tem muitas debilidades e ainda há muito a

ser trabalhado sobre a Passagem da Coluna Prestes por Santa Helena para que os

educandos de hoje possam identificar-se nesta história e nos monumentos que

procuram reafirmar e relembrar determinada história que deveria ser significativa

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para o município e seus munícipes. Regina Clara Simões Lopes, ao trabalhar com a

política cultural reflete sobre a “função anestésica” que o patrimônio cultural tem

adquirido atualmente. “A serviço da ideologia, a consciência dissolvida perde o

poder de crítica, e a identidade se derrete na inconsciência coletiva”. (LOPES, 1987,

p. 27). Como demonstra a autora, o povo brasileiro não possui consciência da

própria existência, muito menos de sua imagem formada pela história. Como

percebemos em nossa pesquisa, a maioria dos munícipes de Santa Helena não

sabem o significado dos monumentos tratados neste trabalho, justamente por

ignorarem a história desse movimento. Terminamos este artigo apontando para a

necessidade, colocada também por Lopes, de discutirmos a origem deste processo

de “amnésia coletiva” em relação às próprias origens, e da desintegração dos

sistemas de acumulação de experiências e conhecimento que dão origem às

culturas.

Ao mesmo tempo, não podemos deixar de lembrar que o objetivo da política

cultural, como muito bem demonstra Teresa Jussara Luporini, não é apenas a

preservação do passado, mas sim, pode servir como espaço de participação no

presente.

Os 'lugares da memória' se caracterizam como um movimento que articula Memória e História, pois intencionalmente se busca preservar os vestígios, impedindo a ação do esquecimento. Ao interpretá-los e devolvê-los à sociedade, a História os institui simbolicamente. (LUPORINI, 2000, p. 212).

Os monumentos devem ser interpretados pelos alunos como ponto de partida

para uma rememoração mais ampla e não apenas como simples ilustração. Ao

mesmo tempo eles podem servir como forma de manipulação e de uso político da

cultura. Infelizmente não nos foi possível avançar nestas discussões tendo em vista

as delimitações deste trabalho. No entanto, esperamos ter, minimamente,

contribuído um pouco com estas discussões.

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