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Departamento de Geografia Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas Universidade de São Paulo Iniciação à Pesquisa em Geografia I A Geografia no Contexto do Pensamento Geográfico Prof. Dr. Fernando Nadal Junqueira Villela

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Departamento de Geografia

Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas

Universidade de São Paulo

Iniciação à Pesquisa em Geografia I

A Geografia no Contexto do Pensamento Geográfico

Prof. Dr. Fernando Nadal Junqueira Villela

O que é Geografia ?

O que é a Geografia Física ?

O que é a Geografia Humana ?

Geografia Física

~ Origens ~

“Compreender a Geografia Física é exatamente como compreender o meio ambiente: necessita-se de alguma

avaliação sobre como e porque o estado atual se desenvolveu” (Gregory, 1992)

Necessário contextualizar o pensamento geográfico em sua evolução para compreender-se a Geografia Física

E o que é a Geografia Física ?

Tais questões vão de encontro à própria evolução do pensamento geográfico na história moderna e ao aparecimento

da Geografia como ciência

Kant (séc. XVIII) concebia a Geografia como ciência de síntese, agregadora de conhecimentos da Natureza, de cunho descritivo e visando sempre o enfoque de conjunto:

perspectiva corológica

“Só a combinação do pensamento com a intuição permite o conhecimento efetivo do real”

Geografia Moderna (após Séc. XVIII): Utilizada como instrumento legitimador das práticas exercidas pelas Nações ou Estados Dominantes Dominada pelos pressupostos da fenomenologia e positivismo Legado impulsionado pelas concepções naturalistas de Alexander Von Humboldt e Carl Ritter

Humboldt: “Cosmos” ; Carl Ritter: “Geografia Comparada”

Trabalhos de cunho empírico e indutivo, contemplando a universalidade dos fenômenos, com relatos detalhados de

observações sistemáticas e explicações causais da paisagem

Reflexo da política expansionista do Estado Alemão, servindo como inventário colonial

Ratzel: Antropogeografia

“DETERMINISMO”

França: Paul Vidal de La Blache

Apoio deliberado do Estado francês burguês, na intenção de legitimar ideologicamente os interesses da Nação

Natureza vista como possibilidade para a ação humana; “A Geografia é uma ciência dos lugares, não dos Homens”

“POSSIBILISMO”

Geografia Moderna (Séc. XIX / Séc. XX): a Geografia Vidalina propiciou a ideia de Região e o nascimento da Geografia Regional

Outras Influências (Geologia): Uniformitarismo: o exemplo de James Hutton (1788)

“Nenhum vestígio de um começo, nenhuma perspectiva de um fim” John Playfair (1802)

Charles Lyell (1830-1833)

“O presente é a chave do passado”

Crítica ao Uniformitarismo: exemplo de Channeled Scablands, EUA

Outras Influências (Paleontologia e Biologia): Catastrofismo: o exemplo de Georges Cuvier (1769-1832)

Evolucionismo: Charles Darwin (1859)

- Mudança através do tempo;

- Organização (estruturas e funções das comunidades);

- Luta e seleção;

- Aleatoriedade e chance.

Influências Indiretas: Solos: V. V. Dokuchaev (1893) - fundamentos da Pedologia

Deriva continental: Alfred Wegener (1815)

Wladimir Köppen (1936): classificações climáticas

Thornthwaite (1948): contribuição à Hidrologia

Biogeografia: Clements (1916)

Glaciologia: Agassiz (1840)

Influência Direta: Ciclo Geográfico de W. M. Davis (1899)

Outras Influências Diretas: T. H. Huxley (1877): “Physiography”

G. K. Gilbert (1877): “Report on the Geology of the Henry Mountains”

Emmanuel De Martonne (1909): “Traité de Géographie Physique”

Walther Penck (1924): “Recuo paralelo das vertentes”

C. H. Crickmay (1933): “Panplano”

E. J. Wayland (1933): “Etchplano”

L. C. King (1953): “Pediplano”

J. Büdel (1957): “Duplas superfícies de aplainamento”

Rj H1

H2

H3

H4

H2 + H3 + H4 E & S

P

Influência Direta: Método de Múltiplas Hipóteses de Trabalho (Chamberlin, 1890)

P – Problema Hx = Hipótese Rj = Rejeição E = Explicação S = Solução

Hutton, Playfair

Lyell

Darwin

DAVIS

Orme, 2002

Mas porquê a Teoria do Ciclo Geográfico davisiano figurou no cenário científico da Geografia Física até pelo menos a década de 1950?

Refletia as tendências positivistas e evolucionistas da época;

Fácil entendimento para os leigos;

Facilidade de acesso (língua e divulgação);

Teórico mas ao mesmo tempo aplicável;

“Geográfico no Geológico” (MONTEIRO, 2001)

Mas porquê a Geomorfologia tomou a frente nas pesquisas associadas à Geografia Física?

Originalidade quanto ao objeto de estudo: forma do relevo indissociável do meio e elemento síntese dos processos interativos entre a crosta e a baixa atmosfera;

Aplicação à visão catastrofista, evolucionista e positivista;

possibilidade do raciocínio escalar e dimensionamento têmporo-espacial dos fenômenos;

Relevo: componente visível e mensurável da paisagem.

A partir da Década de 50 e 60: “New Geography” (Quantitativa):

- Criação de modelos (conceituais, morfológicos, fluviais ...)

- Incorporação da análise de sistemas

- Bacia hidrográfica utilizada na análise sistêmica

- Avaliações estatísticas e laboratoriais

Crítica : “Medir para Refletir ou Refletir para Medir?”

Chorley e Kennedy, 1971

Relações Estruturais

entre as partes

Processamentos de energia ou

massa

Forma é associada ao

processo

Componentes são controlados

e levados a operações específicas

A partir da Década de 50 e 60: R. Hartshorne: Geografia é um ponto de vista

- Geomorfologia: Hack (1960): incorporação do princípios de equilíbrio dinâmico – paisagem não evolui conforme um modelo generalizado, pode haver multiplicidade e singularidade de acordo com os processos erosivos e a resistência litológica, ambos diacrônicos

- Modelagens evolutivas, a exemplo dos estudos das vertentes ( p. ex. Carson & Kirkby, 1971)

- Abordagem sistêmica prima pela perspectiva dos estudos em ordens de grandeza (dimensionamento têmporo-espacial dos fenômenos e raciocínio multi-escalar)

- Brasil: concepção de que a Geomorfologia representa associação entre forma, material e processo (Ab’Sáber, 1969)

Década de 70 e 80: Geomorfologia Climato-Genética

Avanço de técnicas cartográficas, experimentações e monitoramentos (interdisciplinariedade)

Atenção aos eventos contínuos no tempo, assim como suas respectivas magnitudes e frequências e rupturas de limiares

Incorporação do Homem como agente modificador da Paisagem, e não apenas sujeito (incorporação do fator antrópico, muitas vezes protagonista nas modificações)

Geografia Física “Pura” e “Aplicada” Aplicação: aspectos pragmático contraposição: Geografia Crítica (Ex.: Yves Lacoste)

Aplicações: trazem à tona aspectos mal resolvidos da Geografia Física, com incorporações conceituais e aplicações mal interpretadas, a exemplo das cartas geotécnicas (Rodrigues, 1997)

Assim, o que é Geografia Física?

Não há consenso! Toda Ciência evolui de maneira irregular!

Fato: Caráter Sintético

Alguns exemplos de definições da Geografia Física (in Gregory, 1992):

- A. Strahler (1951): estudo descritivo de numerosas outras Ciências da Terra, dando-nos o esclarecimento geral sobre a Natureza do meio ambiente do Homem

- J. B. Leighly (1955): na atual conjuntura seria melhor ficar sem uma definição explicitamente formulada; (...) poderíamos descartar uma descrição: a proibição de se interessar sobre processos (...). Processos físicos na Geografia Física, processos históricos na Geografia Cultural

- Russos (1971): disciplina preocupada com a concha geográfica (a esfera da Paisagem) da Terra e com seus geossistemas naturais constituintes (os complexos territoriais geográficos ou naturais)

- Orme (1980): desejo proferir algumas recomendações aos estudantes e praticantes da Geografia Física ... Sejam preparados! Sejam integrativos! Sejam preditivos! E sejam orgulhosos!

Geologia

Sociologia

História

Economia

Biologia

Meteorologia

Geografia Histórica

Climatologia

GEOGRAFIA FÍSICA

GEOGRAFIA !!

Fenneman, 1919, in Estébanez, 1982

“GEOGRAFIA FÍSICA:

CIÊNCIA HUMANA?” Mendonça, 1996

“Cada vez que as condições gerais de realização da vida sobre a terra se modificam, ou a interpretação de

fatos particulares concernentes à existência do Homem e das coisas conhece uma evolução

importante, todas as disciplinas científicas ficam obrigadas a realinhar-se para poder exprimir, em

termos de presente e não mais de passado, aquela parcela de realidade total que lhes cabe explicar”

Santos, 2002