a espiritualidade juvenil como horizonte da pÓs … · ... a abordagem que esses autores discutem...
TRANSCRIPT
1
A ESPIRITUALIDADE JUVENIL COMO HORIZONTE DA
PÓS-MODERNIDADE
Hiago Baltazar Saraiva*
RESUMO
O presente estudo aborda a dinâmica das juventudes a partir do conceito de
espiritualidade e pós-modernidade. Para tal, elaborou-se um referencial teórico que
apresenta a espiritualidade juvenil como um horizonte na pós-modernidade, tendo como
fio condutor da espiritualidade juvenil as ideias de autores como João Batista Libanio,
Leonardo Boff, Jean-François Lyotard entre outros. O objetivo é reconhecer a
espiritualidade juvenil como eco e horizonte da mudança de época para a
contemporânea. Na primeira parte elabora-se um conceito de pós-modernidade e de
espiritualidade. Em seguida, desenvolve-se o conceito de juventude, e conclui-se que a
espiritualidade é uns dos elementos centrais na vida dos jovens contemporâneos.
Palavras-chave: Juventude, Pós-Modernidade, Espiritualidade.
INTRODUÇÃO
Creio que os reflexos da globalização e da pós-modernidade transcorrem por
muitos âmbitos da sociedade. A ocidentalização do mundo juntamente com a entrada
maciça dos símbolos midiáticos nas mais distintas sociedades espalhadas pelo globo
atingem diretamente seu status quo, e os lançam nos turbilhões fluídos das incertezas
contemporâneas. Todavia, a pós-modernidade não mostra caminhos, ela os desconstrói,
não firma metanarrativas, mas adora destrocá-las, e, assim, o homem moderno calcado
em princípios seculares de verdades absolutas fica sem chão, sem bases sustentáveis de
afirmações plausíveis; a única verdade que surge é essa: “não existe verdade absoluta.”
A globalização da economia mundial juntamente com a ascensão dos meios de
comunicação de massa e as desconstruções levantadas por filósofos, sociólogos e
historiadores descortinam um novo momento histórico, momento esse que tende a
* Graduando do Curso Superior de Teologia do Centro Universitário La Salle – Unilasalle
Canoas-RS, matriculado na disciplina de Trabalho de Conclusão do Curso II sob orientação do Prof. Dr. Renato Ferreira Machado. E-mail do graduando: [email protected]
2
romper provisória ou completamente os paradigmas que sobreviveram íntegros por
séculos.
Tais paradigmas segundo esses teóricos eram os que nortearam a humanidade
por longo tempo, alguns milenares, como a religião e outros mais recentes, como a
ciência. A esse momento histórico alguns pensadores, como Bauman (1998), Morin
(1993), Lyotard (1924-1998) denominaram de Pós-modernidade; Giddens (1991), por
exemplo, caracteriza-o como Modernidade Tardia. Os nomes mudam de acordo com
cada autor, no entanto, a abordagem que esses autores discutem gira em torno da crise
dos referenciais de verdade e a ruptura com as grandes narrativas, entre elas a
metafísica.
Não há duvidas de que pensar a dinamicidade da juventude em nossos dias, em
que toda a sociedade está fortemente marcada pela fragmentação social e fluidez das
instituições: família, relacionamentos, religiões... “Todas assumem caráter flexível na
vida de nossos coetâneos, que relativizam tudo o que, no passado, se considerava
estável e fundamental” (PE. ALEXANDER, 2014, p. 43).
As relações interpessoais tendem a ser, o mais possível, horizontais, frágeis e
abertas. Nossa civilização atual está fortemente marcada pela “... incapacidade
endêmicas de nossa sociedade, e de qualquer parte dela, de manter a sua forma por
algum período de tempo” (BAUMAN, 2007. P. 29).
O que caracteriza os tempos pós-modernos em que vivemos, segundo o filósofo
Lyotard, é a falta de respostas para a questão do sentido da existência.
Segundo Frei Beto (2013, p. 66):
A crise da modernidade favorece espiritualidades adaptadas às necessidades psicossociais de evasão, da falta de sentido, de fuga da realidade conflitiva.
Espiritualidades de tradições religiosas egocêntricas, ou seja, centradas no eu,
e não no outro, capazes de livrar o indivíduo da conflituosidade e da
responsabilidade sociais.
O que está em emergência são os novos modelos de ser Igreja que escapam às
antigas formas de organização eclesial. Para (PE. ALEXANDER 2014, p. 52) o que
começa a emergir não é mais uma organização eclesial monolítica, sem diferenças, mas
os muitos grupos que, embora identitários, independentes e autônomos, começam a
trabalhar com objetivos comuns, estão começando a se interligar em redes.
3
Não é mais possível uma organização uniforme e uniformizadora, como ocorreu
nas décadas anteriores no século XX. Mesmo as tentativas de alguns movimentos em
se tornarem únicos, como se pudessem substituir a antiga organização hegemônica,
frustraram-se.
Segundo Libanio (2012,p. 17):
Parte da juventude da década 60 viveu momento de enorme entusiasmo em
direção ao futuro. Nos EUA, os jovens desencadearam uma batalha simbólica
contra a guerra do Vietnã e romperam com muitas das estruturas do sistema
capitalista em grito de protesto. Na França, a movimentação culminou em
maio de 1968. Na América Latina, apesar da repressão e, em partes, por
causa dela, muita se lançaram na aventura de construir uma sociedade
socialista com diversos coloridos. O futuro os movia a agir.
Diante desse fator Libanio nos adverte que hoje, as Juventudes ficaram em um
comodismo. Todavia, a pós-modernidade desloca o acento para o presente. Os jovens
buscam experimentar o momento.
Boff quando situa o tema espiritualidade, ele situa em um contexto dramático e
perigoso em que se encontra atualmente a humanidade:
Em momentos assim dramáticos, o ser humano mergulha na profundidade do
Ser e se coloca questões básicas: o que estamos fazendo neste mundo? Qual é
o nosso lugar no conjunto dos seres? Como agir para garantirmos um futuro
que traga esperança para todos os seres humanos e para o planeta? E o que
poderemos esperar para além dessa vida? (BOFF 2006. p. 10.)
Para Boff, a “espiritualidade é uma das fontes primordiais, embora não seja a
única, de inspiração do novo, de esperança alvissareira, de geração do ser humano.” A
espiritualidade é algo inerente ao ser humano, sempre ele busca na espiritualidade um
sentido de vida, ou seja, é uma das fontes principais que o ser humano bebe, para dar
um sentido a sua vida.
A maioria dos jovens busca na espiritualidade respostas para as questões
existenciais. Ou seja, a fé ajuda o jovem a procurar e talvez encontrar um significado
para a própria existência. Busca-se algo, uma dimensão da vida que está distante da
banalidade cotidiana. Nesse sentido, a espiritualidade é algo inerente ao ser humano,
uma dimensão fundamental da vida.
4
2. PÓS-MOERNIDADE
Estamos vivendo em uma época da história da humanidade de profunda
mudança em todo o segmento da sociedade. É lançado um novo olhar para a geração
atual, um novo jeito de encarar a realidade e celebrar a vida. E essas mudanças
ocorridas de formas rápidas e transacionais em nossa sociedade é dominada “Pós-
modernidade”.
O momento hodierno tem sido compreendido e, consequentemente, denominado
de maneiras distintas: modernidade tardia ou alta modernidade, para Giddens (1991);
hipermodernidade para Lipovetsky (1944); pós-modernidade para Lyotard (1924-1998),
Fedric Jameson (1934), Beatriz Sarlo (1942), Hall (2006), entre outros. Assim, o
contexto atual e seus desdobramentos tornam-se temáticas relevantes de inúmeros
estudos e teóricos, acirrando os debates a respeito da sociedade e da cultura.
Consequentemente, esse contexto aponta tais características sociais, políticas,
econômicas, tecnológicas e culturais peculiares. Que produz comportamentos, práticas
de consumo, identifica e classifica as pessoas e, forma identidades, em fim, institui
modos de viver e ser das pessoas, ou melhor, de “estar no mundo”. A partir de distintas
compreensões desse contexto, procura-se explicá-lo, por meios das profundas
transformações ocorridas na sociedade, a partir da segunda metade do século XX e as
respectivas consequências nas relações sociais e práticas culturais do mundo presente.
2.1 Pós-modernidade mudança de época
Segundo Sandrini “existem épocas de mudanças e mudanças de épocas. Na
história da humanidade, é consenso que houve poucas mudanças de épocas. Mudança de
época supõe uma mudança de paradigma”.
Para Boff:
[..] está nascendo um novo tipo de percepção da realidade, com novos
valores, novos sonhos, nova forma de organizar arquitetonicamente os
conhecimentos, novo tipo de relação social, nova forma de dialogar com a
natureza, novo modo de experimentar a última realidade e nova maneira de
entendermo-nos a nós mesmos e definir nosso lugar no conjunto de seres
(BOFF, 2005, p. 27-28).
A partir da segunda metade do século XX iniciou-se um processo sem
precedentes de alterações na história do pensamento e da técnica. Junto com a
5
aceleração avassaladora nas tecnologias de comunicação, das artes, de materiais e de
genética, aconteceram também mudanças nos padrões e nos modos de se pensar a
sociedade e suas instituições, com isso começa a se firmar uma nova identidade cultural.
Nossa era é marcada por intensas e profundas mudanças. Depois de uma
longa “época de mudanças”, nós nos deparamos com uma “mudança de
época” que enfraquece e altera muitos dos paradigmas tradicionais que sustentavam certas visões de mundo. Raras são as sociedades imunes a esse
processo. Vivemos em um mundo globalizado, em que todos são afetados por
tudo o que acontece em qualquer lugar (CF 2013, n.5).
As clássicas maneiras de compreender o mundo e a maneira de viver que
serviram de alicerce para as pessoas por muitos séculos, já não são aceitas pelas novas
gerações. Destarte, a tradição cultural se fragmentou e deu lugar a uma diversidade de
visões do mundo e da vida de estruturações sociais, de relações com o sagrado e de
modelos antropológicos: “Vivemos uma mudança de época, e seu nível mais profundo é
cultural. Dissolve-se a concepção integral do ser humano, sua relação com o mundo e
com Deus” (DA, 2007, nº 44).
As mudanças se verificam em todos os campos de atividade humana, atingem
economia, a política, as ciências, a educação, o esporte, as artes e a religião, que constituem os elementos da cultura das sociedades humanas. A religião,
uma das bases fundamentais de toda a cultura, sofre um impacto ainda maior
do que as outras áreas. Além disso, os aspectos humanos da sociedade –
economia, saúde, política, artes – aceitam olhar a questão da mudança de
modo unilateral, isto é, do ponto de vista exclusivo de seus interesses, que
são fragmentados. [..] (CF, 2013, n°8).
Destarte, onde outrora existiam valores e critérios que definiam dada realidade
ou modo de proceder, agora há uma diversidade de propostas aceitas como válidas, num
contexto de abertura a experimentação.
Nesse cenário de “mudança de época”, nos confrontamos com mais uma palavra
muito importante neste contexto atual, isto é, a “globalização”, Segundo BAUMAN
(1925, p.7). a “globalização está na ordem do dia; uma palavra da moda que se
transforma rapidamente em um lema, uma encantação mágica, uma senha capaz de abrir
as portas de todos os mistérios presente e futuro”.
6
2.2 Característica da Pós-modernidade segundo alguns pensadores.
A característica da pós-modernidade é vaga, não é apresentada uma definição
geral para si dentre os diversos teóricos que se debruçam sobre ela. É justamente por
isso que o termo se desdobra dentre tantos outros.
Na obra titulada A condição Pós-moderna (1986), de Jean –François Lyotard
aborda o conceito de pós-modernidade. Lyotard procura demonstrar que o entendimento
desse conceito está relacionado à abolição da ideia de verdade, que durante muitos anos
foi uma das principais armas de poder.
Aceitamos a decisão de que os dados do problema da legitimação do saber
estão hoje suficientemente esclarecidos para o nosso propósito. O recurso às grandes narrativas está excluído; não se pode portanto recorrer nem à
dialéctica do Espírito nem mesmo à emancipação da humanidade para a
validação do discurso científico pós-moderno. Mas, como acabamos de ver, a
<<pequena narrativa>> continua a ser a forma por excelências assumidas
pela invenção imaginativa e, antes de mais, na ciência (LYOTARD, 1986. p.
121).
Para Lyotard, a pós-modernidade se caracteriza por uma incredulidade perante o
metadiscurso filosófico metafísico, que possui pretensões atemporais e universalizantes.
Este cenário composto por uma essencialidade cibernética, informatizada e
informacional. O saber seria legitimado pela ciência, pelo virtual e pelo artificial. A
verdade seria o resultado da vitória do discurso mais sedutor ou daquele mais forte para
impor o seu discurso.
A transmissão de saberes já não surge destinada a forma uma elite capaz de
guiar a nação na sua emancipação, antes fornece ao sistema os jogadores
capazes de assegurar convenientemente o seu papel nos lugares pragmáticos
de que as instituições necessitam (LYOTARD, 1986. p. 99).
Também a complexidade abarcada pela pós-modernidade é exposta por
Esperandio (2007) quando a autora afirma que:
Não há como buscar uma verdade que se chama pós-modernidade. Mas há,
sim, como colocar em evidência a construção de sentido sobre um processo de recomposição de diversos elementos (políticos econômicos, culturais,
religiosos etc.), que leva à emergência do que se tem chamado hoje de pós-
modernidade. (ESPERANDIO, 2007, p. 9, grifo da autora)
7
Apesar de toda a confusão que o termo pós-modernidade pode causar, algumas
caracterizações de teóricos como Fredric Jameson e Michel Maffesoli dão conta de
constatar algumas similaridades entre visões distintas. Exemplo disso é o fato de que
ambos encaram a pós-modernidade como um fenômeno cultural. Featherstone afirma
que em seus estudos Jameson “fala em pós-modernismo como uma lógica cultural, ou
dominante cultural, que conduz à transformação da esfera cultural da sociedade
contemporânea”. (FEATHERSTONE, 1995, p. 26). Para Jameson (1993), a função do
termo pós-modernidade seria:
[...] correlacionar a emergência de novos aspectos formais da cultura com a
emergência de um novo tipo de vida social e com uma nova ordem
econômica - aquilo que muitas vezes se chama, eufemisticamente, de
modernização, sociedade pós-industrial ou de consumo, sociedade da mídia
ou dos espetáculos, capitalismo multinacional. (JAMESON, 1993, p. 27)
Maffesoli (1999), citado por Esperandio (2007), apresenta uma visão parecida
quando afirma que “associar pós-modernidade e neoliberalismo é uma bobagem, pois o
fundamento da pós-modernidade não é econômico” (ESPERANDIO, 2007, p. 6),
destacando o imaginário social como um fato mais marcante para a construção de uma
identidade ‘pós-moderna’.
Coelho vai ainda mais fundo no caráter generalista que o conceito de pós-
modernidade recebeu no decorrer de sua trajetória. O autor destaca a complexidade do
processo de transformação cultural que o termo carrega em si ao explicar que:
Neste final de século que, já um pouco mais facilmente, é possível rotular de
pós-moderno, tanto a tradicional concepção antropológica de cultura quanto
categorias mais recentes como cultura superior, média (midcult), e de massa
(masscult) – discutidas no começo dos anos 60 por Dwight MacDonald, na
esteira dos escritos da escola de Frankfurt, e em seguida vastamente
popularizadas por Umberto Eco, entre outros –, sem esquecer conceitos
similares do tipo cultura popular, cultura hegemônica, cultura dominada,
cultura nacional-popular, não mais dão mais conta, sozinhos, da
complexidade e diversidade da dinâmica cultural. (COELHO, 2005, p. 172,
grifos do autor)
Para Anderson, a chave para a compreensão do que é a pós-modernidade é a
instantaneidade. De acordo com o autor, o termo pós-moderno “é sempre em princípio o
que se deve chamar um presente absoluto. [...] Ele cria uma dificuldade peculiar para a
definição de qualquer período posterior, que o converteria num passado relativo”
(ANDERSON, 1999, p. 20). É dessa maneira que se pode destacar como uma das
8
características mais proeminentes da pós-modernidade a relação peculiar que este tem
com o tempo, que pela primeira vez se desprende das amarras do espaço para se tornar
uma unidade independente.
Pontes (2003, p. 50) afirma que essa característica de relativização do tempo está
presente tanto nas obras de Maffesoli, que a chama de ‘presenteísmo’, quanto de
Jameson, que utiliza o termo ‘presente perpétuo’. Bauman também destaca o caráter
relativo e cada vez mais subjetivo do tempo na pós-modernidade, a qual ele chama de
‘modernidade líquida’. De acordo com o autor, já no começo da era moderna se
observava uma emancipação do tempo em relação ao espaço, na qual “a relação entre
tempo e espaço deveria ser de agora em diante processual, mutável e dinâmica, não
predeterminada e estagnada” (BAUMAN, 2001, p. 131).
É dessa maneira que a instantaneidade se sobrepõe como valor positivo em lugar
do fixo e durável, ou, como o próprio Bauman coloca, há uma “despreocupação com a
eterna duração em favor do carpe diem” (BAUMAN, 2001, p. 144, grifo do autor). O
que resulta dessa nova maneira de se relacionar com o tempo é a quebra da sensação de
limites:
A instantaneidade (anulação da resistência do espaço e liquefação na
materialidade dos objetos) faz com que cada momento pareça ter capacidade
infinita; e a capacidade infinita significa que não há limites ao que se pode
ser extraído de qualquer momento – por mais breve e “fugaz” que seja.
(BAUMAN, 2001, p.145)
A desconstrução das barreiras entre o pessoal e o público também pode ser
encarada como uma característica própria da pós-modernidade.
Bauman destaca que a quebra dos limites entre o privado e o público pode ser
encarada de maneiras diversas na pós-modernidade. Enquanto que pensadores como
Habermas entendem tal fenômeno como uma ‘invasão’ do privado pelo público,
Bauman rebate tal ponto de vista ao afirmar que:
O que parece estar em jogo é uma redefinição da esfera pública como um
palco em que dramas privados são encenados, publicamente expostos e
publicamente assistidos. A definição decorrente de “interesse público”,
promovida pela mídia e amplamente aceita por quase todos os setores da sociedade, é o dever de encenar tais dramas em público e o direito do público
de assistir à encenação. (BAUMAN, 2001, p. 83)
Para Hall (2005, p. 12), o sujeito pós-moderno possui uma identidade
fragmentada e não permanente, refletindo-se aí na quebra de barreiras outras além das
9
de público e privado. O autor também frisa que esse sujeito não é mais definido
biologicamente como em épocas anteriores, mas sim historicamente. De acordo com
Hall (2005):
[a] identidade torna-se uma "celebração móvel": formada transformada
continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou
interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam (HALL, 1987). E
definida historicamente, e não biologicamente. O sujeito assume identidades
diferentes em diferentes momentos, identidades que não são unificadas ao
redor de um "eu" coerente. (HALL, 2005, p. 12-13)
A quebra das fronteiras entre tempo e espaço, entre público e privado e de
paradigmas. Partindo dessas características primordiais, a seção seguinte busca as
relações entre a pós-modernidade e a espiritualidade juvenil pós-moderna.
3. ESPIRITUALIDADE
Neste início do século XXI, o ser humano está perante um desafio fundamental:
a retomada de uma dinâmica que tem traços específicos e que pode ser caracterizada
como espiritualidade.
Nas nossas circunstâncias presente de incertezas e insegurança, a
espiritualidade poderia ser vista como mais uma forma de escape. Embora
isso possa ser verdade em certos casos, parece-me que, de um modo geral, a
nova busca por espiritualidade, é sincera e genuína. Eis um dos sinais dos
tempos.
O sinal, porém, não é o número de pessoas que encontrou uma forma
satisfatória de espiritualidade pela qual possam reger sua vida. Algumas
encontram-na, mais o sinal é, antes de tudo a fome generalizada de
espiritualidade, a busca de espiritualidade, a necessidade de espiritualidade
sentida pelas pessoas. Poder-se-ia argumentar que todos os seres humanos precisam, e sempre precisaram de espiritualidade (NOLAN, 2013.p. 30-31).
O que hoje está acontecendo é que muito mais pessoas estão tomando profunda
consciência da sua necessidade de espiritualidade.
Para Nolan, essa necessidade ou fome por espiritualidade é experimentada de
diversas formas:
Alguns experimentam-na como necessidade de alguma coisa que lhes
transmitam força interior para aguentar a vida, ou paz de espírito e libertação
dos sentimentos de medo e ansiedade. Outros experimentam-na quando se
sentem ir abaixo e necessitado de alguma coisa maior do que eles que os mantenha de pé. Há, ainda, o sentimento de estar ferido, magoado, alquebrado
e com necessidade de cura. Muitos, ao que parece, sentem-se separados e
10
isolados das outras pessoas e da natureza. Anseio por ligação e harmonia. São
cada vez mais as pessoas, sobre tudo os jovens, que sentem essa necessidade de
entrar em contato com o mistério para além daquilo que se vê, ouve, cheira,
saboreia, toca ou pensa, para além das restrições do materialismo mecanicista.
Alguns sentem, muito simplesmente, fome de espiritualidade como um anseio
por Deus (NOLAN, 2013. p.31).
Creio que a espiritualidade no sentido amplo do termo, como experiência de algo
ou de alguém, uma força interior ou não, que transcende a pessoa.
Todos falam de espiritualidade, e ela é um tema recorrente em nossa cultura, não
só âmbito das religiões, mas também nos das buscas humanas, como aqui nesta seção
iremos tratá-la pelo viéis das juventudes no contexto pós-moderno.
3.1 Espiritualidade Pós-moderna
Creio que o cenário histórico da espiritualidade passou por três grandes fases: a
primeira, a fase das explicações sagradas, mediante as quais a natureza, o homem e a
sociedade eram interpretados sob a ótica religiosa. A segunda fase substitui as
explicações religiosas pelas explicações racionais - dilaceramento do sagrado. É
decretada a morte de Deus. Nela, apenas o argumento racional tem legitimidade. É a
terceira fase é ressacralização da sociedade na pós-modernidade.
Num momento de queda e de troca de paradigma e modelo, após a
humanidade ter acabado de entrar milênio, nota-se na sociedade de hoje uma
compreensão do homem que vai deferindo da concepção moderna,
estritamente regida pela autonomia. O novo sujeito que emerge em meio à
assim chamada Pós-Modernidade revela-se um ser relacional e aberto a uma
autonomia heterônoma, ou seja, uma autonomia regida pela alteridade. Essa
alteridade mostra um rosto transcendente, estranho à concretude racional da Modernidade. [...] (LUCCHETTI, 2013, p. 367).
Na visão de Boff, a espiritualidade pode ser entendida como a experiência de
contato com algo que transcende as realidades cotidianas da vida. Percebo que a
espiritualidade contemporânea ela não se da, mas, em meios institucionais como a
própria religião, mas se da por meios, de vivencias grupais.
Neste momento histórico de grandes mudanças, impactos e descobertas e as
novidade, encontramos uma geração diversificadas, essas por sua vez, se expressam o
seu modo de ser e vivem sua espiritualidade, de modos diferentes daqueles que foram
vistos nas gerações passadas.
11
Creio que também essa espiritualidade pós-moderna é vivenciada pelas redes
sociais, pois neste ambiente os jovens vivem comunitariamente e conectados.
E a redes é uma maneira inovadora e incontrolável de se relacionar. Gostos,
sentimentos, ideias se encontram, entrecuzam-se, criam e recriam mundos
fora do controle institucional, mundos em redes. A utilização dos celulares é
também um fator indicativo da necessidade de o jovem estar sempre
conectado. Uma recente pesquisa realizada por uma empresa da are de
telefones celulares indica que 85% dos jovens apontam o celular como o
dispositivo móvel mais importante da vida. O celular dá a sensação de nunca
estar sozinho, de nunca ser mais um na massa, de ser o único e estar sempre
ligado, “plugado”, conectado à tribo e poder partilha o que deseja. (CF 2013,
n° 90)
Percebe-se que o jovem contemporâneo, sempre sente a necessidade de estar no
grupo qual ele se identifica, seja por meio das redes sociais ou por presença física. Creio
que a espiritualidade pós-moderna, ela se da num contexto onde os novos paradigmas e
requer uma atenção maior. Pois estes paradigmas que hoje são um desafio para uma
vivência de espiritualidade mais eficaz.
3.2 Vivencia da espiritualidade Juvenil Pós-moderna
A espiritualidade não é algo que herdamos no nascimento nem algo que
incorporamos com uma investidura. Mas um determinado modo de ser que construímos.
A juventude é vida que está começando ser, com autonomia – assim como
Deus o fez. Podemos dizer que a juventude é o presente – futuro. A juventude não está feita ela está-se fazendo. Carrega em si a dimensão da criatividade e
de uma criação que não está pronta. Ela é a encarnação da criação
acontecendo na humanidade (DICK, 2009, p. 32-33).
Segundo Dick, “a juventude – mais e diferente de outra idade – busca sua
identidade”. De acordo com alguns autores, hoje, vivemos em uma época que a
sociedade está fragmentada, os valores tidos como bússola para vida de gerações
anteriores já não são vistos, mas como nos séculos passados. O jovem pós-moderno, em
busca de sua identidade, ele frequenta diversos lugares, onde se identifica e vivencia a
sua espiritualidade no grupo.
Os jovens e a Igreja em que vivem são influenciados pelos impactos da
modernidade e da pós-modernidade. Alguns elementos deste momento
histórico exercem grande influência na mentalidade, nos valores e no
comportamento de todas as pessoas. (CNBB 2007, n°14)
12
Não há dúvidas de que cada vez mais os jovens se distanciam mais das
instituições, pois os paradigmas referenciais de gerações anteriores não são mais tidos
como referenciais.
Você acredita em Deus? O instituto de Estudos da Religião (Iser) fez essa
pergunta a 800 brasileiros, com idade entre 15 e 24 anos, e 98% deles
responderam sim. Trata-se de uma maioria acachapante, capaz de desarma
qualquer ceticismo em relação à religiosidade dessa geração. Talvez o correto
seja dizer “espiritualidade” , pois a fé é hoje muito mais uma questão de
escolha pessoal do que era nos tempos do vovô, quando a garotada ia à Igreja
por imposição familiar e social. Os jovens hoje elegem a própria fé. “Como
decisão é deles, a religiosidade dessa geração tende ser muito mais forte que nas décadas passadas”, diz a antropóloga Regina Novaes, do Iser. Entre os
que seguem alguma religião, 33% escolheram por decisão pessoal,
independentemente da preferência familiar. Tanto é assim que dois em cada
dez mudaram de religião ao menos uma vez. (CF 2013, p. 438)
Percebe-se que a vivencia da espiritualidade juvenil pós-moderna, se dar por
meios de sociabilidade e por adesão pessoal a um determinado grupo ou tribos, no
entanto, é um novo paradigma de se vivenciar a espiritualidade na sociedade
contemporânea.
3.3 Espiritualidade como Referência Juvenil
Na sociedade contemporânea, a espiritualidade é um dos referenciais primordiais
para as juventudes, mas vivenciar essa espiritualidade hoje é um desafio, segundo o
documento 85 da Conferência Nacional dos Bispos Brasileiros (CNBB), “a rapidez das
mudanças, os atrativos de diferentes níveis e a agitação do cotidiano desafiam a
vivência de uma verdadeira espiritualidade. Muitos jovens não vivem em um contexto
cristão, numa família cristã, não foram iniciados na fé”.
No Brasil há 125 milhões de pessoas que se declaram católicas, isto é, cerca
de 75% da população brasileira. Conforme o censo de 2000, no país há
53.370.011 jovens entre 18 e 29 anos. Dentre os cinco valores que a
juventude entre 15 e 24 anos considera mais importante para uma sociedade
ideal, o mais mencionado é “o temor de Deus” (ROCCA, 2013, p. 68).
Percebe-se o lugar de Deus na vida do jovem contemporâneo, em consonância
com Rocca, O temor a Deus está entre os valores mais importantes para a vida dos
jovens.
13
Segundo o Documento de Puebla 1979, n°1184.
Os jovens devem sentir que são Igreja, experimentando-a como lugar de
comunhão e participação. Por isso, a Igreja aceita suas críticas, por
reconhecer-se limitada em seus membros, e os quer gradualmente responsáveis na sua construção até que os envie como testemunhas e
missionários, especialmente à grande massa juvenil. Nela, os jovens sentem-
se povo novo, o povo das bem-aventuranças, sem outra segurança que a de
Cristo; um povo dotado de coração de pobre, contemplativo, em atitude de
escutar e discernir evangelicamente, construtor de paz, portador de alegria e
de um projeto libertador integral em favor, sobretudo, de seus irmãos jovens.
[...].
Atualmente os jovens se encontram em vários espaços de agregação e de
sociabilidade, tanto nas cidades como na zona rural. Creio que em meio à experiências
religiosas, surgem também atividades caritativas, de lazer e música, por vez essas
atividades tendem a contribuir para uma vivencia espiritual mais consistente dos jovens.
Estamos convictos de que os adolescentes e os jovens permanecem em
nossos ambientes e contribuem com a missão, se encontram espaços, pessoas
e situações adequadas que os auxiliem em sua busca existencial, no
desenvolvimento de seus dons e na formação religiosa. Com grande alegria
constatamos a presença de uma multidão de jovens convivendo e
participando da vida de nossas comunidades: “em nossas Igrejas há uma
presença significativa de jovens em vários os setores da vida eclesial: nas comunidades eclesiais de base e nas paróquias, participando das equipes de
liturgia e de canto, atuando como catequista, em diversas pastorais”. Apesar
disso, duas realidades nos questionam: aquela parcela considerável de
juventude que resume sua presença eclesial em participar de missas
dominicais e aqueles muitos grupos de jovens que não se identificam com
nenhuma expressão associativa atual, mas permanecem em nossos ambientes.
(CF 2013, n° 82)
Percebe-se que atualmente há grandes participações de jovens em iniciativas
solidárias, que são propostas por diversos meios religiosos, creio que quando bem
preparadas e motivadas essas propostas que atraem diversos jovens, a viver
apaixonadamente as suas convicções de fé pela sua opção de expressão religiosa. O
exemplo disso, a Igreja Católica tem criado e organizado grandes momentos com o Dia
Mundial da Juventude, Jornada Mundial da Juventude e encontros no final de semana.
4. JUVENTUDE
Muitos distinguem entre adolescência e juventude. Os critérios não são
universais e são muitos discutíveis. Aqui não se fará tal distinção. Portanto, aqui neste
capítulo trataremos especificamente a juventude.
14
O conceito de juventude não se limita a períodos etários simplesmente, mas
perpassa o âmbito biológico, social, histórico, cultural e religioso.
Segundo Libanio, (2012. p. 05):
Ao falar de juventude no singular, arriscamos perder-nos em afirmações
vagas. Cabem diversas tipologias, ao distinguirmos classes sociais, faixa
etária, origem familiar, gênero, nível de escolaridade, tradição cultural, étnica
e religiosa, certas condições físicas e socioeconômicas e diversos outros
aspectos importantes. A etimologia das diferentes palavras, que povoam o
mundo jovem, acena-nos para a complexidade.
O fato de delimitar a faixa juvenil traz problemas. Creio que há um certo
consenso em defini-la entre 15 e 29 anos, sabendo, porém, que existem situações que
forçam entrada precoce ou prolongam a saída.
Acredito que toda análise supõem um olhar. Pois varia conforme essa mirada.
Se os jovens descrevessem as próprias tendências, diriam coisas bem diferentes
daquelas que o adulto percebe.
4.1 A juventude já é pós-moderna?
Creio que a juventude pós-moderna surge fragmentada. Já não se define como
agrupamento único. Divide-se em constelações que se desintegram em grupos e
individualidades, cada uma com uma síntese, com inquietações e buscas próprias.
Segundo Libanio, (2012. p.18):
A pós-modernidade desloca o acento para o presente. Os jovens buscam
experimentar o momento. Sugam o mel do favo diante dos olhos. Correm o
risco de parar na fase das experiências sem tomar decisões, sem compromisso
com a vir. O presente torna-se – lhes uma sequência de tenções e emoções
fortes, cuja resposta se dá na simples descarga emocional. Tem dificuldade
de gerir as emoções e de sustentar atitudes permanentes. Rejeitam as
obrigações e qualquer autoridade que se lhes imponham de fora.
Segundo Pe. Alexsander, “Os jovens hoje apresentam-se fortemente marcados
pelo desencanto com o programa de progresso.” Prenunciado pelas luzes da razão, que
terminou por produzir Auschwits, Hiroshima, Nagazaki, Vietnã, o 11 de Setembro, o
massacre da Candelária, Carandiru, a violência nas grandes cidades entre outros...
Desencantaram-se também com uniformizações eclesiásticas que geraram situações de
fechamento para a novidade que o Evangelho proporciona ao se encontrar com as
diversas e plurais realidades culturais.
15
Assistimos a emergência de algo novo na sociedade e na Igreja. A “ordem e o
Progresso” dos estados positivistas ruíram em sociedade que parecem
caóticas. Nada mais há de uniforme em nossa sociedade contemporânea.
Tudo é fluido, é líquido ... Os jovens nem se quer questionam as instituições.
Eles simplesmente as ignoram. De um lado, a escola, os governos, as ONGs e
Igrejas olham perplexas e cheias de preconceitos a apatia dos “menores
deliquentes”. Por outro lado, os jovens subvertem e sorrateiramente
organizam-se em redes, em comunidades virtuais, em tribos urbanas,
independentemente do mundo. E aos poucos vão formando uma multidão organizada no caos (PE. ALEXSANDER, 2014. p. 50).
O sociólogo MAFFESOLI diz que essa é grande marca da contemporaneidade, o
individualismo moderno acabou. E a moda – grande marca das tribos urbanas – é um
testemunho disso. Queremos estar com o outro e nos identificar com ele. Poucos jovens
em nossos dias querem estar totalmente isolados. Todos querem se conectar-se em rede.
MAFFESOLI (2009) diz:
Eu acho que o individualismo acabou. É difícil dizer isso. Significa que a
grande ideia de liberdade não é mais um valor atual. Sempre queremos estar
em contato com o outro, de fazer como o outro. Aí está a viscosidade. (...) Se
tomarmos a ideia da tribo, só existimos pelo e através do olhar do outro. Não
se trata mais de uma questão de liberdade, trata-se de uma dependência.
Todos temos vícios. Pode ser a droga, o álcool, roupas, sexualidade, religião.
Essas coisas são muito viciosas. Desde o momento em que existe a
prevalência da moda, nos tornamos prisioneiros do outro em suas
características. Temos aí uma inversão de polaridade, uma verdadeira
mudança, e não podemos julgar isso com os critérios modernos. Quando vemos um grupo de jovens vestidos, se comportando e falando da mesma
maneira, podemos dizer que são fashion victims, mas também que se trata de
um laço comunitário. É uma questão de laços. Estamos ligados.
Roqueiros, Hippies, Punk, Gótico, Manos/Rapper etc. estas são algumas das
expressões da configuração em tribos do meio juvenil pós-moderno. Para Pe.
ALEXSANDER “as rede de relacionamento virtual criaram as “comunidade” – que se
organizam conforme interesses em assuntos comuns aos membros. É interessante o uso
da palavra “comunidade” para definir esse ponto virtual de encontro”. Mesmo na
fluidez dos relacionamentos, os jovens encontram meios de se associar e se organizar,
às margens das instituições oficiais.
Creio que a juventude pós-moderna constitui-se em um momento determinado,
mas não se reduz a uma passagem para a fase adulta. Nela o indivíduo vai se
descobrindo, descortinando as possibilidades em todas as instâncias da vida social,
16
desde a afetiva até a profissional. Buscar perceber como os jovens constroem o seu
próprio modo de ser é um passo para compreender suas experiências, necessidades e
expectativas. Vejo que as identidades juvenis se constituem em espaços-tempos de
sociabilidades e práticas coletivas, colocam em jogo interesses comuns que dão sentido
ao “estar junto” e ao “ser parte” dos grupos também constitui o “nós” que se diferencia
dos “outros”. Não podemos tomar nossa própria experiência para estabelecer quadros
comparativos com “os jovens de hoje”. São os que vivem a juventude hoje que sabem e
sentem o que é ser jovem. O jovem hoje tem acesso a várias tecnologias digitais como a
internet através de computadores, celulares ou tablets que é bem mais comum. As redes
sociais viraram como uma “pandemia” entre os jovens. As tecnologias digitais são, pois,
um elemento importante na construção da cultura juvenil. Os jovens de hoje são
“nativos digitais”. Os jovens pós-moderno, são desafiados a fazer uso seguro e crítico
das novas tecnologias na perspectiva de dominar os instrumentos do conhecimento e
não ser dominados por elas.
Já vivemos em clima de pós-modernidade. De acordo com Libanio, “cabe pensar
as características desse jovem e pensar uma proposta pastoral para ele. Há um jovem
que une a sensação de triunfo da modernidade avançada e o desejo de fruição da vida”.
O jovem pós-moderno vê o mundo como um gigantesco vídeo game colorido.
4.2 Panorama das juventudes no Brasil
A juventude é um tema cada vez mais presente em nossa sociedade
contemporânea, tanto nos espaços religiosos, acadêmicos de discussões e investigação
como nas agendas para o desenvolvimento de políticas públicas.
Segundo o DOCUMENTO 85 da CNBB: (2007, n° 29):
[...]. A juventude brasileira é marcada por uma extrema diversidade e
manifestada as diferenças e as desigualdades sociais que caracterizam nossa
sociedade. Trata-se de um contingente populacional bastante significativo,
em idade produtiva, que se constitui em uma importante força a ser
mobilizada no processo de desenvolvimento de nosso país.
De acordo com documento 85 da CNB, “para caracterizar a juventude, as
estatísticas brasileiras geralmente seguem os parâmetros de organismo internacionais,
considerando o grupo etário de 15 a 24 anos.”
Segundo a socióloga Solange dos Santos Rodrigues: (2011, p. 72)
17
A juventude representa 26% da população brasileira atual, um contingente de
mais de 50 milhões de pessoas, com demandas especificas e potencialidades.
As relações que os jovens estabelecem com a sociedade mais ampla são
marcadas por uma déiasneia: ao mesmo tempo em que a juventude se torna
um valor na sociedade de mercado (ideal desejado de vitalidade, beleza,
alegria, explorado pela propaganda), ela condensa medos sociais, na medida
em que é associada a problemas derivados do envolvimento com a violência,
drogadição, e outros comportamentos que colocam em risco sua integridade
física e saúde. Por outro lado, existem muitas dificuldades de inserção social
para agrandes parcelas da juventude, que têm limitadas as suas possibilidades
de acesso a educação e postos de trabalhos de qualidade, à formação profissional à fruição cultural, ao lazer, à participação. [..].
Creio que as condições de vida oferecida aos jovens são desiguais. Situações
socioeconômicas, como a renda e o nível de desenvolvimento do local onde vivem,
práticas discriminatórias e preconceitos ainda vigentes tem marcado a vida de milhões
de jovens.
Com base na renda de Salário Mínimo (SM) per capta das famílias a que os
jovens pertencem, temos estes dados: 30,6% estão em famílias de até SM,,
15,7%, naquelas com SM superior a dois, e 53,7% às de renda entre meio e
dois SMs. Os jovens pobres são em sua maioria não são brancos (70,9%,
enquanto os jovens brancos são 53,9% dos não pobres – embora a distribuição dos jovens brasileiros entre os grupos, brancos e não brancos,
seja de 47,1% e 52,9% respectivamente. (CF, 2013, n°96)
A população juvenil está concentrada nas áreas urbanas. A maior parte vive em
cidades pequenas e médias, e um terço em áreas metropolitana. As condições de vida
são muito diferentes nestes contextos, e diferente bastante do meio rural.
Os jovens estão maciçamente presentes no meio urbano,representam 84,35%
do total, restando apenas 15,2% no campo. Os jovens urbanos, notadamente
nas periferias, convivem com rotinas de altas taxas de desemprego e de
violência, crescente segregação espacial e qualidade de vida deteriorada.
Cerca de 48,7% dos jovens urbanos vivem em moradias inadequadas
fisicamente, dois milhões de jovens entre 15 e 29 anos vivem em famílias que
recebem até meio SM per capta. (CF, 2013,n°97)
Dentro deste panorama juvenil, é assustador o número de adolescentes e jovens
fora das escolas.
No Brasil, é assustador o número de adolescentes e jovens que permanecem
fora da escola. Agrava o problema educacional a desproporção idade/serie
nesta faixa etária: menos da metade dos alunos entre 14 e 17 anos, está no
ensino médio. Com relação às universidades, há também em nosso país o problema da histórica desigualdade do acesso, pois o ensino superior, com
raras exceções, é destinado aos jovens das classes mais abastadas, o que está
18
sendo amenizado por meio de programas governamentais e pela instituição
de cotas. A taxa de jovens negros analfabetos, entre 15 e 29 anos, é quase
duas vezes maior que a de jovens brancos. No ensino médio, entre 15 e 17
anos, os brancos têm uma frequência de 58,7%, contra 39,3% dos negros; no
ensino superior, na faixa estaria de 18 a 24 anos, a taxa dos brancos é de
19,8%, enquanto a dos negros é de 6,9%. Os jovens negros são os que mais
aparecem entre aqueles que não estudam. (CF, 20013, n°98)
Consta também neste panorama, que “a educação e o trabalho estão no centro
dos interesses da juventude e são elementos fundamentais no seu processo de
construção de autonomia e independência”(SOLANGE, 2011, p. 73-74).
A inserção no mundo do trabalho é outro desafio para a juventude nestes
tempos de transformação nas formas de produção econômica, na gestão de
mão – de – obra de políticas macroeconômicas neoliberais que restringe a
criação de postos de trabalho, em especial para jovens sem experiência laboral anterior ou para quem vive condições especiais, como portadores de
deficiência ou de HIV. Isso faz com que um contingente expressivo de jovens
se veja submetido à situação de desemprego e de emprego precário, ou
procure oportunidades em outras cidades ou regiões, justamente em uma
etapa do ciclo de vida em que aumentam as pressões por consumo e se
acelera a busca por autonomia em relação à família.[..]. (SOLANGE, 2011, p.
75-76)
Conforme Solange, “a incerteza em relação ao ingresso e permanência no
mundo do trabalho tem sido apontada como uma das marcas geracionais da juventude
brasileira neste inicio de século, [..]”.
vejo que outra marca assinalada é a convivência com violência. Os índices são
alarmantes.
A violência tem afetado jovens em nosso país em índices alarmantes, semelhantes ou superiores ou encontrados em países que se encontram em
guerra. Entre 2003 e 2005 foram registrado cerca de 60 mil óbitos de homens
jovens por ano, a grande maioria (78%) devidos a homicídios e acidentes de
transporte. Trata-se de uma violência que atinge de maneira particular jovens
do sexo masculino e negro. Uma parte significativa dessas mortes está
relacionada à disputa por território entre facções para o tráfico de substâncias
psicoativas, com o uso de armamento pesado, e aos confrontos de jovens
enredados neste comércio com as forças policiais. Esta é uma realidade
presente no cotidiano de muitas cidades brasileiras de diferentes portes.
(SOLANGE,2011,p. 77)
Somos desafiados e provocados a refletir essas questões que afetam de maneira
devastadora, grande parte da sociedade brasileira, em especial as juventudes, que se
sente vulneráveis diante da estrutura social de desigualdade e exclusão, geradora de
violência contra as pessoas.
19
4.3 Juventude Pós-moderna Diante do Religioso
Ao meu redor/ Procuro entender/ O que virá/ bem longe eu vou esta/ diante
de Ti/ Eu entreguei os meus caminhos/ Pra Te sentir/ E nunca mais chorar
sozinho/ Mas cansado estou/ e fraco a esperar/ que Tua doce voz venha o meu sono despertar/ Manda teu espírito e vem me abraçar/ Pra eu não chorar/
preciso de Te aqui/ Pra m consolar (...)/ Só você faz o mar se acalmar/ E traz
paz iluminando o meu olhar/ Sabes ouvir as dores do silêncio/ E persistir em
esquecer os meus lamentos/ Sei que em você/ Encontro meu alento/ Estendo
as minhas mãos/Entrego os meus sentimentos. (FARO, 2007, faixa 12)
A banda católica “Rosa de Saron”, autora do trecho da canção citada a cima, foi
formada em Campinas no ano de 1988 e tem conquistado grande sucesso nos últimos
anos no meio juvenil, principalmente no meio católico. Suas canções são executadas
não apenas em meios religiosos, mas em outros meios midiáticos.
As letras das canções dessa banda, bem como de outras muito ouvidas pelos
jovens, são profundamente marcadas pelas expressões de sentimentos de angústias e
frustração diante da sociedade atual. O refúgio seguro não é mais a instituição religiosa,
mas a experiência pessoal com Deus, o único que se pode confiar, conforme a letra da
canção citada acima.
Os tempos atuais são profundamente marcados pela fluidez e pela
fragmentação. As relações interpessoais tendem a ser horizontais e abertas. É
cada vez mais difícil encontrar uniformidade nas nossas instituições, que se
fragmentam em pequenos grupos que se instituem por gosto semelhantes e
ideias parecidas. (CFC, 2013, n° 71)
Alguns anos percebe-se o afastamento paulatino das estruturas eclesiais adultas
do meio juvenil Católico. Em 2007, a CNBB chegou afirma:
Chama atenção a ausência de padres que abracem um trabalho de
acompanhamento sistemático dos jovens. Os religiosos e leigos também estão
distantes [...] Há, no entanto, necessidade de resgatar no coração de todos a
paixão pela juventude. (CNBB 85, 2007, n° 205).
Os jovens, mais do quaisquer outros grupos de nossa sociedade, expressam seu
modo de ser. Não mais se rebelam em massas contra grandes estruturas de poder, mas
se organizam em pequenos grupos, distintos pelas suas relações sociais, econômicas,
midiáticas, culturais.
Atualmente, contudo, os jovens consideram a Igreja de diversas maneiras:
uns a amam espontaneamente como ela é, sacramento de Cristo; outros a
questionam para que seja autêntica; e não faltam os que procuram um Cristo
vivo separado do seu corpo que é a Igreja. Há uma massa indiferente,
passivamente acomodada à civilização de consumo ou outros sucedâneos,
desinteressada da exigência evangélica. (PUEBLA, 1979, n° 1179)
20
Em busca de uma aproximação mais eficaz com a juventude, a Conferência
Nacional dos Bispos Brasileiros (CNBB) em 2007, publica mais um documento
intitulado de: “Evangelização da Juventude: desafios e perspectivas pastorais”, neste
mesmo documento afirmam que:
A busca de unidade de nossas forças eclesiais em vista de um trabalho mais
eficiente encontra neste documento as suas linhas gerais e motivações. A
diversidade de carismas, espiritualidade e pedagogia de trabalho juvenil é
para nós uma riqueza na Igreja de Jesus Cristo. Quanto mais estivermos
convencidos do valor da “unidade na diversidade” mais os nossos jovens se
beneficiarão, as nossas comunidades se fortalecerão e a nossa sociedade
sentirá a força positiva de uma juventude convicta e entusiasmada pelos
verdadeiros valores pregados por Jesus Cristo. (CNBB, 2007, p.6).
Percebo que os jovens atuais estão causando brechas nas instituições eclesiais de
qual fazem parte, criando e recriando suas formas de ser Igreja, E, indiretamente, e por
vez diretamente, pedem acolhida. Portanto, os jovens contemporâneos querem ser Igreja
sem deixar de ser quem são.
5. Considerações finais
Verificou-se no decorrer deste estudo, diante da realidade complexa e
desafiadora da juventude, a espiritualidade é a uma das motivações centrais e a bússola
para orientar a vida do jovem contemporâneo.
Neste estudo também, buscou-se contextualizar a juventude na pós-
modernidade, como mudança de época. Percebe-se que o contexto onde as juventudes
transitam, surgem fragmentadas, os valores tidos como fundamentais as gerações
anteriores, já nessa geração atual esses mesmo valores perdem suas forças de
orientação.
Conforme Dick, quando falamos que o jovem é o “sacramento da novidade não
afirmamos, simplesmente uma frase de efeito”. Alguém que estar na faixa etária
considerada “jovem” significa mais do que viver um estado biológico.
Perceber a juventude como um sacramento que anuncia novidades. É perceber o
novo alvorecer juvenil que se configura em nossa sociedade, que sempre estar presente
e sempre busca uma ligação com o transcendente, isto é, buscar vivenciar uma
espiritualidade eficaz e que gere sentido a sua vida.
21
A idade juvenil fascina pelo tremendo paradoxo da vulnerabilidade e da
potencialidade. Na fragilidade da idade que deixa para trás a serenidade e a segurança
da infância, mas ainda não atingiu a solidez da idade adulta, existe estupenda
potencialidade. Precisamente porque ainda não aterrissou na maturidade, dispõe do
infinito do céu para voar.
A espiritualidade como um horizonte na pós-modernidade, é um processo de
reconfiguração de um novo viver de uma nova forma de expressar seus sentimentos
com o transcendente, portanto, cabe a nós teólogos de acolher esse novo alvorecer
juvenil, como diz Sandrini, 2009, p.15: “um jovem excluído é um profeta que grita, não
com palavras, mas com a sua vida, que Deus é o contrário da injustiça (ética), da
exploração (economia), da opressão (política) e do pecado (teologia). Ele fala sem falar
e grita sem gritar. Ele é a linguagem”.
RESÚMEN
Este estudio trata de la dinámica de las juventudes a partir del concepto de espiritualidad y
posmodernidad.. Para tanto, se elaboró un referencial teórico que presenta la espiritualidad juvenil como
un horizonte en la posmodernidad, tendo como hilo conductor de la espiritualidad juvenil las ideas de
João Batista Libanio, Leonardo Boff, Jean-François Lyotard y otros. El objectivo es reconocer la
espiritualidad juvenil como eco y horizonte de los cambios de epoca para la contemporánea. En la
primera parte se elabora un concepto de posmodernidad y la espiritualidad. Luego, se desarolla el
concepto de juventud, y se concluye que la espiritualidad es un de los elementos centrales en la vida de
los jóvenes contemporáneos.
Palabras-llave: Espiritualidad, Juventude, Posmodernidad.
REFERÊNCIAS:
ANDERSON, Perry. As origens da pós-modernidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,
1999. BALBINOT, Rodinei. Educação e evangelização: pastoral escolar e escola em
pastoral. Informativa educacional- Revista ANEC n° 28 p. 42, 44. Junho 2014.
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Rio de Janeiro: Zahar [Trad. de
Marcus Penchel]
________. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.
________. Globalização as cosequências humanas. Rio de Janeiro: Zahar [Trad. de
Marcus Penchel, 1999].
22
BETTO, Frei. Fome de Deus: fé e espiritualidade no mundo atual. São Paulo:
Paralela, 2013.
BOFF, Leonardo. Tempo de transcendência: o ser humano como um projeto
infinito. Rio de Janeiro: Sextante, 2000.
______. Espiritualidade: um caminho de transformação. Rio de Janeiro: Sextante,
2001.
III CELAM. Puebla: A evangelização no presente e no futuro da América Latina. 7 ed.
Petrópolis, RJ: Vozes, 1987.
COELHO, Teixeira. Moderno pós-moderno: modos e versões. São Paulo: Iluminuras,
2005.
CNBB. Campanha da fraternidade 2013: Manual. Brasília, Edições CNBB. 2012.
______. Evangelização da Juventude: Desafios pastorais e perspectivas pastorais. São
Paulo: Paulinas. 2007.
______. Documento de Aparecida: Texto conclusivo da V Conferência Geral do
Episcopado Latino-Americano e do Caribe. São Paulo, Paulus, 2008. DALAI-LAMA. Uma ética para o Novo Milénio. Rio de Janeiro: Sextante, 2000.
DICK, Hilário. O divino no jovem: elementos teologais para a evangelização da
cultura juvenil. Porto Alegre: Instituto de Pastora de Juventude: Rede Brasileira de
Centros e Institutos de Juventude, 2004.
ESPERANDIO, Mary Rute Gomes. Para entender pós-modernidade. São Leopoldo:
Sinodal, 2007.
ESTATUTO DA JUVENTUDE. Disponivel em
http://juventude.gov.br/estatuto#.VkJiwtKrRMQ > Acesado em 10 de outubro 2015 .
FARO, E. Muitos Choram [Rosa de Saron]: CD // Muitos Choram. São Paulo:
Codimuc, 2007.
FEATHERSTONE, Mike. Cultura de consumo e pós-modernismo. São Paulo: Studio
Nobel, 1995.
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DPA&A,
2001.
HARVEY, David. Condição Pós-moderna. Edições Loyola, São Paulo, 1993. [Trad.
Adail Ubirajara Sobral e Maria Estela Gonçalves].
IPEA. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Pesquisa de opinião púbilca;
Agenda juventude Brasil 2013. Disponível em:
http://www.ipea.gov.br/participacao/images/pdfs/participacao/pesquisa%20perfil%20da
%20juventude%20snj.pdf > Acesso em 10 de novembro de 2015.
LIBANIO, João B. A religião no início do milênio. São Paulo: Edições Loyola, 2002.
________. Jovens em tempo de pós-modernidade considerações pastorais. São
Paulo: Edições Loyola, 2004.
________. Para onde vai a juventude?. São Paulo: Edições Paulus, 2012.
LYOTARD, Jean-François. A condição pós-moderna. Lisboa: Edições Gradiva, 1989.
MAFFESOLI, M. “Maffesoli e a feminização do mundo” [Entrevista em 27/06/2009]:
Disponível em < http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticia/2009/06/maffesoli-e-a-feminizacao-
do-mundo-2559403.html> . Acessado em 20 de outubro de 2015.
NOLAN, Albert. Jesus hoje: Uma espiritualidade de liberdade radical. São Paulo:
Paulinas, 2013.
SANDRINI, Marcos. Religiosidade e educação no contexto da pós-modernidade.
Petrópolis: Vozes, 2009.
23
PONTES, Pedro. Linguagem dos videoclipes e as questões do indivíduo na
pósmodernidade. In: Sessões do imaginário, n. 10. 2003. p. 47-51.
ROCCA, María Susana. Resiliência, Espiritualidade e Juventude. São Leopoldo:
Sinodal/EST, 2013.
TRANSFERRETI, José e GONÇALVES, L. S. Paulo. Teologia na Pós-Modernidade:
Abordagens epistemológica. Sistemática e teórico – prática. São Paulo: Paulinas 2003.