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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUCP-SP Rudney Soares de Souza A práxis política em cena no Brasil: ethos, carisma e poder no discurso eleitoral midiatizado Doutorado em Língua Portuguesa São Paulo 2018

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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

PUCP-SP

Rudney Soares de Souza

A práxis política em cena no Brasil: ethos, carisma e poder no discurso

eleitoral midiatizado

Doutorado em Língua Portuguesa

São Paulo

2018

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

PUCP-SP

Rudney Soares de Souza

A práxis política em cena no Brasil: ethos, carisma e poder no discurso

eleitoral midiatizado

Tese apresentada à Banca Examinadora da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,

como exigência parcial para obtenção do título

de DOUTOR em Língua Portuguesa, sob a

orientação do Prof. Dr. Jarbas Vargas

Nascimento.

São Paulo

2018

BANCA EXAMINADORA

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

O correr da vida embrulha tudo.

A vida é assim: esquenta e esfria,

aperta e daí afrouxa,

sossega e depois desinquieta.

O que ela quer da gente é coragem

Guimarães Rosa

Agradeço à Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Ensino Superior –

CAPES – pelo apoio financeiro para a realização desta pesquisa.

Agradeço o apoio da FUNDASP.

AGRADECIMENTOS

Ao amigo de todas as horas e professor exemplar, Doutor Jarbas Vargas Nascimento,

por quem tenho profunda admiração e respeito. Suas orientações foram imprescindíveis

para a conclusão desta tese. Obrigado pela confiança.

À Professora Doutora Izilda Nardocci e ao Professor Doutor Antonio Roberto Chiachiri,

pelas preciosas contribuições, pelas leituras críticas desta tese e por aceitarem participar

das Bancas de Qualificação e de Defesa.

À Professora Doutora Micheline M. Tomazi e ao Professor Doutor João Hilton Sayeg

de Siqueira, por aceitarem participar da Banca de Defesa.

À Coordenação e aos docentes do Programa de Estudos Pós-Graduados em Língua

Portuguesa da PUC-SP, pelo apoio.

À Lourdes Sclagione, secretária do Programa de Estudos Pós-Graduados em Língua

Portuguesa da PUC-SP, pela amizade e pela atenção de sempre.

A minha esposa, Mirian de Almeida Rodrigues Souza, pela paciência e pelas

demonstrações de amor ao longo da jornada.

Aos meus filhos, Erick Henrique e Théo Augusto, pelos momentos de descontração e

pelo carinho.

Aos meus pais, Rosária Maria Soares de Souza e José Florêncio de Souza, por

acreditarem em mim durante todos os momentos da minha vida. Vocês são exemplos de

dignidade, amor e dedicação.

Aos meus irmãos, Sidney, Kátia e Allyfer, pelo carinho e consideração durante esse

percurso.

A todos os meus familiares e amigos que estiveram ao meu lado durante todo esse

tempo, pelo apoio e pelas palavras de incentivo.

Aos meus companheiros do Grupo de Pesquisa Memória e Cultura na Língua

Portuguesa escrita no Brasil, em especial, aos amigos Losana Prado, Márcio Cano,

Ramon Chaves, André Soares, André Lopes, Anderson Ferreira, Anderson Jacob,

Carlos Baptista e Ricardo Celestino, pelos momentos de discussão que fizeram com que

minha pesquisa amadurecesse.

Ao amigo Márcio Martins Melo e às amigas Losana Prado e Daniela Peneda, pela

generosidade em traduzir as versões do Resumo em inglês, francês e espanhol,

respectivamente.

Aos meus alunos, apoiadores e admiradores do meu trabalho.

Para

Rosária e José

Mirian, Erick e Théo

Allyfer, Sidney e Kátia

Alice, Igor, Ingrid e Italo

RESUMO

SOUZA, Rudney. A práxis política em cena no Brasil: ethos, carisma e poder no

discurso eleitoral midiatizado. Tese de Doutorado. Pontifícia Universidade Católica.

São Paulo, 2018.

Esta tese insere-se nos princípios teórico-metodológicos da Análise do Discurso e tem

por objetivo geral examinar a força do ethos discursivo, do carisma e do poder da mídia

na construção do sujeito político brasileiro no HGPE - Horário Gratuito de Propaganda

Eleitoral -, no segundo turno das eleições presidenciais de 2014. Os objetivos

específicos são: verificar as estratégias e os mecanismos discursivos utilizados nos

discursos do enunciador político que busca legitimação; entender e explicar a força

argumentativa do ethos discursivo, do carisma e da mídia na organização e no

funcionamento do discurso político; identificar as formações discursivas que atravessam

diferentes discursos de campanhas eleitorais e suas relações com as competições

interpartidárias que evidenciam o político por meio do confronto de suas relações

imaginárias com as suas condições reais de existência. Para fundamentar nossas

análises, utilizamos os trabalhos de Maingueneau (1995; 1996; 1997; 2004; 2006; 2007;

2008a; 2008b; 2008c; 2010a; 2010b; 2015) e Charaudeau (1996; 1999; 2000; 2006a;

2006b; 2008a; 2008b; 2009; 2012; 2016). Dado o caráter interdisciplinar das

perspectivas que abordam, permitem o diálogo com Weber (1999), Bourdieu (1989),

Foucault (2003; 2014), Bobbio (2015), entre outros. O tema mostra-se relevante, pois

trata do funcionamento do discurso político midiatizado em território brasileiro e

desloca os estudos sobre política para a interdiscursividade, recuperando as condições

sócio-históricas de discursos de uma eleição presidencial acirrada. Os candidatos Aécio

Neves (PSDB) e Dilma Rousseff (PT) protagonizaram programas eleitorais que

projetaram, no imaginário social, uma sociedade dividida. Nossa hipótese é que o

discurso político midiatizado no HGPE projeta uma identidade discursiva do

enunciador, ou seja, um ethos discursivo que visa a legitimá-lo como sujeito

carismático. Queremos afirmar que o carisma enfatiza o posicionamento do ethos

discursivo, na medida em que nele e por ele vemos o sujeito político validando-se como

melhor. Nessa perspectiva, os conceitos de carisma subjetivo e carisma objetivo, ao

adentrarem às cenografias, situam o enunciador político entre a lógica simbólica e a

lógica pragmática para conquistar a adesão do co-enunciador. Para atingirmos os

objetivos que propusemos, constituímos um corpus composto de doze programas

eleitorais veiculados no HGPE, seis de Aécio Neves e seis de Dilma Rousseff. As

análises revelaram que o sujeito político, ao mostrar seu ethos discursivo de político

brasileiro, oscila entre a lógica simbólica e a lógica pragmática para atingir seus

objetivos de adesão e de sedução e, assim, validar, discursivamente, sua figura de poder

que é projetada na tela da televisão.

Palavras-chave: Análise do Discurso; discurso político; cenografia; ethos discursivo;

carisma; poder.

ABSTRACT

SOUZA, Rudney. The political praxis on the scene in Brazil: ethos, charisma and

power in the mediatized electoral discourse. Doctoral Thesis. Pontifícia

Universidade Católica. São Paulo, 2018.

This thesis is part of the theoretical-methodological principles of Discourse Analysis

and its aim is to examine the strength of discursive ethos, charisma and media power in

the construction of the Brazilian political subject in the HGPE, Horário Gratuito de

Propaganda Eleitoral, ((Free) political advertising time), in the second round of the

2014 presidential elections. The specific objectives are: to verify the strategy and the

discursive mechanisms used in the discourses of the political enunciator that seeks

legitimation; to understand and explain the argumentative strength of the discursive

ethos, the charism and the media in the organization and functioning of political

discourse; to identify the discursive formations that cross different discourses of

electoral campaigns and their relations with the interparty competitions that show the

politician through the confrontation of their imaginary relations with their real

conditions of existence. In order to base our analysis, we use the papers of Maingueneau

(1995, 1996, 1997, 2004, 2006, 2007, 2008a, 2008b, 2008c, 2010a, 2010b, 2015) and

Charaudeau (1996, 1999, 2000, 2006a, 2006b; 2008b; 2009; 2012; 2016). Given the

interdisciplinary nature of the perspectives they address, it is possible to dialogue with

Weber (1999), Bourdieu (1989), Foucault (2003, 2014), Bobbio (2015), among others.

The topic is relevant, since it deals with the functioning of the mediatized political

discourse in Brazilian territory and shifts studies on politics to interdiscursivity,

recovering the socio-historical conditions of discourses of a fierce presidential election.

The candidates Aécio Neves (PSDB) and Dilma Rousseff (PT) carried out electoral

programs that projected, in the social imaginary, a divided society. Our hypothesis is

that the mediatized political discourse in the HGPE projects a discursive identity of the

enunciator, in other words, a discursive ethos that aims to legitimize it as a charismatic

subject. We want to affirm that the charism emphasizes the positioning of the discursive

ethos, since in him and by him we see the political subject validating themselves as the

best. In this perspective, the concepts of subjective charisma and objective charisma,

when entering the scenographies, locate the political enunciator between the symbolic

logic and the pragmatic logic to reach the adhesion of the co-enunciator. In order to

achieve the objectives we have proposed, we have constituted a corpus composed of

twelve electoral programs broadcast in the HGPE, six by Aécio Neves and six by Dilma

Rousseff. The analyzes revealed that the political subject, in showing their discursive

ethos of a brazilian politician, oscillates between the symbolic logic and the pragmatic logic to reach their goals of adhesion and seduction and, thus, to validate, discursively,

their figure of power that is projected on the television screen.

Keywords: Discourse Analysis; political discourse; scenography; discursive ethos;

charisma; power.

RÉSUMÉ

SOUZA, Rudney. La praxis politique sur la scène au Brésil: éthos, charisme et

pouvoir dans le discours électoral médiatisé. Thèse de doctorat. Pontifícia

Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2018.

Cette thèse fait partie des principes théoriques et méthodologiques de l'Analyse du

Discours et a pour objectif d'examiner la force de l'ethos discursif, du charisme et du

pouvoir des médias dans la construction du sujet politique brésilien dans l’HGPE, temps

libre de la propagande électorale au second tour des élections présidentielles de 2014.

Les objectifs spécifiques sont: vérifier les stratégies et les mécanismes discursifs utilisés

dans les discours de l'énonciateur politique qui cherche la légitimation; comprendre et

expliquer la force argumentative de l'ethos discursif, du charisme et des médias dans

l'organisation et le fonctionnement du discours politique; identifier les formations

discursives qui traversent les différents discours des campagnes électorales et leurs

rapports avec les compétitions interpartis qui montrent le politicien à travers la

confrontation de leurs relations imaginaires avec leurs conditions réelles d'existence.

Pour fonder notre analyse, nous avons utilisé les travaux de Maingueneau (1995; 1996;

1997; 2004; 2006; 2007; 2008a; 2008b; 2008c, 2010a, 2010b, 2015) et Charaudeau

(1996; 1999; 2000; 2006a; 2006b; 2008a; 2008b, 2009, 2012, 2016). Compte tenu de la

nature interdisciplinaire des perspectives qu'ils abordent, ils permettent un dialogue avec

Weber (1999), Bourdieu (1989), Foucault (2003, 2014), Bobbio (2015), entre autres. Le

thème montre pertinent car il concerne le fonctionnement du discours politique

médiatisé au Brésil et déplace des études sur la politique de l'interdiscursivité, en

récupérant les conditions socio-historiques des discours d'une élection présidentielle

féroce. Les candidats Aécio Neves (PSDB) et Dilma Rousseff (PT) ont mené des

programmes électoraux qui ont projeté, dans l'imaginaire social, une société divisée.

Notre hypothèse c’est que le discours politique médiatisé dans l’HGPE projette une

identité discursive de l'énonciateur, à savoir um éthos discursive qui vise à légitimer

comme un sujet charismatique. Nous voulons affirmer que le charisme insiste sur le

positionnement de l'ethos discursive, car en lui et par lui nous voyons le sujet politique

se valoriser comme le meilleur. Dans cette perspective, les concepts de but charisme et

son charisme subjectif, à l'étape dans les scénographies, placez l’énunciateur politique

entre la logique symbolique et l’approche pragmatique pour obtenir l'adhésion de le co-

énonciateur. Pour atteindre les objectifs que nous avons proposés, nous avons constitué

un corpus composé de douze programmes électoraux diffusés dans l'HGPE, six d'Aécio

Neves et six de Dilma Rousseff. Les analyses ont révélé que le sujet politique, en

montrant son ethos discursive de politique brésilien, oscille entre la logique symbolique

et la logique pragmatique pour atteindre leurs objectifs de l'adhésion et de la séduction

et de valider ainsi, discursivement, sa figure de puissance projetée sur l'écran de

télévision.

Mots-clés: Analyse du Discours; discours politique; scénographie; ethos discursif;

charisme; pouvoir.

RESUMEN

SOUZA, Rudney. La praxis política en escena en Brasil: ethos, carisma y poder en

el discurso electoral en los medios de comunicación. Tesis de Doctorado. Pontificia

Universidad Católica. São Paulo, 2018.

Esta tesis se introduce en los principios teórico-metodológicos del Análisis del

Discurso y tiene por objetivo general examinar la fuerza del ethos discursivo, del

carisma y del poder de la prensa en la construcción del sujeto político brasileño en el

HGPE, Horario Gratuito de la propaganda Electoral, en el segundo turno de las

elecciones presidenciales de 2014. Los objetivos específicos son: verificar las

estrategias y los mecanismos discursivos utilizados en los discursos del enunciador

político que busca legitimación; entender y explicar la fuerza argumentativa del ethos

discursivo, del carisma y de la prensa en la organización y en el funcionamiento del

discurso político; identificar las informaciones discursivas que atraviesan diferentes

discursos de campañas electorales y sus relaciones con las competiciones

interpartidarias que evidencian el político por medio del confronto de sus relaciones

imaginarias con sus condiciones reales de su existencia. Para fundamentar nuestros

análisis, utilizamos los trabajos de Maingueneau (1995; 1996; 1997; 2004; 2006; 2008

a; 2008 b; 2008 c; 2010 a; 2010 b; 2015) y Charaudeau (1996; 1999; 2000; 2006 a;

2006 b; 2008 a; 2008 b; 2009; 2012; 2016). Dado el carácter interdisciplinar de las

perspectivas que abordan, permiten el diálogo con Weber (1999), Bourdieu (1989),

Foucault (2013; 2014), Bobbio (2015), entre otros. El tema se muestra relevante, pues

trata del funcionamiento del discurso político en los medios de comunicación en

territorio brasileño y disloca los estudios sobre política para la interdiscursividad,

recuperando las condiciones socio-históricas del discurso de una elección presidencial

muy disputada. Los candidatos Aécio Neves (PSDB) y Dilma Rousseff (PT)

protagonizaron programas electorales que proyectaron, en el imaginario social, una

sociedad dividida. Nuestra hipótesis es que el discurso político en los medios de

comunicación en el HGPE proyecta una identidad discursiva el enunciador, o sea, un

ethos discursivo que visa a legitimarlo como sujeto carismático. Queremos afirmar que

el carisma enfatiza el posicionamiento del ethos discursivo, en la medida en que en él y

por él vemos el sujeto político siendo validado como mejor. En esta perspectiva, los

conceptos de carisma subjetivo y carisma objetivo, al adentrarse a las escenografías,

sitúan el enunciador político entre la lógica simbólica y la lógica pragmática para

alcanzar la adhesión del con-enunciador. Para que podamos atingir los objetivos

propuestos, constituimos un corpus compuesto de doce programas electorales

vehiculados en el HGPE, seis de Aécio Neves y seis de Dilma Rousseff. Los análisis

revelaron que el sujeto político, al mostrar su ethos discursivo del político brasileño,

oscila entre la lógica simbólica y la lógica pragmática para atingir sus objetivos de

adhesión y de seducción y, así, validar, discursivamente, su figura de poder que es

proyectada en la tela de la televisión.

Palabras-clave: Análisis del Discurso; discurso político; escenografía; ethos discursivo;

carisma; poder.

LISTA DE TABELAS

TABELA 1. Relação de partidos registrados no TSE .................................................... 42

TABELA 2. Coligações com o PT e com o PSDB no 1º turno (1989-2014) ................ 47

TABELA 3. Descrição do corpus - Discursos de Aécio Neves ................................... 127

TABELA 4. Descrição do corpus - Discursos de Dilma Rousseff ............................... 129

LISTA DE ESQUEMAS

ESQUEMA 1 – Condições de produção do discurso .................................................... 28

ESQUEMA 2 – Tríade do interdiscurso ........................................................................ 77

ESQUEMA 3 – Instâncias enunciativas ........................................................................ 95

ESQUEMA 4 – Concorrência discursiva entre instâncias .......................................... 103

ESQUEMA 5 – Circunstância de imagem – projeção do Sujeito Carismático ........... 117

ESQUEMA 6 – Circunstância de cena – projeção do Sujeito Carismático ................ 119

LISTA DE SIGLAS

AD – Análise do Discurso

ARENA – Aliança Renovadora Nacional

CEBRAP - Centro Brasileiro de Análise e Planejamento

DEM – Democratas

D – Discurso

FHC – Fenando Henrique Cardoso

FD – Formação Discursiva

HGPE – Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral

MDB – Movimento Democrático Brasileiro

MP – Ministério Público

MPF – Ministério Público Federal

MPL-SP– Movimento Passe-Livre – São Paulo

PF – Polícia Federal

PAC – Programa de Aceleração do Crescimento

PCB – Partido Comunista Brasileiro

PCdo B – Partido Comunista do Brasil

PDS – Partido Democrático Social

PDT – Partido Democrático Trabalhista

PFL – Partido da Frente Liberal (atual DEM)

PL – Partido Liberal

PMDB – Partido do Movimento Democrático Brasileiro

PP – Partido Progressista

PPB – Partido Progressista Brasileiro

PPR – Partido Progressista Reformador

PPS – Partido Popular Socialista

PRN – Partido da Reconstrução Nacional

PSB – Partido Socialista Brasileiro

PSC – Partido Social Cristão

PSD – Partido Social Democrático

PSDB – Partido da Social Democracia Brasileira

PSOL - Partido Socialismo e Liberdade

PST – Partido Social Trabalhista

PSTU – Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado

PT – Partido dos Trabalhadores

PTB – Partido Trabalhista Brasileiro

PTR – Partido Trabalhista Renovador

PV – Partido Verde

R – Recorte

STF – Supremo Tribunal Federal

TSE – Tribunal Superior Eleitoral

UDN – União Democrática Nacional

UHF - Ultra High Frequency (Frequência Ultra Alta)

VHF – Very High Frequency (Frequência Muito Alta)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 20

CAPÍTULO I – CONDIÇÕES SÓCIO-HISTÓRICAS: O DISCURSO DA

POLÍTICA E A POLÍTICA DO DISCURSO ........................................................... 27

1.1. Por uma concepção de política ................................................................................ 28

1.1.1. Aristóteles ....................................................................................................... 29

1.1.2. Hobbes ............................................................................................................ 29

1.1.3. Marx................................................................................................................ 30

1.1.4. Weber.............................................................................................................. 32

1.1.5. Arendt ............................................................................................................. 34

1.1.6. Bobbio ............................................................................................................ 35

1.1.7. Charaudeau ..................................................................................................... 36

1.2. A política partidária do Brasil ................................................................................. 38

1.3. PT, PSDB e Coligações em concorrência nas campanhas eleitorais ........................ 44

1.4. A práxis política e o protagonismo dos candidatos ................................................. 49

1.4.1. Tancredo Neves (1985) ................................................................................. 50

1.4.2. Sarney (1985-1990) ....................................................................................... 50

1.4.3. Collor (1990-1992) ........................................................................................ 51

1.4.4. Itamar Franco (1995-2002) ............................................................................ 52

1.4.5. FHC (1995-2002) .......................................................................................... 53

1.4.6. Lula (2003-2010) ........................................................................................... 55

1.4.7. Dilma Rousseff (2011-2016) ......................................................................... 58

1.4.8. Históricos de Aécio Neves e Dilma Rousseff ................................................ 61

1.5. Mídia: espaço privilegiado na disputa política ........................................................ 63

1.6. Eleições 2014: a cena política ................................................................................. 66

CAPÍTULO II – A ANÁLISE DO DISCURSO E SUAS FRONTEIRAS .............. 71

2.1. Do discurso à Análise do Discurso: filiações históricas ........................................... 71

2.2. Da noção de Discurso à de Interdiscurso .................................................................. 75

2.3. A trajetória da noção de gênero de discurso em Maingueneau ................................ 78

2.3.1. Gêneros de discurso ........................................................................................ 79

2.3.2. O gênero de discurso propaganda eleitoral midiatizada ................................ 84

2.4. Cenografia, ethos discursivo e efeitos de verdade .................................................... 87

2.4.1. Cenografia ..................................................................................................... 88

2.4.2. Ethos discursivo e a constituição do sujeito político ...................................... 90

2.5. Instâncias enunciativas ............................................................................................. 95

2.5.1. Instâncias política e adversária ....................................................................... 96

2.5.2. Instância midiática .......................................................................................... 97

2.5.3. Instância religiosa ........................................................................................... 99

2.5.4. Instância cidadã ............................................................................................ 100

CAPÍTULO III – CARISMA E PODER .................................................................. 105

3.1. Discutindo a noção de carisma ............................................................................... 106

3.1.1. Platão: carisma institucional ........................................................................ 107

3.1.2. Weber: dominação carismática ..................................................................... 108

3.1.3. Charaudeau: relação ethos-carisma-poder ................................................... 112

3.2. Rosto e máscaras no discurso: o enunciador em cena ............................................ 115

3.2.1. Carisma Subjetivo......................................................................................... 117

3.2.2. Carisma Objetivo ......................................................................................... 119

3.3. Discutindo a noção de poder ................................................................................. 120

CAPÍTULO IV – MÁSCARAS DO SUJEITO POLÍTICO ................................... 123

4.1. Situação comunicativa Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral ......................... 125

4.2. Discursos – Aécio Neves ....................................................................................... 131

4.3. Discursos – Dilma Rousseff .................................................................................. 173

CONCLUSÃO .............................................................................................................. 210

REFERÊNCIAS........................................................................................................... 214

ANEXOS....................................................................................................................... 229

Anexo 1 – Links dos programas no youtube.com ......................................................... 230

Anexo 2 – CD – Corpus ................................................................................................ 231

20

INTRODUÇÃO

Esta tese está situada na linha de pesquisa Texto e Discurso: modalidades oral e escrita,

do Programa de Estudos Pós-Graduados em Língua Portuguesa da Pontifícia

Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP. Fundamentamo-nos na Análise do

Discurso (AD), de modo particular nas perspectivas enunciativo-discursivas de

Maingueneau (1995; 1996; 1997; 2004; 2006; 2007; 2008a; 2008b; 2008c; 2010a;

2010b; 2015) e Charaudeau et alii (1996; 1999; 2000; 2006a; 2006b; 2008; 2009; 2012;

2016), que dialogam com Weber (1980a; 1980b; 1999; 2000; 2003; 2011), Bourdieu

(2007a; 2007b), Foucault (2003; 2008; 2014), Bobbio et alii (1998; 2001; 2015), entre

outros. Propomos como tema o estudo da cenografia, da força do ethos discursivo, do

carisma e do poder da mídia em campanhas políticoeleitorais midiatizadas para

presidente do Brasil em 2014.

Em nosso percurso de pesquisa, examinamos obras que tratam dos termos que constam

de nosso tema – sobre ethos discursivo, Maingueneau (1997; 2006; 2008a; 2008b;

2008c; 2010a; 2015); sobre carisma, Platão (1999), Weber (1999) e Charaudeau (2009;

2012); sobre poder, Bourdieu (2007a; 2007b), Bobbio (2015) e Foucault (2003, 2014);

sobre mídia, Charaudeau (2006b; 2009; 2016) e Gregolin (2003a; 2003b). Tais

pesquisas enquadraram esses termos como categorias de análise que, engendradas no

funcionamento discursivo de discursos políticoeleitorais midiatizados, projetam, pela

interdiscursividade, além de sujeitos políticos carismáticos, novas formas de abordagem

dos fatos políticos, sociais, culturais e midiáticos.

Assim, este estudo considera que o discurso políticoeleitoral resulta de estratégias

discursivas das quais nem sempre o enunciador é o mentor, ou seja, algumas instâncias1

– que não devem ser confundidas com campos2 – circunscritas na cena política,

1 Compreendemos instâncias como instituições sociais envolvidas na construção da cena política. De

acordo com Charaudeau (2008, p 55), são categorias abstratas, desencarnadas e destemporizadas,

definidas, como se diz, pela oposição que elas ocupam no dispositivo e às quais os indivíduos são

remetidos. 2 Diferentemente de Charaudeau (2008, p. 28), que considera campo como sinônimo de setor de ação

social, seguimos o que postula Maingueneau (2015, p. 68), segundo o qual campos discursivos são esferas

de atividade, apenas algumas – por exemplo, o discurso político ou o discurso religioso – onde se

confrontam diversos posicionamentos.

21

oferecem força ao que é dito nos programas eleitorais do HGPE e afiançam um carisma

projetado pelo ethos do sujeito político que enuncia. De acordo com Charaudeau (2008,

p55), em cada dispositivo, as instâncias se definem de acordo com seus atributos

identitários, os quais, por sua vez, definem sua finalidade comunicacional. Charaudeau

(2008, p.12) ainda assevera que, na cena política, o sujeito político lida com ‘máscaras’,

ou seja, toda palavra pronunciada no campo político deve ser tomada ao mesmo tempo

pelo que ela diz e não diz. Jamais deve ser tomada ao pé da letra, numa transparência

ingênua [...].

Nossa tese enfoca o discurso político por várias razões. Em primeiro lugar, porque,

embora tenha sido tratado por diferentes áreas do saber, o termo ‘política’, aqui, será

apreendido no âmbito da Linguística, uma vez que é por meio da linguagem que

construímos as práticas sociais perpetuadas historicamente. Tais ações determinam a

vida social, organizando-a com base na relação de poder dominante x dominado3,

sujeitos que atuam em um projeto de influência, cujo poder preconiza o uso da

linguagem mediante as relações de força que as instâncias mantêm entre si para

construírem o vínculo social.

Em segundo lugar, priorizamos o discurso político em programas eleitorais no HGPE

porque, indubitavelmente, a mídia se tornou um dos principais meios de informação

política. Os debates, por exemplo, antes restritos ao âmbito interno dos partidos

políticos e ao noticiário impresso, ganharam visibilidade na mídia, inclusive as disputas

de prévias dentro dos partidos passaram a ser exploradas pela imprensa. Em decorrência

dessa nova configuração, houve o empoderamento não só da instância midiática, para

atuar como instância reguladora da circulação da informação política, mas também de

outras instâncias.

Decorre disso a relevância desse estudo, principalmente porque trata do funcionamento

do discurso políticoeleitoral midiatizado em território brasileiro e considera o

deslocamento dos estudos sobre política para a interdiscursividade, recuperando as

condições sócio-históricas de produção de uma das eleições presidenciais mais

disputadas de toda a história política do Brasil. Os candidatos Aécio Neves (PSDB) e

3 WEBER (2009).

22

Dilma Rousseff (PT) protagonizaram programas eleitorais que projetaram, no

imaginário social, uma sociedade dividida, ou seja, uma espetacularização da política,

incomum num país que se engajava apenas em disputas esportivas, principalmente

futebolísticas.

Tais condições possibilitam reflexões acerca da força e da fraqueza dos partidos

políticos, dos candidatos e do jogo de sedução que é instaurado na política. Essas

noções, de certa forma, revelam como se constroem os discursos dos candidatos e,

também, mostram em que medida eleições para presidência da República modificam o

dia a dia do povo brasileiro, já que as campanhas eleitorais estão cada vez mais

marcadas por um alto grau de profissionalização, com propagandas políticas que

objetivam atrair os eleitores por meio de recursos da mídia, espaço privilegiado da

disputa. É o que constatamos na campanha eleitoral de 2014, disputada em segundo

turno pelos candidatos Aécio Neves e Dilma Rousseff.

Assim, alguns aspectos de produção e de veiculação do HGPE são investigados,

sobretudo quanto às imagens positiva (campanha positiva) e negativa (campanha

negativa) dos políticos. Por exemplo, por meio de ataques a adversários, busca-se

evidenciar, por óbvio, o que de positivo tem o político que enuncia, ou seja, há uma

tentativa de promover a sua imagem positiva pelo contraste entre o honesto (Eu) e o

corrupto (Outro).

Devido a esse percurso investigativo e ao fato de que se trata de uma pesquisa de

doutorado, optamos pela Análise do Discurso (AD), pois lida com o discurso de modo

interdisciplinar. Essa escolha teórico-metodológica norteará a intenção de analisar o

discurso político midiatizado no HGPE para comprovar que o carisma faz parte da

construção da imagem do político brasileiro, enunciador4 que oscila entre a lógica

simbólica e a lógica pragmática para atingir seus objetivos de adesão e de sedução. O

discurso político não é factível apenas aos candidatos/governantes, ele é fabricado em

lugares diferentes, na interação e na projeção das identidades dos sujeitos que integram

4 Consideramos a nomenclatura proposta por Maingueneau em conferência, sob o título O Aforisador,

entre enunciação e anunciação, no IX Congresso Latino-Americano de Estudos do Discurso, na UFMG,

promovido pela Associação Latino-Americana de Estudos do Discurso, em 2011. Maingueneau sugeriu:

enunciador – aquele que é fonte de referência do discurso; co-enunciador (com hífen) – aquele que é

destinatário do discurso; já o termo coenunciadores (sem hífen e no plural) segundo o autor francês,

designa enunciador e co-enunciador como partícipes da cena enunciativa.

23

a cena enunciativa. Em eleições para presidente do Brasil, a partir dos anos 1980, com a

força da mídia, os líderes políticos passaram a agregar identidades coletivas que podem

ser identificadas pelo eleitor, independentemente da filiação partidária.

Diante do exposto e considerando esses aspectos sob a base teórico-metodológica da

AD, esta tese discute também a forma como a práxis5 política interfere na organização

da vida coletiva, uma vez que é nos espaços de discussão e de construção de valores que

o campo da política se constitui. Em função disso, o tema desta pesquisa desperta o

questionamento que norteia a investigação: em que medida a cenografia, o ethos

discursivo e o poder da mídia possibilitam ao enunciador político, no funcionamento

discursivo, projetar-se carismático e ser legitimado pela instância cidadã?

Para investigação desse problema, instituímos como objetivo geral: examinar a força do

ethos discursivo, do carisma e o poder da mídia na construção do sujeito político

brasileiro no HGPE, Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral, no segundo turno das

eleições presidenciais de 2014. Já os objetivos específicos são: verificar as estratégias e

os mecanismos discursivos utilizados nos discursos dos candidatos a presidente do

Brasil, em campanhas eleitorais, que buscam a legitimação por parte do co-enunciador;

entender e explicar a força argumentativa do ethos discursivo, do carisma e o poder da

mídia na organização e no funcionamento do discurso político; identificar as formações

discursivas que atravessam diferentes discursos de campanhas eleitorais para presidente

do Brasil e suas relações com as competições interpartidárias que evidenciam o político

por meio do confronto de suas relações imaginárias com as suas condições reais de

existência.

Defendemos a tese de que o discurso políticoeleitoral midiatizado no HGPE do segundo

turno da campanha eleitoral de 2014 projeta ethé discursivos, ou seja, identidades

discursivas do enunciador político, uma relacionada ao conceito político e outra à

prática política. Enquanto a primeira refere-se ao posicionamento do político em relação

à vida em sociedade, a segunda insere-o em determinada posição no processo

comunicativo da gestão do poder. Tudo isso para construção do candidato político

carismático.

5 Prática.

24

Muito por isso, supomos, então, que o carisma seja um traço do ethos discursivo, na

medida em que estabelece condições de validação do enunciador. Os carismas subjetivo

e objetivo se apresentam como resultado de cenografias – concernentes à prática política

e à gestão do poder – e da concorrência entre instâncias que, incorporadas nos

programas políticoeleitorais midiatizados, situam o enunciador político como ser no/do

mundo que tem projetada a imagem de si para ser legitimada pelo co-enunciador. Com

esse propósito, portanto, o enunciador terá de manifestar, nos funcionamentos

discursivo, corporal e sensorial, um carisma, uma maneira de ser e de falar, que

conquiste a adesão do co-enunciador, uma vez que, no processo de legitimação em que

o co-enunciador é o protagonista, enquanto membro de uma comunidade discursiva, há

elementos que podem validar ou não a figura de poder projetada na tela do televisor.

A par disso, no primeiro capítulo, partindo do alcance da categoria condições sócio-

históricas de produção, apresentamos a concepção de política e as particularidades do

processo políticoeleitoral brasileiro do segundo turno da campanha eleitoral para a

Presidência, em 2014, a fim de delimitar o corpus constituído para nossas análises. Por

essa razão, recorremos a Aristóteles6 (2007), Hobbes7 (2003ª; 2003b), Bobbio8 et alii

(1998; 2001; 2015), Marx9 (1970; 1971; 1978; 2009), Charaudeau10 (2006a; 2006b;

2009; 2012), Weber11 (1980a; 1980b; 1999; 2000; 2003; 2009; 2011) e Arendt12 (2001;

2004a; 2004b; 2005; 2006; 2008), pelas contribuições aos estudos atinentes ao discurso

político.

No segundo capítulo, apresentamos uma retomada das noções de análise do discurso

para, depois, situar sua produção atual. As perspectivas da AD que nortearam esta tese

foram as de Maingueneau e Charaudeau, produtivos autores franceses que, a partir de

1980, ampliaram os estudos sobre o discurso, principalmente ao proporem, ou

ressignificarem, dentre muitos conceitos: interdiscurso, formação discursiva, cena de

enunciação, gênero de discurso e ethos discursivo.

6 Filósofo grego (384 a.C – 322 a.C). 7 Filsófo inglês (1588 – 1679). 8 Filósofo italiano (1909 – 2004). 9 Filósofo alemão (1818 – 1883). 10 Linguista francês (1939). 11 Sociólogo alemão (1864 – 1920). 12 Filósofa alemã (1906 – 1975).

25

No terceiro capítulo, partimos da reflexão sobre o papel da interdisciplinaridade e do

alcance inovador da AD, particularmente no que concerne aos discursos

políticoeleitorais em cena na sociedade brasileira, para tratar de carisma e de poder. Ao

trazer as categorias ethos discursivo e carisma para o discurso político, um dos

discursos mais dominadores do mundo atual, estabelecemos uma interdisciplinaridade

com diferentes ciências humanas e sociais, tais como a Linguística, a Sociologia e a

Antropologia, uma vez que o sujeito político materializa em si e em seu discurso as

relações entre as condições sócio-históricas de produção, a linguagem, a memória e as

formações discursivas para se constituir. Tais relações autorizam o enunciador a

articular, tal como no corpus que constituímos, sua imagem pessoal com seu

conhecimento de política e sua competência linguístico-discursiva, incorporando

discursividades que envolvem o verbal e o não verbal.

Para discutirmos a noção de poder, consideramos, de forma sintética, isto é, sem a

pretensão de esgotar o assunto, que mereceria um aprofundamento teórico maior, obras

de Platão (1972; 1997; 1999), Weber (1980a; 1980b; 1999; 2000; 2003; 2011), Bobbio

(1998; 2001; 2015), Bourdieu (2007a; 2007b) e Charaudeau (2006a; 2008; 2012; 2016)

que discutem as posturas que garantem popularidade e legitimidade aos sujeitos

políticos.

Ainda no terceiro capítulo, propomos as noções de carisma subjetivo e carisma objetivo.

O primeiro manifesta-se no detentor da voz, no rosto, na figura humana, no sujeito

empírico, trata-se, portanto, do carisma para além da dominação, ou seja, uma qualidade

performativa em que práticas corporais e sensoriais são fundamentais para o

estabelecimento da autoridade e da legitimidade do candidato político; quanto ao

segundo, carisma objetivo, emerge de condições distintas, ou seja, de condições

externas ao sujeito empírico, que se internalizam no discurso e que projetam um ethos

do enunciador que, nas palavras de Weber (2000), é uma qualidade pessoal

extracotidiana que confere poderes ou qualidades sobrenaturais a quem a detém.

No quarto capítulo, procedemos à análise do corpus constituído – discursos políticos

midiatizados proferidos por Aécio Neves e Dilma Rousseff, na ocasião do segundo

turno das eleições presidenciais brasileiras de 2014, buscando entender como as

26

categorias de análise enquadram esses discursos políticos e como o enunciador pode ser

legitimado como sujeito carismático.

O mundo comum da política reveste-se de sacralidade, o que permite a criação de

“profetas” (candidatos) ‘cheios’ de carisma e, à maneira religiosa, a constituição de um

grupo de “discípulos” (eleitores), pois o carisma, manifestado no discurso do

enunciador durante a campanha eleitoral, pode arrebatar os corações e, portanto, os

votos de eleitores, na medida em que ocorre uma apropriação, pelo candidato político,

de instituições, de discursos e de imagens de outrem que avalizam o seu dizer.

Charaudeau (2008) afirma que, no discurso, o enunciador autoemerge, ou seja, destaca-

se, identifica-se pelo que ele enuncia, embora nem sempre tenha clareza e consciência

de sua elocução. Isso quer dizer que não se trata de avaliar o posicionamento sobre o

que o sujeito enuncia, o seu pensamento e as suas opiniões, mas de sabermos se o

comportamento do sujeito, sua relação com ele mesmo e com os outros, mostrado no

funcionamento discursivo, constitui um modo de subjetividade do enunciador, ou seja,

uma forma de manifestação de sua interioridade. É a partir dessa evidência do

enunciador que podemos relacionar o ethos discursivo ao carisma, que se manifesta em

meio a um acordo de permuta entre os coenunciadores no contrato de comunicação.

Por fim, a análise da cena de enunciação, do ethos discursivo, do carisma e do poder da

mídia revelou que o carisma faz parte da construção da imagem do político brasileiro,

enunciador que oscila entre a lógica simbólica e a lógica pragmática para atingir seus

objetivos de adesão e de sedução e, assim, validar, discursivamente, sua figura de poder

que é projetada na tela da TV.

27

CAPÍTULO I

CONDIÇÕES SÓCIO-HISTÓRICAS: O DISCURSO DA POLÍTICA E A

POLÍTICA DO DISCURSO

Neste capítulo, partindo do alcance do conceito da categoria condições sócio-históricas

de produção, apresentaremos uma concepção de política, as particularidades da

constituição do processo políticoeleitoral brasileiro do segundo turno da campanha

presidencial de 2014 e o histórico dos candidatos Aécio Neves e Dilma Rousseff, a fim

de subsidiar a constituição e a análise do corpus.

O fato de a Análise do Discurso (AD) ser interdisciplinar permite a interface com a

Política, uma vez que dispositivos teórico-metodológicos de diferentes ciências

humanas e sociais, tais como a Linguística, a Sociologia, a Antropologia, são

mobilizados. Para nós, o discurso do sujeito político está circunscrito às condições de

sua produção que são marcadas por aspectos sociais, históricos e linguageiros, marcas

que poderão ser acessadas na memória discursiva do co-enunciador e, se legitimadas

forem, contribuirão para depreensão de efeitos de sentido. Charaudeau & Maingueneau

(2016, pp. 114-115), definem condições de produção do discurso como:

[...] o que condiciona o discurso, ou seja, trata-se de uma noção que

separa enunciado considerado do ponto de vista da pragmática do

enunciado considerado do ponto de vista da análise do discurso. As

condições de produção desempenham um papel essencial na

construção dos corpora, que comportam necessariamente vários textos

reunidos em função das hipóteses do analista sobre suas condições de

produção consideradas estáveis.

Nesse sentido, tomamos condições de produção como categoria essencial para a

constituição do corpus e sua análise, uma vez que aspectos sócio-históricos não só

situam o tempo e o lugar do discurso, mas também mostram os papéis sociais dos

coenunciadores (EU – TU). É o que ilustramos na figura a seguir:

28

LUGAR

TU

TEMPO

EU DISCURSO

ESQUEMA 1 – Condições de produção do discurso13

No tópico seguinte, trataremos da constituição e do funcionamento do discurso político,

por isso, a despeito de outras perspectivas, e para situar as condições de produção do

discurso político no Brasil, consideraremos o que postulam Aristóteles (1987; 2007),

Hobbes (2002; 2003a; 2003b), Arendt (2001; 2004a; 2004b; 2005; 2006; 2008), Weber

(1980; 1980b; 1999; 2000; 2003; 2009; 2011), Marx (1970; 1971; 1978; 2009), Bobbio

(1998; 2001; 2015), Charaudeau (2006a; 2008), entre outros.

1.1. Por uma concepção de política

Partimos do pressuposto de que é nos espaços de discussão e de construção de valores

que a política se constitui. A política é uma ação ligada à convivência humana14, porque

essa prática determina a vida social, organizando-a a partir da relação de poder entre

13 Esquema feito por nós, com base no conceito de condições de produção proposto por Charaudeau &

Maingueneau (2016, pp. 114-115). 14 ARENDT, 2006.

29

dominante x dominado15, sujeitos que atuam em um projeto de influência, cujo poder

preconiza o uso da linguagem, mediante as relações de força que concorrem nos lugares

de fabricação do discurso político16: lugar de governança, lugar de não governança,

lugar de opinião e lugar de mediação das instâncias17. Nesses lugares, as instâncias –

política, adversária, religiosa, cidadã, midiática, empresarial, econômica, judiciária etc.

– constroem o vínculo social em torno de projetos políticos.

1.1.1. Aristóteles

Nesta pesquisa, como já mencionamos na introdução deste capítulo, consideraremos

postulados de teóricos para nortear nosso ponto de vista acerca do conceito de política.

Começaremos a organizar o conceito de política a partir de Aristóteles (2007), segundo

o qual a Política é tudo o que se relaciona à busca de ações para o bem-estar tanto

individual como coletivo.

Desde a antiguidade clássica, a noção de política tem sido discutida nos âmbitos da

filosofia e das ciências sociais. Havia uma classificação das formas de poder: o paterno,

o despótico e o político18. Para Aristóteles (2007), a primeira era exercida pelo interesse

dos filhos; a segunda, pelo interesse do senhor; e a terceira, na acepção do filósofo

grego, ocorria pelos interesses do governante e dos governados, entretanto, na terceira,

de forma viciada, é característico que o poder seja exercido em benefício dos

governantes.

1.1.2. Hobbes

No campo político, Hobbes, que experienciou momentos conflituosos na Inglaterra do

século XVII, assevera que o indivíduo, para ser livre para agir socialmente, deve, antes,

ser capaz de avaliar as consequências de suas ações. As escolhas, as paixões e as ações

desse sujeito revelam o que Hobbes (2002) denomina ‘desejo de poder do ser humano’.

15 WEBER, 2009. 16 CHARAUDEAU, 2008, p. 56. 17 Aprofundaremos tais noções no Capítulo II. 18 BOBBIO, 1998, p. 161.

30

O poder é considerado por Hobbes (2002), semelhante ao que postula Weber (2000),

como consistente nos meios adequados à obtenção de qualquer vantagem, ou seja, uma

combinação de fatores, tais como a dominação da natureza e de outro homem, que

visam a alcançar os efeitos desejados como, por exemplo, a imposição da vontade de

um sujeito em detrimento da vontade de outro, o que determina comportamentos. De

acordo com Hobbes (2002, p. 955):

o poder político pertence à categoria do poder do homem sobre outro

homem, não à do poder do homem sobre a natureza. Esta relação de

poder é expressa de mil maneiras, em que se reconhecem fórmulas

típicas da linguagem política: como relação entre governantes e

governados, entre soberano e súditos, entre Estado e cidadãos, entre

autoridade e obediência etc.

Ainda, segundo Hobbes, existem várias formas de poder do homem sobre outro homem,

mas o homem natural (instância cidadã) deve confiar ao Estado (instância política) as

ações que visem ao bem comum, ou seja, o Estado impõe-se como um órgão

inquestionável, detentor do poder absoluto, diante do qual a sociedade deve se

submeter.

1.1.3. Marx

Marx (1971), por sua vez, cunhou o conceito denominado materialismo histórico,

deixando um legado que registra a luta do proletariado pela igualdade de direitos e pela

queda do “capitalismo voraz”. Em Marx et alii (1998, pp. 102 e 103), há uma crítica aos

alemães que elaboram o mundo e a realidade em que vivem a partir das ideias, das

abstrações teóricas, do método especulativo, sem considerar a realidade material,

concreta, em que estão inseridos, e às suas formas de atuação. Marx (1971) defende que

o mundo e a realidade devem ser analisados com base em métodos empíricos, e não

especulativos:

Tese VIII - Toda vida social é essencialmente prática. Todos os

mistérios que conduzem ao misticismo encontram sua solução

racional na práxis humana e na compreensão dessa práxis. Tese XI –

Os filósofos só interpretaram o mundo de diferentes maneiras; do que

se trata é de transformá-lo. (MARX, 1971, p. 102)

31

Nessa perspectiva, os homens são os responsáveis pela produção de seus meios de

sobrevivência e, por conseguinte, de sua vida material e de sua história. Embora trate do

complexo conceito de ‘política’, Marx atrela a noção de política à figura do Estado,

esclarecendo como este serve como um complemento do capital para a exploração do

trabalho.

Marx (2009) discute a concepção de Estado laico e considera que a emancipação

política concedida pelo Estado não significa a emancipação do homem da religião. Para

Marx, o fato de os judeus terem conquistado a emancipação política não os obriga a

renunciar sua religião e sua cultura, pois permanecem cativos humanamente. Todavia,

segundo o filósofo, o deslocamento da religião e do Estado para a sociedade serve de

complemento para a emancipação política:

a religião é, precisamente, o reconhecimento do homem por um

atalho. Por um mediador. O Estado é o mediador entre o homem e a

liberdade do homem. Assim como Cristo é o mediador a quem o

homem imputa sua divindade, todo o seu constrangimento religioso,

também o Estado é o mediador para o qual ele transfere toda sua não-

divindade, toda sua ingenuidade humana. (MARX, 2009, p. 49).

Nesse sentido, o Estado político é, então, a vida genérica do homem em oposição à sua

vida material:

onde o Estado político alcança o seu verdadeiro desabrochamento, o

homem leva – não só no pensamento, na consciência, mas na

realidade, na vida – uma vida dupla, uma vida celeste e uma vida

terrena: a vida na comunidade política (em que ele se faz valer como

ser comum) e a vida na sociedade civil (em que ele é ativo como

homem privado, considera os outros homens como meio, se degrada a

si próprio à condição de meio, e se torna o joguete de poderes

estranhos). O Estado político comporta-se precisamente para com a

sociedade civil de um modo tão espiritualista como o Céu para com a

Terra. Está na mesma oposição a ela, triunfa dela do mesmo modo que

a religião triunfa do constrangimento do mundo profano. (MARX,

2009, p.50-51).

Para Marx (2009, p.51), toda a emancipação política é a redução do homem, por um

lado, a membro da sociedade civil, a indivíduo egoísta independente; por outro, a

cidadão, a pessoa moral. Desse modo, a emancipação efetiva do homem só pode

32

ocorrer quando ele conseguir transformar suas próprias forças em forças sociais capazes

de intervir no mundo real. Essa é a figura da força política para Marx, força que,

materializada, emancipa o ser humano.

1.1.4. Weber

Weber (2011), de outro lado, propõe uma sociologia que busca entender a sociedade

que se formara com base na força do capitalismo industrial. A atenção de sua pesquisa

voltou-se para o indivíduo e para os grupos sociais os quais, segundo ele, são os

responsáveis pela atribuição de sentidos às ações no contexto social, ou seja, as ações

humanas variam de grupo para grupo e essas variações se devem a valores diferentes de cada

sociedade. Assim, além da força, essencial na vida política, Weber entende que a

violência é um fator de construção da ação política. Ainda, segundo Weber (2011), a

política é um ato violento de dominação.

O sociólogo alemão julga que a política se encontra em uma relação rígida com os

princípios de uma ética religiosa. O poder é vontade de potência, mas os sistemas de

dominação, nos quais o poder se afirma, necessitam ser legítimos para serem duráveis.

O conceito de legitimidade, para Weber, refere-se à aceitação da validade de uma ordem

de dominação. Nesse sentido, Weber (2011, p. 67) assevera que política,

consequentemente, é o conjunto de esforços feitos com vistas a participar do poder ou a

influenciar a divisão do poder, seja entre Estados, seja no interior de um único Estado.

Weber (2011) afirma que todo indivíduo que se propõe político aspira ao poder, seja

porque almeja alguma vantagem particular, seja porque deseja o poder pelo poder para

gozar do sentimento de prestígio que ele confere. Para Weber, o Estado, assim como

qualquer agrupamento político, consiste, portanto, em uma relação de dominação do

homem sobre o homem, estabelecida pela violência legítima, não necessariamente

física, que se instaura na submissão de homens dominados à autoridade reivindicada por

homens dominadores. Nesse sentido, Weber (2011) propõe três fundamentos que

legitimam a obediência ao Estado: poder tradicional, poder legal e poder carismático,

justificados, respectivamente, pela historicidade, pelas leis e pelas características

heroicas do indivíduo.

33

De acordo com o autor, o que definiria a legitimidade de um sistema de dominação seria

a disposição subjetiva de seus sujeitos e a capacidade de esse sistema apresentar-se

como consensual. A instância política, assim, tem a legitimidade forjada pela violência,

na forma de leis e regulamentações, para continuar com o seu poder.

Portanto, embora a participação política deva estar relacionada às políticas públicas

voltadas à criação e manutenção de leis que beneficiem a sociedade em geral, o sujeito

pode ambicionar ingressar na política pelo fato de querer beneficiar-se pessoalmente ou

beneficiar grupos sociais ligados a ele. De acordo com Weber, há duas maneiras de

fazer política:

ou se vive ‘para’ a política ou se vive ‘da’ política. Quem vive ‘para’ a

política a transforma em ‘fim de sua vida’, seja porque encontra forma

de gozo na simples posse do poder, seja porque o exercício dessa

atividade lhe permite achar equilíbrio interno e exprimir valor pessoal,

colocando-se a serviço de uma ‘causa’ que dá significação a sua vida.

Neste sentido profundo, todo homem sério, que vive para uma causa,

vive também dela. [...] daquele que vê na política uma permanente

fonte de rendas, diremos que ‘vive da política’ e diremos, no caso

contrário, que ‘vive para a política’. (WEBER, 2011, p. 78)

Nessa perspectiva, o homem político deve, portanto, ser economicamente independente

das vantagens que a política possa lhe oferecer, mas, segundo Weber, tal condição está

mais próxima de ser alcançada pelo capitalista, uma vez que, grosso modo, ele não

depende de rendas oriundas de mandatos políticos, considerando que, em vários países

europeus, havia um recrutamento de dirigentes políticos segundo critérios

plutocráticos19, mas isso não significa que políticos recrutados de acordo com outros

critérios ou que tenham surgido de camadas menos privilegiadas economicamente não

estejam aptos a ocupar cargos políticos.

Em verdade, o que Weber sustenta é que o modo como as agremiações se apropriam das

instituições do Estado é que fazem com que tenham mais ou menos adesões ao seu

projeto político. De acordo com Weber (2011, p. 82), as lutas partidárias não são,

portanto, apenas lutas para consecução de metas objetivas, mas são, a par disso, e

19 WEBER, 2011, p. 80. “Critérios plutocráticos” são critérios que consideram a concentração de dinheiro

por determinado político ou grupo político.

34

sobretudo, rivalidades para controlar a distribuição de empregos, ou seja, a política

como garantia econômica para o futuro.

1.1.5. Arendt

Arendt (2004b), a seu modo, postula que política é um ato coletivo de delegação de

poder. Assim, ninguém pode governar sozinho, pois até aquele que se utiliza da

violência precisa de certa organização e de apoio de outros para a implementação do

governo. Nas palavras de Arendt (2004b, p. 128), mesmo o mandante totalitário, cujo

maior instrumento de domínio é a tortura, precisa de uma base de poder – a polícia

secreta e sua rede de informantes. Em outras palavras, contrariando Weber, Arendt

afirma que a violência, apesar de não poder ser ignorada como variável, não é suficiente

para constituir uma comunidade política.

De acordo com Arendt (2004b, p.120), as instituições políticas são manifestações e

materializações do poder; petrificam e decaem quando o poder vivo do povo cessa de

lhes sustentar. Desse modo, a ação política não pode ser produto fabricado (poeisis),

pois não tem existência própria, mas depende do processo produtivo (práxis) que o

gerou. O fato é que a ação política, para a autora, está ligada a uma tarefa que necessita

de novas ações e de recordações para a manutenção das instituições políticas, pois,

embora iniciada por um indivíduo apenas, a sua realização depende de muitos outros.

Segundo Sócrates (1991), o homem não é ainda um “animal racional”, um ser dotado da

capacidade da razão, mas um ser pensante cujo pensamento se manifesta em forma de

discurso. Desse modo, não é sem razão que a pluralidade humana, a que Arendt (2008)

se refere, manifestada na realização do discurso político, parece-nos ligada a identidades

coletivas que podem ser discernidas pela instância cidadã. No campo político, tais

identidades são mais expressivas por causa da configuração das campanhas eleitorais no

rádio e na televisão, principais cenários de promoção da instância política.

35

1.1.6. Bobbio

Bobbio, por sua vez, considera que, embora apresentado sob perspectivas diferenciadas,

etimologicamente, o termo ‘política’ é:

derivado do adjetivo originado de pólis (politikós), que significa tudo

o que se refere à cidade e, consequentemente, o que é urbano, civil,

público, e até mesmo sociável e social, o termo Política se expandiu

graças à influência da grande obra de Aristóteles, intitulada Política,

que deve ser considerada como o primeiro tratado sobre a natureza,

funções e divisão do Estado, e sobre as várias formas de Governo,

com a significação mais comum de arte ou ciência do Governo, isto é,

de reflexão, não importa se com intenções meramente descritivas ou

também normativas, dois aspectos dificilmente discrimináveis, sobre

as coisas da cidade. (BOBBIO, 1998, p. 954)

Bobbio (1998) assevera que o termo ‘política’ repercutiu pelo mundo em função da

influência da obra ‘Política’, de Aristóteles, que tratou de apresentar, descritiva e

normativamente, a origem, as funções e as divisões do Estado, além das várias formas

de governo. Tais proposições contribuíram para a perda do significado original do

termo.

Modernamente, o termo política é substituído por expressões como: ciência do Estado,

doutrina do Estado, ciência política, filosofia política etc. É o que vemos em obras do

século XIX, tais como Filosofia do direito (Hegel, 1821), Elementos de ciência política

(Mosca, 1896), entre outras. Ou seja, o termo política passou a indicar um conjunto de

atividades ligadas ao Estado, portanto, uma forma de práxis humana que está

diretamente ligada ao poder, responsável pelas leis, pelos recursos e pela manutenção da

pólis.

A par do que problematizou Aristóteles quanto à sua terceira forma de poder, o político,

Bobbio considera que existem três classes de poder que mantém uma sociedade de

desiguais: o poder econômico, o poder ideológico e o poder político. O poder

econômico é aquele que estabelece, por meio da posse de bens, a diferença entre pobres

e ricos. Trata-se de um poder que se vale de patrimônios considerados necessários e

que, em situação de escassez, pode determinar comportamentos, principalmente quanto

à relação de trabalho. Já o poder ideológico baseia-se na distinção entre ignorantes e

36

sábios, aqueles com ótima influência, ligados a grupos socialmente prestigiados

(sacerdotes, cientistas etc.), estabelecem o status quo do ponto de vista intelectual e

científico. Por sua vez, o poder político, cujo conceito se aproxima dos postulados de

Weber (2011), tem a força instituída como meio para se manter. Trata-se de um poder

coator, que distingue superiores de inferiores e que é capaz de condicionar

comportamentos na sociedade por meio da força física, bélica.

1.1.7. Charaudeau

Charaudeau (2008), a sua maneira, problematiza o poder político, pois, segundo ele, há

uma instância política a qual cabe ditar leis e sancioná-las, mas isso só ocorrerá com o

consentimento da instância cidadã, com o voto e com mecanismos de controle. No

discurso político, o candidato e os lugares de sua fabricação são muito eficazes para a

politização e a legitimação de seus conteúdos.

Em outras palavras, cabe à instância política, no jogo político entre a razão e a paixão,

buscar a adesão de outras instâncias capazes de, nas palavras de Charaudeau (2006b),

estabelecer uma conjunção de discursos de ideias e discursos de poder, verdade e

possibilidade, respectivamente. O Estado, nessa perspectiva, governado pela instância

política, detém o monopólio da força legítima, uma vez que essa é a condição para que

ele exista em meio a tantas forças20 que coexistem no espaço social21.

A ação política determina a vida social ao organizá-la. É ela que possibilita que a

sociedade tome decisões coletivas, por meio de representantes, que estarão incumbidos

de diversas responsabilidades, entre elas a de estar obrigado a prestar contas de seus

atos perante a coletividade. Face ao exposto, os cidadãos devem estabelecer um controle

dos atos praticados por seus representantes. Assim, tem-se uma organização da ação

política, que é depreendida num espaço de discussão dos objetivos a definir, tanto na

sociedade como na política. É do poder político que provêm as sanções de leis, sempre

20 Instâncias enunciativas funcionam como agentes sociais. 21 Consideramos essa expressão “espaço social” de Bourdieu (2007, p. 174). Segundo o autor, os

discursos políticos são produtos de “lutas simbólicas” que agentes sociais promovem no campo político –

um subespaço específico do “espaço social”. Bourdieu considera que o espaço social é um espaço

“multidimensional” composto por vários campos relativamente autônomos - religioso; jurídico; literário;

científico; político; etc. É no interior de cada um de tais campos que ocorrem as lutas simbólicas pelo

poder simbólico.

37

asseguradas no consentimento da instância cidadã, ou seja, para que a instância política

consiga a adesão do povo à sua ação, joga com argumentos da razão e da paixão e isso

configura um espaço discursivo em que se negocia efeitos de sentido.

As eleições seriam o modo de acesso à representação do poder, enquanto que as

modalidades de controle estariam, na essência, no interior das instituições e no exterior,

por diversos movimentos reivindicativos. A linguagem, portanto, não está ausente no

engendrar da ação política, uma vez que esse espaço depende de um espaço de

discussão.

Para Charaudeau (2008, p.21), em função dos espaços de discussão e de persuasão que

o campo político pode ser considerado “o governo da palavra”, mas apenas para “uma

parte” da população. Por exemplo, em algumas ações de protesto que pressionam o

governo, o que tem mais influência são os slogans e declarações da imprensa, pois

marcam uma opinião que será difundida em muitas comunidades que poderão, a partir

da “palavra”, organizarem-se de modo a construírem uma coordenação das tarefas que

resultarão em ações propriamente ditas.

Em contrapartida, o governo, se considerar “a palavra”, poderá utilizá-la para intervir

nos espaços de discussão, de ação e de persuasão, para que se estabeleçam os ideais, os

meios da ação política, a coordenação das tarefas e a promulgação das leis, regras e

decisões de todas as ordens, além de convencer a instância cidadã dos fundamentos de

seu programa e das decisões tomadas ao gerir os conflitos de opinião. Portanto, pode-se

determinar que o discurso é constitutivo da linguagem, que é o que motiva a ação e que

lhe dá sentido.

As campanhas eleitorais estão cada vez mais marcadas por um alto grau de

profissionalização, com propagandas políticas que atraem os eleitores por utilizarem

muito bem os recursos da mídia, espaço privilegiado da disputa. Isso faz crer que o

conceito de política utilizado nesta tese resulta da junção das perspectivas dos autores

apresentados, sobretudo Bobbio e de Charaudeau, segundo os quais, a política é uma

práxis, o que reforça a relevância do estudo da força do carisma, do ethos discursivo e

do poder da mídia em campanhas eleitorais para presidente do Brasil veiculadas no

HGPE, espaço que midiatiza o discurso políticoeleitoral e acomoda/promove instâncias

38

enunciativas, quais sejam, política, religiosa, empresarial, judiciária, cidadã e midiática,

que validam e sustentam figuras de poder no jogo político.

1.2. A política partidária no Brasil

Todo partido político tem um caráter associativo entre a natureza de sua ação, orientada

pela conquista do poder político dentro de uma comunidade, e pela multiplicidade de

estímulos e motivações que levam a uma ação política que preconiza fins "objetivos"

e/ou "pessoais". Segundo Weber (2009, p. 32):

“Partido político é uma associação [...] que visa a um fim deliberado,

seja ele 'objetivo' como a realização de um plano com intuitos

materiais ou ideais, seja 'pessoal', isto é, destinado a obter benefícios,

poder e, consequentemente, glória para os chefes e sequazes, ou então

voltado para todos esses objetivos conjuntamente".

A par disso, para esta pesquisa, faz-se relevante recuperar o histórico dos partidos

políticos brasileiros, uma vez que são meios legais para aqueles que querem concorrer a

cargos políticos no Brasil, país que esteve submetido a diferentes formas de governo

(Monarquia, República, Parlamentarismo, Presidencialismo) e regimes (ditadura e

democracia). Após a queda da Monarquia e a Proclamação da República, em 1889,

abriram-se discussões acerca da constituição das esferas de poder que, mais tarde,

seriam compostas por: Executivo, Legislativo e Judiciário. Tais esferas devem definir e

fazer valer as regras que englobam direitos e deveres de todos, mas quem decide quais

os governantes do Executivo e do Legislativo é a sociedade.

Desde o fim do regime militar, em 1985, a democracia foi instituída. Tal regime

facultou à sociedade o voto direto nas eleições, de maneira que as representações,

independentemente de suas origens, se fossem consideradas legítimas, teriam espaço no

meio político. Mesmo assim, algumas manobras continuam, até hoje, tentando

manipular os procedimentos e os eleitores, mas o direito à livre escolha de seus

governantes foi preservado, pelo voto. Diante dessa realidade, o povo passou a fiscalizar

as ações de seus governantes e a fazer-se ouvir a partir de suas representações sociais.

39

No estado de direito, as representações de setores da sociedade devem estar

organizadas, por exemplo, em estruturas não governamentais, sindicatos, movimentos

sociais etc., e também em partidos políticos que, observado o devido processo legal,

devem buscar a legitimidade de candidaturas nos órgãos competentes da Justiça

Eleitoral para participarem de eleições municipais, estaduais e nacionais. Nesse sentido,

de acordo com Chacon, a ação política deve partir de uma organização partidária. O

autor diz que:

[...] podemos remontar a Atenas e Roma antes de Cristo, como fontes

da moderna organização partidária, mas ela só surge efetivamente na

Grã-Bretanha, a partir do século XIX, isto é, da sua revolução

industrializante e urbanizadora. Donde Maurice Duverger conclui: De

fato, nenhum país do mundo (salvo os Estados Unidos) conhecia

partidos políticos no sentido moderno do termo: encontravam-se

tendências de opiniões, clubes populares, associações de pensamento,

grupos parlamentares, mas nenhum partido propriamente dito.

(CHACON, 1985, p. 11).

No Período Imperial, por exemplo, a cena política brasileira era regrada por três

partidos: o Partido Restaurador (1831), o Partido Conservador (1836), e o Partido

Liberal (1837). O primeiro defendia a volta de Dom Pedro I; o segundo defendia um

regime forte, com autoridade concentrada na monarquia e pouca liberdade às províncias

(Estados); o terceiro acreditava no fortalecimento do parlamento e uma maior

autonomia nas províncias. Os três partidos, entretanto, tinham em membros defensores

do sistema escravista.

Em 1889, o quadro político brasileiro foi marcado por diversos acontecimentos, dentre

tantos, mudanças de regime e revoluções. Esses rompimentos foram assinalados por

quatro motivos: pela implantação da república (1889), pela Revolução de 1930, pelo

Estado Novo (1937-1945) e pelo Regime Militar de 1964.

O surgimento de partidos políticos no Brasil foi marcado por acontecimentos

impactantes - mudanças de regime ou revoluções - que comprometeram a existência dos

partidos, de modo que foram forçados a sempre terem de recomeçar sua trajetória a cada

uma das interrupções sofridas. Esses rompimentos foram assinalados pela implantação

da república, em 1889, que suplantou os partidos monarquistas, instituindo partidos

oligárquicos; a Revolução de 1930 fez com que desaparecessem os partidos

40

republicanos; o Estado Novo (1937-1945) impediu a existência de partidos; o Regime

Militar de 1964 submeteu alguns partidos políticos às condutas do regime.

Em 1943, alguns fatores22 como a mobilização de operários e estudantes de São Paulo,

Rio de Janeiro e Recife, além do Congresso Jurídico Nacional, do Manifesto dos

mineiros, e da iminência de uma vitória das democracias na segunda Guerra Mundial,

motivaram a necessidade de haver um governo democrático no Brasil no lugar do

Estado Novo ditatorial. Diante da pressão sofrida, o governo Getúlio Vargas, em

fevereiro de 1945, promulgou a Lei Constitucional nº 923 que alterou a Constituição

Federal de 1937 visando a regulamentar o funcionamento do sistema eleitoral dos

órgãos de governo.

Em maio de 1945, foi publicado o Decreto-Lei n.º 7.586 que, além estabelecer a forma

de organização dos partidos políticos, apresentou regras para as eleições em âmbito

nacional, tais como: mínimo de dez mil assinaturas para registro de partido;

obrigatoriedade de inscrição dos candidatos até quinze dias antes das eleições; voto

obrigatório e secreto; eleições presidenciais e parlamentares marcadas para 2 de

dezembro de 1945 e estaduais para 6 de maio de 1946. Uma vez que o presidente

Getúlio Vargas constituiu interventores em alguns estados do Brasil, incumbiu a eles a

missão de criar um partido político com abrangência nacional, o PSD.

De 1945 até o ano 1964, a atuação política brasileira foi conduzida pelos partidos

getulistas (PSD – Partido Social Democrático e PTB – Partido Trabalhista Brasileiro) e

pelo principal partido anti-getulista (a UDN – União Democrática Nacional). Cada um

desses três partidos, segundo Lamonier (2005), tinha em suas bases representantes de

setores da sociedade: o PSD deu espaço aos conservadores do getulismo, em sua

maioria lideranças rurais e funcionários estatais importantes, já o PTB, reflexo do

Labour Party da Grã-Bretanha (Partido Trabalhista Independente da Inglaterra),

22 FGV-CPDOC (Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do brasil), Rio de

Janeiro. Disponível em: http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/manifesto-dos-

mineiros. Acesso: 25/07/2017, às 22h02. 23 BRASIL, Lei Constitucional Nº 9, de 28 de fevereiro de 1945. Alterações no Art. 1º - Os arts. 7º, 9º e

parágrafo, 14, 30, 32 e parágrafo, 33, 39 e parágrafos, 46, 48, 50 e parágrafo, 51, 53, 55, 59 e

parágrafos, 61, 62, 64 e parágrafos, 65 e parágrafo, 73, 74, 76, 77, 78 e parágrafos, 79, 80, 81, 82 e

parágrafo, 83, 114 e parágrafo, 117 e parágrafo, 121, 140, 174 e parágrafos, 175, 176 e parágrafo, 179

da Constituição Federal de 1937. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/LCT/LCT009.htm. Acesso: 25/07/2017, às 20h25.

41

unificou as lideranças sindicais e os operários em geral. O partido oposto, a UDN,

liberal e antipopulista, concedeu abrigo à burguesia, interessada no capital estrangeiro e

na iniciativa privada.

Após a aprovação da nova Lei Orgânica dos Partidos pelo Congresso Nacional, em

novembro de 1979, que extinguiu o bipartidarismo, cada partido foi obrigado a (re)

construir sua própria trajetória. Desse modo, surgiram o PFL (Partido da Frente

Liberal), o PPB (Partido Popular Brasileiro), o PMDB (Partido do Movimento

Democrático Brasileiro), o PTB (Partido Trabalhista Brasileiro), o PDT (Partido

Democrático Trabalhista), o PT (Partido dos Trabalhadores) e o PSDB (Partido Social-

Democrático Brasileiro). Segundo Silva (2007)24:

Não seria exagero afirmar que, da mesma forma que ocorre com a

matéria eleitoral em sua quase totalidade, o nascimento jurídico dos

partidos políticos no Brasil ocorre com o Código Eleitoral de 1932.

Ainda que houvesse os grupos políticos do Império, e mesmo os

partidos políticos da Primeira República, é a Revolução de 1930 e o

Código Eleitoral de 1932 que dão início à verdadeira regulação

jurídica do fenômeno políticoeleitoral no Brasil. Já o reconhecimento

constitucional ocorre apenas com o fim do Estado Novo, com a

Constituição de 1946.

A Constituição de 1946, no que tange à regulamentação de partidos políticos, tinha

como propósito estabelecer que as agremiações fossem nacionais e não locais, como na

Primeira República. Tal prescrição continuou assentada na Constituição de 1988.

Hoje, existem trinta e cinco partidos políticos registrados no TSE (Tribunal Superior

Eleitoral), conforme dados da Tabela 1:

24 SILVA, V. A. Partidos e Reforma Política. Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estad (RERE),

Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, n.º 10, junho/julho/agosto, 2007. Disponível em:

http://www.direitodoestado.com/revista/rere-10-junho-2007-virgilio%20afonso.pdf. Acesso: 26/07/2017,

às 13h45.

42

Tabela 1 – Relação de partidos registrados no TSE25

Partidos registrados no TSE

0001 SIGLA NOME DEFERIMENTO PRES. NACIONAL Nº DA LEGENDA

1 PMDB PARTIDO DO

MOVIMENTO

DEMOCRÁTICO

BRASILEIRO

30.6.1981 ROMERO JUCÁ, no

exercício da presidência

15

2 PTB PARTIDO

TRABALHISTA

BRASILEIRO

3.11.1981 ROBERTO

JEFFERSON

MONTEIRO

FRANCISCO

14

3 PDT PARTIDO

DEMOCRÁTICO

TRABALHISTA

10.11.1981 CARLOS LUPI 12

4 PT PARTIDO DOS

TRABALHADORES

11.2.1982 RUI GOETHE DA

COSTA FALCAO

13

5 DEM DEMOCRATAS 11.9.1986 JOSÉ AGRIPINO

MAIA

25

6 PCdoB PARTIDO COMUNISTA

DO BRASIL

23.6.1988 LUCIANA BARBOSA

DE OLIVEIRA

SANTOS

65

7 PSB PARTIDO SOCIALISTA

BRASILEIRO

1°.7.1988 CARLOS ROBERTO

SIQUEIRA DE

BARROS

40

8 PSDB PARTIDO DA SOCIAL

DEMOCRACIA

BRASILEIRA

24.8.1989 AÉCIO NEVES DA

CUNHA

45

9 PTC PARTIDO

TRABALHISTA

CRISTÃO

22.2.1990 DANIEL S.

TOURINHO

36

10 PSC PARTIDO SOCIAL

CRISTÃO

29.3.1990 EVERALDO DIAS

PEREIRA

20

11 PMN PARTIDO DA

MOBILIZAÇÃO

NACIONAL

25.10.1990 ANTONIO CARLOS

BOSCO

MASSAROLLO,

presidente interino

33

12 PRP PARTIDO

REPUBLICANO

PROGRESSISTA

29.10.1991 OVASCO ROMA

ALTIMARI RESENDE

44

13 PPS PARTIDO POPULAR

SOCIALISTA

19.3.1992 ROBERTO JOÃO

PEREIRA FREIRE

23

14 PV PARTIDO VERDE 30.9.1993 JOSÉ LUIZ DE

FRANÇA PENNA

43

15 PTdoB PARTIDO

TRABALHISTA DO

BRASIL

11.10.1994 LUIS HENRIQUE DE

OLIVEIRA RESENDE

70

25 Tabela disponível em: http://www.tse.jus.br/partidos/partidos-politicos/registrados-no-tse. Acesso:

02/07/2017, às 19h44.

43

16 PP PARTIDO

PROGRESSISTA

16.11.1995 CIRO NOGUEIRA

LIMA FILHO

11

17 PSTU PARTIDO SOCIALISTA

DOS TRABALHADORES

UNIFICADO

19.12.1995 JOSÉ MARIA DE

ALMEIDA

16

18 PCB PARTIDO COMUNISTA

BRASILEIRO

9.5.1996 EDMILSON SILVA

COSTA*

21

19 PRTB PARTIDO RENOVADOR

TRABALHISTA

BRASILEIRO

18.2.1997 JOSÉ LEVY FIDELIX

DA CRUZ

28

20 PHS PARTIDO HUMANISTA

DA SOLIDARIEDADE

20.3.1997 EDUARDO

MACHADO E SILVA

RODRIGUES

(AI nº 0705654-

62.2017.8.07.0000

TJDFT - antecipação da

tutela deferida em

16/05/2017)

31

21 PSDC PARTIDO SOCIAL

DEMOCRATA CRISTÃO

5.8.1997 JOSÉ MARIA

EYMAEL

27

22 PCO PARTIDO DA CAUSA

OPERÁRIA

30.9.1997 RUI COSTA

PIMENTA

29

23 PODE PODEMOS 2.10.1997 RENATA

HELLMEISTER DE

ABREU, no exercício

da presidência

19

24 PSL PARTIDO SOCIAL

LIBERAL

2.6.1998 ANTONIO EDUARDO

GONÇALVES DE

RUEDA, no exercício

da presidência

17

25 PRB PARTIDO

REPUBLICANO

BRASILEIRO

25.8.2005 EDUARDO

BENEDITO LOPES,

no exercício da

presidência

10

26 PSOL PARTIDO SOCIALISMO

E LIBERDADE

15.9.2005 RAIMUNDO LUIZ

SILVA ARAÚJO

50

27 PR PARTIDO DA

REPÚBLICA

19.12.2006 ANTONIO CARLOS

RODRIGUES

22

28 PSD PARTIDO SOCIAL

DEMOCRÁTICO

27.9.2011 ALFREDO COTAIT

NETO, no exercício da

presidência

55

29 PPL PARTIDO PÁTRIA

LIVRE

4.10.2011 SÉRGIO RUBENS DE

ARAÚJO TORRES

54

30 PEN PARTIDO ECOLÓGICO

NACIONAL

19.6.2012 ADILSON BARROSO

OLIVEIRA

51

31 PROS PARTIDO

REPUBLICANO DA

ORDEM SOCIAL

24.9.2013 EURÍPEDES G.DE

MACEDO JÚNIOR

90

32 SD SOLIDARIEDADE 24.9.2013 PAULO PEREIRA DA

SILVA

77

33 NOVO PARTIDO NOVO 15.9.2015 JOÃO DIONÍSIO

FILGUEIRA B.

AMOÊDO

30

44

34 REDE REDE

SUSTENTABILIDADE

22.9.2015 JOSÉ GUSTAVO

FÁVARO BARBOSA

SILVA

18

35 PMB PARTIDO DA MULHER

BRASILEIRA

29.9.2015 SUÊD HAIDAR

NOGUEIRA

35

(*) Nos termos do § 1º do art. 58 do estatuto do PCB, para fins jurídicos e institucionais, os cargos de Secretário Geral do Comitê Central e de Secretário Político dos Comitês Regionais e Municipais

equiparam-se ao de Presidente do Comitê respectivo.

Esse número de partidos apresentado na tabela desperta críticas ao sistema eleitoral

brasileiro e motiva iniciativas populares que desacreditam partidos políticos, sobretudo

aqueles considerados ‘nanicos’ que fazem uso de verbas públicas, mas não têm

representatividade significativa na Câmara e no Congresso. A despeito de tudo isso, o

número de partidos é justificado pela legislação eleitoral26 vigente no país.

1.3. PT, PSDB e Coligações em concorrência nas campanhas eleitorais

Coligações partidárias são agrupamentos de partidos políticos em torno de um projeto

de poder. De acordo com Sartori (1982), tais coligações mostram-se como estratégias

para o empoderamento de determinados grupos políticos, sobretudo em torno daqueles

considerados “partidos relevantes” e que almejam a Presidência da República, não só

por seu posicionamento, à direta, ao centro ou à esquerda, mas também, e

principalmente, pela abrangência e número de eleitores em todo o território nacional. É

o que tem acontecido com os partidos políticos PT e PSDB nos últimos 23 anos (1994-

2017).

26 BRASIL. Lei nº 9.096/1995. Dispõe sobre partidos políticos, regulamenta os arts. 17 e 14, § 3º, inciso

V, da Constituição Federal. (Lei dos Partidos Políticos). D.O.U, 20/09/1995. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9096.htm. Acesso: 20/06/2017, às 14h30.

________________. Resolução/TSE nº 23.093/2009. Dispõe sobre o Sistema de Gerenciamento de

Informações Partidárias (SGIP). (Sistema de Gerenciamento de Informações Partidárias – SGIP). DJE-

TSE, nº 155, de 17/08/2009, p. 27. Disponível em: http://www.tse.jus.br/legislacao-

tse/res/2009/RES230932009.html. Acesso: 24/05/2017, às 08h55.

Resolução/TSE nº 23.465/2015. Disciplina a criação, organização, fusão, incorporação e extinção de

partidos políticos. DJE-TSE, nº 241, de 22/12/2015, p. 2-12. Disponível em:

http://chimera.tse.jus.br/legislacao-tse/res/2015/RES234652015.htm. Acesso: 24/05/2017, às 11h20.

45

No período em referência, estabeleceu-se uma polarização política em torno da qual os

demais partidos (“micros”, segundo Sartori, 1982) articulam-se para compor as

bancadas de situação e de oposição ao governo vigente. Em consequência disso, a

faculdade de compor coligações é atribuída aos partidos, desde que observada a

legislação. Embora, no Brasil, as junções partidárias tenham, por vezes, interesses

pouco republicanos – como o loteamento da estrutura do Estado em troca de apoio

político às ações do governo –, o objetivo primeiro é o de possibilitar força política à

candidatura para propagar seus projetos e consolidá-los após a vitória nas urnas.

De acordo com a Lei nº 9.504/1997, art. 6º, § 1º, a coligação deve funcionar como um

só partido no relacionamento com a Justiça Eleitoral e no trato dos interesses

interpartidários. A par disso, Machado (2006) assevera que, além da preocupação com

o quociente eleitoral, os partidos têm em vista a elevação do tempo disponível no

HGPE, importante instrumento de campanha eleitoral. Desse modo, a identificação

ideológica parece ser fator menos importante na composição das coligações. É o que

ressalta Miguel (2010, p. 34):

Há a descontinuidade do sistema partidário brasileiro, nossos partidos

são criados e desaparecem, se fundem, se partem, mudam de nome.

Há a baixa identificação do eleitorado. Há o personalismo das disputas

políticas. Há o fato de que um político pode passar por diversas

legendas ao longo de sua carreira, de esquerda ou direita. Mas há,

sobretudo, a fraca coesão e o localismo. Fraca coesão que se manifesta

nas votações no poder legislativo e também nas disputas eleitorais,

quando é frequente que lideranças de um mesmo partido apoiem

candidatos diferentes, de peemedebistas e pefelistas abandonando

Ulysses Guimarães e Aureliano Chaves para embarcar na campanha

presidencial de Collor em 1989 até o PSDB kassabista na São Paulo

de 2008. E o localismo que faz com que os partidos ganhem

colorações diferentes de acordo com os caciques locais que os

controlam - ou será que o PSB de Eduardo Campos, de Wilma de

Farias e de Cid Gomes para ficar apenas em três governadores

Nordestinos, é o mesmo partido?

Embora as coligações partidárias mostrem-se instáveis no sistema político brasileiro,

elas têm papel fundamental no jogo político. Segundo Miranda (2013), no período de

1950 a 1962, no Brasil, as coligações foram permitidas. Em 1971, a Lei Orgânica dos

Partidos Políticos as proibiu e, entre 1986 e 1998, elas foram permitidas novamente,

mas os partidos ficaram proibidos de constituir coligações incongruentes para a Câmara

dos Deputados, em relação às firmadas para as governadorias.

46

Para as eleições de 1994, a Lei n. º 8.713/9327 estabeleceu normas, sobretudo quanto às

condições para que os partidos, coligados ou não, pudessem lançar candidatos:

Art. 5º Poderá participar das eleições previstas nesta lei o partido que,

até 3 de outubro de 1993, tenha obtido, junto ao Tribunal Superior

Eleitoral, registro definitivo ou provisório, desde que, neste último

caso, conte com, pelo menos, um representante titular na Câmara dos

Deputados, na data da publicação desta lei.

§ 1º Só poderá registrar candidato próprio à eleição para

Presidente e Vice-Presidente da República:

I - O partido que tenha obtido, pelo menos, cinco por cento dos

votos apurados na eleição de 1990 para a Câmara dos Deputados, não

computados os brancos e os nulos, distribuídos em, pelo menos, um

terço dos Estados; ou

II - o partido que conte, na data da publicação desta lei, com

representantes titulares na Câmara dos Deputados em número

equivalente a, no mínimo, três por cento da composição da Casa,

desprezada a fração resultante desse percentual; ou

III - coligação integrada por, pelo menos, um partido que

preencha condição prevista em um dos incisos anteriores, ou por

partidos que, somados, atendam às mesmas condições.

Segundo levantamento do TSE, publicado no Jornal Folha de São Paulo28, em 1989, o

percentual de deputados eleitos por coligações era de 83,50% e, em 1994, 91,81% dos

513 deputados federais representavam alianças interpartidárias. Esse levantamento

revelou que os partidos utilizam cada vez mais a estratégia das coligações com a

finalidade de ampliar os resultados eleitorais, ou seja, o objetivo é aumentar o número

de parlamentares a despeito de qualquer vínculo ideológico. Nas eleições de 1994, por

exemplo, no Pará, umas das coligações para a Câmara Federal tinha os seguintes

partidos: PDT, PTB, PCB, PPS, PFL, PSB, PSDB e PCdoB.

Se, de um lado, fundado em 1980, o PT alça-se como esquerda29, de outro, o PSDB

intitula-se30 como centro. Em outros tempos, os dois partidos se uniram no segundo

27 BRASIL. Lei n. º 8.713, de 30/09/1993. Estabelece normas para as eleições de 3 de outubro de 1994.

D.O.U. de 1/10/1993. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8713.htm#art73.

Acesso: 28/07/2017, às 03h11. 28 SOUSA, V. Coligações elegem mais de 90% dos deputados federais. Folha de São Paulo, 01 de janeiro

de 1998. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc010102.htm. Acesso: 07/07/2016, às

20h30. 29 PARTIDO DOS TRABALHADORES. Estatuto. Alterações ao Estatuto do PT aprovadas de acordo

com as normas estatutarias e legais, registradas na ata da reunião do Diretório Nacional de 12 de

dezembro de 2013. Disponível em: http://www.justicaeleitoral.jus.br/arquivos/tse-estatuto-do-pt-deferido-

em-5-junho-2014. Acesso: 28/03/2015, às 20h40.

47

turno das eleições à presidência da República de 1989, quando Mário Covas (PSDB),

após amargar o quarto lugar, apoiou o candidato Lula (PT), que disputou o segundo

turno com Collor (PMN).

Não obstante, a partir de 1994, com a vitória de FHC (PSDB), os dois partidos (PT e

PSDB) assumiram, definitivamente, lados opostos na política nacional e, na nova

configuração, formaram alianças em torno de projetos distintos de poder. É o que se

mostra delineado na Tabela 2:

Tabela 2 – Coligações com o PT e com o PSDB no 1º turno (1989-2014)

ANO Coligações com o PT Coligações com o PSDB

1989 PT – PSB – PcdoB PSDB

1994 PT – PSB – PCdoB – PCB –

PV – PPS – PMN – PSTU

PSDB – PFL – PPB – PTB –

PSD

1998 PT – PCB – PSB – PCdoB PSDB – PPB – PTB – PFL –

PSD

2002 PT – PL – PCdoB – PMN –

PCB

PSDB – PMDB

2006 PT – PRB – PCdoB PSDB – PFL

2010 PT – PRB – PDT – PMDB –

PTN – PSC – PR – PTC –

PSB – PCdoB

PSDB – PTB – PPS – DEM –

PMN – PTdoB

2014 PT – PMDB – PSD – PP –

PR – PROS – PDT – PCdoB

– PRB

PSDB – DEM – SD – PTB –

PMN – PTC – PEN – PTdoB

– PTN

Fonte: tabulação nossa. Elaborada com base nos dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

30 PARTIDO DA SOCAIL DEMOCRACIA BRASILEIRA. Estatuto. Alterações aprovadas pela Xl

Convenção Nacional do Partido da Social Democracia Brasileira - PSDB, realizada no dia 18 de maio de

2013, em Brasília, Distrito Federal. Disponível em http://www.justicaeleitoral.jus.br/arquivos/tse-

estatuto-psdb-de-18-5-2013-deferido-em-13-8-2013-1427215183593. Acesso em 28/03/2015, às 22h14.

48

O PSDB venceu duas disputas, em 1994 e em 1998, quando elegeu Fernando Henrique

Cardoso, e o PT ganhou as eleições de 2002 e 2006, alçando Lula, por duas vezes, à

Presidência, e, em 2010 e 2014, as vitórias do PT ficaram por conta de Dilma Rousseff.

A coligação que lançou FHC candidato a presidente, em 1994, era “União Trabalho e

Progresso” e reunia os partidos PSDB, PFL, PPB, PTB e PSD. Já a coligação de Lula

era “Frente Brasil Popular pela Cidadania” e agrupava os partidos PT, PSB, PPS, PV,

PCdoB, PCB e PSTU. De acordo com Guarnieri & Limongi (2014, p. 11):

A estratégia adotada pelo PSDB pede comentários. A candidatura de

Fernando Henrique Cardoso, como se sabe, apoiou-se no sucesso do

Plano Real, lançado quando o candidato era o ministro da Fazenda de

Itamar Franco. Os estrategistas de sua campanha consideraram esse

trunfo insuficiente para garantir a nacionalização de sua candidatura.

O objetivo central era evitar as limitações enfrentadas por Covas cinco

anos antes10. Eis a razão de ser da aliança com o PFL: garantir a

entrada do candidato no Nordeste. O acordo se fez, vale recordar, sem

o apoio do PSDB baiano. Ou seja, a estratégia implicou submeter os

interesses locais aos nacionais. Dito de outra forma: a nacionalização

de um partido, a viabilização de sua candidatura presidencial, passa

por concessões no plano local. Envolve, portanto, uma divisão do

mercado eleitoral em que o cabeça da chapa faz concessões a seus

aliados no plano estadual.

Em 1998, FHC concorria à reeleição, e Lula continuava na oposição. Para aquele pleito,

FHC, na coligação “União, Trabalho e Progresso”, contou com o apoio dos partidos

PSDB, PPB, PFL, PTB e PSD. Lula, na coligação “União do Povo. Muda Brasil”,

assegurou o apoio das agremiações PT, PCB, PSB e PCdoB. É importante observar que,

nas duas eleições, 1994 e 1998, o candidato do PSDB ganhou no primeiro escrutínio,

não havendo, assim, um segundo.

Em 2002, quando o PT chega ao poder com a vitória de Lula, a polarização entre dois

partidos se estabeleceu com mais força, já que o PT se tornou situação ante o

deslocamento do PSDB para a oposição, aliás, os tucanos fincaram-se como a legenda

mais significativa de oposição ao governo. Nas eleições de 2002 e 2006, o TSE instituiu

a verticalização, que estabeleceu que os partidos que integrassem coligações

presidenciais adversárias não poderiam coligar-se nas disputas para os outros cargos,

federais ou estaduais. Contrariados, os parlamentares aprovaram, em 2006, uma

49

Emenda Constitucional nº. 52 que determinou a não obrigatoriedade de manterem-se os

mesmos parceiros de coligação nos diversos pleitos.

É imprescindível ressaltar que o deslocamento da visibilidade dos partidos para as

figuras dos candidatos não diminuiu as negociatas, o fisiologismo, muito pelo contrário,

essa prática, que é parte do sistema político brasileiro e consiste na congregação de

ações políticas e decisões tomadas em troca de favorecimento a interesses particulares,

continuou ora liderada pelos candidatos, ora pelos seus asseclas aglutinados nos

partidos políticos.

O fisiologismo no Brasil, segundo Teixeira31 (2007), é um vício de origem do sistema

político, causado pela fraqueza e divisão dos partidos, pela falta de fidelidade partidária

e pela forma como são construídas as coligações de governo, ou seja, não há

preocupação com pautas nacionais, mas com interesses de determinados grupos sociais

ligados ao mercado financeiro, à religião e aos conglomerados industriais ou midiáticos.

Nesse sentido, a figura do político, sobretudo quando candidato ao cargo de presidente

da República, ganha ainda mais status na conjuntura política do país, principalmente

entre os partidos políticos, seja na disputa eleitoral ou no curso do mandato.

O protagonismo político nas disputas políticoeleitorais fixa-se, portanto, no candidato e

não em seu partido político, muito menos nas ideias suprapartidárias em torno de um

projeto que vise à promoção de políticas públicas, de políticas de estado. Há muito, a

tônica dos projetos de vários políticos brasileiros tem sido a promoção de políticas de

grupos, de governos, infelizmente.

1.4. A práxis política e o protagonismo dos candidatos

Há de se considerar que, embora haja tantos partidos e a legislação regule sua atuação, é

fato que, no Brasil, o protagonismo na política brasileira, desde a redemocratização,

passou a estar vinculado ao candidato e não ao partido político, sobretudo em

campanhas majoritárias. Muito por isso, apresentaremos, neste tópico, um breve

31 ESTADÃO. Fisiologismo virou negociação política. Entrevista com o Professor Marco Antonio

Teixeira, Professor da FGV (Fundação Getúlio Vargas). São Paulo, 29/09/2007. Disponível em:

http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,fisiologismo-virou-negociacao-politica,58072. Acesso:

26/07/2017, às 15h10.

50

histórico de todos os presidentes da República eleitos após a ditadura militar, do

candidato derrotado nas eleições de 2014, Aécio Neves, e de Dilma Rousseff. Tal

percurso tem o propósito de recuperar a trajetória de sujeitos cuja atuação influenciou a

práxis política brasileira nas últimas três décadas, a saber: Tancredo Neves (1985),

Sarney (1985-1990), Collor (1990-1992), Itamar Franco (1992-1994), FHC (1995-

2002), Lula (2003-2010), Dilma Rousseff (2011-2016), e Aécio Neves (candidato em

2014).

1.4.1. Tancredo Neves (1985)32

A eleição de Tancredo Neves – PMDB (Partido do Movimento Democrático

Brasileiro), em 1985, após vinte anos de ditadura militar, mesmo indireta, foi não só

palco do simbolismo da eleição de um cidadão comum para presidência da República,

mas também da comoção da sociedade quando esta soube que Tancredo falecera à

véspera de sua posse, depois de vencer Paulo Maluf – PDS (Partido Democrático

Social), candidato dos militares33 para sucessão do presidente Figueiredo. Diante do fato

concreto, Sarney (PMDB), que havia exercido diversos cargos públicos e eleito vice-

presidente de Tancredo Neves, foi empossado presidente do Brasil em 21 de abril de

1985.

1.4.2. Sarney (1985-1990)34

O governo Sarney foi marcado por tentativas frustradas de medidas econômicas de

combate à inflação e pelo estabelecimento de uma nova Constituição que foi

promulgada em outubro de 1988. Após o governo Sarney, houve, finalmente, eleições

presidenciais diretas, em 1989, realizadas em dois turnos.

A campanha eleitoral de 1989 polarizou forças políticas. Embora vinte e dois candidatos

concorressem ao mais alto cargo do país, entre os quais Brizola (PDT), Enéas

32 A Lei nº 7.465, de 21 de abril de 1986 conferiu a Tancredo Neves o status de ex-presidente do Brasil,

mesmo não tendo sido empossado presidente em 15/03/1985. 33 No Brasil, vigia o período denominado Ditadura Militar. Época em que houve cerceamento dos direitos

democráticos dos cidadãos, prisões autoritárias, mortes e perseguições políticas. 34 O mandato de presidente era de cinco anos. A Constituição de 1988 modificou para quatro anos, que

passou a vigorar a partir das eleições de 1989.

51

(PRONA), Mário Covas (PSDB), Ulysses Guimarães (PMDB), Lula (PT) e Silvio

Santos35 (PMB), apenas Collor e Lula foram para o segundo escrutínio.

Conforme previa a Lei n.º 7.773/8936, dois ou mais partidos poderiam se coligar para

aquela eleição: Collor, pela coligação “Movimento Brasil Novo” – PRN, PSC, PTR e

PST; e Lula, pela coligação “Frente Brasil Popular” – PT, PSB e PC do B. Tais

coligações foram importantes para a viabilização das candidaturas, mas, finalizado o

primeiro turno, os candidatos vitoriosos receberam apoio dos partidos vencidos. Dentre

muitos partidos que apoiaram os dois candidatos no segundo escrutínio, destacaram-se

PDS e PSDB. O primeiro, liderado por Maluf, apoiou Collor, enquanto que o segundo,

liderado por Mário Covas, apoiou Lula. Após a finalização da contagem dos votos37

pelo TSE, o vitorioso foi Collor com uma pequena margem sobre Lula.

1.4.3. Collor (1990-1992)

Collor, além de ser o protagonista da primeira eleição direta para presidente da

República, após vinte e nove anos sem voto direto, amargou também o posto de

primeiro presidente a sofrer impeachment38 no Brasil. Filiado a um partido considerado

pequeno, o PRN (Partido da Reconstrução Nacional), Collor, assim que assumiu o

35 O apresentador de Televisão, Silvio Santos – PMB (Partido Municipalista Brasileiro), também entrou

no páreo eleitoral em 1989, no lugar do Pastor Armando Correia (PMB), mas o dono do SBT acabou

tendo dezoito pedidos de impugnação de sua candidatura que questionaram a legalidade da filiação de

Silvio Santo ao partido. Embasado na lei n.º 5.682/71 (Lei Orgânica dos Partidos Políticos) e no art. 1º, II,

d , da Lei Complementar nº 5/70, que estabelecia serem inelegíveis os candidatos a presidente e vice-

presidente da República que tivessem exercido, nos seis meses anteriores ao pleito, cargo ou função de

direção, administração ou representação em empresas concessionárias ou permissionárias de serviço

público ou sujeitas a seu controle, o TSE declarou extinto o registro provisório do PMB, o que invalidou a

candidatura de Silvio Santos no sufrágio de 1989. Disponível em:

http://www.tse.jus.br/jurisprudencia/julgados-historicos/silvio-santos. Acesso: 27/07/2017, às 21h52. 36 BRASIL. Lei n.º 7.773, de 08/06/1989. Dispõe sobre a eleição para Presidente e Vice-Presidente da

República. D.O.U. de 09/06/1989. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7773.htm.

Acesso: 20/07/2017, às 14h25. 37 Em 1989, depois de 29 anos da eleição direta que levou Jânio Quadros à Presidência da República, o

alagoano Fernando Collor de Mello (lançado pelo pequeno PRN) foi eleito por pequena margem de votos

(42,75% a 37,86%) sobre Luiz Inácio Lula da Silva (PT). FOLHA DE SÃO PAULO. História - 1990 -

Fernando Collor de Mello. Disponível em:

http://www1.folha.uol.com.br/folha/especial/2002/eleicoes/historia-1990.shtml. Acesso: 21/06/2017, às

13h40. 38 BRASIL. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. TÍTULO IV - Da

Organização dos Poderes (Redação da EC 80/2014). CAPÍTULO II - DO PODER EXECUTIVO. Seção

III - Da Responsabilidade do Presidente da República. O impeachment é acolhido pela Constituição de

1988, no Art. 85. Trata-se de processo de impedimento do presidente da República por crimes de

responsabilidade que atentem contra a Constituição Federal.

Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/artigobd.asp?item=%20950. Acesso em

02/07/2017, às 17h21.

52

cargo, adotou medidas econômicas impopulares, como o bloqueio dos saldos das contas

bancárias de pessoas físicas e jurídicas. Tal medida causou complicações até hoje

lembradas pelos brasileiros.

Além disso, Collor foi acusado de participar do esquema de corrupção denominado

“Esquema PC Farias”. As denúncias davam conta de que Paulo César Farias, tesoureiro

da campanha eleitoral de Collor, era peça-chave no esquema. Em reportagem, a revista

Veja39 publicou uma entrevista com o irmão de Collor, Pedro Collor de Mello, que

apresentou detalhes do esquema bilionário de corrupção.

Em 2 de outubro de 1992, Collor foi afastado temporariamente da Presidência da

República, em decorrência da abertura do processo na Câmara dos Deputados.

Renunciou ao cargo em 29 de dezembro no mesmo ano, mas foi condenado pelo Senado

por crime de responsabilidade e teve seus direitos políticos cassados, tornando-se

inelegível por oito anos.

1.4.4. Itamar Franco (1992-1994)

Como rege a Constituição40, em caso de afastamento do presidente, assume o vice-

presidente, neste caso, o engenheiro Itamar Augusto Cauteiro Franco, conhecido como

Itamar Franco, que mudara de partido apenas para compor a chapa de Collor no PRN. O

governo Itamar foi marcado por mudanças na condução da política econômica,

principalmente, em 1994, com a criação do Plano Real. O programa instituiu uma nova

moeda nacional, o Real, e conseguiu, com reformas econômicas, conter a hiperinflação.

39 AZEVEDO, R. Entrevista de Pedro Collor de Mello. (VEJA). Disponível em:

https://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/a-entrevista-que-pedro-concedeu-a-veja-ha-20-anos-e-que-esta-na-

raiz-do-odio-que-fernando-collor-tem-da-revista/. Acesso: 20/03/2016, às 18h32. 40 BRASIL. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. TÍTULO IV - Da

Organização dos Poderes (Redação da EC 80/2014). CAPÍTULO II - DO PODER EXECUTIVO. Seção

III - Da Responsabilidade do Presidente da República. O processo deve ser autorizado pela Câmara dos

Deputados, por 2/3 de seus membros, a instauração do processo (CF, art. 51, I), ou admitida a acusação

(CF, art. 86), o Senado Federal processará e julgará o presidente da República nos crimes de

responsabilidade.

Disponível em: http:// http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/artigobd.asp?item=%20950. Acesso em

02/07/2017, às 17h21.

53

1.4.5. FHC (1995-2002)

Após o término do governo Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso (FHC) disputou

a presidência com Luiz Inácio Lula da Silva (Lula) nas eleições de 1994 e 1998,

ocasiões em que FHC saiu vitorioso nos primeiros turnos, o que permitiu ao PSDB

governar o país por quase uma década.

Antes de presidir o país por tanto tempo, FHC experienciou algumas situações.

Inicialmente, como militante de esquerda, após o golpe militar de 1964, exilou-se no

Chile e, mais tarde, na França. Voltou ao Brasil em 1968 e tornou-se professor de

ciências políticas na USP (Universidade de São Paulo). Algum tempo depois, foi

aposentado compulsoriamente pelo AI-5 (Ato Institucional nº 5). Fundou, então, com

outros pesquisadores cassados, o CEBRAP.

Em 1978, foi eleito suplente de Franco Montoro para o Senado, pelo MDB e assumiu o

cargo em 1983, quando Montoro foi empossado governador de São Paulo. Em 1985,

FHC foi candidato a prefeito de São Paulo, mas perdeu o pleito para Jânio Quadros. Em

1986, reelegeu-se para o Senado. Em 1988, fundou, com outros líderes políticos, o

PSDB. Em 1992, tornou-se ministro das Relações Exteriores do governo Itamar Franco,

e, em 1993, assumiu a pasta da Fazenda, integrando, assim, o grupo responsável pela

criação do Plano Real. Com a sensação de estabilidade percebida pela população, FHC

concorreu ao cargo de presidente da República nas eleições de 1994, quando venceu no

primeiro turno.

O primeiro governo FHC foi marcado não só pela busca da estabilização da economia,

mas também pelas privatizações de empresas estatais das áreas de comunicação e

petróleo, e pela eliminação de restrições ao capital estrangeiro. Para muitos

especialistas, a política de privatização de empresas estatais renovou o país nas áreas de

telefonia e de extração e comercialização de minérios, ponto de vista que é contestado

por representantes de outros setores da sociedade, sobretudo por partidos como PT e o

PSOL.

54

Antes de findar o primeiro mandato, em 1998, FHC articulou a Emenda à Constituição

n.º 1641, aprovada pelo Congresso, que tornou a reeleição possível no Brasil. Com tal

manobra legal, com os índices de aprovação popular elevados e a economia com sinais

positivos, reelegeu-se já no primeiro turno. Como legado dos dois mandatos de FHC,

pode-se citar a regulamentação do Programa Nacional de Renda Mínima42, a

distribuição gratuita de medicamentos aos portadores do HIV (Vírus de

imunodeficiência humana)43 e a criação dos remédios genéricos44, vendidos a preços

menores que os praticados por laboratórios tradicionais.

Por um lado, apesar das crises externas, que impactaram a economia brasileira durante

os quatro anos de seu segundo governo, o Plano Real mostrou-se forte e a inflação

manteve-se baixa. Por outro lado, o setor energético não recebeu investimentos

suficientes para impedir um colapso nas centrais hidrelétricas que ameaçou o país com a

chamada "crise do apagão"45. O racionamento de energia elétrica foi imposto e a

economia brasileira ficou estagnada por um período. Tal deficiência no setor elétrico foi

o mote de que a oposição precisava para dar cabo da era PSDB no poder.

41 BRASIL. Emenda à Constituição, nº 16, de 04 de junho de 1997. Dá nova redação ao § 5º do art. 14,

ao caput do art. 28, ao inciso II do art. 29, ao caput do art. 77 e ao art. 82 da Constituição Federal.

D.O.U. de 05/06/1997. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc16.htm. Acesso: 26/07/2017, às

00h20. 42 BRASIL. Decreto nº 3.934, de 20 de setembro de 2001.

Aprova o Regulamento do Programa Nacional de Renda Mínima vinculado à saúde: "Bolsa-Alimentação"

e dá outras providências. D.O.U. 21/09/2001. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2001/D3934htm.htm. Acesso: 26/07/2017, às 00h30. 43 BRASIL. Lei n.º 9.313, de 13 de novembro de 1996.

Dispõe sobre a distribuição gratuita de medicamentos aos portadores do HIV e doentes de AIDS. D.O.U.

de 14/11/1996. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9313.htm. Acesso:

26/07/2017, às 00h28. 44 BRASIL. Lei nº 9.787, de 10 de fevereiro de 1999. Altera a Lei no 6.360, de 23 de setembro de 1976,

que dispõe sobre a vigilância sanitária, estabelece o medicamento genérico, dispõe sobre a utilização de

nomes genéricos em produtos farmacêuticos e dá outras providências. D.O.U. 11/02/1999. Disponível

em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9787.htm. Acesso: 26/07/2017, às 00h35. 45 Foi uma crise energética no Brasil que prejudicou o fornecimento e a distribuição de energia elétrica.

Ocorreu entre 2001 e 2002, durante o segundo mandato de FHC. Especialistas afirmam que houve muitas

causas, dentre as principais, a falta de planejamento e investimentos em geração de energia. O GLOBO.

Da falta de estrutura fez-se a ‘crise do apagão’ no Brasil do início do século XXI. Disponível em:

http://acervo.oglobo.globo.com/fatos-historicos/da-falta-de-estrutura-fez-se-crise-do-apagao-no-brasil-do-

inicio-do-seculo-xxi-9396417. Acesso: 27/07/2017, às 18h50.

55

1.4.6. Lula (2003-2010)

Com a derrocada do PSDB a partir de 2002, o PT governou o Brasil. O governo petista

durou até 31 de agosto de 2016, quando a presidente Dilma Rousseff foi afastada

definitivamente da Presidência, após impeachment46 admitido e julgado procedente pela

Câmara e pelo Senado.

O PT ficou na Presidência da República por mais tempo que o PSDB. Foram dois

mandatos consecutivos de Lula e um e meio de Dilma Rousseff, todos com vitórias em

segundo escrutínio eleitoral, diferentemente de FHC, que venceu em primeiro turno nas

duas disputas das quais participou.

Em 2002, Lula venceu José Serra (PSDB); em 2006, Lula venceu Geraldo Alckmin

(PSDB); em 2010, Dilma venceu José Serra (PSDB); e, em 2014, Dilma venceu Aécio

Neves (PSDB). O PT participa das eleições presidenciais brasileiras desde 1989 e tem

na figura de Lula, ex-líder sindical, sua principal força política em âmbito nacional.

Quando ingressou na política, Lula teve seu primeiro teste eleitoral ao ser candidato a

governador de São Paulo, em 1982. Ficou em quarto lugar. Quatro anos depois, elegeu-

se deputado constituinte com votação expressiva47. Nas eleições de 1988, o PT venceu

em 37 prefeituras do país - entre elas, São Paulo, com a candidata Luiza Erundina,

primeira mulher eleita prefeita na maior e mais rica cidade do Brasil. A partir dali,

foram catorze anos de presença do PT em diferentes esferas do poder público, até a

chegada de Lula à Presidência do país, na quarta tentativa, em 2002.

46 Em 26/10/2014, Dilma (PT) foi reeleita após um confronto eleitoral acirrado com o candidato Aécio

Neves (PSDB). Antes da posse de Dilma, Aécio e líderes da oposição gravaram um vídeo, em

05/12/2014, convocando a população para um protesto e, em 18/12/2014, o PSDB protocolou no TSE um

pedido de cassação do registro da chapa Dilma-Temer pelo fato de o ex-diretor de Abastecimento da

Petrobras Paulo Roberto Costa ter afirmado ao Ministério Público Federal, em colaboração premiada, que a

campanha de Dilma para a Presidência, em 2010, recebeu recursos de desvios cometidos na Petrobras, desse

modo, PT e PMDB eram os maiores beneficiários do esquema de corrupção. PASSARINHO, N. PSDB pede

a TSE cassação de Dilma e posse de Aécio como presidente. (G1). Disponível em:

http://g1.globo.com/politica/noticia/2014/12/psdb-pede-tse-cassacao-de-dilma-e-posse-de-aecio-como-

presidente.html. Acesso: 27/07/2017, às 19h29.

47 CÂMARA DOS DEPUTADOS. Biografia de Luiz Inácio Lula da Silva – PT/SP. Deputado Federal

(Constituinte), 1987 – 1991, posse em 01/02/1987. Disponível em:

http://www2.camara.leg.br/deputados/pesquisa/layouts_deputados_biografia?pk=106585&tipo=0.

Acesso: 26/07/2017, às 00h52.

56

O sindicalista foi definido candidato pelo partido para concorrer à presidência em 1989,

quando conseguiu chegar ao segundo turno, superando Leonel Brizola – PDT –

governador do Rio de Janeiro, e Mário Covas – presidente do recém-criado PSDB. No

segundo escrutínio, Lula perdeu o confronto para Fernando Collor de Mello – PRN. Por

sua vez, Brizola e Covas apoiaram Lula no segundo turno.

Polarizada a disputa, Collor, à época evidenciado pelo bom relacionamento que tinha

com a imprensa, sobretudo com a Rede Globo48, utilizou o espaço do HGPE para incutir

medo no eleitorado, associando o candidato Lula ao fim do direito à propriedade

privada, ao confisco de bens, às invasões de terra, à ocupação de fábricas etc., além de

divulgar testemunho de Miriam Cordeiro, ex-companheira de Lula, em que acusou o

candidato petista de ter pedido a ela que fizesse um aborto na década de 1970. Houve,

portanto, uma exploração significativa desses fatos não só no HGPE, mas também em

outras mídias, o que enfraqueceu a campanha do petista.

De sua parte, com discurso popular, Lula atingia grande parte da população, mas não

alcançava uma parcela da sociedade que, embora menor, era (e continua) dominante. O

jingle do petista era “Lula lá” e, em discursos midiatizados, combatia Collor. Este, de

outro lado, prometia reduzir os altos salários daqueles que denominava “marajás”,

assim, passou a ser conhecido como o “caçador de marajás”. No sufrágio, Collor venceu

Lula, 42,75% a 37,86% dos votos, respectivamente49.

Curioso perceber que, desde quando o segundo turno foi instaurado no país, em 198850,

a projeção feita por pesquisas de opinião51 e a exposição dos candidatos na mídia

48 À época (1989), havia especulações acerca do favorecimento da Globo ao candidato Collor,

principalmente quanto às edições nos debates realizadas pela emissora. Em entrevista ao site UOL

Notícias (15/11/2009), Collor afirma que “a boa relação com a Globo ajudou a evitar armadilhas, algo

que estivesse tentando montar contra a minha candidatura”. O candidato é dono de emissora de TV em

Alagoas filiada à Rede Globo e, à época, era governador desse estado. SEREZA, C, H. Relação com a

Globo 'ajudou bastante', lembra Collor; senador diz ter pensado, na véspera, que perderia a eleição.

(UOL). Disponível em: https://noticias.uol.com.br/especiais/eleicoes-

1989/ultnot/2009/11/15/ult9005u10.jhtm. Acesso: 26/07/2017, às 01h28. 49 TSE. Julgados históricos. Collor. Informações gerais. Disponível em:

http://www.tse.jus.br/jurisprudencia/julgados-historicos/collor. Acesso: 26/07/2017, às 01h47. 50 De acordo com os artigos 28, 29, inciso II, e 77, todos da Constituição de 1988, o segundo turno

poderá ocorrer apenas nas eleições para presidente e vice-presidente da República, governadores e vice-

governadores dos estados e do Distrito Federal e para prefeitos e vice-prefeitos de municípios com mais

de 200 mil eleitores. Logo, são eleitos em uma única votação os senadores, deputados federais, deputados

estaduais e vereadores, assim como prefeitos e vice-prefeitos de municípios com menos de 200 mil

eleitores.

57

mostram a força ou a fraqueza dos candidatos, estejam à frente ou atrás numericamente,

o que pode determinar, no imaginário social, aquele que tem mais ou tem menos

condições de lograr êxito no pleito eleitoral.

Entre 1989 e 2014, cinco das sete disputas presidenciais foram para o segundo turno:

em 1989, 2002, 2006, 2010, 2014. Nos cinco casos, de acordo com pesquisas de

intenção de voto, os candidatos derrotados começaram a campanha do segundo turno

em desvantagem em relação ao vencedor. Foi o que ocorreu com o Lula em 198952,

quando disputou o segundo turno com Fernando Collor. Na ocasião, as últimas

pesquisas mostravam Collor como favorito.

De 1994 a 2014, houve um acirramento mais acentuado nas disputas para Presidente da

República. Os partidos PT e PSDB enfrentaram-se em todas as seis eleições, mas, em

duas delas (1994 e 1998), o PSDB, representado por FHC, saiu vitorioso. Já em 2002 e

2006, quando Lula (PT) disputou as eleições com José Serra (PSDB) e Geraldo

Alckmin (PSDB), respectivamente, o petista acabou saindo vitorioso das duas eleições –

teve vantagem significativa no primeiro turno e, de acordo com pesquisa Datafolha53,

feita às vésperas do segundo turno, Lula tinha 64% dos votos válidos (excluindo

brancos e nulos), contra 36% de Serra, tal previsão ficou próxima da apuração final54

feita pelo TSE, 61,3% (Lula) e 38,7% (Serra).

O PT chegou ao patamar mais alto da República em 2002, após mudar sua plataforma

de governo, realinhar suas bases e reestilizar seu discurso. Tais medidas fizeram com

que Lula mantivesse-se no poder por dois mandatos (2002-2006 / 2006-2010).

51 Os institutos de pesquisas surgiram no Brasil a partir de 1942. Entre tantos, o primeiro foi o IBOPE –

Instituto Brasileiro de Opinião Pública; o segundo foi O Instituto Gallup (1967); o terceiro foi o Datafolha

(1983); e o quarto, em 1984, foi o Vox Populi. BIROLI, F. et alii. Mídia, eleições e pesquisa de opinião

no Brasil (1989-2010): um mapeamento da presença das pesquisas na cobertura eleitoral.

(COMPOLÍTICA).Disponível: http://www.compolitica.org/revista/index.php/revista/article/viewFile/6/4.

Acesso: 02/07/2017, às 17h56. 52 DATA FOLHA. Intenção de voto presidente 1989 – 2º turno. (Folha). Disponível em:

http://datafolha.folha.uol.com.br/eleicoes/1989/12/1203337-intencao-de-voto-presidente-1989---2-

turno.shtml. Acesso: 05/10/2015, às 20h. 53DATA FOLHA. Eleições 2002 e 2006. Disponível em:

http://datafolha.folha.uol.com.br/eleicoes/2002/indice-1.shtml e

http://datafolha.folha.uol.com.br/eleicoes/2006/indice-1.shtml. Acesso:10/01/2014, às 14h25. 54 TSE. Eleições 2002. Disponível em: https://eleicoes.uol.com.br/2002/. Acesso: 02/07/2017, às 20h17.

58

Após perceber as mudanças sociais por que o país vinha passando, o PT buscou retratar

tais mudanças em seu discurso e em sua imagem. Em 2002, o “Lula lá” deu lugar à “Por

um país decente” e para a reeleição, em 2006, a vez era de “Lula de novo com a força

do povo”. Em 2010, era “Meu Brasil tá querendo Dilma...agora é Dilma! É a vez da

mulher”. Em 2014, era “Dilma, coração Valente”.

1.4.7. Dilma Rousseff (2011-2016)

Após muitas mudanças na política e avanços democráticos protagonizados pelo Brasil

ao eleger um operário ao cargo mais alto da República, o país fortaleceu o sistema

eleitoral, sobretudo no que cerne ao papel da mulher, aquela que ainda não havia

galgado o posto de presidente da República.

Não obstante, é válido ressaltar que dos quinhentos e treze Deputados da Câmara

Federal a maioria continua sendo do sexo masculino; no Senado, com 81 parlamentares,

o cenário é semelhante. Esse era o panorama do poder no Brasil até 2010, ano em que a

primeira mulher foi eleita presidente do Brasil.

Durante as eleições de 2010, o PT de Lula ousou lançar candidata à presidência alguém

que nunca havia concorrido a um cargo público e que, ao longo da vida política, ocupou

apenas cargos técnicos. Antes, o PT já tinha mulheres como quadros importantes no

cenário político, senadoras, deputadas, prefeitas e vereadoras. Entre os tais, Luiza

Erundina, ex-prefeita de São Paulo – atualmente no PSOL; Marta Suplicy, ex-prefeita

de São Paulo, ministra e, atualmente, senadora pelo PMDB; Marina Silva, ex-ministra

do Meio Ambiente e senadora pelo PT, atualmente é filiada à REDE Sustentabilidade,

partido que fundou visando às eleições de 2014 e 2018.

Após a queda de José Dirceu – ex-ministro da Casa Civil nos governos Lula, acusado de

orquestrar o “mensalão”, Lula, que havia posicionado Dilma em cargos de maior

visibilidade no governo federal, entre eles o de Ministra de Minas e Energia, percebeu a

importância de empossar Dilma ao cargo de Ministra Chefe da Casa Civil, cargo que

deu a ela muito destaque.

59

Dilma foi apresentada pelo presidente Lula ao povo brasileiro em um evento público no

complexo do Alemão, em março de 2008, no Rio de Janeiro, durante lançamento de

obras, como “mãe do PAC”55. Tal ocasião marcou, definitivamente, após várias

especulações, Dilma candidata à Presidência da República do Brasil, dois anos antes das

eleições.

Segundo Amaral (2011), Dilma conciliava seu trabalho diário com os diversos pedidos

de entrevistas e especulações sobre projetos de governo, até que, em maio de 2009,

notícias estampadas nos jornais revelavam que Dilma estava sendo submetida a um

tratamento contra um câncer. Após se recuperar totalmente do câncer, Dilma investiu

em sua candidatura, a começar por sua imagem. Retocou o corte e a cor dos cabelos, fez

alguns procedimentos estéticos e intensificou as caminhadas diárias. Tratava-se de um

recomeço. Tal recomeço estava relacionado à sua vida pessoal, uma vez que, na vida

política, seria um começo, pois se tratava da primeira vez que disputaria uma eleição.

Se o PT já tinha Dilma como candidata, o PSDB tinha Serra, candidato que participou

do governo Montoro (São Paulo), foi Ministro da saúde no governo FHC, governador

do estado de São Paulo e prefeito da cidade de São Paulo. Os tucanos (como são

chamados os membros do PSDB) estavam confiantes que Dilma não chegaria nem perto

dos altos índices que apontavam a vitória de Serra, já no primeiro turno. Segundo

Amaral (2011, p. 225), para o PSDB, ele (Serra) era o candidato mais preparado, e

Dilma, uma iniciante, ou como os tucanos a chamavam, um “poste de Lula”.

Com a disputa mais acirrada nos dias que antecederam as eleições, a campanha de 2010

foi marcada por resvalos do “mensalão”56, mas o fato de a candidata do PT nunca ter

disputado uma eleição foi ainda mais estampado nas propagandas eleitorais tucanas.

Dilma foi taxada de “poste” pela oposição, imagem que serviu de mote para Lula que,

durante seus pronunciamentos nas propagandas eleitorais petistas, dizia que “de poste

em poste, vamos iluminar o Brasil”, em alusão aos avanços obtidos no governo Lula,

55 REUTERS. Lula apresenta Dilma como mãe do PAC em favelas do Rio. Disponível em:

https://br.reuters.com/article/companyNews/idBRN0733097220080307. Acesso: 24/08/2016, às 18h20. 56 NUNOMURA, E.Y. O mensalão impresso: o escândalo político-midiático do governo Lula nas

páginas de Folha e Veja. Dissertação de Mestrado. ECA, USP, São Paulo, 2012. Disponível em:

www.teses.usp.br/teses/disponiveis/27/27153/tde-18122012-125216/publico/EN.pdf

60

por exemplo, com o programa “Luz para todos”, que beneficiou milhões de brasileiros

em todo o país.

Não foi só o apadrinhamento de Lula que garantiu a campanha vencedora de Dilma,

houve também um amplo arco de alianças político-partidárias, a fim de garantir

condições políticas e de sustentação da candidata no processo políticoeleitoral. De

acordo com Amaral (2011), assim como ocorreu em eleições passadas, quando Lula era

candidato, a oposição passou a querer incutir na opinião pública que, se Dilma fosse

eleita em 2010, o aborto seria liberado, igrejas seriam fechadas etc. Todos esses ataques

resvalaram nos números de pesquisas, de diversos institutos. A candidata do PT perdia

pontos. Diante disso, mais uma vez, Lula posou para as câmeras e, com semblante

austero, afiançou a candidata de seu partido no HGPE.

As eleições presidenciais de 2010 agitaram o contexto político nacional. Os problemas

que cercavam o governo Lula, “mensalão” entre os piores, e o fato de assuntos pontuais,

tais como aborto e a inexperiência da candidata, serem difundidos na grande mídia, fez

abrir brechas para que os adversários políticos atacassem a candidata do PT. Mesmo

assim, todos os ataques não fizeram frente o bastante para tirar da lembrança do eleitor

o imaginário de que havia bom desenvolvimento do país, sobretudo do ponto de vista

econômico, proporcionado durante o governo de Lula.

Naquele momento, não importava quem era a candidata, desde que Lula fosse o

avalista. Dilma venceu seu adversário político (José Serra), no segundo turno, com

55.752.52957 votos, doze milhões a mais que Serra. Segundo Amaral (2011, p. 302):

não era apenas a primeira mulher a conquistar a presidência da

República, num país onde a presença feminina nas lutas sociais é

marcante, mas sua representação política nunca chegou a 10% das

cadeiras do Congresso. Dilma era também a primeira representante da

geração que se formou no combate à ditadura a conquistar o poder em

eleições livres, as primeiras que ela disputou nos 63 anos de vida que

ia completar em 14 de dezembro, duas semanas antes de assumir o

comando do país.

57 TSE. Eleitor e eleições. Disponível em http://www.tse.jus.br/eleicoes/eleicoes-anteriores/eleicoes-2010/eleicoes-

2010. Acesso em 23/11/2012.

61

No primeiro turno da eleição de 201058, a candidata do PT à Presidência, Dilma

Rousseff, também estava à frente de seu opositor no primeiro turno, recebeu 46,91%

dos votos válidos, contra 32,61% de José Serra (PSDB). Em 201459, não foi diferente,

no primeiro turno, Dilma Rousseff ficou com 41,59% dos votos válidos (43.267.668) e

Aécio Neves (PSDB) com 33,55% dos votos válidos (34.897.211).

1.4.8. Históricos de Aécio Neves e Dilma Rousseff

A seguir, reproduzimos breve histórico dos candidatos60 que visa a situá-los como

figuras públicas e candidatos políticos.

Aécio Neves da Cunha

Foto: Flickr

Natural de Belo Horizonte, Aécio Neves da Cunha nasceu em 10 de

março de 1960. Formado em Economia pela Pontifícia Universidade

Católica de Minas Gerais (PUC-Minas), começou sua carreira política

como secretário pessoal do avô Tancredo Neves - presidente da

República eleito em 1985 pelo Colégio Eleitoral, morto antes de tomar

posse. Um ano depois da morte do avô, Aécio elegeu-se deputado

federal constituinte.

Em 1990, já filiado ao PSDB, conquistou seu segundo mandato na

Câmara. Dois anos depois, concorreu, sem sucesso, à eleição para a

Prefeitura de Belo Horizonte. Em seu terceiro mandato como

deputado federal, tornou-se líder da bancada do seu partido.

58 FOLHA DE SÃO PAULO. Eleições 2010 - Apuração – 1º turno. Disponível em:

http://eleicoes.folha.uol.com.br/2010/1turno/apuracao-presidente.shtml. Acesso: 10/01/2014, às

14h55. 59 ________________. Eleições 2014 – Apuração – 1º turno. Disponível em:

http://eleicoes.folha.uol.com.br/2014/1turno/presidente/br.shtml. Acesso: 05/04/2015, às 15h22. 60 ULTIMO SEGUNDO. Aécio Neves e Dilma Rousseff. (IG). Disponível em:

http://ultimosegundo.ig.com.br/aecio-neves/53ea210f08ec508e570000a4.html e

http://ultimosegundo.ig.com.br/dilma-rousseff/53e8e018a5fea40938000077.html. Acesso: 10/05/2017, às

18h35.

62

Em 2001, em uma articulação que contou com a ajuda do então

ministro da Saúde José Serra, apresentou-se como candidato à

presidência da Câmara à revelia do PFL (atual DEM), principal aliado

do governo Fernando Henrique Cardoso. Eleito, tomou medidas,

como a criação do Conselho de Ética, que ajudaram a pavimentar seu

nome para a disputa do governo de Minas Gerais.

Eleito duas vezes no primeiro turno e com a maior taxa de aprovação

entre governadores em 2009, foi cotado para disputar a vice-

presidência na chapa de Serra em 2010, mas recusou o convite. No

mesmo ano, foi eleito senador.

Dilma Vana Rousseff

Foto: Site oficial do Palácio do Planalto

Dilma Vana Rousseff nasceu em Belo Horizonte em 14 de dezembro

de 1947. Iniciou sua militância política aos 16 anos e ingressou na luta

armada contra a ditadura militar. Foi presa em 1970 por quase três

anos e submetida à tortura. Após deixar a prisão, Dilma mudou-se

para Porto Alegre e formou-se em Economia na Universidade Federal

do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Em 1980, ajudou a fundar o PDT, legenda a qual permaneceu filiada

até 2001, quando entrou para o PT. Durante a campanha de 2002, que

levou Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência, Dilma ganhou destaque

na equipe responsável por formular o plano do governo na área

energética. Foi convidada então a ocupar a pasta de Minas e Energia

em 2003. Permaneceu no cargo até 2005, quando substituiu José

Dirceu, atingido pelo escândalo do mensalão, na Casa Civil.

Em 2009, revelou que se submetera a tratamento contra um linfoma

descoberto em exame de rotina. Após sessões de radioterapia e

quimioterapia, anunciou que estava curada do câncer. Meses depois,

teve sua candidatura à Presidência oficializada pelo PT.

Dilma comandou uma extensa campanha pelo País, tendo Lula como

seu principal cabo eleitoral. Viu a disputa ser levada ao segundo turno

em meio a denúncias envolvendo Erenice Guerra, sua antiga auxiliar e

então ministra da Casa Civil. Na segunda etapa da votação, Dilma

confirmou seu favoritismo e se tornou a primeira presidente mulher do

Brasil.

63

1.5. Mídia: espaço privilegiado na disputa política

Gregolin (2007) afirma que aquilo que os textos da mídia oferecem não é a realidade,

mas uma construção que permite ao leitor produzir formas simbólicas de representação

da sua relação com a realidade concreta. Ainda, segundo a autora:

Na sociedade contemporânea, a mídia é o principal dispositivo

discursivo por meio do qual é construída uma “história do presente”

como um acontecimento que tensiona a memória e o esquecimento. É

ela, em grande medida, que formata a historicidade que nos atravessa

e nos constitui, modelando a identidade histórica que nos liga ao

passado e ao presente. Esse efeito de “história ao vivo” é produzido

pela instantaneidade da mídia, que interpela incessantemente o leitor

através de textos verbais e não-verbais, compondo o movimento da

história presente por meio da ressignificação de imagens e palavras

enraizadas no passado. Rememoração e esquecimento fazem derivar

do passado a interpretação contemporânea, pois determinadas figuras

estão constantemente sendo recolocadas em circulação e permitem os

movimentos interpretativos, as retomadas de sentidos e seus

deslocamentos. Os efeitos identitários nascem dessa movimentação

dos sentidos. (GREGOLIN, 2007, p. 16).

A mídia é um espaço privilegiado para aqueles que dominam tal território, uma vez que

os discursos que lá circulam utilizam estratégias discursivas capazes de transformar o

irreal em real, o falso em verdadeiro, tudo isso, segundo Gregolin (2007), baseados em

técnicas como a confissão (reportagens, entrevistas, depoimentos, cartas, pesquisas),

que operam um jogo em que se constituem identidades baseadas no regramento de

saberes sobre a utilização que as pessoas devem fazer de seu corpo, de sua vida. Nesse

sentido, Gregolin assevera que:

Podemos enxergar essa rede de discursos tomando alguns exemplos

de propagandas, veiculadas na grande mídia brasileira, com base nas

quais institui-se a subjetivação tanto nas práticas que propõem a

modelagem do corpo como na construção dos lugares a serem

ocupados por homens e mulheres na sua relação com os outros.

Articuladas a outros enunciados que com elas dialogam nos meios de

comunicação, essas propagandas são verdadeiros dispositivos por

meio dos quais instalam-se representações, forjam-se diretrizes que

orientam a criação simbólica da identidade. (GREGOLIN, 2007, p.

18).

64

Nas eleições para presidente do Brasil, a partir dos anos 1980, os líderes políticos

passaram a agregar identidades coletivas e que puderam ser identificadas pelo eleitor,

independentemente da filiação partidária do candidato. A relação dos candidatos com o

eleitor passou a ser configurada via mídia, principalmente pela televisão, que se

instituíra como um dos principais cenários de representação política, sobretudo após a

regulamentação do HGPE.

Não obstante, segundo aponta Carvalho (1990, p. 17), na República Velha (1894),

apenas cerca de 2% da população votava; em 1922, eram 833.270 os eleitores, o que

correspondia a 2,9% da população; em 1930, eram apenas 5,6% da população, ou seja,

1.890.805 de eleitores. Se comparado aos dados de eleições mais recentes. Carvalho

ainda assevera que esses percentuais parecem irrisórios quando comparados com os

dados de eleições mais recentes.

Nesse cenário, tendo em vista o crescente papel da mídia no campo político, os eleitores

passam a aderir às candidaturas com mais volatilidade, ou seja, a mídia se tornou o

principal meio de informação política, haja vista sua atuação como promotora de

debates e propagadora de pesquisas de opinião e de intenção de voto. Os debates, antes

restritos ao âmbito interno dos partidos políticos, ganharam visibilidade na mídia. Até

as disputas internas dos partidos passaram a ser exploradas com mais frequência nos

órgãos de imprensa.

Esse cenário é atual. As campanhas políticas pelos meios de comunicação de massa são

recentes. Sua expansão confunde-se com a chegada da televisão entre as décadas de

1950 e 1970. Desde o período de redemocratização, nos anos 1980, é percebida a

influência da mídia, marcadamente a televisiva, nas campanhas políticoeleitorais, pois

estão cada vez mais marcadas por um alto grau de profissionalização, com propagandas

midiatizadas que atraem os eleitores por meio de recursos da mídia, espaço privilegiado

da disputa.

Após o início do HGPE, em 1962, boa parte dos eleitores tomou conhecimento dos

candidatos e decidiram em quem votar. O HGPE é um espaço garantido por lei para os

partidos apresentarem gratuitamente as suas propagandas. No entanto, sabe-se que, há

65

algum tempo, são contratados especialistas em marketing e publicidade para tornar as

campanhas cada vez mais profissionais e atrativas para o eleitor.

Durante o HGPE, o candidato pode dirigir-se aos eleitores de maneira individual ou

coletiva; discursar para um grande público; atacar um adversário; veicular mensagens

de apoio de seus aliados ou discursos pontuais de seus adversários; utilizar repórteres e

atores em cenários ficcionais.

Nas eleições para presidente do Brasil, a partir dos anos 1980, os líderes políticos

passaram a agregar identidades coletivas que podem ser identificadas pelo eleitor,

independentemente da filiação partidária do candidato, como liderança carismática, ou

seja, como candidato político em que se deve votar. A relação dos candidatos com os

eleitores passou a ser configurada via mídia, principalmente pela televisão. A campanha

eleitoral de 2014 teve a mídia como eixo do processo, sobretudo por causa do tempo de

propaganda eleitoral na TV e no rádio. Conforme dados da Tabela 2, no primeiro turno

das eleições de 2014 – de 19/08 a 02/10 –, a coligação encabeçada pelo PSDB (Muda

Brasil) teve 04min35s ante 11min24s da coligação encabeçada pelo PT (Coligação com

a força do povo). No segundo turno – de 10/10 a 24/10 –, cada coligação teve 10min.

Na era da internet, época em que as redes de relacionamento repercutem discursos,

sobretudo políticos, é comum ver mobilizações de grandes proporções em várias partes

do mundo. No Brasil, tal fenômeno ganhou forma substancial em 2013, durante as

manifestações que reivindicavam a redução dos preços das passagens de transporte

público em várias cidades do país, sobretudo em São Paulo e no Rio de Janeiro. De

acordo com Souza:

No caso do MPL-SP, a reinvindicação que perdura há mais de oito

anos está relacionada à diminuição da tarifa do transporte público.

Desde 2006, o MPL-SP mobiliza-se para barrar os aumentos no preço

das tarifas, entretanto, só em 2013 que o movimento logrou êxito. Tal

ação teve um efeito ‘jurisprudencial’, pois interveio na tomada de

decisão dos órgãos públicos de várias regiões do Brasil, não só em

São Paulo. (SOUZA, 2015, p. 149).

O portal Facebook.com, dentre outros, foi o suporte encontrado por manifestantes para

promoção de datas, horários e locais das manifestações em São Paulo e no resto do país.

66

Segundo especialistas, manifestações em outros países podem ter influenciado os

cidadãos brasileiros a utilizarem a tal ferramenta, tão acessível e abrangente. Souza

(2015, p. 158) assevera que, se permanecesse reclusa ao ambiente virtual, a ‘nova rede

social’ não teria o êxito que teve, pois, embora visualizada por diferentes grupos sociais,

uma rede, para ser legitimada pela instância política, precisa estar presente, de alguma

maneira, sobretudo com exposição midiática, nas ruas, para poder intervir na pauta de

políticas públicas do Estado.

O discurso dos movimentos, ressoados pelo MPL-SP, por exemplo, ressignificou a

forma com que a instância cidadã lida com as instâncias midiática e política, pois os

próprios manifestantes, sem necessidade de mobilizar canais de televisão, divulgaram

suas ideias e obtiveram adesão expressiva da população. Desse modo, não se pode

olvidar que a mídia, na sociedade contemporânea, veicula representações que

atravessam diferentes esferas sociais e que são materializadas em variados gêneros de

discurso, com o propósito de subjetivar a relação dos cidadãos com suas próprias

convicções, principalmente políticas e culturais. Deleuze et alii (1976) assevera que a

subjetividade é a matéria-prima de toda produção, logo, nas palavras de Gregolin

(2007), é consumidora de sistemas de representação, de sensibilidades. Nesse sentido, a

subjetividade, potencializada pela força da mídia, circula discursos que regulamentam o

comportamento das pessoas e o estado das coisas.

1.6. Eleições 2014: a cena política

Os discursos dos dois presidenciáveis que foram ao segundo turno na campanha

eleitoral que ocorreu no ano 2014 intensificaram a polarização histórica entre PT e

PSDB devido ao acirramento de posicionamentos, sobretudo em função dos

desdobramentos da Lava Jato. Nesse sentido, mostra-se relevante não só entender a

operação Lava Jato, mas também o movimento político nas redes sociais que motivaram

manifestações populares em todo o Brasil em 2013. Esse cenário ficará marcado na

memória e na história dos brasileiros como um divisor de águas nas relações entre

políticos e cidadãos.

67

O termo “Lava Jato” surge após uma investigação da PF que encontrou uma rede de

postos de combustíveis e de lava a jato de automóveis utilizada para movimentar

recursos ilícitos pertencentes a organizações criminosas. Segundo o site do MPF 61:

a operação Lava Jato é a maior investigação de corrupção e lavagem

de dinheiro que o Brasil já teve. Estima-se que o volume de recursos

desviados dos cofres da Petrobras, maior estatal do país, esteja na casa

de bilhões de reais. Soma-se a isso a expressão econômica e política

dos suspeitos de participar do esquema de corrupção que envolve a

companhia.

No primeiro momento da investigação, desenvolvido a partir de março

de 2014, perante a Justiça Federal em Curitiba, foram investigadas e

processadas quatro organizações criminosas lideradas por doleiros,

que são operadores do mercado paralelo de câmbio. Depois, o

Ministério Público Federal recolheu provas de um imenso esquema

criminoso de corrupção envolvendo a Petrobras.

Nesse esquema, que dura pelo menos dez anos, grandes empreiteiras

organizadas em cartel pagavam propina para altos executivos da

estatal e outros agentes públicos. O valor da propina variava de 1% a

5% do montante total de contratos bilionários superfaturados.

De acordo com o MPF, o esquema de suborno era orquestrado por meio de operadores

financeiros do esquema, incluindo doleiros investigados na primeira etapa, empreiteiras,

funcionários da Petrobras e agentes políticos. De acordo com o MPF, o esquema

corrupto se organizava da seguinte maneira:

As empreiteiras - Em um cenário normal, empreiteiras concorreriam

entre si, em licitações, para conseguir os contratos da Petrobras, e a

estatal contrataria a empresa que aceitasse fazer a obra pelo menor

preço. Neste caso, as empreiteiras se cartelizaram em um “clube” para

substituir uma concorrência real por uma concorrência aparente. Os

preços oferecidos à Petrobras eram calculados e ajustados em reuniões

secretas nas quais se definia quem ganharia o contrato e qual seria o

preço, inflado em benefício privado e em prejuízo dos cofres da

estatal. O cartel tinha até um regulamento, que simulava regras de um

campeonato de futebol, para definir como as obras seriam distribuídas.

Para disfarçar o crime, o registro escrito da distribuição de obras era

feito, por vezes, como se fosse a distribuição de prêmios de um bingo.

Funcionários da Petrobras - As empresas precisavam garantir que

apenas aquelas do cartel fossem convidadas para as licitações. Por

isso, era conveniente cooptar agentes públicos. Os funcionários não só

61 Conforme o site do MPF, o nome “Lava Jato” decorre do uso de uma rede de postos de combustíveis e

lava a jato de automóveis para movimentar recursos ilícitos pertencentes a uma das organizações

criminosas inicialmente investigadas. Embora a investigação tenha avançado para outras organizações

criminosas, o nome inicial se consagrou. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. Caso Lava Jato.

Disponível em: http://lavajato.mpf.mp.br/entenda-o-caso. Acesso: 04/09/2017, às 15h.

68

se omitiam em relação ao cartel, do qual tinham conhecimento, mas o

favoreciam, restringindo convidados e incluindo a ganhadora dentre as

participantes, em um jogo de cartas marcadas. Segundo levantamentos

da Petrobras, eram feitas negociações diretas injustificadas,

celebravam-se aditivos desnecessários e com preços excessivos,

aceleravam-se contratações com supressão de etapas relevantes e

vazavam informações sigilosas, dentre outras irregularidades.

Operadores financeiros - Os operadores financeiros ou

intermediários eram responsáveis não só por intermediar o pagamento

da propina, mas especialmente por entregar a propina disfarçada de

dinheiro limpo aos beneficiários. Em um primeiro momento, o

dinheiro ia das empreiteiras até o operador financeiro. Isso acontecia

em espécie, por movimentação no exterior e por meio de contratos

simulados com empresas de fachada. Num segundo momento, o

dinheiro ia do operador financeiro até o beneficiário em espécie, por

transferência no exterior ou mediante pagamento de bens.

Agentes políticos - Outra linha da investigação – correspondente à

sua verticalização – começou em março de 2015, quando o

Procurador-Geral da República apresentou ao Supremo Tribunal

Federal 28 petições para a abertura de inquéritos criminais destinados

a apurar fatos atribuídos a 55 pessoas, das quais 49 são titulares de

foro por prerrogativa de função (“foro privilegiado”). São pessoas que

integram ou estão relacionadas a partidos políticos responsáveis por

indicar e manter os diretores da Petrobras. Elas foram citadas em

colaborações premiadas feitas na 1ª instância mediante delegação do

Procurador-Geral. A primeira instância investigará os agentes

políticos por improbidade, na área cível, e na área criminal aqueles

sem prerrogativa de foro.

Essa repartição política revelou-se mais evidente em relação às

seguintes diretorias: de Abastecimento, ocupada por Paulo Roberto

Costa entre 2004 e 2012, de indicação do PP, com posterior apoio do

PMDB; de Serviços, ocupada por Renato Duque entre 2003 e 2012, de

indicação do PT; e Internacional, ocupada por Nestor Cerveró entre

2003 e 2008, de indicação do PMDB. Para o PGR, esses grupos

políticos agiam em associação criminosa, de forma estável, com

comunhão de esforços e unidade de desígnios para praticar diversos

crimes, dentre os quais corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

Fernando Baiano e João Vacari Neto atuavam no esquema criminoso

como operadores financeiros, em nome de integrantes do PMDB e do

PT.

Em 2013, antes do início da Lava Jato, milhões de brasileiros foram às ruas para

protestar contra o aumento das passagens de ônibus, sobretudo em São Paulo, onde o

MPL-SP62 e outros movimentos, como o VemPraRua63, enquanto atores sociais, mesmo

62 Segundo o site do Movimento Brasil Livre – MBL, ele é uma organização não governamental de

ativismo político. MOVIMENTO BRASIL LIVRE. Sobre o MPL-SP. Disponível em: https://mbl.org.br/.

Acesso: 02/09/2017, às 11h34. 63 Segundo o site do VemPraRua, ele é um movimento suprapartidário, democrático e plural que surgiu

da organização espontânea da sociedade civil para lutar por um Brasil melhor. VEMPRARUA. Sobre o

Movimento. Disponível em: http://www.vemprarua.net/sobre-nos/. Acesso: 02/09/2017, às 11h55.

69

sem líderes políticos declarados em seus sites e em nenhuma outra fonte a que tivemos

acesso, revelaram-se novas formas de representação política no Brasil.

O discurso do MPL ressignificou a forma de representação política no Brasil, ou seja,

inaugurou um novo tipo de representação que não depende da chancela de partidos

políticos, nem de vitórias em eleições para mobilizar a sociedade para o estabelecimento

de uma agenda divergente daquela pautada pelo poder público.

Na atualidade, considerando os atos reivindicatórios que ocorreram no Brasil, sobretudo

nos últimos três anos (2013-2016), o termo ‘rede social’ assume o sentido de ‘uma

organização sem vínculos oficiais com o Estado’ que, por meio do

agrupamento/mobilização, primeiramente virtual, depois físico, de indivíduos de vários

setores da sociedade, promove ações visando à tomada de decisão dos órgãos do Estado.

Nesse sentido, o Estado e os cidadãos são, portanto, atores no jogo político e articulam-

se em variadas cenas. Para Marques (2006, p. 18), uma estrutura de poder pode ser

estabelecida a partir de um conjunto articulado de atores, posições relativas de poder e

instrumentos para exercê-lo. Com a busca pela instalação de um cenário político

democrático, a partir de 1964, o Brasil teve uma ampliação da presença da sociedade

civil nas políticas públicas, o que, para Avritzer (2007), causou o crescimento das

chamadas instituições participativas.

O aumento da participação civil nas políticas públicas do Estado gerou,

inevitavelmente, a criação de movimentos que reivindicam melhorias e investimentos

em diversas áreas, como assistência social, saúde e transporte urbano. Para serem

legitimadas suas propostas políticas, os indivíduos passaram a ter representantes que,

após autorização da instância cidadã, validam-se nos órgãos do Estado. Essa busca por

legitimidade esbarra em burocracias ou más gestões, o que faz com que a instância

cidadã realize protestos, passeatas e carreatas.

É fato que a revolução tecnológica que aconteceu nas últimas décadas possibilitou mais

projeção e notoriedade aos movimentos organizados pela instância cidadã, sobretudo

com o surgimento de aplicativos que permitem o relacionamento virtual. A instância

midiática, que outrora tinha o papel exclusivo de mediadora e promotora dos debates

70

entre os atores das instâncias política e cidadã, passou a repercutir manifestações

organizadas em outros suportes digitais, como facebook.com e twitter.com, suportes que

viabilizaram sua mobilização sem intermediações. Nesses domínios, a instância cidadã

inscreve e agrupa, sem censura ao seu conteúdo, adeptos que darão corpo e voz à rede

social que anseiam formar. O MPL-SP é produto dessa da nova configuração das

relações sociais. Hoje, a interação acontece em rede, e o discurso, que já preconiza ação,

movimenta ainda mais a política, a mídia e a sociedade.

71

CAPÍTULO II

A ANÁLISE DO DISCURSO E SUAS FRONTEIRAS

2.1. Do discurso à Análise do Discurso: filiações históricas

Iniciamos este capítulo propondo uma retomada das noções do termo ‘análise do

discurso’ para, depois, situar sua produção atual. O termo surgiu nos Estados Unidos, no

ano de 1952, quando Zallig S. Herris, em artigo intitulado “Discourse Analysis”,

afirmou que ‘discurso’ designava uma unidade linguística constituída de frases, o que

indicava que discurso era sinônimo de texto. Harris trabalhava a linguística numa

perspectiva estruturalista, visão que o enveredava a tratar de discurso como uma

decomposição do texto, de modo que a parte interior fosse separada da parte exterior, ou

seja, a depender da finalidade da análise, o analista poderia (des)considerar a parte

exterior.

Hoje, os trabalhos com o discurso comumente tomam como ponto de partida a

Linguística que inscreve os estudos do discurso no âmbito das ciências da linguagem,

transformando-as em um ponto de cruzamento com as ciências humanas e sociais. A

Análise do Discurso modifica-se de acordo com as transformações que ocorrem na

comunicação humana. A AD se constituiu progressivamente como disciplina a partir

dos anos 1960.

É fato que a AD nos permite compreender os sentidos e interpretá-los a partir de uma

relação que se estabelece entre o discurso e sua exterioridade, retomando aquilo que já

foi dito. Maingueneau (2007) afirma que, quando se fala em AD, não é possível mais

ignorar que ela se aplica a trabalhos de inspirações muito diferentes em todo o mundo,

pois ela permanece extremamente variável. Segundo o autor:

[...] na era do e-mail e da mobilidade dos pesquisadores, os recortes

geográficos e intelectuais tradicionais devem transigir com redes de

afinidades científicas que desconhecem fronteiras e que modificam

profundamente as linhas de partilha epistemológica. Em análise do

discurso, como em outros domínios, a transformação dos modos de

72

comunicação modificou em profundidade as condições de exercício da

pesquisa. (MAINGUENEAU, 2007, p. 17).

Como se pode ver, a AD não existe para preencher, simplesmente, um espaço vago na

linguística do sistema, como se a uma linguística da “língua” acrescentássemos uma

linguística da “fala”. Maingueneau (2007) assevera que a AD parte da noção de que as

disciplinas são complementares e atendem ao propósito de analisar um dado discurso,

uma vez que este não é estanque, mas ligado a diferentes posicionamentos e condições

de produção. Desde 1960, parte dos grandes inspiradores da AD não é formada por

linguistas, mas por antropólogos (Hymes), sociólogos (Garfinkel, Sacks) e também

filósofos, provavelmente preocupados com a linguística (Pêcheux e Foucault). Segundo

Maingueneau (2007, p. 18):

O discurso somente se torna verdadeiramente objeto de um saber se

ele for assumido por diversas disciplinas que possuem cada uma um

interesse específico: sociolinguística, teorias da argumentação, análise

do discurso, análise da conversação, análise crítica do discurso etc.

Grosso modo, o interesse da AD é o de apreender o discurso como intricação de um

texto e de um lugar social, o que torna seu objeto aquilo que une, por meio de um

dispositivo de enunciação específico, a organização textual e a situação de

comunicação, o social e o linguístico, o interno e o externo do discurso. A AD estuda a

utilização da linguagem nas situações reais de comunicação, já que as interações sociais

são responsáveis por determinar as escolhas de linguagem feitas pelos coenunciadores.

Não é possível, portanto, buscar conceituações restritivas sobre o que vem a ser a

disciplina, já que a AD não é uma vertente da análise conversacional, tampouco uma

evolução da Linguística Textual.

Não obstante, na década de 1960, concomitante ao surgimento da AD, e à influência da

pragmática, surgia a Linguística Textual, disciplina que buscava analisar, além da frase,

as regularidades e exterioridades do texto. Tais estudos, em grande monta, contribuíram

para o entendimento da estruturação dos textos. Em 1966, houve publicações que, mais

tarde, influenciariam consubstancialmente os estudos sobre o discurso, a saber: As

palavras e as coisas, de Foucault (2002); Escritos, de Lacan (1998); Crítica e verdade,

73

de Barthes (2007); Semântica estrutural, de Greimas (1973); Problemas de linguística

geral, de Benveniste (1989).

A década de 1960, dada a produção profícua nos campos da língua e da linguagem, foi

crucial para o engendramento da AD, principalmente na França, país em que, no ano de

1969, uma revista de considerável prestígio, de nome Langages, sob a responsabilidade

do linguista Jean Dubois, dedicou uma de suas publicações (número 13), a um campo

denominado ‘novo’: análise do discurso.

Nesse mesmo período, o filósofo Pêcheux apoiava-se no marxismo, na psicanálise de

Lacan e na linguística estrutural de Saussure para elaborar a análise psicanalítico-

político-epistemológica, ou seja, decompunha os textos para revelar a ideologia a que

estavam subordinados. Diferentemente de Pêcheux, Foucault não considerava que o

discurso tivesse uma relação direta com o uso da língua, pois o enunciado, como

acontecimento, tinha regras e práticas que o regulavam em diferentes períodos da

história, de modo que o que se depreenderia não era um inconsciente textual, mas os

efeitos de sentido possíveis na imbricação do texto com as condições de sua existência e

com os outros enunciados que podem estar filiados a ele. Maingueneau (2015)

considera que os dois filósofos são filiados ao que se denomina ‘teoria do discurso’.

O período a que nos referimos anteriormente pode ser considerado o de fundação da

AD. Destacam-se pesquisas de Charaudeau (1983; 1997) sobre as mídias; de

Maingueneau (1984; 1993) sobre os discursos religioso e literário; de Moirand (1988)

sobre o discurso científico. Tais pesquisas focalizaram a noção de gênero do discurso,

com base nas teorias da enunciação e situaram a AD como uma disciplina que passou a

analisar o discurso num quadro metodológico comum e numa perspectiva

interdisciplinar.

Em princípio, de acordo com Maingueneau (2015), a AD, já na França, tinha uma

predileção pelo discurso político da esquerda francesa. Depois, o conceito de formação

discursiva modificava o objeto de análise da AD, na medida em que a formação

discursiva era responsável por determinar aquilo que podia ou não ser dito por um

sujeito que ocupava determinado papel social, em determinado momento histórico. No

fim dos anos 60 e início da década de 1970, procurava-se colocar em evidência as

74

particularidades de formações discursivas, o discurso comunista, socialista etc.,

propostas por Foucault (2008), para quem as formações discursivas devem ser

consideradas:

[...] um conjunto de regras anônimas, históricas, sempre determinadas

no tempo e no espaço que definiram em uma época dada, e para uma

área social, econômica, geográfica ou linguística, dadas as condições

de exercício da função enunciativa. (FOUCAULT, 2008, p. 97)

A AD, na atualidade, apreende o discurso como intricação de um texto e um lugar

social, o que torna seu objeto aquilo que une, por meio de um dispositivo de enunciação

específico, a organização textual e a situação de comunicação. Segundo Maingueneau:

Esse dispositivo pertence, simultaneamente, ao verbal e ao

institucional: pensar os lugares independentemente das palavras que

eles autorizam, ou pensar as palavras independentemente dos lugares

com os quais elas estão implicadas significaria permanecer aquém das

exigências que fundam a análise do discurso. (MAINGUENEAU,

2007, p. 18)

Para a AD, é na relação da linguagem com o social que o sujeito tem um enunciador

constituído e que pode ser totalmente distinto do sujeito empírico. Nas palavras de

Nascimento (2013, p. 14):

A AD postula o discurso como uma construção linguística em suas

condições de produção, integrando, por conseguinte, a história e o

sujeito, categorias imprescindíveis de apreensão a quem se candidata a

discutir relações entre textualidade e discursividade.

Desse modo, faz-se necessário recorrer à materialidade linguística e relacioná-la às

condições sócio-históricas de produção, no momento de depreensão dos efeitos de

sentido do discurso, quando as categorias carisma e de ethos discursivo são desveladas

no discurso do candidato político, que assume, no dito, uma imagem de si estereotipada

e/ou idealizada e que é capaz de projetar um carisma pronto para mobilizar o co-

enunciador para aderir ao discurso e incorporá-lo às suas formações discursivas.

75

2.2. Da noção de Discurso à de Interdiscurso

A AD entende o discurso como prática social. Segundo Maingueneau64, trata-se de uma

disciplina empírica, pois modifica suas hipóteses de análise de acordo com a evolução

dos diferentes tipos de discursos que circulam na sociedade e com as transformações

nos modos de comunicação. O discurso, objeto de análise da AD, ocorre socialmente por

meio de uma materialidade específica, a língua. Nessa materialidade, manifesta-se o

interdiscurso. A AD considera a interdiscursividade como o lugar dos efeitos de sentido,

ou seja, é onde ocorre o atravessamento dos campos discursivos e os jogos de falsa

aparência.

Em Maingueneau (2008a), é apresentada uma análise de discursos de uma época de

embates sobre a Reforma Protestante e a Contrarreforma Católica, portanto, o campo

religioso era o quadro de referência obrigatório aos debates ideológicos. O autor

apresenta dois discursos devotos que, à época, meados do século XVII, mantinham uma

relação polêmica: o humanismo devoto e o jansenismo. Ambos pretendiam ensinar aos

fiéis quais comportamentos deveriam adotar para se enquadrarem aos pressupostos

cristãos convencionados pela sociedade.

Influenciado por Foucault, Maingueneau (2008a, p. 19) entende que discurso é uma

dispersão de textos, cujo modo de inscrição histórica permite definir como um espaço

de regularidades enunciativas. Ainda, de acordo com Maingueneau (2008a, p. 19), é

preciso pensar ao mesmo tempo a discursividade como dito e como dizer, enunciado e

enunciação.

A noção de formação discursiva, a qual Maingueneau (2006) desloca para

posicionamento ideológico, é fundamental para a apreensão de efeitos de sentido de um

dado discurso, porque as vivências e a historicidade do enunciador devem ser

consideradas, quando da análise de seu discurso, uma vez que o lugar do qual ele fala

interfere na enunciação, bem como o lugar de onde se o ouve.

64 Palestra proferida pelo Professor Dominique Maingueneau no I CITeD realizado na UNESP-ASSIS em

16/05/2011. Disponível em: http://www.gedunesp.com/i-cited. Acesso: 04/08/2015, às 16h30.

76

O autor propõe, então, que o discurso é, ao mesmo tempo, linguístico e histórico. Muito

por isso, o discurso sofre, nessa imbricação, atravessamentos que o constituirão. Nesse

sentido, Maingueneau (2008, p. 20) assevera que a categoria Interdiscurso precede o

discurso [...]. A unidade de análise pertinente é um espaço de trocas entre vários

discursos convenientemente escolhidos. Em consequência disso, Maingueneau amplia a

concepção de ‘competência’ dada por Chomsky (1978), para o qual a aquisição de uma

língua dá-se de forma inata por parte do ser humano e, ao longo do tempo, esse ser

pode, criativamente, criar enunciados inéditos. De acordo com Maingueneau:

no quadro do espaço discursivo, a competência deve ser pensada

como competência interdiscursiva; o que supõe: a aptidão para

reconhecer a incompatibilidade semântica de enunciados da ou das

formação(ões) do espaço discursivo que constitui(em) seu Outro; a

aptidão de interpretar, de traduzir esses enunciados nas categorias de

seu próprio sistema de restrições (MAINGUENEAU, 2008a, p. 55).

O enunciador, portanto, não imita meramente enunciados, mas os traduz. Tal tradução

equivale a uma interincompreensão regida por regras. Segundo o Maingueneau (2008a),

é preciso haver, por parte dos coenunciadores, uma aptidão, ou seja, uma competência

discursiva que permita a eles produzirem enunciados e saberem se posicionar em

relação às formações discursivas concorrentes. Em outras palavras, ao longo da vida, o

mesmo indivíduo deve estar apto a se inscrever em competências discursivas distintas.

Assim, ser enunciador de um discurso significa ser capaz de reconhecer enunciados

como bem formados, ou seja, pertencentes à sua formação discursiva, e produzir um

número ilimitado de enunciados pertencentes a essa formação discursiva. De acordo

com Maingueneau, se considerarmos o primado do interdiscurso e, portanto, o quadro

do espaço discursivo, a competência deve ser apreendida como competência

interdiscursiva.

Essa interdiscursividade inscreve-se, portanto, na hipótese da heterogeneidade

discursiva, que amarra, em uma relação inextricável, o mesmo do discurso e seu outro,

Maingueneau (2008a, p. 31). Por entender difícil a apreensão da categoria,

Maingueneau (2008a) propõe a noção de interdiscurso pela seguinte tríade:

77

ESQUEMA 2 – Tríade do Interdiscurso65

Tal tríade estrutura a identidade do enunciado e do enunciador. Nesse sentido, o

universo discursivo deve ser entendido como um conjunto finito de todos os

posicionamentos que interagem em uma conjuntura dada, mesmo que ele não possa ser

apreendido em sua totalidade. O campo discursivo constitui um conjunto de

posicionamentos que se encontram em concorrência, delimitando-se reciprocamente em

uma região determinada pelo universo discursivo.

Na prática social discursiva, existem diversos campos, dentre tantos, podemos destacar:

científico, político, religioso, filosófico e pedagógico. É no interior do campo de

discursivo que o discurso se constitui. O espaço discursivo, por sua vez, isolado de um

campo discursivo, compõe subconjuntos de posicionamentos, cujas relações são

estabelecidas pelo analista de acordo com seus propósitos, ou seja, é no espaço

discursivo que o discurso se materializa.

Para ancorar seus pressupostos, Maingueneau faz referência a alguns autores, entre eles

Bakhtin, para o qual o fundamento da discursividade está na relação com o Outro, quer

pela heterogeneidade mostrada, quer pela heterogeneidade constitutiva. A primeira é

marcada, ou seja, é explicitada no discurso por meio das citações, autocorreções, aspas

etc., e a segunda, na qual se inscreve o autor, pode ser compreendida como

heterogeneidade discursiva.

O primado do interdiscurso estabelece uma rede semântica em que a especificidade de

um discurso reflete a definição das relações de um discurso com um discurso Outro.

65 Esquema elaborado por nós, com base no conceito de interdiscurso proposto por Maingueneau (2008a).

Interdiscurso

Universo discursivo

Campo discursivo

Espaço Discursivo

78

Este não é um fragmento identificável no espaço discursivo; na verdade, encontra-se na

raiz daquele. O interdiscurso inscreve-se justamente na construção do discurso por meio

de uma heterogeneidade constitutiva que, segundo Maingueneau (2008a, p. 31), amarra

em uma relação inextricável o Mesmo do discurso e seu Outro.

Charaudeau (2011), por sua vez, discute postulações acerca de texto/discurso e

estabelece constatações e pontos de vista sobre o que nos parece ligado ao que

Maingueneau denomina primado do interdiscurso:

[...] há discursos diversos num mesmo texto e um mesmo discurso em

vários textos. O discurso não é o texto, mas ele é carreado por textos.

O discurso é um percurso de significância que se acha inscrito num

texto, e que depende de suas condições de produção e dos locutores

que o produzem e o interpretam. Um mesmo texto é então portador de

diversos discursos e um mesmo discurso pode impregnar textos

diferentes. Há discurso atravessando textos diferentes, e um mesmo

texto pode ser portador de discursos diferentes. (CHARAUDEAU,

2011, p. 6).

Pelo fato de os discursos, necessariamente, constituírem-se a partir de uma hierarquia

instável entre discursos dominantes e dominados, é preciso isolar, no campo, espaços

discursivos, isto é, subconjuntos de formações discursivas que serão, de acordo com o

propósito do analista, definidores da identidade do discurso, pois trata-se de um espaço

de trocas, em que os discursos se atravessam para constituírem um outro. Esse espaço

de trocas está ligado à cena de enunciação. Tal categoria é importante, na medida em

que provoca o deslocamento dos olhares para a constituição heterogênea de qualquer

discurso.

2.3. A trajetória da noção de gênero de discurso em Maingueneau

Muitas pesquisas sobre linguagem tratam do conceito de gênero de discurso. Tal

interesse ocorreu, em certa medida, pelo impacto que os estudos de Bakhtin causaram

no meio acadêmico. De acordo com Bakhtin (2011, p. 264), [...] em qualquer corrente

especial de estudo faz-se necessária uma noção precisa do enunciado em geral e das

particularidades [...] dos diversos gêneros do discurso, ou seja, independentemente da

79

área de estudo, a concepção de gêneros é indispensável, uma vez que é por meio dos

gêneros que as interações sociais acontecem e também podem ser analisadas.

2.3.1. Gêneros de discurso

Inicialmente, os estudos sobre gêneros de discurso buscaram oferecer clareza à

complexidade dos textos literários, propondo um estudo sobre gêneros a partir da noção

fundamental da intertextualidade. Tal atitude privilegiou os estudos sobre gêneros

literários em detrimento dos ‘não literários’, ou seja, todos os outros gêneros passaram a

ser considerados como de ‘menor prestígio’, pois estariam a serviço das necessidades da

vida social.

A AD, por sua vez, propôs estudar os gêneros considerados de pouco prestígio.

Maingueneau et alii vem destacando a importância da categoria gênero de discurso em

suas investigações, tratando dessa categoria nas seguintes obras: Novas tendências em

Análise do Discurso (1997), O contexto da obra literária (1995), Pragmática para o

discurso literário (1996), Análise de Textos de Comunicação (2004), Gênese dos

Discursos ( 2008a), Dicionário de Análise do Discurso (2016), Cenas da Enunciação

(2008b), Doze Conceitos em Análise do Discurso (2010a) e Discurso e análise do

discurso (2015).

Maingueneau (1997), baseado em Todorov e em Bakhtin, trata da categoria gênero de

discurso pela primeira vez. De um lado, recupera o conceito de heterogeneidade

constitutiva e relaciona-o ao princípio do dialogismo bakhtiniano, de outro, considera

aspectos da Pragmática, tais como noções de quadro de enunciação, apreendido como

um “conjunto de elementos moduladores” e não como “uma dimensão constitutiva do

discurso”. Além disso, as metáforas de contrato, papel e cena também aparecem no

conjunto de seu trabalho no que cerne aos gêneros de discurso.

A AD passa, então, a atrelar a noção de gênero à de formação discursiva, uma vez que

esta se materializa em diferentes gêneros de discurso, quais sejam, orais ou escritos,

uma vez que o sujeito assume, no gênero, papéis de enunciador e de co-enunciador.

Maingueneau, para tratar da finalidade do gênero de discurso, considera o que chama de

80

condições de êxito, ou seja, todo ato de fala, tais como jurar, declarar, chamar, deferir

etc., implica, com base em regras próprias e em uma semântica global, condições e

coerções para que obtenha sucesso.

Nesse sentido, Maingueneau apresenta a relação entre os gêneros e o posicionamento do

escritor na esfera literária. Para o autor, posicionamento refere-se à autolegitimação do

enunciador, ao configurar uma obra como sendo dessa ou daquela escola literária, ou

seja, o enunciador traça um percurso com o objetivo de firmar-se ora romântico, ora

moderno etc., mesmo que em épocas diferentes. Segundo Maingueneau (1996), os

gêneros de discurso na literatura, como dispositivos de comunicação compartilhados

socialmente, geram certas expectativas nos coenunciadores, entretanto, as normas

enunciativas, às vezes, são transgredidas.

Dominar os gêneros de discurso é tão fundamental quanto dominar a língua, tendo em

vista que é possível utilizá-los convenientemente nas diversas esferas da comunicação.

Os gêneros de discurso são mais flexíveis e mutáveis que a língua, mas o indivíduo não

cria gêneros, apenas os apreende. Nesse sentido, de acordo com Maingueneau (2008a),

todos os gêneros de discurso dialogam com outros anteriormente produzidos, já que

todo enunciado corresponde a um elo da cadeia da comunicação.

Todo enunciado pertence a um gênero de discurso que Maingueneau (2008c) conceitua

como dispositivos de comunicação que só podem aparecer quando certas condições

sócio-históricas estão presentes. Nesse sentido, uma propaganda publicitária só pode

existir se houver uma empresa interessada em vender determinado produto e um

possível mercado consumidor.

A denominação dos gêneros do discurso está subordinada a critérios bastante

heterogêneos que variam de acordo com o uso que se faz deles. O poema, por exemplo,

remete a uma produção literária que pressupõe uma determinada disposição de versos;

um romance policial, de outro modo, lembra um tipo de conteúdo policial. Isso indica

que o gênero está intrinsecamente ligado às necessidades da vida cotidiana, fato que não

pode ser desprezado pelo analista do discurso, que deve aceitar diferentes formas de

apreensão e tipologias do discurso.

81

Maingueneau (2008c) postula que os gêneros de discurso pertencem a diferentes tipos

de discurso que se associam a diferentes práticas sociais, assim, o telejornal está

inserido no tipo de discurso televisivo, que faz parte do tipo de discurso midiático, no

qual também estão inseridos os discursos radiofônicos e a imprensa escrita.

Para a AD, as tipologias propriamente discursivas são as mais relevantes, pois não

separam as caracterizações ligadas às funções, aos tipos e aos gêneros de discurso e às

caracterizações enunciativas. Maingueneau (1995) discute, dentre outros temas, a

importância do domínio de um bom repertório de gêneros de discurso pelos

coenunciadores, pois considera um fator de economia cognitiva:

Se os gêneros do discurso não existissem, se não os dominássemos, se

precisássemos criá-los pela primeira vez no processo da palavra, se

precisássemos construir cada um de nossos enunciados, o intercâmbio

verbal seria impossível (MAINGUENEAU, 1995, p. 65).

Dominar os gêneros do discurso resulta em uma economia cognitiva, pois, quanto mais

conhecemos os gêneros, mais moldamos a nossa fala adequadamente a eles e prevemos

seu conteúdo e sua construção composicional, não precisando, assim, inventar

diferentes gêneros no ato comunicacional, o que tornaria a troca verbal impossível entre

coenunciadores.

Todo gênero de discurso pode transformar a situação de comunicação. Escrever uma

carta, por exemplo, implica querer comunicar-se com alguém; produzir um anúncio

publicitário subjaz a sedução do consumidor para que ele compre determinado produto.

Maingueneau (2008c) explica que a determinação da finalidade do gênero de discurso

faz com que o co-enunciador tenha um comportamento adequado em relação ao gênero

produzido, ou seja, o gênero instaura determinadas regras que devem ser conhecidas

pelos partícipes da comunicação, de modo que qualquer transgressão, por menor que

pareça ser, pode pressupor a exclusão do jogo.

É possível que um leitor de determinado gênero literário presuma que o autor siga as

convenções do gênero, mas aquele que escreve pode aproveitar a oportunidade para

provocar surpresa. A transgressão das normas do gênero, de acordo com Maingueneau,

não passa de uma maneira de respeitar o contrato num outro nível, de obrigar o leitor a

82

restabelecer o equilíbrio esperado. Os partícipes do discurso, portanto, devem saber que

é próprio do discurso literário criar efeitos de novidade como o ato transgressor,

sobretudo em função das cenografias validadas, o que promove efeitos de sentido

diversos.

Assim, os gêneros de discurso devem ser analisados em condições sócio-históricas

dadas, uma vez que se distanciam dos aspectos meramente cotextuais/formais. Nesse

sentido, Maingueneau retoma a diferenciação entre os conceitos de tipo de discurso e de

gênero de discurso. Enquanto o primeiro se associa aos grandes setores da atividade

social, jornalismo, propaganda etc.; o segundo se refere aos dispositivos de

comunicação, notícia, editorial, “talk show”, reportagem etc., subordinados ao primeiro.

Maingueneau (2008b) assevera que o quadro cênico é imprescindível para o discurso,

independentemente da época e da sociedade. Assim, todo discurso é engendrado numa

situação de enunciação, situação concreta em que uma cena pode acontecer. A par disso,

Maingueneau (2004) discute, mais uma vez, a noção de gênero de discurso. O autor

entende que há uma diversidade de gêneros, uma vez que toda atividade de linguagem

pertence a um gênero de discurso. Com base nessa premissa, ele propõe duas grandes

espécies de gêneros de discurso: os instituídos e os conversacionais. Entretanto,

esclarece que, em razão de considerar os conversacionais difíceis de serem

diferenciados, sobretudo por não pesquisadores, trata apenas dos instituídos, embora

entenda que estes não deem conta da totalidade das atividades verbais.

Os gêneros instituídos, orais ou escritos, são dispositivos de comunicação verbal sócio-

historicamente definidos. De acordo com Maingueneau, essa espécie de gênero não

pode ser dissociada de um lugar e de um tempo, ou seja, são formas com scripts

relativamente estáveis para situações sociais determinadas, por exemplo: conselho de

classe, consulta médica, entrevista etc. Maingueneau (2004, p. 118) enquadra os gêneros

instituídos em quatro modos, a saber:

modo 1: gêneros muito coercitivos e padronizados (carta comercial,

boletim meteorológico, fichas administrativas etc), e seus locutores

são substituíveis;

modo 2: embora sejam gêneros também coercitivos (telejornais,

notícias, aulas etc.), exigem, muitas vezes, a habilidade discursiva do

locutor;

83

modo 3: gêneros (campanhas publicitárias, programas de

entretenimento na TV etc.) para os quais o autor precisa inventar uma

cenografia original, dada a necessidade de sedução de seus

consumidores, entretanto, segundo Maingueneau, a criatividade na

criação de cenografia estará sempre em conformidade com a cena

genérica;

modo 4: são gêneros que, de acordo com Maingueneau, servem como

etiquetas, ou seja, gêneros que se afastam de quadros preestabelecidos

e que, ao serem “etiquetados” por seus autores, geralmente filósofos

ou literatos, estabelecem o sentido da obra, diferentemente do que

ocorre com outros gêneros (consulta médica, por exemplo), ainda que

não os nomeássemos, a atividade discursiva continuaria existindo.

Como vemos, quando apresenta os quatro modos, Maingueneau propõe um novo olhar

para os estudos do gênero, sobretudo no que cerne ao conceito de “etiquetas”, no modo

4, em que o autor afirma que há três espécies de etiquetas: os enquadramentos

interpretativos, os hipergêneros e as classes genealógicas66.

A primeira refere-se ao modo de enquadramento do texto, ou seja, o enunciador

pretende causar um efeito ao direcionar a leitura. Por exemplo, ao lermos uma série de

artigos sobre empregos introduzida pela etiqueta “passos de um campeão”, isso dá a

entender que, do mesmo modo que o treino possibilita ao atleta a vitória, a leitura de

ótimos conselhos sobre como conquistar um novo emprego permite melhorar a

performance do candidato em processos de seleção.

A segunda diz respeito a categorizações que permitem formatar o texto, mas não tratam

de seu funcionamento, ou seja, o hipergênero que, segundo Maingueneau, é um tipo de

organização textual superficial, por exemplo: diário, carta, diálogo, carnê etc., acomoda

diferentes gêneros de discurso.

A terceira remete a propriedades de organização textual e ao conteúdo. As classes

genealógicas têm um pano de fundo histórico e apoiam-se na memória coletiva.

Maingueneau apresenta Eneida, do poeta romano Virgílio, que é legitimada como

epopeia. Essa legitimação se dá em função de sua semelhança quanto a sua organização

textual e a seu conteúdo com as obras Ilíada e Odisseia de Homero. No Brasil, podemos

citar os talk shows, programas que são assim denominados em função de sua

66 Noção emprestada de J-M. Shaeffer, Qu’est-Ce Qu’um Genre Littéraire?, Paris: Seuil, 1989 apud

Maingueneau, 2013, p. 124.

84

semelhança, quanto ao formato e ao conteúdo, com os programas renomados e

originalmente produzidos e televisionados nos Estados Unidos.

A distinção entre as espécies de etiquetas é problemática, de sorte que Maingueneau

afirma que, entre elas, há uma relação de predominância e não de exclusão. Além disso,

ele afirma que o maior interesse do leitor está em reconhecer o gênero e não as etiquetas

que, superficialmente, o compõem.

2.3.2. O gênero de discurso propaganda eleitoral midiatizada

O termo “propaganda”, segundo Pinho (1990, p.19) tem origem no gerúndio do verbo

“propagare” (latim) e significa ‘divulgação de ideias’. A par disso, é possível afirmar

que a propaganda é um conjunto de técnicas e atividades de informação e de persuasão

destinadas a influenciar as opiniões, os sentimentos e as atitudes do público. Há

registros que demonstram que o primeiro uso de propaganda data do século XVII, pela

Igreja Católica, instituição que era a principal fonte de fomento de ideias. Com o

advento do protestantismo, conforme assevera Pinho (1990), a Igreja Católica perdeu

espaço de influência, sobretudo após o surgimento da imprensa, do crescimento das

classes vinculadas ao comércio e da emblemática revolução industrial, dentre outros

fatores, que modificaram o modo de pensar e de interagir do homem.

Nesse contexto, outras instituições, além da Igreja, passaram a fazer uso da propaganda,

tais como o comércio, os políticos e outras frentes sociais. De acordo com Pinho (1990,

p. 21):

vivemos em um mundo de ideologias e sistemas filosóficos em

conflito, no qual coexistem inúmeras organizações que se dedicam à

disseminação de suas ideias, princípios e doutrinas, sejam elas de

natureza institucional, política, social, econômica ou religiosa. A esse

contingente vêm juntar-se as entidades governamentais em nível

municipal, estadual e nacional.

Atualmente, com os vários meios de comunicação e a globalização, o alcance da

propaganda foi potencializado, ou seja, a TV e a internet fazem com que bilhões de

pessoas tenham acesso a diferentes ideias e produtos. Existe, nas palavras de Pinho

85

(1990, p. 22), uma classificação das propagandas: ideológica, política, eleitoral,

governamental, institucional, corporativa, legal, religiosa e social. Consideraremos,

apenas, a distinção que o autor faz entre propaganda política e eleitoral. Para ele, a

primeira tem o propósito de divulgar ideologias políticopartidárias, filosofias desse ou

daquele partido, programas; a segunda tem o objetivo de convencer os eleitores a votar

num determinado candidato a cargo eletivo.

A propaganda política é um gênero de discurso que se subdivide67 em três outros

gêneros, a propaganda partidária, a propaganda intrapartidária e a propaganda eleitoral;

distinguiremos apenas a partidária da eleitoral. De acordo com a Lei dos Partidos

políticos68, a propaganda partidária:

FUNDAMENTO LEGAL. O direito de antena está previsto no art. 17,

§ 3º, da CF e regulamentado nos artigos 45 a 49 da Lei nº 9.096/95

(Lei dos Partidos Políticos – Lei nº 9.096/97) e na Res.-TSE nº

20.034/97. 2)

OBJETIVO. O art. 45, caput, da Lei nº 9.096/95 estabelece que a

propaganda partidária será realizada, com exclusividade, para: a)

difundir os programas partidários; b) transmitir mensagens aos filiados

sobre a execução do programa partidário, dos eventos com este

relacionados e das atividades congressuais do partido; c) divulgar a

posição do partido em relação a temas político-comunitários; d)

promover e difundir a participação política feminina, dedicando às

mulheres o tempo que será fixado pelo órgão nacional de direção

partidária, observado o mínimo de 10% do programa e das inserções a

que se refere o art. 49.

A propaganda partidária tem como proposta a divulgação do pensamento político dos

partidos. Ela é gratuita para os partidos, mas existe um ônus ao Estado, uma vez que as

emissoras de rádio e televisão têm direito a compensação fiscal69 pela cedência do

horário político em sua grade de programação. Caso a propaganda partidária configure-

se eleitoral, há possibilidade de fixação de multa ao partido político.

67 Conforme entendimento do TSE e do MP. Disponível em:

https://www.mprs.mp.br/media/areas/eleitoral/arquivos/cartilha_eleitoral-propaganda_eleitoral.pdf.

Acesso: 08/05/2017, às 14h30. 68 Lei nº 9.096/97 e a Resolução-TSE nº 20.034/97. 69 Conforme art. 52, parágrafo único da Lei nº 9.096/95.

86

A propaganda eleitoral, por sua vez, visa a captar o voto do eleitor durante o período

eleitoral. Esse tipo de propaganda tem fundamento legal70 e, como a partidária, também

é gratuita aos partidos políticos, mas custa aos cofres público, uma vez que os veículos

de comunicação recebem por meio de compensação fiscal. A propaganda eleitoral

acontece, com a devida observância da Lei e das Resoluções e a regulam, em algumas

modalidades: em outdoor, em bens particulares, nas sedes do partido e comitês de

campanha, em bens públicos e de uso comum, mas dependências do poder legislativo,

debates ou conversas em recinto aberto ou fechado – mediante uso de alto-falantes ou

amplificadores de som, em material gráfico, na mídia escrita, no rádio e na televisão.

Trataremos, dado o corpus selecionado para esta pesquisa, da propaganda eleitoral na

televisão, via HGPE. A Lei71 estabelece a obrigatoriedade de veiculação da propaganda

eleitoral gratuita para as emissoras de rádio e de televisão de canal aberto e para as

emissoras de televisão que operam em VHF e UHF, além dos canais de televisão por

assinatura sob a responsabilidade do Senado Federal, Câmara dos Deputados,

Assembleias Legislativas, Câmara Legislativa do Distrito Federal ou Câmaras

Municipais, que são referidos no art. 57 da Lei nº 9.504/97.

As campanhas políticas majoritárias são midiatizadas por meio de pesquisas de opinião,

divulgação de agendas e do HGPE, uma série de atividades da práxis política que busca

a visibilidade pública nos meios midiáticos. O processo de midiatização72 ocorre

quando o discurso político é veiculado pela mídia. Na disputa pela visibilidade, as

campanhas políticas precisam ser atrativas, os discursos, de fácil assimilação e os

candidatos, verdadeiras personagens capazes de “conquistar” o eleitorado. As técnicas

da publicidade de mercado são próprias de equipes de marketing político que buscam

fazer de seus políticos produtos a serem “consumidos”. Face ao exposto, com base no

que assevera Pinho, entendemos que o termo ‘propaganda políticoeleitoral’ abarca as

ações discursivas impressas no HGPE, partidária e eleitoral.

Charaudeau (2008) apresenta os lugares de fabricação do discurso político: o da

elaboração de sistemas de pensamento; o dos atos de comunicação entre atores da cena

70 Conforme Lei nº 9.504/07 (arts. 36 até o 57-I), no Código Eleitoral (arts. 240 a 256) e – para as eleições

de 2016 – na Res.-TSE nº 23.457/2015. 71 Conforme art. 47 da Lei nº 9.504/97. 72 Charaudeau (2008), Marcondes Filho (2005) e Hjardard (2014) tratam do processo de midiatização.

87

política; e o lugar onde se produz o comentário, em princípio alheio ao campo da ação

política. Na perspectiva do autor, um discurso pode ser considerado político mais pelas

condições da situação de comunicação e menos pelo conteúdo, ou seja, o discurso

político não se restringe aos governantes, aos candidatos ou aos estudiosos da política;

ele se caracteriza político em função da interação e das identidades que dele participam.

Nesse sentido, a mídia pode ser produtora ou propagadora de discursos políticos.

Produtora quando desenvolve programas que tratam de temas de relevância social e que

pretendem provocar a tomada de decisão de órgãos públicos, por meio da sensibilização

do público (tele)espectador. Propagadora quando veicula o discurso político por força

de determinação legal – é o caso do HGPE –, ou por meio de fomento – é o caso dos

debates entre candidatos políticos.

Assim, a mídia, nas palavras de Charaudeau (2008), funciona como um enunciador da

informação. Em outras palavras, ela realiza um processo de significação que contempla

a construção do discurso nas suas diversas configurações – quer verbais quer não

verbais. No caso concreto desta pesquisa, o HGPE, gênero de discurso ‘propaganda

eleitoral midiatizada’, a instância política apropria-se do espaço da instância midiática

para propagar a figura política que pretende ser alçada ao poder político. Para tanto, a

instância política escolhe determinados conceitos, imagens e gestos com os quais

elabora um processo enunciativo que permite a comunicação com e para a sociedade,

num processo de imbricação entre mídia e política.

2.4. Cenografia, ethos discursivo e efeitos de verdade

O discurso depende da cena de enunciação para ser de fato enunciado. Tal cena,

segundo Maingueneau (2013) associa três tipos, a englobante, a genérica e a cenografia,

que não são percebidos hierarquicamente, mas a partir do ponto de vista que o analista

assume. A cena englobante equivale ao campo discursivo. Um panfleto entregue na rua,

por exemplo, pode ser reconhecido pelo co-enunciador como político, que se une a um

gênero discursivo (cena genérica), que é a propaganda políticoeleitoral, e faz emergir

cenografias que se diferem de um discurso para o outro. A cenografia é caracterizada e

88

construída pelos elementos que compõem a cena de enunciação – textuais e gráficos,

por exemplo.

2.4.1. Cenografia

A cenografia define, portanto, os “papéis” dos sujeitos da enunciação (enunciador – co-

enunciador), pois o falante, ao mesmo tempo em que assume um papel discursivo,

implica uma relação não só com o papel discursivo do Outro, mas também com as

condições espaciotemporais das quais o discurso emerge. É na cenografia que se

revelam o ethos discursivo e o carisma. Para Maingueneau, o tempo (cronografia) e o

espaço/lugar (topografia) diferenciam e legitimam o EU – TU (enunciação discursiva),

de modo a inscrevê-los sócio-discursivamente e instituí-los como válidos

linguisticamente. Nesse sentido, a topografia não se refere ao espaço físico onde os

sujeitos interagem, mas se incumbe de restringir a posição que podem ocupar, no

âmbito do discurso, enquanto que a cronografia é um momento histórico do discurso, da

mesma forma que seu sujeito em termos de posição social.

A cenografia é, desse modo, uma encenação que, mesmo caracterizada em espaços e

gêneros distintos, apropria-se das condições necessárias para validar-se. Daí a

possibilidade de um político, por exemplo, dirigir-se aos seus eleitores como pai que

adverte ou instrui seus filhos.

Um discurso, muitas vezes, apresenta-se inserido apenas em duas cenas: a englobante e

a genérica, dada a necessidade de o discurso ter o campo discursivo e o gênero de

discurso definidos. Por exemplo, ao receber um panfleto na rua, o co-enunciador precisa

identificar o campo a que pertence tal panfleto, político, religioso etc., a fim de que se

enquadre na situação comunicativa adequada (eleitor, cliente potencial de uma empresa

etc.) e, por fim, o gênero discursivo precisa ser identificado, uma vez que define o papel

dos participantes da cena de enunciação.

Entretanto, é por meio da cenografia que facetas são admitidas pelo enunciador e pelo

co-enunciador, pois, de acordo com Maingueneau (2013), de um lado, o discurso impõe

sua cenografia de algum modo desde o início, mas, de outro lado, é por intermédio de

89

sua própria enunciação que ele poderá legitimar a cenografia que ele impõe. A

cenografia é, concomitantemente, origem e produto do discurso, uma vez que pode ser

uma cena típica ou se servir de outra para que o co-enunciador legitime o discurso como

sendo próprio de tal cenografia e não de outra.

Uma cenografia pode assumir outras cenas que não as tipicamente esperadas para

determinados gêneros. Por exemplo, em um pronunciamento aos eleitores, o

enunciador, que emerge no discurso de um candidato a presidente, pode utilizar a

cenografia ‘conselho de pai’ e seus eleitores podem aderir ao discurso como filhos.

Nesse caso, as cenas englobante e genérica são preteridas e é na cenografia que os

coenunciadores interagem efetivamente. A cenografia revela os posicionamentos que os

enunciadores assumem e os efeitos de sentido que concorrem na enunciação, logo, não

são os sujeitos empíricos que interagem, mas enunciador e co-enunciador que assumem

papéis e legitimam a cenografia de conselho de pai.

Embora Maingueneau (2013) apresente linearmente os três tipos de cena, no tópico

Cenas validadas, ele esclarece que as relações entre essas cenas são conflituosas. Para

ratificar sua constatação, o autor analisa a “Carta a todos os franceses”, escrita por

François Mitterrand, presidenciável na campanha política de 1988. Maingueneau afirma

que enunciar não é somente expressar ideias, é também tentar construir e legitimar o

quadro de sua enunciação.

Nesse sentido, o enunciador, portanto, tem uma identidade social construída na

discursividade que constitui seu ethos discursivo, em outras palavras, o enunciador do

discurso políticoeleitoral precisa construir para si uma dupla identidade discursiva; uma

relacionada ao conceito político e outra que corresponda à prática política: enquanto a

primeira refere-se ao posicionamento ideológico do político em relação à vida em

sociedade, a segunda insere-o em determinada posição no processo comunicativo da

gestão do poder. De acordo com Charaudeau (2008a), o candidato político recorre à

persuasão e à sedução de forma a atrair seu eleitor por meio de características

demonstradas pelos seguintes interesses pessoais:

90

1. Construir uma imagem de si, um ethos, destinada a assegurar sua

credibilidade e oferecer ao público um espelho de identificação;

2. Escolher os modos de interpelação do público que lhe permita se

reconhecer dentro de certa identidade cidadã;

3. Saber desqualificar o adversário, pois é necessário se mostrar

melhor que o concorrente;

4. Saber exaltar os valores descritos como idealidade social de um

bem comum. (CHARAUDEAU, 2008a, p. 4).

Nessa perspectiva, Charaudeau (2008) assevera que o ethos discursivo está associado a

um “cruzamento de olhares”, uma troca de olhares entre os coenunciadores – olhar do

que fala sobre a forma como acha que é percebido pelo seu público e o olhar do que

escuta sobre aquele que fala. Essas representações construídas pelo público não se dão

exclusivamente no ato da enunciação, pois o discurso, embora constitua um sujeito

discursivo, reflete a imagem do enunciador a partir de seus conhecimentos linguísticos e

de mundo. Muito por isso, o enunciador político pode apresentar um ethos discursivo

que é incorporado ao discurso.

Para a Pragmática, a língua não é um instrumento para transmitir informações, mas um

objeto interativo da atividade de linguagem. Para Foucault (2008), a teoria do discurso

não é uma teoria do sujeito antes que este enuncie, mas uma teoria das instâncias de

enunciação que tratam de determinar qual é a posição que pode e deve ocupar cada

indivíduo para dela ser o sujeito. A encenação não é uma máscara do real, mas uma de

suas formas, estando este real investido pelo discurso.

2.4.2. Ethos discursivo e a constituição do sujeito político

Pesquisas recentes sobre ethos discursivo têm permitido o levantamento de questões

relacionadas à incorporação de atitudes e comportamentos do coenunciador na voz do

enunciador, permitindo, na base textual, a incorporação de imagens diferentes sobre ele.

Sabemos que o discurso constitui um sujeito discursivo que reflete a imagem desse

sujeito a partir de seus conhecimentos linguísticos e de mundo. Historicamente,

podemos citar vários autores cujos estudos podem ser relacionados ao ethos, tais como

Aristóteles, Ducrot, Benveniste e Maingueneau.

91

Segundo Aristóteles (2007), o ethos está ligado à própria enunciação e à imagem

positiva criada pelo enunciador, por meio do discurso e das qualidades fundamentais

que ele deve demonstrar: a phronesis (prudência), a aretè, (virtude) e a eunoia

(benevolência).

Ducrot (1987) conceituou o ethos retórico fazendo uma distinção entre o que ele

chamou de locutor-L e locutor-lambda. O primeiro é o locutor apreendido como

enunciador; o segundo, como ser do mundo. Nesse sentido, o ethos emerge na

enunciação.

Benveniste (1989), por sua vez, com a teoria da enunciação e as figuras do locutor e do

alocutário, necessárias ao discurso, também contribuiu para a construção da noção de

ethos. Em sua perspectiva, o locutor usa dos pronomes pessoais para revelar sua

subjetividade na linguagem. Nesse processo de enunciação, quando se institui um EU,

pessoa subjetiva, institui-se, necessariamente, um TU, pessoa não-subjetiva, porém há,

aqui, uma transcendência do primeiro sobre o segundo. Para Benveniste, o ELE é a não-

pessoa.

Maingueneau (2008c) relaciona ethos à cena da enunciação e é dele a ideia de

construção da imagem de si no discurso. A noção de ethos na visão de Maingueneau

permite um estudo mais geral da adesão dos sujeitos a uma certa posição discursiva.

Para ele não existe um ethos preestabelecido, mas sim um ethos construído no âmbito

da atividade discursiva.

O conceito de ethos discursivo de Maingueneau desloca a noção de persuasão para a

noção de adesão. Assim, a noção de ethos na AD possibilita compreender a adesão dos

sujeitos às formações discursivas, já que cada discurso é perpassado por formações

discursivas diferentes. Assim, a noção de ethos discursivo ajuda a entender como esses

sujeitos que transitam nos diferentes discursos são marcados pelas formações

discursivas que compõem o ethos discursivo.

A imagem do sujeito que fala no discurso permite que o co-enunciador tenha uma

adesão ao discurso quando ele compreender essa imagem que aflora no interior do

discurso. Dessa forma, na ótica da AD, o ethos discursivo é um conjunto de

92

características que sempre são relacionadas ao sujeito que revela o próprio modo como

se enuncia. Assim, o ethos discursivo trata não do que o sujeito diz a seu respeito, mas

do caráter da personalidade que revela esse modo do sujeito se exprimir. Ele está

relacionado com aquilo que o sujeito exprime, expressa, ou seja, as marcas de

linguagem e os aspectos psicológicos que ajudam a entender esse sujeito.

A diferença do ethos na Retórica e na AD é que, na primeira, ele tem relação com o

locutor, o sujeito empírico, carnal, ao passo que, na segunda, a relação é com o sujeito

que se diz no discurso (imaterial). Para Maingueneau, o ethos é do discurso, por isso

denomina-o como ethos discursivo, categoria vinculada ao exercício da palavra, ou seja,

ao tomar a palavra, o sujeito já se revela. Dessa forma, o ethos discursivo está vinculado

ao papel que corresponde ao seu discurso e não ao indivíduo real. Esse ethos discursivo

é apreendido independentemente de seu desempenho oratório.

Na perspectiva de Maingueneau, existem elementos que cobrem o ethos discursivo, de

modo que o ethos discursivo vai ser corporificado por uma voz, um tom, um corpo e um

caráter. Segundo o autor, o texto escrito também tem uma voz, que é chamada

exatamente de tom, sendo certo que o que é dito e o tom com que é dito são igualmente

importantes, inseparáveis.

Na AD, o co-enunciador atribui espontaneamente, à figura do enunciador, traços de

personalidade a partir do modo como ele diz. Dessa forma, quando ouvimos alguém

falar, imaginamos um corpo, um tom e traços de caráter. Para a AD, é na relação da

linguagem com o social que o sujeito tem um enunciador constituído e que pode ser

totalmente distinto do sujeito empírico. Segundo Nascimento (2013: 14):

A AD propõe discurso como uma construção linguística em suas

condições de produção, integrando, por conseguinte, a história e o

sujeito, categorias imprescindíveis de apreensão a quem se candidata a

discutir relações entre textualidade e discursividade.

Desse modo, faz-se necessário recorrer à materialidade linguística e relacioná-la às

condições sócio-históricas de produção, no momento de interpretação do discurso.

Tendo em vista as noções de carisma e de ethos discursivo propostas por Charaudeau e

Maingueneau, respectivamente, temos necessidade de observar a forma como o

93

enunciador assume, no discurso políticoeleitoral, uma imagem de si estereotipada e

idealizada da realidade que constrói um carisma capaz de mobilizar o co-enunciador

para aderir ao discurso e para torná-lo parte de seu próprio discurso.

Segundo Charaudeau (2006), o ethos discursivo está associado a um “cruzamento de

olhares”, uma troca de olhar entre os interlocutores – olhar do que fala sobre a forma

como acha que é percebido pelo seu público e o olhar do que escuta sobre aquele que

fala. Essas representações construídas pelo público não se dão exclusivamente no ato da

enunciação. Cada tipo de discurso comporta papéis preestabelecidos e o enunciador

pode escolher, mais ou menos livremente, a sua cenografia. Para Maingueneau (2008b,

p. 71), são os conteúdos desenvolvidos pelo discurso que permitem especificar e validar

o ethos discursivo, bem como sua cenografia, por meio dos quais esses conteúdos

surgem.

O discurso político apresenta procedimentos discursivos que contribuem para a

construção de um ethos discursivo aberto a constituir uma imagem do enunciador, ou

seja, uma cenografia é construída e deve ser legitimada. De acordo com Maingueneau

(2008b, p. 70):

Por meio do ethos, o destinatário está, de fato, convocado a um lugar,

inscrito na cena de enunciação que o texto implica. Essa “cena de

enunciação” se compõe de três cenas, que propus chamar “cena

englobante”, “cena genérica” e “cenografia”.

Maingueneau (2008b) diz que o ethos discursivo se dá no momento da fala, a partir do

comportamento e do que o sujeito político diz, na tentativa de conquistar seus eleitores.

Esse conceito de ethos discursivo é também tratado por Charaudeau (2006, p. 115)

quando afirma que:

o sujeito aparece, portanto, ao olhar do outro, com uma identidade

psicológica e social que lhe é atribuída, e, ao mesmo tempo, mostra-se

mediante a identidade discursiva que ele constrói para si. O sentido

veiculado de nossas palavras depende ao mesmo tempo daquilo que

somos e daquilo que dizemos. O ethos é resultado dessa dupla

identidade, mas ele termina por se fundir em uma única.

94

O ethos discursivo está ligado à própria enunciação. É a imagem que apresenta o

enunciador de si mesmo pelo discurso. O ethos discursivo, então, não está relacionado a

um saber extradiscursivo sobre o enunciador, seu modo de vida, por exemplo. Porém,

em determinados discursos, como o político, por exemplo, o co-enunciador constrói

representações do ethos discursivo do enunciador antes mesmo do discurso do

enunciador. Mas é preciso esclarecer que o ethos discursivo visado não é,

necessariamente, o ethos produzido: o enunciador, por seu discurso, quer transmitir uma

imagem, mesmo que não seja verdadeira, ao co-enunciador. Não se trata somente do

que o enunciador diz (ethos dito), mas do que ele mostra (ethos mostrado) e de como

tudo isso é recebido pelo co-enunciador. Para que seu discurso obtenha o efeito de

sentido pretendido, o enunciador utiliza recursos intra e extradiscursivos, tom de voz,

escolha das palavras, olhar, postura etc. No discurso escrito, somente é possível analisar

os recursos intradiscursivos.

No ethos discursivo encontramos, ainda, a figura do fiador, que pode ser confundido

com a figura do enunciador, mas, na verdade, quem o constrói é o co-enunciador,

quando o discurso é proferido pelo enunciador. No entanto, o ethos discursivo do fiador

não se restringe somente ao discurso – ele engloba, ainda, um caráter, traços

psicológicos, e uma corporalidade, compleição física e uma maneira de se vestir, por

exemplo. A somatória de todos esses aspectos elucubrados pelo destinatário, num dado

discurso, denomina-se estereótipo. A esses estereótipos, quando da enunciação do

discurso, será dada maior relevância, caso se trate de uma pessoa conhecida na mídia,

podendo, o fiador, receber uma avaliação positiva ou negativa do destinatário.

95

2.5. Instâncias enunciativas

Segundo Charaudeau & Maingueneau (2016), a noção de instância está relacionada à

noção de enunciador, ou seja, a instância é o lugar de dizer do enunciador. Ela é,

portanto, imaterial, lugar de ação dos discursos. No discurso político, há uma conjunção

de discursos de ideias e discursos de poder. Os primeiros dizem respeito à verdade, e os

segundos à problemática do verdadeiro, do falso e do possível, assim, o enunciador, na

situação de comunicação, mostra-se como instância de enunciativa, quais sejam política,

cidadã, midiática etc., que, por sua finalidade comunicacional, pode propor, reivindicar,

denunciar etc.

No jogo discursivo, há estratégias de sedução, inclusive a inserção da mentira. Segundo

Charaudeau (2008, pp. 104-105), todo político sabe que lhe é impossível dizer tudo, a

todo momento, e dizer as coisas exatamente como ele as pensa ou concebe, pois suas

palavras não devem atrapalhar sua ação. Desse modo, no contrato de comunicação, na

cena política, os coenunciadores devem obedecer à lógica do parecer verdadeiro,

mesmo que seja necessário empregar estratégias para “evitar ter mentido", entre elas a

generalidade, o silêncio, a omissão e a negação. Sem a verdade de aparências não

haveria ação política possível.

Há outras tantas instâncias implicadas nos variados discursos, mas, nesta pesquisa,

trataremos apenas de instâncias circunscritas no jogo político, conforme esquema a

seguir.

ESQUEMA 3 – Instâncias enunciativas73

73 Esquema elaborado por nós com base em Charaudeau (2008a).

Instância política

Instância midiática

Instância judiciária

Instância empresarial

Instância religiosa

Instância econômica

Instância cidadã

Instância adversária

96

Nos extremos do esquema estão as instâncias política e cidadã, uma vez que, dada a

organização em torno do jogo político, são as duas instâncias responsáveis pela

assunção de figuras de poder. As demais, midiática, judiciária, empresarial, religiosa e

econômica, subjazem ao processo eleitoral, já que funcionam como promotoras,

reguladoras e, algumas vezes, algozes dos políticos. Segundo Charaudeau (2008, p.18):

[...] instâncias implicadas na ação política: a instância política, que é

delegada e assume a realização da ação política; e a instância cidadã,

que está na origem da escolha dos representantes do poder. É a

instância política que se encontra em contradição: ela chegou ao poder

por uma vontade cidadã (e não autoritária), mas esta, não estando

encarregada dos negócios de Estado, não conhece as regras de seu

funcionamento e ignora as condições de realização da ação política. A

instância política, que é de decisão, deve, portanto, agir em função do

possível, sendo que a instância cidadã a elegeu para realizar o

desejável.

É mister, com vistas a nossa análise, entendermos o funcionamento e o papel de cada

instância no cenário das eleições presidenciais de 2014.

2.5.1. Instâncias política e adversária

Na ação política cotidiana, as instâncias política, governo e adversária (não governo),

assumem funções de situação e de oposição, respectivamente, ou seja, a primeira é

governo e a segunda gostaria de sê-lo, por isso esta exercerá pressão política sobre

aquela no curso do mandato eletivo.

O protagonismo das duas instâncias, no Brasil, fica notório durante as campanhas

eleitorais, ocasião em que há igualdade de condições legais, e muitas vezes financeiras,

para que as duas instâncias busquem a legitimação de uma terceira, a cidadã,

responsável pela escolha das figuras de poder.

De acordo com Chararudeau (2008), a instância cidadã, antes de decidir o voto, espera

que a instância política a ser eleita realize o desejável, mas esta agirá apenas em função

do possível. Daí tem-se a noção da dificuldade em se exercer o poder político, pois é

dele que provêm as sanções de leis, sempre asseguradas. Para que a instância política

consiga a adesão do povo à sua ação, joga com argumentos da razão e da paixão, isso se

configura um espaço de persuasão.

97

Para Charaudeau (2008), é em função dos espaços de discussão e de persuasão que o

campo político pode ser considerado “o governo da palavra”. Por exemplo, quando há

ações de protesto que pressionam o governo, o que tem mais influência na tomada de

decisão são os slogans e as declarações da imprensa (palavra), pois marcam uma

opinião que será difundida em muitas comunidades.

De sua parte, o governo, se considerar “a palavra”, poderá utilizá-la para intervir nos

espaços de discussão, de ação e de persuasão para que se estabeleçam os ideais e os

meios da ação política; a coordenação das tarefas e a promulgação das leis, regras e

decisões de todas as ordens para convencer a instância cidadã dos fundamentos de seu

programa e das decisões que ela toma ao gerir os conflitos de opinião em seu benefício.

O discurso político não é factível apenas aos governantes, ele é fabricado em lugares

diferentes, a partir de marcas identitárias e da interação entre os sujeitos.

2.5.2. Instância Midiática

As campanhas políticoeleitorais na mídia são recentes no Brasil. Sua expansão

confunde-se com a chegada da televisão entre as décadas de 1950 e 1970 e com o início

do HGPE, em 1962. Todavia, é no período de redemocratização, nos anos 1980, que é

percebido o quanto a dinâmica das eleições foi modificada. O HGPE é um espaço

garantido por lei para os partidos apresentarem gratuitamente as suas propagandas.

Sabe-se que, há muito, são contratados especialistas em marketing e publicidade para

tornar as campanhas cada vez mais profissionais e atrativas para o eleitor.

Durante o HGPE, o candidato pode se dirigir diretamente ao eleitor, direcionando-se a

ele de maneira individual ou coletiva; discursar para um grande público; atacar um

adversário; veicular mensagens de apoio de seus aliados ou discursos pontuais de seus

adversários; utilizar repórteres, personagens ficcionais e populares. Uma vez que o

objetivo principal de uma campanha eleitoral é promover um candidato a um cargo

eletivo, o lema dos marqueteiros será seduzir os eleitores por meio de apelos, seja de

ordem política, seja familiar etc.

Tal é a força da mídia que, nas eleições para presidente do Brasil, a partir dos anos

1980, os líderes políticos passaram a agregar identidades coletivas e que podem ser

98

identificadas pelo eleitor, independentemente da filiação partidária do candidato. A

relação dos candidatos com o eleitor passou a ser “direta”, principalmente por causa da

projeção televisiva, que se institui como um dos principais cenários de representação

política.

Esses cenários prospectam uma instância cidadã que deve aderir, no curso das

campanhas políticas, a um dos discursos, da instância política ou da adversária. Daí a

importância da instância midiática, visto que a projeção das instâncias ocorre em

suportes e processos midiáticos74.

Muito embora o discurso político não seja midiático, já que não é suporte de veiculação

de discursos, os atores políticos e seus partidos passaram a utilizar as tecnologias

midiáticas como mediadoras de suas práticas discursivas, o que caracteriza o processo

de midiatização que, nas palavras de Thompson (1998, pp. 13-14), são os meios de

comunicação que implicam a criação de novas formas de ação e interação no mundo

social, entre indivíduos e consigo mesmos, novas formas de exercer o poder diferentes

das interações face a face. Nesse sentido, moldadas pela forma com que as mídias

constroem discursos, as instâncias política e adversária ajustam seus discursos para, nas

palavras de Charaudeau (2008, p 67), adquirir legitimidade social e poder exercer o

poder de fazer, o poder de pensar e o poder de agir.

No HGPE, os candidatos fazem uso de pesquisas de opinião pública que mostram as

principais preocupações do eleitor e sinalizam os candidatos mais propensos a vencer. A

ideia é fazer com que o eleitor, de certa maneira, se deixe influenciar pela informação

de que determinado candidato ganharia se as eleições ocorressem naquele período em

que a pesquisa foi realizada. Assim, a mídia tornou-se um dos principais meios de

informação política. Os debates, antes restritos ao âmbito interno dos partidos políticos,

ganham visibilidade na mídia. Até as disputas internas dos partidos são exploradas pela

imprensa.

74 “Os processos midiáticos são entendidos como um conjunto de práticas comunicacionais pertencentes

ao campo das mídias, que operam segundo diferentes linguagens, por meio de dispositivos como jornal,

televisão, rádio, fotografia, publicidade, revista, produção editorial, produção editorial, produção

eletrônica, comunicação organizacional, vídeo e outros emergentes.” (GOMES, P.G. 2004, p. 17)

99

2.5.3. Instância Religiosa

Segundo Durkheim (2003), o conceito de religião vincula-se às representações coletivas

e é a via por meio da qual é possível entender a forma de representação do mundo.

Nesse sentido, o indivíduo abre mão de sua própria liberdade para aderir às práticas,

ritos coletivos e solidários cujo objetivo final é receber em troca uma certa organização

da realidade da vida cotidiana quanto aos aspectos social, político e emocional. No

Brasil, há diversas religiões reconhecidas pelo Estado, o que provoca uma busca por

igualdade de direitos no acesso aos bens públicos e à representação política.

Desde o século XVI, durante o processo de colonização, que foi realizado numa

parceria entre o governo português e as missões de padres jesuítas (1549), de carmelitas

descalços (1580), de beneditinos (1581), de franciscanos (1584), de capuchinhos

(1642), entre outros, o catolicismo delimitou, no Brasil, o que se concebia como

religião. Até o início do século XVIII, o Estado, dominado pela Igreja Católica,

controlou a atividade religiosa na colônia por meio do padroado. Tal controle

promoveu, por exemplo, contribuição financeira e impedimento da entrada de outras

religiões. Somente após o período republicano (século XIX), houve uma influência do

protestantismo que decentralizou o poder religioso no país. No século XXI, há uma

presença significativa de grandes igrejas protestantes no Brasil que fazem frente ao

monopólio em decadência da Igreja de Roma.

A relação entre Estado e Igreja Católica, durante o Império, influenciou o código

criminal vigente em 1830. No artigo 276, por exemplo, observa-se a punição à

celebração, à propaganda ou ao culto de confissão religiosa diferente da oficial (religião

católica). Apenas na República, ao final do século XIX, em 1891, a primeira

Constituição da República garantiu a separação entre o poder político e o poder

religioso, ou seja, o conceito de laicidade passou a viger no Brasil. No Código Penal

brasileiro de 1940, observa-se, entre outros, o impedimento ao constrangimento público

de alguém em razão de sua crença religiosa.

Hoje, igrejas como Presbiteriana, Assembleia de Deus, Deus é Amor, Universal do

Reino de Deus, Mundial do Poder de Deus, Renascer em Cristo e Sara Nossa Terra, a

100

despeito da atuação da Igreja Católica, aglomeram milhões de fiéis em todo o território

nacional e em vários países do mundo. Tal ocorrência influencia a composição das

bancadas políticas, uma vez que as instituições religiosas lançam mão de sua articulação

social para alçar membros e pastores a diversos cargos políticos, eletivos ou

comissionados, atitude que confere a elas peso político nas disputas eleitorais.

As eleições presidenciais, pós redemocratização, exploraram temáticas de apelo

religioso, tais como aborto, casamento, pena de morte etc., ora para enaltecer o

posicionamento do candidato, ora para expor atitudes dos adversários, contrárias aos

dogmas religiosos. O objetivo central dessa disputa é o apelo à opinião pública que, no

Brasil, é predominantemente cristã75.

Neste trabalho, dada a representatividade de instituições religiosas não só na política,

mas também na economia76 e na mídia, a instância religiosa, que intervém no curso das

campanhas eleitorais para presidente do Brasil, será considerada em nossas análises.

2.5.4. Instância Cidadã

De acordo com Chararudeau (2008, p. 58), na expressão ‘instância cidadã’, o termo

‘cidadã’ deve ser entendido no sentido amplo, como uma noção que faz parte de um

regime democrático. Instância cidadã, portanto, é o lugar de construção da opinião fora

do governo, ou seja, essa instância incumbe-se de, entre outras ações, reivindicar

políticas públicas e definir aqueles que governarão o Estado em nome do bem-estar

comum.

75 Segundo Censo do IBGE/2010, o número de evangélicos no Brasil aumentou 61,45% em 10 anos, segundo

dados do Censo Demográfico divulgado nesta sexta-feira (29) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

(IBGE). Em 2000, cerca de 26,2 milhões se disseram evangélicos, ou 15,4% da população. Em 2010, eles

passaram a ser 42,3 milhões, ou 22,2% dos brasileiros. Em 1991, o percentual de evangélicos era de 9% e, em

1980, de 6,6%. Mesmo com o crescimento de evangélicos, o país ainda segue com maioria católica. Segundo o

IBGE, o número de católicos foi de 123,3 milhões em 2010, cerca de 64,6% da população. No levantamento

feito em 2000, eles eram 124,9 milhões, ou 73,6% dos brasileiros. A queda foi de 1,3%. G1. Número de

evangélicos aumenta 61% em 10 anos, aponta IBGE. (G1). Disponível em:

http://g1.globo.com/brasil/noticia/2012/06/numero-de-evangelicos-aumenta-61-em-10-anos-aponta-ibge.html.

Acesso: 01/09/2014, às 12h30. 76 Segundo reportagem, em um país onde só 8% da população declaram não seguir uma religião, os

templos dos mais variados cultos registraram uma arrecadação de R$ 20,6 bilhões apenas em 2011, valor

superior ao orçamento de 15 dos 24 ministérios da Esplanada ou 90% do disponível naquele ano para o

Bolsa Família. FOREQUE, F. Igrejas arrecadam R$ 20 bilhões no Brasil em um ano. (Folha de SP).

Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/poder/2013/01/1221000-igrejas-arrecadam-r-20-bilhoes-

no-brasil-em-um-ano.shtml. Acesso: 03/06/2015, às 22h30.

101

No Brasil, a instância cidadã consolidou-se no movimento das Diretas já (15/06/1983 a

16/04/1984), quando mais de quatro milhões de pessoas77, diante da repressão do

governo militar, reagiu e, organizada em diversas classes sociais, organizou comícios e

passeatas em várias regiões do país. Segundo Nery (2012), em 2 de março de 1983, o

deputado Dante de Oliveira (PMDB) apresentou ao Congresso Nacional proposta de

emenda à Constituição prevendo o restabelecimento de eleições diretas para a

Presidência da República em dezembro do ano seguinte. Em abril, foi lançada

oficialmente a campanha nacional de apoio à emenda, com o slogan que ganharia as

ruas: "Diretas já".

Ainda, segundo Nery (2012), devido a pressões e censuras por parte do governo militar,

emissoras de rádio e de TV cobriram modestamente as manifestações populares com

receio de retaliação, sobretudo da ameaça de encerramento das concessões públicas. Só

com o crescimento do número da participação popular em atos em favor de eleições

diretas é que grandes emissoras como a Rede Globo78 passaram a cobrir de maneira

expressiva esses atos reivindicatórios.

Em 2013, a reivindicação do MPL-SP buscou a diminuição da tarifa do transporte

público. O MPL-SP, desde 2006, mobilizava-se para barrar aumentos no preço das

tarifas, entretanto, só em 2013 logrou êxito. Conseguiu não só cancelar o aumento

proposto pela prefeitura de São Paulo, mas também fazer com que a iniciativa causasse

um efeito ‘jurisprudencial’, ou seja, interveio na tomada de decisão do estado brasileiro

em várias regiões do Brasil.

Assim, o MPL, enquanto ator social, mesmo sem líderes políticos declarados, no site e

em nenhuma outra fonte a que tivemos acesso, revela-se uma forma de ação da instância

cidadã sobre a instância política no Brasil. O movimento do MPL-SP, assim como o da

Diretas já, ressignificaram a forma de ação da instância cidadã no Brasil, ou seja, sem a

chancela de partidos políticos, nem de votos em eleições, organizados, os grupos sociais

mobilizaram os setores da mídia para modificarem o status quo. De mediadora à

77 NERY, V. E. A Campanha Diretas já e a transição brasileira da ditadura militar para a democracia

burguesa. Tese de Doutorado em Ciências Sociais. PUC-SP, 2012. Disponível em:

https://sapientia.pucsp.br/bitstream/handle/3421/1/Vanderlei%20Elias%20Nery.pdf. Acesso: 07/06/2017,

às 15h42. 78 MEMÓRIA GLOBO. Diretas já. Disponível em: http://memoriaglobo.globo.com/erros/diretas-ja.htm.

Acesso: 02/08/2017, às 14h25.

102

promotora, a instância midiática, no período das manifestações, instaurou, por um lado,

um clima de torcida pelos resultados a serem obtidos pela instância cidadã e, por outro

lado, uma pressão sobre a instância política que, exposta nas telas das TVs, não

prosseguiu com as medidas de aumento.

Segundo Egler (2010, p. 220), as ações da instância cidadã, a partir da propulsão que

recebeu com o advento das novas tecnologias, teve transformada a capacidade de

conectividade e de articulação das redes sociais nas organizações de estado, instituições

do conhecimento, entidades sociais, de capital privado e de pessoas. Isso significa que o

elo estabelecido entre os atores do jogo político tornou-se mais estreito e as ações muito

mais dinâmicas, uma vez que 90% desses atores estão conectados virtualmente79, seja

por e-mail, sites na internet, WhatsApp, entre outros.

Assim, quando o Estado falha na tomada de decisão, a instância cidadã mobiliza-se,

promovida pela mídia, com o intuito de ser ouvida e de ter suas reivindicações não só

percebidas, mas também validadas e atendidas. Ao atender tais reivindicações, a

instância política atesta legitimidade ao discurso das representações sociais, mas não

perde o poder de decidir, pois a ela fora delegada, pela instância cidadã, a tomada de

decisão que, mesmo questionada por setores da sociedade, deverá ser respeitada, afinal,

o Estado, liderado pela instância política, continua soberano em uma República.

A instância política e a instância cidadã devem saber desempenhar seus papéis sociais,

uma vez que a manutenção da polis80 depende desse desempenho. É interessante

perceber, do ponto de vista da AD, mais propriamente nas abordagens de Charaudeau,

como os discursos políticos são marcadores dos papéis sociais de cada indivíduo.

Segundo Charaudeau (2008, p. 21):

[...] a política não pode agir sem a palavra: a palavra intervém no

espaço de discussão para que sejam definidos o ideal dos fins e os

meios da ação política; a palavra intervém no espaço de ação para que

sejam organizadas e coordenadas a distribuição das tarefas e a

promulgação das leis, regras e decisões de todas as ordens; a palavra

intervém no espaço de persuasão para que a instância política possa

79 Conforme aponta EGLER (2010, p. 225). 80 “Por Pólis se entende uma cidade autônoma e soberana, cujo quadro institucional é caracterizado por

uma ou várias magistraturas, por um conselho e por uma assembleia de cidadãos (politai)”. BOBBIO

(1998, p. 949).

103

convencer a instância cidadã dos fundamentos de seu programa e das

decisões que ela toma ao gerir os conflitos de opinião em seu proveito.

Considerando que a política surge para, de certa maneira, regular as relações de força e

organizar a vida dos indivíduos em uma sociedade, de acordo com Charaudeau (2008, p.

27), é papel dela também orientar os comportamentos dos indivíduos para preservar o

bem comum e distribuir os papéis e as responsabilidades de cada um mediante a

instalação de um sistema de representação mais ou menos hierarquizado.

As duas instâncias são, portanto, lugares de produção de discursos no jogo político e

concorrem entre si em variadas cenas. É o que buscamos sintetizar no Esquema:

ESQUEMA 4 – Concorrência discursiva entre instâncias81

81 Esquema elaborado por nós com base em Charaudeau (2008).

Instância

Midiática

Instância Religiosa

Instância Jurídica

Instância Empresarial

Instância Econômica

Instância

Cidadã

Instância

Política

Instância Adversária

104

Para Marques (2006, p. 18), uma estrutura de poder pode ser estabelecida a partir de

um conjunto articulado de atores, posições relativas de poder e instrumentos para

exercê-lo. Com a busca pela instalação de um cenário político democrático, a partir de

1983, o Brasil teve uma ampliação da presença da instância cidadã nas políticas

públicas, mas a instância que mais notoriedade recebeu foi a midiática, haja vista o seu

alcance e sua capacidade de articulação em todas demais instâncias.

105

CAPÍTULO III

CARISMA E PODER

Este capítulo será dedicado ao estudo e à reflexão das noções de carisma, de ethos

discursivo e da estreita relação dessas categorias com a prática política, na medida em

que ambas são constituídas indissociavelmente por processos sociais, históricos e

linguísticos e podem nos servir como balizadoras de análise nas relações de interesses

pessoais nas campanhas políticoeleitorais para presidente do Brasil. Objetivamos, com

isso, mostrar o papel da interdisciplinaridade, o alcance inovador da AD,

particularmente nos discursos políticos em cena na sociedade brasileira, e buscar

subsídios para nortear nossas análises e confirmar a tese que defendemos.

Ao trazer para o discurso político, um dos discursos mais dominantes do mundo atual,

as categorias carisma e ethos discursivo, queremos mobilizar dispositivos teórico-

metodológicos de diferentes ciências humanas e sociais, pois o sujeito político

materializa em si e em seu discurso as relações entre as condições sócio-históricas de

produção, a linguagem e as formações discursivas. A associação dessas relações

autoriza o sujeito político a articular, tal como no corpus que selecionamos, sua imagem

pessoal com seu conhecimento de política e sua competência linguístico-discursiva.

Temos percebido que a categoria carisma vem se tornando uma peculiaridade,

principalmente nos sujeitos políticos brasileiros em campanhas eleitorais. De modo

geral, os sujeitos dos discursos políticoeleitorais procuram manifestar, na organização

discursiva, não somente o seu conhecimento de política, mas também uma imagem de

poder a partir de valores simbólicos que lhes garantem êxito nas eleições. Nesse sentido,

podemos apreender cada discurso político, principalmente aquele veiculado na mídia

(midiatizado), como um espaço discursivo que ganha novos efeitos de sentido quando o

sujeito político utiliza recursos linguageiros e estratégias de marketing político para

construir uma imagem carismática de si, posicionando-se, por conseguinte, com poder e

autoridade diante dos cidadãos.

Nosso interesse por relacionar carisma e ethos discursivo corresponde a uma saída

teórico-metodológica para a questão da construção da imagem e da comunicação

106

política, especialmente em se tratando da aplicação dessas categorias em discursos

proferidos em segundo turno de campanhas para presidente do Brasil.

O que buscamos no discurso políticoeleitoral é confirmar como o presidenciável se

inscreve em seu discurso. A par disso, discutiremos a noção de carisma com o propósito

de tomá-la como uma categoria da AD.

3.1. Discutindo a noção de carisma

Da busca em alguns dicionários de Língua Portuguesa, pudemos depreender, de um

lado, o termo carisma, em sentido lato, como uma habilidade inata de um indivíduo que

o torna apto a causar admiração, encantar, persuadir, atrair ou seduzir outro ou um

grupo de indivíduos, por meio de uma maneira peculiar de ser e agir. A ideia de que o

carisma seja inato não é consenso entre os dicionaristas, visto que alguns argumentam

que, como qualquer habilidade, o carisma pode ser aprendido. Em sentido etimológico,

por outro lado, o termo carisma vem do grego khárisma, significando graça ou favor,

ou seja, um dom gratuito de Deus.

A consequência do uso desse conceito de carisma, ainda hoje, permanece presente nos

estudos de práticas religiosas, na medida em que carisma se ancora na transcendência,

na graça divina, dando ao sujeito carismático poder em vida e após a morte sobre

aqueles que o reconhecem como salvador da humanidade. Nesse sentido, podemos

afirmar que, em contextos de relações de domínio e poder, tanto religiosos quanto

políticos, o carisma causa admiração.

Considerando as várias abordagens da noção de carisma e de sua aplicação em análise

de práticas e crenças religiosas, recorremos a essa categoria para o estudo do discurso

políticoeleitoral, porque, para nós, o sujeito político pode ser um indivíduo admirável,

poderoso, fascinante e sedutor, se observado do ponto de vista da instância política.

Além disso, qualquer sujeito que utiliza o espaço público para se manifestar como

político pode ser reconhecido como portador de carisma, se assim for legitimado por

outro indivíduo ou por um grupo, sendo, por conseguinte, o carisma, um dispositivo

fundamental de poder para a instituição do político enquanto líder.

107

3.1.1. Platão: carisma institucional

No intuito de situarmos discursivamente, em nossa tese, os estudos desenvolvidos

acerca de carisma e sua relação com o poder, faz-se necessário apontar, inicialmente,

que o embrião da noção desta categoria remonta a Platão. Segundo o filósofo, a arte de

governar a cidade, ou seja, a arte política, deve estar intrinsicamente ligada ao saber,

que atribui qualidades e determinações ao sujeito político. As ideias de Platão em

relação ao modelo de sujeito político para ser o guardião do Estado estão explanadas em

A República, A Política e a Carta VII.

Para os interesses de nossa tese, podemos afirmar que, em Platão, encontramos uma

noção de carisma que envolve uma perspectiva institucional, na medida em que o

carisma está no indivíduo que não vive fora da lei, está legitimado pela tradição, deve

ser ou parecer justo e bondoso, a fim de que se aproxime das qualidades da divindade.

Platão considera que o carisma deve se constituir a partir da justiça, entendida como

uma virtude que fortalece o poder e estabiliza a unidade do Estado.

Em Platão (1999 p.154), encontramos algumas características do sujeito político,

quando ele discute as condições necessárias aos que deverão estabelecer as leis,

protegê-las e preservá-las”: ele deve ser tranquilo, reflexivo e, às vezes, passional e

rápido nas decisões e posicionamentos. Para tal, afirma: Habrá de ser filósofo, fogoso,

veloz y fuerte por naturaleza quien haya de desempeñar a la perfección su cargo de

guardián en nuestra ciudad. Além disso, Platão (1997), enumera as qualidades

indispensáveis ao político, entre elas, ser amigo da verdade, ter ódio à mentira e à

fraude, cultivar os prazeres da alma, abandonar os prazeres do corpo, ser moderado,

generoso, magnânimo, entusiasta e desinteressado.

Ao longo da história das ciências, outros autores, tais como Nietzsche, Maquiavel,

Weber, Bourdieu, Charaudeau discutem as posturas dos sujeitos religiosos e políticos

em seus discursos, garantindo-lhes popularidade e êxito em suas atividades. Para os

interesses de nossa tese, enfocaremos apenas as contribuições de Weber (1980a; 2000;

2011), Bourdieu (2007a; 2007b) e Charaudeau (2006a; 2008; 2012), de forma sintética,

isto é, sem a pretensão de esgotar o assunto, que mereceria um aprofundamento teórico

maior, que nos desviaria dos objetivos de nossa tese.

108

3.1.2. Weber: dominação carismática

É pontualmente das palavras de Weber que justificamos sua escolha para esta tese,

quando nos afirma que:

O poder do carisma [...] fundamenta-se na fé em revelações e heróis,

na convicção emocional da importância e do valor de uma

manifestação de natureza religiosa, ética, artística, científica, política

ou de outra qualquer, no heroísmo da ascese, da guerra da sabedoria

judicial, do dom mágico ou de outro tipo. Esta fé revoluciona os

homens “de dentro para fora” e procura transformar as coisas e as

ordens segundo seu querer revolucionário. No entanto, deve-se

compreender corretamente esta oposição. Apesar de todas as

diferenças fundamentais da esfera em que circulam, as “ideias”

religiosas, artísticas, éticas, científicas e todas as demais,

particularmente também as organizatórias políticas e sociais,

surgiram, do ponto de vista psicológico, de uma maneira

essencialmente idêntica. Trata-se de um “avaliar” subjetivo, “a serviço

da época”, o qual quer atribuir algumas ideias ao “intelecto” e outras à

“imaginação” (ou seja, como for a distinção): a “imaginação”

matemática de um Weierstrass, por exemplo, é “intuição” exatamente

no mesmo sentido que aquela de qualquer artista, profeta ou

demagogo; não é aqui que se encontra a diferença. Não se encontra, e

isto cabe enfatizar para se compreender a significação do

“racionalismo”, na pessoa ou nas “vivências” anímicas do criador das

ideias ou das “obras”. Encontra-se, ao contrário, na forma em que são

internamente apropriadas e “vivenciadas” pelos dominados ou

liderados. (WEBER, 1999, pp. 327-328).

Por esse recorte, compreendemos a amplitude das contribuições de Weber para a

constituição de nosso objeto de estudo, da problemática que delimita nossa tese e para a

as análises que empreenderemos mais adiante. Weber viveu em um momento histórico

em que, por um lado, predominava o positivismo e, por outro, os críticos dessa corrente

filosófica. Contrário às ideias dos idealizadores do positivismo, Weber recebe influência

direta de Marx em relação ao capitalismo ocidental e de Nietzsche, na questão da

vontade de poder, compartilhando com esses pensadores a fundação da Sociologia.

Weber inaugura o método da Sociologia compreensiva pelo qual os sujeitos atribuem

sentido às suas próprias ações e consideram-nas em um contexto social mais amplo.

Para ele, o sociólogo, ao estudar as ações sociais, deve priorizar a motivação dos

indivíduos e dos grupos sociais, pois as ações em si não têm um sentido próprio, na

medida em que são os sujeitos que atribuem sentidos a elas. Assim, ser sociólogo

implica compreender, por meio de reflexão sociológica, os sentidos das ações sociais,

109

que são dados pelos acordos com o autor; por isso, ação social significa uma ação que,

quanto ao sentido visado pelo agente ou pelos agentes, se refere ao comportamento dos

outros, orientando-se por este em seu curso. (WEBER, 2009, p.3).

Embora, em seus estudos, Weber tenha se dedicado a diferentes temas, em sua maior

parte, nos campos da sociologia, economia, religião e política, aqui, nos limitaremos ao

seu conceito de dominação e sua relação com o carisma, a fim de depreendermos como

essa categoria pode definir o sujeito político, mudando-lhe a atitude. Nas palavras dele:

O portador do carisma assume as tarefas que considera adequadas e

exige obediência e adesão em virtude de sua missão. Se as encontra,

ou não, depende do êxito. Se aqueles aos quais ele se sente enviado

não reconhecem sua missão, sua exigência fracassa. Se o reconhecem,

é o senhor deles enquanto sabe manter seu reconhecimento mediante

“provas”. Mas, neste caso, não deduz seu “direito” da vontade deles, à

maneira de uma eleição; ao contrário, o reconhecimento do

carismaticamente qualificado é o dever daqueles aos quais dirige sua

missão. (WEBER, 1999, p. 324).

Contudo, Weber entende a dominação como uma sorte de encontrar pessoas

determinadas e prontas para obedecer a uma ordem de conteúdos determinados. Nesse

sentido, para que se constitua indivíduos submissos que atendam os dominadores, faz-se

necessário que a dominação seja socialmente legitimada. Com base nisso, Weber

(1999), em função de diferentes legitimidades, apresenta três tipos de dominação:

carismática, legal racional e tradicional.

A dominação carismática é aquela em que a autoridade é aceita por conta de uma

devoção afetiva dos dominados. Esse tipo de dominação se fundamenta em crenças

transmitidas por profetas, ou seja, os indivíduos dominados reconhecem o dominador,

acatam-no por uma atitude de fé e a eles imputam deveres invioláveis e qualidades

pessoais extremas que obedecem afetivamente e por convicção. Dessa forma, a

dominação carismática é autoritária e imperativa e, sendo a forma mais pura de

dominação, Weber (1999) assegura que essa virtude é instável à figura do dominador.

A dominação legal racional depende da crença nas legalidades das leis. Os dominados

pensam respeitar as leis, mas, na verdade, respeitam também aqueles que as elaboram.

Nesse sentido, o dominador legal pode criar ou modificar qualquer lei que será aceita e

110

assegurada pelos submissos. Por essa perspectiva, instala-se uma burocracia hierárquica

funcional como sendo o tipo mais puro de dominação. Queremos dizer com isso que a

submissão não ocorre à pessoa diretamente, mas à lei e por ela se torna autoridade a

própria lei e, por extensão, quem a elaborou, dando-lhe e assegurando-lhe legalmente

poder de autoridade.

A dominação tradicional se caracteriza por considerar a autoridade do dominador

homologada pela força sagrada da tradição. Desse modo, os dominados são os súditos,

devendo-lhes obedecer e respeitar o dominador, em virtude de a tradição garantir a ele

uma dignidade pessoal que se julga sagrada. Estreitamente relacionada à tradição, toda

ordem se prende necessariamente às normas tradicionais. Em outros termos, não há

possibilidade de criação de um novo direito, impossível em função das normas da

tradição. Segundo Weber, esse tipo de dominação é estável por causa da solidez e da

estabilidade do meio social que se acha sob a dependência direta e imediata do

aprofundamento da tradição na consciência coletiva.

De forma geral, a sociologia de Weber se fundamenta em uma possível interpretação da

sociedade moderna. Por isso, os termos dominação e carisma tornam-se recorrentes em

seus estudos e servem para caracterizar a construção de figuras políticas em cena em

nossa sociedade. Dominação, para Weber, expressa uma ação pela qual o dominador,

por vontade própria, influi sobre os atos de outros, e carisma refere-se a uma qualidade

pessoal, extracotidiana que confere a uma pessoa poderes sobre-humanos. Conforme o

autor, a dominação carismática se estabelece na relação de forças dissimuladas, em que

o dominador e dominado se apreendem. Isso porque:

o carisma é a grande força revolucionária nas épocas com forte

vinculação à tradição [...] O carisma destrói [...] em suas formas de

manifestação mais sublimes regra e tradição e inverte todos os

conceitos sacrais. Ao invés da piedade em relação àquilo que é, desde

sempre, considerado comum, e por isso sacral, ele força a sujeição

interna sob aquilo que nunca antes existiu, sob o absolutamente

singular, e por isso divino. Nesse sentido puramente empírico e

neutro, é, porém, o poder especificamente criativo e revolucionário da

história. (WEBER, 2009, p.161).

Pelo que antecede, podemos afirmar que Weber postula o carisma como uma força

social criativa ou destrutiva que circula nos espaços sociais e que pode estimular o

111

surgimento de novas religiões, destruir as instituições políticas dominantes e até mesmo

possibilitar novas formas de vida. Basicamente, à categoria carisma, para o autor,

integram elementos racionais que geram poder e dominação e outros não racionais

presentes nas ações transformadoras dos carismáticos e de seus seguidores.

Vale ressaltar que a dominação carismática se refere àquela que vai além da

racionalidade, visto que o sujeito carismático se define por meio de dons específicos do

corpo e do espírito. Neste sentido, o carisma não é e não pode ser institucionalizado em

sua forma “pura”, pois a atitude do indivíduo é mais importante. Nessa perspectiva, o

político carismático deve ser colocado sempre à prova para que se legitime como tal;

afinal, o político, por suas aptidões particulares, deve transformar sonhos em realidade.

Nele, portanto, são observados racionalmente aspectos de empatia, emoção e de

subjetividade em função de seus objetivos. Resta-nos dizer, ainda, que, para Weber

(2009), o carisma é algo atribuído a determinado sujeito que, para manter sua condição,

deve provar o seu valor. Por isso, quando um político utiliza o carisma em benefício

próprio, pela sociologia weberiana, ele passa da dominação carismática pura para a

dominação racional.

Em nossa análise, traremos a discussão de como a dominação incide sobre o carisma em

diálogo com as abordagens de Weber, Bourdieu e Charaudeau, articulando-as com a

noção de ethos discursivo, conforme Maingueneau; além da noção de poder de Bobbio,

pois essas categorias podem negociar diferentes efeitos de sentido nos enunciados

constitutivos dos discursos que selecionamos como corpus desta tese.

112

3.1.3. Charaudeau: relação ethos-carisma-poder

Charaudeau é um linguista francês, especialista em Análise do Discurso e reconhecido

como o fundador da Semiolinguística, abordagem interdisciplinar que apreende o

discurso em uma situação de problematização, tornando possível a relação entre as

marcas linguísticas e alguns fenômenos sociais ou psicológicos dos quais interagem

enunciador e co-enunciador nos processos de produção de efeitos de sentido. A

abordagem proposta por Charaudeau visa à construção de um modelo multidimensional

de compreensão da realidade social e isso nos interessa, na medida em que nossa tese

integra o verbal, o não verbal e outras dimensões necessárias ao ato enunciativo.

Privilegiamos seus estudos em nossa tese, porque reflete sobre a relação de dependência

entre carisma e ethos no discurso político, ligando a categoria carisma com legitimidade

por meio da qual se constitui um ethos de credibilidade ao/no discurso.

Sabemos que todo discurso pressupõe a constituição de uma imagem do enunciador que

interage com o co-enunciador no processo discursivo. Neste sentido, Charaudeau

postula que é na interação com o outro que as identidades e recursos sociais deles são ou

não utilizados, embora o discurso se construa de uma forma ou de outra. O modo de

interação dos interlocutores e o discurso que eles produzem não estão predefinidos em

relação ao momento de produção do discurso. O enunciador e o co-enunciador

assumem, no discurso, uma série de expectativas relativas ao modo de organização de

cada tipo de encontro linguageiro e ao tipo de discurso esperado em cada caso. Falar,

nesta direção, significa interagir com outro, manifestar-se a si mesmo e falar sobre o

mundo.

Decorre do que antecede que, segundo Charaudeau (2012), todo e qualquer ato de

linguagem se estabelece por meio de um contrato de comunicação e implicitamente

desencadeia a construção de um ethos resultante de um plano situacional e de um plano

linguístico. Segundo ele, a imagem dos interlocutores advém, de um lado, de seus

objetivos comunicacionais, do assunto da interação e das circunstâncias materiais que os

aliam. Por outro lado, estão outros aspectos relacionados ao plano discursivo, ou seja, os

aspectos que definem o modo de dizer e as estratégias discursivas pertinentes ao tipo de

discurso enunciado.

113

Charaudeau (2006b) afirma, também, que, no discurso, o enunciador autoemerge,

destaca-se, identifica-se pelo que ele enuncia, embora nem sempre tenha clareza e

consciência de sua elocução. Isso quer dizer que não se trata de avaliar o

posicionamento sobre o que o sujeito enuncia, o seu pensamento e as suas opiniões, mas

de sabermos que o comportamento do sujeito, sua relação com ele mesmo e com os

outros, mostrado no funcionamento discursivo, constitui um modo de subjetividade do

enunciador, ou seja, uma forma manifestação de sua interioridade.

É a partir dessa evidência do enunciador que podemos relacionar o ethos discursivo ao

carisma que se manifesta em meio a um acordo de permuta entre os coenunciadores do

contrato de comunicação. Por essa perspectiva de Charaudeau, o carisma resulta da

interação entre a imagem do enunciador e a forma como sua expressividade ecoa no seu

co-enunciador, atraindo-o de modo a levá-lo a identificar-se com o enunciador como

uma necessidade essencial. Assim, a categoria carisma não só se define como um meio

de identificação, mas também como um ideal a ser absolutizado.

O ethos discursivo é sempre um movimento em construção, e o carisma participa deste

fenômeno. É a questão do ethos discursivo levado ao extremo, pois ele não se funda na

legitimidade; é uma vantagem que se sobrepõe à legitimidade, na medida em que um

sujeito pode ter uma legitimidade institucional, mas não ter carisma. Ter carisma é mais

que conseguir credibilidade e aceitação do público.

Para conceituar carisma, Charaudeau (2012) busca sua origem etimológica no grego

que, como dissemos anteriormente, significa dom, graça divina. Para ele, o termo foi

introduzido na Teologia católica pelo apóstolo Paulo e, tempos após, empregada na

Sociologia política com o sentido de autoridade, sedução. Em sua reflexão, Charaudeau

caracteriza carisma por transcendência e atração mediado pelo corpo que materializa a

existência do carisma.

Ao propor a transcendência como a característica primeira do carisma, Charaudeau

(2012) retoma Weber, para quem o carisma carrega em si a graça divina, ou seja, o

carisma é algo transcendente, sagrado. Assim que, neste sentido, carisma foi atribuído à

figura dos profetas e àqueles que assumiram atitudes divinas. Entretanto, ao longo da

história, a ideia de carisma como transcendência se secularizou, tomando para si uma

114

marca de poder incomensurável, assumido pelo homem. Ao colocar o homem como

mediador entre a transcendência e a atração, Charaudeau insiste que a força da

transcendência emana do homem. Por isso, para que haja carisma, faz-se necessário que

um ser humano o revele. O líder carismático deve, por conseguinte, estar apto a

representar, por meio de seu corpo, as forças boas ou más da vida e da eternidade, já que

partilha sua corporeidade com a divindade. Como está investido de graça (energia

positiva ou negativa), com sua personalidade irradiada, ele exerce fascínio para o bem

ou para o mal sobre os outros. O carisma, de fato, transcende o ser humano.

Assim, na caracterização do carisma está a atração. Isso significa que o carisma é

negociado entre os coenunciadores, na medida em que o sujeito carismático se coloca

como um espelho em que o público, por meio de um desejo irresistível, vê-se atraído e

identificado com o líder carismático. É como se o público estivesse em uma situação de

espera e ele surge. Por isso, o sujeito carismático irrompe de uma necessidade de

identificação com um grupo, principalmente em dificuldade social. Com isso, torna-se

um ideal, é reconhecido como tal, de modo particular por aqueles que sofrem ou estão

marginalizados.

Na discussão sobre a categoria carisma, Charaudeau (2012) postula que se deve

distinguir carisma nas artes e na religião de carisma no campo político. E observa que o

carisma religioso, por um lado, é marcado pela transcendência divina em que o poder

emana de Deus que possibilita ao líder religioso manifestar um dom extraordinário. Por

outro lado, de modo artístico, designa o líder carismático pela extroversão, pela

exibição, posto que ele luta para satisfazer seu ego, sublimar sua criatividade e sua

performance.

O carisma político, no entanto, caracteriza-se pelo poder, pela capacidade de dominação

do líder político. Seu discurso é constitutivamente marcado pela persuasão e pela

sedução, que instaura no funcionamento discursivo um processo de fascínio garantidor

da eficácia do político. Nesse sentido, o sujeito político quer construir uma autoimagem,

um ethos discursivo de credibilidade, ao mesmo tempo em que incita o público a

identificá-lo, reconhecer nele uma identidade cívica particular capaz de desqualificar o

adversário, destacando o enunciador como melhor.

115

Em face disso, o político carismático é capaz de eliminar o oponente e de exaltar os

valores sociais necessários à vida comum. Por isso, carisma e ethos discursivo se inter-

relacionam, porque o político carismático revela em si uma identidade ideal, apta a

realizar seus sonhos que são os mesmos sonhos do co-enunciador e, inclusive,

mostrando caminhos para alcançá-los.

Naturalmente, nossa opção pelas reflexões de Charaudeau se justifica porque, além de

se filiar à AD, postula a relação ethos-carisma-poder nas discussões que apresenta sobre

o discurso político. Para ele, o carisma se constitui por meio de estratégias de linguagem

que, por serem argumentativas, refletem os posicionamentos que assumem os sujeitos

políticos na organização e no funcionamento discursivo.

Assim, embora consideremos importantes as contribuições de cada um dos autores que

mencionamos acima, priorizamos Charaudeau, pois visamos a compreender a maneira

pela qual o sujeito político se legitima perante a instância cidadã e constrói, na

enunciação, um ethos discursivo que lhe dá credibilidade e que contribui para lhe

garantir uma força social. Outros autores, particularmente Weber e Bourdieu, apontam

abordagens em diferentes modelos teórico-metodológicos, por isso reconhecemos neles

pontos fundamentais que recuperaremos no momento das análises, uma vez que os

sujeitos políticos que enunciam em nosso corpus de pesquisa recorrem a uma série de

enunciados interdiscursivos que nos impossibilita dissociar a interação de diferentes

campos discursivos no funcionamento intradiscursivo.

Do que antecede, podemos dizer que Charaudeau (2012) postula que o carisma político

se define pela transcendência, pelo cesarismo, pelo enigma, pela sabedoria e pelo poder.

No tópico seguinte, verificaremos as facetas do enunciador nas cenas discursivas.

3.2. Rosto e máscaras no discurso: o enunciador em cena

O processo de enunciação ocorre numa imbricação do que é dito com o que se projeta

ao dizer, ou seja, o enunciador, quando profere o discurso, busca a adesão do co-

enunciador por meio de estratégias discursivas que acabam por dissociar o sujeito

portador do rosto, da voz e do corpo, daquele sujeito que se diz, o enunciador.

116

O enunciador, nas palavras de Nascimento (2013), é constituído na relação da

linguagem com o social e pode ser totalmente distinto do sujeito empírico (dono do

rosto), em outras palavras, o sujeito joga com máscaras, conforme sua historicidade e a

de seu co-enunciador, a fim de negociar os efeitos de sentido de seu discurso, visando a

ter constituído o ethos discursivo de sujeito carismático.

O mundo comum da política reveste-se de sacralidade, o que permite a criação de

“profetas” (candidatos) ‘cheios’ de carisma e, à maneira religiosa, a constituição de um

grupo de “discípulos” (eleitores), pois o carisma, manifestado no discurso de uma

campanha políticoeleitoral, pode arrebatar os corações e, portanto, os votos de eleitores,

na medida em que ocorre uma apropriação, pelo enunciador, de instituições, de

discursos e de imagens de outrem que avalizam o dito.

Charaudeau (2012) afirma que, no discurso, o enunciador autoemerge, ou seja, destaca-

se, identifica-se pelo que ele enuncia, embora nem sempre tenha clareza e consciência

de sua elocução. Isso quer dizer que não se trata de avaliar o posicionamento sobre o

que o sujeito enuncia, o seu pensamento e as suas opiniões, mas de sabermos que o

comportamento do sujeito, sua relação com ele mesmo e com os outros, mostrado no

funcionamento discursivo, constitui um modo de subjetividade do enunciador, ou seja,

uma forma de manifestação de sua interioridade.

É a partir dessa evidência do enunciador que podemos relacionar o ethos discursivo ao

carisma que se manifesta em meio a um acordo de permuta entre os coenunciadores no

contrato de comunicação. A par disso, propomos, então, as noções de carisma subjetivo

e carisma objetivo. O primeiro manifesta-se exclusivamente no detentor da voz, na

figura humana, no sujeito empírico dono do rosto, trata-se, portanto, do carisma para

além da dominação, ou seja, uma qualidade performativa em que práticas corporais e

sensoriais são fundamentais para o estabelecimento da autoridade e da legitimidade do

candidato político; quanto ao segundo, carisma objetivo, emerge de condições distintas,

ou seja, de condições externas ao sujeito empírico, que se internalizam no discurso e

que projetam um ethos discursivo do candidato.

117

3.2.1. Carisma Subjetivo

ESQUEMA 5 – Circunstância de imagem – projeção do Sujeito Carismático82

O carisma subjetivo é associado às características de transcendência e de atração, que

podem ser apreendidas pelo modo de falar e gesticular do enunciador, por exemplo.

Desse modo, o carisma subjetivo está, de certa maneira, ligado ao corpo de quem

enuncia e se manifesta diante de duas forças opostas: o poder e o povo. No cruzamento

dessas forças, o carisma subjetivo torna-se fator crucial para a atuação do enunciador,

pois ajuda na promoção de discursos sedutores, gerando a necessidade de o enunciador

ter de oscilar entre a lógica simbólica e a lógica pragmática para atingir seus objetivos

de adesão.

A Circunstância de imagem toma o rosto como força simbólica na relação com

máscaras e condições que circunscrevem o projeto de dizer do enunciador e o colocam

em cena, ou seja, tal circunstância projeta ethé discursivos em certas condições de

produção (lugar e tempo) que visam a validação do discurso por parte do co-enunciador.

Este, por sua vez, associa a imagem pessoal do enunciador ao seu conhecimento de

política e à sua competência linguístico-discursiva, incorporando discursividades que

envolvem o verbal e o não verbal.

82 Esquema elaborado por nós.

MMÁÁSSCCAARRAASS

CCaarriissmmaa oobbjjeettiivvoo

RROOSSTTOO

CCaarriissmmaa ssuubbjjeettiivvoo

SSUUJJEEIITTOO

CCAARRIISSMMÁÁTTIICCOO

CCOONNDDIIÇÇÕÕEESS

CCaarriissmmaa oobbjjeettiivvoo

118

Indubitavelmente, esse é o processo discursivo em que ocorrem os programas

políticoeleitorais no HGPE, espaço em que se busca construir a imagem de candidato

carismático por meio de cenografias e ethé discursivos que fazem parte do propósito do

enunciador de obter legitimação pelo co-enunciador que, enquanto membro de uma

comunidade discursiva, tem, na memória discursiva, elementos que podem, por um

lado, validar e, por outro, invalidar a figura de poder projetada na tela do televisor.

Consideramos que o carisma do sujeito é projetado não só por meio de máscaras,

condições de produção e cenografias, mas também pelo rosto do candidato, e se

constitui como traço do ethos discursivo do enunciador. No HGPE, há uma encenação

proposta por profissionais de marketing que, em um processo de midiatização dos

discursos políticos, envolve o co-enunciador em circunstâncias que visam a validação

não só da cena, por meio de cenografias variadas, cujos scripts são reconhecíveis, mas

também do rosto e de ethé discursivos que sacralizam o enunciador como mais honesto,

mais crível, mais comprometido, mais realizador, mais humano, em outras palavras, a

Circunstância de imagem busca sacralizar o enunciador como sujeito carismático.

119

3.2.2. Carisma Objetivo

ESQUEMA 6 – Circunstância de cena – projeção do Sujeito Carismático83

Algumas considerações sobre o discurso políticoeleitoral: i. a situação de comunicação

política é onde o discurso é elaborado e organizado com base nas relações de poder; ii. a

mídia é espaço de promoção política; iii. a política é uma prática social em que forças

simbólicas se enfrentam para a conquista e a gestão de poder. Nesse sentido, a política

só pode ser exercida se for legitimada e se o candidato político se mostrar competente e

crível a um grande número de indivíduos com os quais partilha certos valores. O

candidato político, portanto, deve ser ao mesmo tempo representante e fiador do bem-

estar social. Para Maingueneau (2008b, p. 71), são os conteúdos desenvolvidos pelo

discurso que permitem especificar e validar o ethos discursivo e as cenografias.

O carisma objetivo se constitui nas cenografias que circundam a propaganda

políticoeleitoral midiatizada. A desconstrução da imagem do oponente, por meio de

falas de jornalistas, manchetes, pesquisas, diálogos casuais, mostra-se como uma

83 Esquema elaborado por nós.

Cenografia de entrevista

Cenografia de anúncio

Cenografia

de programa de auditório

Cenografia

de

depoimento

Cenografia de conversa

casual

Cenografia de notícia

SUJEITO

CARISMÁTICO

120

estratégia discursiva em que dados externos ao discurso são alocados para a situação de

comunicação e objetivam projetar o ethos discursivo do enunciador em confronto com o

ethos discursivo projetado do adversário.

No discurso políticoeleitoral, o candidato de um partido pode falar aos seus eleitores

como homem do povo, como “enviado de Deus”, como homem experiente, como

tecnocrata etc. Essas possibilidades permitem reconstruir cenografias do dado discurso e

desvelar o ethos discursivo, pois política é, na verdade, o lugar da linguagem e da

negociação de efeitos de sentido, em que atos de linguagem permitem a busca pela

adesão do co-enunciador. Dessa forma, o ethos discursivo de sujeito político

carismático é manifestado, na medida em que esse carisma influencia o co-enunciador

para que ele creia, ou seja, dê credibilidade ao discurso.

Muito por isso, acreditamos que, no HGPE, o enunciador apresenta um carisma

construído em cenografias próprias da mídia que promovem um projeto de dizer e, por

conseguinte, instauram um processo de sedução em que o co-enunciador é levado a

legitimar um ethos discursivo do enunciador que, enquanto ser no/do mundo, direciona

sua imagem de carismático para o outro e, assim, busca, nos funcionamentos discursivo

e corporal, manifestar maneiras discursivas de ser e de falar que conquistem a adesão do

Outro.

Assim, o sujeito político carismático emerge da imbricação da Circunstância de imagem

e da Circunstância de cena, ou seja, das projeções dos carismas subjetivo e objetivo, da

concorrência entre instâncias enunciativas (política, adversária, religiosa, jurídica,

econômica e empresarial) que, na cena midiática, buscam estabilizar o discurso numa

cenografia familiar ao co-enunciador para sacralizar o enunciador e fazer com que

corações sejam tocados e votos sejam garantidos nas eleições. Afinal, no jogo político,

em que ganha quem mais seduzir o Outro, paixões afloram e norteiam os debates.

3.3. Discutindo a noção de poder

Segundo Bourdieu (2007b, p.174), o sujeito político assume uma postura dominadora

pelo poder de fazer ver e fazer crer, de predizer e prescrever, de dar a conhecer e de

fazer reconhecer, que é ao mesmo tempo uma luta pelo poder sobre os poderes

121

públicos. A par disso, em nossas análises, mobilizamos as categorias ethos discursivo,

carisma, entre outras, essenciais aos procedimentos metodológicos da AD em sua

perspectiva enunciativo-discursiva, porque queremos identificar como o sujeito político,

no funcionamento discursivo, constrói uma imagem carismática de si e, em meio a

práticas linguageiras, torna possível aliar à linguagem, a mídia, a política e o poder na

espetacularização dos efeitos de sentido.

De acordo com Bourdieu (2007b), os discursos políticos são produto das “lutas

simbólicas” que determinados agentes sociais travam entre si no campo político – um

subespaço específico do “espaço social”. Este é um espaço multidimensional

constituído por diversos campos: literário, científico, político etc. É no cerne de cada um

dos campos que ocorrem as lutas simbólicas pelo poder simbólico – pelo poder agir

sobre o mundo. Ainda, de acordo com Bourdieu, a luta simbólica é uma

luta pela conservação ou pela transformação do mundo social por

meio da conservação ou da transformação da visão do mundo social

ou, mais precisamente, pela conservação ou pela transformação das

divisões estabelecidas entre as classes por meio da transformação ou

da conservação dos sistemas de classificação que são a sua forma

incorporada e das instituições que contribuem para perpetuar a

classificação em vigor, legitimando-a. (BOURDIEU, 2007b, p. 174)

É, portanto, por meio da luta simbólica, da legitimação entre as várias instâncias, que,

no campo político, as formações discursivas e os discursos políticos se estabelecem. Em

consonância à noção de carisma, trazemos também à discussão a noção de poder que,

em sua forma de coerção, marca-se efetivamente nas práticas políticas. Daí

constatarmos relações entre as instâncias política e a cidadã e podermos evidenciar a

complexidade da política, na medida em que o sujeito político, pela força do carisma,

pode oprimir os submissos.

Nesse sentido, o discurso político, particularmente, aqueles em circulação durante

campanhas eleitorais, tornam-se um espaço relevante para as manifestações de poder.

Temos assim que, enquanto instância cidadã, consciente de seus direitos e deveres, o

povo se deixa envolver por relações dominadoras que o tornam submisso. Poder, em

sentido amplo, significa uma capacidade de ação humana. Como os dicionários

122

apresentam também diferentes conceitos de poder, tomamos, aqui, a conceituação

proposta por Bobbio (2015, p. 56) que entende o poder:

como algo que se possui: como um objeto ou uma substancia (...) que

alguém guarda num recipiente. Contudo, não existe Poder, se não

existe, ao lado do individuo ou grupo que o exerce, outro individuo ou

grupo que é induzido a comportar-se tal como aquele deseja.

Isso indica que o poder carrega em si uma relação interpessoal que inclui poderosos e

submissos, o que nos faz associar o poder à força, na medida em que a ação política

determina a vida social ao organizá-la. É ela que possibilita que a sociedade tome

decisões coletivas, por meio de representantes, que estarão incumbidos de diversas

responsabilidades, entre elas a de estar obrigado a prestar contas de seus atos perante a

coletividade.

Nessa perspectiva, cabe aos cidadãos estabelecer um controle dos atos praticados por

seus representantes. Assim, tem-se uma organização da ação política, que é depreendida

num espaço de discussão dos objetivos a definir, tanto na sociedade como na política. É

do poder político que provêm às sanções de leis, sempre asseguradas no consentimento

da instância cidadã, ou seja, para que a instância política consiga a adesão do povo à sua

ação, joga com argumentos da razão e da paixão e isso configura um espaço de

persuasão. As eleições seriam o modo de acesso à representação do poder, enquanto que

as modalidades de controle estariam, na essência, no interior das instituições e no

exterior, por diversos movimentos reivindicativos. A linguagem, portanto, não está

ausente no engendrar da ação política, uma vez que esse espaço depende de um espaço

de discussão.

Para Charaudeau (2008), o governo, se considerar “a palavra” como instrumento de

exercício do poder, poderá utilizá-la para intervir nos espaços de discussão, de ação e de

persuasão, para que se estabeleçam os ideais e os meios da ação política; a coordenação

das tarefas e a promulgação das leis, regras e decisões de todas as ordens, além de

convencer a instância cidadã dos fundamentos de seu programa e das decisões que ela

toma ao gerir os conflitos de opinião em seu benefício. Portanto, pode-se determinar

que o discurso é constitutivo da linguagem, que é o que motiva a ação e que lhe dá

sentido e lhe confere poder.

123

CAPÍTULO IV

MÁSCARAS DO SUJEITO POLÍTICO

Este capítulo é destinado à análise do corpus e propõe examinar, sob os princípios

teórico-metodológicos da AD, a força do ethos discursivo, do carisma e do poder da

mídia em cenografias que promovem a construção das faces do sujeito político

brasileiro no HGPE do segundo turno das eleições presidenciais de 2014, quando os

candidatos Aécio Neves (PSDB) e Dilma Rousseff (PT) protagonizaram programas

eleitorais que projetaram no imaginário social uma sociedade dividida.

Entendemos que o discurso políticoeleitoral midiatizado no HGPE projeta identidades

discursivas do enunciador, ou seja, ethé discursivos que visam a legitimá-lo como

sujeito carismático em campanhas políticas, apreendidas, aqui, como discursos que

amplificam e também modificam, numa concorrência entre as várias instâncias

circunscritas na cena política, um modo de ser e um modo de fazer discurso

políticoeleitoral no Brasil.

Como vimos no capítulo I, a política é meio pelo qual os indivíduos organizam a

sociedade. Tal organização acontece dentro da lógica da prática discursiva em que a

instância política, no jogo político, para exercer o poder, deve apresentar-se crível e

eleger-se para ter suas tomadas de decisão legitimadas pela instância cidadã. Com o

advento da mídia, a busca pelo voto ganhou nova configuração, ou seja, as campanhas

políticas sofreram influências e controles de profissionais especializados em ‘marketing

político’.

Os discursos aqui analisados potencializam os jogos de aparência, pois, ao candidato,

ancorado por instâncias, conglomerados empresariais, industriais, midiáticos, religiosos

etc., ofereceu-se a possibilidade de ser, nas cenografias constituídas, carismático –

honesto e bom gestor da coisa pública. Nas palavras de Charaudeau (2008, p.12), na

cena política, o sujeito político lida com ‘máscaras’, ou seja, toda palavra pronunciada

no campo político deve ser tomada ao mesmo tempo pelo que ela diz e não diz. Jamais

deve ser tomada ao pé da letra, numa transparência ingênua [...].

124

A par disso, buscamos verificar as estratégias e os mecanismos discursivos utilizados

nos discursos do enunciador político que busca legitimação; entender e explicar a força

argumentativa do ethos discursivo, do carisma e da mídia na organização e no

funcionamento do discurso político; identificar as formações discursivas que atravessam

diferentes discursos de campanhas eleitorais e suas relações com as competições

interpartidárias que evidenciam o político por meio do confronto de suas relações

imaginárias com as suas condições reais de existência. Nossa hipótese é que o discurso

político midiatizado no HGPE projeta uma identidade discursiva do enunciador, ou seja,

um ethos discursivo que visa a legitimá-lo como sujeito carismático. Queremos afirmar

que o carisma enfatiza o posicionamento do ethos discursivo, na medida em que nele e

por ele vemos o sujeito político validando-se como melhor.

Nessa perspectiva, os conceitos de carisma subjetivo e carisma objetivo, ao adentrarem

às cenografias, situam o enunciador político entre a lógica simbólica e a lógica

pragmática para alcançar a adesão do co-enunciador. Para atingirmos os objetivos que

propusemos, constituímos um corpus composto de doze programas eleitorais veiculados

no HGPE, seis de Aécio Neves e seis de Dilma Rousseff. No primeiro momento,

fundamentando-nos em dados teórico-metodológicos da AD, privilegiaremos, em

nossas análises: condições sócio-históricas de produção dos discursos que

selecionamos, instâncias enunciativas, interdiscurso, gênero de discurso, cenografia,

ethos discursivo, carisma e poder, categorias imbricadas no processo exposto nos

Esquemas 1 ao 6.

No segundo momento, a par desses elementos, relacionaremos cenografia, ethos

discursivo e carisma para comprovar que a força do enunciador depende da força da

projeção de sua imagem carismática na mídia, em programas do HGPE. Assumimos

que o ethos discursivo é o que torna o enunciador ‘sujeito político carismático’, por

meio de circunstâncias de subjetivação e objetivação84.

84 Esquemas 5 e 6, páginas 117 e 119.

125

4.1. Situação comunicativa Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral

Os programas políticoeleitorais do segundo turno da campanha eleitoral de 2014 foram

transmitidos pelos canais de televisão aberta entre 13h e 13h20 / 20h30 e 20h50, do dia

11/10 ao dia 23/10. Ao todo foram quarenta minutos diários de programas que

interromperam a transmissão normal dos canais. Para esta pesquisa, selecionamos

recortes dos seis programas noturnos de cada candidato, denominados como discursos.

Na situação comunicativa HGPE, há um discurso que informa: PROPAGANDA

ELEITORAL GRATUITA DE ACORDO COM A LEI 9504/97, seguido de uma

narração de quinze segundos do enunciador: interrompemos nossa programação para

transmitir o horário eleitoral gratuito obrigatório de propaganda eleitoral sob

responsabilidade dos partidos políticos. Dentro de dez minutos, continue assistindo ao

programa X. A cenografia constituída promove uma distinção entre o que é da mídia e o

que é midiatizado, ou seja, o que é produzido pela instância midiática e o que é

produzido por outra instância, no caso do HGPE, pela instância política.

Informe inicial do HGPE

Fonte: youtube.com

126

O discurso inicial instaura a situação comunicativa, ou seja, estabelece, circunscreve, os

coenunciadores na cena do HGPE, um programa de responsabilidade dos políticos e de

seus partidos que veiculará propagandas eleitorais. Há, portanto, um enquadramento do

campo discursivo político e uma delegação de responsabilidades. À instância midiática

cabe o papel de transmitir os discursos; às instâncias política e adversária cabe o papel

de, respeitadas as regras expressas na lei, apresentar suas propostas de governo, por

meio de discursos criativos e convincentes; por fim, à instância cidadã cabe o papel de

depreender efeitos de sentido que a permitam legitimar, positiva ou negativamente, o

discurso do enunciador e, na ocasião da votação, decidir em quem votar.

Com propósito metodológico para realizar as análises, utilizaremos recortes85 feitos dos

discursos selecionados do site youtube.com. Nas tabelas a seguir, classificamos o corpus

por: discurso (D), data, recorte (R), descrição e páginas.

85 Prints feitos da tela do computador. São imagens congeladas do vídeo.

Utilizamos a noção de ‘recorte’ proposto por Orlandi (1984).

127

Tabela 3. Descrição do corpus – Discursos de Aécio Neves

Discursos Data Recortes Descrição Páginas

D1: Aécio

1º Programa

3º Programa

11 e

16/10/2014

R1, R2, R3,

R4 e R5.

O enunciador se posiciona como

representante da instância

adversária por meio de

cenografias que relacionam o

nome de Aécio com o Brasil. As

circunstâncias de imagem e de

cena projetam o enunciador como

uma espécie de ‘a marca da

mudança de que o Brasil precisa’.

131 – 135.

D2: Aécio

1º Programa

11/10/2014 R1, R2, R3,

R4, R5, R6,

R7, R8, R9,

R10.

O enunciador constitui, por meio

de circunstâncias de imagem e de

cena, cenografias que o projetam

como político ativo na luta pela

redemocratização do Brasil: pai

de família, economista, deputado

federal, governador, neto de ex-

presidente, portanto, pronto para

ser Presidente do Brasil.

135 – 143.

D3: Aécio

1º Programa

3º Programa

4º Programa

11, 16 e

18/10/2014

R1, R2, R3,

R4, R5, R6,

R7, R8, R9,

R10, R11,

R12, R13,

R14, R15,

R16.

Em diferentes cenografias, o

enunciador apresenta fiadores do

discurso do enunciador para

validar o ethos discursivo de

político conhecido e reconhecido

por sujeitos de diferentes

instâncias enunciativas.

143 – 152.

D4: Aécio

1º Programa

2º Programa

11 e

14/10/2014

R1, R2, R3,

R4, R5, R6,

R7.

O enunciador apresenta

cenografias que evidenciam uma

campanha negativa contra a

instância política e que buscam

fortalecer ethé discursivos de:

bom político e gestor que valoriza

os professores, a educação etc.

153 – 157.

D5: Aécio

2º Programa

14/10/2014 R1, R2, R3,

R4, R5.

O enunciador apresenta

cenografias variadas, em que

157 – 161.

128

conversa com representantes de

sindicatos; atribui ao sentimento

de medo o fato de muitos votarem

no partido da instância política;

fala de seu compromisso com a

valorização do salário mínimo.

D6: Aécio

3º Programa

4º Programa

16 e

18/10/2014

R1, R2, R3,

R4, R5, R6,

R7.

A partir das condições sócio-

históricas, o enunciador constitui

cenografias que buscam

desconstruir a imagem positiva da

instância política.

161 – 165.

D7: Aécio

3º Programa

6º Programa

16 e

23/10/2014

R2, R3. O enunciador apresenta

cenografias que mostram

pesquisas de opinião que o

posicionam na liderança da

corrida eleitoral.

165 - 166.

D8: Aécio

4º Programa

5º Programa

18 e

21/10/2014

R1, R2, R3,

R4, R5.

O enunciador apresenta

cenografias que visam a promovê-

lo como representante da

mudança de que o Brasil precisa

na política nacional.

167 – 170.

D9: Aécio

5º Programa

21/10/2014 R1, R2, R3. O enunciador, por meio de jogos

de aparência, busca promover a

instância política como fiadora da

verdade que o beneficia.

170 – 172.

D10: Aécio

5º Programa

6º Programa

21 e

23/10/2014

R1, R2. O enunciador apresenta

cenografias em que são

demonstrados os apoios da

família de Eduardo Campos e de

Marina Silva, presidenciáveis no

primeiro turno.

172 – 173.

129

Tabela 4. Descrição do corpus – Discursos de Dilma Rousseff

Discursos Data Recortes Descrição Páginas

D1: Dilma

1º Programa

11/10/2014 R1. O enunciador se posiciona como

representante da instância política

que busca encarar o desafio de se

mostrar (i)nova(dora) por meio de

cenografias que o associam a

ideias e governo novos.

173 – 175.

D2: Dilma

1º Programa

2º Programa

3º Programa

11 e

14/10/2014

R1, R2, R3,

R4, R5, R6,

R7.

O enunciador se posiciona, por

meio de circunstâncias de imagem

e de cena, como: liderança valente

na luta pela democracia em anos

de ditadura militar; vítima de

perseguição política; presidente

séria, experiente, querida pelo

povo brasileiro e apta para

continuar mandatária do Brasil.

175 – 180.

D3: Dilma

3º Programa

4º Programa

16 e

18/10/2014

R1, R2, R3,

R4, R5, R6.

Em diferentes cenografias, o

enunciador apresenta fiadores de

seu discurso para validar o ethos

discursivo de político conhecido e

reconhecido por sujeitos de

diferentes instâncias enunciativas.

181 – 185.

D 4: Dilma

1º Programa

11/10/2014 R1, R2, R3,

R4, R5, R6,

R7.

O enunciador apresenta

cenografias que evidenciam uma

campanha negativa contra a

instância adversária com o

propósito de fortalecer ethé

discursivos de: bom político e

gestor que valoriza as pessoas,

sobretudo as menos favorecidas.

185 – 191.

D5: Dilma

1º Programa

2º Programa

11 e

14/10/2014

R1, R2, R3,

R4, R5, R6.

O enunciador apresenta

cenografias variadas: recebe

jovens representantes de

movimentos da juventude no

Palácio do Planalto; participa de

eventos que demonstram seu

191 – 194.

130

engajamento e compromisso com

a aprovação da Reforma Política.

D6: Dilma

1º Programa

2º Programa

11 e

14/10/2014

R1, R2, R3,

R4, R5, R6,

R7, R8.

A partir das condições sócio-

históricas, o enunciador constitui

cenografias que buscam

desconstruir a imagem positiva da

instância adversária.

195 – 200.

D7: Dilma

5º Programa

21/10/2014 R1, R2. O enunciador apresenta

cenografias que mostram

pesquisas de opinião que o

posicionam na liderança da corrida

eleitoral.

200 – 201.

D8: Dilma

1º Programa

2º Programa

3º Programa

11, 14 e

16/10/2014

R1, R2, R3,

R4, R5, R6,

R7.

O enunciador apresenta

cenografias que visam a promove-

lo como representante da mudança

de que o Brasil precisa na política

nacional.

202 – 206.

D9: Dilma

1º Programa

18/10/2014 R1, R2. O enunciador, por meio de jogos

de aparência, busca promover a

instância adversária como fiadora

da verdade que o beneficia.

206 – 207.

D10: Dilma

5º Programa

6º Programa

21 e

23/10/2014

R1, R2. O enunciador apresenta

cenografias em que é apoiado por

Lula, político que pede votos e faz

um balanço dos doze anos de

governos petistas.

207 – 209.

131

4.2. Discursos – Aécio Neves

D1 - AÉCIO – 1º e 3º PROGRAMAS – 11 e 16/10/2014

O D1, pela cenografia, instaura o enunciador como representante da instância

adversária, por meio de cenografias que relacionam o nome de Aécio com o Brasil. As

circunstâncias de imagem e de cena projetam o enunciador como uma espécie de ‘a

marca da mudança de que o Brasil precisa’.

R1

Aécio – 1º Programa – 00:09:58

Para constituição da cenografia do discurso da instância adversária, o enunciador utiliza

a letra A em maiúsculo [R1] com as cores verde, branco, amarelo e azul, que

representam as cores da bandeira do Brasil. Está centralizado na cenografia, logo abaixo

da letra A, o nome Aécio e o número 45, que representam a instância adversária e o

posicionamento que assume frente à instância política ao acionar, na memória

discursiva, o número 45. Logo abaixo do nome Aécio, há o nome do vice e a marca do

132

posicionamento do enunciador que, ao proferir o enunciado “Muda Brasil, agora é

Aécio”, assume uma formação discursiva que o define.

O cargo de presidente e a indicação do vice Aloysio Nunes são dados que buscam

recuperar, na memória discursiva do enunciador, conhecimentos que situam o

enunciador como o Presidente de que o Brasil precisa: único brasileiro que pode mudar

o país. Apesar de haver o número da sigla, não há outra referência que evidencie o

partido político (PSDB) a que está filiado o candidato, trata-se, portanto, de uma

negociação de efeitos de sentido entre enunciador e co-enunciador, uma vez que o

primeiro diz, sem dizer, que está filiado a um partido político por imposição de lei e o

segundo é conduzido a confiar no enunciador e não em seu partido.

R2

Aécio – 3º Programa – 00:00:01

133

R3

Aécio – 3º Programa – 00:00:02

Dadas as condições sócio-históricas em que o discurso está inscrito, campanha eleitoral

pós manifestações em todo o país, uma das estratégias do marketing político foi omitir86

informações que vinculassem explicitamente o candidato a um partido político, uma vez

que a maioria das agremiações estava sob investigação policial.

A cenografia nos R2 e R3, sem qualquer alusão ao PSDB, é constituída com base em

linhas com as cores verde e amarela [R2 e R3] que “percorrem” diferentes regiões do

Brasil, numa tentativa de mostrar, por meio de recursos gráficos, que as ideias do

enunciador estão contagiando todo o país. A circunstância de cena projeta o enunciador

como uma espécie de ‘a marca da mudança de que o Brasil precisa’, em um locus que

oferece ao enunciador competências ética e situacional que fazem com que o discurso

seja considerado do ponto de vista da verdade e da realidade, visando a marcar a

identidade e/ou a contrariedade do sujeito no ato enunciativo.

86 O mesmo ocorre nos programas do PT.

134

R4

Aécio – 1º Programa – 00:00:09

R5

Aécio – 1º Programa – 00:01:10

Para constituição da cenografia, o enunciador profere um enunciado o qual etiqueta

como ‘carta ao ex-presidente FHC assinada pela presidente do Brasil’ [R4],

encaminhada pela presidente Dilma Rousseff na ocasião do aniversário de FHC.

135

Enquanto narra, o enunciador focaliza o nome de quem assina a carta: Dilma Rousseff,

fiadora do discurso do enunciador [R5]. Essa estratégia situa o discurso na

Circunstância de cena, em que o enunciador constrói uma cenografia de declaração

pública positiva feita pela instância política sobre as qualidades de um correligionário

do PSDB e, depois de narrar o conteúdo da declaração, questiona: quem fala a verdade?

A Dilma que ataca para ganhar votos ou a Dilma que escreve e assina embaixo? Tal

atitude projeta, ao mesmo tempo, um ethos discursivo da instância adversária, de vítima

de ataques injustos, e um ethos discursivo da instância política, de desesperada para

ganhar as eleições, faces que objetivam influenciar o posicionamento do co-enunciador

Ao apresentar um documento com a etiqueta de ‘carta assinada pela presidente do

Brasil’, o enunciador quer conferir um efeito de verdade, afinal, a assinatura da

proponente indica não só seu conhecimento formal do conteúdo, mas também expressa

sua vontade de reconhecê-lo. Nesse sentido, a cenografia em curso ‘declaração pública

positiva feita pela instância política sobre as qualidades de um correligionário do

PSDB’ busca estabilizar o gênero de discurso ‘declaração de reconhecimento da

qualidade dos governos tucanos pela presidente da República’. Com isso, o efeito de

sentido negociado é, se a própria presidente sabe quão eficientes foram os governos do

PSDB, logo, a instância cidadã também o saberá. A cenografia define, desse modo, os

papéis do enunciador e do co-enunciador, quais sejam, propagador de verdades e

legitimador de verdades.

Vemos, portanto, que a cenografia é uma encenação que, mesmo caracterizada em

espaços e gêneros distintos, promove a força do ethos discursivo e do carisma e constrói

condições necessárias para ser legitimada. Daí a possibilidade de o enunciador, por

meio de jogos de máscaras e de cenografias, poder dirigir-se ao co-enunciador como

aquele que possui provas da falta de coerência em atitudes da instância política.

D2 – AÉCIO – 1º PROGRAMA – 11/10/2014

O D2 posiciona o enunciador que constitui, por meio de circunstâncias de imagem e de

cena, cenografias que o projetam como político ativo na luta pela redemocratização do

Brasil, pai de família, economista, deputado federal, governador, neto de ex-presidente,

portanto, pronto para ser Presidente do Brasil.

136

R1

Aécio – 1º Programa – 00:01:39

R2

Aécio – 1º Programa – 00:01:53

137

Nos R1 e R2, a cenografia é constituída por meio da apropriação de recursos da mídia,

efeitos de imagem, música etc., pelo enunciador. O intuito é projetar, pela máscara de

um fiador, sua trajetória política. Nesse propósito, o enunciador lança mão da figura

política Tancredo Neves [R1], seu avô e ex-presidente do Brasil. Na cenografia de

biografia profissional e pessoal, o enunciador negocia efeitos de sentido com o co-

enunciador com vistas a estabelecer uma associação de seu histórico de luta ao lado do

avô às realizações nos cargos que ocupou. Trata-se do jogo de máscaras inerente ao

discurso políticoeleitoral, no qual o enunciador quer atribuir a si o poder ser para poder

fazer, ou seja, se ele está ao lado do ex-presidente Tancredo e tem o seu sangue,

certamente, também tem o mesmo credenciamento para ser mandatário do Brasil.

Como foi analisado, as estratégias discursivas do enunciador consistem em mobilizar,

na memória discursiva do co-enunciador, formações discursivas que validem Tancredo

Neves como bom político e, por conseguinte, mostrar a força do ethos discursivo do

enunciador, ancorado no ethos do fiador do discurso, Tancredo, projeta um ethos

discursivo de candidato, sujeito membro de família nacionalmente reconhecida e

participante de movimentos que modificaram a história recente do Brasil.

R3

Aécio – 1º Programa – 00:01:55

138

R4

Aécio – Programa 1 – 00:01:57

R5

Aécio – 1º Programa – 00:01:59

139

R6

Aécio – 1º Programa – 00:02:04

R7

Aécio – 1º Programa – 00:02:48

140

R8

Aécio – 1º Programa – 00:02:50

R9

Aécio – 1º Programa – 00:02:11

141

R10

Aécio – 1º Programa – 00:02:21

A cenografia constituída nos R1 a R10 extrapola os limites da política e adentra espaços

diversos na sociedade, uma vez que, na TV, pessoas comuns, em papéis centrais como

aqueles em que estão os candidatos políticos à época de eleições, são considerados

arquétipos, tanto do ponto de vista da imagem quanto do comportamento, em outras

palavras, durante o HGPE, o enunciador dirige-se diretamente ao co-enunciador visado,

mostrando a composição ideal de uma família [R3] com o objetivo de promover-se

como candidato represente da ‘família brasileira’. A estratégia discursiva tem como

propósito seduzir o co-enunciador. Isso ocorre por meio da interdiscursividade entre os

campos político e familiar.

Com efeito, o enunciador não imita enunciados, mas os traduz. Tal tradução equivale a

uma interincompreensão regida por regras reconhecidas pelos coenunciadores, por meio

de uma competência discursiva que permite posicionamentos em relação às formações

discursivas concorrentes, ou seja, o enunciador, ao mostrar-se numa imagem

cumprimentando pessoas [R5], de modo feliz e descontraído, projeta um ethos

discursivo que emerge de uma cenografia que o performa como candidato popular,

articulador e capaz para ser presidente.

142

Nesse sentido, o ethos discursivo, a imagem do enunciador no discurso, constitui-se a

partir de um conjunto de características que sempre estão relacionadas ao sujeito que

revela o próprio modo como se enuncia, ao que se diz sobre ele, à sua personalidade, às

marcas de linguagem e aos aspectos psicológicos. A imagem do enunciador projetada

no discurso permite que o co-enunciador adira ao discurso. Para tanto, o enunciador

busca recuperar, na memória discursiva do co-enunciador, estereótipos e arquétipos

ligados a formações discursivas específicas que validam ethé discursivos de bom pai

[R3], bom marido [R3] e profissional competente para ‘arrumar’ a economia do Brasil

[R4]. Tais projeções estabelecem uma qualidade performativa e uma marca identitária, a

fim de que o enunciador seja legitimado pela instância cidadã que, no Brasil, é,

predominantemente, adepta do dito ‘padrão social’, quer seja na configuração familiar,

quer seja nas esferas de trabalho. Entretanto, de outro modo, há que se ressaltar que, na

atualidade, as ditas “minorias” têm tomado corpo no que diz respeito à representação

político-social.

Considerando a força da instância midiática, lugar de produção e publicização de

discursos políticos do HGPE, o enunciador constrói uma cenografia de notícia

jornalística [R6 e R7] em que apresenta sua atuação em defesa da ética na política,

quando era deputado federal [R5]. Essa estratégia vincula-se a uma circunstância de

imagem, em que, a fim de convalidar seu discurso, o enunciador destaca seu rosto e a

posição de seu corpo, sentado na cadeira da presidência da Câmara dos Deputados

Federais [R6]. Portanto, a cenografia em questão, apesar de não se abrigar em sua

instância de produção, a midiática, quer não só se estabelecer como notícia, mas

também definir o papel do co-enunciador, leitor de notícia que, bem informado, tomará

a decisão correta de votar no enunciador. Essa atitude vincula-se, também à

circunstância de cena, um conjunto de cenografias no discurso político midiatizado que

contribui para a construção do ethos discursivo de sujeito político carismático.

É disso que se trata. De um lado, o rosto mostra sua força simbólica, na medida em que

é instaurada uma relação com máscaras e condições que circunscrevem o projeto de

dizer do enunciador e o colocam em cena, ou seja, há projeção de ethé discursivos em

certas condições de produção (lugar e tempo) que visam à legitimação por parte do co-

enunciador. Este, por sua vez, associa a imagem pessoal do enunciador ao seu

conhecimento de política e à sua competência linguístico-discursiva, incorporando

143

discursividades que envolvem o verbal e o não verbal. De outro, a cenografia pode ser

uma cena típica ou servir-se de outra para negociar com o co-enunciador a legitimação

do discurso como sendo próprio de tal cenografia e não de outra. Ela é, portanto, uma

encenação que, mesmo caracterizada em espaços e gêneros distintos, apropria-se das

condições necessárias para se legitimar.

Assim, reuniões [R4], manchetes de jornais [R6 e R7], inauguração de obras [R8] –

condições externas que são internalizadas no discurso e projetam uma qualidade

extracotidiana ao enunciador –, no funcionamento discursivo, são cenografias que

projetam o ethos discursivo do enunciador de sujeito carismático, ou seja, mais bem

preparado para ser presidente do Brasil, capaz de arrebatar corações e conquistar os

votos necessários para sua vitória. Esse carisma é construído de modo objetivo e

subjetivo, ou seja, de um lado, confere, ao enunciador, qualidades superiores às de seus

oponentes e, de outro, por meio de práticas sociais que denotam competência e

habilidade, associa ao rosto do sujeito, aquele que exerceu funções públicas de deputado

federal [R5], governador [R9 e R10].

D3 – AÉCIO – 1º, 3º e 4º PROGRAMAS – 11, 16 e 18/10/2014

O D3, em diferentes cenografias, apresenta fiadores do discurso do enunciador que

buscam validar o ethos discursivo de político conhecido e reconhecido por instâncias

enunciativas.

144

R1

Aécio – 3º Programa – 00:07:11

R2

Aécio – 4º Programa – 00:00:23

145

R3

Aécio –1º Programa – 00:02:33

R4

Aécio – 1º Programa – 00:02:35

146

R5

Aécio – 1º Programa – 00:02:37

R6

Aécio – 1º Programa – 00:02:43

147

R7

Aécio – 3º Programa – 00:08:21

R8

Aécio – 3º Programa – 00:08:48

148

R9

Aécio – 3º Programa – 00:07:16

R10

Aécio – 3º Programa – 00:07:35

149

R11

Aécio – 3º Programa – 00:07:44

R12

Aécio – 3º Programa – 00:07:59

150

R13

Aécio – 3º Programa – 00:08:11

R14

Aécio – 3º Programa – 00:08:15

151

R15

Aécio – 3º Programa – 00:08:25

R16

Aécio – 1º Programa – 00:02:54

Apropriando-se da força da mídia, o enunciador constitui, no conjunto dos recortes [R1

a R16], uma cenografia de biografia, por meio da qual o eleitor deve conhecer mais do

enunciador: um político com mais de trinta anos de vida pública honrada e honesta.

152

Enquanto o enunciador fala que o eleitor conhecerá Aécio como pai, marido, filho e

irmão, imagens com sua família são projetadas no vídeo, seguidas de depoimentos de

familiares.

É possível perceber a força do ethos discursivo e do carisma, quando o enunciador, no

rosto (carisma subjetivo) de políticos, lideranças e artistas, fiadores de seu discurso e em

cenografias (carisma objetivo), evidencia sua trajetória de sucesso pessoal e

profissional, o que situa o discurso nas Circunstâncias de imagem e de cena, ou seja,

circunstâncias que fortalecem o ethos discursivo projetado de homem honrado, de boa

família, e que performam o enunciador como sujeito carismático.

Para constituição de cenografias, o enunciador, nas vozes de personalidades artísticas e

políticas, reforça sua identidade discursiva ao proferir enunciados do tipo: “Aécio é o

presidente da esperança” [R7], “Eu sinto nele uma vontade, uma capacidade” [R12],

“ele organizou o estado mineiro” [R15], “pode acreditar, o Aécio dá conta do recado”

[R13], “o Brasil precisa mudar, de novo” [R14]. Tais enunciados revelam formações

discursivas que marcam o posicionamento do enunciador em relação à vida em

sociedade, inserindo-o em determinada posição no processo comunicativo de gestão de

poder.

Com efeito, o ethos discursivo se revela na figura do fiador, que pode ser confundido

com a figura do enunciador. Em outras palavras, o ethos discursivo do fiador não se

restringe somente ao discurso, ele engloba, ainda, um caráter (traços psicológicos) e

uma corporalidade (compleição física e a maneira de vestir-se, por exemplo), que

constroem estereótipos fortalecidos por se tratar de pessoa conhecida na mídia.

A estratégia discursiva de apresentar fiadores do discurso, políticos e artistas conhecidos

nacional e internacionalmente, busca associar a imagem pessoal do enunciador (seu

rosto), ao seu conhecimento de política e à sua competência linguístico-discursiva,

incorporando discursividades (máscaras) que envolvem o verbal e o não verbal. É o que

podemos constatar no R16, em que o enunciador, diante de vários microfones de

imprensa, numa cenografia que disponibiliza o espaço midiático para ouvi-lo,

posiciona-se como um candidato com força política e credibilidade. Tal atitude insere o

discurso em circunstâncias para projeção do sujeito carismático.

153

D4: AÉCIO – 1º e 2º PROGRAMAS – 11 e 14/10/2014

O D4 apresenta cenografias que evidenciam uma campanha negativa contra a instância

política.

R1

Aécio – 1º Programa – 00:09:36

No R1, o enunciador, incorporado em corpos e rostos de um homem e de uma mulher, a

mulher aparenta ser mais velha que o rapaz, constitui a cenografia que tem o propósito

de projetar ethé discursivos do enunciador de sujeito capaz, honesto, pai de família,

competente, influente e pronto para ser o próximo presidente do Brasil, tudo isso sob o

processo de desconstrução da imagem do oponente, da instância política, por meio de

enunciados como “Para o PT, o inimigo é o Aécio”. Com tal enunciado, a memória

discursiva do co-enunciador é mobilizada e, a par de suas formações discursivas, ele é

enquadrado no papel de fiador do discurso, ou seja, se ele for contra o PT, votará no

enunciador. Essa construção está associada à circunstância de imagem, em que o rosto

exerce uma influência significativa no imaginário social, o que atribui força ao ethos

discursivo e ao carisma na construção da identidade discursiva do enunciador.

A par disso, valendo-se das condições sócio-históricas em que o discurso está inserido,

últimos acontecimentos relacionados ao PT (processo da Lava Jato, por exemplo), o

154

enunciador busca projetar um ethos discursivo que macule a credibilidade da instância

política, representada pela presidente Dilma Rousseff, candidata à reeleição pelo PT.

R2

Aécio – 2º Programa – 00:00:01

R3

Aécio – 2º Programa – 00:00:02

155

R4

Aécio – 2º Programa – 00:00:41

R5

Aécio – 2º Programa – 00:01:21

156

R6

Aécio – 2º Programa – 00:01:56

R7

Aécio – 2º Programa – 00:01:57

157

O enunciador, nos R2-R7, constrói uma cenografia de resposta às afirmações dos

adversários sobre sua conduta política em que, num rosto mais velho e tom de voz sério,

rebate acusações de seus adversários quanto a políticas que implementou à época que

foi governador de Minas Gerais. Para conquistar a adesão do co-enunciador, o

enunciador confronta o imaginário social com suas condições reais de existência, ou

seja, para reforçar tal tese de que foi um bom governador, cita notícias de jornal [R5] e

apresenta documento em que a Presidência da República, instância política, reconhece

que o governo mineiro fez boas políticas públicas, sobretudo na área da educação.

Para reforçar seu posicionamento e recobrar a memória discursiva do co-enunciador, o

enunciador constitui novas cenografias ao apresentar gráfico que indica a exatidão da

informação de que o governo mineiro paga adequadamente aos professores. As

discursividades são ancoradas pela citação de autoridade, jornal Folha de São Paulo

[R5], recurso que o enunciador utiliza para negociar os efeitos de sentido e conseguir a

adesão ao discurso de que quem paga mal os professores são governos da Bahia e do

Rio Grande do Sul, liderados pelo PT.

Essa estratégia discursiva, aliada a formações discursivas marcadas pelos enunciados:

“A campanha da Dilma está faltando com a verdade” [R2 e R3], “como sempre, o PT

adora arrumar confusão” [R4], “contra a mentira, o melhor remédio é a mudança”

[R6], “e a mudança é Aécio” [R7], recupera dados externos ao discurso que exercem

poder simbólico na construção do sujeito carismático, na medida em que fortalecem

ethé discursivos do enunciador: bom político e gestor que valoriza os professores, a

educação.

D5: AÉCIO – 2º PROGRAMA – 14/10/2014

O D5 apresenta cenografias variadas em que o enunciador conversa com representantes

de sindicatos; atribui ao sentimento de medo o fato de muitos votarem no partido da

instância política; fala de seu compromisso com a valorização do salário mínimo.

158

R1

Aécio – 2º Programa – 00:02:25

No R1, o enunciador constrói seu discurso inscrito numa cenografia de programa de

auditório, cenário muito comum na programação da instância midiática. Cercado de

representantes sindicais, com o rosto e o corpo posicionados para responder a perguntas

dos convidados, mas sempre direcionando seu discurso ao telespectador, o enunciador

tem as circunstâncias de que precisa para buscar a adesão do co-enunciador ao seu

discurso. Diante de dessa realidade, os representantes sindicais, no funcionamento

discursivo, são fiadores do discurso do enunciador, na medida em que simbolizam a

perda de poder da instância política, que é filiada ao PT, partido historicamente apoiado

pelo seguimento sindical.

As condições sócio-históricas são fatores que determinam os jogos de verdade

propostos na cenografia em questão. Considerando que havia uma avalanche de

denúncias contra o partido e correligionários da instância política, sobretudo aquelas

investigadas pela Lava Jato, o enunciador, num jogo de aparência, alude que a instância

política, além de corrupta, está isolada, ou seja, não tem mais nem o apoio de sindicatos.

Tal estratégia mostra a força da mídia, do ethos discursivo e do carisma do enunciador.

159

R2

Aécio – Programa 2 – 00:09:02

R3

Aécio – Programa 2 – 00:09:32

160

R4

Aécio – Programa 2 – 00:09:35

R5

Aécio – Programa 2 – 00:09:51

161

Nos R3 a R5, a cenografia parte da simulação de uma ação de desencorajamento

realizada pela instância política e destinada àqueles que gostariam de votar na instância

adversária. Para obter êxito, o enunciador faz uso de enunciados do tipo: “eles

[instância política] é que estão com medo [da vitória da instância adversária]87 [R5]. Tal

estratégia revela uma tentativa da instância adversária, pela lógica simbólica, em querer

instaurar, no imaginário social, uma sociedade dividida entre os que apoiam a verdade e

os que apoiam a mentira. Nesse sentido, o carisma enfatiza o posicionamento do ethos

discursivo, na medida em que nele e por ele o sujeito político valida-se como melhor.

D6: AÉCIO – 3º e 4º PROGRAMAS – 16 e 18/10/2014

O D6, a partir das condições sócio-históricas, apresenta cenografias que buscam

desconstruir a imagem positiva da instância política.

R1

Aécio – 3º Programa – 00:00:16

87 Grifos nossos.

162

R2

Aécio – 3º Programa – 00:00:30

R3

Aécio – 3º Programa – 00:00:45

163

R4

Aécio – 3º Programa – 00:01:45

R5

Aécio – 3º Programa – 00:02:31

164

R6

Aécio – 4º Programa – 00:07:17

R7

Aécio – 4º Programa – 00:07:21

Para constituição da cenografia do discurso, nos R1 e R2, o enunciador utiliza o não

verbal, imagens de um copo com água limpa que recebe gotas de um líquido que deixa a

165

água escura, turva, e o verbal, enunciados que marcam suas formações discursivas:

“Gota a gota, o governo atual... está levando o Brasil ao fundo do poço” [R1 e R2]. O

enunciador busca, por meio da cenografia, vincular, no imaginário social, a ‘morte’ da

Petrobras à morte do governo, ou seja, se o co-enunciador quiser que a Petrobras

continue viva [R3], deverá votar no enunciador, representante da instância adversária.

As cenografias constituídas nos R3-R7 reforçam a identidade do enunciador e

depreciam a instância política, na medida em que apresentam depoimentos de pessoas

de regiões diferentes do Brasil que validam as formações discursivas do enunciador.

Como visto, o enunciador assume um posicionamento em circunstâncias de imagem e

de cena, em que a força dos rostos, dos corpos, das cenografias, é fundamental para a

projeção do ethos discursivo do enunciador, que visa a ser sujeito carismático, digno da

adesão do co-enunciador.

D7: AÉCIO – 3ºe 6º PROGRAMAS – 16 e 23/10/2014

O D7 apresenta cenografias que mostram pesquisas de opinião que posicionam o

enunciador na liderança da corrida eleitoral.

R1

Aécio – 3º Programa – 00:06:45

166

R2

Aécio – 6º Programa – 00:00:04

Para constituição da cenografia, o enunciador utiliza recursos verbais e não verbais que

o projetam como candidato que está à frente de sua oponente. Enquanto as pesquisas de

opinião são apresentadas, o enunciador profere enunciados que reforçam os motivos de

sua liderança em seu estado: “Aécio está ganhando em Minas” [R1], “saiu do governo

de Minas Gerais com 92% de aprovação popular” [R2].

A cenografia que evidencia dados favoráveis ao enunciador projeta o ethos discursivo

de vencedor da corrida eleitoral, máscara ancorada pelos dados registrados no discurso

“Aécio 57% e Dilma 43%” [R1]; “Aécio 53,2% e Dilma 46,8” [R2]. No contraste, a

máscara de perdedor é atribuída a Dilma.

Essa estratégia discursiva, aliada a força da mídia que propaga pesquisas de opinião e,

portanto, influencia o posicionamento do co-enunciador, busca recuperar dados externos

ao discurso e que exercem poder simbólico na construção do sujeito carismático, na

medida em que fortalecem sua imagem pelo jogo de aparências.

167

D8: AÉCIO – 4º e 5º PROGRAMAS – 18 e 21/10/2014

O D8 apresenta cenografias que visam a promover o enunciador como representante da

mudança de que o Brasil precisa na política nacional.

R1

Aécio – 4º Programa – 00:05:48

R2

Aécio – 4º Programa – 00:05:44 Aécio – 4º Programa – 00:05:46

168

R3

Aécio – 5º Programa – 00:00:14

R4

Aécio – 4º Programa – 00:05:52

169

R5

Aécio – 4º Programa – 00:08:47

A cenografia constituída no R1 tem o propósito de, pelo alerta ao co-enunciador quanto

ao calendário das eleições, vincular a mudança à atitude do co-enunciador no momento

do voto. Enquanto o enunciador diz “faltam sete dias para mudar você mudar o Brasil”

[R4], uma imagem reproduz um calendário com contagem regressiva. O enunciador

marca seu posicionamento nos enunciados proferidos no R2: “O Brasil quer mudar. A

mudança é Aécio”, mas sua preocupação quanto à efetivação de seu desejo esboçado no

R1 é concretizada no R3, em que o enunciador mostra o código da mudança [45],

número da legenda partidária que deverá ser digitado no dia da eleição.

As condições sócio-históricas, proximidade do dia da votação no segundo turno, fazem

com que o enunciador constitua outras cenografias, como uma fala familiar ao lado de

sua esposa [R4], e notícias sobre os malfeitos da instância política [R5], para reforçar o

ethos discursivo de carismático.

De um lado, o enunciador, com a máscara de bom marido [R4], conversa com os

eleitores, lembrando que aquele dia marcava o início da última semana eleitoral, por

isso agradece as demonstrações de apoio e carinho de todas as famílias brasileiras, que

170

se mostram inseguras quanto ao futuro. O enunciador diz que a mudança por que todas

as famílias esperam já começou e convida a todos para que todas as famílias construam

um novo Brasil. De outro, após as demonstrações de apoio à campanha de Aécio, numa

cenografia de notícia e na voz de uma mulher mais madura, o enunciador diz “veja

agora o que o governo Dilma fez e entenda por que a maioria dos brasileiros quer

mudar”.

A cenografia é constituída por uma sequência de reportagens sobre os altos juros

brasileiros e as paralisações de obras iniciadas por Dilma, além do drama por que os

brasileiros passariam se mantivessem Dilma no governo por mais quatro anos. Essa

estratégia situa o discurso na circunstância de cena, em que o enunciador, subsidiado

pela força da mídia, projeta-se como sujeito político carismático, ou seja, busca

influenciar o posicionamento do co-enunciador para validar-se como melhor.

D9: AÉCIO – 5º PROGRAMA – 21/10/2014

O D9 mostra jogos de aparência para promover a instância política como fiadora da

verdade que beneficia o enunciador.

R1

Aécio – 5º Programa – 00:06:28

171

R2

Aécio – 5º Programa – 00:06:38

R3

Aécio – Programa 5 – 00:06:47

172

Para constituição da cenografia, o enunciador profere os enunciados “Preste atenção no

que Dilma fala de Aécio”, “Aécio. Aprovado até pela Dilma” e aforiza enunciado

proferido por Dilma, em abril de 2009, em que diz “Então, primeiro eu respeito demais

o governador. Acho que ele fez um excelente governo em Minas, reconhecido pelos

mineiros, né?”. Essa estratégia situa o discurso em circunstâncias de cena e de imagem,

na medida em que, pelo rosto e pelas palavras da oponente, o enunciador projeta o ethos

discursivo de sujeito carismático, reconhecido até pelos adversários.

D10: AÉCIO – 5º e 6º PROGRAMAS – 21 e 23/10/2014

O D10 apresenta cenografias em que o enunciador é apoiado pela família de Eduardo

Campos e por Marina Silva, presidenciáveis no primeiro turno.

R1

Aécio – 5º Programa – 00:00:25

173

R2

Aécio – 6º Programa – 00:06:19

O enunciador, para constituição da cenografia, utiliza o hino nacional brasileiro, as

cores da bandeira do Brasil, o rosto e a voz de Marina Silva. Trata-se, mais uma vez, de

afiançar seu discurso, de mostrar-se melhor, por isso, dentro de tais circunstâncias, o

enunciador assume formações discursivas que destacam a importância dos apoios de

forças políticas que obtiveram votações expressivas no primeiro turno, principalmente

de Eduardo Campos e de Marina Silva, para, no funcionamento discursivo do discurso

midiático, promover a força do ethos discursivo e do carisma.

.

4.3. Discursos – Dilma Rousseff

D1: DILMA – 1º PROGRAMA – 11/10/2014

O D1 instaura o enunciador como representante da instância política que tem de encarar

o desafio de se mostrar (i)nova(dora), por meio de cenografias que associam o

enunciador a ideias e governo novos.

174

R1

Dilma – 1º Programa – 00:00:01 Dilma – 1º Programa – 00:00:03

Para constituição da cenografia no R1, o enunciador utiliza elementos não verbais,

como o tamanho grande das letras ‘GOVERNO NOVO / IDEIAS NOVAS’ e as cores

verde e laranja em destaque, que buscam recuperar, na memória discursiva do co-

enunciador, conhecimentos que situem o enunciador como presidente de um governo

que está se reformulando para melhor. Essa estratégia situa o discurso em circunstâncias

que projetam, no imaginário social, um ethos discursivo de sujeito político carismático,

representante da instância política, desvinculado de malfeitos e que continuará seu

governo, mas em novo formato, com novas ideais, máscaras que objetivam influenciar o

posicionamento do co-enunciador.

Como parte da estratégia que visa à adesão do co-enunciador, há a valorização das

condições sócio-históricas em que se inscreve o discurso, campanha eleitoral pós

manifestações em todo o país88. Uma das estratégias discursivas, assim como ocorreu

no discurso do enunciador na campanha de Aécio Neves, foi omitir89 informações que

vinculassem explicitamente o enunciador a um partido político, uma vez que a maioria

das agremiações estava sob investigação policial.

Com efeito, o enunciador, ao proferir o enunciado ‘GOVERNO NOVO / IDEIAS

NOVAS’, tem o propósito de vincular-se ao futuro e afastar-se de qualquer problema do

presente e do passado, instituindo, portanto, uma perspectiva da mudança de que o

88 Vide Capítulo I, p.53. 89 O mesmo ocorre nos programas do PT.

175

Brasil precisa. Assim, tal atitude promove uma cenografia de reconhecimento de erros

que visa a (re)credenciar o enunciador e reconduzi-lo à instância política, lugar de

produção de discursos do enunciador que governa.

D2: DILMA – 1º, 2º e 3º PROGRAMAS – 11, 14 e 16/10/2014

O D2 posiciona o enunciador, por meio de circunstâncias de imagem e de cena, como

liderança valente na luta pela democracia em anos de ditadura militar; vítima de

perseguição política; presidente séria, experiente, querida pelo povo brasileiro e pronta

para continuar mandatária do Brasil.

R1

Dilma – 1º Programa – 00:08:59

176

R2

Dilma – 1º Programa – 00:09:59

Nos R1 e R2, o enunciador, para constituir a cenografia, lança mão de um fiador

discursivo que avaliza sua trajetória política: sua própria luta contra a ditadura militar.

Essa estratégia discursiva busca mobilizar, na memória discursiva do co-enunciador,

dados que legitimem uma combatente do regime militar como sujeito capaz de combater

os malfeitores e sujeito valente para tocar obras e projetos importantes para o Brasil. Por

meio da cenografia de biografia pessoal e profissional, da relação do histórico de luta

com as realizações do enunciador como Presidente da República, o ethos discursivo

projetado é o de candidata experiente e preparada para ser, novamente, presidente do

Brasil. Tudo se dá em um jogo de máscaras, em que o enunciador busca atribuir a si o

poder ser para poder fazer, em outras palavras, os efeitos de sentido negociados buscam

estabilizar o seguinte: se o enunciador venceu os ditames de um regime autoritário e

conseguiu ser presidente da República, apesar de sua condição estereotipada, continua

habilitado para continuar sendo mandatário do Brasil.

Assim, vemos que a cenografia é uma encenação que, mesmo caracterizada em espaços

e gêneros distintos, promove a força do ethos discursivo e do carisma, e constrói

condições necessárias para ser legitimada. Daí a possibilidade de o enunciador, por

177

meio de jogos de máscaras e de cenografias, poder dirigir-se ao co-enunciador como

aquele que possui força e resistência para enfrentar as adversidades políticas e pessoais.

Apropriando-se do poder da mídia, o enunciador é mostrado por meio de cenografias

que registram sua atuação política desde a tenra idade. Essa atitude está associada à

Circunstância de cena. A cenografia de biografia pessoal e profissional pretende não só

projetar o ethos discursivo do enunciador de mulher guerreira e valente, mas também

estabelecer o papel social do co-enunciador, admirador de políticos que venceram

regimes autoritários e que são defensores da democracia.

R3

Dilma – 2º Programa – 00:00:43

178

R4

Dilma – 3º Programa – 00:07:26

R5

Dilma – 3º Programa – 00:07:27

179

R6

Dilma – 3º Programa – 00:07:38

R7

Dilma – 3º Programa – 00:07:45

180

Já nos R3-R7, para constituição da cenografia, o enunciador distancia-se do arquétipo

comum aos candidatos em época de eleições, ou seja, não apresenta familiares felizes

que demonstram apoio à sua campanha. Ao contrário, apresenta-se como eixo de sua

própria trajetória política. Nessa perspectiva, o enunciador negocia efeitos de sentido ao

mostrar que, outrora, estava em xeque diante de militares [R1], mas, atualmente, figura,

paradoxalmente, como líder das forças armadas [R4]. Isso ocorre por meio da

interdiscursividade entre os discursos institucional e de luta política. O objetivo é

seduzir o co-enunciador para que ele adira ao discurso.

Com efeito, o fato de o discurso ser midiatizado faz com que estratégias discursivas do

campo político, quais sejam, utilização de recursos midiáticos que projetam imagens

diversas do enunciador no imaginário social; estímulo da competência discursiva do co-

enunciador, revelem as formações discursivas do enunciador, a fim de que seu ethos

discursivo seja validado como melhor. Para tanto, nos R3-R7, o enunciador apresenta

traços do sujeito, corpo, rosto e gestos, que projetam uma identidade social: uma mulher

guerreira, valente.

Assim, os efeitos de sentido negociados são engendrados em diferentes cenografias –

fotografias [R4, R5, R6, R7], cumprimentos [R6], depoimentos [R1], desfiles [R4],

condições externas que são internalizadas no discurso e projetam uma qualidade

extracoditiana do enunciador – que projetam o ethos discursivo e um carisma objetivo

do enunciador, na medida em que realçam-no como superior a seus adversários

políticos. Isso indica que tais cenografias, aliadas ao rosto da mulher, e aos ethé

discursivos de estudante engajada, valente, perseguida pelos militares [R1, R2],

primeira mulher eleita Presidente do Brasil [R3], política séria [R5], experiente [R7] e

amada pelo povo [R6], imprimem competência e habilidade ao enunciador e constroem

um carisma subjetivo, na medida em que busca credenciar o enunciador, no imaginário

social, como candidato político mais bem preparado para continuar com as políticas

públicas de que o Brasil precisa. Tais estratégias discursivas são realizadas nos

discursos multimodais, nos quais o verbal e o não verbal colaboram para a construção

do sujeito político mais carismático, capaz de arrebatar corações e conquistar os votos

necessário para sua vitória.

181

D3: DILMA – 3º e 4º PROGRAMAS – 16 e 18/10/2014

O D3, em diferentes cenografias, apresenta fiadores do discurso do enunciador que

buscam validar o ethos discursivo de político conhecido e reconhecido por instâncias

enunciativas.

R1

Dilma – 3º Programa – 00:03:38

R2

Dilma – 3º Programa – 00:06:37

182

R3

Dilma – 4º Programa – 00:07:19

R4

Dilma – 3º Programa – 00:01:53

183

R5

Dilma – 4º Programa – 00:07:22

R6

.

Dilma – 4º Programa – 00:07:31

184

Apropriando-se da força da mídia, o enunciador constitui, no conjunto dos recortes [R1

a R6] que apresenta depoimentos, uma cenografia de biografia, por meio da qual o

eleitor deve conhecer mais do enunciador: uma mulher política honesta e honrada que

luta pelos menos favorecidos.

Com efeito, é possível perceber a força do ethos discursivo e do carisma, quando o

enunciador, no rosto (carisma subjetivo) de políticos, lideranças e artistas, fiadores de

seu discurso e em cenografias (carisma objetivo), evidencia sua trajetória de sucesso

pessoal e profissional, o que situa o discurso nas Circunstâncias de imagem e de cena,

ou seja, circunstâncias que fortalecem o ethos discursivo projetado de mulher política

honrada, honesta, e performam o enunciador como sujeito carismático.

Para constituição de cenografias, o enunciador, nas vozes de personalidades artísticas e

políticas, sobretudo de Lula, reforça sua identidade discursiva ao proferir enunciados do

tipo:

[R1]

“houve um tempo em que o governo não conseguia fazer o emprego crescer e o

trabalhador chegava a duvidar de sua própria capacidade. Os mais jovens talvez não

se lembrem, mas os seus pais certamente se lembrarão. [...] Eu sei, como vocês, que

tem ainda muita coisa pra [sic] fazer. Pode estar certo que a Dilma é a melhor pessoa

para continuar mudando, para melhor, o nosso querido Brasil”.

[R4]

“Em 2010, eu votei na Dilma muito por causa do Lula. Neste ano, voto na Dilma por

causa da Dilma”.

[R5]

“Dilma, estamos com você”.

[R6]

“É necessário que ela consolide o que ela realizou nos últimos quatro anos”.

185

Tais enunciados revelam formações discursivas que marcam o posicionamento do

enunciador em relação à vida em sociedade, inserindo-o em determinada posição no

processo comunicativo de gestão de poder.

Nesse sentido, o ethos discursivo se revela na figura do fiador, que pode ser confundido

com a figura do enunciador. A estratégia discursiva de apresentar fiadores do discurso,

políticos e artistas conhecidos nacional e internacionalmente, busca associar a imagem

pessoal do enunciador (seu rosto), ao seu conhecimento de política e à sua competência

linguístico-discursiva, incorporando discursividades (máscaras) que envolvem o verbal

e o não verbal.

D4: DILMA – 1º PROGRAMA – 11/10/2014

O D4 apresenta cenografias que evidenciam uma campanha negativa contra a instância

adversária com o propósito de fortalecer ethé discursivos do enunciador: bom político e

gestor que valoriza as pessoas, sobretudo as menos favorecidas.

R1

Dilma – 1º Programa – 00:06:50

186

R2

Dilma – 1º Programa – 00:06:50

R3

Dilma – 1º Programa – 00:07:34

187

R4

Dilma – 1º Programa – 00:00:11

R5

Dilma – 1º Programa – 00:00:30

188

R6

Dilma – 1º Programa – 00:00:39

R7

Dilma – 1º Programa – 00:00:47

189

Para constituição da cenografia, o enunciador, no R1-R7, utiliza recursos verbais e não

verbais numa campanha negativa contra o oponente. O rosto jovem [R1], o tom de voz

sério e as manchetes de jornal [R2, R4, R5, R6, R7], são estratégias discursivas que

visam confrontar o imaginário social com as condições reais de existência do discurso

para reforçar a tese de que o enunciador é o melhor.

Com tal propósito, o enunciador profere enunciados que marcam seu posicionamento e

buscam recobrar a memória discursiva do co-enunciador quanto a declarações feitas

pela instância adversária, tais como:

[R4]

“Aécio já disse o seguinte: estou preparado para tomar as decisões necessárias. Por

mais que elas sejam impopulares” [...] “o candidato tucano não explicou o que seriam

essas ‘medidas impopulares’A resolução de um problema acontece quando o problema

é reconhecido.

A cenografia constituída busca validar o ethos discursivo do enunciador, na medida em

que desqualifica a instância adversária, por meio de dados da memória discursiva do co-

enunciador. Esse processo envolve o co-enunciador em circunstâncias que visam a

validação não só da cena, por meio de cenografias variadas, cujos scripts são

reconhecíveis, mas também de ethé discursivos que sacralizam o enunciador como mais

honesto, mais crível, mais comprometido, mais realizador, mais humano, em outras

palavras, trata-se da sacralização do enunciador como sujeito carismático em detrimento

da falta de carisma de seu adversário.

Firme nesse propósito, o enunciador, num rosto jovem, numa cenografia de noticiário

jornalístico, recupera, na memória discursiva do co-enunciador, fatos negativos ligados

ao aliado do adversário, Armínio Fraga. Segundo o enunciador, uma das medidas do

oponente, se eleito, será colocar Armínio Fraga como ministro da Fazenda, o que, na

visão do enunciador, é um risco, já que, quando presidente do Banco Central, no

segundo mandato de FHC, Fraga “elevou juros para 45% ao ano” [R5]. Com tal

afirmação, busca-se, pelo medo, enquadrar o co-enunciador no papel de fiador do

discurso, ou seja, se ele for contra ao caos econômico, votará no enunciador. Essa

construção está associada à circunstância de imagem, em que o rosto exerce uma

190

influência significativa no imaginário social, o que atribui força ao ethos discursivo e ao

carisma, visando à constituição identidade discursiva do enunciador.

O discurso de Fraga é aforizado e seu rosto destacado, o que o alça ao papel de

representante da instância adversária, numa tentativa de o enunciador imprimir um ethos

discursivo negativo ao seu adversário, já que aquele aduz que é assustador pensar na

possibilidade de Armínio Fraga ser membro da equipe econômica do governo federal

novamente. Percebe-se, portanto, que o enunciador, em circunstâncias dadas, joga com

máscaras, na medida em que tenta imprimir uma de incompetente ao adversário. É o que

ocorre no R3: “Aécio e seu governo foram desaprovados pelos mineiros”. Como visto,

o enunciador quer projetar para si um ethos discursivo de credibilidade ao mesmo

tempo que incita o co-enunciador a desqualificar o adversário.

Em face disso, constata-se que o enunciador se mostra empenhado em eliminar o

oponente e, paradoxalmente, exaltar os valores sociais necessários à vida comum. Tais

atitudes imbricam ethos discursivo e carisma, uma vez que o sujeito carismático

pretendido deve revelar de si uma identidade ideal, que o projete para o co-enunciador

como um sujeito apto a realizar sonhos comuns aos dois.

Além da voz empostada, cenografias variadas, como manchetes de jornais de grande

circulação mostram-se como estratégia discursiva que busca não só mobilizar a

memória discursiva do co-enunciador, mas também incorporar o poder da instância

midiática ao seu discurso, na forma de fiadora, o que possibilita, de um lado, a projeção

do ethos discursivo positivo do enunciador, que não tem nenhum dos membros de seu

governo fazendo declarações ‘tão impopulares’ e, de outro lado, a projeção do ethos

discursivo de incompetente da instância adversária, ao vinculá-la a Fraga. É o que fica

evidente quando o enunciador finaliza o discurso com o enunciado “essa é a visão de

governo de Fraga. Assustador, não é?” [R7].

A fim de negociar os efeitos de sentido, o enunciador profere o enunciado “medidas

impopulares podem significar cortes na educação, na saúde e em programas sociais”

[00:00:55, 1º Programa], numa cenografia em que apenas o enunciador é mais

competente do que a instância adversária para atender aos anseios da instância cidadã

no que cerne às áreas da saúde, educação etc. Trata-se, portanto, da construção do

191

sujeito carismático, com base nas circunstâncias de imagem e de cena. O enunciador se

vale de várias representações no discurso. Em verdade, ele joga com máscaras. Na

mídia, tal estratégia é potencializada pelo alto grau de profissionalismo das equipes

técnica e artística, que utilizam luzes, cenários, corpos, posturas e cores para investir de

poder o enunciador. É o que constatamos. O enunciador, por meio de uma voz, de um

tom e de um rosto, busca, evidenciando o ethos discursivo negativo da instância

adversária, construir para si o ethos discursivo de líder de equipe, gestor de bons e

eficientes projetos em todas as áreas.

D5 – DILMA – 1º e 2º PROGRAMAS – 11 e 14/10/2014

O D5 apresenta cenografias variadas em que o enunciador recebe jovens representantes

de movimentos da juventude no Palácio do Planalto, e de seu engajamento e

compromisso com a aprovação da Reforma Política para a qual, segundo ele, já há sete

milhões de assinaturas favoráveis.

R1

Dilma – 1º Programa – 00:07:38

192

R2

Dilma – 1º Programa – 00:07:43

R3

Dilma – 3º Programa – 00:05:43

193

R4

Dilma – 3º Programa – 00:05:50

R5

Dilma – 3º Programa – 00:06:17

194

R6

Dilma – 3º Programa – 00:06:24

Nos R1 a R6, para constituição da cenografia de propaganda/agenda de sua atuação em

defesa de assuntos de interesse da população, sobretudo quanto à Reforma Política,

cenografia típica de programas jornalísticos, o enunciador, cercado de jovens

representantes de entidades estudantis [R2] e outras lideranças políticas [R3 e R6], o

enunciador projeta, com o corpo, o rosto e a voz, um ethos discursivo de liderança

política respeitada. Assim, os representantes de entidades sociais, no funcionamento

discursivo, são fiadores do discurso do enunciador, na medida em que simbolizam o

poder de articulação dele enquanto produtor de discursos da instância política.

As condições sócio-históricas determinam os jogos de verdade na cenografia em

questão. Considerando que havia um desgaste do enunciador e de seu partido, sobretudo

por causa das denúncias da Lava Jato, o enunciador, num jogo de aparência, quer se

mostrar forte e articulador, ou seja, detentor de força política para realizar as reformas

de que o Brasil necessita. Essas estratégias são impulsionadas pelo poder da mídia que

atende aos propósitos de fortalecer o ethos discursivo do enunciador e projetá-lo como

sujeito político carismático, que merece a adesão do co-enunciador.

195

D6 – DILMA – 1º e 2º PROGRAMAS – 11 e 14/10/2014

O D6, a partir das condições sócio-históricas, apresenta cenografias que buscam

desconstruir a imagem positiva da instância adversária.

R1

Dilma – 1º Programa – 00:01:17

196

R2

Dilma – 1º Programa – 00:02:12

R3

Dilma – 1º Programa – 00:02:33

197

R4

Dilma – 1º Programa – 00:03:53

R5

Dilma – 2º Programa – 00:02:08

198

R6

Dilma – 2º Programa – 00:02:16

R7

Dilma – 2º Programa – 00:05:17

199

R8

Dilma – 2º Programa – 00:06:21

No D6, a cenografia é constituída a partir da exposição de realizações do enunciador,

enquanto representante da instância política, com o propósito de descontruir a imagem

positiva da instância adversária. Assim, o discurso inscreve-se nas circunstâncias de

imagem e de cena que, respectivamente, mostram a força dos rostos e das cenografias,

fatores fundamentais para a projeção do ethos discursivo do enunciador, que visa a ser

sujeito carismático, digno da adesão do co-enunciador.

De um lado, sob o som do jingle “respeite o meu Nordeste” [R7], imagens destacam

obras que estão sendo realizadas e o enunciador apresenta dados que registram o

desenvolvimento da região, sobretudo o fato de que “42% da população do Nordeste

pertencer à classe média” [R6], de outro, o projeto de integração do rio São Francisco é

apresentado [R8] como destaque, numa cenografia de conversa casual entre Dilma e

Lula, às margens do rio. Tal cenografia é constituída pelo uso de depoimentos, pela

apresentação da transposição que levou o desenvolvimento ao nordeste e pela prestação

de contas das realizações do enunciador nas áreas da saúde, educação e transporte.

Dessa forma, a fim de sedimentar o espaço na disputa políticoeleitoral, o enunciador

negocia efeitos de sentido com o co-enunciador, na medida em que apresenta dados

200

positivos da economia [R5, R6], isto é, entre a lógica pragmática – as realizações – e a

lógica simbólica – o poder fazer mais, o enunciador incorpora, no discurso, valores que,

se legitimados pela instância cidadã, oferecem força ao ethos discursivo projetado.

Essa estratégia discursiva, vinculada a fotografias das obras que já foram realizadas no

primeiro governo Dilma como, por exemplo, uma das policlínicas criadas, a de Caucaia

– CE, segundo o enunciador, “quem não conhece até estranha” [R2 e R3], e o programa

“Mais Médicos” [R4], criado no governo Dilma e que consiste na atuação de médicos

em regiões carentes do país, projeta ethé discursivos do enunciador, de bom gestor,

realizador, aquele que tem o poder de fazer muito mais do que já fez, por isso lança

novas propostas que buscam não só recobrar a memória do co-enunciador, sobretudo

nordestino, sobre as condições sócio-históricas de que fala o enunciador, mas também,

por meio do poder da mídia, provocar posicionamentos favoráveis às formações

discursivas apresentadas, de modo que a adesão enseje o voto eleitoral ao final do

processo.

D7: DILMA – 5º PROGRAMA – 21/10/2014

O D7 apresenta cenografias que mostram pesquisas de opinião que posicionam o

enunciador na liderança da corrida eleitoral.

R1

Dilma – 5º Programa – 00:01:12

201

R2

Dilma – 5º Programa – 00:01:21

Para constituição da cenografia, o enunciador utiliza recursos verbais e não verbais que

o projetam como candidato que está à frente de seu oponente. Enquanto as pesquisas de

opinião são apresentadas, o enunciador profere enunciados que reforçam os motivos de

sua liderança em seu estado: “Cresce a certeza que é Dilma novamente”, “Dilma

dispara na liderança” [R1], “É o que dizem as pesquisas...” [R2].

A cenografia que evidencia dados favoráveis ao enunciador projeta o ethos discursivo

de vencedor da corrida eleitoral, máscara ancorada pelos dados registrados no discurso

“Dilma 52% e Aécio 48%” [R1 e R2]. No contraste, a máscara de perdedor é atribuída

ao Aécio.

Essa estratégia discursiva, aliada a força da mídia que propaga pesquisas de opinião e,

portanto, influencia o posicionamento do co-enunciador, busca recuperar dados externos

ao discurso e que exercem poder simbólico na construção do sujeito carismático, na

medida em que fortalecem sua imagem pelo jogo de aparências.

202

D8: DILMA – 1º, 2º e 3º PROGRAMAS – 11, 14 e 16/10/2014

O D8 apresenta cenografias que visam a promover o enunciador como representante da

mudança de que o Brasil precisa na política nacional.

R1

Dilma – 2º Programa – 00:00:01 Dilma – 2º Programa – 00:00:03

R2

Dilma – 2º Programa – 00:00:05 – RJ

203

R3

Dilma – 2º Programa – 00:00:06 – SP

R4

Dilma – 5º Programa – 00:01:54

204

R5

Dilma – 3º Programa – 00:00:27

R6

Dilma – 3º Programa – 00:00:35

205

R7

Dilma – 1º Programa – 00:05:35

Para constituição das cenografias no D8, o enunciador apresenta seu slogan “Governo

Novo. Ideias Novas” [R1], imagens de cartões-postais brasileiros [R2], além de

registros de realizações de seu governo anterior, como diminuição das taxas de

desemprego e da miséria [R4], ascensão da nova classe média [R5], diminuição da

pobreza [R6] e aumento de investimentos em mobilidade urbana [R7]. Desse modo, o

enunciador marca seu posicionamento ao comparar os feitos de seu governo Dilma ao

do governo tucano (FHC) e ao recuperar, na memória discursiva do enunciador, dados

positivos dos governos petistas.

As condições sócio-históricas, proximidade do dia da votação no segundo turno, fazem

com que o enunciador constitua outras cenografias, por meio de imagens panorâmicas e

de enunciados do tipo: “hoje, em todas as partes do Brasil há mais emprego e

desenvolvimento, mais crianças nas escolas e mais jovens na universidade,

principalmente naquela região que era a mais esquecida, o Nordeste” [R2, R3], para

projetar o ethos discursivo de sujeito político carismático.

De um lado, com a máscara de realizador, aquele que põe a ‘mão na massa’, o

enunciador mostra suas realizações e seus novos projetos para o futuro, numa tentativa

206

de posicionar-se como o político das mudanças para influenciar o posicionamento do

co-enunciador quanto à validação de seu discurso.

D9: DILMA – 1º PROGRAMA – 11/10/2014

O D9 mostra jogos de aparência para promover a instância adversária como fiadora da

verdade que beneficia o enunciador.

R1

Dilma – 4º Programa – 00:00:57 Dilma – 4º Programa – 00:01:02

R2

Dilma – 4º Programa – 00:01:09

O enunciador, para constituição da cenografia, num processo de incorporação, utiliza o

rosto e a voz de pessoas que andam pelas ruas de São Paulo e pelas ruas do Rio de

207

Janeiro para apresentar dados sobre o aumento do número de homicídios nessas regiões

e lembrar que a Segurança é uma das maiores preocupações das populações das grandes

cidades. Trata-se de um jogo de aparências, já que o enunciador, enquanto representante

da instância política, é corresponsável por tal avanço nos índices apresentados.

A estratégia discursiva situa o discurso em circunstâncias de cena e de imagem, na

medida em que, pelo rosto e pelas estatísticas, o enunciador busca projetar o ethos

discursivo de sujeito carismático, reconhecido como governante atento às demandas da

segurança pública, diferente do opositor que governou o estado de Minas Gerais,

posicionado no gráfico como o estado que, segundo gráfico apresentado, amarga altos

índices de criminalidade. Assim, a instância adversária é alçada ao posto de fiadora do

discurso do enunciador, uma vez que, no contraste com os índices positivos do governo

Dilma, o enunciador promove formações discursivas que sustentam seu ethos discursivo

de governante realizador.

D10: DILMA – 5º PROGRAMA – 11/10/2014

O D10 apresenta cenografias em que o enunciador é apoiado por Lula, que pede votos

para Dilma e faz um balanço dos doze anos de governos petistas.

R1

Dilma – 5º Programa – 00:09:29

208

R2

Dilma – 6º Programa – 00:09:54

O enunciador, para constituição da cenografia, utiliza imagens de manifestações de

apoio à Dilma, o rosto e a voz do ex-presidente Lula e de artistas. Trata-se, mais uma

vez, de estratégias que buscam afiançar seu discurso e mostrar o enunciador como

melhor, por isso, dentro de tais circunstâncias, o enunciador assume formações

discursiva que destacam a importância do apoio da força política que obteve expressivas

votações e altos índices de aprovação popular quando era governante.

[R1]

Converse com sua família, seus vizinhos, seus amigos; mobilize sua rua, seu bairro sua

escola, seus companheiros de trabalho para refletir sobre o que está em jogo nessa

eleição. É preciso mostrar quais são os interesses representados pelos dois candidatos.

Não há dúvida de que Dilma é a garantia de manter o rumo de que o povo brasileiro

precisa. Conto mais uma vez com vocês para construirmos juntos uma grande vitória.

Dia 26 de outubro, vote 13.

O rosto de Lula, no funcionamento discursivo, é mais uma das máscaras do enunciador

que, no jogo de aparências, promove a força do ethos discursivo do enunciador de

sujeito político carismático.

209

Por fim, após relatos que registram ‘investidas históricas’ da revista Veja para tentar

barrar vitória de candidatos do PT, novas pesquisas que colocam Dilma à frente de

Aécio, novos depoimentos, inclusive do ex-presidente Lula, o enunciador fala e a

imagem registra: dou minha alma ao Brasil [R2]. Assim, o enunciador que ora estava

ancorado no rosto de outrem, posiciona-se com o rosto da presidente que dá “a alma ao

Brasil”, enunciado que busca sacralizar o discurso do enunciador.

210

CONCLUSÃO

Com esta pesquisa, pudemos analisar os elementos enunciativo-discursivos que

comprovam a força do ethos discursivo, do carisma e do poder da mídia na construção

do sujeito político brasileiro no HGPE, em condições sócio-históricas marcadas pela

realização do segundo turno das eleições presidenciais de 2014.

Em princípio, partimos das noções de política e de categorias da AD, sobretudo quanto

às condições sócio-históricas de produção, à cena de enunciação e ao ethos discursivo,

fazendo uma distinção deste com o carisma, para mostrar que houve, no discurso

políticoeleitoral midiatizado, cenografias diversas que projetaram, no imaginário social,

identidades discursivas do enunciador, ou seja, ethé discursivos que buscaram legitimá-

lo como sujeito carismático, condição que lhe permitiu negociar, com mais facilidade,

os efeitos de sentido de seus discursos com o co-enunciador.

Nessa perspectiva, apreendemos o ethos discursivo e o carisma em circunstâncias, de

imagem e de cena, que construíram, pela subjetividade, a identidade do enunciador.

Trata-se de um jogo discursivo em que estratégias de sedução, por meio de máscaras,

permitem ao enunciador parecer verdadeiro diante das instâncias enunciativas inscritas

na situação comunicativa.

Desse modo, provamos que, em cenografias estrategicamente constituídas, o discurso

políticoeleitoral midiatizado projetou ethé discursivos, ou seja, identidades discursivas

do enunciador, uma relacionada ao conceito político e outra à práxis social, para

constituição do sujeito político carismático. O ethos discursivo é sempre um movimento

em construção, e o carisma participa desse fenômeno. É a questão do ethos discursivo

levado ao extremo, pois ele não se funda na legitimidade; é uma vantagem que se

sobrepõe à legitimidade, na medida em que um sujeito pode ter uma legitimidade

institucional, mas não ter carisma. O carisma se relaciona à atitude de poder e à

capacidade de dominação, pelo convencimento, do líder político. Ter carisma é mais

que conseguir credibilidade e aceitação do público, é ser capaz de se posicionar frente

às instâncias para garantir sua identidade de exaltar os valores sociais necessários à vida

comum. Por isso, carisma e ethos discursivo se inter-relacionam, uma vez que o político

211

carismático revela em si uma identidade ideal apta a realizar seus sonhos que são os

mesmos sonhos do co-enunciador, mostrando, inclusive, caminhos para alcançá-los.

As análises mostraram que o carisma aparece como traço constitutivo da identidade do

sujeito, ou seja, situa o enunciador entre a vontade de mudança do status quo, lógica

simbólica, e sua projeção como sujeito político executor, lógica pragmática. Nesse

sentido, o sujeito político brasileiro, num jogo de aparência e de sedução, para validar

sua figura de poder na tela da televisão e nas urnas, buscou firmar-se como carismático,

reforçando suas formações discursivas que atravessaram não só diferentes discursos,

mas também competições interpartidárias que evidenciam o político por meio do

confronto de suas relações imaginárias com as suas condições reais de existência. Com

efeito, as cenografias revelaram os posicionamentos que os coenunciadores assumiram e

os sentidos que concorreram na enunciação. O enunciador, assim, assumiu identidades

sociais marcadas pelas discursividades que constituíram seu ethos discursivo.

Como sujeito político, o enunciador, enquanto ser no/do mundo, projetou a imagem de

si para ser legitimada pelo co-enunciador, mas teve de manifestar, no funcionamento

discursivo, corporal e sensorial, um carisma, uma maneira de ser e de falar, que

conquistasse a adesão do co-enunciador no processo de legitimação em que o co-

enunciador é personagem importante, enquanto membro de uma comunidade discursiva

detentora do voto e que dispõe de elementos que podem validar ou não a imagem do

enunciador. Nesse sentido, ser enunciador de um discurso não só significa ser capaz de

reconhecer enunciados como bem formados, ou seja, pertencentes à sua formação

discursiva, mas também de produzir um número ilimitado de enunciados pertencentes a

essa formação discursiva.

É essa constituição do sujeito que promove, no campo político, o discurso capaz de

projetar máscaras e assumir discursividades que buscam influenciar o posicionamento

do co-enunciador. Propor maneiras de identificar essas estratégias contribui para

perceber os efeitos de sentido negociados num campo tão polêmico como é o político.

Queremos afirmar que o carisma enfatiza formações discursivas e reforça o ethos

discursivo, na medida em que nele e por ele vê-se o sujeito político validando-se como

melhor. É o que comprovamos na análise do corpus, por exemplo, quando o enunciador

se coloca como representante da mudança de que o Brasil precisa [D1: Aécio e D1:

212

Dilma]; defensor da democracia e político experiente [D2: Aécio e D2: Dilma];

afiançado por lideranças políticas e artísticas [D3: Aécio e D3: Dilma]; conhecedor dos

malfeitos de seu opositor [D4: Aécio e D4: Dilma]; atuante nos campos sindical e

político [D5: Aécio e D5: Dilma]; respeitado e reconhecido até pelo opositor [D6: Aécio

e D6: Dilma]; líder nas pesquisas de opinião [D7: Aécio e D7: Dilma]; político

diferente, engajado [D8: Aécio e D8: Dilma]; bom gestor [D9: Aécio e D9: Dilma];

apoiado por políticos com peso eleitoral [D10: Aécio e D10: Dilma]. O discurso do

enunciador, que se revela sujeito político carismático, buscou convencer o co-

enunciador para que nele votasse.

Os candidatos Aécio Neves (PSDB) e Dilma Rousseff (PT) protagonizaram programas

eleitorais que projetaram, no imaginário social, uma sociedade dividida. Do ponto de

vista linguístico, como práxis, o discurso político foi analisado com base nas relações de

força e de fraqueza que as instâncias discursivas mantêm entre si para construírem o

vínculo social. Tais relações nos permitiram perceber os jogos de sedução que se

instauram no discurso político. Queremos dizer, por exemplo, que alguns aspectos de

produção e de veiculação do HGPE investigados, sobretudo quanto aos ethé discursivos

positivo e negativo do político, mostraram que, por meio de ataques a adversários,

buscou-se evidenciar, por óbvio, o que de positivo tem o político que enuncia, em

contraste com que o Outro tem de negativo. Em outras palavras, houve tentativas de

promover a imagem positiva do enunciador pelo contraste entre o honesto (EU) e o

corrupto (Outro). Constatamos que a legitimação de um sujeito político como

carismático pode orientar os demais eleitores, que compõem a instância cidadã, a

votarem na figura de poder que é projetada na mídia. Perceber o discurso político nessa

dimensão pode contribuir para outras discussões acerca do discurso políticoeleitoral

brasileiro.

Compreender a lógica da política brasileira e a noção de carisma possibilitou-nos propor

os conceitos de carisma subjetivo e carisma objetivo. O primeiro manifesta-se no

detentor da voz, no rosto, na figura humana, no sujeito empírico, trata-se, portanto, do

carisma para além da dominação, ou seja, uma qualidade performativa em que práticas

corporais e sensoriais são fundamentais para o estabelecimento da autoridade e da

legitimidade do candidato político; quanto ao segundo, carisma objetivo, emerge de

condições distintas, ou seja, de condições externas ao sujeito empírico, que se

213

internalizam no discurso e que projetam uma imagem do enunciador. O carisma se

apresenta como resultado da força do ethos discursivo, do rosto do sujeito, de

cenografias e da concorrência entre instâncias que, incorporadas nos programas

eleitorais midiatizados, promovem o enunciador ao status de carismático.

Ademais, verificamos que, na mídia, são produzidos e/ou propagados vários gêneros de

discurso, dentre eles a propaganda eleitoral midiatizada. Como Maingueneau (2008c),

entendemos que a determinação da finalidade do gênero de discurso faz com que o co-

enunciador tenha um comportamento adequado em relação ao gênero produzido, ou

seja, o gênero instaura determinadas regras que devem ser conhecidas pelos partícipes

da comunicação, de modo que qualquer transgressão, por menor que pareça ser, pode

pressupor a exclusão do jogo. No HGPE, o gênero de discurso ‘propaganda eleitoral

midiatizada’ abarca práxis partidária e eleitoral em processos de significação, verbal e

não verbal, que permitiram ao enunciador apropriar-se do espaço midiático para

produzir cenografias que o projetassem como melhor.

Assim como para Charaudeau (2006), para nós, também, a mídia funciona como um

espelho para o co-enunciador que, num “cruzamento de olhares”, pode aderir ao

posicionamento do enunciador, uma vez que os discursos que nela circulam utilizam

estratégias discursivas capazes de transformar, na práxis política em cena no Brasil, o

irreal em real, o falso em verdadeiro e, pelo poder da mídia, o enunciador em sujeito

carismático.

214

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sociologia compreensível. Tradução de Regis Barbosa e Karen Elsabe Barbosa. Brasília:

UnB, vol. I, 2000. p. 139-198, 279-418.

________________. O Estado Nacional e a Política Econômica. São Paulo: Ática

228

2003.

________________. Economia e Sociedade: Fundamentos da sociologia compreensiva.

4ª ed. Brasília: UnB. 2009. V. I

________________. Ciência e política: duas vocações. Tradutores: Leonidas

Hegenberg, Octany Silveira da Mota. São Paulo: Cultrix, 2011.

229

ANEXOS

230

ANEXO 1

Links dos programas no youtube.com

AÉCIO NEVES

D1: AÉCIO 11/10/2014

https://www.youtube.com/watch?v=Ma8N1ILu-o4

D2: AÉCIO 14/10/2014

https://www.youtube.com/watch?v=4SdU74gxveI

D3: AÉCIO 16/10/2014

https://www.youtube.com/watch?v=SWImw6O9eDY

D4: AÉCIO 18/10/2014

https://www.youtube.com/watch?v=9RGg3YVONMY

D5: AÉCIO 21/10/2014

https://www.youtube.com/watch?v=qkzWTno68pg

D6: AÉCIO 23/10/2014

https://www.youtube.com/watch?v=oXPgHfeZBCw

DILMA ROUSSEFF

D1: DILMA 11/10/2014

https://www.youtube.com/watch?v=mX2nWNos7pk

D2: DILMA 14/10/2014

https://www.youtube.com/watch?v=2CqaYCo5_yE

D3: DILMA 16/10/2014

https://www.youtube.com/watch?v=VjzQHnRWUEU

D4: DILMA 18/10/2014

https://www.youtube.com/watch?v=knailgd0JhA

D5: DILMA 21/10/2014

https://www.youtube.com/watch?v=bly5I65bIV0

D6: DILMA 23/10/2014

https://www.youtube.com/watch?v=i0wP7f1pXKU

231

ANEXO 2

CD – Tese em PDF e Corpus constituído