a história da social democracia - buonicore

38
A história da social democracia Esta série de artigos que ora se inicia tratará da história das Internacionais social democratas entre os anos 1889 e 1990, quando do auge da ofensiva neoliberal. Acredito poderão nos ajudar a entender um pouco mais os grandes limites e as vicissitudes desta corrente política neste início de século XXI, especialmente no Brasil. A Segunda Internacional (1889-1914) Os antecedentes Em 1871, quando caíram os últimos comunardos transpassados pelas balas da reação francesa, encerrou-se mais um capítulo da história do movimento socialista mundial. Uma cortina de violência desceu sobre o cenário político europeu. Liberais e conservadores, republicanos e monarquistas, se uniram numa nova santa aliança contra o proletariado revolucionário e sua representante maior a Associação Internacional dos Trabalhadores, posteriormente conhecida como I Internacional. No ano seguinte reuniu-se na Holanda o último congresso daquela Internacional em solo europeu. Por proposta de Marx, o seu conselho-geral foi transferido para os Estados Unidos. Ele queria com isto protegê-lo dos ataques da reação e também da ação desagregadora dos anarquistas, que ameaçavam assaltar a direção da organização. A Internacional ainda sobreviveu por mais alguns poucos anos; até que, em 1876, diante dos revezes sofridos pelo movimento operário, o Congresso de Filadélfia decidiu pela sua dissolução. No entanto, profundas modificações já estavam se gestando no seio do capitalismo. Estas teriam importantes conseqüências para o movimento revolucionário em todo o mundo. O fim da década de 1870 e o início da seguinte foi

Upload: nathalia-do-vale

Post on 17-Nov-2015

15 views

Category:

Documents


1 download

DESCRIPTION

A História Da Social Democracia - Buonicore

TRANSCRIPT

A histria da social democracia

Esta srie de artigos que ora se inicia tratar da histria das Internacionais social democratas entre os anos 1889 e 1990, quando do auge da ofensiva neoliberal. Acredito podero nos ajudar a entender um pouco mais os grandes limites e as vicissitudes desta corrente poltica neste incio de sculo XXI, especialmente no Brasil.

A Segunda Internacional (1889-1914) Os antecedentes Em 1871, quando caram os ltimos comunardos transpassados pelas balas da reao francesa, encerrou-se mais um captulo da histria do movimento socialista mundial. Uma cortina de violncia desceu sobre o cenrio poltico europeu. Liberais e conservadores, republicanos e monarquistas, se uniram numa nova santa aliana contra o proletariado revolucionrio e sua representante maior a Associao Internacional dos Trabalhadores, posteriormente conhecida como I Internacional.

No ano seguinte reuniu-se na Holanda o ltimo congresso daquela Internacional em solo europeu. Por proposta de Marx, o seu conselho-geral foi transferido para os Estados Unidos. Ele queria com isto proteg-lo dos ataques da reao e tambm da ao desagregadora dos anarquistas, que ameaavam assaltar a direo da organizao. A Internacional ainda sobreviveu por mais alguns poucos anos; at que, em 1876, diante dos revezes sofridos pelo movimento operrio, o Congresso de Filadlfia decidiu pela sua dissoluo.

No entanto, profundas modificaes j estavam se gestando no seio do capitalismo. Estas teriam importantes conseqncias para o movimento revolucionrio em todo o mundo. O fim da dcada de 1870 e o incio da seguinte foi um perodo de rpido desenvolvimento econmico, em especial na Alemanha. A produo se concentrou cada vez mais em grandes centros industriais. Forjou-se uma classe operria numerosa e com elevado esprito de organizao e de luta. As bases sociais de um amplo movimento de massas proletrias, guiado pelas idias socialistas, j estavam dadas.

Neste perodo surgiram os primeiros partidos polticos independentes, e de massa, do proletariado. Em 1875 as duas principais organizaes dos operrios socialistas da Alemanha, os eichenianos (marxistas) e lassalianos, fundiram-se em um nico partido poltico: o Partido Operrio Social-Democrata da Alemanha. Apesar das crticas de Marx e Engels ao programa aprovado em Gotha, no qual os socialistas internacionalistas fizeram concesses injustificveis s idias de Lassale, ele representou um importante acontecimento para o proletariado alemo.

Nos anos seguintes foram formados partidos socialistas na Frana, ustria, Espanha, Itlia, EUA, Inglaterra e Rssia. A maioria destas organizaes nasceu sob o signo da teoria mais avanada j produzida at ento: o marxismo. Pouco a pouco foi surgindo a necessidade de agrupar todos esses partidos em uma nova organizao internacional, que pudesse unificar e direcionar as diversas lutas nacionais no sentido de superar a dominao e a explorao capitalista em escala mundial.

Engels e a Internacional Depois de vrios contatos e reunies, os socialistas franceses resolveram convocar para o ano de 1889 um congresso internacional. Engels foi o principal incentivador deste conclave. Durante todo o primeiro semestre daquele ano ele se concentrou na tarefa de garantir uma maioria marxista. Ele escreveu: Este maldito congresso e tudo que a ele se relaciona j vem a trs meses tomando todo o meu tempo: escrivinhaduras, correrias, um rebulio dos diabos. Este deveria se iniciar no dia 14 de julho quando se comemoraria o centenrio da grande revoluo francesa.

O congresso internacional contou com a participao de 300 delegados, representando cerca de 20 pases. Sem dvida, este foi o congresso mais representativo j realizado pelo movimento socialista. Engels no pode comparecer. Aps ter garantido a participao de uma folgada maioria de delegados afinados com as teses marxistas, teve que se dedicar outra importante tarefa: preparar a publicao dos volumes restantes de O Capital.

Embora no estivesse presente influenciou fortemente aquele congresso. No houve uma resoluo importante que no tivesse por trs as mos e o crebro operosos daquele grande revolucionrio. A sua principal resoluo foi de desencadear uma campanha pela conquista da jornada de oito horas dirias de trabalho. Foi estabelecido o primeiro de maio como dia internacional de luta, que deveria ser comemorado por todas as organizaes ali presentes.

Em fevereiro de 1890 os socialistas alemes conquistaram 1 milho e 500 mil votos nas eleies para o parlamento, elegendo 35 deputados. Em maro, diante do fracasso das leis anti-socialistas, caiu o primeiro-ministro Von Bismarck. A surpreendente vitria poltica do proletariado alemo causou uma verdadeira comoo nos meios polticos europeus. Os setores reacionrios buscaram, atravs de todos os meios, jogar os trabalhadores numa aventura. Engels, ento, aconselhou-os: Por agora s nos resta agir mais pacificamente e legalmente possvel e evitar qualquer pretexto para colises.

No mesmo ano, pela primeira vez, o proletariado mundial comemorou o primeiro de maio. Engels, impressionado com a gigantesca manifestao realizada pelos operrios ingleses, escreveu: At onde meus olhos alcanavam via um mar de cabeas, 250 mil ou 300 mil pessoas, das quais eram operrios (....) foi a assemblia mais gigantesca de todas as que alguma vez se realizaram aqui (...) o que eu no daria para que Marx tivesse vivido ainda este despertar. Marx havia falecido em 1883.

Graas ao de Engels os marxistas conseguiram alcanar a hegemonia no movimento socialista. Ele considerou, num primeiro momento, inconveniente excluir as minorias esquerdistas. Os socialistas esperavam ainda atrair os que ainda vacilavam para posies mais conseqentes, isolando assim os anarquistas. A ttica era continuar aprovando resolues que exigissem dos seus aderentes uma posio mais clara diante da luta poltica, inclusive parlamentar. No Congresso de Zurich, em 1893, foi aprovada uma resoluo que praticamente excluiu da Internacional as organizaes que no fossem partidrias da ao poltica visando conquista do poder poltico pelo proletariado. Um ano aps a morte de Engels, em 1896, os anarquistas foram definitivamente expulsos das fileiras da Internacional. Assim, no final do sculo XIX, o marxismo se consolidou como principal fora poltica no interior do movimento operrio europeu.

Bernestein contra o marxismo A partir de 1899, o PSDA foi palco de uma acirrada controvrsia poltico-terica entre Bernestein e a maioria do partido, liderado por Augusto Bebel. Bernestein apregoava que o desenvolvimento do capitalismo no levava monopolizao crescente da economia, como afirmava Marx, mas sua democratizao, atravs do aumento do nmero de proprietrios, graas a introduo das sociedades por aes. Esta tendncia levaria a um fortalecimento das classes mdias e no a sua reduo, eliminando assim as previses catastrficas de Marx sobre o choque inevitvel entre burgueses e proletrios. O desenvolvimento do capitalismo no levaria crises, pois ele mesmo desenvolveria meios de controle, atravs da melhor organizao da produo e do planejamento. O socialismo deixava de ser uma necessidade histrica para se transformar em uma possibilidade, cada vez mais remota.

Este tipo de concepo levou Bernestein a elaborar uma nova ttica, que privilegiava a luta parlamentar e sindical. Segundo ele seria atravs do voto que o trabalhador se elevaria da condio social de proletrio para quela de cidado. A luta sindical por melhores condies de trabalho e salrios seria o instrumento privilegiado para conduzir a sociedade capitalista, atravs das reformas econmicas, para o socialismo. Na verdade, essas reformas j seria a prpria realizao molecular da nova sociedade. de Bernestein a famosa frase: o movimento tudo e o fim nada significa.

As teses revionistas foram condenadas em todos os congressos do PSDA realizados entre 1899 e 1903. O principal crtico foi Augusto Bebel que condenou o intento revisionista de alterar a ttica da Social-Democracia, posta a prova vrias vezes e baseada na luta de classes. Concluiu: Se adotarmos a poltica revisionista nos constituiramos em um partido que se conformaria apenas com a reforma da sociedade burguesa.

No congresso da Internacional, realizado em Amsterd em 1904, a polmica alem adquiriu centralidade. Desta vez o revisionismo foi condenado num tribunal internacional. O congresso aprovou a proposta de que em todos os pases deveria ser procurada a unidade dos partidos socialistas visto que existiria apenas um proletariado, mas aconselhava que esta unidade deveria se dar sob as bases dos princpios estabelecidos pelo congresso da Internacional e nos interesses do proletariado mundial. Mas, os revisionistas permaneceram nas direes dos partidos socialistas e da Internacional.

A Internacional entre a guerra e a revoluo A revoluo democrtica eclodida na velha Rssia tzarista em fevereiro de 1905, que teve como fora dirigente o proletariado, reacendeu o velho debate sobre o problema da articulao entre reforma e da revoluo. A revoluo ajudou a demarcar mais claramente os campos em que se dividia o movimento. De um lado, os reformistas, porta-vozes da via parlamentar para o socialismo; de outro, os revolucionrios.

Os acontecimentos na Rssia foi o sinal de que a poca do desenvolvimento pacfico do capitalismo estava chegando ao fim e se fazia necessrio preparar o exrcito internacional do proletariado para novos tempos que exigiram uma nova ttica. A maioria dos socialistas no conseguiu, ou no quis, compreender isso. Comeou a se constituir lentamente uma ala esquerda da que seria encabeada pelos bolcheviques e pela esquerda da social democracia alem.

Em 1907, reuniu-se o congresso de Stuttgart no qual a maioria anti-reformista comeou a se desfazer. O problema da guerra iminente comeou a tomar o centro da agenda internacional do movimento socialista. A resoluo sobre a guerra teve como base a moo apresentada por Bebel e afirmava que as guerras eram prprias da essncia do capitalismo e s cessariam com o seu fim e que os trabalhadores era as principais vtimas do conflito, portanto seus inimigos naturais. Mas, como alertou Lnin, presente no congresso, no continham qualquer indicao concreta sobre quais deveriam ser as tarefas da luta do proletariado.

A esquerda socialista props e foi aprovada uma emenda que afirmava: Se apesar de todos os nossos esforos a guerra eclodir dever intervir com o objetivo de colocar-lhe um fim, e com toda fora utilizar as crises econmicas e polticas criadas pela guerra pra agitar os estratos mais profundos do povo e precipitar a queda da dominao capitalista. No entanto, j se podia sentir que eram poucos aqueles que estavam realmente dispostos a levar at as ltimas conseqncias esta resoluo. No congresso seguinte em Copenhague (1910) reforou-se ainda mais as posies reformistas e o problema da manuteno da paz ficou quase que reduzido as presses parlamentares em detrimento da mobilizao das massas e da preparao da luta revolucionria.

A guerra e os dilemas socialistas O comeo da dcada de 1910 viu agravada a situao internacional, alimentada as contradies inter-imperialistas - crise marroquina (1911) - que quase levou a uma guerra entre Frana e Alemanha, a guerra talo-turca (1911), a guerra balcnica (1912). Estes eram prenncios de uma guerra mundial que se aproximava e acabaria por varrer a Europa nos anos seguintes.

Em 1912, em meio ao clima pesado da guerra iminente, reuniu-se um congresso extraordinrio na Basilia, que tomou carter de uma manifestao anti-blica. Os discursos contra os preparativos da guerra eram to eloqentes quanto vazios de proposituras. Falava-se da utilizao de todos os meios apropriados para conjurao do conflito e do pretenso medo das classes governantes da revoluo proletria (...), pois qualquer guerra podia tornar-se perigosa para elas e se conclua ameaadoramente: Que se lembre que a guerra franco-prussiana provocou a exploso revolucionria da Comuna.

No dia 28 de junho de 1914 foi assassinado o arque-duque Francisco Fernando, prncipe herdeiro do trono Austro-hngaro. Seus assassinos foram dois nacionalistas srvios. Um ms depois a Autro-Hungria declarou guerra a Srvia. Neste mesmo dia a Rssia entrou no conflito em defesa da Srvia ameaada. Em seguida foi a vez da Frana se colocar favor da Rssia e da Alemanha se colocar ao lado da Austro-Hungria. No dia 4 de agosto a Inglaterra entrou no conflito, declarando guerra Alemanha e Autro-Hungria. Era o maior conflito blico que a humanidade j havia visto.

Neste perodo reuniu-se extraordinariamente o Comit Executivo da Internacional. Nele o representante alemo afirmou sua posio contrria a aprovao dos crditos para a guerra imperialista. Ainda, mais uma vez, no dia 1 de agosto, no congresso do Partido Socialista Francs, o representante alemo ratificou suas posies anti-blicas. A realidade, porm, era bem outra. As massas operrias e o partido socialista vinham sendo, pouco a pouco, dominados pelo esprito chauvinista patriotismo burgus.

No dia 4 de agosto, para surpresa de muitos revolucionrios, inclusive Lnin, os deputados socialistas alemes votaram massivamente favor da liberao dos crditos de guerra e assim punham uma pedra sobre o seu passado revolucionrio e internacionalista. Era a vitria do pragmatismo de direita do oportunismo. Desde 4 de agosto, afirmou Rosa de Luxemburgo, a social democracia alem um cadver putrefato.

Os socialistas franceses, por sua vez, uniram-se sua burguesia em defesa da ptria ameaada. A mesma coisa fizeram os austro-hngaros, os belgas, os ingleses. At Plekhanov, pai do marxismo russo, aderiu s teses social-patriticas. Em todos os pases os socialistas formaram alianas polticas e blocos governamentais com suas respectivas burguesias imperialistas. O movimento socialista e o marxismo entrariam na sua pior crise.

Radiografia de uma capitulao Como afirmamos, desde os fins da dcada de 1870 o capitalismo atravessou uma fase de desenvolvimento relativamente pacfico. O nmero de operrios cresceu vertiginosamente, concentrado em grandes unidades produtivas. As greves econmicas e os sindicatos tambm puderam se desenvolver sem grandes obstculos. Ampliaram-se os espaos democrticos, o sufrgio tornou-se uma arma importante na luta dos operrios. Estes chegaram a eleger uma expressiva bancada parlamentar. Essas vitrias importantes, contraditoriamente, foram amortecendo a conscincia revolucionria de parcelas importante dos trabalhadores e, especialmente, de suas direes. Ironicamente, Stalin comentou, as formas legais foram colocadas nas nuvens e acreditou-se poder matar o capitalismo atravs da legalidade.

O desenvolvimento econmico rpido criou condies favorveis para a formao de uma camada de operrios melhor remunerada e com maiores direitos sociais. Alguns autores definiram esta camada como aristocracia operria. Esta, ao lado da pequena-burguesia urbana, foi a base social onde se assentou o reformismo social-democrata.

Este desenvolvimento do capitalismo europeu s foi possvel graas super-explorao das colnias e dos pases capitalistas perifricos. A guerra era justamente uma maneira de manter os privilgios das grandes burguesias nacionais, uma condio para que se mantivesse tambm o nvel de vida de parcelas privilegiadas do proletariado. Por isto, para esta camada, a derrota militar das suas burguesias poderia representar uma derrota dos seus prprios interesses econmico-corporativos imediatos. O destino da aristocracia operria e das classes mdias urbanas se vinculava ao destino da guerra e da capacidade das classes dominantes em manter os nveis elevados de crescimento econmico.

Mas a guerra, pouco a pouco, foi revelando para amplos setores do proletariado os limites das suas antigas direes. Abriu-se um novo perodo na histria da luta pelo socialismo. Este novo perodo exigia que se constitussem novas organizaes. A II Internacional est morta, afirmou Lnin, vencida pelos oportunistas. Abaixo os oportunistas! Viva a III Internacional!.

A histria da social democracia (2)

Reorganizando Internacional Social-democrata no ps-1918 Quando a Primeira Grande Guerra Mundial estava chegando ao seu final, os partidos social-democratas das potencias imperialistas vitoriosas (Gr-bretanha, Frana e Blgica) realizaram uma conferncia na qual discutiram um projeto para reconstruo europia e elegeram um comit que teria como misso preparar um congresso internacional dos partidos e organizaes social-democratas e reorganizar a II Internacional. O comit refletiu bem o carter desta articulao, pois deste participavam figuras como o belga mile Vanderveld, o britnico Arthur Henderson e o francs Albert Thomas. Todos, sem exceo, haviam sido ministros de seus respectivos pases nos governos de Defesa Nacional, durante a guerra imperialista, e ardorosos defensores do patriotismo burgus.

Em fevereiro de 1919 reuniu-se em Berna o primeiro congresso socialista internacional do ps-guerra, com a participao de delegaes de 26 pases. Mas, partidos importantes como os partidos socialistas da Itlia e da Sua, os bolcheviques russos se recusaram a participar de um encontro patrocinado pelos social-chauvinistas, responsveis pela falncia moral e poltica da II Internacional. (ver primeira parte deste artigo)

O primeiro ponto da pauta do congresso foi discusso sobre as responsabilidades da social-democracia alem no conflito mundial. O debate terminou em um documento-compromisso que desresponsabilizava os sociais democratas alemes pelos fatdicos acontecimentos iniciados em 1914, quando eles, rompendo com a tradio socialista, votaram favoravelmente aos crditos para a guerra imperialista. Ao anistiar os dirigentes do PSDA, estavam anistiando a si prprios pela traio aos princpios do internacionalismo proletrio.

O segundo ponto da pauta foi discusso sobre o problema da democracia em geral e da ditadura do proletariado. No transcorrer do congresso surgiram dois grupos. O primeiro, amplamente majoritrio, era formado pelos trabalhistas britnicos e pelo PSD alemo, e condenava por princpio a necessidade da ditadura do proletariado e da revoluo socialista - advogavam a passagem gradual e pacfica para o socialismo, atravs da democracia e da legalidade burguesas -, e criticavam duramente a ao do governo sovitico implantado em outubro de 1917.

O grupo minoritrio agrupava as tendncias centristas, dirigido por Adler e Longuet, pregava uma posio mais comedida em relao Rssia Sovitica. A proposta de resoluo da minoria se posicionava contra qualquer estigma que se pudesse aplicar contra a Repblica Sovitica e afirmava que a social-democracia no devia ser vtima das manobras e calnias plantadas pelos governos burgueses. O congresso, segundo os centristas, devia recusar a basear suas aes somente nas opinies dos mencheviques que representavam a minoria da classe trabalhadora de Rssia. Baseando-se na pouca representatividade daquele congresso, se colocaram contra a formao de uma nova internacional socialista e sinalizavam para reunificao do movimento socialista cindido desde 1914.

No entanto, a resoluo da direita social-democrata foi aprovada e com ela consolidou-se a hegemonia social-chauvinista no seio da nova organizao que se esboava em Berna. Este congresso no ousou proclamar, oficialmente, a criao de uma nova internacional, mas formou uma comisso permanente, integrada por representantes de todos partidos presentes, que deveria coordenar a ao dos diversos partidos social-democratas.

Esta nova Internacional nasceu como uma resposta articulada ao crescimento da corrente comunista e a eminncia de uma revoluo social na Europa. MacDonald, dirigente trabalhista e futuro primeiro ministro ingls, afirmou: toda a II Internacional anti-bolchevique. Ela , de fato, o nico baluarte contra ele, excetuando-se as represses militares. No foi sem motivo que Lnin se referiu a ela como uma organizao de agentes do imperialismo internacional que atuava no seio do movimento operrio.

Em contraposio ao congresso de Berna, a esquerda revolucionria social-democrata (comunista) realizou em maro de 1919 o seu prprio congresso internacional. A resoluo deste conclamava todos os partidos e organizaes revolucionrias a travarem uma luta sem quartel contra os social-democratas da maioria, tendo em vista que as massas operrias ainda no se tinham dado conta do perigo que os social-traidores representavam para o proletariado internacional. Seria, ento, preciso abrir os olhos de todos os trabalhadores para o seu trabalho de traio e colocar pela fora das armas esse partido contra-revolucionrio fora desse quadro confuso. Eis uma das tarefas mais importantes na revoluo proletria internacional

Em relao ao centro social-democrata, a resoluo apontava a necessidade de rach-lo e atrair a sua ala esquerda para o campo da revoluo, mas para isto seria preciso submeter a uma crtica implacvel as posies vacilantes e conciliadoras de seus chefes. Lnin sabia que a social-democracia no era um bloco coeso, sem fissuras; ele sabia que enquanto a social-democracia se assentasse, em grande medida, sobre o movimento operrio ela estaria sujeita as presses dos trabalhadores. Isso que permitia a existncia de um centro e, vez por outra, seu deslocamento para esquerda. O congresso da esquerda realizado em Moscou assentou as bases da III Internacional a Internacional Comunista.

A primeira crise Entre o primeiro e o segundo congresso da internacional dos social-democratas vrios partidos abandonaram a organizao, entre eles a seo francesa da Internacional Operaria (a SFIO) e o partido Social-democrata Independente da Alemanha. Inmeros partidos, como os partidos socialistas da ustria e da Espanha, expressaram o seu descontentamento quanto direo que vinha sendo dada.

No segundo congresso, realizado em Genebra em 1920, estavam presentes partidos de 17 pases, sendo que cinco enviaram apenas observadores, sem autorizao para assumirem qualquer compromisso com as resolues ali aprovadas. Fortaleceram-se ainda mais as posies da direita social-democrata. Condenou-se toda e qualquer utilizao da violncia revolucionaria, negou a Ditadura do Proletrio como fase necessria no processo de transio ao comunismo e atacou duramente o governo sovitico, fazendo coro com a reao mundial. O dirigente social-democrata J. Thomas expressou muito bem a essncia de sua ttica reformista: o nosso poderio deve ser orientado, antes de mais nada, para a urnas eleitorais. O boletim de voto mais forte os projeteis e dever vencer em ltima instncia

Atravs da maioria social e parlamentar o que significaria maioria no governo eles pensavam poder passar para uma gradual nacionalizao e socializao dos principais meios de produo. Um processo que se daria, pacificamente, a partir da incorporao das propriedades ao novo Estado democrtico e socialista. atravs da justa compensao financeira aos seus proprietrios.

Mas, mesmo esta socializao passo a passo, com justa indenizao, no pode ser realizada em parte alguma da Europa. Mesmo as poucas nacionalizao realizadas por governos social-democratas se deram em setores deficitrios da economia ou naqueles que forneciam insumos baixos preos os grandes monoplios privados, colaborando para acumulao capitalista. At 1939 nenhuma empresa privada de vulto havia sido nacionalizada por governo social democratas na Europa Ocidental. Apenas durante a II Guerra empresas estratgicas foram nacionalizadas pelos governos beligerantes, socialistas e anti-socialistas.

Portanto este programa no se realizou no apenas pelo desinteresse em aplic-lo, mas por ser ele inaplicvel. No era possvel a passagem de uma economia de livre mercado capitalista para uma economia planejada socialista atravs de reformas econmicas, da socializao gradual de um ramo de indstria a outro, dentro da legalidade democrtica, como desejavam os social-democratas de direita e de esquerda. O capitalismo e infenso a qualquer reforma radical desse tipo.

Perry Anderson afirmou, corretamente, que qualquer intromisso sria nas prerrogativas do capital em um setor, repercute inevitavelmente atravs do conjunto de sistema em todos os demais setores. Uma crise de confiana cujos traos invariveis so entesouramento, a fuga de capitais. Medidas genuinamente socialistas seria, necessariamente, o sinal para uma guerra entre as classes, na qual o capitalismo vai utilizar de todas as armas que possui.

A Internacional II e o sonho centrista No incio de 1921 os centristas romperam a unidade com a direita social-democrata e fundaram a Unio Internacional dos Partidos Socialistas, mais conhecida como Internacional II por sua posio intermediaria entre as duas internacionais j existentes. Da conferncia centrista participaram partidos de 13 pases, entre eles estavam: o Partido Social-Democrata Independente da Alemanha, o Partido Socialista Austraco, a SFIO francesa e o Partido Trabalhista Independente da Gr-Bretanha.

O surgimento da internacional II , em certo sentido, era um reflexo da radicalizao do movimento operrio na Europa. O programa e a declarao aprovados traduziam bem este estado de esprito. Neles no se negava, em certos casos, a necessidade da ditadura do proletariado e da revoluo violenta. Para eles seria um absurdo que os socialistas se limitassem ao uso exclusivo de mtodos parlamentares-democrticos em pases onde no havia a menor possibilidade de serem utilizados com xito, como na Rssia czarista. Mas, tambm, afirmavam que seria um erro limitar a ao dos trabalhadores, prescrevendo-lhes o modelo da revoluo adotado na Rssia.

Nos pases em que a classe capitalista era fraca politicamente, e, portanto no podia substituir a democracia pela guerra civil aberta, a classe operaria poderia obter o poder poltico atravs de meios democrticos, ou seja, pela via parlamentar. No entanto, mesmo onde isto ocorresse os capitalistas ainda poderiam utilizar o poder econmico para desestabilizar o Estado Democrtico nas mos dos trabalhadores. Neste caso somente ai - os centristas advogavam a necessidade da utilizao da violncia revolucionaria e a utilizao provisria de mtodos ditatoriais de governo, com o objetivo de quebrar a resistncia da burguesia e consolidar o poder socialista. Era a chamada estratgia de violncia defensiva. O resultado da estratgia centrista ser vista no prximo artigo.

A unidade dos socialistas contra a reao Em dezembro de 1921, diante do avano da reao, a executiva da Internacional Comunista conclamou a unidade de todas as foras proletrias e props uma reunio emergencial entre as trs internacionais para discutir um plano de ao conjunta. Esta reunio, que se realizou em abril de 1922, deliberou pela realizao de atos unificados nos dias 20 de abril de 1 de maio em defesa da reduo da jornada de trabalho para 40 horas e da revoluo russa, isolada poltica e economicamente pela reao capitalista. Foi formada uma comisso composta de nove membros, trs de cada Internacional, que teria como objetivo preparar um congresso operrio e socialista internacional unitrio.

O desejo de unidade dos bolcheviques levou-os a fazer concesses aos oportunistas; entre elas estavam a abertura de um processo pblico para os mencheviques e social-revolucionrios acusados de terrorismo e sabotagem contra o poder sovitico, a autorizao para que advogados indicados pela Internacional de Berna pudessem acompanhar e efetuar a defesa dos acusados e, por fim, garantias previas de que, independentemente dos fatos apurados, no seria aplicada a pena capital contra os culpados. Lnin, embora no concordasse inteiramente com o teor do acordo firmado, respeitou a deciso dos delegados da Internacional Comunistas.

Ainda em abril realizou-se uma conferencia internacional com a participao das principais potncias imperialistas e da Rssia Sovitica. Nela a delegao russa apresentou uma proposta ousada de reduo geral de armamentos na Europa; mas, os governos capitalistas no aceitaram. Lnin, ento, solicitou uma reunio de emergncia da comisso dos nove para discutir a questo e estabelecer uma ao conjunta contra a poltica guerreira do imperialismo, visto que o desarmamento era uma das reivindicaes estampada na plataforma das trs internacionais. Apesar dos esforos dos delegados comunistas a reunio no foi convocada. Mais uma vez a retrica pacifista e antiimperialista da social-democracia no se traduziu em atos.

Diante do boicote dos membros da Internacional de Berna, e da cumplicidade dos centristas, a direo do PC bolchevique e os delegados da IC lanaram um ultimato pela convocao imediata de um congresso operrio mundial: Se a II Internacional continuar a sabotar este assunto o Cominter retirar os seus representantes da comisso dos nove e prosseguir a agitao em prol da frente nica de uma forma mais adequada a atual situao.

Ainda em maio realizaria a ltima reunio da comisso dos nove. A direita social-democrata no estava realmente disposta a realizar um congresso operrio internacional e estabelecer uma estratgia comum na luta contra o imperialismo e a reao capitalista. A unidade na luta, neste momento, era uma sombra sinistra que pairava sobre as cabeas dos burocratas da II Internacional.

Um editorial do jornal Avante do PSDA, publicado em 29 de maio, no escondia a posio reacionria dos seus dirigentes. Afirmava ele: a unidade do movimento operrio s poder se restabelecer e se reforar na luta aguda contra os comunistas. Em junho chegou ao fim o julgamento do grupo terrorista ligado aos social-revolucionrios e mencheviques. O resultado foi a condenao a morte de seus principais lideres. A pena foi, imediatamente, comutada e transformada em priso perptua. Os advogados e representantes da internacional de Berna se retiraram antes que a sentena fosse pronunciada protestando contra o encaminhamento do processo.

Este era o pretexto que precisavam para por um fim em definitivo a comisso dos nove e, assim, enterrar a toda e qualquer possibilidade de restabelecer a unidade orgnica do movimento operrio internacional. Para arrematar a sua obra, a direo da II Internacional determinou que a Internacional (social-democrata) e os partidos a ela filiados no poderiam participar em futuras tentativas de conseguir um acordo com a III Internacional.

Aps o fracasso do processo de unidade, que os centristas no fizeram nenhum esforo para manter, a Internacional II sofreu um forte baque com a deciso do Partido Social Democrata Independente alemo de reintegrar-se ao PSDA. Era o comeo do fim da alternativa centrista e, mais uma vez, seus lderes capitularam perante a ala direita do movimento socialista.

Em dezembro de 1922 era formado um comit executivo composto por membros das duas internacionais social-democratas com o objetivo de organizar um congresso de reunificao, que foi realizado em maio de 1923 e contou com a participao de 424 delegados, representando 43 partidos social-democratas. A presidncia da nova organizao, que se chamaria Internacional operaria e Socialista, caberia a Arthur Andersen do Partido Trabalhista Britnico e a secretaria-geral ao centrista Friedrich Adler do Partido Socialista Austraco.

* Esta a segunda parte do artigo sobre a histria das internacionais social-democratas. A bibliografia sobre o tema ir ao ar juntamente com a quinta e ltima - parte. A histria da social democracia (3)

O mito do capitalismo organizado e a crise Na ustria, como na Alemanha, os socialistas tiveram uma expressiva votao nas eleies de 1923. Dois meses aps a vitria no continente, os trabalhistas britnicos formaram o seu primeiro governo, encabeado por McDonald. Na mesma poca o radical Edouard Herriot chegou ao governo da Frana, apoiado por uma coligao entre radicais e socialistas. Na Sucia e na Dinamarca os socialistas tambm ingressaram em governos de coalizo.

A razo para esse crescimento da influncia reformista no movimento operrio est no fato de ter chegado ao fim a onda revolucionria que varreu a Europa entre 1917 e 1920 e o capitalismo passar a conhecer um perodo de relativa estabilidade econmica e poltica, superando provisoriamente a crise que se instaurou no imediato ps-guerra. Com o reaquecimento da economia caiu o nmero de desempregados e o nvel de vida se elevou. Mal sabiam que esta calmaria aparente era apenas o prenncio da grande tempestade que se aproximava.

O primeiro congresso da Internacional Operria e Socialista (IOS) foi realizado em agosto de 1925 sob o signo dessas vitrias eleitorais, que pareciam comprovar a justeza da estratgia reformista. Os partidos filiados a IOS possuam mais de sete milhes de filiados e haviam alcanado mais de 25 milhes de votos nas ltimas eleies. Neste ano um dos principais tericos da social democracia europia, Hilferding, anunciava uma nova etapa do capitalismo: a do capitalismo-organizado. O alto grau de concentrao do capital permitiria, pela primeira vez, romper com a lgica da livre concorrncia capitalista e criar novas condies para a passagem gradual e pacfica para a economia planificada. O capitalismo organizado teria o poder de exorcizar as crises que periodicamente atingiam o sistema e abriria caminho para o socialismo.

O segundo congresso, realizado em 1928, seguiu na mesma trilha aberta pelo anterior, apenas aprofundando os seus erros. Nele se comemorou, mais uma vez, o desenvolvimento da democracia burguesa na Europa, em especial, na Alemanha. Um processo que era encarado como algo quase irreversvel. O desenvolvimento das foras produtivas deveria ser acompanhado, automaticamente, pela expanso da democracia e a vitria dos socialistas.

Os sucessivos xitos eleitorais cegava-os em relao ao perigo representado pelas foras reacionrias e gestao da crise econmica que abalaria o sistema capitalista um ano depois. A social democracia ainda sonhava com um capitalismo humanizado e sem crises, no qual a classe operria, atravs de instituies democrticas, pudesse pacificamente chegar ao socialismo. Estas concepes ajudaram a desarmar parcelas importantes das massas trabalhadoras e foram responsveis por uma das maiores derrotas polticas do proletariado internacional.

Em junho de 1931, dois aps o cataclismo econmico que eles no previram, os social-democratas realizaram um novo congresso. Nele foi constatada a profundidade da crise, a maior que o capitalismo j havia atravessado, mas nas suas resolues no se dedicou nenhuma linha sobre a necessidade de se aproveitar a crise para por em xeque o sistema capitalista. Ainda alimentavam uma esperana na rpida recuperao da economia de mercado. Por isso fizeram todos os esforos para conjurar a crise, mesmo que significasse recomendar aos trabalhadores que apertassem ainda mais os seus cintos. Um dirigente do PSDA afirmou no congresso do partido em Leipzig (1931): achamo-nos ao lado do capitalismo no seu leito de morte, mas no apenas apara fazer o diagnostico da sua doena. Estamos condenados a sermos o mdico que quer cur-lo. Outro dirigente social-democrata disse: evidentemente, neste caso, toda a social democracia se desempenha em conjurar a bancarrota do capitalismo. Eles sabiam que sem a expanso do capitalismo no existe projeto social-democrtico que prospere.

O PSDA: da prudncia ttica ao nazismo O ano de 1928 foi um ano bom para o capitalismo alemo, ele voltava a ultrapassar o ndice de crescimento de antes da guerra e isso se deu graas ao ingresso em grande escala de capitais norte-americanos, atravs do plano Dawes. Reduziu-se o desemprego e aumentou o poder de barganha dos sindicatos. Nesse quadro favorvel ocorreu o crescimento do Partido Social-Democrata que chegou a obter nove milhes de votos. Ele passou a compor, novamente, o governo em aliana com partidos democrticos burgueses. Herman Muller, lder do PSDA, foi indicado chanceler de Reich e Hilferding assumiu o ministrio das finanas.

A social democracia no governo seguiu fielmente as diretivas econmicas impostas pelos norte-americanos. A burguesia pressionava no sentido de que o governo no fizesse concesses ao movimento sindical e ainda retirasse algumas conquistas. E quando a direita unificada exigiu a deposio de Hilferding, os social-democratas nada fizeram para manter seu companheiro no cargo.

A crise econmica eclodiu em 1929 e os trabalhadores se radicalizam. Passaram a exigir medidas efetivas contra o desemprego e a degradao do nvel de vida. A burguesia, por sua vez, exigiu do governo a reduo dos gastos pblicos e o fim do seguro-desemprego que, afirmavam, onerava o Estado. A social democracia se viu prensada entre dois blocos antagnicos e sua situao se tornou insustentvel. Em maro de 1930, poucos meses depois do inicio da crise econmica, caiu o governo social-democrata.

A crise desestruturou a economia alem e levou ao agravamento da radicalizao poltica. Diante do crescimento da influencia comunista, a grande burguesia passou a apostar suas fichas numa soluo autoritria, atravs do Partido Nacional-socialista (nazista). A extrema-direita colheu os frutos do desgaste dos social-democratas e democratas burgueses e ganhou o apoio de parcelas importantes das classes mdias tradicionais. Em 1928 os nazistas elegeram apenas 12 deputados; em 1930 este nmero subiu para 230.

Entre 1930 e incio de 1933 a Alemanha teve quatro chanceleres. Finalmente, no dia 30 de Janeiro daquele ano, Hitler foi indicado para o cargo. Assim, os nazistas chegaram ao poder atravs dos meios democrticos oferecidos pelas instituies burgueses da Repblica de Weimar. O PSDA, em nome da prudncia ttica, no ops resistncia - inclusive desaconselhou o uso da greve geral para impedir a consolidao dos nazistas no poder. Hitler chegando ao poder por meios democrticos era melhor que um Hitler que viesse imposto atravs de um golpe de fora, afirmavam os lderes social-democratas. O que constatariam, pouco tempo depois, era que independentemente do modo que os nazistas chegassem ao poder o resultado final seria o mesmo: violncia e morte para classe operria.

Hitler no poder iniciou, imediatamente, uma violenta represso contra o movimento operrio independente, especialmente contra os comunistas. Aproveitando-se do incndio criminoso do parlamento alemo, os nazistas prenderam e assassinaram milhares de militantes comunistas e colocaram o Partido Comunista na ilegalidade. Os dirigentes do PSDA calaram-se diante da represso, embora se posicionassem contra a lei de exceo que autorizava o governo ditar leis sem a necessria aprovao do parlamento alemo.

A direo do PSDA, receosa de uma possvel decretao de sua ilegalidade e do confisco do seu poderoso aparelho (sedes, grficas, editoras, livrarias etc.), fez uma srie de concesses ao governo nazista. O partido se retirou da IOS, quando ela passou a dirigir criticas mais duras represso que ocorria na Alemanha, depois se viu obrigado a excluir de sua direo todos judeus, que foram abrigados a se exilar. Os sindicatos, por sua vez, se desvincularam do PSDA e chegaram mesmo a participar de atividades organizadas pelo governo nazista.

No dia 10 de maio, apesar das sucessivas concesses, tropas alems ocuparam as sedes e oficinas do PSDA e seqestraram os seus fundos partidrios. Os dirigentes que conseguiram escapar da onda de prises fugiram para o exterior. E, assim, chegou ao fim o maior partido social-democrata do mundo.

A Viena Vermelha e o fim da alternativa centrista O Partido Socialista Austraco (PSA) era considerado a esquerda da social democracia europia e se colocava como alternativa entre o reformismo e o bolchevismo. Depois de uma breve participao no governo central, foi derrotado eleitoralmente. Mas os social-democratas mantiveram um slido baluarte no governo da capital, cognominada de Viena Vermelha.

O novo governo central conservador, e a grande burguesia, temendo o avano do movimento operrio, incentivaram a criao de uma fora paramilitar de direita especializada em realizar atos de provocao contra as organizaes de esquerda. Por sua vez os socialistas tinham sua prpria milcia armada os Schutzbund que contavam com mais de dez mil membros, a maioria composta de operrios.

A situao se tornou crtica quando um corpo de jurado conservador absolveu membros da milcia direitista, comprovadamente envolvidos no massacre de vrios operrios socialistas. Os trabalhadores revoltados incendiaram o Palcio da Justia. Nos conflitos que se seguiram 85 manifestantes foram mortos e mais de mil ficaram feridos. O PSA convocou uma greve geral que paralisou quase todos os centros operrios, especialmente Viena. Os trabalhadores exigiam a renncia do governo conservador, mas a maioria do parlamento se manteve irredutvel e reiterou seu apoio ao governo e a represso.

O movimento grevista chegou ento a um impasse. Naquele momento cabia a direo social democrata resolver se deveria ser usada a violncia revolucionaria contra a reao, que j ameaava a prpria democracia burguesa, ou se deveria recuar. Os austro-marxistas, como eram chamados, optaram pela segunda alternativa. Esta atitude seria fatal para o movimento operrio austraco e para o prprio Partido Socialista.

Em 1932, o fascista Dolfus assumiu a chancelaria e deu um golpe contra o parlamento, assumindo poderes ditatoriais. Aumentou a represso contra os sindicatos e aos partidos de esquerda, determinou o desarmamento das organizaes operrias, enquanto os grupos para-militares fascistas continuavam impondo terror entre a populao.

Em Fevereiro de 1934 as foras governamentais ocuparam a sede e as oficinas do PSDA em Linz. Os milicianos do Schutzbund resolveram reagir e partiram para a resistncia armada, mesmo sem a autorizao da direo do PSA. O levante operrio se estendeu por vrias cidades. Em Viena a direo nacional do partido decidiu, por maioria de apenas um voto, deflagrar uma nova greve geral. Uma parte das milcias socialistas de Viena partiu para a luta armada contra as tropas do governo e os grupos para-militares. A direita do partido permaneceu imvel, esperando o desenrolar dos acontecimentos. A luta herica dos operrios se estendeu por mais de quatro dias, at que os ltimos redutos caram sob os ataques cerrados do exrcito austraco, auxiliado pelos grupos fascistas.

O partido Socialista e os sindicatos a ele ligados foram interditados e vrios de seus membros presos. Era o fim da Viena vermelha e da alternativa centrista. Um partido com 600 mil membros, que obteve mais de 40% dos votos para o parlamento e que possua um contingente de cerca de 10 mil homens armados deixou-se golpear pouco pouco, quase sem resistncia, at ser eliminado da cena poltica. Apesar de seus discursos e ameaas de utilizar da fora para a defesa das instituies democrticas burgueses, o medo da guerra civil foi ainda maior. Assim, os socialistas perderam a oportunidade histrica de barrar o fascismo na ustria. Em pouco tempo o pas seria anexado Alemanha nazista. A Segunda Guerra j batia s portas da Europa.

O ltimo ato O avano sem precedente da reao europia no incio dos anos 1930 imps a necessidade de um entendimento entre as duas internacionais. Em 1934, pouco tempo aps a queda de Viena, reuniram-se os representantes da IOS e da Internacional Comunista para discutir a situao mundial e estabelecer um plano conjunto de combate ao nazi-fascismo. Mas, esta unidade tinha muito de formal, pois existia uma forte resistncia por parte da direita social-democrata a adotar uma poltica de frente-nica com os comunistas.

Entre 1937 e 1938 os processos de Moscou serviram de pretexto para o rompimento das relaes entre as duas internacionais e a IOS radicalizou suas posies anticomunistas. Esta atitude dificultou ainda mais a construo da unidade operria internacional contra o fascismo.

Os interesses nacionais, nas vsperas da II Guerra Mundial, dividiram cada vez mais os partidos que compunham a IOS. Os da Blgica, Noruega e Sucia anunciaram em 1938 que permaneceriam neutros em caso de um conflito mundial. O Partido Trabalhista Britnico e a SFIO francesa defenderam a formao de um bloco militar contra a Alemanha nazista. Em outubro de 1938 a executiva da IOS no conseguiu elaborar um texto de consenso condenando a posio agressiva da Alemanha. Ela se reduziu a exigir que fossem respeitados os direitos democrticos das populaes dominadas e anexadas pelo III Reich.

Friedrich Adler, que havia renunciado a secretaria-geral da IOS, afirmou amargurado: ns estamos hoje mais afastados do que nunca do que deveria ser uma verdadeira internacional. A ultima reunio da IOS se deu no dia 23 de abril de 1940 e nela foi aprovado um manifesto em defesa da paz que no continha nenhuma crtica de fundo a poltica guerreira de Hitler e seus asseclas.

Quando as tropas nazistas invadiram a neutra Blgica, os membros direo da IOS fugiram para Londres. Comprovou-se assim que as internacionais social-democratas no haviam sido feitas para enfrentarem momentos agudos de crise. Como afirmaria o historiador socialista ingls G.D.H, A diferena em relao a II internacional de antes da primeira guerra que dessa vez que ningum esperava mais nada dessa organizao.

____________________________________________

Nota

Esta a terceira parte do artigo sobre a histria das internacionais social-democratas. A bibliografia sobre o tema ir ao ar juntamente com a quinta e ltima - parte.

A historia da social democracia (4)

A Internacional Socialista (1945-1985) Na quarta e quinta parte desse artigo no se far uma anlise da natureza de classe da social democracia moderna ou da complexa relao entre partido-sindicato-Estado nos pases onde ela exerceu uma real influncia. O seu objetivo mais modesto. Elas buscaro expor, sucintamente, a atuao da Internacional Socialista desde sua criao em 1945 at meados da dcada de 1980, em especial sua relao com os pases dependentes, expondo o carter contraditrio, e muitas vezes contra-revolucionrio, de sua interveno.

A derrota do nazi-fascismo criou condies mais favorveis para o avano da unidade de ao entre as foras de esquerda do mundo. Neste processo, a URSS e os partidos comunistas jogaram um papel destacado por isso saram do conflito mundial com uma fora poltica redobrada e sendo reverenciados por grande parte dos trabalhadores e pelas correntes democrticas de todo o mundo. Os partidos comunistas da Europa, vanguardas da resistncia antifascista, saram da clandestinidade para se constiturem em organizaes de massa. Nos governos de coalizo, criados no imediato ps-guerra, os comunistas participaram ao lado dos socialistas e liberal-democratas. A febre da unidade tambm tomou conta do movimente operrio e popular. Mesmo os inimigos da unidade foram obrigados a se curvarem diante da presso de suas bases.

Na primeira conferncia oficial dos partidos socialistas, ocorrida em 1946, os representantes de diversos partidos reafirmaram a necessidade da unidade do movimento operrio e sindical internacional. O trabalhista ingls Harold Laski, representando o esprito reinante, afirmou: Se lograr a cooperao da Rssia com a Internacional Socialista, em 20 anos a Europa se converter em um continente socialista.

No seio deste conclave ocorreram srias discordncias quanto ao problema da fundao de uma nova internacional e qual deveria ser seu carter naquele momento. De um lado, existiam aqueles que desejavam a criao imediata de uma nova organizao internacional, com o claro objetivo de demarcar campo com os comunistas e dificultar as aes conjuntas; de outro, existiam os que se posicionavam contra a fundao imediata porque, no fundo, alimentavam a esperana na construo de uma nova organizao que congregassem socialistas e comunistas, a exemplo do que havia ocorrido no campo sindical com a fundao da Federao Sindical Mundial em 1945. Mas, devido s divergncias apenas foi possvel formar um frgil comit de ligao e informao, coordenado pelos trabalhistas britnicos.

Os Estados Unidos e a grande burguesia europia no podiam observar impassveis os avanos do movimento comunista e de unidade do movimento operrio e sindical. Na Europa, os partidos comunistas consolidavam suas posies e se tornavam os principais partidos na Frana e na Itlia. Esta tendncia poderia ser constatada em quase todas as partes do mundo. As democracias populares do leste europeu tambm definiam seu caminho rumo ao socialismo. Somavam-se a isso o impulso adquirido pelas lutas de libertao nacional na frica e na sia. Os imprios coloniais desabavam como castelos de cartas e se reforava o esprito nacionalista entre os povos das naes economicamente dependentes. Era preciso pr um freio nesta situao, pensavam os grandes grupos imperialistas. O tempo dos acordos e da coexistncia pacfica estava chegando ao fim.

Em maro de 1946 os primeiros sinais desta mudana de ventos j podiam ser observados. O ex-primeiro-ministro britnico, Churchill, quando em vista aos EUA, fez um virulento ataque URSS e s democracias populares, apelando para o rompimento de todos os pactos com aqueles pases e a formao de uma aliana poltico-militar ocidental contra uma suposta ameaa sovitica. Este apelo calou fundo na conscincia conservadora dos governos e da grande burguesia dos pases capitalistas. Era o incio de uma guerra fria que incendiaria vrias partes do planeta.

Um ano aps do discurso de Churchill, o presidente estadunidense Harry Truman anunciou uma nova doutrina de poltica externa na qual os EUA deveriam assumir o papel de xerife do mundo e estavam autorizados a intervir militarmente em todas as partes onde os interesses do mundo livre estivessem ameaados. Poucos meses depois o Secretrio de Estado, General Marshall, apresentou ao congresso um programa para a reconstruo da Europa que previa pesados investimentos, mas as condies para o recebimento desses emprstimos eram lesivas soberania destes pases e tinham implicaes poltica srias.

O Plano Marshall tinha, basicamente, dois objetivos: primeiro, fortalecer o capitalismo naquela parte do mundo, que se encontrava bastante debilitado pelos resultados da guerra e pelo ascenso do movimento operrio dirigido pelos comunistas; segundo, colocar as burguesias destes pases sob a orientao poltica e militar do imperialismo norte-americano. Neste sentido ele foi bem sucedido, pois conseguiu arrastar os pases europeus para um bloco militar hostil URRS que culminou com a criao do Pacto do Atlntico Norte em 1949.

Estas alteraes na conjuntura mundial tiveram reflexos na poltica interna de cada pas e a social democracia no pode ficar margem deste movimento de radicalizao poltica e social. Novamente diante dela se colocou a questo: marchar com o socialismo ou capitular diante da grande burguesia e do imperialismo?

Na Europa, como conseqncia direta do Plano Marshall, os comunistas foram afastados dos governos de coalizo e a sua ao passou a ser duramente reprimida. Nos fins de 1947, em meio aos primeiros conflitos da guerra fria, foi convocada uma nova conferencia dos partidos social-democratas. A luta de tendncias ganhou vulto e se consolidaram dois blocos, um majoritrio, que assumiu a defesa intransigente do Plano Marshall e outro, minoritrio, que o criticava por seu carter imperialista e pelos efeitos que acarretaria no processo de unidade do movimento operrio e socialista internacional. Entre os primeiros estavam os grandes partidos social-democratas da Alemanha, Inglaterra e Frana. No segundo grupo estavam os partidos socialistas da Itlia e do leste europeu.

Nesta conferncia foi criado um comit internacional para coordenao dos partidos socialistas. Este verdadeiro embrio da nova Internacional Socialista acabou se constituindo num instrumento de propaganda do Plano Marshall entre os partidos e sindicatos europeus e um de diviso entre os trabalhadores.

Os lderes social-democratas acreditavam que a injeo de capitais americanos poderia reacender a chama da produo e com isto minorar a crise que atravessava o capitalismo europeu. A recuperao da economia era condio fundamental para o sucesso do seu projeto reformista. A estagnao e crise, segundo eles, criavam o caldo cultural para a radicalizao operria e o crescimento da influencia comunista, solapando sua base poltico-eleitoral.

A situao se agravou depois dos acontecimentos na Tchecoslovquia. Em 1948 os partidos burgueses abandonaram o governo tcheco, buscando desestabilizar o regime democrtico e popular. Diante desta manobra, os operrios dirigidos pelo Partido Comunista - e apoiados pelos socialistas de esquerda - se mobilizaram e conseguiram barrar a ao dos golpistas, garantindo a manuteno de um governo com hegemonia comunista e apressando a caminhada no sentido da construo do socialismo no pas.

A direita da social democracia, sob presso da burguesia europia, passou ofensiva. Aproveitando-se de sua maioria no Comit Internacional, expulsou os socialistas tchecos e iniciou um processo para expulso dos partidos da Romnia, Bulgria e Hungria. Contra eles pesava a sria acusao de manterem unidade de ao com os comunistas. A direo do Comit enviou tambm um ultimato aos partidos da Polnia e da Itlia no qual afirmava: escolham entre a submisso ao Cominform ou a livre cooperao socialista. Como se pode ver, a cooperao passaria a no ser to livre assim. Os poloneses e Italianos acabariam por se afastar da organizao. O prximo passo do Comit foi aceitar a participao de grupos socialistas de direita exilados da URSS e do Leste-europeu. O anticomunismo passou a ser condio fundamental para o ingresso na nova Internacional Socialista que se formava.

Em 1948, por iniciativa do governo trabalhista ingls, firmou-se o Tratado de Bruxelas, que seria o embrio da famigerada OTAN. Dos 12 pases que iriam assinar o Pacto Atlntico, sete possuam governos com participao social democrata. Trs anos depois, em 30 de junho de 1951, expurgados todos aqueles que pudessem pr em risco os seus planos de capitulaes diante da burguesia, a direita social-democrata pode constituir sua prpria Internacional. A conferncia de fundao da Internacional Socialista, realizada em Frankfurt, aprovou um documento que seria o programa para ao poltica da social democracia nas dcadas que se seguiriam: a Declarao de Tarefas e Objetivos do Socialismo Democrtico.

Este programa, ao contrrio dos anteriores, era marcado pela neutralidade ideolgica. O marxismo deixava de seu sua nica e principal referncia. Ele recusa um critrio uniforme, pois os socialistas j basearam suas convices no marxismo, nos princpios religiosos e humanistas, pois todos eles se orientam para um mesmo objetivo: um sistema de justia oficial, de busca de uma vida melhor, da liberdade e paz universal. Durante o congresso, o trabalhista ingls Morgan Phillips eleito primeiro presidente da IS - se gabou do fato do movimento operrio ingls nunca ter aceito as concepes marxistas sobre a luta de classes. Esta maneira desideologizada e pragmtica - de compreender o socialismo s tendeu a se agravar com o passar dos anos e o prprio termo marxismo desaparecia dos documentos de vrios partidos socialistas.

Os socialistas, afirmava a Declarao, lutavam para construir uma sociedade nova dentro da liberdade e por meios democrticos. O caminho para o socialismo era o caminho das urnas e a principal arma era o voto. E isto, segundo eles, estava mais que do que comprovado pelas vitrias eleitorais obtidas pelos socialistas europeus. O documento ia mais longe ao afirmar que nos pases capitalistas governados pelos social-democratas j estavam assentadas as bases da sociedade socialista, pois ali estavam desaparecendo os males do capitalismo e a sociedade se desenvolvia com um novo vigor. Decerto, este socialismo s foi possvel graas ao incentivo dos dlares ianques, talvez por isso na declarao no constasse nenhuma palavra crtica sobre o imperialismo e o perigo que ele representava para a paz mundial naquele momento.

A Declarao de Oslo de 1962 seguiria na mesma direo: A ao dos partidos socialistas, trabalhando em ligao estreita com os sindicatos (...) corrigiu os piores excessos do capitalismo. Novas formas de propriedade e o controle da produo apareceram. O desemprego massivo foi vencido, as horas de trabalho diminuram, a seguridade social foi instaurada e a formao escolar alargada. Mesmo onde os partidos socialistas esto na oposio, os governos foram obrigados, sob presso da opinio pblica, a adotar solues, essencialmente, socialistas sobre o problema do pleno emprego e do bem-estar social. Por tudo isso, afirmaram que muito do que seria uma democracia socialista j havia sido realizada na Europa Ocidental e com a ajuda, ou omisso, da prpria burguesia.

Os documentos da Internacional Socialista reafirmaram sua compreenso da democracia (burguesa) como valor universal. Mas, chegaram mesmo a retroceder de suas posies reformistas para posies abertamente conservadoras ao verem nas democracias ocidentais instrumentos privilegiados para a construo do socialismo e que por isto mesmo deveriam ser defendidas contra uma hipottica ameaa sovitica e o mpeto contestatrio da prpria classe operria alem. Este mesmo Estado democrtico alemo ocidental, com o aval social-democrata, colocou na ilegalidade o Partido Comunista e seus principais lderes na priso. A prpria direo social-democrtica, em nome da defesa do Estado (democrtico), defendeu a demisso dos comunistas e socialistas de esquerda dos empregos que exerciam nos servios pblicos.

Em outro documento (1951) a Internacional Socialista afirmaria que o movimento comunista internacional instrumento de um novo imperialismo. Esta posio anticomunista a acompanharia durante toda sua vida. A Declarao de Oslo (1962), por exemplo, no se intimidou em afirmar, entre outras coisas, que a China representava o principal perigo aos pases da sia e os lderes comunistas eram os principais responsveis pelas rivalidades entre o Leste e Oeste.

Estas avaliaes distorcidas serviro de base para justificar o apoio incondicional poltica militarista norte-americana representada pela OTAN. Nesta mesma Declarao de 1962 os social-democratas afirmaram: rejeitamos a idia do desarmamento das democracias ocidentais. O poder defensivo em caso de ataques deve ser preservado como meio de desencorajar a agresso. (...) Os partidos dos pases membros da OTAN a consideram como um poderoso instrumento para a paz e, por isso, afirmam a sua vontade de mant-lo. Para ela o princpio da soberania nacional ilimitada deveria ser abolido. Estas formulaes instrumentalizariam terica e politicamente a defesa que alguns partidos socialistas fariam das aspiraes colonialistas de suas respectivas burguesias na frica e na sia.

_________________________________

Nota

Esta a quarta parte do artigo sobre a histria das internacionais social-democratas. A bibliografia sobre o tema ir ao ar juntamente com a quinta e ltima - parte.

A histria da social democracia (final)

A Internacional Socialista e o neo-colonialismo Desde 1954 o povo argelino vinha lutando pela libertao de seu pas do jugo francs. A Seo Francesa da Internacional Operria partido filiado Internacional Socialista -, se colocou ao lado das pretenses imperialistas da burguesia francesa. Em 1956, Guy Mollet, vice-presidente da Internacional Socialista, foi eleito primeiro-ministro e manteve a guerra sanguinria contra o povo argelino, compactuando com mtodos fascistas empregados pelo exrcito francs contra a resistncia daquele pas. Diante da crtica mundial Pierre Comim, tambm da direo da SFIO, afirmou: Ns socialistas nos negamos a considerar que a fase nacionalista seja meio para lograr a libertao do homem (...) dever dos socialistas ajudar a evitar esta fase perigosa e avanar at formas mais desenvolvidas de cooperao entre os povos da colnia e da metrpole. Mas, como poderia haver cooperao amigvel entre o imperialismo e um povo subjugado?

No mesmo ano estourou um novo conflito, desta vez no Oriente Mdio. O presidente Nasser, do Egito, seguindo uma poltica de carter nacionalista, assumiu o controle do Canal de Suez. Mais que depressa uma aliana de trs paises (Frana, Inglaterra e Israel) ameaou atacar o Egito. Na direo de dois desses governos (Frana e Israel) se encontravam partidos socialistas. Dessa vez seria o prprio primeiro-ministro socialista francs que responderia s criticas internacionais: a expedio a Suez se situava no esprito internacionalista e de solidariedade socialista, pois ns estamos salvando Israel, um pequeno pas que marcha para o socialismo em face do ditador Nasser. O cinismo aqui chegou aos seus limites.

Em todos esses acontecimentos a Internacional Socialista no deixou de emitir criticas, mas em nenhum momento ousou tomar medidas contra seus membros que se viram envolvidos nestas aventuras imperialistas. No congresso de 1959, o Partido Socialista Uruguaio fez pesadas crticas ao comportamento de diversos partidos e solicitou a expulso da SFIO. A direo achou por bem ignorar a solicitao. Indignados, os uruguaios abandonaram a organizao, que acabou perdendo seu principal membro na Amrica Latina.

As posies pr-imperialistas adotadas pela maioria dos membros da Internacional, mantinham afastados os partidos reformistas e nacionalistas dos demais continentes. Muitos deles at desejariam uma aproximao, mas se tornava impossvel defender em seus pases qualquer ligao com uma organizao encarada como um brao esquerdo da poltica colonialista da burguesia europia. A IS, portanto, continuava a ser uma entidade de partidos reformistas da Europa Ocidental. No entanto, ela no podia ficar de olhos fechados diante dos movimentos de libertao nacional e dos novos pases que surgiam da luta contra o colonialismo. Em 1960, a IS realizou a primeira conferncia fora da Europa, em Haifa (Israel). Este ato simblico sinalizava uma tentativa de aproximao com a frica e sia.

Analisando essa nova poltica, o The Times afirmou: o objetivo dos lderes da IS impedir que os partidos dos novos estados caiam sob o controle comunista. Isso foi reconhecido pelos prprios dirigentes da Internacional. Saragat escreveu: os 800 milhes de pessoas que se libertaram neste ltimo ano do colonialismo vo influir decididamente sobre a futura evoluo da humanidade. Se se deixaro seduzir pelo comunismo ou se uniro sob as bandeiras do socialismo democrtico uma questo decisiva.

No seu VII Congresso participaram, pela primeira vez, representantes de organizaes africanas. Estiveram presentes partidos da Nigria, Tanganica, Senegal, Madagascar e Camerun. Desses apenas os partidos do Camerun e de Madagascar se filiaram Internacional. A Declarao de Oslo (1962) afirmaria que a Internacional reconhecia o direito dos povos autodeterminao, mas alertava s novas naes que o nacionalismo levado a seus extremos podia levar runa da liberdade e do progresso humano e que, por isso, era preciso evitar excessos nacionalistas. A sada apontada era a cooperao fraterna entre os pases desenvolvidos (exploradores) e os pases subdesenvolvidos (explorados).

Apesar de todos os esforos, ainda na dcada de 1960, a Internacional Socialista continuava sendo uma organizao de partidos social-democratas da Europa Ocidental. Dos seus 40 membros apenas sete representavam sia, frica e Amrica Latina. Uma das alternativas encontradas para driblar o embarao dos dirigentes reformistas do terceiro mundo foi a alterao dos seus estatutos. Incluiu-se, assim, um artigo que permitiria a participao de observadores convidados nas suas reunies. Esta medida, segundo Sibiliov, abriu as portas para muitas organizaes que estavam dispostas a cooperar sem se converter em membros plenos, para no assumirem a responsabilidade pelas decises e aes daquela organizao.

A partir dos fins da dcada de 1960, a crise do capitalismo se agravou. Segundo Sibilov, o aumento das dificuldades econmicas dos pases capitalistas, o incremento da luta entre eles pelos mesmos mercados, pelas fontes de matrias-primas (especialmente petrleo) conduziu a crescentes contradies de muitos governos presididos pelos partidos social-democratas, que defendiam os interesses de seus pases e buscavam limitar a influncia das transnacionais norte-americanas.

A primeira divergncia pblica mais aguda entre a direo da Internacional Socialista e a poltica externa dos Estados Unidos se deu em 1965, quando da interveno norte-americana na Repblica Dominicana, e a segunda durante a guerra do Vietn. Por algum tempo ela havia acompanhado impassvel s agresses militares no sudeste asitico, mas vrios partidos e sindicatos ligados social democracia aderiram campanha internacional contra a guerra. Dentro dos principais partidos ocorreu uma luta entre aqueles que desejavam manter a subordinao poltica norte-americana e aqueles que desejavam uma maior independncia. No congresso do Partido Trabalhista Britnico (1965) uma moo condenando os bombardeios indiscriminados contra o Vietn do Norte foi derrotada, pouco tempo depois esta mesma moo seria aprovada no Congresso dos Sindicatos Britnicos. Na Sucia, o prprio primeiro-ministro Olaf Palmer liderou manifestao de protesto contra a agresso americana, o que custou o rompimento das relaes diplomticas entre os dois pases. Mas, somente em 1972 a Internacional Socialista se colocou de maneira mais decidida contra a inveno militar americana no Vietn.

Uma srie de acontecimentos reforou ainda mais a tendncia anti-americana dentro da militncia social-democrtica. Primeiro, o golpe militar na Grcia (1967) e a gota dgua foi o golpe militar contra o governo socialista de Salvador Allende no Chile (1973), ambos dado com apoio direto dos EUA. O Partido Socialista Chileno, que foi desalojado do governo e teve seus dirigentes presos e assassinados, era ligado Internacional Socialista. A experincia chilena era divulgada como um modelo para a Amrica Latina e demais pases do terceiro mundo - de como se podia avanar para o socialismo pela via pacfica. Esse acontecimento criou um profundo mal-estar nas fileiras social-democratas, o que levou a uma radicalizao de suas posies.

No congresso do agora Partido Socialista Francs, Pontillon afirmou que os socialistas tambm deviam tratar de criar uma Europa independente porque hoje ela se encontrava ameaada pelo domnio econmico do imperialismo americano. O secretrio-geral do Partido Socialista Operrio Espanhol, Felipe Gonzles, exortou o governo espanhol a romper os acordos com os EUA sobre as bases militares, porque eles submetiam a poltica exterior do pas aos interesses dos EUA. Neste mesmo perodo, o presidente do PSDA, Willy Brandt, qualificou de absurda a proposta dos EUA de aumentar os gastos militares em detrimento dos gastos sociais.

um fato que toda essa retrica no se traduziu em medidas efetivas e mesmo esses partidos quando estiveram nos governos no romperam os laos econmicos e militares que os prendiam ao imperialismo norte-americano, mas nem por isso deveramos menosprezar tais declaraes. Ela, em certo sentido, mostravam a existncia das contradies criadas pelas disputas inter-imperialistas e refletiam as presses efetuadas pela base social dos partidos socialistas que se radicalizava.

No congresso realizado em 1976, a IS tentou mostrar ao mundo que trilhava novos rumos, rompendo com a lgica dos grandes blocos e sinalizando uma aproximao maior com o terceiro mundo. Nele, o alemo Willy Brandt foi eleito presidente e sueco Berndt Carlson indicado para a secretaria-geral. Os trabalhistas ingleses, mais conservadores, passaram para uma posio secundaria na organizao.

A constatao da existncia de certas contradies com imperialismo americano, no entanto, no deve levar-nos a falsas concluses quanto ao carter desta organizao. Ela continuou desempenhando um papel ativo na luta contra as transformaes revolucionarias e socialistas no mundo. Esta continuou sendo a essncia de sua poltica.

A Internacional Socialista e a Amrica Latina Ainda em 1976, dentro da sua nova estratgia de aproximao dos movimentos democrticos e nacionalistas latino-americanos, a Internacional realizou uma reunio na Venezuela. Em 1980 realizou-se na Republica Dominicana a Primeira Conferncia sobre os problemas da Amrica Latina e Caribe, na qual os partidos socialistas condenaram a campanha caluniosa contra a Nicargua e a poltica dos EUA, que estrangulava o desenvolvimento econmico do pas. Declararam tambm seu apoio Frente Sandinista de Libertao Nacional e Frente Democracia e Revolucionaria de El Salvador. Posies que foram ratificadas no congresso da Internacional em Madri.

Os resultados desta ofensiva da Internacional Socialista foram significativos. Se em Genebra somente sete partidos da Amrica Latina eram membros, no congresso da Madri (1980) o seu nmero mais que dobrou, chegando a 15 membros. A prpria Frente Sandinista passou a tomar acento nas reunies da organizao como observadora.

Os objetivos de tais aproximaes eram claros. Em primeiro lugar, visavam desbancar a hegemonia norte-americana na regio e, em segundo lugar, impedir que os movimentos revolucionrios da Amrica Latina e Caribe se ligassem a Cuba e radicalizem suas posies no sentido de levar as suas revolues at s ltimas conseqncias, ou seja, at a construo efetiva do socialismo. Era preciso afastar estes dois perigos para que pudessem ser criadas melhores condies para o ingresso de capitais europeus na regio.

No Brasil a ofensiva da Internacional Socialista se deu no final da dcada de 1970, em pleno ascenso do movimento da oposio democrtica e popular ditadura militar. Em fevereiro de 1978, Brizola participou de uma reunio do Bureau da Internacional onde travou contatos com Willy Brandt e, sob auspcios deste ltimo, organizou em Lisboa a primeira reunio de socialistas brasileiros, cujo objetivo era discutir a formao de um partido de tipo social-democrata no Brasil.

Em outubro de 1984, no governo do general Figueiredo, ainda com os partidos comunistas na ilegalidade, realizou-se no pas uma nova reunio do Bureau da Internacional. Desta participaram representantes do PDT, PT e do PMDB. Diante do naufrgio da tentativa de se constituir um partido social-democrata nico, a Internacional passou a relacionar-se e a investir em varias alternativas partidrias no pas.

Ao afirmarmos a essncia no-revolucionaria da social-democracia em geral, no devemos chegar concluses falsas e sectrias sobre a impossibilidade dos comunistas fazerem alianas - ou estabelecerem pontos de unidade - com as direes dessa corrente. A social democracia, em determinadas condies, movida pelas contradies de um pas capitalista dependente, pode se constituir numa aliada importante na luta contra os projetos conservadores e ditatoriais das classes dominantes. Estas organizaes podem cumprir tambm algum papel, ainda que de maneira vacilante, na luta contra o imperialismo norte-americano. Mas, esta unidade de ao deve ser acompanhada por uma luta permanente no seio da frente no sentido de construir uma hegemonia verdadeiramente socialista e revolucionaria no processo de transformao da sociedade brasileira e latino-americana.

Concluso A Internacional Socialista nunca se constituiu numa verdadeira Internacional, entendida como uma organizao que se pautasse, fundamentalmente, pelo princpio internacionalista da solidariedade operria e cumprisse um papel de coordenao e apoio luta dos trabalhadores de todo o mundo contra o capital e o imperialismo. Essa Internacional nasceu como um aglomerado de partidos social-democratas da Europa Ocidental, que tinha como principal objetivo barrar o avano da conscincia revolucionaria dos operrios. Assim, nesse perodo inicial, cumpriu o infame papel de alinhar parte da classe operria ao lado de suas respectivas burguesias - e do imperialismo norte-americano -, contra as organizaes operrias comunistas e o bloco socialista. Mesmo com a incluso de novos partidos da frica, sia e Amrica Latina essa hegemonia ocidental no foi quebrada. As alteraes efetuadas na dcada de 1970 apenas a transformaram num instrumento mais eficaz na cooptao de novos partidos para a influncia poltico-econmica das potncias capitalistas europias.

Outra de suas caractersticas foi que jamais conseguiu tomar decises que fossem acatadas minimamente pelos partidos a ela filiados, pois existia uma forte tendncia de cada organizao colocar os interesses das burguesias de seus pases (e tambm de parcelas privilegiadas da classe operria) acima dos interesses histrico-universais dos trabalhadores. Cada vez que os interesses locais entravam em choque com os princpios do internacionalismo, os dirigentes desses partidos no tiveram dvidas em optar pelos interesses menores de seus prprios pases capitalistas.

Foi este esprito mesquinho que conduziu bancarrota a II Internacional em 1914 e mais tarde, na dcada de 1930, levou a falncia a Internacional Operaria e Socialista. A essncia do projeto social-democrata se contrape ao verdadeiro esprito do internacionalismo proletrio. Este s pode ter por base o marxismo revolucionrio, ou seja, uma concepo despojada de todo reformismo e social-patriotismo, to tpicos da conscincia pequeno-burguesa e tambm compartilhada por uma reduzida camada dos operrios que se beneficiam ou pensam em se beneficiar - das migalhas que caem da mesa do grande banquete imperialista.

____________________________________

Bibliografia

ABENDROTH, Wolfgang - A histria do movimento trabalhista europeu, Ed. Paz e Terra, 1977.

AMAZONAS, Joo A social-democracia, instrumento do capitalismo in Princpios, n2, Ed. Anita Garibaldi, S.P., junho/1981

ANDERSON, Perry Antinomias da social democracia. Jornal Em Tempo, fev. de 1990.

BERTELLI, Antnio R. Marxismo e transformaes capitalistas, Instituto Astrojildo Pereira/IPSO, 2000

COLE, G.D.H., Historia del pensamiento socialista, vol.V a VII, Ed. Fondo de Cultura Econmica, Mxico, 1975.

CARONE, Edgard A II Internacional pelos seus congressos (1889-1914), Ed. Anita Garibaldi/Edusp, S.P. 1993

DUARTE, A. e MIRANDA, O. - O trabalhismo e social democracia, Ed. Global, 1985.

JAGUARIBE, Hlio (org.) - A proposta social-democrata, Livraria Jos Olympio, 1989.

LEFRANC, Georges O socialismo reformista, Ed. Difel, 1974

LNIN, V. I. - A falncia da II Internacional, Ed. Kairs, 1979.

MAYER, Thomas - Socialismo democrtico: uma introduo, Ed. Paz e Terra e Friedrich Ebert Stiffung, 1983.

PORTELLI, Hugues (org) LInternational Socialista, Les editions Ovrire, Paris, 1983

POULAIN, J. (org) - A social democracia hoje, Ed. Civilizao Brasileira, 1980.

ROSENBERG, Arthur Democracia e socialismo, Ed. Global, S.P., 1986

SIBILIOV, N. - La Internacional Socialista, Ed. Progresso, Moscou, 1980.

SOBOLEV, A (org) A Internacional Comunista, vol. 1 e 2, Ed. Avante!, Lisboa, 1988