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1 A DEGRADAÇÃO DO MEIO AMBIENTE LABORAL E A CONSEQUENTE REPARAÇÃO CIVIL MOTIVADA PELA DOENÇA OCUPACIONAL VANESSA KANIAK 1 Resumo: O intuito do presente trabalho foi suscitar discussões alusivas ao direito do trabalhador no meio ambiente de trabalho, assim como as sanções ao empregador no caso do descumprimento das normas de segurança e medicina do trabalho. Para tanto, foi analisado as repercussões no âmbito da responsabilidade civil, em sua forma legislativa, doutrinária e por fim jurisprudencial. 1. Introdução A degradação do meio ambiente laboral é um fato muito discutido e que gera inúmeras repercussões, pois vincula a saúde e o bem estar do ser humano como direito fundamental. O presente trabalho objetiva demonstrar as causas e os efeitos que trazem um ambiente de trabalho inadequado e fora dos parâmetros dignos e legais. Para encetar esse exame, primeiramente será estudado o meio ambiente do trabalho e o seu reflexo na saúde do trabalhador, demonstrando o que caracteriza o local de trabalho e sua influência direta no bem estar do obreiro que ocupa parte significativa de seu tempo exercendo atividades laborais em troca de uma contra- prestação pecuniária, essencial passa a composição de uma base financeira familiar. Nessa perspectiva, indaga-se o desenvolvimento de doenças ocupacionais quando da inobservância do empregador de um ambiente de trabalho sadio e próspero. 1 Advogada autônoma inscrita na Ordem dos advogados do Brasil de nº 50.584, Seção do Paraná, atuante na área Trabalhista e Cível, especialista em Direito e Processo do Trabalho pela UNIDERP, pós-graduanda em Direito Aplicado pela Escola da Magistratura do Paraná, conciliadora no Juizado Especial Cível, graduada pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná – Campus Curitiba. Endereço eletrônico: [email protected].

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A DEGRADAÇÃO DO MEIO AMBIENTE LABORAL E A CONSEQUENTE

REPARAÇÃO CIVIL MOTIVADA PELA DOENÇA OCUPACIONAL

VANESSA KANIAK1

Resumo: O intuito do presente trabalho foi suscitar discussões alusivas ao direito do trabalhador no meio ambiente de trabalho, assim como as sanções ao empregador no caso do descumprimento das normas de segurança e medicina do trabalho. Para tanto, foi analisado as repercussões no âmbito da responsabilidade civil, em sua forma legislativa, doutrinária e por fim jurisprudencial.

1. Introdução

A degradação do meio ambiente laboral é um fato muito discutido e que gera

inúmeras repercussões, pois vincula a saúde e o bem estar do ser humano como direito

fundamental.

O presente trabalho objetiva demonstrar as causas e os efeitos que trazem um

ambiente de trabalho inadequado e fora dos parâmetros dignos e legais.

Para encetar esse exame, primeiramente será estudado o meio ambiente do

trabalho e o seu reflexo na saúde do trabalhador, demonstrando o que caracteriza o

local de trabalho e sua influência direta no bem estar do obreiro que ocupa parte

significativa de seu tempo exercendo atividades laborais em troca de uma contra-

prestação pecuniária, essencial passa a composição de uma base financeira familiar.

Nessa perspectiva, indaga-se o desenvolvimento de doenças ocupacionais

quando da inobservância do empregador de um ambiente de trabalho sadio e próspero.

1 Advogada autônoma inscrita na Ordem dos advogados do Brasil de nº 50.584, Seção do Paraná, atuante na área Trabalhista e Cível, especialista em Direito e Processo do Trabalho pela UNIDERP, pós-graduanda em Direito Aplicado pela Escola da Magistratura do Paraná, conciliadora no Juizado Especial Cível, graduada pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná – Campus Curitiba. Endereço eletrônico: [email protected].

2

É legítimo verificar, nesse enfoque, a conseqüência que um meio ambiente do

trabalho desonroso e imoral traz à qualidade de vida do ser humano e o que a

legislação estabelece como forma de compensação.

Para concluir essa exposição, haverá um estudo da responsabilidade civil no

âmbito trabalhista motivada pela doença ocupacional, examinando o tema em termos

de conceituação jurídica, legislação constitutiva e entendimento da Corte Superior.

2. O meio ambiente de trabalho e seu reflexo na saúde do trabalhador

Chamamos de meio ambiente do trabalho como sendo o local em que os

trabalhadores desempenham suas funções ou atividades laborais para o empregador.

Podemos, ainda, conceituar meio ambiente do trabalho como "o conjunto de

fatores físicos, climáticos ou qualquer outro que interligados, ou não, estão presentes e

envolvem o local de trabalho da pessoa"2.

Nas palavras de Sidnei Machado3, meio ambiente do trabalho é “o conjunto

das condições internas do local de trabalho e sua relação com a saúde dos

trabalhadores”.

O meio ambiente de trabalho é formado pelo conjunto de máquina-trabalho;

de edificações, do estabelecimento, de equipamentos de proteção individual,

iluminação, conforto térmico, instalações elétricas, condições de salubridade ou

insalubridade, de periculosidade ou não, meios de prevenção à fadiga e outras medidas

de proteção ao trabalhador, de jornadas de trabalho e horas extras, intervalos,

descansos, férias, movimentação, armazenagem e manuseio de materiais dentre

outros.4

2 SANTOS, Antonio Silveira R. dos. Meio Ambiente do Trabalho: considerações. Jus Navigandi, Teresina, ano 4, n. 45, set. 2000. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1202>. Acesso em: 24 ago. 2010. 3 MACHADO, Sidnei. O direito à proteção ao meio ambiente de trabalho no Brasil. São Paulo: LTr, 2001, p. 66-67. 4 NASCIMENTO, Amauri Mascaro do. A defesa processual do meio ambiente do trabalho. Revista LTr, 63/584.

3

Júlio Cesar de Sá da Rocha5 entende que o meio ambiente do trabalho

caracteriza-se como a ambiência na qual se desenvolvem as atividades do trabalho

humano.

Rodolfo de Camargo Mancuso ensina que “o meio ambiente do trabalho

conceitua-se ‘habitat’ laboral, isto é, tudo que envolve e condiciona, direta e

indiretamente, o local onde o homem obtém os meios para prover o quanto necessário

para a sua sobrevivência e desenvolvimento, em equilíbrio com o ecossistema”.6

O meio ambiente de trabalho condiciona o seu exercício no conceito amplo de

meio ambiente, o que significa que deve ser analisado como um bem a ser protegido

com o objetivo de preservar a saúde do trabalhador, proporcionando ao mesmo uma

melhor qualidade de trabalho e consequentemente de vida.

A Constituição Federal do Brasil através do Capítulo de Direitos Sociais em

seu art. 6º, garante o direito a saúde a todos os indivíduos, o que significa que o Estado

tem o dever de proteger tal direito. Nesse ponto, frisa-se que sendo um direito

reconhecido constitucionalmente, este se consolida como um direito fundamental.

É certo que o meio ambiente de trabalho é onde o trabalhador passa parte de

seu dia e onde ocorre o desenvolvimento intelectual ou físico de cada sujeito,

dependendo da atividade exercida. A partir dessa indagação, faz-se necessário

disponibilizar segurança ao indivíduo e adequar o local de trabalho a um ambiente

saudável e salubre.

O Direito, nessa perspectiva, determina as condições mínimas a serem

observadas pelo empregador sob pena de sanções no caso de seu descumprimento,

conforme segmento determinado como segurança e medicina do trabalho.

A segurança e medicina do trabalho é o segmento do direito do Trabalho

incumbido de oferecer condições de proteção à saúde do obreiro no local de trabalho, e

a recuperação do mesmo quando não estiver em condições de prestar serviços ao

empregador.7

Nas palavras de Amauri Mascaro do Nascimento: 5 ROCHA, Júlio César de Sá da. A defesa processual do meio ambiente do trabalho: dano, prevenção e proteção jurídica. São Paulo, Ed. LTr, 2002, p. 30. 6 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Ação civil pública trabalhista. 5 ed., São Paulo, Ed. RT, 2002, p. 59. 7 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. Ed. 25. São Paulo: Atlas, 2009, p. 631.

4

a segurança do trabalho é o conjunto de medidas que versam sobre condições específicas de instalação do estabelecimento e de suas máquinas, visando à garantia do trabalhador contra a natural exposição aos riscos inerentes à prática da atividade profissional.8

É insofismável que esta proteção ao trabalhador é inerente a garantir direitos

mínimos de saúde ao trabalhador e desta forma, não admitem desregulamentação, ou

seja, são direitos indisponíveis.

Nesse prisma, entende Maurício Delgado que:

Tais parcelas são aquelas imantadas por uma tutela de interesse público, por se constituírem em um patamar civilizatório mínimo que a sociedade democrática não concebe ver reduzido em qualquer segmento econômico-profissional, sob pena de se afrontarem a própria dignidade da pessoa humana e a valorização mínima deferível ao trabalho (arts. 1º, III e 170, "caput", CF). Expressam, ilustrativamente, essas parcelas de indisponibilidade absoluta a anotação de CTPS, o pagamento do salário mínimo, as normas de medicina e segurança no trabalho.9

Indeclinável é a existência de uma ampla proteção jurídica sobre o tema

exposto, a encetar na perspectiva do Direito Constitucional Pátrio em seu artigo 7º,

inciso XXII, que estabelece: “são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais (...), a

redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e

segurança.”

Na esfera da Consolidação das Leis do Trabalho, verifica-se que esta

reconhece a segurança e saúde do trabalhador em seu art. 154 e seguintes. O citado

artigo determina a extensão das obrigações para além da consolidação das leis do

trabalho, tornando obrigatório o cumprimento do estabelecido nas demais disposições,

como as incluídas em códigos de obras ou regulamentos sanitários dos Estados ou

Municípios, bem como daquelas oriundas de convenções coletivas de trabalho.

Nos influxos da lei, o Programa de Controle Médico e de Saúde Ocupacional e

o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais, são obrigatórios nas empresas que

também instituem as Comissões Internas de Prevenção de Acidentes, conforme

8 NASCIMENTO, Amauri Mascaro do. Iniciação ao Direito do Trabalho. 34. Ed. LTr: São Paulo, 2009.p.119. 9 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2002. p 899

5

disciplina o art. 163 da Convenção Coletiva de Trabalho, lembrando que o objetivo é a

preservação da qualidade ambiental do local de trabalho.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) tem uma atuação proveitosa

no que se refere a segurança no trabalho, por meio das Convenções e Recomendações

sobre prevenção de acidentes (1937), segurança da máquinas (1929), pesos e fardos

transportados por barco (1929), fiscalização trabalhista (1937), edificações (1937),

acidentes de trabalho (1929), radiações (1960), assistência médica (1944), higiene no

comércio e oficinas (1959), enfermidades profissionais (1952), fósforo branco (1919),

saturnismo (1919).10

Também há o amparo na Portaria do Ministério do Trabalho de n. 3.214 do

ano de 197811

, que Aprova as Normas Regulamentadoras do Capítulo V, Título II,

da Consolidação das Leis do Trabalho, relativas à Segurança e Medicina do

Trabalho, também da Portaria n. 598 de 200412

e na Lei Orgânica da Saúde de n.

8.080/9013

que Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação

da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes.

O artigo 2º da citada Lei Orgânica da Saúde define que a saúde é um direito

fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao

seu pleno exercício.

Nessa extensão, o artigo 3º da Lei 8080 de 1990 estabelece que:

a saúde tem como fatores determinantes e condicionantes, entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços

10 NASCIMENTO, Amauri Mascaro do. Iniciação ao Direito do Trabalho. 34. Ed. LTr: São Paulo, 2009.p.119. 11 BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Portaria n. 3214 de 8 de junho de 1978. Aprova as Normas Regulamentadoras - NR - do Capítulo V, Título II, da Consolidação das Leis do Trabalho, relativas a Segurança e Medicina do Trabalho. Diário Oficial da União, 06 jul. 1978. Disponível em: http://www.mte.gov.br/legislacao/portarias/1978/p_19780608_3214.pdf>. Acesso em: 06 dez. 2010. 12 BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Portaria n. 598 de 07 de dezembro de 2004. Altera a Norma Regulamentadora n.º 10 que trata de Instalações e Serviços em Eletricidade, aprovada pela Portaria n.º 3.214, de 1978, que passa a vigorar na forma do disposto no Anexo a esta Portaria. Diário Oficial da União, Brasília. p. 74- 77. Seção 1, 28 dez. 2004. Disponível em: < http://www.mte.gov.br/legislacao/portarias/2004/p_20041207_598.pdf>. Acesso em: 06 dez. 2010. 13 BRASIL. Lei n. 8.080 de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Diário Oficial da União, 20 set. 1990. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8080.htm>. Acesso em: 06 dez. 2010.

6

essenciais; os níveis de saúde da população expressam a organização social e econômica do País.

Na seqüência o parágrafo único do citado artigo amplifica os fatores

determinantes da saúde dispondo que “Dizem respeito também à saúde as ações que,

por força do disposto no artigo anterior, se destinam a garantir às pessoas e à

coletividade condições de bem-estar físico, mental e social.”

Ainda sob a proteção da Lei Orgânica de Saúde, o art. 6º inclui no campo de

atuação do Sistema Único de Saúde a execução de ações de saúde do trabalhador e a

colaboração na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho e ainda,

especifica no parágrafo terceiro que fica entendido como saúde do trabalhador o

conjunto de atividades que se destina à promoção e proteção da saúde dos

trabalhadores, e à recuperação e reabilitação da saúde dos trabalhadores submetidos

aos riscos e agravos advindos das condições de trabalho, e abrange em seus incisos o

conjunto de atividades a que se destinam.

Assentadas as noções supra, podemos entender que a qualidade de vida do

trabalhador está vinculada ao ambiente de trabalho em que o mesmo executa suas

atividades diárias. Claramente que as condições do meio ambiente de trabalho refletem

diretamente na vida do empregado, estabelecendo parâmetros na saúde de cada um.

Um local com instalações pré aprovadas antes do início de suas atividades e

procedendo o responsável pela inspeção sempre que houver alteração de

equipamentos, certamente trará condições legais de um ambiente de trabalho sadio

para os funcionários.

Por certo que nos locais em que o ambiente perigoso e insalubre se faz

indispensável, como no caso de manuseamento de máquinas para tecelagem, trabalho

de fundição em geral ou também no caso de exposição a radiações ionizantes, o

empregador não poderá disponibilizar um ambiente sadio ao empregado, mas deverá

oferecer equipamento de proteção individual que ofereçam completa proteção a

acidentes e danos à saúde do trabalhador, conforme estabelece o art. 166 e seguintes da

CLT.

7

Salienta-se que o Delegado Regional do Trabalho poderá interditar o local

caso este demonstre iminente risco à saúde do empregado em virtude do

descumprimento das normas gerais de segurança ao trabalhador.

Nesse enfoque, medidas ligadas à medicina do trabalho, estabelecidas no art.

168 da CLT, obrigam o empregador a realizar exames médicos na admissão do

empregado como medida preventiva e também exames periódicos, visando garantir

um controle de saúde do subordinado.

Por oportuno que há diversos amparos legais para garantir a saúde do

trabalhador, pois o local de trabalho reflete no bem estar da vida dos empregados e

desta forma, a segurança e medicina do trabalho garantem o direito fundamental de

dignidade a pessoa humana.

Ora, é sabido que os direitos fundamentais possuem um inegável conteúdo

ético, pois, são valores básicos para uma vida digna em sociedade.

Chimenti entende que: “A dignidade da pessoa humana é uma referência

constitucional unificadora dos direitos fundamentais inerentes à espécie humana, ou

seja, daqueles direitos que visam garantir o conforto existencial das pessoas”. 14

Na perspectiva do Direito Constitucional pátrio, o artigo 1º, inciso III,

constitui como fundamento do Estado Democrático de Direito a dignidade da pessoa

humana e nesse prisma, todo ser humano tem direito a uma vida digna, e o meio

ambiente do trabalho deve tê-lo como parte integrante de sua plataforma.

Assentadas as noções supra, e mediante Carta Carta Magna em seu art. 225

resta claro a necessidade dos indivíduos em gozarem de uma saudável qualidade de

vida no meio ambiente com condições seguras de trabalho.

3. O Desenvolvimento das Doenças Ocupacionais Ocasionadas pela Degradação

do Meio Ambiente de Trabalho

Para encetar este exame, é legítimo indagar o significado de doença

ocupacional e o que a diferencia de acidente de trabalho.

14 CHIMENTI, Ricardo C. et al. Curso de Direito Constitucional. ed. 2. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 33.

8

A doença ocupacional engloba a doença profissional15 e a doença do trabalho16

e sua causa decorre de fatores relacionados ao ambiente de trabalho.

Ocorre em virtude da atividade desempenhada pelo trabalhador e se manifesta

internamente com o distúrbio das funções de um órgão ou do organismo. Geralmente

se desenvolve devido à exposição do indivíduo a agentes nocivos, definidos como

físicos, químicos ou biológicos ou também com o uso inadequado de determinado

equipamento.

Alice Monteiro de Barros esclarece que “em geral, as condições em que se

realiza o trabalho não são adaptadas à capacidade física e mental do empregado”.17

Observa-se que a doença ocupacional também engloba as doenças pré-

existentes quando as condições inadequadas de trabalho possibilitem o agravamento de

uma determinada doença e nesse ponto, pode-se entender que “as condições

excepcionais ou especiais do trabalho determinam a quebra da resistência orgânica

com a conseqüente eclosão ou a exacerbação do quadro mórbido, e até mesmo seu

agravamento”.18

No que concerne a acidente de trabalho, este se encontra disciplinado na Lei

8.213/91, em seu artigo 19 que de forma expressa estabelece que “Acidente do

trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo

exercício do trabalho (...), provocando lesão corporal ou perturbação funcional que

cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o

trabalho”.

Desta forma, deve haver um vínculo, chamado de nexo causal, entre a

atividade exercida pelo trabalhador e o acidente, para que se configure as doenças

ocupacionais, fator este também presente no acidente de trabalho.

O artigo 20 da citada Lei, assim define acidente de trabalho:

Consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes entidades mórbidas: doença profissional, assim entendida a

15 É a doença normal que se desenvolve em determinada profissão ou devido a certa atividade. 16 Não está vinculada a determinada profissão e ocorre devido a condições específicas do ambiente de trabalho. 17 BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 6. Ed. São Paulo: LTr, 2010, p. 1063. 18 OLIVEIRA, José de. Acidentes do Trabalho. Teoria, Prática e Jurisprudência. Ed. 3. São Paulo: Saraiva, 1997.p. 2

9

produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social; doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I.

Nessa ótica BRANDIMILLER (1996, p.145-146) elucida que “no sentido

genérico, acidente é o evento em si, a ocorrência de determinado fato em virtude da

conjugação aleatória de circunstâncias causais. No sentido estrito, caracteriza-se

também pela instantaneidade: a ocorrência é súbita e a lesão imediata”.

Conforme já restou demonstrado, entende-se que no acidente ocorre a lesão de

forma inesperada ao passo que a doença ocupacional é um estado patológico ou

mórbido de perturbação da saúde do trabalhador.19

Na força construtiva dos fatos, Sebastião Geraldo de Oliveira ensina que:

O fato gerador do acidente típico geralmente mostra-se como evento súbito, inesperado, externo ao trabalhador e fortuito no sentido de que não foi provocado pela vítima. Os efeitos danosos normalmente são imediatos e o evento é perfeitamente identificável, tanto com relação ao local da ocorrência quanto no que tange ao momento do sinistro, diferentemente do que ocorre nas doenças ocupacionais. 20

Salienta-se que para se configurar doença ocupacional é necessário a presença

de três elementos básicos: A causalidade, a prejudicialidade e nexo etiológico ou

causal. Significa que se faz necessário que a doença decorra do trabalho de forma

inesperada e não provocada e que a perturbação funcional resulte em redução da

capacidade laborativa do empregado e por fim, haja conexão entre o trabalho e a

doença desenvolvida ou agravada.

Por oportuno, indaga-se a interferência do meio ambiente do trabalho no

desenvolvimento das doenças ocupacionais.

19 RUSSOMANO, Mozart Victor. Curso de Previdência Social. ed. 2. São Paulo: Forense Jurídica, 1983. p. 350-351 20 OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenizações por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional. Ed. 5. São Paulo: LTr, 2009. p.43

10

É certo que um ambiente de trabalho sadio de acordo com as normas legais em

nada prejudica na saúde do trabalhador, porém, há de se considerar que um ambiente

de trabalho inadequado interfere diretamente na saúde e bem estar do empregado.

Nesse enfoque, encontra-se a degradação do meio ambiente do trabalho como

sendo a inobservância do empregador em proporcionar e/ou manter perfeitas

condições de trabalho para que impossibilite o desenvolvimento de patologias.

Conforme disciplina Alice Monteiro de Barros, além de acidente de trabalho e

enfermidades profissionais, as deficiências nas condições em que o empregado executa

as atividades geram tensão, fadiga e insatisfação, fatores prejudiciais a saúde.21

Observa-se que ocorre uma perda na qualidade do meio ambiente de trabalho

cada vez mais em nossa sociedade, pois, cresce a necessidade do empregador em

investir nas ações que tragam lucro à empresa de forma rápida e com menor

diminuição financeira.

Porém, um ambiente de trabalho inadequado gera absenteísmo, instabilidade

no emprego e queda na produtividade.

É nesse ponto que se verifica o desconhecimento dos empresários, pois, ao

investirem em saúde, também estarão investindo na qualidade de trabalho e

conseqüentemente em maior produtividade que trará maior lucro além de evitar perdas

pecuniárias futuras em ações trabalhistas que visem reparar o dano.

Valentin Carrion22, em seu comentário à Consolidação das Leis de Trabalho,

assim expõe seu entendimento: “ A segurança e higiene do trabalho são fatores vitais

de prevenção de acidentes e na defesa da saúde do empregado, evitando o sofrimento

humano e o desperdício econômico lesivo às empresas e ao próprio país”.

Com a falta de cautela do empregador ao disponibilizar condições impróprias

de trabalho com mobiliário inadequado, em posições anti-ergonômicas ou na ausência

de equipamentos de proteção em condições que não é possível eliminar os riscos do

ambiente, o empregado corre o risco de adquirir uma irreversível moléstia.

21 BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 6. Ed. São Paulo: LTr, 2010, p. 1063. 22 CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 33. Ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p.160.

11

É o caso do empregado que desenvolve um dos tipos de DORT - Doenças

Osteomusculares Relacionados ao Trabalho, conhecida genericamente por LER -

Lesões por Esforços Repetitivos que se desenvolvem pela exigência de força

excessiva, posturas incorretas, movimentos repetidos, jornada de trabalho excessiva,

exigência crescente de produtividade, ausência ou insuficiência de pausas e outros

fatores que ocorrem devido à falta de atuação preventiva por parte das empresas nas

condições ambientais de trabalho.

Outro exemplo de patologia atinente é a Neoplasia maligna dos brônquios e do

pulmão que pode atingir trabalhadores responsáveis pelo processo de fundição que

utilizam equipamentos de proteção ineficazes, que não ilidem a insalubridade. Essa

moléstia se desenvolve pelo contato com a sílica livre em pó, produto extremamente

pernicioso, aspirável pela via respiratória.

Há inúmeros riscos causados pelas más condições de trabalho, dentre eles

podemos citar ainda o desenvolvimento de doenças causadas pela absorção do

chumbo, do mercúrio, de solventes e pela exposição à poeira de silicose ou amianto.

Para arrematar essa exposição, registra-se que a falta de observância das

condições adequadas de trabalho não só afetam o desenvolvimento econômico da

empresa pela perda da qualidade do trabalho e posterior perda pecuniária em

reclamatória trabalhista, mas também afeta diretamente o ser humano em sua

qualidade de vida, pondo em risco o direito de viver com dignidade.

4. A Degradação do Ambiente Laboral e a Consequente Reparação Civil

Motivada pela Doença Ocupacional

Para adentrar ao desenvolvimento do assunto, há de se ressaltar que a

degradação do meio ambiente laboral ocorre pela inobservância do empregador em

aplicar de forma eficaz normas que garantam a saúde e a segurança do trabalhador no

seu local de trabalho.

Indeclinável é o prestígio de valores essenciais ao ser humano para que este

trabalhe de forma digna e saudável, dentro dos parâmetros estabelecidos pela

sociedade e pela segurança e medicina do trabalho.

12

O artigo 157 da CLT estabelece que são obrigações da empresa “cumprir e

fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho e instruir os empregados,

através de ordens de serviço, quanto às precauções a tomar no sentido de evitar

acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais(...)”.

Conforme já restou demonstrado, é comum o desenvolvimento de doenças

ocupacionais devido ao desrespeito por parte do empregador em cumprir de forma

correta as condutas impostas pelas normas para garantir a saúde e bem estar de seus

empregados.

Certamente que as condutas incorretas geram dano moral e material ao

empregado, pelo qual o empregador tem a obrigação de ressarcir pecuniariamente.

Nas palavras de Maria Helena Diniz,

“a responsabilidade civil é, portanto, a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou por simples imposição legal”. 23

Por oportuno, no que se refere ao dano material, este surge para ressarcir o que

pecuniariamente a vítima da doença ocupacional desprendeu em virtude da patologia

desenvolvida ou o que deixou de auferir em decorrencia dela.

Observa-se que o dano material está sedimentado no dano emergente e no

lucro cessante. O dano emergente consiste no prejuízo real sofrido pelo trabalhador, o

que este efetivamente perdeu em virtude da doença acometida.

Vislumbra-se nos casos em que são custeados pelo empregado exames

médicos, remédios, consultas médicas e demais despesas desprendidas devido a

patologia gerada pela ilicitude do empregador e que sem a qual não haveria redução no

patrimônio do lesado.

Nesse domínio, quando do afastamento do trabalhador de seu local de trabalho

para tratamento, este não não aufere mensalmente o mesmo ganho que recebia

enquanto trabalhava, restando, apenas, neste caso, a cargo do empregador, pagar as

23 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1993, p. 484.

13

diferenças entre o valor do benefício recebido pelo INSS e o valor dos vencimentos

que o obreiro recebia quando na ativa, restando caracterizado os lucros cessantes.

Salienta-se que o benefício previdenciário corresponde a 91% do salário

benefício e este é calculado pela média dos 80% maiores salários de contribuição de

todo o período contributivo, ou seja, não corresponde ao salário que o trabalhador

ganhava na ativa, o que já implica em prejuízo financeiro.

Entrementes, na extensão do Direito Previdenciário, é importante indagar que

o pagamento pela Previdência Social das prestações por doença ocupacional não

exclui a responsabilidade civil da empresa. A Súmula nº 229 do STF, assim disciplina:

“A indenização acidentária não exclui a do direito comum, em caso de dolo ou culpa

grave do empregador”.

Continuando na esfera do aspecto legal, há violação do artigo 7º inciso

XXVIII da Constituição Federal que assim disciplina: “São direitos dos trabalhadores

urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social o

seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização

a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa”. Da mesma forma o artigo

121 da Lei nº 8.213/9124 determina: “O pagamento, pela Previdência Social, das

prestações por acidente do trabalho não exclui a responsabilidade civil da empresa ou

de outrem”.

Em decisão do Tribunal Superior do Trabalho o Ministro assim explicou a

questão:

RECURSO DE REVISTA. DANO MATERIAL LUCROS CESSANTES PENSÃO VITALÍCIA FORMA DE CÁLCULO. Restando caracterizada a ocorrência de danos materiais a empregado em decorrência de doença profissional, com a consequente incapacitação para o trabalho, é devido o pagamento, a título de lucros cessantes e de pensão mensal vitalícia, de diferenças salariais entre o valor percebido pelo reclamante sob a forma de benefício previdenciário e o salário que ele estaria percebendo, caso pudesse laborar, desde o seu afastamento do trabalho. Recurso de revista conhecido e provido.( RR - 70800-14.2006.5.18.0003 PUBLICAÇÃO: DEJT - 27/08/2010 - Ministro Relator RENATO DE LACERDA PAIVA)

O superior Tribunal de Justiça assim entendeu sobre a incapacidade do

lesionado em caso de doença profissional: 24 Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências.

14

Ficando o ofendido incapacitado para a profissão que exercia, a indenização compreenderá, em princípio, pensão correspondente ao valor do que deixou de receber em virtude da inabilitação. Não justifica seja reduzida apenas pela consideração, meramente hipotética, de que poderia exercer outro trabalho. (Resp n° 233.610-RJ, 3ª Turma, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, DJ 26/06/2000).

Evidentemente que estando constatada a incapacidade permanente para o

trabalho, resta configurado o prejuízo material do empregado capaz de ensejar a

indenização civil a título material.

Em Acórdão do TST o Ministro assim ensinou sobre o tema:

Frise-se, quanto à demonstração do dano material, que este se configura ante a limitação física sofrida pelo empregado, pois a sua lesão é de caráter irreversível, o que ocasionou a sua incapacidade para o trabalho, bem como a aposentadoria por invalidez. Tal circunstância certamente impede ou, no mínimo, restringe o reingresso do reclamante no mercado de trabalho, ainda que aposentado, não havendo como negar o infortúnio sofrido pelo trabalhador, tal como o prejuízo financeiro acarretado pela interrupção do trabalho em plena condição de produtividade.” (TST - RR - 70800-14.2006.5.18.0003 PUBLICAÇÃO: DEJT - 27/08/2010 - Ministro Relator RENATO DE LACERDA PAIVA)

No que concerne a indenização por dano moral, esta surge com o objetivo de

preservar os direitos por uma melhor qualidade de vida, para que a prática do ato

ilícito seja punida e desestimulada.

O dano moral encontra-se amparado nos artigos 186, 927, 949, 950 e 951 do

Código Civil de 2002 e artigo 5º inciso X da Constituição Federal de 1988, além dos

entendimentos doutrinários e jurisprudenciais.

Evidentemente que a vítima ao ser acometida por uma doença desenvolvida

devido ao trabalho que desempenha passa a um estado emocional diverso e frustrante.

Para que se amenize esse estado de desânimo, há de se proporcionar os meios

adequados para a recuperação da vítima. Condenar o ofensor por danos morais implica

reparar o necessário para que se propicie os meios de retirar o ofendido do estado

melancólico a que fora levado.

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Carlos Roberto Gonçalves entende que “indenizar significa reparar o dano

causado à vítima, integralmente. Se possível, restaurando o status quo ante, isto é,

devolvendo-a ao estado em que se encontrava antes da ocorrência do ato ilícito”.25

Ocorre que retornar ao estado anterior é impossível e desta forma, a

compensação ao dano causado ocorre na forma de pagamento de um valor pecuniário.

Alice Monteiro de Barros esclarece que:

A fixação da compensação alusiva ao dano moral e psicológico resulta de arbitramento do juiz, após analisar a gravidade da falta, a intensidade e a repercussão da ofensa, a condição social da vítima, a sua personalidade e a do ofensor, a possibilidade da superação física ou psicológica da lesão, bem como o comportamento do ofensor após o fato, entre outros fatores.26

Ao se averiguar os danos morais ocasionados pela doença ocupacional

adquirida, resta claro à repercussão que esta traz a vida do trabalhador, principalmente

psicológica, conforme esclarece decisão Jurisprudencial abaixo aplicada:

“CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. ACIDENTE DE TRABALHO. LESÃO POR ESFORÇO REPETITIVO – LER. DANO MORAL. PROCEDÊNCIA DA VERBA. Para a indenização por dano moral motivada por doença profissional, bastante a prova do fato, do qual decorre, no caso, a óbvia repercussão psicológica sobre a trabalhadora que se vê atingida e frustrada em face da sua incapacidade para continuar exercendo a atividade laboral para a qual se preparou e concretamente desempenhava, integrada à classe produtiva de seu país. (...) (STJ/RESP 329094/2001- Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior - DJ- 17/06/2002).”

Valho-me dos ensinamentos de Augusto Zenun que assim expõe: “ao se

condenar o ofensor por danos puramente morais, implica isto em condená-lo à

reparabilidade do necessário para que se proporcione ao sofredor os recursos, os meios

de retirá-lo do estado melancólico a que fora levado", e acrescenta:

"Conseqüentemente, não se trata de dar preço à dor, aos sofrimentos, aos sentimentos,

e nada há de vexativo nisso, assim como não há bis in idem, vez que tal reparabilidade

não se confunde com a material, mas há tão só cumulatividade.27

25 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. ed. 8. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 529. 26 BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 6. Ed. São Paulo: LTr, 2010, p. 656-657. 27 ZENUN, Augusto. Dano Moral e Sua Reparação. Ed. 8. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 03.

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Se a doença trouxer incapacidade permanente ao trabalhador, o art. 950 do

Código Civil assim disciplina:

Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas de tratamento e lucros cessantes até o fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu. Parágrafo único. O prejudicado, se preferir, poderá exigir que a indenização seja arbitrada e paga de uma só vez.

Dispõe, ainda, o artigo 951 do Código Civil que:

O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional,por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.

Nesse diapasão, configurado está o dano moral quando a vítima remanesce de

sofrimento psíquico e moral, uma vez que não haverá mais condições de igualdade no

mercado de trabalho, vejamos:

ACIDENTE DE TRABALHO. DOENÇA PROFISSIONAL. LER/DORT. DANO MORAL E MATERIAL. INDENIZAÇÃO.A lesão física que redunda em perda ou diminuição permanente da capacidade laborativa causa, de uma só vez, dano de ordem material e moral ao empregado. (...) O dano moral, por sua vez, remanesce do evidente sofrimento causado à pessoa humana e da também óbvia repercussão psíquica e emocional, já que o trabalhador estará sujeito, desde a lesão e pelo resto de sua vida, à situação de desigualdade perante o mercado de trabalho. Comprovada a lesão, o sofrimento, o nexo de causalidade e a culpa do empregador, a condenação ao pagamento das indenizações é medida legítima. TRT-10 - RECURSO ORDINARIO: RO 142200681210001 TO 00142-2006-812-10-00-1

Um caso muito comum de doença ocupacional é a DORT, Doenças

Osteomusculares Relacionados ao Trabalho, que agrupam um conjunto de doenças que

afetam dolorosamente os trabalhadores, atingindo, principalmente, seus membros

superiores: dedos, mãos, punhos, antebraços, cotovelos, braços, ombros e pescoço. A

DORT se manifesta devido a mobiliário inadequado e esforços repetitivos no local de

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trabalho e ensejam com freqüência reclamatórias trabalhistas indenizatórias. Vejamos

decisão a respeito:

RECURSO DE REVISTA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL E MATERIAL DECORRENTE DE DOENÇA OCUPACIONAL. (...) DOENÇA OCUPACIONAL. LER. INDENIZAÇÕES PELOS DANOS CAUSADOS (MORAL/ PENSÃO MENSAL). Constatada a existência da doença ocupacional (LER/DORT), o nexo de causalidade e a culpa da reclamada, uma vez que a autora laborou por 22 anos em condições impróprias, utilizando mobiliário inadequado, em posições anti-ergonômicas, causando grave e irreversível moléstia. (...) TST - RECURSO DE REVISTA: RR 507 507/2002-024-05-00.6 Relator(a): Carlos Alberto Reis de Paul - Publicação: DJ 24/08/2007.

A indenização é devida de forma a compensar a dor do obreiro e como forma

de uma sanção à empresa a fim de desestimulá-la a praticar o ato novamente e

começar a dar segurança a seus empregados no ambiente de trabalho.

Neste sentido o TRT fundamenta o objetivo do dano:

TRT-PR-23-10-2009 INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. VALOR. FIXAÇÃO. A reparação pecuniária do dano moral deve, de um lado, servir como compensação pela sensação de dor experimentada pela vítima, de acordo com a gravidade e a extensão do dano, e, de outro, constituir uma sanção ao ofensor, considerando sua capacidade econômica, a fim de desestimulá-lo a praticar o ato novamente. Desse modo, o valor fixado terá uma finalidade verdadeiramente educativa, induzindo o agente que praticou o ato ilícito a mudar o seu comportamento, sem proporcionar, todavia, o enriquecimento da vítima. Recurso ordinário do reclamante conhecido e desprovido. TRT-PR-01805-2008-322-09-00-9-ACO-35911-2009 - 3A. TURMA. Relator: ALTINO PEDROZO DOS SANTOS. Publicado no DJPR em 23-10-2009

A perda da saúde com contínuos tratamentos, fere a auto-estima do ser

humano. Esses passam a se distanciar da vida em sociedade, permanecendo em suas

casas, pois, sentem se menos estimados.

Seguindo esse entendimento, a jurisprudência assim estabelece quanto ao

empregado que se submete a longos tratamentos decorrentes de doença ocupacional:

TRT-PR-27-10-2009 DANO MORAL - ACIDENTE DE TRABALHO. O acidente de trabalho macula a intimidade do trabalhador, que se submete a exames médicos, longos tratamentos que por certo acarretam transtornos em

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sua vida pessoal, elementos totalmente estranhos ao contrato de trabalho já que este presume um pagamento em troca da força de trabalho, mas jamais pressupõe abrir mão da saúde física e mental. Os efeitos de tais transtornos são sentidos dia-a-dia através das dores, desconforto e incapacidade para atividades antes rotineiras. O tomador dos serviços tem o dever de zelar pela saúde de trabalhadores que lhe prestam serviços, obrigação esta decorrente da função social da propriedade e do contrato. O descumprimento desse dever gera uma dor moral que deve ser indenizada. Recurso ordinário a que se nega provimento. TRT-PR-99503-2005-014-09-00-0-ACO-36310-2009 - 2A. TURMA. Relator: PAULO RICARDO POZZOLO. Publicado no DJPR em 27-10-2009

Frisa-se que a responsabilidade civil se encontra configurada diante da

presença dos seguintes pressupostos: culpa do empregador pela doença ocupacional,

dano e elo de causalidade.

Nesse ponto, o empregador tem o dever de adotar as medidas para eliminar os

riscos à saúde do obreiro. Se verificado a inobservância do empregador às condições

adequadas de segurança e medicina do trabalho e após, provado o nexo de causalidade

através de análise pericial do local em que o trabalhador desempenhava suas atividades

e do exame pericial do empregado acometido pela enfermidade, comprovado estará o

direito do empregado a reparação civil a título de danos morais.

Vejamos decisão jurisprudencial a respeito das obrigações dos empregadores

de zelar pela saúde dos empregados:

TRT-PR-27-07-2010 DOENÇA OCUPACIONAL. REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORATIVA. DANO MATERIAL E MORAL CONFIGURADOS. Não se olvide que a empresa tem o dever de observar e fazer observar as normas de segurança e medicina do trabalho, com vistas a proteger a saúde e a integridade física do trabalhador, onde se insere o alerta aos empregados. Logo, tendo o Réu determinado a um de seus empregados que dirigisse veículo da empresa, deveria orientá-lo na prevenção de acidentes, eis que a função tem riscos ergonômicos (postural), fato conhecido pela própria Ré, conforme atestado de saúde ocupacional quando da admissão do Autor. Configurado o ato ilícito, o dano e o nexo causal entre a lesão e o trabalho, correta a condenação relativa ao dever de indenizar, tanto material como moralmente, eis que comprovada redução da capacidade laborativa. Recurso da Reclamada a que se nega provimento. (...) Recurso a que se nega provimento. (TRT-PR-38302-2007-029-09-00-8-ACO-23766-2010 - 1A. TURMA Relator: UBIRAJARA CARLOS MENDES Publicado no DEJT em 27-07-2010).

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Assentadas as noções supra, é indeclinável o prestígio do diploma laboral ao

reconhecer a responsabilidade civil do empregador quando este não cumpre com as

normas de segurança e medicina do trabalho.

5. Considerações Finais

O meio ambiente do trabalho se configura como o local em que o empregado

exerce suas atividades diárias em troca de uma contra-prestação pecuniária chamada

de salário.

À luz da proteção legal, o local de trabalho deve possuir todas as condições

dignas e que proporcionem saúde e segurança ao trabalhador.

Ressalta-se que não há plenitude no cumprimento das normas, e se torna

comum o aparecimento de um meio ambiente de trabalho degradado que podemos

definir como desonroso e imoral.

A alusão a um ambiente de trabalho degradado se faz devido a falta de

conhecimento ou de vontade do empregador em empregar os meios adequados para

que os empregados possam realizar suas atividades com qualidade. A ignorância

decorre da necessidade do empresário em desprender menos dinheiro na empresa,

possuir a mão de obra necessária e os maquinários para produção e com isso gerar

cada vez mais lucros. Desconhece, portanto, que o resultado pode ser contrário ao seu

planejamento além de colocar a vida de um ser humano em risco.

Nessa esfera, é comum o desenvolvimento de doença ocupacional, que se

origina devido a condições inadequadas de trabalho.

Nessa perspectiva, a responsabilidade civil já sedimentada no diploma legal

passa a ser aplicada no âmbito trabalhista, visando desestimular a conduta do

empregador para que este forneça segurança a seus empregados no ambiente laboral ao

mesmo tempo que compensa de alguma forma a dor do empregado enfermo e o

tranqüiliza ao sancionar o empregador pelo ocorrido.

Por certo que um meio ambiente do trabalho com absoluta adequação as

normas de segurança e digno, destaca-se como um dos mais importantes e

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fundamentais direitos do trabalhador, e sua não observância representa agressão não só

ao ser humano de forma individual, mas a toda a sociedade.

6. Referências

BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 6. Ed. São

Paulo: LTr, 2010

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do

Brasil. Coleção Saraiva de Legislação. 44. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

BRASIL. Lei n. 8.080 de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições

para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento

dos serviços correspondentes e dá outras providências. Diário Oficial da União, 20

set. 1990. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8080.htm>.

Acesso em: 06 dez. 2010.

BRASIL. Lei n. 8213 de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de

Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8213cons.htm>. Acesso em: 06 dez.

2010.

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dezembro de 2004. Altera a Norma Regulamentadora n.º 10 que trata de Instalações e

Serviços em Eletricidade, aprovada pela Portaria n.º 3.214, de 1978, que passa a

vigorar na forma do disposto no Anexo a esta Portaria. Diário Oficial da União,

Brasília. p. 74- 77. Seção 1, 28 dez. 2004. Disponível em:

<http://www.mte.gov.br/legislacao/portarias/2004/p_20041207_598.pdf>. Acesso em:

06 dez. 2010.

BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Portaria n. 3214 de 8 de junho

de 1978. Aprova as Normas Regulamentadoras - NR - do Capítulo V, Título II, da

Consolidação das Leis do Trabalho, relativas a Segurança e Medicina do Trabalho.

Diário Oficial da União, 06 jul. 1978. Disponível em:

http://www.mte.gov.br/legislacao/portarias/1978/p_19780608_3214.pdf>. Acesso em:

06 dez. 2010.

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