a avaliação de desempenho humano no exército brasileiro
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Fundação Getúlio VargasEscola Brasileira de Administração Pública e de Empresas
Centro de Formação Acadêmica e PesquisaMestrado Executivo
DISSERTAÇÃO APRESENTADA POR
Gustavo Guberman de Andrade
TÍTULO
A Avaliação de Desempenho Humano no ExércitoBrasileiro: uma análise do sistema.
Professor Orientador Acadêmico: Prof. Dr. Marcelo Milano FalcãoVieira
Rio de Janeiro – RJ2003
Andrade, Gustavo Guberman de.
A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro: uma análise do
sistema. Rio de Janeiro: FGV/EBAPE, 2003.
183 p.
Dissertação (Mestrado) – Fundação Getulio Vargas, Escola Brasileira de
Administração Pública e de Empresas, 2003.
1. Avaliação de Desempenho. 2. Gestão de Pessoas. 3. Exército Brasileiro.
4. Tese (Mestrado – FGV/EBAPE). I. Título.
Dedico este trabalho aos meus pais,
Osvaldo e Ida, eternos exemplos de
dedicação e devoção aos filhos, responsáveis
maiores por todos os meus sucessos, a quem
devo não somente a vida, mas o aprender a
trilhá-la de forma honrada, justa e
significativa; à minha irmã Cristiane, fonte de
eterna alegria e orgulho para meu coração; ao
meu irmão Flavio, amigo em todos os
momentos; e em especial memória aos
Mártires do Holocausto.
“Now and forever, in memory of those who
rebelled in the camps and ghettoes, fought in
the woods, in the underground and with the
allied forces, who braved their way to Eretz
Israel and those who died, sanctifying the
name of God”.
(Inscrição nos jardins do Museu Yad
Vashem, Jerusalém – Israel).
AGRADECIMENTOS:
Nem mesmo a mais magnífica obra de arte tem em seu autor o únicoresponsável pela criação. O que se falar então de um trabalho acadêmico depesquisa? Muitos foram aqueles cujas contribuições foram fundamentais para aelaboração deste, aos quais estendo os mais sinceros votos de gratidão.
Ao meu orientador, o Prof. Dr. Marcelo Milano Falcão Vieira, que de formapaciente e diligente, guiou-me de forma sempre sábia a cada passo dado nestalonga e tortuosa jornada que é a Dissertação, confiando e acreditando em meutrabalho e incentivando-me sempre, tornando a convivência motivo de satisfaçãoprofissional e pessoal.
Aos Maj Cunha e Cap Silvia, ambos do Centro de Estudo de Pessoal doExército, pela forma como me receberam, franqueando-me acesso a todas asinformações do Projeto AVALOP, permitindo-me, inclusive, participar de reuniões domesmo. Sem este auxílio, o trabalho certamente perderia muito em seu conteúdo.
Em nossas vidas somos expostos a alguns exemplos que não simplesmentenos transmitem informações valiosas, mas tornam-se verdadeiros moldes paranossa vida. A Profª Drª Carmen Migueles, com toda sua sabedoria, correção edisposição em ajudar, ensinou-me muito mais que o conteúdo de livros e teorias,deu-me um exemplo grandioso e nobre de profissional, amiga e ser humano, a quemtenho o imenso orgulho, e honra ainda maior, de reverenciar como mestre.
Ao grande amigo Anderson Araújo de Carvalho, que não mediu esforços paraauxiliar-me nas mais diversas tarefas, com quem contraio inestimável dívida por estetrabalho.
Aos companheiros de jornadas acadêmicas, Kiyoshi Komamura e Rogério deMatos Dias, que, na diversidade das nossas convivências, ensinaram-me o quantoela é valiosa. Certamente, um pouco de cada um deles se encontra em cada páginadesta dissertação.
À querida amiga Sônia Regina Barone e ao mui caro amigo Flávio Alcoforado,por terem me proporcionado o apoio necessário e fundamental para que, nummomento tão atribulado de minha vida, eu tivesse a tranqüilidade necessária paracontinuar e concluir esta tarefa.
Ao ilustre amigo Fábio Barcellos de Melo, presente com seu apoioincondicional e suas fundamentais palavras de incentivo em todos os momentos.
Aos demais colegas da turma do mestrado, que nestes dois anos deconvivência, muito me honraram com o tanto que ensinaram, sendo tambémresponsáveis por agradáveis momentos vividos juntos.
Aos Bibliotecários da FGV e da COPPEAD/UFRJ, que prestaram fundamentalauxílio em minhas pesquisas.
E, acima de tudo, a D’us. Durante o transcurso da longa estrada da vida, Elenos brinda com a dificuldade, e por ela agradecemos a Sua confiança na nossacapacidade de vencê-la; nos apresenta as vitórias, que nos fazem refletir sobre onosso merecimento; e dá à nossa existência um sentido único e os momentos epessoas de que precisamos para fazermos da felicidade um caminho significativo,jamais um destino inalcançável.
RESUMO
O objetivo do presente estudo é o de analisar a atual sistemática de Avaliação de
Desempenho utilizada pelo Exército Brasileiro, de forma a se identificar as suas
características que a impedem de cumprir os propósitos e objetivos aos quais ela se
propõe. Para tal, é utilizado o referencial teórico não somente relacionado à
Avaliação de Desempenho em si, mas também aquele que diz respeito a assuntos
que mantenham relação com ela. A despeito das formas múltiplas que a Avaliação
de Desempenho pode tomar, algumas características e coerências internas devem
ser observadas para que o sistema possa funcionar corretamente. Além disso, não
se pode esquecer que, como um instrumento, a avaliação será fortemente
influenciada pela cultura da organização em que é utilizada, a qual, por sua vez, não
se encontra isolada da sociedade em que a organização opera. Ao trazer todas
estas premissas para análise do sistema utilizado pelo Exército Brasileiro, uma série
de problemas emergem, destacando-se: a presença de objetivos de natureza
antagônica; falta de ligação com a estratégia da organização; falta de mecanismos
para operacionalizar os objetivos; avaliação utilizada como instrumento de coação,
na tentativa de manter o sistema de dominação que passa a ser contestado; adoção
de um método de avaliação que reforça a utilização coercitiva dela e que não
propicia uma visão completa do avaliado; falta de etapas no processo de avaliação,
também implicando na falta da adoção de parâmetros para a avaliação, inserindo
grande subjetividade no sistema e fornecendo feedback insuficiente aos avaliados;
utilização de instrumento também de grande subjetividade e reducionista; e um
sistema de premiação que, além de replicar as distorções do sistema de avaliação,
acrescenta outras.
ABSTRACT
This study aims to analyze the current systematics of Performance Appraisal used by
the Brazilian Army, in a way that permits us to identify its characteristics that hinder it
to fulfill the purposes and objectives to which it proposes. In order to do so, it is used
the theoretical referential not only related to Performance Appraisal itself, but also
that one that focus on the subjects related to it. In spite of the multiple forms
Performance Appraisal can take, some internal characteristics and coherences must
be observed so that the system can function correctly. Moreover, it can not be
forgotten that, as a tool, the appraisal will be strongly influenced by the organizational
culture where it is used. The organizational culture, in turn, does not find itself
isolated from the society in which the organization operates. When all these
characteristics are brought to the analyses of the system used by the Brazilian Army,
several of problems emerges, including: the presence of objectives of antagonistic
nature; the lack of linking with the organization strategy; the absence of mechanism
to operate the objectives; appraisal used as a coercion tool, in the attempt to keep
the domination system that begin to be contested; adoption of an appraisal method
which strengthens the coercitive use of it and that does not propitiate a complete
vision of the apprasee; the lack of steps on the appraisal process, including in the
absence of parameters adoption for the appraisal, inserting great subjectivity into the
system and supplying insufficient feedback to the appraisees; use of an instrument
also of great subjectivity and reductionist; and a awarding system that, besides
replying the distortions of the evaluation system, adds others.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .........................................................................................................71.1 Objetivos Geral e Específicos............................................................................91.2 Justificativas Teórica e Prática ........................................................................101.3 Estrutura do Trabalho ......................................................................................12
2 METODOLOGIA ....................................................................................................142.1 Perguntas de Pesquisa....................................................................................142.2 Definição de Termos........................................................................................152.3 Delineamento da Pesquisa ..............................................................................162.4 População e Amostra.......................................................................................172.5 Coleta e Análise de Dados ..............................................................................182.6 Limitações do Estudo.......................................................................................23
3 REFERENCIAL TEÓRICO.....................................................................................263.1 Propósitos e Objetivos da Avaliação de Desempenho ....................................263.2 Considerações Gerais sobre o Desempenho Humano....................................343.3 Métodos de Avaliação......................................................................................463.4 Etapas da Avaliação de Desempenho.............................................................503.5 Os Instrumentos de Avaliação .........................................................................593.6 Avaliação de Desempenho na Administração Pública.....................................683.7 Resultados de outras Pesquisas .....................................................................75
4 TRANSFORMAÇÕES SÓCIO-CULTURAIS DA SOCIEDADE E SUASIMPLICAÇÕES PARA O EXÉRCITO BRASILEIRO ................................................86
4.1 Considerações Iniciais .....................................................................................864.2 A Importância da contribuição das demais Ciências Sociais ...........................874.3 O Fenômeno Pós-Moderno .............................................................................914.4 Implicações da Pós-Modernidade para a Gestão das Organizações ..............954.5 Implicações da Pós-Modernidade para a Gestão no Exército Brasileiro .......106
5 SISTEMÁTICA DE AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DO EXÉRCITOBRASILEIRO ..........................................................................................................138
5.1 Considerações Iniciais ...................................................................................1385.2 Propósitos e Objetivos...................................................................................1395.3 Método de Avaliação .....................................................................................1435.4 Etapas da Avaliação ......................................................................................1475.5 O Instrumento de Avaliação...........................................................................1515.6 O Sistema de Valorização do Mérito .............................................................1565.7 O Projeto AVALOP – Avaliação de Oficiais e Praças ....................................1595.8 Considerações Finais ....................................................................................165
6 CONCLUSÃO ......................................................................................................1676.1 Principais Resultados Encontrados ...............................................................1686.2 Conclusão......................................................................................................1726.3 Sugestões para Trabalhos Futuros................................................................174
7 REFERÊNCIAS....................................................................................................175
1 INTRODUÇÃO
O trabalho é uma atividade que já faz parte do cotidiano do homem desde que
este iniciou sua luta pela sobrevivência. Entretanto, o que antes se resumia a
atividades simples, como a caça e a coleta de alimentos, foi se sofisticando e
ganhando uma complexidade crescente à medida que o próprio homem começou a
trilhar o caminho do desenvolvimento tecnológico.
Atualmente, o trabalho não só faz parte do cotidiano do homem, como
desempenha papel fundamental no seu desenvolvimento como pessoa. Além disso,
o trabalho diversificou-se e se especializou de tal maneira que ele passou a integrar
uma vasta e complexa rede de relações interdependentes.
Nesta rede, a sociedade também foi se transformando. Em certa medida,
influenciando nas transformações pelos quais o trabalho passou. Em outra, sendo
influenciada por estas mesmas transformações.
Tomando o trabalho, então, como essa vasta rede, pode-se inferir sobre a
necessidade de que cada componente funcione corretamente, a fim de que toda a
rede cumpra a sua finalidade (a de agora não só garantir a sobrevivência do homem,
mas também o seu desenvolvimento). Desta forma, ao longo dos tempos, surgiu a
necessidade de se avaliar o desempenho das organizações, para que se pudesse
garantir este bom funcionamento.
As organizações, então, por sua vez, passaram a sentir a necessidade de
avaliar o desempenho de seu pessoal, buscando desta forma, garantir o bom
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desempenho das mesmas em função do bom desempenho de seus integrantes.
Assim, surgiu a avaliação de desempenho.
O Exército Brasileiro, como Instituição cujas unidades integram a complexa rede
do trabalho, também sente a necessidade de buscar avaliar o desempenho do
pessoal integrante delas, tanto que possui uma sistemática para tal.
Todavia, assim como todas as técnicas e tecnologias, a sistemática adotada
pelo Exército é passível de críticas. Estas, por sua vez, descortinam o caminho para
o aperfeiçoamento e até novas descobertas que propiciem um passo maior no
caminho do desenvolvimento.
Este trabalho, então, tratará de abordar a avaliação de desempenho no Exército
Brasileiro.
A problemática analisada partiu da suspeita, confirmada durante a pesquisa, de
que o sistema de Avaliação de Desempenho seria ineficaz para atingir os objetivos e
propósitos os quais se propõe a atingir. E por trás desta incapacidade, encontram-se
uma série de aspectos cujos reflexos extrapolam o próprio sistema em si.
A título de exemplo, o Exército utiliza a avaliação para efeitos de comparação
entre dois indivíduos que foram avaliados por instrumentos iguais, mas de conteúdo
diferente. Este aspecto evidente, suscitou a suspeita supracitada e, quando melhor
examinada, trouxe à luz outros elementos até então insuspeitos.
Desta forma, para que se possa efetivamente analisar o sistema de Avaliação
de Desempenho do Exército Brasileiro, o problema apresentado a seguir é
suscitado:
Quais são as características da atual sistemática de Avaliação de Desempenho
do Exército Brasileiro que a impede de cumprir os propósitos e objetivos por ela
mesma determinados?
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Qualquer verdade pode ser comparada a um prédio, ela é construída sobre
alicerces que não estão totalmente à vista do espectador. Nestes, podem estar
escondidas muitas das causas ignoradas de fenômenos aparentes.
Por esta razão, o presente estudo se preocupa em ir além do que a análise pura
e simples do sistema de Avaliação de Desempenho poderia apresentar, para que,
inclusive, se obtenha uma explicação mais completa e fidedigna das razões daquilo
que é observado na concepção e prática do sistema.
1.1 Objetivos Geral e Específicos
Desta forma, tem-se então que o objetivo geral desta dissertação é o de
analisar a atual sistemática de Avaliação de Desempenho utilizada pelo
Exército Brasileiro, de forma a se identificar as suas características que a
impedem de cumprir os propósitos aos quais ela se propõe.
Para que o objetivo geral seja alcançado, será necessário que sejam atingidos
os seguintes objetivos intermediários:
- identificação dos propósitos e objetivos da sistemática de Avaliação de
Desempenho do Exército Brasileiro;
- análise dos propósitos e objetivos à luz da literatura sobre Avaliação de
Desempenho;
- verificação do grau de sintonia existente entre o sistema de Avaliação de
Desempenho e o tratamento dado ao elemento humano na gestão no Exército
Brasileiro;
- identificação do método e das etapas da sistemática de Avaliação de
Desempenho; e
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- análise da praxis destas etapas, incluindo o instrumento utilizado, visando
identificar em que medida elas colaboram para a consecução dos propósitos e
objetivos da sistemática.
1.2 Justificativas Teórica e Prática
As justificativas do estudo proposto podem ser vislumbradas sob duas óticas. A
ótica teórica e a prática.
Com o passar do tempo, a Administração mudou sua abordagem sobre as
pessoas, as quais deixaram de ser consideradas como meros ativos para inclui-las
nas questões de crescimento e desenvolvimento das organizações (Wagner III et
Hollenbeck, 1999).
Ainda segundo os autores supracitados (ibidem, p. 99), “as pessoas serão
motivadas ao desempenho de alto nível desde que percebam que a recepção de
resultados de valência alta depende de sólido desempenho pessoal”.
Assim, juntando as duas idéias apresentadas, pode-se perceber a importância
que vem sendo dada ao desempenho individual, bem como àquilo que
possivelmente o motiva.
Logo, um estudo cujo foco é numa sistemática que aborda justamente a questão
do desempenho individual, deve ser considerado como relevante.
Considerando ainda que
“a técnica nessa perspectiva [a de ser ato de transformação do mundo e ato de
transformação do sujeito] é então evolutiva, porque diz respeito à ordem humana e
não só à ordem natural, a única dotada de uma consciência historicizante” (Dejours,
1997, p. 37).
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Pode-se então ressaltar ainda mais esta importância, justamente porque o
estudo em questão buscará resultados que poderão contribuir para a evolução da
técnica ora em uso. Esta que, na verdade, está relacionada a aspectos muito mais
abrangentes e profundos com relação ao papel do ser humano no trabalho e ao
como tal papel é vivido e tratado pelas organizações.
Esta última assertiva remete, então, à importância do estudo sob o ponto de
vista prático.
Indo aos propósitos e objetivos do sistema de Avaliação de Desempenho do
Exército Brasileiro, tem-se, por exemplo, um propósito que aborda a questão do
aperfeiçoamento individual constante (Brasil, 2001a). Ora, tal aperfeiçoamento só
será possível, a priori, caso sejam conhecidos os pontos necessários e/ou possíveis
de aperfeiçoamento. Logo, tem-se também que tal conhecimento deverá advir do
resultado da Avaliação de Desempenho.
Desta forma, enquanto técnica na perspectiva apresentada anteriormente, a
sistemática de Avaliação de Desempenho do Exército Brasileiro também deve ser
evolutiva. Assim, o presente trabalho reveste-se desta importância, a de fornecer
subsídios para o aprimoramento da instrumentalidade do sistema em vigor.
Além disso, citando um outro propósito, a de fornecer subsídio para a
formulação de política de pessoal (idem), pode-se afirmar o seguinte. Simplificando,
pode-se dizer que a Avaliação de Desempenho não passa de um instrumento. Como
tal, por si só, não tem validade alguma. Ou seja, só se pode falar em avaliação
considerando-se a teia de relações na qual ela se insere. Então, de nada adianta
buscar o esmero técnico do instrumento se sua utilização, se todos os elementos
que também têm relação com o instrumento não forem avaliados sob a ótica do
esmero que se pretende alcançar. Em última instância, neste caso, pode-se
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identificar esta teia como sendo a da própria política de pessoal do Exército
Brasileiro.
Logo, ao se estudar a sistemática de Avaliação de Desempenho do Exército
Brasileiro, descortina-se como de grande relevância a oportunidade que se cria de,
com base nos resultados obtidos, estudar-se a própria política de pessoal em si.
Por fim, pode-se dizer ainda que a relevância prática do estudo pode ser medida
em cada propósito e objetivo da sistemática de Avaliação de Desempenho, haja
vista que ele vem justamente buscar identificar a lacuna existente entre o logos e a
praxis da sistemática em vigor.
1.3 Estrutura do Trabalho
Para que os objetivos da presente dissertação sejam atingidos, o mesmo foi
dividido em cinco capítulos, além do primeiro – a presente introdução, bem como
constam, ao final, as referências citadas no texto.
O segundo capítulo – Metodologia – apresenta a delineação da pesquisa e o
método escolhido para a coleta e análise de dados.
O terceiro capítulo – Referencial Teórico – busca, a partir da apresentação da
Avaliação de Desempenho sob a perspectiva da literatura que aborda o tema,
construir o referencial sob o qual o sistema utilizado pelo Exército Brasileiro será
analisado.
O quarto capítulo – Transformações Sócio-Culturais da Sociedade e suas
Implicações para o Exército Brasileiro – é encarregado de aprofundar as questões
relativas ao tratamento dado ao elemento humano na gestão no Exército, buscando
estabelecer as implicações para o sistema de Avaliação de Desempenho.
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O quinto capítulo – Sistemática de Avaliação de Desempenho do Exército
Brasileiro – apresenta a sistemática utilizada pelo Exército, buscando identificar as
suas falhas e/ou incongruências existentes.
Por fim, o sexto capítulo – Conclusão – apresenta os principais resultados
encontrados e conclui o estudo, além de apresentar sugestões de futuros trabalhos
a serem desenvolvidos.
Espera-se, desta forma, ter dado ao assunto o tratamento necessário para que
as questões pertinentes tenham sido devidamente esclarecidas.
2 METODOLOGIA
Ao se conduzir qualquer pesquisa na qual o elemento humano é seu objeto, a
escolha da metodologia encerra particular dificuldade. Isso porque são tantos os
prismas sob os quais o homem tem sido estudado que a escolha de um menos
adequado pode fornecer somente parte da resposta que se procura.
Desta forma, optou-se pelo emprego da metodologia apresentada a seguir, a fim
de que as perguntas de pesquisa possam ser respondidas convenientemente,
possibilitando chegar à raiz do problema pesquisado.
2.1 Perguntas de Pesquisa
Ao se aplicar a metodologia escolhida, as seguintes perguntas de pesquisa são
respondidas:
- Quais são os propósitos e objetivos da sistemática de Avaliação de
Desempenho do Exército Brasileiro?
- Os propósitos e objetivos são coerentes com aquilo que a literatura apregoa
como sendo pertinentes a um sistema de Avaliação de Desempenho?
- Há sintonia entre o sistema de Avaliação de Desempenho e o tratamento dado
ao elemento humano na gestão no Exército Brasileiro?
- Qual o método e quais etapas constituem a sistemática de Avaliação de
Desempenho do Exército Brasileiro?
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- Em que medida o método, a prática das etapas identificadas, bem como o
instrumento utilizado, contribuem para a consecução dos propósitos e objetivos da
sistemática de Avaliação de Desempenho?
2.2 Definição de Termos
Avaliação de Desempenho
Definição Constitutiva – “pode ser definida como o processo pelo qual uma
organização mede a eficiência e a eficácia dos seus colaboradores” (Almeida, 1996,
p. 15). Complementando, “o instrumental que com maior precisão tem respondido à
necessidade de conhecimento da organização sobre si mesma” (Bergamini et
Beraldo, 1988, p. 32).
Definição Operacional – para efeitos de estudo de campo, é entendida como
sendo o processo específico do preenchimento da ficha de avaliação de
desempenho por parte do superior hierárquico, incluindo neste processo o
posicionamento do avaliador quanto a este.
Sistemática de Avaliação de Desempenho
Definição Constitutiva – Nesta dissertação, será entendida como todo o
processo que se inicia com o estabelecimento dos propósitos e objetivos da
sistemática, passando pela Avaliação de Desempenho propriamente dita e sendo
concluída com a adoção das medidas corretivas necessárias, sendo este processo
permanente na organização. Nas palavras de Pontes (1999, p. 24),
“é um método que visa, continuamente, estabelecer um contrato com os funcionários
referente aos resultados desejados pela organização, acompanhar os desafios
propostos, corrigindo os rumos, quando necessário, e avaliar os resultados
conseguidos”.
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Definição Operacional – para efeitos do estudo de campo, o termo será
entendido como englobando desde o estabelecimento dos propósitos e objetivos da
sistemática, passando pela constituição do instrumento de avaliação, a avaliação
propriamente dita e o feedback fornecido aos integrantes da instituição.
2.3 Delineamento da Pesquisa
Utilizando-se a taxionomia apresentada por Vergara (2000), apresenta-se o tipo
de pesquisa classificando-a quanto aos fins e aos meios.
Quanto aos fins, a pesquisa é descritiva e explicativa. Descritiva porque
identifica algumas características específicas ausentes da sistemática de Avaliação
de Desempenho do Exército Brasileiro. Também é explicativa porque, com base nas
características identificadas, estabelece-se a causalidade entre estas e a
consecução dos objetivos e propósitos do sistema atual.
Quanto aos meios, a pesquisa é bibliográfica, documental, de campo e ex post
facto. Bibliográfica porque é com base na bibliografia disponível sobre o assunto que
repousa o referencial teórico do estudo. Documental porque também se faz uso de
documentos internos do Exército Brasileiro que normatizam o sistema de Avaliação
de Desempenho atual. Também foi de campo, pois a pesquisa colheu dados,
através do método etnográfico, conciliando a observação do pesquisador com
entrevistas que se fizeram necessárias para o esclarecimento de algumas questões.
Por fim, é também ex post facto, haja vista a impossibilidade do pesquisador
manipular e controlar as variáveis envolvidas.
A pesquisa trata-se de um estudo de caso, já que é especificamente o caso da
aplicação da Avaliação de Desempenho no Exército Brasileiro que é objeto de
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estudo. Sendo também qualitativa, pois serão estes os dados levantados terão esta
característica, bem como os resultados obtidos.
2.4 População e Amostra
O universo da pesquisa é composto por todos os militares avaliadores e
avaliados pela sistemática atual de Avaliação de Desempenho. Quais sejam, todos
os oficiais formados pela Academia Militar das Agulhas Negras, Instituto Militar de
Engenharia, Escola de Saúde do Exército e Escola de Administração do Exército,
bem como todas as praças (sargentos e subtenentes) formadas pela Escola de
Sargento das Armas, Escola de Instrução Especializada e Escola de Saúde do
Exército. Desta forma, estão excluídos deste universo os oficiais e praças
temporários, ou seja, o pessoal militar que não é de carreira.
Quanto à amostra, a parcela deste universo pesquisada em campo, tem-se sua
definição pelo critério da acessibilidade (idem). Ou seja, os sujeitos observados se
limitaram àqueles aos quais o pesquisador teve acesso, mas que abrangeram
indivíduos oriundos de todas as escolas de formação e de todas as especializações
existentes no Exército.
Os sujeitos, por sua vez, contaram com, no mínimo, dois anos de formado. Este
tempo mínimo foi requerido devido ao fato de ser o mínimo necessário para que os
sujeitos já tenham sido avaliados ao menos uma vez e tenham recebido o resultado
da avaliação.
Entretanto, para que os objetivos da pesquisa fossem atingidos, a terceira
pergunta de pesquisa (há sintonia entre o sistema de Avaliação de Desempenho e o
tratamento dado ao elemento humano na gestão no Exército Brasileiro?) requereu
que a observação não se limitasse aos sujeitos supracitados, abrangendo também,
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todos os integrantes do Exército aos quais se teve acesso, acima da graduação de
terceiro sargento.
A observação a estes permitiu que as perguntas relativas ao sistema de
Avaliação de Desempenho, mais especificamente com relação à sua prática,
pudessem ser respondidas. Todavia, como a pesquisa não se limitou a verificar a
prática do sistema, mas tudo que o engloba e no que ele implica, uma observação
mais ampla se fez necessária.
2.5 Coleta e Análise de Dados
Devido aos objetivos do trabalho, como também as particularidades que
envolveram a coleta de dados, o método utilizado para efetuá-la foi o etnográfico.
Uma série de razões motivou esta escolha.
Inicialmente, por ocasião da coleta de dados, o pesquisador era membro da
organização objeto da pesquisa. Logo, julgou-se que a utilização de um questionário
não traria resultado desejado.
Tal julgamento baseou-se na premissa de que, dependendo do objeto do
estudo, os respondentes dirão aquilo que pensam que o pesquisador considera
como sendo a resposta certa (Douglas, 1998).
O Exército é uma instituição onde o componente hierárquico tem uma grande
importância. O pesquisador, incluído nesta hierarquia, ao passar o questionário,
poderia influenciar na resposta do mesmo. Influência que se daria tanto com relação
àqueles que estivessem abaixo na hierarquia, quanto àqueles que estivessem
acima.
Com relação aos sujeitos que estivessem abaixo na hierarquia, corria-se o risco
de que ou estes tentariam dar as “respostas certas”, ou utilizar o questionário como
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mecanismo para protestar contra qualquer coisa, canalizando a insatisfação para o
sistema de Avaliação de Desempenho, devido à falta de mecanismos institucionais
pelos quais os integrantes do Exército possam apresentar suas reivindicações.
Por outro lado, com relação aos sujeitos que estivessem acima na hierarquia,
corria-se o risco de que eles evitassem respostas que, na visão deles, os
colocassem em posição de questionamento contra as suas próprias avaliações ou
que eles interpretassem como sendo um julgamento do pesquisador com relação a
eles. E estando o pesquisador abaixo na hierarquia, não haveria abertura para tal.
Já pela etnografia, o pesquisador teve condições de obter as informações que
necessitou, pois, se por um lado a observação evitou que fossem coletados dados
enviesados, por outro, o fato do pesquisador pertencer à organização o permite
acesso à “verdade formular” (Giddens, 1997, p. 83) ou ao conhecimento comunal
(Lash, 1997b) dela.
Ou seja, o pesquisador já conhece o seu objeto de estudo, minimizando o risco
de que suas interpretações acerca do observado se deixe enviesar por estereótipos
consagrados do objeto do estudo ou explicações tendenciosas por parte de alguns
dos seus integrantes.
Obviamente que a observação permitiu a coleta de dados isenta de qualquer
viés desta natureza somente porque esta também se deu de forma encoberta
(Roesch, 1999). Em outras palavras, os demais integrantes da organização não
tinham conhecimento que estavam sendo observados com a finalidade de suas
atitudes servirem como dados para uma pesquisa.
Buscou-se manter a predisposição de isenção por parte dos sujeitos, inclusive
quando algumas entrevistas foram feitas. Estas, com a finalidade de elucidar o
significado de fatos observados. Elas não se caracterizaram, a rigor, como
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entrevistas, pois, sempre que possível, os questionamentos foram feitos em meio a
conversas informais e aparentemente despretensiosas. Assim, descaracterizando a
inquirição direta, acredita-se ter obtido maior sinceridade por parte dos
respondentes.
Mas além de evitar que os dados coletados não contribuissem para a
consecução dos objetivos da pesquisa, a etnografia foi escolhida também por causa
dos objetivos em si.
A busca pelos significados do que é observado é o fim último da etnografia.
Assim, utilizou-se a perspectiva semiótica (Geertz, 1989) com a finalidade de extraí-
los dos fatos observados e das respostas dadas pelos respondentes. Significados
estes que, então, permitiram a consecução dos objetivos deste estudo.
O método etnográfico é aquele comprometido com a apresentação das
realidades sociais como elas são vividas, experimentadas, entendidas e familiares
às pessoas estudadas (Katz, 1997). Com isso, ele busca evitar que as realidades
sociais sejam vistas como os sujeitos da pesquisa podem querer mostrá-las, ou
ainda, como os estereótipos de determinado grupo nos queiram fazer acreditar. No
estudo de uma instituição como o Exército, ambos os riscos existem.
Katz (ibidem) ainda apresenta algumas outras justificativas para a utilização da
etnografia. Destas, apresenta-se aqui aquelas pertinentes ao presente estudo:
- a busca por significados escondidos das condutas das pessoas por receio
de condenação moral esta justificativa corrobora com o que já foi
apresentado, bem como se torna evidente nos resultados do presente
estudo;
- a presença de um novo fenômeno historicamente localizado a Pós-
modernidade, como fenômeno novo, traz implicações para a gestão do
21
Exército Brasileiro com novas interações e desafios internos advindos
delas;e
- a necessidade de compreender como é criado o caráter particular das
práticas sociais para tanto, a instituição social precisa ser estudada no
seu contexto social, o que não ocorre, por exemplo, quando se utilizam
unicamente questionários.
Além do mais, os fenômenos sociais são distintos em caráter dos naturais.
Portanto, não podem ser entendidos em termos de puras relações causais ou pela
subordinação à leis universais (Hammersley et Atkinson, 1995).
Poder-se-ia questionar acerca da imparcialidade do julgamento do pesquisador
necessária ao estudo. O que não seria possível pela observação, mais
especificamente pela semiótica.
Ao que pese tal afirmativa, vale considerar que a percepção é parte de toda e
qualquer observação humana, percepção essa que invariavelmente envolverá a
interpretação daquilo que está sendo coletado (Fox, 1998).
Lembrando-se que a relação sujeito-objeto é recíproca, trazendo o dualismo
para a essência do conhecimento (Hessen, 1999), utilizar métodos que se dizem
objetivos, fingindo ignorar esta relação, pode, à rigor, prejudicar mais a qualidade
dos resultados do que aprimorá-la. A seção 4.2 – A Importância da contribuição das
demais Ciências Sociais – explora mais esta questão.
A análise dos dados, dada à natureza deles, será qualitativa. Desta forma, os
dados coletados tanto pela observação, quanto pelas entrevistas, serão
categorizados de acordo com as classificações existentes nas teorias pertinentes ao
assunto, de forma a colaborar para que os resultados sejam obtidos.
22
Por fim, cabe explorar a validação dos resultados da pesquisa pelo método
utilizado.
Os critérios que validam qualquer pesquisa foram basicamente desenvolvidos
pelo paradigma positivista. Portanto, ao se utilizar um método construído sobre um
outro paradigma, eles devem ser repensados em uma perspectiva diferente (Guba et
Lincoln, 1985; Roesch, 1999).
Desta forma, a credibilidade da pesquisa se baseou no procedimento de que a
descrição feita pelo pesquisador foi ratificada pela observação de terceiros. Como
também os critérios de seleção do que foi observado, onde e quando foram assim
testados.
A escolha dos demais observadores se deu entre integrantes do Exército com
formação em áreas distintas que a administração. Com isso, buscou-se fazer com
que o foco destes se desse exclusivamente sobre o que foi observado, não sobre
categorizações ou reflexões de cunho da ciência administrativa.
A presença de viés por parte do pesquisador, ao se tratar de pesquisa
qualitativa, acontecerá sempre. Inicialmente, a própria escolha do método a ser
utilizado já indica um viés de preferência por determinado campo do conhecimento.
Por isso, a revisão das observações por terceiros e das conclusões acerca destas
buscou minimizar a medida em que o viés do pesquisador tenha influenciado nos
resultados.
Finalizando, a generalização dos resultados é extremamente limitada à
organização estudada. Devido às suas características bastante particulares, é com
extrema precariedade que os resultados obtidos possam ser estendíveis à outras
organizações. Todavia, naquilo em que as características se assemelharem, ao
23
menos a dinâmica dos fenômenos pode ser tomada como semelhante,
possibilitando um ponto de partida para uma investigação específica mais profunda.
2.6 Limitações do Estudo
Apesar de todo o cuidado que foi tomado para que a metodologia utilizada
pudesse fazer com que o estudo produzisse resultados mais precisos possíveis, o
mesmo possui limitações que precisam ser apresentadas, tanto para que as
ressalvas quanto ao trabalho possam ser consideradas, quanto para justificar
alguma ocorrência do que possa ser julgado como aparente deficiência.
Em primeiro lugar, o fato do pesquisador ter sido membro da organização
estudada, apesar de lhe dar acesso à “verdade formular” (Giddens, 1997, p. 83) ou
ao conhecimento comunal (Lash, 1997b) dela, concorre para a ocorrência de algum
tipo de parcialidade no julgamento das questões observadas.
Já foi citado como se buscou certificar a precisão das observações. Todavia, a
interpretação das mesmas fica sujeita ao viés adotado pelo pesquisador, o que, pelo
objeto do estudo e pelas teorias utilizadas para analisar o problema, não goza de
unanimidade, sendo passível de críticas por parte daqueles que não são partidários
desta mesma linha de análise.
Além disso, ao se abordar questões como a disciplina militar, esta ligada
estritamente às operações tipicamente militares, e a disciplina no âmbito da gestão,
esta ligada ao andamento de atividades administrativas, o que também existe no
Exército, pode-se ter a impressão de que ambas precisariam ser claramente
distinguidas, de forma que o sistema de Avaliação de Desempenho pudesse ser
melhor analisado.
24
Todavia, mesmo reconhecendo o imperativo desta necessidade, ela é julgada
como sendo uma armadilha na qual o pesquisador buscou evitar cair.
No cotidiano militar, ambas as esferas da disciplina são tratadas como uma
mesma, havendo um interlaçamento tão grande entre essas esferas que, tentar
apresentá-las distintamente pode se apresentar mais prejudicial aos resultados da
pesquisa do que as tratando juntas.
A conseqüência direta desta limitação é que não se tem como separar até que
ponto o atual sistema de Avaliação de Desempenho está mais adequado para
utilização no Exército enquanto organização com vida administrativa, necessitando
esta de uma atuação comparável à de organizações civis, da utilização no Exército
enquanto organização responsável pela garantia da segurança nacional, para a qual
é necessária a adoção de algumas práticas e posturas, especialmente no que tange
às relações de poder, que seriam vistas como anacrônicas se adotadas nas
organizações civis.
Portanto, principalmente pelo fato da Avaliação de Desempenho ter sido criada
como instrumento de gestão, é imprescindível que sejam considerados os assuntos
discutidos e os resultados apresentados como mais pertinentes à faceta
administrativa do Exército, à qual, como foi dito, não tem como ser estudada
isoladamente da sua faceta operacional.
As possíveis soluções apontadas que envolvem a situação de inseparabilidade
têm a sua limitação na carência de um maior número de evidências empíricas (vide
seção 4.5). Esta limitação existe justamente por serem poucas as unidades
especiais existentes, mesmo sendo verificado em todas elas os mesmos elementos
das características apresentadas.
25
Por fim, essa série de limitações apontará para o fato de que, tanto os
resultados, quanto as conclusões apresentadas, apesar de os serem feitos de forma
propositiva, sejam mais fortes evidências que apontem para as possíveis causas do
que causas que efetivamente possam ser comprovadas. Tanto que, para isso, ainda
vem contribuir não uma limitação do estudo, mas uma deficiência de nível
estratégico da organização, apontada no capítulo 5, seção 5.2 – Propósitos e
Objetivos.
3 REFERENCIAL TEÓRICO
3.1 Propósitos e Objetivos da Avaliação de Desempenho
O conhecimento e discussão dos propósitos e objetivos da Avaliação de
Desempenho devem ser os passos iniciais de qualquer trabalho de elaboração ou
análise de sua sistemática. Serão os propósitos os balizadores do trabalho do
pesquisador, justamente porque qualquer sistema, em princípio, deverá estar
construído sobre propósitos e objetivos bem definidos, a fim de que a sua
operacionalização não se perca ao enveredar por caminhos que privilegiem outros
aspectos.
“A existência dessa prática [avaliação de desempenho], tecnicamente elaborada,
pressupõe o estabelecimento de um processo de planejamento em que objetivos e
metas são fixados e os indicadores (medidas de desempenho) são predeterminados”
(Brito et al., 2001, p. 52).
Com esta assertiva, Brito et al. atentam para a necessidade da definição dos
propósitos e objetivos, sob risco de que a prática da avaliação de desempenho não
venha a produzir os resultados esperados, talvez ironicamente justamente porque
sem a definição, dificilmente saber-se-á o que se espera do sistema.
Bergamini et Beraldo (1988, p. 13), por sua vez, ao afirmarem que,
“o processo de Avaliação de Desempenho Humano nas organizações implica menos
na criação de um instrumental técnico sofisticado e mais no desenvolvimento de
uma atmosfera em que as pessoas possam relacionar-se umas com as outras de
maneira espontânea, franca e confiante”,
27
argumentam que há um propósito maior que deve balizar o desenvolvimento do
processo de avaliação de desempenho, sendo este o de justamente criar um melhor
ambiente de trabalho, de forma justamente a se conseguir obter os melhores
resultados possíveis das pessoas no trabalho.
Então, poder-se-ia afirmar que, quanto ao ser humano, a Avaliação de
Desempenho tem uma grande correlação com a questão da motivação no trabalho.
Reforçam esta afirmação Wagner III et Hollenbeck (1999, p.99) ao colocarem que
“as pessoas serão motivadas ao desempenho de alto nível desde que percebam que
a recepção de resultados de valência alta depende de sólido desempenho pessoal”.
Sendo que esta valência seria a “satisfação que ele [o indivíduo] prevê receber de
um determinado resultado” (ibidem, p. 89).
Assim, a percepção desta valência estaria expressa justamente no resultado da
Avaliação de Desempenho, que se torna então um importante instrumento para que
os indivíduos se motivem na organização.
Cabe aqui, entretanto, ser feita uma breve digressão sobre a questão da
motivação. Böhmerwald (1999, p. 33) afirma que “o objetivo final da avaliação de
desempenho é contribuir para o aumento da motivação das pessoas na empresa”. A
uma primeira vista, pode-se ter a falsa impressão de que as organizações podem
motivar os seus integrantes. Todavia, como já foi apresentado no item anterior, a
organização influencia na motivação das pessoas mediante os fatores de satisfação
e contra-satisfação existentes na mesma. Portanto, a motivação é um fator interno a
cada indivíduo, sendo importante este conceito ao se tratar dos propósitos e
objetivos da avaliação de desempenho.
28
Entretanto, há autores que discordam desta perspectiva que coloca a motivação
como cerne da questão da gestão de recursos humanos. Desta forma, a crítica a
esta perspectiva bem como outras serão apresentadas na seção seguinte.
Distintos autores apresentam uma enormidade de propósitos, finalidades e
objetivos para os sistemas de Avaliação de Desempenho. Stoffel (2000) e Pontes
(1999), por exemplo, apresentam o sistema de Avaliação de Desempenho como
sendo dependente do planejamento estratégico da organização. A guisa de
ilustração, dentre os objetivos propostos por Pontes (1999, p. 26, 27), destacam-se:
“- tornar dinâmico o planejamento da empresa;
- conseguir melhorias na empresa voltadas à produtividade, qualidade e satisfação
dos clientes, bem como em relação aos aspectos econômicos e financeiros;
- ...;
- estabelecer um clima de confiança, motivação e cooperação entre os membros das
equipes de trabalho;
- ...; e
- servir como instrumento para levantamento de necessidades de treinamento e
desenvolvimento”.
A dependência do desempenho humano com relação ao planejamento
estratégico também é defendida por Coens et Jenkins (2000, p. 80) ao
argumentarem que
“to perform effectively, employees require basic information. They need to
understand the aim of the organization and understand how their works relates do
the whole”1.
Assim, pode-se argumentar que o entendimento do objetivo da organização e da
relação da tarefa individual com o todo da organização, providenciado por esta
1 “para atuar de forma eficaz, os empregados requerem de informações básicas. Eles precisamentender o objetivo da organização e como seus trabalhos se relacionam com o todo”.
29
informação básica, permitiria aos integrantes da organização perceberem como suas
avaliações relacionam-se com o desempenho efetivamente ocorrido, permitindo,
inclusive, que haja uma maior facilidade de identificação de eventuais discrepâncias
no sistema por parte dos próprios integrantes da organização.
Almeida (1996), Lucena (1992), Gillen (2000), Bader et al. (2000), Böhmerwald
(1999) e Stoffel (2000) apresentam objetivos os quais, em linhas gerais, alinham-se
com os apresentados por Pontes.
Cabe também ressaltar o que Phillips (1996, p. 3) afirma acerca da contribuição
do departamento de recursos humanos para o resultado final das organizações.
“HR departments are taking significant strides in reducing costs, enhancing
customer service, improving profits and boosting productivity. They accomplish this
through a rigorous program of accountability for the function, and at the heart of
accountability is measurement and evaluation [grifo nosso] ”2.
Ou seja, pode-se dizer que o grande objetivo do sistema de Avaliação de
Desempenho seria o de medir a parcela de contribuição de cada integrante para os
resultados da organização. Desta forma, seu propósito então seria o de alimentar os
demais sistemas de recursos humanos com informações que os possibilitassem
transformar esta contribuição na maior possível, buscando o desenvolvimento
daqueles integrantes que o necessitem, bem como servir de parâmetro para a
seleção dos melhores habilitados a ocupar cargos que porventura vaguem.
Neste ponto, porém, emergem as primeiras contradições inerentes aos sistemas
de avaliação de desempenho. Coens et Jenkins (2000, p. 46-47), por exemplo,
contradizem Phillips (1996) ao afirmarem que há uma interdependência
2 “Os departamentos de RH estão tendo avanços significativos na redução de custos, melhoria doserviço ao consumidor, aumento de lucros e produtividade. Eles atingem isso através de um rigorosoprograma de contabilidade para a função, e no centro da contabilidade estão a medição e avaliação”.
30
fundamental entre todos os componentes do sistema organizacional e que, portanto,
“because of the interdependency of the parts, improvement strategies aimed at the
parts, such as appraisal, do little or nothing to improve the system ”3.
Assim, o primeiro questionamento suscitado é justamente o da validade do
sistema de avaliação de desempenho como ferramenta de desenvolvimento das
pessoas e, em conseqüência, de melhoria da organização. Ambos os pontos estão
ligados ao fato de que normalmente a avaliação não considera a interdependência
de todas as partes da organização. Desta forma, qualquer tentativa de melhoria de
uma destas sem considerar o todo, será inútil. (Coens et Jenkins, 2000).
Poderia-se argumentar, entretanto, que caso o sistema de avaliação seja
desenhado em consonância com a estratégia da organização, tal crítica perderia sua
validade.
Mesmo assim, ainda sim se verificariam novos problemas. Inicialmente,
considerando-se a ligação entre a estratégia da organização e o desenho do sistema
de avaliação, Figueiredo (2002) sustenta que as competências de uma organização
em todas as suas funções devem ser acumuladas e mantidas em paralelo. Ou seja,
não adiantaria somente que a avaliação de desempenho fosse desenhada em
consonância com a estratégia da organização, como também seria necessário que a
organização, ao buscar desenvolver seus recursos humanos, o fizesse em nível
paralelo ao desenvolvimento das demais funções da organização.
Por outro lado, mesmo que tal condição fosse satisfeita, o que, a priori, pode-se
dizer, é algo que depende fundamentalmente da organização fazer, há ainda um
outro problema cuja solução não parece tão simples.
3 “por causa da interdependência das partes, estratégias de melhoria focadas nas partes, como aavaliação, fazem pouco ou nada para melhorar o sistema”.
31
Recordando, tem-se que há dois principais propósitos para a avaliação de
desempenho: a de desenvolver e a de premiar os integrantes da organização. Estes
dois própositos, porém, já se revelam conflitantes entre si.
O ato de premiar, por si, traz a noção de julgamento sobre a capacidade e/ou
competência das pessoas. Desta forma, quem estiver sendo julgado poderá adotar
uma postura defensiva contra esse julgamento e, principalmente, contra o juiz, o
avaliador, normalmente o superior hierárquico.
Por outro lado, desenvolvimento significa melhoria e, necessariamente, boa
vontade das pessoas em reconhecer suas necessidades de melhoria em acordo
com aqueles em condições de propiciar os meios necessários para tal. Neste caso,
também será o superior hierárquico aquele que deverá desempenhar o papel de
facilitador para o desenvolvimento de seus subordinados.
Como então, esperar que uma mesma pessoa, atuando em dois papéis distintos
frente a um mesmo fato, possa efetivamente desempenhar os dois com a isenção
requerida para um bom desempenho de ambos?
Block (2000, p. XV) já coloca que
“when we combine compensation with a developmental discussion, we undermine
the openness and vulnerabity that development requires, and all our ears can hear is
the money ”4.
Ou seja, não somente haverá dificuldade do superior em atuar bem nos dois
papéis, mas também os subordinados não adotarão a postura aberta necessária.
Com isso, então, o que Bergamini et Beraldo (1988) colocaram sobre a atmosfera de
4 “Quando nós combinamos compensação com discussão para o desenvolvimento, minamos aabertura e vulnerabilidade que o desenvolvimento requer, e tudo o que nossos ouvidos conseguemouvir é o dinheiro”.
32
relacionamento espontânea e confiante não se concretizará, fazendo com que a
avaliação de desempenho perca sua finalidade.
Beer et Ruh (1990) apontam para ambas as dificuldades, tanto no que concerne
ao fato do papel de juiz do superior interferir na sua habilidade de auxiliar no
desenvolvimento do desempenho do subordinado, quanto à posição defensiva que o
subordinado tenderá a adotar.
Estas contradições também são apontadas por Meyer et al. (1990) ao condenar
a utilização das entrevistas de avaliação que buscam, ao mesmo tempo, aperfeiçoar
o desempenho das pessoas e servir de base para negociações salariais e
promoções. Assim, eles apregoam que para propósitos distintos, distintas avaliações
devam ser conduzidas.
Bader et al. (2000) apontam para o mesmo caminho, ao considerarem que as
avaliações deverão ser comparadas com a primeira, a qual deverá servir de diretriz
básica. Isto converge com a idéia de Stoffel (2000) sobre administração de
desempenho, no qual o principal objetivo deve ser o desenvolvimento do integrante
da organização.
Lenvinson (1990a) vai um pouco mais longe em sua crítica. Além dos dois
propósitos já citados, ele também lista o feedback dado a cada pessoa sobre sua
performance. Todavia, ele também coloca que os sistemas atuais são incapazes de
servir a qualquer uma dessas funções. Esta incapacidade, além da contradição entre
os diferentes propósitos teria uma série de outros motivos de característica
operacional, questões essas que serão exploradas mais adiante.
Fechando as críticas, Coens et Jenkins (2000) ressaltam que o problema não é
a avaliação em si, mas sim sua abordagem com vários propósitos, estes, como já
apresentados, antagônicos em essência. Eles ainda apresentam um diagrama numa
33
tentativa de mostrar todas as variáveis envolvidas no desempenho de um indivíduo,
visando demonstrar que qualquer sistema que vise cobrir todos aqueles aspectos é
ilusório. Portanto, qualquer sistema desenhado para melhorar a performance
baseado em prêmios ou incentivos estaria fadado ao fracasso.
As discussões acerca das contradições existentes nos propósitos dos sistemas
de avaliação de desempenho levam a constatação de que, no mínimo, há
necessidade de se reavaliar os sistemas em uso.
Desenvolver versus premiar. Propósitos distintos que, conforme foi visto,
deverão dar origem a sistemas distintos. A idéia de administração do desempenho,
defendida tanto por Stoffel (2000) quanto por Bader et al. (2000), Beer et Ruh (1990)
e Coens et Jenkins (2000) já pode apontar para um caminho que talvez concretize o
primeiro.
Contudo, como atingir concretizar o segundo propósito sem que isso interfira no
primeiro, especialmente quando premiar inclui não somente o reconhecimento pelo
ótimo desempenho, mas também a possibilidade de promoção?
A resposta exigirá o desenho de um sistema que, além de apresentar
características específicas para tal fim, o que varia de organização para
organização, consiga apresentar-se como algo totalmente desvencilhado do outro
aos olhos dos integrantes da organização, bem como um grande preparo por parte
dos avaliadores de ambos os sistemas.
Concluindo, pode-se dizer que a avaliação de desempenho apresenta-se como
uma sistemática muito mais complexa e difícil do que se poderia supor a uma
primeira vista. Portanto, antes que se possa efetivamente operacionalizá-la, faz-se
necessário que se conheça mais sobre os fatores que influenciam no desempenho
humano no trabalho, objeto da próxima seção.
34
3.2 Considerações Gerais sobre o Desempenho Humano
A compreensão do ser humano no trabalho é um desafio que se apresenta aos
pesquisadores da administração desde os seus primeiros estudos. Desde Taylor e
seus princípios da administração científica, os pesquisadores têm buscado conhecer
as variáveis atuantes no desempenho das pessoas no trabalho, visando, desta
forma, desenvolver mecanismos ou técnicas que visem obter o melhor desempenho
delas.
Os últimos anos são testemunhas da crescente complexidade que o trabalho e
as relações interpessoais neste ambiente ganharam. As atividades, em sua grande
maioria, deixaram de ser essencialmente manuais e passaram a exigir a utilização
cada vez maior do intelecto dos trabalhadores. Stoffel (2000) realça a importância
dessa utilização do intelecto, ao afirmar que o maior diferencial entre os
concorrentes deixou de ser a tecnologia para passar a ser o conhecimento.
Com isso, então, não basta apenas o treinamento. O desenvolvimento das
pessoas e a criação de um ambiente propício tornam-se mister para a geração do
conhecimento. Lucena (1992), então, aponta as condições para o desempenho
humano, sendo estas a qualificação profissional, a cultura organizacional, o estilo
gerencial e o ambiente externo.
Estas condições, então, serão aquelas que atuarão diretamente no
comportamento do ser humano no trabalho.
“Considerando então que o desenvolvimento da estrutura comportamental do ser
humano se dá pela interação entre elementos intrínsecos e extrínsecos à sua
constituição, que gera ao longo do processo a imagem que o indivíduo tem de si e o
afeto que sente por si mesmo, é natural que deseje e recuse ao mesmo tempo
35
situações que confirmem, coloquem em xeque ou contrariem sua auto-imagem”
(Bergamini et Beraldo, 1988, p. 12).
Com esta afirmação, Bergamini et Beraldo apresentam um outro aspecto de
grande influência no desempenho humano no trabalho, os elementos intrínsecos,
dos quais pode-se destacar a motivação para o trabalho.
Assim, por um lado, há os fatores, ou condições, externos para o desempenho,
apresentadas por Lucena, as quais, entre outras coisas, são responsáveis pelo
“paradigma emergente [que] pressupõe que o desempenho humano seja regulado
pela relação gerente/colaborador e que vise ao comprometimento de todos com os
objetivos da organização” (Stoffel, 2000, p. 11). E, por outro, há os fatores internos
para o desempenho, como a motivação, para a qual contribuirão os fatores de
satisfação e de contra-satisfação existentes no ambiente de trabalho, o qual
determinarão a direção do comportamento humano no trabalho (Archer, 1997;
Bergamini, 1997).
Pode-se então dizer que o desempenho humano será o resultado da interação
entre o colaborador e sua chefia, conjuntamente com suas características individuais
e fatores situacionais (Almeida, 1996).
O tema da motivação tem sido visto por muitos autores como o ponto chave
para a obtenção de um desempenho superior dos integrantes de um organização
por esta (Wagner III et Hollenbeck, 1999; Archer, 1997; Davis et Newstrom, 1992).
Segundo esta corrente de pensamento, a motivação estaria diretamente
relacionada às necessidades do homem. Por isso mesmo ela deriva em grande
parte da Teoria das Necessidades de Maslow.
Segundo esta teoria, há uma classificação de necessidades hierarquizadas, as
quais só podem ser satisfeitas à medida que aquelas de grau inferior se encontrem
36
saciadas. Em ordem crescente, são elas: fisiológicas, de segurança, sociais, de
estima e de auto-realização (Wagner III et Hollenbeck, 1999).
Sobre esta teoria, novas idéias foram sendo formuladas e adaptadas. Archer
(1997), por exemplo, desenvolveu seu argumento no sentido de que, para ele, cada
um desses níveis de necessidades, possui uma multiplicidade de necessidades
distintas. Dentre estas, algumas precisam ser plenamente satisfeitas para que se
passe a buscar a satisfação de necessidades de níveis mais elevados e, para
outras, basta apenas a satisfação parcial.
A Teoria das Necessidades Manifestas de Murray pode também ser evocada
para exemplificar construções feitas sobre o modelo original de Maslow. Essa teoria
“sustentava que um indivíduo pode ser motivado por mais de uma necessidade de
cada vez, e sugeria também que, às vezes, as necessidades podiam entrar em conflito
entre si” (Wagner III et Hollenbeck, 1999).
Desta forma, então, conclui-se que a primordial tarefa das organizações seria a
identificação das necessidades que motivariam seus integrantes ao trabalho,
atuando nelas no intuito de se obter o desempenho desejado.
Aprofundando-se um pouco mais no assunto, Herzberg (1997) aponta para o
“enriquecimento do cargo” como sendo o caminho para a motivação dos integrantes
de uma organização.
Em resumo, pode-se dizer que a premissa por trás desta idéia é a de que há
fatores higiênicos e motivadores por trás do desempenho de qualquer cargo, sendo
que somente esses últimos são responsáveis pelo aumento da satisfação no
trabalho e, portanto, possibilitam a motivação dos empregados.
37
Desta forma, há necessidade de que haja uma correta adequação entre a
capacidade do ocupante do cargo e o seu nível, com investimentos sobre os fatores
motivadores de forma a se obter um melhor desempenho dos empregados.
Davis et Newstrom (1992) já adotam uma abordagem que entende a motivação
como produto de uma multiplicação cujos fatores seriam a expectância, a valência e
a instrumentalidade. Entendendo-se por valência a satisfação de um indivíduo ao
obter determinado resultado; por expectância, a crença individual na capacidade de
se desempenhar uma tarefa; e por instrumentalidade, a crença que o desempenho
bem-sucedido resultará em recompensa. Para tal, eles apregoam que a atuação
com reforços positivos e negativos nos comportamentos desejados e indesejados,
respectivamente, serão de suma importância, isso em conjunto com o feedback
dado aos integrantes da organização.
Normalmente aborda-se a temática da motivação focalizando os subordinados e
o papel da gerência, a qual justamente, recordando o que já foi apresentado, recai
sobre os fatores de satisfação, as necessidades e os reforços dos comportamentos.
Todavia, seguindo o raciocínio das teorias expostas, pode-se dizer que há também a
necessidade de que a gerência se encontre motivada para desempenhar seu papel
de catalisadora ou indutora dos aspectos ligados à motivação.
McClelland et Burnham (1990) estudaram esta questão e concluiram ser o poder
o fator preponderante na motivação dos gerentes. Todavia, eles alertam, é delicado
a utilização deste fator por parte da organização, haja vista o risco de que isso leve a
um imperialismo ou autoritarismo nas organizações, o que faria com que a
motivação dos subordinados se esvaísse à medida em que aumentassem os
comportamentos autoritários da gerência.
38
Em torno do debate sobre os fatores de satisfação, mais especificamente ligado
à instrumentalidade, é importante que haja uma vinculação do pagamento ao
desempenho (Wagner III et Hollenbeck, 1999; Lawler III, 1997; Kanter, 1990). Ou
seja, a remuneração deverá conter também uma parcela variável, esta dependente
do desempenho individual ou da equipe. Todavia, é importante tomar cuidado na
implantação dessa prática, pois ela torna visiveís as questões concernentes à
eqüidade (Kanter, 1990), podendo isto levar a questionamentos ou reações ao
sistema, dependendo se os integrantes da organização o percebam como justo ou
não.
A despeito do grande respaldo que a teoria da motivação tem entre os adeptos
da psicologia organizacional e da validade por eles atribuída a ela, a forma como ela
foi construída é passível de críticas.
A construção da teoria da motivação segue o caminho previamente trilhado pela
ciência positivista, imparcial em tese, fruto do pensamento cartesiano.
O pensamento cartesiano tem suas origens no pensamento grego e na
dicotomia criada pelos gregos, quando a unicidade do mundo foi dividida entre o
Belo e o útil (Marcuse, 1997). Esta dicotomia acabou hierarquizando o
conhecimento, elevando a racionalidade pura e instrumental ao sinônimo de
verdade.
O primeiro questionamento a esta promoção da racionalidade é se colocar a
questão de que, segundo Nietzsche (1983), o homem é o criador dos valores aos
quais ele não somente se apega, como hierarquiza. Todavia, parece que o homem
se esquece de tal característica. Em conseqüência, essa criação do homem acaba
por transcendê-lo, ocupando um lugar acima dele.
39
Na filosofia pré-socrática, a distinção entre o Belo e o útil não existia, tampouco
a sua hierarquização. Ou seja, Belo e útil, assim como vida e morte, criação e
destruição seriam todos partes de um continuum no qual o homem estaria inserido.
Considerando, então, como já dito, que os valores são criados pelo homem,
passa então a ser uma questão de interpretação o fato de se considerar, em
primeiro lugar, Belo e útil como distintos e opostos e, em seguida, hierarquizar,
estabelecendo a precedência de um sobre o outro.
É justamente por este motivo que esta hierarquização, considerada como a
verdade por Sócrates (Marcuse, 1997), é por Nietzsche (1983) veementemente
criticada. Afinal de contas, questões como a verdade ou a felicidade não estão além
da sensibilidade do homem, diferente do apregoado por Sócrates.
Kant (1999) vem corroborar com isso, ao afirmar “que todo o nosso
conhecimento começa com a experiência”, com exceção da própria faculdade de
conhecer, ou seja, a razão. E qual é fruto da experiência se não interpretações do
fenômeno experimentado?
Todavia, ao contrário do que uma má interpretação de Kant possa sugerir, o fato
da razão em si não estar sujeita à experiência não significa que ela esteja num plano
superior ao da sensibilidade, como propõe a filosofia socrática, pois o que ela produz
depende desta. Portanto, há uma complementaridade, uma unicidade entre ambas e
não a dicotomia apregoada por Sócrates.
Assim como Kant (1999), Nietzsche (1983) também critica a metafísica, pois
esta independeria da experiência e, portanto, estaria isenta das interpretações, o
que, segundo ele, seria impossível de acontecer.
Em crítica similar, Damásio (1996) contradiz o pressuposto cartesiano de que o
raciocínio deveria desprover-se de qualquer veste emocional para que as respostas
40
obtidas fossem as melhores possíveis. E as emoções, o que são, se não reações
neurobiológicas aos significados atribuídos às interpretações dos fatos?
Portanto, estas críticas permitem a afirmação de que os significados atribuídos
aos fenômenos, advindos da interpretação dos mesmos, são os mais releventes
aspectos concernentes à hierarquização dos mesmos.
Direcionando esta afirmação para a questão da motivação, tem-se então que o
papel dos significados do trabalho, das tarefas desempenhadas pelas pessoas e de
tudo o mais que cerca a atividade produtiva do homem reveste-se da maior
importância como determinante da motivação individual.
Estas críticas também permitem que se trace um paralelo entre elas e o
conceito de cultura formulado por Geertz (1989), o qual utiliza a semiótica para seu
entendimento.
Para Geertz (1989, p. 15), “o homem é um animal amarrado a teias de
significados que ele mesmo teceu”, sendo, portanto, essas teias a cultura. Este
conceito é convergente com o que Nietzsche (1983) coloca sobre a criação e
hierarquização dos valores. À semiótica, então, cabe o papel de identificar e
compreender as teias tecidas pelo homem.
Em resumo, a semiótica busca identificar os significados com os quais se
revestem as ações do homem que, portanto, passam a ser vistas como ações
simbólicas.
A ação simbólica pode ser definida como o significado que há por trás de cada
comportamento, refletida na importância com a qual se reveste cada ação do
comportamento humano. Esta importância, por sua vez, será determinada, para
cada indivíduo, na sua base social.
41
A partir do momento em que se vislumbra toda a ação simbólica que está por
trás dos atos, a estranheza ou incoerência com a qual se percebe o comportamento
humano de determinado grupo se desmancha. Mais especificamente para os
estudos da administração, aquilo que impulsiona o homem a ter determinado tipo de
comportamento se revela.
Por outro lado, é interessante observar que a compreensão destes significados,
via de regra, ocorre pela observação dos mesmos atos e comportamentos que
inicialmente se apresentam como sendo estranhos, ou os quais se busca explicar.
Assim então, tem-se que todo o comportamento humano é revestido de
simbolismos que permitem a um observador compreendê-lo melhor. Entretanto, a
forma de conhecimento destes simbolismos não é outra senão a orientada pelo
próprio comportamento humano, a qual apresentar-se-á pela base social do grupo
ao qual o indivíduo observado pertence.
Para ser corretamente identificado e compreendido, os significados devem ser
observados dentro do contexto em que ocorrem as ações, a este entendimento,
deve-se somar o fato de que a própria comunicação em si passa a ser um elemento
estruturante dos significados e, portanto, da própria cultura (Eco, 1991).
Em linhas gerais, a comunicação ocorre por intermédio do código utilizado.
Assim, tem-se que cabe ao código ordenar os símbolos, de forma que, então, possa
ocorrer a comunicação.
Considerando-se o que se entende por relações semasiológicas, ou seja, o fato
de determinados símbolos poderem designar determinados significados, mais uma
possibilidade de comunicação se abre. Tem-se o que também é apresentado como
o sentido denotativo e conotativo da comunicação. Sendo, então, este último sujeito
a alterações da relação supracitada, a qual, nas palavras de Eco (1991, p. 23),
42
“pode mudar, crescer, deformar-se; o símbolo permanece constante e o significado
torna-se mais rico ou mais pobre”.
Acrescenta-se, ainda, o fato da relação entre o símbolo e o referente ser algo
indireto e não natural, sendo somente a relação entre aquele e a referência algo
imediato, recíproco e reversível.
Todas estas relações têm como conseqüência, o fato de que a comunicação,
desta forma, fica sujeita a uma série de fatores externos ao significante mediante o
qual deseja-se transmitir o significado.
Considera-se ainda que a informação, elemento nuclear do processo de
comunicação, só ganha valor a partir do momento que o destinatário traduz a
mensagem-significante recebida em mensagem-significado, isto se tomando por
base o léxico pelo qual ela é determinada.
Desta forma, o contexto na visão de Eco é justamente este léxico, ou subcódigo,
que trabalhará estabelecendo o significado conotativo dos símbolos. Este
significado, então, será fundamental para que a mensagem-significante seja
recebida pelo destinatário e transformada, enfim, em mensagem-significado.
A compreensão da questão da comunicação e seu papel na cultura é importante
principalmente em dois aspectos. O primeiro se refere ao sentido conotativo de
como ela ocorre no ambiente organizacional, cuja análise já poderá dar pistas
acerca da eficácia ou não de discursos que visam a motivação ou outras ações a
serem adotadas pelos empregados.
O segundo, com estreita relação com o primeiro, diz respeito ao fluxo de
informações dentro da organização. Com relação a este aspecto, de nada adianta o
esforço na construção de canais de comunicação dentro da organização, se o
43
contexto no qual devam ocorrer as trocas de informação não o favorecerem, por
quaisquer razões que sejam.
A abordagem sobre cultura e o papel da comunicação remetem ao que Lucena
(1992) classificou como sendo uma condição externa para o desempenho, ou um
fator extrínsico (Bergamini et Beraldo, 1988). Porém, a análise da ação humana pela
lente semiótica sobrepõe tal idéia, já que se percebe ser a base social a
determinante dos significados e da importância relativa de cada um deles.
Ou seja, na ação humana há presente um forte elemento de estratégia de
inserção social, o que tem sua importância avultada quando se trata de
comportamento no trabalho, justamente pelo importante significado atribuído ao
papel do homem no trabalho e como as sociedades atribuem ao trabalho a função
das construções das próprias identidades individuais.
Isto permite que se afirme que o estudo isolado da motivação perde seu sentido
de ser porque, para ser bem compreendida, a motivação deve ser estudada
levando-se em conta a teia de significados da empresa na qual o indivíduo está
inserido, que, por sua vez, terá relação com a cultura da sociedade na qual esta se
encontrar (Barbosa, 2001; Barros et Prates, 1997; Amado et al., 1994; Chanlat,
1999). Do contrário, corre-se o risco de se identificar e atuar em fatores que somente
aparentam ter relação com a motivação das pessoas, mas que numa descrição
densa, revelariam-se insignificantes.
Por outro lado, a partir do momento que se tem uma compreensão mais acurada
da cultura e dos significados que cercam e permeiam as pessoas no trabalho, já se
tem em mãos um conhecimento muito mais abrangente e profundo que o sobre a
motivação pura e simplesmente pode revelar, tornando, portanto, este estudo menos
relevante.
44
Há ainda um ponto que vem se somar ao já exposto. Dejours (1997), ao discutir
os pressupostos relativos ao trabalho e os da pesquisa sobre fator humano,
apresenta que, a partir do momento em que se submete o comportamento humano a
leis, ou seja, utilizando-se a racionalidade instrumental, não se abre espaço para as
falhas humanas. Em elas ocorrendo, deixam de ser responsabilidade do executante
e passam a ser daqueles que não compreendem bem as leis e que, portanto, não
adequaram suas condutas com relação aos subordinados adequadamente, a fim de
que as tarefas sejam corretamente desempenhadas. Isso se aplica perfeitamente
como crítica à Teoria da Motivação, como nas suas próprias palavras:
“a motivação, ... , seria transferível a qualquer atividade, o que também constitui
uma simplificação considerável, já que mesmo nas condições ideais de comando ou
de organização resta um lugar para falhas humanas, erros ou acidentes que a
referência exclusiva à qualidade das relações de trabalho e da motivação não permite
explicar” (p. 34).
Em outras palavras, as relações instrumentais e diretas entre motivação e
desempenho não são suficientes para nem explicar o desempenho humano,
tampouco garantir determinado nível deste.
É interessante como se pode encontrar evidências implícitas que levem a esta
mesma conclusão em autores que tratam especificamente de motivação. O controle,
por exemplo, é interpretado como um nefasto integrante das organizações, o qual os
empregados tentam burlar quando possível e sendo também um agente responsável
pela queda de motivação dos funcionários. A solução apontada para evitar tal queda
é a participação dos empregados, o que garantiria maior produtividade e substituiria
o controle pelo compromentimento individual (Walton, 1990; Meyer et al., 1990).
O primeiro fato a se contradizer é a questão do fim do controle. Barker (1993)
apresenta que grupos auto-gerenciados, os quais reforçam a participação de todos,
45
acabam por exercer um controle ainda mais rigoroso do que aqueles anteriormente
impostos pela organização, apresentando inclusive tendências à normatização. Ou
seja, o controle em si não é o responsável pela queda ou aumento da motivação dos
empregados, mas sim, o que se esconde por trás do controle, que vem a ser
justamente os aspectos culturais da organização.
Talvez por inabilidade em identificá-los, ou por circunscrever o conceito de
controle àquele meramente praticado pela organização, os autores que consideram
o controle como enfraquecedor da motivação, assim o tenha classificado.
Na verdade, é possível que tal visão distorcida do controle seja fruto da
dicotomia existente entre a racionalidade instrumental ainda predominante nas
organizações e a consciência de ruptura mais forte do que sua vivência (Carvalho,
2002). O controle normativo, que pode ser classificado como artefato da
racionalidade instrumental, acaba sendo visto como expressão desta e, então, passa
a ser identificado como a fonte dos problemas para a motivação, quando na
verdade, o verdadeiro alvo da crítica, mesmo incoscientemente é a racionalidade
instrumental.
Há uma convergência entre esta afirmação e o que foi apresentado por Dejours
(1997). Guerreiro Ramos (1981) também coloca esta questão, sendo suas críticas
mais diretas. Segundo ele, o pensamento racional-positivista tende a abordar as
organizações e as suas dinâmicas internas como sendo passíveis de explicação
pelo ponto de vista estritamente psicológico. Isto porque esta racionalidade é
permeada por uma “orientação controladora do mundo”. Desta forma, sob este
prisma, a compreensão dos fenômenos organizacionais ficaria circunscrita aos
limites da psicologia.
46
Esta limitação da compreensão dos fenômenos organizacionais abre uma
lacuna que necessita ser preenchida. Esta seção justamente buscou apresentar
elementos que visam preenchê-la, baseando-se na pertinência das abordagens
sociológicas para cumprir tal papel.
Por fim, é importante ressaltar que não é papel desta seção esgotar a
apresentação daquilo tudo que envolve a compreensão dos fenômenos
organizacionais, dado inclusive o próprio título desta. Entretanto, durante o restante
do texto, outras inserções necessárias serão feitas, tudo com vistas à consecução
do objetivo desta pesquisa.
3.3 Métodos de Avaliação
Tomando-se por base os objetivos e princípios da Avaliação de Desempenho,
tem-se a situação na qual é necessário que as informações obtidas sobre os
integrantes da organização sejam as mais completas e precisas possíveis.
Assim, a avaliação efetuada deverá ser capaz de apresentar um perfil completo
e acurado do desempenho individual na organização. Para tanto, esta pode ser
efetuada de distintas formas. Caberá, então, à organização selecionar aquela que
ela julgue ser a melhor para que os objetivos de seu sistema sejam atingidos, bem
como ela pode se valer de mais de uma maneira para efetuar esta avaliação.
Bergamini et Beraldo (1988) apresentam três métodos mediante os quais a
Avaliação de Desempenho pode ser levada a cabo. São elas a Avaliação direta,
Avaliação conjunta e Auto-avaliação. A estas, Chiavenato (1999) acrescenta a
Avaliação pela equipe, Avaliação 360º e Avaliação para cima.
A Avaliação direta é aquela mais tradicionalmente conhecida. Nela, cabe ao
superior efetuar a avaliação de seus subordinados. É interessante observar que este
47
método está tão intrínseco na cultura administrativa, que alguns autores
simplesmente o consideram como o único método que deva ser utilizado, não
chegando sequer a fazer referência sobre os demais. Este é o caso, por exemplo, de
Stoffel (2000), Pontes (1999), Almeida (1996) e Lucena (1992). Ou ainda, quando se
chega a citar outro método, como é o caso de Böhmerwald (1999) ao falar da
avaliação do superior pelo subordinado, só o faz para criticá-la e censurá-la.
Gillen (2000), por outro lado, considera um anacronismo a utilização de somente
a avalação direta, isto porque, ao se pregar o trabalho em equipe, o
compromentimento de todos e a participação de todos na definição dos objetivos a
serem alcançados no trabalho, soa como contracenso, justamente na hora de se
avaliar como a equipe se saiu, que somente o chefe seja o dono da verdade.
Pode-se inferir ainda que tal tipo de procedimento passe a desencadear na
equipe o comportamento de que a participação na definição dos objetivos, bem
como o próprio desempenhar dos papéis, passem a ser pautados pelas expectativas
e preferências dos chefes, a quem os subordinados buscarão atender de forma a
serem melhor avaliados.
A Avaliação conjunta é uma variação do primeiro método apresentado. Nela,
não cabe só ao superior efetuar a avaliação. Este e seu avaliado devem preencher a
ficha de avaliação em conjunto, ou qualquer outro instrumento utilizado para
documentar a avaliação.
No outro extremo desta linha, encontra-se a Auto-avaliação. Nela, cabe ao
próprio avaliado o julgamento de seu desempenho, bem como o preenchimento da
ficha de avaliação, ou documento correspondente. Cabe acrescentar que,
normalmente, este método não é utilizado como único meio de avaliação, sendo
normalmente empregado em conjunto com algum dos outros apresentados.
48
A Avaliação pela equipe ocorre quando são os próprios membros da equipe de
trabalho os responsáveis pela elaboração da avaliação de cada um dos seus
membros. Esta também é conhecida como Avaliação lateral ou Avaliação 180º.
Um dos métodos considerados mais completos, mas também mais recentes, é a
Avaliação 360º. Em resumo, ela consiste na avaliação feita por todos aqueles que
circunscrevem a vida organizacional do avaliado: seu chefe, seus pares e seus
subordinados. Alguns modelos ainda incluem os chamados clientes internos e
externos e os fornecedores do avaliado.
Talvez pela sua recenticidade seja também um dos métodos mais criticados,
especialmente por aqueles que vêm a Avaliação direta como o único método
aceitável. A guisa de exemplo, cabe apresentar a crítica feita por Böhmerwald (1999,
p. 31):
“A avaliação no sentido inverso [do superior pelo subordinado] poderia desencadear
efeitos indesejáveis, tais como enfraquecimento ou mesmo perda da autoridade,
além de oferecer oportunidades para manifestações de revanchismo”.
Em resposta a este tipo de crítica, Edwards et Ewen (1996) apresentam que por
trás desse discurso encontra-se, na verdade, o medo que alguns superiores têm de
ser criticados, ou mesmo o medo que os subordinados têm de criticar. Eles ilustram
isso de forma interessante, apresentando como exemplo a resposta dos súditos da
estória infantil da Nova Roupa do Imperador, quando este os argüia sobre a beleza
de seus novos trajes.
Coens et Jenkins (2000) endossam esta posição, ao afirmarem que
“one positive influence of the 360-degree feedback movement has been greater
awareness of the multitude of people who can offer critical and useful information.
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While supervisory feedback is benefical, it makes little sense to design a feedback
process that facilitates feedback exclusively or predominantly from the supervisor”5.
Na realidade, não se pode esquecer que uma equipe, cujo mote dos trabalhos é
a participação, necessita de toda a informação útil para que seu trabalho possa ser
corretamente avaliado. Ademais, o receio citado anteriormente só será justificado se
o ambiente de relacionamento espontâneo e confiante apregoado por Bergamini et
Beraldo (1988) não existir. Caso isso não se verifique, então, poder-se-á dizer que a
avaliação de desempenho não está cumprindo o seu papel.
Ou seja, em qualquer uma das hipóteses, o trabalho não estaria funcionando
como desejado e talvez necessário para a prosperidade da organização. Desta
forma, tudo não passaria de uma ilusão ou de um estelionato administrativo na
tentativa de obter de cada integrante da organização o melhor de si, sem a devida
contrapartida.
Mais ainda, tal melhor de si seria baseado por aquilo que o superior acreditaria
ser o comportamento mais adequado, o que, em última instância, acabaria por
desprezar as contribuições autênticas de cada integrante da organização, perdendo
esta os potenciais ganhos advindos da diversidade de pensamento.
Em resumo, então, pode-se dizer que a avaliação de desempenho, mais um
meio do que um fim sem si, dependerá muito mais de como a organização
trabalhará seu todo – ponto no qual se volta a evocar a questão da interdependência
levantada por Coens et Jenkins (2000) – do que tratará exclusivamente de um ou
outro sistema.
5 “Uma influência positiva do movimento pela avaliação 360º tem sido a maior consciência damultiplicidade de pessoas que podem oferecer informação crítica e útil. Mesmo sendo o feedback dosupervisor é benéfico, faz pouco sentido desenhar um processo de feedback que o tenhapredominante ou exclusivamente do supervisor”.
50
Antes de encerrar, porém, cabe citar a existência também da Avaliação para
cima. Esta nada mais é do que uma variação do método anterior. A diferença
existente, então, limita-se a não ocorrência das avaliações laterais e da direta.
3.4 Etapas da Avaliação de Desempenho
Pelo que foi apresentado até agora, pode-se dizer que a sistemática de
Avaliação de Desempenho é um método para que a organização possa atingir todos
aqueles objetivos e propósitos determinados por ela. Considerando-se, então, este
foco, pode-se dizer que as suas etapas devem ser configuradas e controladas de
forma a, assim, conduzirem a organização aos resultados desejados.
Desta forma, para este fim, pode-se tomar da Qualidade Total o método do Ciclo
PDCA de controle. Segundo Campos (1992), este se constitui num método de
controle de processos.
Ainda segundo ele (ibidem, p. 29),
“os termos no Ciclo PDCA têm o seguinte significado:
Planejamento (P) – Consiste em:
a. estabelecer metas sobre os itens de controle; e
b. estabelecer a maneira (o caminho, o método) para se atingir as metas propostas.
...
Execução (D) – Execução das tarefas exatamente como prevista no plano e coleta de
dados para verificação do processo. Nesta etapa é essencial o treinamento no
trabalho decorrente da fase de planejamento.
Verificação (C) – A partir dos dados coletados na execução, compara-se o resultado
alcançado com a meta planejada.
Atuação corretiva (A) – Esta é a etapa onde o usuário detectou desvios e atuará no
sentido de fazer correções definitivas, de tal modo que o problema nunca volte a
ocorrer ”.
51
Tanto Böhmerwald (1999) quanto Stoffel (2000) adaptaram este método à
Avaliação de Desempenho. Entretanto, eles o fizeram sob diferentes perspectivas.
Para o primeiro (Böhmerwald, 1999), fica assim configurado o método:
a. Na etapa do planejamento – P – são definidos as metas para o modelo de
avaliação de desempenho que será utilizado.
b. Na etapa da execução – D – o modelo é executado, ou seja, ocorre a avaliação
propriamente dita.
c. Na etapa da verificação – C – os dados levantados são comparados com as
metas padrão.
d. Por fim, na etapa da atuação corretiva – A – são promovidas ações no sentido de
se corrigir os eventuais desvios encontrados no modelo.
Já Stoffel (2000) configurou desta forma o método:
a. Na etapa do planejamento – P – são estabelecidos as metas, os indicadores e os
controles do desempenho. Além disso, são previstos os recursos necessários à
consecução das metas, englobando estes os recursos materiais, tecnológicos e
financeiros.
b. Na etapa da execução – D – ocorrem os treinamentos necessários e a execução
da tarefa. Ou seja, é nesta etapa que se dá o desempenho.
c. Na etapa da verificação – C – se dá o que se chama de acompanhamento do
desempenho. Em resumo, são comparados os resultados obtidos com os
esperados. É importante frisar que acompanhamento não significa atuação
corretiva, com a qual pode ser confundida. Enquanto aquele é “a coleta ou
aquisição de dados ou informação sobre a execução” (Valeriano, 1998, p. 415),
52
esta faz uso destes dados e informação para sua avaliação e decisão de
correção.
d. Finalmente, na etapa da atuação corretiva – A – os dados levantados na etapa
anterior são analisados e são tomadas ações visando corrigir os desvios
encontrados.
A diferença básica entre as duas abordagens é que Böhmerwald (1999) foca a
sua no aperfeiçoamento do modelo de avaliação de desempenho em si, enquanto
Stoffel (2000) o faz com relação ao próprio desempenho individual.
Essa diferença é decorrente da própria visão que cada autor tem da avaliação
de desempenho. Conforme já foi visto, Böhmerwald (1999) considera a avaliação
direta como o único método a ser utilizado, portanto, sua abordagem trata
exclusivamente da operacionalização do mesmo, focando no aprimoramento do
instrumento. Justamente essa prescrição é o ponto fraco de sua abordagem, pelos
motivos já apresentados na seção anterior.
Já Stoffel (2000) apresenta uma abordagem que, conforme ele mesmo
denomina, visa administrar o desempenho. Por esta, avaliação de desempenho
deixa de ser o fim em si e sua validade estará atrelada à capacidade de
monitoramento e auxílio no aprimoramento do desempenho individual, sendo este
aprimoramento o fim último.
Tal posição é coadunada por Bader et al. (2000), de cuja argumentação acerca
da avaliação de desempenho extrai-se a dinâmica de um modelo que se iniciaria
com uma primeira avaliação, na qual os dados coletados serviriam de diretriz básica.
A partir daí, à medida que as outras avaliações fossem sendo feitas, seu novo
desempenho registrado seria comparado com a diretriz básica.
53
Esta dinâmica deixa uma lacuna em aberto. Mesmo considerando-se válida as
linhas gerais desta, certamente alguma performance mínima deve ser necessária
para que o desempenho no cargo apresente uma eficácia para o trabalho da
organização.
É justamente nesta lacuna que a administração do desempenho se encaixaria,
não só preocupando-se com padrões mínimos de eficácia, como também visando o
assessoramento dos diversos integrantes da organização para que estes padrões
sejam atingidos e aperfeiçoados ao longo do tempo.
É pertinente afirmar-se que, com relação à última etapa, sob a abordagem de
Stoffel (2000), cabe o seguinte adendo. Caso sejam identificadas como causas do
desempenho aquém do esperado fatores externos ao indivíduo, como falta de
recursos, a ação corretiva a ser tomada é mais facilmente determinada. Ou ainda,
caso seja perfeitamente identificável como sendo por falta de uma habilidade
requerida, também vale a afirmação anterior.
Já se as causas forem intrínsecas ao indivíduo, torna-se tarefa mais complexa
tomá-las. Entretanto, independente de como será procedida esta tarefa, há um ponto
que é de fundamental importância para o sucesso da ação corretiva: o feedback
dado ao indivíduo.
Normalmente o feedback é dado naquilo que um grande número de autores
chama de entrevista de avaliação. Como diz Pontes (1999, p. 140), “a Avaliação de
Desempenho é, antes de mais nada, um processo de comunicação”. Assim, a forma
com que os resultados da avaliação são comunicados aos avaliados tem uma forte
correlação com a maneira como eles reagirão a estes resultados.
Coda (1997) apresenta o processo de comunicação como sendo um dos fatores
que mais influenciam na satisfação dos indivíduos nas organizações, haja vista ser
54
este, entre outros, elemento de “adequação das informações recebidas ao correto
desempenho das atividades” e “instrumento facilitador da integração da empresa”
(ibidem, p. 104).
Gillen (2000) reforça ainda mais esta idéia ao colocar que a eficácia do sistema
de avaliação como um todo depende da forma como a avaliação é discutida entre o
avaliador e o avaliado. E não somente um fator chave, mas a maneira como o
feedback é feito também tem um papel importante em todo o processo da avaliação
de desempenho (Coens et Jenkins, 2000).
Voltando então ao que foi abordado sobre a correlação entre os fatores de
satisfação e a motivação individual, tem-se que este processo de comunicação,
especialmente no que se refere à Avaliação de Desempenho, tem o fundamental
papel de ser o catalisador para o alavancar do desempenho individual.
Complementando, Bergamini et Beraldo (1988, p. 192) ressaltam a importância
da entrevista de avaliação ao afirmarem que
“os empregados de uma empresa precisam necessariamente dessa orientação formal
[a entrevista], pois não se pode pretender que tenham claro para si mesmos seu
próprio nível de eficiência diante daquilo que deles é esperado”.
Stoffel (2000) ainda ressalta a importância de que não somente sejam
apresentados os aspectos negativos, nos quais o avaliado deverá se esforçar para
melhorar o seu desempenho. É também relevante que seja dado o reforço positivo
aos aspectos nos quais o avaliado destacou-se, a fim de que sua percepção de
valência sobre seu desempenho positivo em alguns aspectos possa contribuir para a
melhoria nos demais.
Mas nem mesmo a mais completa e franca discussão resultará em melhorias
efetivas do desempenho se durante o processo de feedback não forem
55
estabalecidas ou esboçadas ações necessárias para a correção das deficiências
levantadas ou das necessidades de aperfeiçoamento (Bader et al., 2000).
Para tal, portanto, boa vontade de ambas as partes não basta. É fundamental
que a organização possua meios para operacionalizar as mudanças necessárias.
Isso implica, portanto, na alocação de recursos destinados a tal fim, quaisquer que
sejam as suas naturezas.
Mesmo havendo os meios para se operacionalizar as mudanças necessárias, há
um componente que não pode ser esquecido, a disposição do avaliado em mudar.
Esta dependerá, dentre outros fatores, da validade que o avaliado der à sua
avaliação e ao interlocutor do feedback (McGregor, 1990). Podendo-se dizer,
também, que a preparação do avaliado para receber o feedback é outro aspecto a
ser observado e que deve ser fomentado na organização.
Além disso, também é importante que o tipo e a freqüência do feedback se
adequem às características do trabalho avaliado, incluindo-se nessas características
o tempo de exercício do cargo por parte do avaliado, bem como características do
próprio (Coens et Jenkins, 2000).
A utilização de um mesmo tipo de feedback, numa mesma freqüência, para
todos os cargos, pode ser comparado à utilização do relógio para medir a duração
de um evento, a distância entre dois pontos e o peso de algo. Dependendo de como
for feito, obter-se-á resultados em termos de tempo para cada uma dessas funções,
todavia, esta somente será efetivamente útil para uma delas.
A despeito da existência de todos os fatores supracitados que permitem que o
feedback tenha efeitos positivos, é de suma importância que a organização o veja
como mais um mecanismo de aprendizagem para a organização, preocupando-se
em criar o ambiente propício para tal. Um dos aspectos já comentados e o
56
considerado de maior impacto para esse objetivo é o reforço nos pontos positivos,
sobre os quais é melhor direcionar para um nivelamento das competências do que
focar nos pontos fracos (idem).
Com relação à questão da comunicação, cabe uma breve digressão.
Recordando o que foi discutido na seção 3.2 – Considerações Gerais sobre o
Desempenho Humano, tem-se que se pode considerar os fenômenos de cultura
como sendo fatos de comunicação (Eco, 1991).
Esta, por sua vez, é dependente do contexto no qual ocorre. Assim, tudo o que
foi citado até o momento sobre os fatores que influenciam a comunicação estão
subordinadas, antes de mais nada, ao contexto no qual ocorre a comunicação, de
forma que o significado da informação seja corretamente interpretado pelo avaliado.
No caso específico da avaliação de desempenho, no qual há os contextos de
julgamento e auxílio para o aperfeiçoamento do desempenho, requerendo cada qual
um papel diferente por parte do avaliador, a possibilidade de que seu feedback
venha efetivamente a se transformar em subsídios para que o avaliado se
aperfeiçoe está relacionada a uma cultura de confiança mútua entre o avaliador e o
avaliado de que o feedback fornecido por aquele visa, acima de tudo, o
aprimoramento do avaliado.
Isto, por sua vez, encontra uma ligação com a Teoria do Agir Comunicativo de
Habermas (Tenório, 2000).
Dejours (1997) apresenta uma síntese bem elaborada dos tipos de agir.
Segundo ele, o agir pode ser instrumental (ou estratégico), moral-prático (ou
comunicativo) ou expressivo (ou dramatúrgico). O primeiro é o utilizado visando um
objetivo, submeter o mundo físico ao seu próprio interesse, levando-se em conta os
comportamentos dos outros. O segundo já é “orientado para o entendimento,
57
suporta o objetivo do viver em conjunto e diz respeito à vida boa”. O terceiro, por fim,
estaria ligado à intersubjetividade, ao sujeito transmitir a legitimidade de sua ação a
outro.
A estes três tipos de ação, Ingram (1987) acrescenta o agir normativo, que é
uma ação social na qual a intenção primordial das partes envolvidas é atender
reciprocamente às expectativas, adequando seus comportamentos às normas e
valores sociais.
As fronteiras entre cada tipo de ação não são tão fáceis de serem delimitadas,
isto porque se pode afirmar que é praticamente impossível encontrar uma ação que
seja puramente instrumental, normativa, comunicativa ou expressiva. O que se tem
é que cada ação desenvolvida num plano refletirá nos demais, em maior ou menor
intensidade.
Entendimento é a palavra-chave no Agir Comunicativo. Através dele é que o
objetivo de “viver em conjunto” será alcançado. Mas a noção de viver em conjunto
pode, e deve, ser ampliada para a de consenso também. Não se pode pensar em
viver em conjunto como sinônimo de tolerar a convivência. Pois esta, na verdade, se
caracteriza mais como ação estratégica do que como ação comunicativa. Afinal de
contas, a tolerância pura e simples é unicamente o reconhecimento da
impossibilidade de supressão do outro. Desta forma, o entendimento deve ser a
tônica no viver em conjunto, a fim de que, então, o conjunto chegue a um consenso
e, como um todo, caminhe para a mesma direção.
Não se pode imaginar que o entendimento possa ser alcançado sem serem
considerados os fatores que nele influenciam. Assim, pode-se caracterizar o
processo de se chegar a um entendimento como sendo composto pelas seguintes
etapas (Aragão, 1992):
58
- o intérprete deve estar familiarizado com as condições de validade do
proferimento (considerando-se um ato de fala);
- ele deve observar sob quais condições estas são aceitas como válidas;
- conhecer as razões implícitas que levaram os participantes a assumirem
suas posições; e
- finalmente, o intérprete também deve ser conduzido para o interior do
processo de afirmação das pretensões de validade.
Habermas (1991) reafirma a importância da linguagem no processo da ação
comunicativa ao afirmar que atos de fala podem fazer a ligação dos planos de ação
de um ator com os dos outros atores, mediante a motivação racional da
concretização de se obter um entendimento, melhor do que o exercício do poder.
Pode-se ainda apresentar mais uma posição, na qual se considera que,
somente no caso da ação comunicativa há realmente entendimento. Alexander
(1991, p. 63), ao estudar a Teoria Crítica de Habermas, diz que a ação estratégica
não envolve nem entendimento, tampouco intenção de comunicação, o máximo a
que ela se permite é um emprego não comunicativo do conhecimento.
Ingram (1987, p. 35) também alerta para o fato de que, sociologicamente
falando, como qualquer ação provoca alterações no contexto social da vida, não há,
diria-se assim, entendimento neutro.
Desta forma, então, pode-se concluir esta seção não somente reforçando a
importância do feedback em si, mas principalmente, tendo-se em mente o quão
complexo é o processo de comunicação (para que este possa efetivamente
contribuir para a eficácia do feedback), envolvendo uma série pressupostos de
sócio-antropológicos, que, a despeito da importância de cada etapa da avaliação de
desempenho, há necessidade de uma melhor preparação por parte dos
59
responsáveis em fazê-lo, justamente para que um feedback mal fornecido não venha
por abaixo a validade de todo um sistema.
3.5 Os Instrumentos de Avaliação
Uma atenção especial deve ser dada ao instrumento de avaliação que será
utilizado no processo. Isto porque, mesmo considerando que há outras questões
mais importantes em Avaliação de Desempenho, ele ainda é o maior alimentador de
dados do sistema, se não o único, na grande maioria das organizações.
Pode-se dizer que o instrumento de avaliação tem por objetivo o de registrar os
dados de desempenho do trabalho do indivíduo de forma a se verificar sua
adequação ao desempenho previsto. Bergamini et Beraldo (1988, p. 132) dizem que
“dois elementos são necessariamente considerados nesse momento e devem
convergir para o mesmo ponto: as características de trabalho em si e as possíveis
variações comportamentais que podem ser exibidas ao executá-lo”.
Tomando-se isso, então, os instrumentos a serem utilizados poderão variar
enormemente, tanto em forma quanto em conteúdo, não só dependendo da
organização, mas também dentro das características do cargo ocupado.
Vale relembrar que a construção do instrumento de avaliação deverá ser guiado
para que os dados coletados possam ser úteis na consecução dos objetivos
propostos pelo sistema. Para tanto, é importante a observação de Bader et al.
(2000) para que a avaliação ocorra somente sobre o que interessa à organização
para aquele fim. Do contrário, ela corre o risco da ineficácia.
Esta posição é reforçada por Oberg (1990), o qual atribui à adequação da
escolha com relação aos objetivos do sistema o sucesso do mesmo. Ou seja, a
60
prática da avaliação deverá estar de acordo com o seu propósito, sendo o
instrumento de avaliação engrenagem fundamental desta prática.
Para que tais aspectos sejam observados, é mister que a organização esteja
alerta ao fato de que normalmente os instrumentos focam no desempenho individual
do cargo, como se fosse possível isolar tal fenômeno. Desta forma, esta limitação
pode fazer com que o instrumento seja incapaz de efetivamente coletar os dados
necessários à avaliação do desempenho. Assim, caberá à organização estar alerta a
isso (Lenvinson, 1990b) e criar mecanismos para suplantar tal deficiência de
informação.
Independente de qual seja o instrumento de avaliação, o mesmo deverá ser
elaborado observando-se alguns critérios, condições sine qua non para que os
indivíduos da organização o percebam como adequado para atingir os objetivos e
propósitos aos quais se destina. Bergamini et Beraldo (1988) os apresentam como
sendo a confiabilidade, validade, sensibilidade, objetividade e simplicidade.
No que tange à confiabilidade, é o critério que permite que, sob as mesmas
condições, dois desempenhos semelhantes sejam medidos de forma semelhante.
A validade é o critério que está intimamente relacionado aos objetivos do
sistema. Ou seja, o instrumento deve permitir, por exemplo, que indivíduos de
desempenhos explicitamente melhores sejam assim classificados. É importante
frisar, porém, que não basta verificar a validade do instrumento como um todo, mas
também devem ser testados todos os seus itens.
O critério da sensibilidade é percebido pela capacidade do instrumento em
discriminar as diferenças das pessoas que estão sendo avaliadas.
61
Já quanto à objetividade, pode-se dizer que um instrumento é objetivo quando
ele consegue minimizar que as tendências do avaliador influenciem no resultado da
avaliação.
Neste ponto, a fim de ressaltar a importância deste critério, toma-se emprestado
um conceito de Economia Política, derivado do public choice. Monteiro (2000, p. 15)
afirma que em Política Econômica é importante
“estabelecer um conjunto de regras que funcionem bem, independentemente de
quais sejam os comportamentos individuais desses participantes [os participantes do
jogo do governo representativo]”.
Assim, por analogia, pode-se dizer que é de suma importância que o
instrumento de avaliação funcione bem, independente de quais sejam as tendências
do avaliador. Se isso for conseguido e, acima de tudo, percebido pelos integrantes
da organização, o próprio instrumento será visto como sendo mais confiável.
Esta posição também é adotada por Barbosa (2001, p. 34), quando ela diz que
“é preciso fazer com que os processos avaliativos sejam os mais objetivos possíveis,
no sentido de medir o mais exatamente possível o desempenho de cada um, sem
distorções resultantes de interesses particulares ou da subjetividade dos avaliadores”.
Por fim, tem-se a simplicidade. As pessoas nas organizações certamente
possuem outras tarefas além da de avaliar. Assim, seus tempos devem ser divididos
de forma que possam arcar com todas as suas responsabilidades. Desta forma, um
instrumento complexo pode gerar dúvidas, prejudicando a validade e a
confiabilidade do instrumento, bem como reduzir a predisposição do avaliador para
utilizá-lo, prejudicando o resultado da avaliação.
62
É importante que se observe que, na verdade, estes cinco critérios
apresentados são interdependentes. Normalmente, o rigor na observância de um
deles contribuirá para o aprimoramento dos demais.
Observados, então, os critérios balizadores para a elaboração do instrumento,
tem-se os diversos tipos de instrumentos que podem ser utilizados.
Antes, porém, de serem apresentados os diversos tipos, é importante ressaltar
que o método a ser utilizado deve ser construído de forma a se minimizar os “fatores
que contribuem para uma deterioração da validade dos sistemas de Avaliação de
Desempenho” (Almeida, 1996, p. 34). São eles o estereótipo, o efeito de halo, o erro
de contraste, o erro de semelhança, o erro de primeira impressão e os fatores
situacionais (Bergamini et Beraldo, 1988; Lucena, 1992; Pontes, 1999; Böhmerwald,
1999; Stoffel, 2000; Bader et al., 2000, Gillen, 2000; Coens et Jenkins, 2000).
O estereótipo deve ser entendido na semântica de sua palavra, ou seja, um
juízo particular baseado numa falsa pressuposição sobre determinado grupo ao qual
a pessoa pertença.
O efeito de halo é “a tendência para classificar uma pessoa uniformemente nos
vários elementos componentes da avaliação, por efeito de uma apreciação global”
(Almeida, p. 34).
O erro de contraste “ocorre quando o avaliador é influenciado por avaliações
feitas anteriormente” (idem). Neste caso, tanto faz se são as avaliações passadas do
indivíduo ou a avaliação de um outro indivíduo com o qual se compara o primeiro.
Quando o avaliador possui afinidades com o avaliado, quer seja por
pertencerem a mesmos grupos sociais fora da organização ou por questões de
gostos e valores, pode ocorrer o erro de semelhança. Ou seja, o avaliador pode ter a
63
noção de que, por exemplo, uma má avaliação deste indivíduo em questão
signifique uma má auto-avaliação.
O erro de primeira impressão, como o próprio nome diz, é decorrente da
primeira impressão que o avaliador tem do avaliado permanecer, independente do
comportamento deste mudar ou não.
Por fim, os fatores situacionais são aqueles que podem contribuir para um
enviesamento da avaliação. Por exemplo, características do avaliado que são
irrelevantes para o desempenho são sobrevalorizadas, ou particularidades da
organização que valorizam tais características individuais, independente da sua
correlação com o desempenho.
Almeida (1996) faz uma divisão inicial dos instrumentos obedecendo a seguinte
classificação: resultado de funções individuais, instrumentos tradicionais de
atribuição de pontos, instrumentos de ordenação e instrumentos baseados em
observação de comportamentos. A esta classificação segue-se uma nova divisão
dentro de cada categoria supracitada.
Chiavenato (1999) já apresenta uma classificação mais simples, que englobam
as classificações feitas por Almeida (1996), composta dos seguintes instrumentos:
escalas gráficas, escolha forçada, pesquisa de campo e incidentes críticos.
Classificações semelhantes também são apresentadas por Bergamini et Beraldo
(1988), Lucena (1992) e Pontes (1999). Já Böhmerwald (1999) e Stoffel (2000)
limitam-se a apresentar o instrumento julgado por eles como sendo o mais
adequado.
Cabe agora, então, detalhar cada um dos instrumentos apresentados.
O Instrumento das Escalas Gráficas é “baseado em uma tabela de dupla
entrada: nas linhas estão os graus de avaliação e nas colunas estão os graus de
64
avaliação do desempenho” (Chiavenato, 1999, p. 195). Podem ocorrer algumas
variações, mas o cerne do instrumento permanece o mesmo.
Este instrumento possui alguns pontos positivos e outros negativos. São seus
pontos positivos (Chiavenato, 1999, Bergamini et Beraldo, 1988 e Pontes, 1999):
- facilidade de planejamento e de construção do instrumento de avaliação,
segundo as características mais valorizadas pela organização;
- simplicidade e facilidade de compreensão e de sua utilização;
- visão gráfica e global dos fatores de avaliação envolvidos; e
- facilidade na comparação dos resultados de vários funcionários.
São seus pontos negativos (idem):
- superficialidade e subjetividade na avaliação do desempenho;
- produz efeito de generalização (efeito de Halo);
- produz efeito tendência central;
- peca pela categorização e homogeneização das características
individuais;
- limitação dos fatores de avaliação: funciona como sistema fechado;
- rigidez e reducionismo no processo de avaliação;
- deixa dúvidas quanto às gradações utilizadas;
- dificulta o entendimento do feedback do resultado por parte do
avaliado; e
- avalia apenas o desempenho passado.
A escolha forçada, também conhecida como frases descritivas, é o instrumento
no qual são apresentados blocos de frases descritivas num formulário e o avaliador
deve escolher aquela que mais se adequar ao comportamento do avaliado.
65
São os pontos positivos desse instrumento (Chiavenato, 1999 e Bergamini et
Beraldo, 1988):
- evita o efeito de generalização (efeito de Halo) na avaliação, isso se
forem misturadas as frases que apresentam as diversas gradações das
características;
- evita o efeito tendência central;
- reduz a influência pessoal do avaliador, isto é, a subjetividade;
- apresenta maior precisão nos itens;
- ocasiona menos dúvidas no momento da avaliação e na compreensão
de seu feedback; e
- requer menos treinamento dos avaliadores para sua aplicação.
São seus pontos negativos (idem):
- complexidade no planejamento e na construção do instrumento,
necessitando de maior tempo para o levantamento dos dados e para a
implantação na organização;
- não proporciona uma visão global dos resultados da avaliação; e
- não permite comparações.
O terceiro instrumento é o da pesquisa de campo, a qual consiste em
entrevistas entre um especialista em avaliação e o gerente do avaliado, os quais,
conjuntamente, procedem à avaliação.
São seus pontos positivos (Chiavenato, 1999 e Pontes, 1999):
- envolve a responsabilidade de linha (o gerente avalia) e a função de staff
(o DRH assessora) na avaliação de desempenho;
66
- permite planejamento de ações para o futuro, como o desenvolvimento
profissional de cada um; e
- permite um diagnóstico padronizado do desempenho dos funcionários.
São seus pontos negativos (idem):
- custo operacional elevado por exigir a assessoria de especialista; e
- processo de avaliação lento e demorado.
Além dos pontos positivos e negativos, a eficácia deste instrumento dependerá
muito da competência do staff para conduzir as entrevistas, bem como a própria
relação entre o gerente e o staff e como as entrevistas serão conduzidas. Estes
pontos tem relação com o que foi abordado anteriormente sobre a comunicação.
Por fim, o instrrumento dos incidentes críticos é aquele que se baseia no registro
de “características extremas (incidentes críticos) que representam desempenhos
altamente positivos (sucesso) ou altamente negativos (fracasso)” (Chiavenato, p.
198).
São seus pontos positivos (Chiavenato, 1999 e Pontes, 1999):
- calcado em fatos reais;
- enfatiza os aspectos excepcionais do desempenho. As exceções
positivas devem ser realçadas e melhor aplicadas, enquanto as
exceções negativas devem ser eliminadas ou corrigidas; e
- instrumento de fácil montagem e fácil utilização.
São seus pontos negativos (idem):
- não se preocupa com aspectos normais do desempenho;
- peca pela subjetividade, pois o conceito de incidente crítico pode diferir
de pessoa para pessoa; e
67
- peca por fixar-se em poucos aspectos do desempenho. Donde sua
tendenciosidade e parcialidade.
É importante frisar que os pontos positivos de cada instrumento só se
transformarão em ganhos para a organização se a mesma estiver imbuída do
objetivo de criar um ambiente propício para o desenvolvimento das pessoas,
principalmente no que se refere à comunicação, participação e cooperação. Pelo
mesmo motivo, ou pela combinação de distintos instrumentos, os pontos negativos
de cada instrumento podem ser minimizados, já que cada um contempla indicações
diferentes que servirão a objetivos e propósitos diferentes (Bader et al., 2000).
De qualquer forma, é importante também que se tenha em mente que por mais
abrangentes e complementares que sejam os instrumentos utilizados, discretas
diferenças de desempenho poderão não ser detectadas pelos mesmos, o que tem
como conseqüência imediata a possibilidade de dois integrantes da organização
terem a mesma avaliação, mas, de fato, possuírem desempenhos distintos. Com
isso, então, a organização deverá atentar para que a avaliação de desempenho não
acabe por se tornar um fim em si, resultando em futuras má decisões pelos dogmas
assumidos de seus resultados.
Por fim, concluindo esta seção, é bom relembrar que
“deve-se ter bem claro que o sucesso da avaliação de desempenho bem como seu
fracasso podem também ser determinados pela boa ou má qualidade do instrumento
que se está colocando em uso, tendo esse aspecto tanta importância quanto os
demais” (Bergamini et Beraldo, 1988, p. 167).
68
3.6 Avaliação de Desempenho na Administração Pública
Como é de se supor, o Exército Brasileiro não é o único órgão público a adotar
uma sistemática de Avaliação de Desempenho, vários outros também o fazem.
Entretanto, verifica-se a ocorrência de distintas sistemáticas, as quais variam desde
os objetivos quais devam atingir, passando por todos os tópicos relacionados à
atividade de avaliação, já apresentados neste capítulo. Esta variação ocorre
inclusive dentro de um mesmo órgão, neste caso normalmente quando da
implantação de uma nova sistemática distinta da empregada até então, servindo de
laboratório.
A ocorrência de tal diversidade deve ser analisada com grande interesse, pois
dela poderão ser obtidas idéias para o aperfeiçoamento dos sistemas utilizados,
quer seja pela adoção de alguma prática adotada por outro órgão ou pelo resultado
da reflexão sobre o próprio sistema utilizado.
De forma breve, então, apresenta-se-á a seguir um comparativo entre a
sistemática de Avaliação de Desempenho utilizada pela Delegacia da Receita
Federal de Belém (DRF/Belém), a Fundação Joaquim Nabuco (FJN), o Serviço
Federal de Processamento de Dados (SERPRO), a Secretaria Federal de Controle
(SFC), a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) e a
Universidade Federal de Uberlândia (UFU).
Todos os dados apresentados nas subseções que se seguem são fruto de uma
pesquisa da Escola Nacional de Administração Pública (Brasil, 2000a). Para melhor
atender aos objetivos desta dissertação, extraiu-se da pesquisa apenas o que é
considerado mais relevante para este estudo, o que não significa dizer, porém, que
esta abordagem esgota o assunto, pois há outros elementos os quais não foram por
ela explorados.
69
3.6.1 Própositos e Objetivos
Ao se visualizar os propósitos e objetivos dos distintos sistemas utilizados,
contabiliza-se um universo de dezesseis itens. Destes, alguns contemplam a quase
totalidade dos órgãos pesquisados, enquanto outros são encontrados em somente
um ou dois sistemas.
As três ocorrências mais freqüentes são: (1) desenvolvimento e capacitação de
pessoal – abrangida por todos os sistemas, (2) promoção e (3) progressão salarial
por mérito. Sendo que as duas últimas somente não são encontradas no sistema da
SFC. No outro extremo, tem-se a (1) demissão, (2) a seleção, (3) a punição e (4) a
assistência social. As duas primeiras existindo somente no sistema do SERPRO, a
terceira somente no da EMBRAPA e a última no da FJN.
Com relação aos órgãos especificamente, tem-se que a FJN e a EMBRAPA,
com respectivamente onze e dez objetivos, são os órgãos que prevêem a mais
ampla gama de finalidades para o sistema. No outro extremo tem-se a SFC, cujo
sistema conta com apenas dois objetivos: (1) o desenvolvimento e capacitação de
pessoal e (2) a informação para outros sistemas de avaliação e premiação.
O exposto já permite que se identifique a existência uma forte convergência com
relação ao que poderia se chamar de principais objetivos do sistema,
especificamente com relação ao objetivo de desenvolvimento e capacitação de
pessoal, o qual pode ser destacado como o objetivo principal dos sistemas de
avaliação de desempenho.
Por outro lado, ao se observar a ocorrência de uma variada gama de objetivos
em dois órgãos, contrastando com a SFC que tem apenas dois objetivos, pode-se
dizer que os sistemas daqueles órgãos apresentam uma propensão muito maior a
70
não conseguir comprir seus papéis, justamente pela dificuldade que já foi levantada
anteriormente de um sistema conseguir contemplar vários objetivos distintos,
dependendo de como estiver estruturado, bem como devido ao antagonismo natural
existente entre a adoção de objetivos de premiação e de desenvolvimento ocorrendo
concomitantemente, problema já explorado na seção 3.1 – Propósitos e Objetivos da
Avaliação de Desempenho.
3.6.2 Os Métodos de Avaliação
Assim como se verificou uma variedade de objetivos e propósitos na
comparação dos diversos sistemas, também se verificou a ocorrência de quase
todos os métodos apresentados na seção 3.3 – Métodos de Avaliação, sendo que
somente a Avaliação Conjunta não é utilizada.
A participação da chefia imediata é exclusiva somente em dois sistemas, sendo
que nos demais há participação dos pares. A participação dos subordinados é
verificada como regra somente em um órgão, podendo ainda ocorrer num outro.
Especificamente a respeito de cada órgão, tem-se que a EMBRAPA apresenta
maior flexibilidade quanto à adoção dos métodos. Além da chefia imediata, cabe a
cada setor o estabelecimento das figuras dos avaliadores, os quais poderão ser os
pares, os próprios avaliados (auto-avaliação) e os subordinados, havendo
combinações entre estes elementos. De qualquer forma, os resultados,
independente do método utilizado, são compilados por um comitê composto por
representantes dos empregados e pelas chefias.
Na DRF/Belém, participam como avaliadores as chefias, os próprios avaliados e
os subordinados.
71
Na FJN, a avaliação que ocorre é somente a Direta, mesmo quando o
funcionário estiver lotado em área diferente da sua de origem, sendo que, neste
último caso, prescreve-se a consulta à chefia do local no qual o funcionário
efetivamente trabalhava para efeitos da avaliação.
Na UFU ocorre a Avaliação pela Equipe. Todavia, há a restrição de que, no
máximo, vinte integrantes participem da avaliação, sendo que a chefia
obrigatoriamente inclui-se neste universo.
A Avaliação pela Equipe também é norma no SERPRO, sendo que, neste caso,
o número de pares que participam é somente de três, todos escolhidos pelo
avaliado, além da participação da chefia imediata. Lá também ocorre a auto-
avaliação.
Por fim, a SFC utiliza-se somente da Avaliação Direta.
Em princípio, deveria-se esperar uma variação nos métodos em paralelo com a
variação no número de objetivos em cada órgão. Todavia, as variações encontradas
diferem.
Já se argumentou na seção anterior da provável dificuldade em que os sistemas
da FJN e da EMBRAPA incorrem para que seus objetivos sejam atingidos. Uma
maior gama de objetivos distintos pressupõe uma maior e melhor capacidade de
uniformização tanto na coleta, quanto na tabulação e interpretação dos dados sobre
o desempenho humano no trabalho.
Ora, a uma primeira vista, pode-se perceber que os sistemas dos órgãos
supracitados correm em direção contrária. Pelas suas construções, os mesmos
tendem mais a dificultar a comparabilidade dos resultados do que a facilitar.
A partir do momento em que, no caso da FJN, por exemplo, a chefia direta
avalia o funcionário mesmo quando este se encontra efetivamente exercendo sua
72
atividade profissional em área distinta, abre-se margem para distorções na
percepção do desempenho, mesmo quando há a consulta à chefia do local no qual o
funcionário efetivamente trabalhava, pois não se pode garantir nem a colaboração
plena entre as duas chefias no tocante à troca de informações, bem como há o risco
de que ruídos na comunicação gerem distorções e, ainda, há inclusive a questão da
validade que a chefia direta atribuirá às informações passadas pela outra.
O sistema da EMBRAPA apresenta um quadro ainda mais complexo no que se
refere à capacidade de atingir os seus objetivos. Por exemplo, promoção e
desenvolvimento pessoal são dois dos objetivos contemplados pelo sistema. Além
do conflito existente entre objetivos de natureza originariamente antagônica, a
flexibilidade existente na adoção do método, dotando cada departamento de
autonomia, certamente dificulta a uniformização das informações, mesmo havendo a
compilação pelo comitê, pois esta, em princípio, por tratar somente com dados já
coletados, provavelmente atua mais na questão da formatação dos mesmos do que
na avaliação do conteúdo.
Desta forma, mais especificamente aos objetivos relacionados à premiação
ficam mais seriamente comprometidos que os ligados ao desenvolvimento, já que
modelos diferentes utilizados por distintos departamentos tem grande tendência a
gerar comparações enviesadas.
Fechando esta seção, então, pode-se perceber que a adoção dos métodos sem
que os mesmos estejam intimamente relacionados com os objetivos dos sistemas
aos quais devem servir, tendem a comprometer tanto o alcance dos objetivos quanto
a validade dos resultados do sistema.
73
3.6.3 Os Instrumentos de Avaliação
A variada gama de possibilidades de instrumentos de avaliação pode ser
verificada na seção 3.5 – Os Instrumentos de Avaliação, bem como os pontos
positivos e negativos de cada um e a importância da construção do instrumento.
Todavia, é curioso observar que, com exceção da UFU, todos os órgãos
pesquisados utilizam instrumentos bastante semelhantes, ocorrendo poucas
variações entre eles.
A Escala Gráfica é o instrumento utilizado por eles, sendo que a EMBRAPA
utiliza dois formulários, um buscando atingir os objetivos relacionados com o
desenvolvimento pessoal do avaliado e o outro, chamado de avaliação
complementar, relacionado aos objetivos de premiação, como promoção e
progressão salarial.
É interessante notar o peso que é dado por atividades no formulário de
avaliação de desempenho. Todavia, a despeito destes pesos buscarem brindar o
instrumento com uma maior precisão, dois problemas emergem.
Inicialmente, tem-se a questão de que “no serviço público, entre os problemas
enfrentados para a avaliação de desempenho, está a definição genérica de cargos e
funções” (Brasil, 2000a). Ou seja, mesmo que o peso vise a obtenção de uma
medição mais precisa, se o que se deve medir não é definido corretamente, a
validade da medição obtida certamente não poderá ser tomada como totalmente fiel
à realidade.
Além disso, um instrumento fechado, no qual pontuações indicam o patamar de
desempenho individual, dificilmente é capaz de fornecer os subsídios realmente
necessários à adoção de medidas de desenvolvimento pessoal. Esta observação
74
não se restringe ao instrumento utilizado pela EMBRAPA, sendo estendível aos
instrumentos utilizados pelos demais órgãos.
A DRF/Belém utiliza três formulários em seu sistema: formulário de
competências, formulário de contratação e avaliação de metas e formulário de
síntese da avaliação. Destacando-se neste caso a escala composta por cinco
conceitos distintos, o que pode contribuir para a ocorrência do efeito de tendência
central.
Instrumentos similares são utilizados pela FJN, SERPRO e SFC, com as
seguintes particularidades: o sistema da FJN também adota pesos distintos para
fatores, o do SERPRO é informatizado e o da SFC também é possuidor de
características que podem contribuir para a ocorrência do efeito de tendência
central.
O instrumento utilizado pela UFU pode ser classificado como uma pesquisa de
campo, seguindo a taxionomia apresentada na seção 3.5 – Os Instrumentos de
Avaliação. São dois os formulários utlizados, sendo um para a auto-avaliação do
funcionário e outro para a avaliação feita pelo grupo. O mais interessante é que este
é o único caso, dentre os descritos, que não utiliza um sistema fechado, ou seja, o
resultado não é um simples conceito ou índice final.
A apresentação dos instrumentos de avaliação utilizados, em contraste com os
métodos e os objetivos dos diversos sistemas permite concluir que, em linhas gerais,
há uma série de incongruências internas e deficiências a serem corrigidas na
maioria dos órgãos apresentados.
Estas encontram-se deste as definições de objetivos antagônicos entre si,
passando pela escolha de métodos que não contribuem para a consecução dos
objetivos estabelecidos, culminando com a escolha de instrumentos que vem
75
agravar ainda mais os problemas trazidos pela errônea escolha de alguns dos
métodos e que fazem suscitar novos.
Ademais, a maioria dos sistemas peca por uma instrumentalidade excessiva,
instrumentalidade essa no sentido dado pela seção 3.2 – Considerações Gerais
sobre o Desempenho Humano – à maneira positivista de se abordar a questão da
motivação para o trabalho. Porém, mesmo que se considerasse válida esta
abordagem, a crítica feita acerca da descrição genérica dos cargos e funções
acabaria por suscitar problemas de validade na medição dos instrumentos, fazendo
com que tais problemas refletissem na validade do próprio sistema.
Os vários problemas verificados nos sistemas apresentados encontram eco nos
resultados de algumas pesquisas sobre avaliação de desempenho, as quais são
apresentadas na seção que se segue.
3.7 Resultados de outras Pesquisas
Por mais controversa e polêmica que se apresente, mesmo sendo reconhecida
como um tema de grande importância, a avaliação de desempenho não tem sido
objeto de muitos trabalhos acadêmicos. Pode-se especular pelas razões que levam
a esta situação, somente especular, mas não afirmar.
Justamente por se tratar de um tema controverso, talvez alguns acadêmicos
prefiram não se expor em demasia ao julgamento que deles se fará por adotar uma
ou outra posição com relação ao tema, pois é praticamente impossível ingressar na
seara de uma polêmica mantendo-se neutro com relação a mesma.
Outro motivo, ainda, reside na questão da instrumentalidade. Para os adeptos
da Teoria da Motivação e das correlatas que embasariam a avaliação de
desempenho, esta seria apenas conseqüência da operacionalização dos
76
pressupostos da teoria na prática organizacional. Portanto, a questão da avaliação
de desempenho passaria a ter um papel secundário ou intelectualmente menos
estimulante.
Entretanto, acredita-se que o apresentado na seção 3.2 – Considerações Gerais
sobre o Desempenho Humano – já é suficiente para mostrar como a avaliação de
desempenho está longe de ser intelectualmente menos estimulante, tampouco
conseqüência simples da aplicação de teorias sobre motivação e afins.
Desta forma, apresenta-se a seguir as pesquisas sobre avaliação de
desempenho relatadas em dissertações de Mestrado de algumas instituições, sendo
as mesmas dispostas das mais recentes para as mais antigas.
De forma a sistematizar as apresentações das pesquisas, bem como fazê-las de
forma suscinta, opta-se por apresentar o objetivo principal, a metodologia utilizada e
as conclusões. Quando for o caso, algumas observações adicionais são feitas.
A pequisa de Lang (2001, p. 3) teve por objetivo
“fornecer uma visão geral sobre a teoria e realidade e relacionar os indicadores
capazes de auxiliar a implantação de um programa de Avaliação de Desempenho
Humano”.
A metodologia utilizada foi tanto a bibliográfica quanto a pesquisa de campo, a
qual se constituiu de entrevistas efetuadas em uma organização.
Das conclusões da pesquisa, cabe destacar:
- há uma grande lacuna entre a teoria e a prática na avaliação de
desempenho;
- necessidade de um preparo e melhoria da capacitação técnica dos
profissionais relacionados aos recursos humanos durante a implantação
do sistema;
77
- importância da divulgação ampla e clara do programa de avaliação de
desempenho a todos os integrantes da organização;
- importância do estabelecimento conjunto entre avaliadores e avaliados
dos objetivos a serem alcançados;
- necessidade de flexibilidade do sistema para se adequar tanto ao tipo de
organização, quanto ao setor da mesma e para ser modificado quando
necessário; e
- necessidade de conhecimento da cultura da organização para a que o
sistema adotado seja eficaz.
A segunda pesquisa apresentada é a de Gago (2001), cujo objetivo era (p.20)
“identificar os procedimentos de Avaliação de Desempenho utilizados atualmente
pela Unicred Florianópolis, verificando sua compatibilidade com as teorias das
Organizações em Aprendizagem”.
Para que tal objetivo fosse alcançado, utilizou-se da pesquisa bibliográfica e
documental, aliada à pesquisa de campo, constituida de questionários e entrevistas
não estruturadas.
As conclusões da pesquisa foram:
- o modelo de avaliação de desempenho adotado devará ser construído
considerando-se as peculiaridades culturais da organização;
- este também deverá ser guiado pela maneira como a organização avalia
seus resultados, para que haja compatibilidade entre como os gerentes
são avaliados e como esses avaliam seus subordinados;
- o modelo deverá ser construído com a participação de todos os
envolvidos no sistema; e
78
- devido à posturas partenalistas e autocráticas da organização, o objetivo
de desenvolvimento das pessoas não é atingido.
Farah (2000) é o autor da terceira pesquisa, cujo objetivo foi o de
“verificar a consistência entre um certo conjunto de valores [éticos] aceitos
consensualmente e a conduta das empresas em relação a seus empregados, conduta
essa que se expressa, entre outras ações, na prática dos processos avaliativos” (p.8).
A lista de valores utilizada foi definida com base nas convenções da
Organização Internacional do Trabalho e na Declaração Universal dos Direitos do
Homem, da Organização das Nações Unidas, vistos sob à ótica da Ética Humanista.
A metodologia utilizada constituiu-se de pesquisa bibliográfica e pesquisa de
campo, a qual constituiu-se de um questionário enviado a 260 empresas, das quais
34 responderam.
A principais conclusões da pesquisa foram:
- os sistemas são, em sua quase totalidade, subjetivos, não baseados em
evidências factuais;
- somente a Avaliação por Objetivos e por Incidentes Críticos são
“eticamente promissores” – os demais não o são (Comparação aos
Pares, Distribuição Forçada, Ordenamento, Escolha Forçada e Escalas
Gráficas);
- os processos avaliativos são injustos, pois: faltam mecanismos capazes
de assegurar a consistência das avaliações, eles impõem discriminação
com respeito às categorias que devam ser avaliadas, são mais rigorosos
em cobrar o desempenho do que em fornecer informações prévias sobre
o desempenho esperado, não examinam as queixas dos funcionários
sobre o sistema de avaliação, avaliam a personalidade do funcionário e
79
não o seu desempenho e são omissos no treinamento das pessoas para
a avaliação, na revisão das avaliações anteriores e na difusão das
normas dos sistemas; e
- há uma predominância de preceitos antiéticos nas normas de Avaliação
de Desempenho na maioria das empresas, denotando falta de
preocupação moral do processo avaliativo.
O objetivo da pesquisa de Campos (1999, p. 2), quarta a ser apresentada, foi o
de
“examinar o quanto as práticas de avaliação de desempenho de uma empresa,
estruturada em centros de responsabilidade, se aproxima do ideal, ou seja, daquilo
que é preconizado pela teoria, exposta na literatura de controle de gestão”.
Bastante peculiar nesta pesquisa é tanto a aproximação que se faz dos temas
do controle de gestão e avaliação de desempenho, como a correlação presumida
entre desempenho individual e organizacional, tendo-se a impressão, em alguns
pontos do relatório, de não se saber se o pesquisador está tratando do desempenho
individual ou do organizacional.
Além de bibliográfica, foi feita pesquisa de campo com base em entrevistas.
Estas, com o apoio da documentação da organização sobre seu sistema de
avaliação de desempenho, foram confrontadas com o preconizado pela literatura de
controle de gestão.
Resumidamente, as principais conclusões da pesquisa foram os seguintes:
- há um hiato entre a prática da organização e a teoria estudada;
- o sistema de avaliação de desempenho é importante para motivar os
funcionários, alinhando os objetivos individuais com os globais;
80
- o sistema utilizado é considerado injusto, pois foca somente os
resultados financeiros obtidos;
- tal injustiça leva à desmotivação dos funcionários;
- o sistema de avaliação de desempenho aperfeiçoa o controle; e
- a descontinuidade de gestão, originada por questões de cunho político,
tem gerado problemas para o aproveitamento dos resultados da
avaliação de desempenho.
A quinta pesquisa é a de Silva (1999, p. 6), cujo objetivo foi o de “propor um
instrumento de avaliação de desempenho de recursos humanos utilizando-se o
sistema de Custeio Baseado em Atividades (ABC) como suporte”.
A metodologia utilizada foi a bibliográfica, aliada com a pesquisa-ação, na
medida em que, partindo da pesquisa bibliográfica, propos-se o modelo que foi
testado em uma unidade de uma empresa prestadora de serviços.
As principais conclusões as quais se chegou pela pesquisa foram:
- a falta de integração entre a avaliação de desempenho individual e as
estratégias organizacionais distanciam as pessoas dos resultados da
organização; e
- os resultados e a aplicação do método são positivos, no sentido de que,
corretamente aplicado, ele é capaz de fornecer subsídios para diminuir o
caráter comportamental do processo.
O aspecto mais interessante desta pesquisa é que a unidade da organização
estudada é composta das lojas de atendimento ao público de uma concessionária de
serviços públicos. Portanto, esta é uma unidade que não tem outra fonte de receita
que não os recursos advindos do orçamento da empresa.
81
Este fato é importante, inclusive para possíveis discussões acerca da
generalização ou não da aplicação método, haja vista o mesmo se utilizar do
sistema de Custeio Baseado em Atividades, o que poderia sugerir uma não
aplicabilidade a organizações do setor público, isso sem se entrar no mérito do
mesmo neste presente trabalho.
A pesquisa de Marques (1994, p.8) teve por objetivo:
“discutir os atuais pressupostos em que se fundamentam as relações de trabalho no
pradigma vigente de modo a permitir às organizações um novo olhar nos atuais
modelos de avaliação de desempenho”.
A metodologia consistiu-se da observação, aliada a entrevistas e análise de
documentos de seis organizações, três do setor público e três do setor privado,
baseando o trabalho também em ampla bibliografia sobre avaliação de
desempenho, o homem no trabalho e organizações.
A escolha de organizações do setor público e privado pode levar à expectativa
de que as conclusões apresentarão um comparativo entre os setores, expectativa
essa que é frustada, pois as conclusões apresentadas são gerais. Todavia, tal fato
não chega a ser demeritório para a pesquisa, a qual apresenta um aprofundamento
teórico bastante considerável, em especial em comparação com as demais
pesquisas aqui apresentadas.
Suas principais conclusões foram:
- há uma dissonância entre o discurso das organizações e as práticas –
por exemplo, fala-se em liberdade e criatividade necessárias ao
funcionário, mas se exige comportamento padronizado;
- independente dos objetivos do sistema de avaliação de desempenho,
percebe-se que todos são classificatórios;
82
- é também expressivo o foco dos sistemas nas metas e não no
aperfeiçoamento das pessoas ou na geração do conhecimento;
- as organizações têm visão reducionista sobre a avaliação de
desempenho, o que leva à criação de mecanismos de práticas
antagônicas e perpetuadoras do status quo;
- quando se busca o aprimoramento do sistema, as mudanças
implementadas simplesmente ocorrem em termos de forma, o que
acarreta na obtenção dos mesmos resultados; e
- os modelos utilizados contemplam somente fragmentos da organização
e não o todo.
“Avaliar a percepção do executivo sobre a validade e utilidade do Sistema de
Avaliação de desempenho” foi o objetivo da pesquisa de Agostinho (1992, p.11).
Para tal, a pesquisadora procedeu sua pesquisa de campo, utilizando-se de
questionários fechados, aliada à pesquisa bibliográfica.
As principais conclusões da pesquisa, apontam para a percepção dos
executivos para a Avaliação de Desempenho como:
- sendo um mecanismo eficiente para indicar potencial;
- somente através dela poderão ser identificadas as alternativas de
funções a serem desempenhadas;
- sendo capas de detectar as limitações e potenciais dos funcionários,
havendo preocupação da empresa em atender essas questões;
- dotada de instrumentos e critérios adequados;
- sendo o feedback apropriado, possibilitando que os empregados
melhorem; e
83
- não havendo predominante opinião sobre a necessidade de revisão e
atualização dos sistema de Avaliação de Desempenho.
Apesar de não ter sido o escopo dessa pesquisa, cabe a observação de que,
considerando especialmente o objetivo de desenvolvimento do funcionário, a
percepção dos executivos deve ser confrontada com a dos funcionários para que se
possa atestar a eficácia do sistema. Porque se estes o consideram injusto ou
incapaz de apontar deficiências, dentre outros pontos, dificilmente eles darão crédito
ao feedback do sistema e, conseqüentemente, adotarão as medidas necessárias
para o seu desenvolvimento.
O escopo da pesquisa de Lemos (1981) é bastante peculiar, o que se pode ver
pelo seu objetivo, que veio a ser a verificação da aplicabilidade da Análise
Discriminante como mecanismo de fornecimento de informações para o
Departamento de Recursos Humanos sobre a avaliação de desempenho no que
tange à inferência da homogeneidade dos avaliadores no julgamento dos fatores de
avaliação, na identificação dos fatores que mais contribuem para homogeneizar a
avaliação e na elaboração de um programa de treinamento para a homogeneização.
Para tal, ele pesquisou uma organização na qual se comparou a avaliação de
desempenho de dois distintos grupos avaliados por diferentes avaliadores, todos
escolhidos aleatoriamente, mediante a utilização do método de Análise
Discriminante.
Suas conclusões são apresentadas de forma simples, dando-se mais ênfase
aos resultados estatísticos do que às consequências dos resultados, o que deveria
ser o esperado, haja vista o objetivo da elaboração de um programa de treinamento,
do qual o pesquisador se ocupa bem superficialmente. Em resumo tem-se que:
84
- foram encontradas correlações entre fatores nas avaliações, bem como
diferenças significativas entre os dois grupos avaliados, evidenciando a
falta de homogeneidade de julgamento por parte dos avaliadores; e
- foram identificadas, para a organização pesquisada, três fatores os quais
mais contribuem para a homogeneização das avaliações.
É importante ressaltar que, apesar de não estar explícito no relatório, pode-se
deduzir que a organização pesquisada não possuía um treinamento para os
avaliadores. Tal dedução baseia-se tanto na não citação de tal treinamento, quanto
no objetivo de se elaborar um programa de treinamento. Caso houvesse,
provavelmente o pesquisador utilizaria a expressão reformular o programa.
As pesquisas apresentadas nesta seção, a despeito de tratarem de objetivos
diferentes, são convergentes quanto às suas conclusões. Resumindo os pontos
principais apontados pelos pesquisadores, pode-se dizer que há uma distância entre
a teoria e a prática da avaliação de desempenho nas organizações. Tal distância
pode, ao mesmo tempo, ter como parcela de causa e como parcela de
conseqüência o fatos dos sistemas serem injustos e até antiéticos. Para isso,
também contribuem a parcialidade com que os avaliadores efetuam suas avaliações.
Outra causa apontada para a distância entre a teoria e a prática da avaliação
está no desconhecimento quanto à cultura da organização no qual o sistema é
implantado. Sendo que esta última causa, apesar de bem alinhada com a seção 3.2
– Considerações Gerais sobre o Desempenho Humano, na verdade só abrange
parte dessas deficiências, pois são os próprios pressupostos sobre o desempenho
humano que merecem um estudo mais minucioso.
Por fim, a percepção da avaliação de desempenho por parte dos executivos
aponta para uma direção totalmente oposta, fazendo crer que ou há uma miopia
85
quanto a realidade da avaliação ou, como são os principais avaliadores, eles não
criticam os sistemas com medo, mesmo inconsciente, de estarem se auto-criticando
como avaliadores.
4 TRANSFORMAÇÕES SÓCIO-CULTURAIS DA SOCIEDADE E SUAS
IMPLICAÇÕES PARA O EXÉRCITO BRASILEIRO
4.1 Considerações Iniciais
É lugar comum falar-se das transformações pelas quais o mundo vem passando
nos últimos anos. Tão lugar comum que por vezes pode ser interpretado como clichê
acadêmico na tentativa de se valorizar o próprio trabalho ou de se demonstrar a
atualidade ou pertinência do mesmo.
Independente das críticas, muitas vezes justificadas, feitas a tais abordagens,
ao se tratar de uma instituição como o Exército Brasileiro, possuidora de mais de
180 anos de história, certamente se justifica tal necessidade. Necessidade ainda
mais acentuada se forem consideradas as suas características de instituição total,
tal qual descreve Foucault (1987, p. 117) ao falar de disciplina:
“o soldado tornou-se algo que se fabrica; de uma massa informe, de um corpo
inapto, fez-se a máquina de que se precisa; corrigiram-se aos poucos as posturas;
lentamente uma coação calculada percorre cada parte do corpo, se assenhoreia dele,
dobra o conjunto, torna-o perpetuamente disponível, e se prolonga, em silêncio, no
automatismo dos hábitos”.
Mesmo quando se trata de um assunto específico, tal qual a Avaliação de
Desempenho, ainda sim não é somente justificada, senão necessária, tal
abordagem.
87
Mauss (1974) trata cada fato social como sendo um “fato social total”. Por este,
entende-se que o todo deve ser considerado ao se analisar um aspecto particular,
mais especificamente, aquelas inter-relações com os demais campos do
conhecimento. Em suas próprias palavras (ibidem, p. 199), “quer estudemos fatos
especiais ou fatos gerais, no fundo é sempre com o homem completo que temos de
lidar”.
Esta abordagem vem justamente ao encontro da crítica de Guerreiro Ramos
(1981), apresentada na seção 3.2 – Considerações Gerais sobre o Desempenho
Humano, o que reforça ainda mais a importância de se considerar a contribuição das
demais Ciências Sociais no estudo das organizações.
4.2 A Importância da contribuição das demais Ciências Sociais
A ciência, com a finalidade de compreender o mundo, foi se dividindo ao longo
do tempo, à medida que determinado campo do conhecimento se apresentasse
complexo e grande o suficiente que justificasse a necessidade de uma ciência
específica para estudá-lo.
Entretanto, as divisões surgidas muitas vezes criaram barreiras quase que
intransponíveis entre as diversas ciências, pois cada uma parece esquecer-se da
heterogeneidade com a qual o mundo se apresenta e se julga capaz de, a partir do
seu ponto de vista, compreendê-lo. Todavia é esquecido ser justamente “o homem
que introduz a heterogeneiradade à natureza” (Dejours, 1997, p. 74).
Se na natureza em geral o homem introduz a heterogeneidade, pode-se inferir
também que cada parte componente da natureza também encerra em si um grande
número de distintos aspectos que são objetos de estudos particulares, mas que
também foram introduzidos pelo homem. Nestas partes, se encontra o próprio
88
homem, o qual pode ser estudado sob vários prismas, mas que, para ser melhor
compreendido, não pode ser limitado à visão de somente um deles.
“para a teoria crítica [frankfurtiana], o homem não pode ser visto isolado de seu
contexto social, quer em sociedade, onde se manifestam relações de classe, quer nos
subsistemas de produção, local no qual se reproduzem essas manifestações sob a
divisão hierarquizada” (Tenório, 2000, p.37).
Desta forma, já se pode perceber que o ser humano no trabalho não pode ser
compreendido totalmente por abordagens que encerrem a sua compreensão aos
limites da psicologia, sendo necessário agregar outros conhecimentos.
Todavia, a consciência dessa necessidade nem sempre é tão óbvia, pois cabe
recordar que o pensamento racional-positivista está intrinsecamente relacionado à
forma como são vistas a gestão das organizações e das pessoas, gerando uma
“concepção mecânica e energética da gestão que ainda subsiste até nossos dias, a
despeito de todas as críticas que lhe foram feitas” (Chanlat, 1999, p. 38).
E essas críticas, além das já apresentadas, podem ser encontradas tanto no
simples questionamento da eficácia daquele tipo de abordagem na gestão das
organizações (Solé, 2000), quanto na assertiva do imperioso de se adotar uma visão
sociológica sobre o fenômeno (Douglas, 1998) ou até mesmo na dialética entre a
sociedade e o indivíduo (Migueles, 1999).
Mesmo quando se tem consciência da necessidade da utilização das demais
Ciências Sociais para a compreensão do homem e da organização, a transposição
dessa consciência para a prática não se revela instantânea, tampouco fácil de
ocorrer.
Vários motivos concorrem para que tal transposição não ocorra. Douglas (1998,
p. 87) aponta para o fato de que “os psicólogos são institucionalmente incapazes de
lembrar que os seres humanos são seres sociais. Assim que tomam consciência
89
desse fato, esquecem-no”. Quando este não é o caso, pode ocorrer a dificuldade da
utilização de distintas abordagens concomitantemente, sem se conseguir identificar
qual a linearidade a ser seguida, especialmente se for relembrado que a formatação
do pensamento cartesiano demanda a linearidade.
Este, todavia, não se apresenta como sendo uma dificuldade a qual não se
possa transpor. Considerando que “o fator humano é marcado pelo selo do histórico,
do social, do contextual” (Dejours, 1997, p. 76), tem-se que estes selos devem ser
compreendidos e analisados a priori.
Mais além, pode-se considerar cada selo como sendo um subsistema de ação
social (Castro, 2002), havendo uma hierarquização entre entres, sendo que os mais
altos na hierarquia regulariam os demais. Desta forma, ter-se-ia o cultural como o
grande regulador, seguido pelo social, pelo psíquico e pelo biológico.
Obviamente não se pode supor que os subsistemas abaixo na hierarquia não
influenciem os primeiros, já que, apesar dos primeiros regularem os demais, isso só
se faz possível se houver a capacidade de replicação prática daquilo que o cultural e
social regulam. Em outras palavras, há um constante realinhamento entre as
demandas do cultural e do social e a capacidade de atendimento destas que, por
sua vez, também podem ser balizadas por essa capacidade, o que não chega a
caracterizar uma relação dialética entre os subsistemas, mas de forte
interdependência.
E não somente é importante que todos os subsistemas sejam considerados,
como também a prática da gestão sob o prisma único da psicologia acaba também
por se revelar contraproducente (Chanlat, 1999).
Antes, porém, que seja mal interpretado o que se coloca nesta seção, é
importante ressaltar que
90
“o que nós reclamamos não é a erradicação de disciplinas, com objetos próprios e
métodos diferenciados, mas o reconhecimento do direito e mesmo do dever de
circular, a valorização do livre trânsito, o levantamento de barreiras à associação
com pessoas diferentes, sociólogos, economistas, psicólogos, biologistas, filósofos,
administradores e tantas outras disciplinas que consideram o homem com ser vivo,
consciente e sociável [sic]” (Chanlat, 1999, p.64).
Ou seja, em resumo, o mais importante é ter a consciência de que a
consideração da contribuição de cada disciplina para o estudo do homem não
somente é recomendada, como se revela como um verdadeiro imperativo para que o
objeto do estudo seja melhor compreendido.
Recordando a questão das hierarquias dos subsistemas, se for considerado que
“as instituições estão se tornando mais culturais em seu caráter” (Lash, 1997a, p.
245), é mister que se busque examinar as razões de tal fenômeno e, então, se
procure visualizar as implicações desse movimento para a gestão das mesmas, com
o intuito de se poder estabelecer um quadro mais completo do homem na
organização.
Ao se estudar qualquer assunto específico em gestão, isso não deve ser feito
especificamente per se, já que as condições culturais e sociais que a motivaram
podem ter mudado.
Assim, para que o estudo sobre o sistema de Avaliação de Desempenho do
Exército Brasileiro apresente resultados mais elucidativos para os problemas que
enfrenta, faz-se necessário um aprofundamento sobre o que cerca, as condições
nas quais foi concebido e é aplicado. Ainda mais, sendo um instrumento, e não uma
teoria, a compreensão da utilização dele será invariavelmente dependente desta
visão.
91
4.3 O Fenômeno Pós-Moderno
A culturalização das instituições, se assim for resolvido alcunhar o movimento
identificado por Lash (1997a), é vista e interpretada por diversos autores de forma
distinta. No que há maior convergência, entretanto, são que as mudanças não
somente vêm acontecendo, como também é no indivíduo que suas conseqüências
podem ser percebidas em primeiro lugar.
A esta época de mudanças, alguns autores rotulam como sendo o Pós-
Modernismo (Hall, 2001; Motta, 1997; Castro; 2002). Podendo ainda receber o nome
de Modernização Reflexiva (Beck, 1997a), Modernidade Reflexiva (Lash, 1997b),
Terceira Onda (Srour, 1998) ou ainda Sociedade Pós-Tradicional (Giddens, 1997).
Obviamente que não somente os rótulos são vários. Como já foi dito, algumas
características atribuidas aos fenômenos são vistas de forma distinta por cada autor.
Todavia, antes de se apresentarem como abordagens antagônicas, as mesmas
podem e devem ser vistas como complementares, pois fato é que, se for
considerado como um fenômeno ainda em curso, não há como qualquer um delas
isoladamente conseguir compreendê-lo por completo.
Partindo para análise da identidade, como ponto de percepção das
conseqüências das mudanças para os indivíduos, Hall (2001) apresenta três
concepções culturais. São elas: o sujeito do Iluminismo, o sujeito sociológico e o
sujeito pós-moderno.
O sujeito do Iluminismo seria um indivíduo totalmente centrado, unificado,
dotado das capacidades da razão, de consciência e da ação. Em resumo, “o centro
essencial do eu era a identidade de uma pessoa” (ibidem, p. 11). Ou seja, uma
concepção que se apresenta ao mesmo tempo individualista e valorizando a razão.
92
A complexidade do mundo moderno, surgida após a Revolução Industrial, gerou
a noção do sujeito sociológico. Neste sujeito,
“a identidade é formada na ‘interação’ entre o eu e a sociedade. O sujeito ainda tem
um núcleo ou essência interior que é o ‘eu real’, mas este é formado e modificado
num diálogo contínuo com os mundos culturais ‘exteriores’ e as identidades que
esses mundos oferecem” (idem).
Por fim, o sujeito pós-moderno, caracteriza-se como não sendo possuidor de
uma identidade fixa, esta
“torna-se uma ‘celebração móvel’: formada e transformada continuamente em
relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas
culturais que nos rodeiam” (ibidem, p. 13).
Ou seja, o sujeito pós-moderno deixa de ser visto como alguém unificado,
moldando-se aos sistemas culturais com os quais haja o sentimento de pertença por
parte dele. Nas palavras de Beck (1997a, p. 19), “o eu [self] não é mais o eu
inequívoco, mas se tornou fragmentado em discursos fragmentados do eu”.
Mas como as estruturas que cercam o cotidiano do indivíduo não se adaptam
tão rapidamente à nova realidade quanto esta atua e modifica o indivíduo, os
discursos das instituições, ainda evocando o sujeito unificado, podem acabar
fazendo com que os indivíduos levem a fragmentação para o interior das
organizações, desejando vivê-las lá, o que traz conseqüências para elas.
A compreensão das implicações para as organizações, porém, exige uma
melhor compreensão de como as mudanças se processam, o que, obviamente, não
é limitado à questão da identidade.
E isso não se limita à detecção da ocorrência delas, mas principalmente
perceber que as mudanças ocorrem sobre um novo paradigma (Wood Jr, 2002), o
93
que significa também dizer que a própria mudança em si está mudando
(Rothwell,1994).
A primeira recomendação que deve ser dada para qualquer um que busque
compreender os fenômenos é a de olhá-los sob perspectivas diferentes daquelas
utilizadas até então para a compreensão do ambiente e das suas implicações para
as organizações.
A análise da abordagem de Motta (1997), por exemplo, pode transmitir a falsa
idéia de que o fenômeno pós-moderno ocorre em todos as sociedades e, em
conseqüência, em todas as organizações destas sociedades, delineando-nos um
futuro que proporcionará um maior bem estar a toda a sociedade.
Beck (1997a, p. 25-26), ao falar de “individualização”, coloca que a
fragmentação do eu depende da “desintegração das certezas da sociedade
industrial”, bem como coloca que as novas certezas criadas apresentam-se
globalmente interdependentes.
A Modernização Reflexiva, então, ao se processar nas diversas sociedades,
seria fortemente determinada por questões de como se organiza e qual a dinâmica
industrial e qual a influência do papel desempenhado pela globalização na vida de
cada sociedade.
Se isso contraria a abordagem de Motta (1997) por um lado, esta determinante
advinda da interação globalização e industrialização vai ao encontro da abordaqem
de Srour (1998).
Motta (1997), ao apresentar os benefícios trazidos pela pós-modernidade para o
trabalho e a sociedade, os apresenta como sendo um fenômeno generalizável, o
que é contestado por Srour (1998). Motta (1997) havia colocado a modernidade
como elemento de aumento das desigualdades mundiais. Apesar dele não colocar
94
de forma explícita, tem-se a nítida impressão de que sua conclusão é no sentido de
que tais distorções seriam corrigidas pela pós-modernidade. Srour (1998), por outro
lado, coloca de maneira bem clara que, ao contrário de corrigidas, as fortes
assimetrias existentes serão mantidas pela globalização.
Enquanto nos países desenvolvidos poderão ser observados muitos dos
fenômenos apresentados por Motta (1997), bem como outros apresentados por
Srour (1998), os países do terceiro mundo continuarão a ser vítimas dos males da
modernidade, bem como não serão contempladas com as bênçãos da pós-
modernidade, como indústrias limpas e valorização do ser humano no trabalho. Tais
fatos já podem ser verificados atualmente no mundo, já que as grandes marcas da
indústria mundial possuem seus centros de pesquisa, design e gerencial em países
do primeiro mundo, enquanto seus produtos são fabricados em países do terceiro,
onde, na grande maioria das vezes, as condições de trabalho são bastante inferiores
àquelas dos países de primeiro mundo, os salários pagos são consideravelmente
menores e a legislação ambiental é normalmente muito menos rígida (e a sua
aplicação também).
Neste sentido, as assimetrias podem ser vistas inclusive com relação à própria
velocidade e profundidade com as quais as mudanças se processam em cada
sociedade, formando um ciclo que se retroalimenta.
Este ciclo apresenta uma face relativa à dicotomia do sujeito pós-moderno em
organizações modernas, na qual o sujeito precisa se libertar das estruturas sociais
modernas para que plenamente seja tal sujeito (Lash, 1997b) e uma outra
considerando “a capacidade de refletir sobre as condições sociais de sua existência
e, assim, modificá-las” (Beck, 1997b, p. 207) como aquilo que permite ao sujeito a
sua libertação.
95
Ou seja, a capacidade de reflexão é necessária à libertação do sujeito das
amarras das organizações modernas. Por sua vez, enquanto o indivíduo estiver lá
preso, sua capacidade de reflexão sobre as condições e de modificação delas não
será plena. Isso, então, pode se apresentar como um ciclo virtuoso ou vicioso,
dependendo do grau de interação da sociedade com o universo industrial e
globalizado.
Só que isso não tem implicações somente para os indivíduos. Quando se opera
em ambiente globalizado, no qual a sociedade como um todo é receptora dos
movimentos de mudanças, o agora paradoxo de pessoas pós-modernas em
organizações modernas pode ter como conseqüências o aumento da insastifação no
trabalho e a queda da produtividade.
Isto posto, cabe às organizações buscarem conhecer as mudanças pelas quais
as sociedades nas quais estão inseridas vêm passando e, principalmente,
descortinarem as implicações que estas mudanças trazem para as suas gestões.
4.4 Implicações da Pós-Modernidade para a Gestão das Organizações
Todo este novo ambiente complexo e em rápida transformação traz
conseqüências para a dinâmica interna das organizações. Conforme já dito, é por
demais importante a compreensão das implicações para as organizações dos
fenômenos que ocorrem na sociedade para que, antes de mais nada, elas
sobrevivam.
Todavia, a tarefa de abordar as implicações da Pós-Modernidade para a Gestão
das Organizações revela-se extremamente ardilosa. Em primeiro lugar porque, por
se tratar de um fenômeno extremamente dinâmico, no qual uma série de
interdependências estão envolvidas, qualquer alteração em uma das variáveis pode
96
mudar todo o quadro final, o que torna a análise um trabalho bastante complexo, se
não meticuloso.
Além disso, a generalização pode se mostrar incapaz de atender às
necessidades específicas das organizações, tanto pela questão do grande número
de interdependências, quanto pelo caráter fragmentado do fenômeno, o que faz com
que cada caso mereça uma análise particular. Por este motivo, então, é que se
busca uma análise particular das implicações para o Exército Brasileiro na próxima
seção.
Entretanto, a despeito das dificuldades apresentadas, algumas características
comuns das implicações insinuam-se em meio as interdependências. Desta forma,
longe de esgotar o assunto, estas características comuns serão apresentadas nesta
seção.
Dejours (1997, p. 13) coloca que “todos os que trabalham [...] são pressionados
a ter um certa concepção sobre o funcionamento do ser humano”, pressão essa que
se revela ainda maior para os que ocupam cargo executivo, especialmente por
serem os executivos aqueles sobre os quais recaem, entre outros, o dever de avaliar
o desempenho de seus subornidados.
Entretanto, o que vem a ser concepção sobre o funcionamento do ser humano é
uma questão tão fundamental quanto a própria pressão para que tal concepção seja
criada. Dilema este que emerge da própria pós-modernidade.
Quando se busca identificar como a pós-modernidade reflete na gestão das
organizações, mais especificamente nos recursos humanos, costuma-se evocar a
dicotomia entre a gestão objetiva e subjetiva das pessoas na organização. Pois
enquanto esta seria uma necessidade advinda com a pós-modernidade, aquela seria
característica da gestão moderna.
97
Davel et Vergara (2001) apresentam a importância de se considerar os aspectos
subjetivos na gestão de recursos humanos. Segundo eles (ibidem, p. 32), “como a
subjetividade, normalmente, atrelada ao ‘ser’, tanto quanto a objetividade,
normalmente, atrelada ao ‘ter’, merece atenção na gestão organizacional”.
Especificando mais um pouco, tem-se que
“o modo ter (possuir) origina-se do fator biológico do desejo de sobrevivência,
enquanto o modo ser (partilhar) é impulsionado pelas condições específicas da
existência humana e pela necessidade inerente de ultrapassar o isolamento e
socializar-se” (idem).
Ou seja, apesar de ambos estarem presentes na composição do ser humano, a
visão mecanicista do homem que imperava até a época moderna fazia com que
somente o aspecto objetivo da gestão das pessoas fosse considerado, ou, no
máximo, que se destinasse uma posição secundária para a subjetividade.
A abordagem de Davel et Vergara (ibidem) tem a limitação de tratar a
subjetividade e a objetividade na organização como dois opostos imiscíveis.
Tratamento este que pode ser questionado. Afinal de contas, até que ponto um não
define o outro?
Thompson et McHugh (1994) vêm justamente responder a este questionamento,
quando apresentam que as diversas interações vividas pelas pessoas no trabalho
vão construindo suas identidades. E, indo mais além, as diversas interações que
ocorrem em contextos sociais distintos faz com que as pessoas acabem por
desempenhar papéis distintos nesses respectivos contextos.
O grande mérito de Thompson et McHugh (idem) é o fato deles buscarem a
convergência entre as abordagens psicológica e sociológica da gestão de pessoas.
Tal convergência fica clara ao colocarem que
98
“personal, subjective identity consists of the meanings and images we have found to
represent us accurately in the past. Social identity, where it is different from the
former, consists of the negotiated position between our personal identity and the
meanings and images demanded of us in our current social context”1 (ibidem, p.
289-290).
Apesar do contexto social atual ser apresentado como o da pós-modernidade,
não se pode esquecer que ele também é composto pelos contextos das
organizações às quais o indivíduo pertence, tendo portanto, as interações indivíduo
– organização um peso para a definição das implicações da pós-modernidade para a
gestão.
Este tipo de interação faz emergir a real dicotomia que há, que pode ser
constatada na imensa maioria, se não totalidade, das organizações: o homem pós-
moderno amarrado à instituições modernas.
Neste contexto, em que a consciência social das pessoas as permite modificar
as condições de existência (Beck, 1997b), sendo que as amarras modernas das
instituições não permitem que as pessoas adquiram tal capacidade de forma plena
(Lash, 1997b), é desenrolado um jogo no qual se contestam tradições, mas as
organizações se defendem como se a contestação às tradições significasse uma
contestação à própria insituição que as detém (Beck et al., 1997).
É plausível a especulação de que tal defesa, impossibilitada de separar a
contestação às tradições da contestação às instituições, seja um reflexo das suas
características modernas, a qual evocam o sujeito unificado e, portanto, a instituição
unificada. Com isso, não conseguem elas distinguir, no discurso fragmentado
1 “identidade subjetiva, pessoal, consiste dos significados e imagem que tenhamos encontrado paranos representar adequadamente no passado. Identidade social, que é diferente desta última, consisteda posição negociada entre nossa identidade pessoal e os significados e imagens demandadas denós em nosso atual contexto social”.
99
daqueles que contestam, que uma contestação não obrigatoriamente implica na
outra.
Tendo tal questão em mente, poderia parecer simples para as organizações
evitar a ocorrência do conflito que emerge da tentativa de defesa das tradições. Ou
talvez, diante da impossibilidade de evitar o conflito, que elas minimizassem os
danos advindos dele.
Entretanto, as mudanças, os questionamentos e as contestações ocorrem
silenciosamente (Beck, 1997a), dificultando ou impossibilitando a constatação das
ocorrências. Ou ainda, quando constatadas, elas são analisadas sob os antigos
prismas, trazendo como resultado da análise algo enviesado, de pouca serventia
para que se lide com a questão.
Algo desta natureza pode acontecer com relação à postura da organização
frente aos seus integrantes. Determinado comportamento observado poderá ser
interpretado de forma distinta daquele qual seria o seu objetivo por parte das
pessoas que o adotam, fazendo com que um eventual conflito organização-
indivíduo, ao invés de resolvido, seja exacerbado.
Considerando que a natureza do social é dialética (Castro, 2002), as
contestações passam a ser necessárias para que a mudança ocorra. Esta natureza
dialética, porém, explicita a necessidade de se observar a dinâmica das forças que
operam no interior da organização (contestação versus defesa) de forma que o
resultado da dialética não seja destrutivo para a organização e que seja possível
canalizá-la de forma que ela produza, ao menos, uma destruição criativa, tomando
emprestado o termo de Schumpeter (1997).
Dialética esta que, também não se pode esquecer, será influenciada pelo papel
exercido na lógica cultural da empresa pela cultura nacional na qual ela estiver
100
operando (Barbosa, 2001; Barros et Prates, 1997; Amado et al., 1994; Chanlat,
1999).
Uma forma de contestação das tradições é o questionamento das
regras/normas da organização, muitas vezes também ligada à própria contestação
de toda aquela “aura” conferida pela autoridade.
Há uma interdependência entre o sentido impessoal do termo e a pessoa que a
detém. A organização que, normalmente, vê tudo como uma coisa unificada,
também a vê assim. Desta forma, acaba criando normas e regras que não dissociam
tais papéis. Por outro lado, os contestadores não somente vêem os papéis distintos
como podem acabar tratando com deboche, ou outra denominação depreciativa
qualquer, aqueles que perdem a “aura” da autoridade, ou seja, que insistem em agir
da forma antiga mesmo quando a contestação já existe (Giddens, 1997).
Além disso, a rápida inovação com a qual as organizações se deparam, faz com
que o trabalho seja intensivo no conhecimento e menos material. E a
“intensidade do conhecimento envolve necessariamente a reflexividade. E envolve a
auto-reflexividade, pois o monitoramento heterônomo dos trabalhadores por regras é
substituído pelo automonitoramento. Isso envolve (e implica) a ‘reflexidade
estrutural’, pois o fato de as regras e os recursos (estes últimos incluindo os meios de
produção) do chão-de-fábrica (shopfloor) não mais controlarem os trabalhadores
torna-se objeto de reflexão da ação. Isto é, os agentes podem reformular e usar essas
regras e recursos em uma variedade de combinações para, cronicamente, inovar”
(Lash, 1997b, p. 146).
Neste caso, os sujeitos podem refomular as regras, na medida em que
automonitoramento é a norma. Assim, a contestação dará lugar ao impulso inovador
direcionado para a modificação das regras conforme direcionada pela reflexidade do
grupo.
101
Entretanto, há um dicotomia entre a racionalidade instrumental ainda
predominante nas organizações e a consciência de ruptura mais forte que sua
vivência (Carvalho, 2002) e, no mesmo sentido que as amarras modernas impedem
a plenitude da reflexidade (Lash,1997b), esta racionalidade instrumental aliada à
reflexidade não plena, pode ter como conseqüência uma normatização de controle
criada pelo grupo que se torne ainda mais instrumental e presa à estrutura moderna
do que a existente previamente (Barker, 1993).
Se por um lado, a ocorrência deste controle estritamente moderno valida a
observação da dicotomia que há entre a consciência de ruptura ser mais forte que a
sua vivência nas organizações essencialmente instrumentais, por outro, demonstra
que a reflexividade ainda pode ser considerada mais fraca que as estruturas que ela
tenta transformar.
Uma possível justificativa para o predomínio das estruturas sobre a
reflexividade, particularmente relativo ao caminho da excessiva normatização, pode
ser derivada do fato de que todas essas mudanças, apesar de não acontecerem de
modo totalmente incosciente, não chegam porém a ocorrer de modo inteiramente
consciente nem de forma dirigida (Beck, 1997a).
Portanto, as organizações, ao adotarem grupos automonitorados, muitas vezes
conseqüência das contestações ou da própria característica das atividades
intensivas em conhecimento, se não cercarem o processo de desenvolvimento
destes grupos com todo o cuidado, poderão acabar por ter resultados insatisfatórios,
especialmente no que se refere ao desenvolvimento posterior das regras e, por fim,
da própria inovação.
Por outro lado, como há uma característica de fluidez no pós-modernismo, as
estruturas sociais, à medida que vão se adequando, moldam-se como estruturas de
102
informação e comunicação (Lash, 1997b). Neste rastro, seguindo a mesma premissa
das mudanças não ocorrerem de forma consciente, tampouco de forma dirigida, as
estruturas de informática criadas constumam trilhar o mesmo caminho de
acirramento dos controles seguido pelos grupos automonitorados, com a vantagem
deste tipo de controle ter a capacidade de ser praticamente invisível aos olhos dos
integrantes da organização (Rosen et Baroudi, 1992).
A recorrência da questão do controle é devido ao fato de que normalmente o
controle é percebido pelos integrantes da organização como sendo algo perverso. É
provável que tal percepção se dê fundamentalmente porque o controle remete à
organização burocrática, moderna em sua essência.
Além disso, segundo Motta et al. (1995), o controle burocrático gera uma série
de tensões e problemas na organização. Ademais, com a complexidade do trabalho
atual, o mesmo se mostra ineficaz no sentido de condução para a produção de bons
resultados.
Assim, o controle social surge como alternativa, como um método mais eficaz,
pois faz com que o controle deixe de ser algo externo e passe a ser algo interno.
Para tal, “surge o simbolic manager, que utiliza símbolos, rituais, linguagem e outros
elementos da cultura organizacional como forma de controle social na empresa”
(ibidem, p. 120). Mesmo assim, pode ocorrer resistência, principalmente por parte da
gerência média, contra essa estratégia simbólica levada a cabo pela organização.
A estratégia simbólica só é utilizada nas organizações intensivas em
conhecimento, onde o trabalho intelectual é priorizado sobre o manual. Este fato traz
algumas considerações. Primeiramente, quando o trabalho intelectual é priorizado,
pressupõe-se que o nível de operação é detentor da tecnologia, considerando-se
103
aqui a tecnologia de produção do conhecimento. Segundo, quando a tecnologia é
possuída pelo nível operacional, o controle externo torna-se difícil de ser exercido.
Com isso em mente, tem-se que as organizações verticalizadas, com controles
exercidos pelos superiores são incapazes de atuar sobre a produção do
conhecimento. Desta forma, como normalmente esta atividade não é singularmente
individualizada, mas compartilhada por times, tem-se que o controle passa então a
estar disseminado pela organização, mediante muitas vezes o poder de exclusão de
um membro, mesmo que esta se processe exclusivamente no nível simbólico
(Foucault, 1996).
Então, tem-se que o poder nos modelos de gestão de conhecimento é muitas
vezes exercido simbolicamente, mas com tão grande eficácia nestes modelos
quanto tinha o poder disciplinar na sociedade industrial.
Este simbolismo é principalmente exercido ao dar [restringir o] acesso, àqueles
que trabalharem conforme o [aquém do] esperado, a objetos de desejo e/ou
símbolos de status. (Sendo que no caso da restrição, tem-se uma espécie de
violência simbólica).
Considerando que o trabalho também compreende o funcionamento do “tecido
social e [d]as dinâmicas intersubjetivas indispensáveis à psicodinâmica do
reconhecimento” (Dejours, 1997, p. 58), é reforçado que o caráter do controle social
e as suas vertentes de punição e recompensa podem produzir profundos impactos
na organização em todos os seus aspectos.
Mas o controle está também intimamente ligado à liderança, mais
especificamente ao fato de que a natureza da liderança implica em controle direto ou
indireto dos subordinados. Este é exercido conforme o estilo de liderança adotado, o
104
qual depende das expectativas da liderança com relação à resposta dos
subordinados a ele (Johnson et Gill, 1993).
Isso também apresenta ligação com a questão da contestação às regras e à
autoridade. Portanto, a liderança deve estar ciente de que a construção das suas
expectativas com relação à resposta dos subordinados terá íntima ligação com como
culturalmente são aceitos os diversos estilos.
Desta forma, pode-se perceber a formação da teia de intensa interdependência
que se forma mediante a interação da cultura local, com todas as suas causas e
implicações já apresentadas, com a questão do controle e agora da liderança.
Resumindo, todas as questões que implicam em mudanças na postura das
pessoas no trabalho, e que também vão ter reflexos em como as organizações
reagem à essas mudanças, vão ser fundamentais para que o processo de Avaliação
de Desempenho adquira sua legitimidade junto aos integrantes da organização.
Afinal de contas, não se pode esquecer que a avaliação pode ser descrita como
um processo que, de alguma forma, exerce um controle do desempenho, quer seja o
objetivo do sistema o de desenvolvimento das pessoas ou o de premiação (vide
seção 3.4 – Etapas da Avaliação de Desempenho).
Por outro lado, quem desempenha o papel de avaliador, normalmente a chefia,
é a figura que distribui as recompensas e punições. E o estilo de liderança que esta
resolver adotar impactará na validade do julgamento feito, também impactando na
percepção, por parte dos demais integrantes da organização, da legitimidade do
sistema.
Legimitidade esta que fica mais em xeque quando o papel da liderança é
desvirtuado e o avaliador passa a utilizar o controle e a avaliação como elemento de
coação ou “moeda de troca” com seus subordinados. É por isso que o controle
105
social emerge, e que a vigilância sobre os subordinados não pode ser visível
(Carvalho et Alcadipani, 2001), o que faz reforçar a pertinência da existência dos
grupos auto-monitorados.
Antes de finalizar esta seção cabe a observação de que, ao se falar das
mudanças pelas quais a sociedade e, em conseqüência, a gestão vem passando,
pode-se ter a falsa percepção de que, recentemente, de uma ora para outra, o
homem percebeu sua alienação no trabalho – ou se percebeu amarrado à uma
estrutura na qual ele não mais se sentia confortável – (conseqüência do choque
entre a dialética da relação com o contexto social e sua prévia gestão puramente
objetiva e todas as outras implicações já apresentadas) e, por conta disso, as
empresas vêem-se hoje na necessidade por novas formas de gestão que atentem
para os problemas identificados.
Aktouf (2001), ao fazer um breve histórico recente dos acontecimentos,
demonstra não somente que os sinais de tais mudanças já vêm surgindo desde os
anos 70, mais notavelmente, como também nos permite inferir as causas que
levaram as novas técnicas administrativas a tomarem os caminhos que tomaram.
Conhecedoras das implicações da característica dialética do social, é mister que
as organizações mantenham-se constantemente monitorando os sinais de
mudanças emanados pelo ambiente no qual se inserem e que busquem identificar,
dentro dos seus contextos sociais particulares, as implicações refletidas nas suas
gestões.
Com isso, participando de forma ativa nos processos de mudanças, dando um
direcionamento onde necessário e sabendo distinguir entre o que cada contestação
visa atingir, as organizações têm condições tanto de sentir menos os efeitos
106
negativos dos processos de mudança, quanto de obter resultados que as
possibilitem alavancarem-se com o resultado dos mesmos.
4.5 Implicações da Pós-Modernidade para a Gestão no Exército Brasileiro
As implicações da Pós-Modernidade para a Gestão nas organizações, para
serem compreendidas melhor, demandam que sejam consideradas as
características daquela sobre a qual se deseja inferir.
Uma série de características distingue o Exército Brasileiro das demais
organizações existentes. Pois não se trata apenas de uma instituição pública, mas
de uma instituição na qual os imperativos da tradição desempenham papel nuclear
na construção da sua própria identidade.
“As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica,
são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na
hierarquia e na disciplina” [grifo nosso] (Brasil, 1994, P. 70).
A Constituição Federal, ao caracterizar o Exército Brasileiro como permanente e
baseado na hierarquia e disciplina, já explicita os princípios norteadores da
atividade militar, elevando, neste caso de forma tácita, a tradição à própria essência
da instituição.
Ademais, a dinâmica da atividade profissional do Exército Brasileiro pode ser
caracterizada como sendo de trabalho intensivo. Isso, levando em conta que “a
organização encontra-se numa configuração com a qual interage, que constitui a
fonte de insumos e o objeto do consumo dos produtos” (Castro, 2002, p. 118), traz
uma nova conseqüência de ampla dimensão.
O ambiente, assim chamada a configuração na qual a organização se encontra,
interage com a organização. Quando a organização é do tipo de trabalho intensivo,
107
ou seja, boa parte dos insumos produtivos é constituída por pessoas, a dinâmica
interna do trabalho tende a sofrer fortes influências deste ambiente, mais
especificamente no que se refere às características da sociedade na qual estiver
inserida.
Todavia, para que tais influências não prejudiquem o processo produtivo, uma
certa flexibilidade será exigida das organizações. Flexibilidade essa que, no caso de
uma instituição com características de instituição total (Goffman, 1992), torna-se, aos
olhos dela mesma, ameaçadora à própria existência.
Essa visão de ameaça vai além daquela normalmente adotada pelas demais
organizações, cujas estruturas essencialmente modernas as impedem de distinguir
entre o que vem a ser contestação à regra e o que vem a ser contestação à
organização.
Consideradas a hierarquia e a disciplina como pilares da organização militar e,
mais ainda, o carater de dedicação exclusiva e permanente ao serviço por parte do
servidor militar (Brasil, 1980), ela tem a sua estrutura construida de tal forma que
efetivamente as contestações às regras se tornam contestações à instituição, mas
neste caso, as contestações não existem com relação à legitimidade da mesma,
mas ao seu modus operandi.
Obviamente, é de se supor que tão conflitante e complexa situação apresente-
se aparentemente sem solução. Pois se o modus operandi da insituição militar está
intimamente relacionado, transpassando e sendo transpassado por aquilo que define
a si própria, como se conseguir a flexibilidade necessária para que as influências da
sociedade sobre os integrantes da instituição não acabe gerando uma situação de
prejuízo ao processo produtivo? Por outro lado, qual grau de alienação ou
desmotivação não será provocado pela insistência da instituição em não buscar
108
esse entendimento entre as influências da sociedade e os reflexos internos para a
gestão?
A compreensão destes fenômenos vai obrigatoriamente passar por uma
abordagem que os explore partindo da relação dialética entre o indivíduo e a
sociedade e explorando, então, as conseqüências dessa relação no ambiente
interno do Exército Brasileiro (Migueles, 1999).
Se por um lado, já se abordou como a Pós-modernidade tem provocado
modificações no indivíduo, mais especificamente com relação à questão da
identidade, quando este movimento se observa nos integrantes do Exército
Brasileiro, uma particularidade de grande importância emerge.
O processo de integração social do indivíduo, ao internalizar neste os “valores,
padrões, modelos, normas e símbolos sociais” (Castro, 2002, p. 40), se constitui na
base sobre a qual a identidade que emergirá da dialética se construirá.
No Exército, o processo de integração social ocorre de forma distinta entre os
diversos grupos que nele se encontram.
No universo dos oficiais de carreira, encontram-se aqueles oriundos das
seguintes escolas de formação: Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN),
Instituto Militar de Engenharia (IME), Escola de Saúde do Exército (EsSEx) e Escola
de Administração do Exército (EsAEx). Além destes, há os oficiais temporários,
oriundo dos Centros e Núcleos de Preparação dos Oficiais da Reserva (CPOR e
NPOR, respectivamente).
Apesar do sistema de Avaliação de Desempenho só contemplar os oficiais de
carreira, é importante explicitar as características de cada escola de formação, já
que todas fornecem pessoal para as diversas organizações militares. Ou seja,
109
elementos que estarão participando desta dialética indivíduo-sociedade com reflexos
para a gestão no Exército Brasileiro.
Os oficiais formados pela AMAN correspondem ao núcleo principal do Exército
Brasileiro, bem como formam a maior parte do efetivo dos oficiais de carreira. A
quase totalidade dos oficiais-generais são oriundos da AMAN, bem como os
comandantes das diversas organizações militares, com exceção daqueles
específicas de saúde ou técnicas de engenharia, também o são. São estes oficiais
os que compõem os quadros chamados operacionais. A formação na AMAN tem
duração de quatro anos, sendo que, para os oficiais formados antes de 1994, havia
um percentual oriundo da Escola Preparatória de Cadetes do Exército (EsPCEx –
correspondente ao Ensino Médio), totalizando para os incluídos neste percentual
sete anos de formação, e, para os oficiais formados a partir de 1994, todos são
oriundos da EsPCEx, a qual passou a compreender somente o último ano do Ensino
Médio, totalizando, então, cinco anos de formação.
O curso da AMAN, durante toda a sua duração, funciona em regime de
internato, com saída franqueada aos cadetes (título concedido aos seus instruendos)
nos finais-de-semana, feriados e período de férias.
Ao longo do curso, atividades acadêmicas e operacionais alternam-se. Aos
cadetes ainda é imposto horários para o levantar, refeições e o chamado silêncio,
momento a partir do qual não se permite atividade alguma que produza barulho
considerado pertubador.
Além disso, são submetidos a controles quanto ao asseio dos uniformes, dos
alojamentos e estabelecidos prazos máximos para corte de cabelo (controlado
através de um “cartão de cabelo”).
110
Por fim, cabe ressaltar que a AMAN somente forma oficiais do sexo masculino,
sendo que as demais escolas de formação de oficiais de carreira são mistas.
(A EsPCEx, etapa obrigatória para ingresso na AMAN vive rotina semelhante à
descrita para a AMAN).
O IME forma os oficiais que compõem o quadro de Engenheiros Militares,
divididos por 10 especializações diferentes. O curso dura cinco anos, dos quais no
primeiro está incluída a instrução militar básica e nos demais as atividades são
restritas às acadêmicas.
No primeiro ano, os alunos do IME estão sujeitos à rotina similar aos da AMAN.
Mesmo assim, a rotina é considera bem mais branda, já que estes futuros oficiais se
destinarão a trabalhar em áreas técnicas.
A partir do segundo ano, porém, aos alunos já é permitido residir fora da escola,
sendo franqueada a saída a todos quando fora do horário de aulas, mantendo-se o
controle de asseio de uniforme, cabelo (mas sem a existência do “cartão de cabelo”,
o qual só é aplicado aos alunos do primeiro ano) e alojamentos para aqueles que
continuem a residir na escola.
Na EsSEx e na EsAEx a formação se dá de maneira muito semelhante entre
elas. Enquanto a primeira forma os oficiais médicos, dentistas e veterinários (com
formação acadêmica prévia nestes campos), a segunda forma os oficiais do
chamado quadro complementar, compreendendo economistas, advogados,
administradores, entre outras formações de nível superior.
A duração dos cursos é de dez meses, durante os quais os alunos já são
considerados oficiais, compreendendo um período de instrução militar básica e
diversas instruções que objetivam familiarizar os alunos com as peculiaridades
111
administrativas do Exército, com as quais eles se depararão no exercício de suas
funções.
Apesar de, em tese, ser feito o controle de asseio de uniformes, horários e corte
de cabelo, a formação não funciona em regime de internato (somente no primeiro
mês), bem como esses controles são bem mais brandos que os exercidos no IME.
A formação dos oficiais temporários tem a duração de um ano, do qual somente
um mês em regime de internato. Ao fim do ano, todos passam por um estágio de um
mês em diversas organizações militares, dos quais alguns passam a exercer as
funções de oficial por um período de até oito anos.
O primeiro mês do curso nos diversos CPOR e NPOR é similar ao primeiro ano
da AMAN, sendo que, nos demais meses, a saída dos alunos passa a ser
franqueada, mantendo-se, porém os controles de asseio de uniforme, alojamentos
para aqueles que continuem residindo e cabelo (com a manutenção do “cartão de
cabelo”).
As atividades dos CPOR e NPOR se restrigem às operacionais.
Normalmente, a idade média para ingresso na EsPCEx (etapa obrigatória para a
AMAN) é de 17/18 anos e no IME gira em torno dos 19/20. Havendo grande
variação na EsSEx e EsAEx, sendo que, nestas, a idade máxima não ultrapassa os
35 anos. Já os alunos dos CPOR e NPOR ingressam com 18/19 anos, a idade dos
demais prestadores do serviço militar obrigatório.
O objetivo da suscinta descrição das diversas escolas é o de possibilitar que se
perceba os diferentes processos de integração social pelos quais passam os oficiais
formados pelas diversas escolas.
112
Apesar de não minuciosa, a descrição permite concluir de antemão que, pela
duração e idade de ingresso, os resultados das interações sociedade-indivíduo
tendem a ser diferentes para os indivíduos pertencentes aos distintos grupos.
Por exemplo, a construção da identidade profissional para os formados pela
AMAN e pelo IME será diferente da construção dos formados pela EsSEX e pela
EsAEx, cujos alunos já possuem uma identidade profissional prévia e distinta da
militar.
Até mesmo entre os formados pela AMAN e pelo IME tal construção se dará de
forma distinta, pois somente naquela as atividades operacionais fazem parte da
rotina durante toda a formação.
Assim, considerando o Exército como “Instituição Total”, pode-se ver que tal
premissa será mais marcante para os oficiais oriundos da AMAN do que para os
demais, os quais, mesmo assim, não estão imunes às interações com a sociedade,
pois, findo período de formação, também finda a reclusão.
Como medida de como a rotina da AMAN busca controlar a totalidade dos
aspectos da vida do interno, a transcrição de parte do regulamento da “Casa dos
jovens detentos em Paris”, datado da década de 1780, feita por Foucault (1987)
apresenta um paralelo assombroso com a rotina daquela Academia Militar.
Fornecendo também uma medida de como se dá parte do processo de moldagem
do indivíduo.
Uma outra faceta deste processo se deve à própria grade curricular acadêmica.
Nos dois primeiros anos, as disciplinas encontram-se quase todas, com exceção da
língua portuguesa, no universo das quantitativas/exatas. Sendo que disciplinas com
conteúdo mais teórico-crítico são ministradas apenas nos dois últimos anos.
113
Um docente mais antigo naquela Academia, certa vez confidenciou que o
objetivo de tal ordenação é o de justamente só permitir que as discussões naturais
advindas das disciplinas teórico-críticas sejam conduzidas de acordo com os valores
passados pela AMAN nos anos anteriores.
Este processo já não é conduzido pelos professores, mas pelos oficiais que
comandam as companhias de alunos, quer seja na rotina, no desenrolar das
atividades operacionais ou ainda nas sessões destinadas a tratar de temas ligados a
valores militares, ocorridas com freqüência semanal durante os dois primeiros anos,
nas quais normalmente o comandante da companhia aborda os valores já com a sua
interpretação. Neste processo, portanto as disciplinas de caráter exato tem o papel
de não interferir na recepção dos valores.
Apesar de tal afirmativa não ser de possível comprovação, pois é bem difícil que
tal intenção esteja manifesta em algum documento, ela se apresenta como sendo
bastante coerente com o que se observa tanto no que estaria no escopo de uma
“Instituição Total” deste tipo, quanto no próprio decorrer do curso da AMAN.
O universo dos sargentos de carreira possui formação muito similar. Curso com
duração de dez meses em regime de internato e todas as peculiaridades da
formação da AMAN com relação aos controles. Entretanto, suas atividades se
restrigem à instruções operacionais, sendo exigido a conclusão do Ensino
Fundamental como pré-requisito de ingresso. (Normalmente, a média de idade de
ingresso na escolas de formação de sargentos é de 21/22 anos).
Já a formação dos sargentos temporários é feita na mesma unidade no qual já
estão servindo (os sargentos temporários são selecionados dentro do universo de
cabos e soldados lotados normalmente na organização militar para a qual há vagas),
114
ou em outras unidades por motivo de economia de escala, cujos cursos têm duração
de aproximadamente três meses.
As diferenças internas com relação ao resultado das dialéticas indivíduo-
sociedade, observadas como conseqüência das distintas formações dos oficiais,
acentuam-se ainda mais ao se considerar a formação dos sargentos. Pois esta além
de ser de menor duração que a dos oficiais da AMAN, tem como público alvo
pessoas com escolaridade média menor que a dos oficiais.
Trazendo isso para o campo das mudanças pelas quais a sociedade passa e
suas implicações em termos de contestações, como se viu na seção anterior,
configuram-se três principais situações.
Na primeira, e que vem a ser a imensa maioria dos casos, tem-se as unidades
cujos quadros são compostos em sua maioria, se não totalidade, por oficiais
oriundos da AMAN.
Se as distintas integrações sociais produzem dialéticas distintas para cada
grupo, não somente se percebe um menor grau de contestação por parte dos oficiais
oriundos da AMAN, como também eles se apresentam como menos perceptivos às
mudanças.
Já se colocou que as mudanças não ocorrem de forma consciente, mas os
indivíduos, à medida que sentem algum grau de desajuste em seus ambientes de
trabalho, estão vivenciando as manifestações que essas mudanças desencadeiam
em suas vidas.
Se a formação dos oficiais de AMAN, tem como conseqüência uma não
transferência da experiência que vivenciam na sociedade para o interior das
organizações, não permitindo que eles percebam qualquer desajuste, isso também
115
terá implicações na percepção que as mudanças têm implicações mais profundas
para a própria organização.
Desta forma, eles se tornarão os principais bastiões de defesa das tradições e
regras, estando incapacidados de fazer a distinção entre contestação das regras e
da organização.
Esta conduta também não se dá de forma uniforme. E este grau de
diferenciação não se dá somente de forma idiossincrática (analisá-la seria por
demais complexo, bem como fugiria ao escopo e à metodologia deste trabalho), mas
é observada em diferentes grupos.
Entre os oficiais oriundos da AMAN, são observadas notadamente diferenças de
posturas em dois grupos principais: os oficiais mais jovens e os oficiais do Serviço
de Intendência.
A época pós-moderna não surgiu num instante. Sinais das mudanças já vêm
sendo dados desde a década de 70 (Aktouf, 2001). Quanto mais jovem a pessoa,
mais sua identidade como indivíduo foi construída neste novo cenário. Assim,
mesmo com toda a característica da formação da AMAN, a qual produz um alto grau
de conformidade dos seus formandos com as normas, as características da
sociedade pós-moderna já fazem parte do indívido, o que resulta no observado
maior grau de contestação por parte dos oficiais mais novos.
Um outro fator pode ser identificado. O percentual de oficiais mais novos que
freqüentam cursos superiores é maior que passado. Pode-se inclusive observar que,
no interior do círculo dos oficiais mais novos, há um certo consenso quanto à
importância de se freqüentar outro curso superior. Isso traz como uma conseqüência
uma maior troca com a sociedade e todos os reflexos que esta troca tem para o
indivíduo e sua vida no Exército.
116
(Não há base de dados disponível para que se possa quantificar este aumento
de percentual. Todavia, ao se entrevistar os oficiais quanto a essa questão, tem-se
que o que antes era exceção, e raro, atualmente é um fato bastante comum. Adendo
este que também diz respeito ao nível de escolaridade dos sargentos, abordado
mais adiante).
Além da própria informação advinda do conteúdo dos cursos, a troca de idéias,
o ambiente de questionamento aberto normalmente existente nas instituições de
ensino superior fazem suscitar o espírito crítico nesses oficiais, o que acaba alguns
deles a o levar para o interior das unidades nas quais servem.
Não se pode precisar em que medida um dos fatores afeta o outro. É bem
provável que a própria característica dos oficiais mais novos os levem a buscar outro
curso superior, o que acaba por reforçar o espírito crítico já latente neles, ratificando,
então, tal necessidade. De qualquer maneira, é um movimento que, se bem
conduzido, poderá encontrar o caminho para que as mudanças das regras não
necessariamente se traduza em fim da instituição.
O outro grupo observado é o dos oficiais do Serviço de Intendência. Este
pessoal é o responsável pela vida administrativa e logística do Exército Brasileiro.
Como direta conseqüência da natureza das suas funções, há um constante e
considerável contato com empresas civis, envolvendo negociações de contratos,
aquisições de bens e contratação de serviços.
Muitas vezes, ainda, esse pessoal é obrigado a encontrar soluções “fora da
norma” para problemas que afligem as unidades, como, por exemplo, o risco de
interrupções de fornecimento de material por falta de crédito orçamentário ou para
que sejam sanadas as deficiências em material que determinada unidade tenha,
caso o crédito seja específico para outro tipo de material, problemas esses que, por
117
conta das amarras da legislação que regulamenta o assunto, não poderiam ser
resolvidos dentro da norma.
Todo esse contato com o público civil, aliado à necessidade muitas vezes
cobrada pelos superiores hierárquicos de resolver os problemas administrativos das
unidades, obrigando-os a transitarem fora da norma, trazem como conseqüência a
percepção, mesmo que inconsciente, de que normas e regras podem ser
questionadas e mudadas sem que a instituição em si seja questionada.
Quando, por fim, se tem a interseção destes dois grupos, ou seja, oficiais mais
novos do Serviço de Intendência, já se pode supor que todas essas considerações
são potencializadas, haja vista o reforço mútuo das questões inerentes a cada
grupo.
Na segunda situação, estão as unidades de Saúde. Nestas, a quase totalidade
dos quadros é composta por médicos e dentistas (formados pela EsSEx) e
sargentos auxiliares de enfermagem.
A formação dos oficiais do Serviço de Saúde, além de ser de curta duração e
contar com formandos de maior faixa etária, é feita em indivíduos que já tinham uma
prévia identidade profissional constituída.
Neste caso, a eficácia da formação no que se refere à conformidade com as
normas é limitada, podendo-se concluir que, de maneira geral, o que se observa nas
organizações civis com relação às mudanças e suas implicações ocorre de forma
semelhante, inclusive porque, nestas unidades, até o comando é composto por
oficiais do Serviço de Saúde.
Entretanto, a capacidade de mudança de regras é limitada. Se forem regras que
digam respeito específico à unidade, as mudanças não são tão difíceis de
acontecerem, desde que não interfiram na interface da unidade de Saúde com as
118
demais. Mas as que extrapolam esses limites dificilmente mudam, pois estas, para
serem mudadas, normalmente dependem da aprovação de oficias oriundos de
AMAN, superiores hierarquicamente ao comandante da Unidade de Saúde em
questão, e que, portanto, são mais resistentes às mudanças.
Na terceira, unidades com grande percentual de Engenheiros Militares
(formados pelo IME) ou do Quadro Complementar (formados pela EsAEx). Este
pessoal apresenta a mesma característica do pessoal de Saúde quanto à questão
da formação.
O que é observado nestas unidades, porém, difere das unidades de Saúde.
Como muitas vezes os superiores hierárquicos deste pessoal são oficiais de AMAN,
mesmo as mudanças restritas às unidades são difíceis de acontecer. Mesmo assim,
a especificidade do assunto técnico faz com que algumas mudanças sejam
possíveis, diante da impossibilidade de alguns superiores de outra formação
opiniarem sobre a legitimidade da necessidade delas. Todavia, há resistência na
mesma medida em que é percebida qualquer ameça à autoridade.
De qualquer maneira, a despeito dessas peculiaridades, os dois grupos de
oficiais oriundos da AMAN (mais novos e do Serviço de Intendência) e as segunda e
terceira situações de unidades, não só se constituem em minoria, como também o
poder decisório para implementação de quaisquer mudanças estruturais ainda se
encontra além da esfera de competências deles.
Por isso mesmo que, ao se falar em reflexos da Pós-Modernidade para a
Gestão no Exército Brasileiro, e mais especificamente no que se refere ao sistema
de Avaliação de Desempenho, o quadro mais freqüente observado é o da primeira
situação apresentada: unidades com oficiais oriundos da AMAN. Sendo este,
portanto, o objeto de análise mais minuciosa a partir de agora, e inclusive aquele
119
que apresenta o quadro mais conflitante e com maior impacto para o sistema de
Avaliação de Desempenho.
Mesmo assim, quando se apresenta as demais situações existentes, tanto com
relação aos distintos tipos de formações, quanto com relação às diferentes
composições de unidades, pode-se perceber como diversas lógicas existem dentro
de uma organização cujo estereótipo adotado pelo cidadão comum não comportaria
e como essas lógicas, ao mesmo tempo que existem, provam que há espaços para
mudanças que não comprometam a existência da organização.
Neste ambiente, observa-se nitidamente uma dicotomia: a atitude dos oficiais
versus as atitudes dos sargentos.
As diferenças nas formações trazem conseqüências que só não são mais
manifestas, graças ao poder coercitivo dos regulamentos, que assim o são em prol
da manutenção da hierarquia e disciplina.
Entretanto, não é incomum se escutar frases como “não entendo como os
oficiais aceitam tudo sem reclamar”, pronunciadas por sargentos em diversas
situações. E se pode ousar dizer que é em torno desta dicotomia que residem as
maiores implicações para gestão no Exército Brasileiro. Pois ela não se trata
somente de trazer o dilema emergido da Pós-modernidade para o interior do
organização, mas sucita diferentes percepções sobre o fenômeno que tornam ainda
maior a lacuna entre esses dois grupos.
A origem desta pode ser entendida como uma extensão das diferenças entre o
poder ideológico mediante o qual os oficiais se dobram às regras da instituição e o
poder coercitivo que doma os espíritos dos sargentos.
Contudo, mesmo com a aparente eficácia da coerção dos regulamentos em
domar os insatisfeitos, não se extingue a reação. Pois o poder coercitivo não é tão
120
duradouro quanto o ideológico, abrindo possibilidade para contestação ou até
retaliação quando ao indivíduo é possível escapar das garras da punição (Foucault,
1987).
Partindo da construção da própria identidade para se retomar a questão do
poder mais adiante, enveredando-se na sua dinâmica, a pós-modernidade, ao
fragmentar o inequívoco eu em diversos discursos fragmentados (Beck, 1997a),
torna tal discurso fragmentado um problema para o Exército.
Há militares que desempenham funções estritamente administrativas, outros
estritamente técnicas. Todavia, se no universo destes houver aqueles que queiram
desempenhar seus papéis de técnicos em um momento e de militares em outro,
quando a situação assim demandar, na imensa maioria das vezes estes são
confrontados pelos superiores hierárquicos com a internamente conhecida assertiva:
“você é militar em primeiro lugar, depois é administrador (médico, engenheiro, entre
outros)...” .
Esta situação acontece mais freqüentemente com sargentos que ocupam
funções de auxiliares administrativos, oficiais da administração e mais
freqüentemente com médicos lotados em unidades que não sejam de saúde e
outros técnicos em similar situação.
Pode ser apontada outra razão para este tipo de frase o fato de que, para
ocupar cargos administrativos, são selecionados indivíduos de cargos operacionais
mais antigos, sem a preocupação formal de prepará-los para estes cargos.
Assim, muitos daqueles oficiais recolocados diretamente de funções
operacionais para funções administrativas, sem qualquer tipo de treinamento formal
para tal, passam a tratar os seus subordinados em funções administrativas da
121
mesma forma como tratavam seus subordinados operacionais, esperando daqueles
o mesmo tipo de resposta que esperariam destes.
Isso, portanto, reforça a necessidade da compreensão de todas as esferas de
atividades existentes no Exército, bem como denota a incapacidade de separação
das duas para a presente análise, pois invariavelmente a prática operacional acaba
sendo levada para a prática administrativa, com as conseqüências a seguir.
A reação a esse tipo de discurso não é maior apenas por parte dos sargentos e
dos oficiais com formação que não seja a da AMAN. Também entre os oficiais
oriundos da AMAN, especialmente os do Serviço de Intendência, por
desempenharem atividades administrativas, reagem negativamente a esse tipo de
discurso.
Reação essa que cria um clima de desânimo e frustração porque, normalmente,
o bom andamento das atividades administrativas depende invariavelmente da
capacidade de contornar as normas, que implica, principalmente, no
estabelecimento de canais de comunicação extra-oficiais com as demais unidades
das quais depende a vida administrativa da unidade em questão.
Ademais, tais afirmativas são mais freqüentemente utilizadas para a negação de
alguma solicitação e “esquecidas” quando os superiores esperam que seus
subordinados resolvam determinados problemas pelas vias não-oficiais.
Esse aparente paradoxo pode soar quase que como uma postura imatura por
parte dos superiores. Na verdade, porém, ela tem uma causa mais profunda e tácita.
Recordando, o ambiente atual é um no qual as tradições estão sofrendo
constantes contestações, precisando se defender (Beck et al., 1997). Defesa esta
normalmente incapaz de distinguir contestação às tradições de contestação à
instituição, normalmente fruto das características modernas desta.
122
Todavia, quando as tradições são tomadas como sendo a própria essência da
organização, sendo elas inclusive instrumento para se perpetuar o seu caráter de
instituição total, ainda com lógica da tradição como essência permeando também os
oficiais que têm o poder para modificá-las, a defesa se torna ainda mais ferrenha.
A defesa normalmente se dá normalmente em seus próprios termos, típico da
frase “desde o tempo de Caxias é assim” (referência ao Duque de Caxias, patrono
do Exército Brasileiro), várias vezes evocada para se justificar alguma tradição
quando os argumentos para defendê-la não são encontrados, ou insuficientes para
convencer o contestador. Podendo se dar, ainda, justificando-as como tendo valor
em contraposição aos de outro setor da sociedade (Giddens, 1997). Neste segundo
caso, busca-se evocar a aparente superioridade moral dos valores da caserna sobre
aqueles da sociedade civil.
Uma outra razão para a defesa das tradições ser exacerbada é o fato de que o
Exército pode ser considerado como um sistema social atributivo, na definição de
Douglas (1998). Este tipo de sistema, ao mesmo tempo que possui uma atuação
mais marcante sobre a sua memória, também dela depende para sobreviver. O
problema existe quando defesa de tradições se confunde com imobilismo da
organização, o que costuma acontecer por medo de que a organização perca a sua
referência.
Na prática, a defesa dessas tradições erguem barreiras consideráveis a
qualquer processo de mudança. Por um lado, devido às características modernas
das organizações, também encontradas no Exército Brasileiro. Por outro, a formação
do Exército republicano se deu sobre a égide positivista, de caráter essencialmente
cartesiano, o que potencializa a fixação das estruturas sobre o qual o Exército se
desenvolve.
123
Esta formação, atrelada ao pensamento cartesiano, tem desdobramento quanto
à mudança. Como a racionalidade cartesiana considera prejudicial no processo
racional a presença da emotividade, normalmente este aspecto não é considerado
na sua gestão, tampouco quando se trata de questões de mudança.
Entretanto, a dinâmica coletiva é condicionada pela afetividade existente entre
os membros de determinado grupo, com conseqüências na forma como
informalmente o trabalho será configurado e para a qualidade deste (Chanlat, 1999).
Isso reforça a necesidade de consideração destes aspectos na racionalidade,
revelando-se a sua ausência no processo racional problemática para o mesmo
(Damásio, 1996).
Portanto, quando a emotividade é trazida pelos contestadores quer seja no
discurso de contestação, seja como objetivo final da contestação, a reação é quase
sempre extremamente negativa.
A interação da postura de adoção da racionalidade cartesiana em contraste com
o conteúdo emotivo das contestações, devido as peculiaridades das relações de
poder existentes no Exército Brasileiro, bem como a forma como a maioria dos
oficiais oriundos de AMAN tem internalizado tais pressupostos, acaba fazendo com
que qualquer mudança que não planejada por quem tenha a legitimidade
institucional para tal tem um custo individual muito elevado, muitas vezes mais
elevado do que o indivíduo esteja disposto a se sacrificar.
Além disso, a visão cartesiana também acaba por ver essas mudanças como
desvios nos procedimentos, o que é visto com desconfiança pela hierarquia, muitas
vezes por questões de poder e domínio sobre os subordinados (Dejours, 1997).
Poder e domínio são palavras intimamente relacionadas com hierarquia e
disciplina. Considerados como os pilares básicos da organização militar, conforme já
124
apresentado, quaisquer ações que os enfraqueçam estarão invariavelmente, na
visão da organização, enfraquecendo-a.
Como as suas características eminentemente modernas a impedem de
distinguir o que venha a ser contestação à regra de contestação à organização,
também a impedem de conceber qualquer tipo de processo que possa ameaçar tal
ordem.
A grande implicação para isso é que há uma clara distinção entre os
“pensantes” e os “executantes”. Com isso, busca-se evitar que aqueles que não
disponham da prerrogativa de pensar ameacem a ordem estabelecida.
Na origem, tal distinção classificava os oficiais como sendo o grupo “pensante” e
os demais (sargentos, cabos e soldados) no grupo “executante”. Independentemente
de o quão bem ou mal essa divisão tenha funcionado até o presente, percebe-se
atualmente algumas conseqüências negativas dessa distinção que, apesar de não
ser mais tão rigorosa no que diz respeito aos sargentos, ainda existe.
E esta separação vai na contramão daquilo necessário para que os integrantes
da organização sintam-se motivados a participar de programas de qualidade e
inovação, fundamentais para a sobrevicência das organizações (Migueles, 1999).
Talvez esta seja uma das razões do relativo insucesso da implantação do Programa
de Gestão pela Qualidade Total no Exército Brasileiro como um todo, só sendo
verificados casos isolados de êxito na implantação, mesmo assim tendo sido
apontada a falta de preparo dos recursos humanos como um forte óbice à
consecução dos objetivos do Programa (Andrade, 1999).
Ainda mais, “na modernidade reflexiva, as oportunidades de vida são uma
questão de acesso [...] e do lugar nas novas estruturas de informação e
comunicação” (Lash, 1997b, p. 147). Ou seja, ao colocar os sargentos numa posição
125
secundária na estrutura de informação e comunicação do Exército, eles percebem a
restrição a que são impostos com relação às oportunidades de vidas, além das
limitações que a carreira já tem em si.
A posição de descrédito com relação ao Sistema de Avaliação de Desempenho
também pode ter a mesma causa. Ao se verem alijados das estruturas de
informação e comunicação que encerram o de Avaliação de Desempenho, ou
ocupando posições de meros espectadores nestas, os sargentos podem passar a
considerá-lo como algo imposto pelo comando ou mais um instrumento coercitivo
deste, passando a desconsiderar a validade das informações advindas dele.
Mas essas implicações não se limitam aos sargentos. Também entre os oficiais
ocorrem reações similares. Apesar destes estarem no grupo “pensante”, a posição
na estrutura de informação se dá pelo grau hierárquico. Aqueles abaixo de
determinado grau hierárquico não têm possibilidade de opinar sobre questões que,
muitas vezes, dizem respeito a eles. Desta forma, ao se desprezar esta capacidade
de contribuição, produz-se efeito semelhante ao produzido nos sargentos.
Esta situação pode ser interpretada por estes como a de excluídos, que fazem a
organização sobreviver à custa de seu trabalho, mas que só tem acesso à recepção
da informação e não ao seu envio. Além desta situação se apresentar como um
poderoso combustível para a crítica (Lash, 1997b), também traz conseqüências
danosas para a organização.
Entre os principais objetivos da Avaliação de Desempenho encontra-se o de
conseguir melhorias voltadas à qualidade, bem como clima de cooperação entre os
membros das equipes de trabalho, entre outros. Os programas de qualidade, que
têm íntima ligação com a inovação nas organizações, dependem da participação
ativa e motivada dos seus integrantes para produzir resultados satisfatórios. E tal
126
participação não se verificará, pois não pode esperar que os ressentimentos
advindos desta separação sejam transpassados por qualquer sentimento de
cooperação entre as equipes, pois estas tampouco são assim vistas, graças à
separação entre quem pensa e quem faz.
Indo mais além, a estratégia de uma organização é algo que pode também ser
desenvolvida inadvertidamente. Isso ocorre normalmente por um processo de
aprendizagem, o que é dificultado quando ocorre tal dicotomia, refletindo no fato da
inovação não conseguir ser nunca institucionalizada (Mintzberg, 1994).
Este tipo de processo de aprendizagem tem início com o indivíduo. O qual,
mediante sua experiência, descobre novas formas de se efetuar o trabalho ou novas
estratégias naquilo que esteja ligado ao seu trabalho específico.
Como essas novas formas não fazem parte da norma, sendo o inovador
pertencente ao grupo “executante”, elas são vistas como desvios no procedimento,
recaindo-se na desconfiança dos superiores (Dejours, 1997).
Como essas novas formas, interpretadas como desvios, provavelmente
impactarão negativamente na avaliação daquele que as adotar, ou os indivíduos
buscarão evitar a agir de forma inovadora, evitando serem mal avaliados, ou não se
importarão com a má avaliação que lhes for feita. Em resumo, é configurado um
quadro em que as duas situações possíveis são desfavoráveis ao desenvolvimento
da organização.
O curioso é observar o paradoxo existente no discurso da organização com
relação a este assunto. Por um lado, é freqüente a conclamação para que os
indivíduos tenham iniciativa durante o trabalho. Por outro lado, é comum se escutar
a frase: “inventor começa com I e termina com R. Nunca chega a B” (referência aos
127
conceitos de desempenho “insuficiente”, “regular” e “bom”). Ou seja, iniciativa, neste
caso, só pode ser sinônimo de antecipar os desígnios da chefia, e nada mais.
Resumindo, a separação entre quem “pensa” e quem “faz” causa danos tanto ao
sistema de Avaliação de Desempenho per se, pois as possíveis atitudes
supracitadas dos indivíduos se traduzem em resultados imprecisos da avaliação,
quanto para o desenvolvimento da organização.
Por um lado, o processo de inovação não contará com a necessária participação
daqueles potenciais descobridores de novas formas de executar as atividades. Por
outro, como o resultado da Avaliação de Desempenho não será preciso, este
perderá em eficácia para a consecução de seus objetivos.
A dicotomia faz x pensa também é conseqüência da forma como o Exército
Brasileiro vê o processso de inovação, fazendo com que o caminho escolhido para
gerenciá-la adquira tal característica (Bessant, 2002).
Levando esse raciocínio para a Avaliação de Desempenho, o Exército, com sua
característica de Instituição Total, amarrado à todas as estruturas sobre as quais já
se abordou, acaba, de fato, utilizando-a como instrumento de dominação. E ao
desencorar qualquer atitude que permita aos executantes modificarem rotinas que
possam inclusive vir a refletir em mudanças do próprio sistema de Avaliação de
Desempenho, este ciclo tende a se auto-reforçar e, por fim, perpetuar.
Mas o Exército não se encontra isolado. O ambiente no qual se encontra
interage com os sues integrantes, lançando neles a sua influência. E vem a ser
justamente pelas influências do ambiente que os choques começam a emergir.
A pós-modernidade, quanto mais vai sendo absorvida pela sociedade, mais dá a
capacidade de reflexão aos indivíduos sobre as suas condições sociais e, então, os
128
possibilita modificá-las (Beck, 1997b). E esta absorção vem ocorrendo na sociedade
brasileira.
Em conseqüência, observa-se no interior das unidades do Exército Brasileiro um
forte criticismo com relação às condições sociais, pois todas as estratégias de
dominação e controle total passam a ser questionados pelos seus integrantes.
Este criticismo é muito mais forte por parte dos sargentos. Criticismo que é tanto
contra aquelas normas ou procedimentos que são utilizados como instrumentos de
dominação, caráter este percebido pelos sargentos, quanto contra eventuais ordens
ou decisões da instituição que também visam perpetuar tal sistema.
Apesar dos sargentos não possuirem autoridade suficiente para modificar as
primeiras, podendo somente utilizar estratégias de ação de desvios nos
procedimentos, possibilitando-os minimizar os efeitos destes, a reação é mais direta
com relação às últimas.
Quando qualquer ordem ou decisão gera um descontentamento muito grande
entre os sargentos, é comum que eles solicitem uma reunião com o emissor de tal
ordem, quando possível. Se concedida, tentam revertê-la.
Muitas vezes não conseguem, quando o emissor utiliza sua autoridade para
fazer prevalecer sua ordem, contra a qual só restará aos sargentos lamentar e
manter as reclamações entre eles. Mas em outras conseguem revertê-la ou produzir
modificação naquilo que na ordem mais desagrada.
Já no círculo de oficiais, muito raramente se vê alguma solicitação de reunião
quando alguma ordem desagrada. Quando muito, solicitam que a reinvidicação seja
levada ao emissor por algum superior hierárquico não diretamente envolvido na
ordem. Entretanto, em especial entre os oficiais mais novos, as reclamações entre
eles acontecem. Indiretamente, a reivindicação levada por um superior se traduz
129
num tácito reconhecimento de que os superiores são mais aptos a decidir,
denotando claro reflexo da implicação da formação dos oficiais nas suas atitudes, ou
ainda, de que tal reivindicação não é uma contestação à ordem, o que poderia ser
interpretado como quebra de hierarquia.
É tão notável a diferença entre os oficiais e sargentos com relação à reações
contra ordens daquela natureza, que não é incomum se escutar em conversas entre
sargentos e oficiais que possuem maior proximidade os sargentos dizerem: “não sei
como é que os oficiais aceitam tudo sem reclamar”; ou: “os oficiais abaixam a
cabeça para tudo o que é ordem”.
Além da diferença na formação fazer com que as influências do ambientes
gerem uma reação mais forte por parte dos sargentos do que dos oficiais, há ainda
um outro fator que vem a potencializar a propensão a reagir.
O número de sargentos que possuem curso superior ou estão cursando algum
tem aumentado a cada ano. Não se pode precisar o que tem levado um maior
número de sargentos a procurar as universidades, mas duas constatações podem
estar contribuindo.
Em primeiro lugar, a abertura de um maior número de instituições de curso
superior, reduzindo os custos das mensalidades, tornando assim o curso superior
mais acessível. Ademais, observa-se que os próprios sargentos tratam o ingresso no
curso superior como uma necessidade, na maioria para que possam ter outras
oportunidades profissionais.
Independente de quais sejam as razões, as conseqüências são claras. O curso
superior contribui para o aumento do capital intelectual dos sargentos. Este aumento
se transforma numa maior capacidade deles em decifrar e manipular estruturas
complexas (Bourdieu et Passeron, 1994).
130
Assim, os sargentos começam a questionar as regras, procedimentos e práticas
que têm o latente objetivo de dominação, pois eles passam a ter essa capacidade
decifratória de que antes não dispunham. E não somente estas, mas como todas
aquelas que, se modificadas, permitiriam uma otimização do processo de trabalho. É
importante lembrar que os sargentos são vistos como executores. Como tais, suas
maiores preocupações são o de efetuar suas atividades da forma que for mais fácil
para eles. Não tendo eles, portanto, e também por conta da formação, uma devoção
à norma pela norma, em especial quando identificam nela elementos de dominação.
Estes dois fatores, absorção da pós-modernidade pela sociedade e maior capital
intelectual dos sargentos, não somente potencializam a propensão a reagir. Eles
também se reforçam mutuamente, na medida em que a reflexão sobre as condições
sociais levam muitos sargentos a perceberem suas necessidades de um maior
aprimoramento intelectual, os levando à universidade. Lá ingressando, o maior
capital intelectual aquirido durante o curso, aprimora ainda mais a sua capacidade
reflexiva. Sendo criado, assim, uma espiral ascendente de maior criticismo e
propensão à reação.
Essa transformação, diria-se assim, de atitude dos sargentos é percebida pelos
oficiais. Tanto que observações do tipo “não tem ninguém bobo hoje em dia”,
mencionadas com relação aos sargentos, não são raras. Entretanto, esta percepção
é ingênua, pois ela não enxerga que essa transformação vai ao ponto do
questionamento das estruturas sob as quais se buscar subjulgar os indivíduos.
Portanto, ela é ineficaz no sentido de se gerar ações que evitem as reações dos
sargentos ou as direcione para a reformulação das estruturas.
Considerando que a cognição é sociologicamente dependente (Fleck, 1981),
pode-se supor que a posição inerente dos oficiais de inquestionabilidade das
131
estruturas os impeça, em grande parte de chegar a qualquer outra percepção além
daquela que já têm. Tanto isso que, apesar de afirmar-se que “não há ninguém mais
bobo”, mantem-se a separação entre quem pensa e quem faz, nem considerando a
possibilidade de contribuição que outro grupo possa dar.
Com isso, muitas vezes a natural reação diante à impossibilidade do
convencimento, é o apelo à hierarquia, que, apesar de questionada, só não é
abertamente desafiada pelo poder disciplinar imposto aos indivíduos.
Segundo Foucault (1987), o homem produtivo só é possível por ele estar preso
a um sistema de sujeição. Ou seja, só há utilidade produtiva no homem na medida
em que ele for submisso. E, como já se viu, o poder simbólico é aquele que permite
essa submissão em tempos pós-modernos.
Todavia, as estruturas sobre as quais o Exército foi construído, e tenta se
manter, não permitem que este tipo de poder seja institucionalmente utilizado. Como
instituição total, ainda é o poder coercitivo o mais utilizado. Este, por sua vez, leva à
alienação dos indivíduos (Etzioni, 1989).
Mas como os indivíduos recebem outras influências, bem como vêm ganhando
maior capital intelectual, a submissão à qual são sujeitos para produzir também são
contestadas por estes, sendo que, como não têm o poder de modificá-las, acabam
sufocando o lado produtivo.
Em outras palavras, como há a percepção da inadequação para os sargentos e
outros contestadores do poder exercido, não podendo os mesmos modificá-lo, o
resultado final é a queda na satisfação destes no trabalho e também de sua
produtividade.
Na medida em que saber e poder estão relacionados diretamente (Foucault,
1987), pode-se reforçar a idéia de que a Avaliação de Desempenho é uma forma de
132
exercício de poder sobre o subordinado, no caso específico do Exército, até mesmo
de subjugação.
Só que a subjugação não se restringe ao sistema de Avaliação de Desempenho.
Para ser eficaz, deve manter a disciplina. Portanto, daí a necessidade do quartel
como lugar isolado do mundo exterior. Pois a cerca evita que o contato com o
mundo civil crie quarelas à disciplina (Foucault, 1987). Apesar dos militares poderem
se ausentar dos quartéis após o término do expediente, há em todas as esferas de
formação, em maior ou menor duração, um período de internato, de isolamento do
mundo exterior.
Mesmo durante as atividades diárias, o poder disciplinar é utilizado para
subjugar os indivíduos, com definições estritas de horários e realizações de paradas
e formaturas que, por fim, visam atuar na elaboração temporal dos atos, por corpo e
gesto em correlação e articular corpo-objeto (idem).
Com isso, disciplinando o corpo, busca-se disciplinar a alma do soldado. Donde
vem o sentido da frase que “se percebe se uma tropa é boa pela sua ordem unida”.
Ou seja, há todo um sistema de sujeição mais complexo do que o já discutido. E a
noção de boa tropa vem, antes de mais nada, pela sua disciplina.
O indivíduo vai sendo construído via poder disciplinar, objetivo que tenta ser
alcançado via as relações de poder, regimes de verdade e discursos que sustentam
as relações (Foucault, 2000). E essa construção também será derivada das
analogias sobre as quais a organização estiver construída (Douglas, 1998).
No Exército se observa a ênfase que é dada à ordem unida, a disciplina do
grupo, às muitas vezes punições coletivas aplicadas e aos discursos de espírito de
corpo e lealdade. Isso busca canalizar os pensamentos individuais para uma visão
133
mais harmônica de interesse e poder. Só que isso não considera aquilo que é
central nas ciências humanas, o estudo da dominação e sofrimento (Chanlat, 1999).
Desprezando tais questões, a artificialidade que é a disciplina do corpo ainda é
utilizada como mecanismo de poder (Foucault, 1987), esquecendo-se que o
indivíduo atualmente reflete sobre e não mais se deixa convencer. Não é sem razão
que, quando a vigilância que deveria ser permanente, ilimitada, exaustiva e
indiscreta (Carvalho et Alcadipani, 2001), se ausenta, ocorre todo tipo de
manifestação não permitida.
Poder-se-ia argumentar que este tipo de disciplina se justificaria no Exército,
devido à natureza das suas atividades. Afinal de contas, numa organização que se
destina a combater, em que invariavelmente a morte estará circundando os seus
integrantes, como abrir espaço para outra coisa que não a razão instrumental e o
poder disciplinar?
Na verdade, esse tipo de indagação é mais estereotipada do que
correspondente à realidade. Normalmente ela é evocada pelos próprios militares
para justificar suas práticas. Entretanto, a maior parte das atividades que os
soldados desempenham nas suas rotinas diárias passa longe do que seria o cenário
do campo de batalha.
Mesmo assim, isso por si só não seria suficiente para justificar o abandono dos
antigos modos de vida, já que, quando se fizesse necessário o combate, eles seriam
decisivos em fazer com que os soldados se portassem corretamente no campo de
batalha.
Mas esta argumentação, evocada por aqueles que visam defender as práticas
do Exército, é refutada a partir do seguinte raciocíonio.
134
A noção de habitus reflete o fato da verdade não ser conceitual, mas seriam as
práticas compartilhadas que a tornariam evidente (Lash, 1997b). E que práticas
compartilhadas são essas?
As práticas compartilhadas são as rotinas vivenciadas que fazem emergir o self
do indivíduo (Bourdieu, 1977). Portanto, a noção do habitus é justamente a
predisposição com a qual os indivíduos agirão dentro dos mundos nos quais estas
práticas existem.
Portanto, trazendo esta noção para o mundo Exército, observa-se que
justamente as unidades mais operacionalmente ativas diferem-se das demais no
que se refere ao habitus.
Nestas, como o Batalhão de Forças Especiais e as demais unidades da Brigada
de Infantaria Pára-quedista, percebe-se uma nítida diferença em todas as esferas de
relacionamento de poder, controle e da dicotomia entre fazer e pensar que torna o
ambiente destas muito menos rígido do que o das demais unidades.
Justamente por serem unidades consideradas de elite, talvez elas se permitam
agir assim sem que aparentemente estejam em flagrante choque com aquilo que é
preconizado pela organização como um todo. É importante que se reforçe que o
habitus atua em categorias impensadas, sendo quase que como um inconsciente
coletivo. Assim, as rotinas que se configuram nestas unidades, no qual há uma
predisposição para o ambiente de confiança mútua que se revela nas práticas
adotadas, aparecem naturalmente.
Entretanto, o ambiente mais aberto que existe não causa perda de rendimento
algum aos seus integrantes quando em situação de combate. Pois quando lá se
encontram, passam a agir pela lógica de combate, que produz um habitus diferente
daquele vivido na situação de paz.
135
Esta distinção surge na própria formação das unidades de elite. Por terem esta
característica, os oficiais e sargentos que lá ingressam passam previamente por um
curso específico. Durante este, a lógica do combate é vivida exaustivamente,
quando o instruendo, quer seja ele oficial ou sargento, é considerado como um
aluno, identificado apenas por um número, e que deve obediência aos instrutores,
sejam estes superiores ou subordinados hierarquicamente.
Assim, quando em combate, a lógica que permeará a predisposição do indivíduo
será aquela formada pelo habitus do curso e, fora daquela situação, será o outro
habitus que atuará.
Ao contrário do que se pode inadvertidamente supor, a utilização do termo
habitus para o tempo de paz é feito somente para explicitar a contraposição ao
habitus de combate. Reconhece-se que não há sentido em se falar em habitus se
não for considerado que o mesmo só é formado partindo-se do disciplinamento do
corpo (idem).
Este disciplinamento ocorre, como já foi dito, durante os cursos especiais, no
qual situações de combate, incluindo a privação do sono, o desgaste físico, entre
outras mais situações que atuam diretamente no corpo dos indivíduos contribuem
para a construção do habitus de combate.
Já a prática compartilhada e vivenciada em tempo de paz, a qual se chamou de
habitus em termos de paz para contrapor ao habitus específico das operações
daquelas unidades, é justamente aquela que se verifica quando o ambiente que
circunscreve é outro que não o operacional.
Continuando, coloca-se lógica da ação porque ela vem a ser moldada
socialmente para cada tipo de ambiente em que o indivíduo se encontrar (Bauman,
1998). Isso, então, corrobora com a perspectiva de Bourdieu (1977) e vai de
136
encontro à teoria da resposta idiossincrática a situações diferentes e que justificaria
o permanente estado de tensão e sujeição dos subordinados no Exército para que,
em combate, estes mantivessem a obediência.
Entretanto, a prática das unidades de elite mostra que não somente é possível
adotar outro tipo de postura nas situações fora de combate, como provavelmente
esse tipo de ambiente foi se moldando a partir do momento que os acontecimentos
nas atividades de combate demonstraram essa necessidade, justamente para evitar
insubordinações ou outras reações mais graves por parte dos subordinados. E este
outro tipo de postura, em momento algum, evidenciou casos de quebra de hierarquia
e disciplina em níveis além daqueles normalmente vistos nas demais unidades.
Pode-se especular esta razão porque já foram observados no Centro de
Avaliação de Adestramento do Exército situações que reforçam isso. Neste centro,
cujo objetivo é avaliar as tropas num o ambiente de combate o mais próximo da
realidade, já ocorreram alguns casos de deliberado fraticídio contra superiores que,
quando apurados, tinham origem em descontentamentos gerados na postura dos
superiores nas rotinas da caserna.
É por estes motivos que, então, mediante os processos sociais envolvidos nas
atividades que a postura dos oficiais e comandantes nessas unidades é bem
diferente do que nas demais. E o estilo deles de gerenciar seu pessoal tem um
fundamental papel na formação do ambiente social delas (Migueles, 1999).
As questões de controle – poder – indivíduos no Exército Brasileiro e como a
Avaliação de Desempenho se vê afetada por isso encontra-se num certo paralelismo
com relação às questões abordadas na seção anterior.
137
Todavia, por tudo o que foi exposto, as características peculiares do Exército
tornam essa relação muito mais conflituosa e complexa do que a das organizações
civis em geral.
Deste quadro, emergem dois principais questionamentos. Em primeiro lugar,
vem a reflexão quanto à pertinência da manutenção do sistema de sujeição com
características de instituição total, frente aos danos causados pelo mesmo para a
produtividade e o bem-estar dos indivíduos, e a possibilidade observada de
procedimentos distintos sem que estes reflitam em quebra da hierarquia e disciplina,
medo que justifica a maior parte da resistência à mudanças por parte dos oficiais.
Em segundo lugar, deve ser refletido em até que ponto podem ser considerados
válidos os resultados de um sistema de Avaliação de Desempenho que, entre outros
pressupostos, depende de ambiente aberto e de confiança mútua para funcionar
corretamente. Ademais, é utilizado como instrumento de subjugação, o que vai
flagrantemente contra alguns dos objetivos gerais dos sistemas de Avaliação.
Portanto, quando da análise do sistema de Avaliação de Desempenho do
Exército Brasileiro, objeto do próximo capítulo, estes questionamentos servirão de
base para que a análise do mesmo não se restrinja aos seus aspectos técnicos e
contemplem as condições sociais sobre as quais deve ser construído.
5 SISTEMÁTICA DE AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DO EXÉRCITO
BRASILEIRO
5.1 Considerações Iniciais
O capítulo anterior lançou questionamentos importantes sobre a validade do
sistema de Avaliação de Desempenho utilizado pelo Exército Brasileiro. Em linhas
gerais, pode-se perceber que as questões que circundam este instrumento de
gestão são muito mais profundas e complexas do que poderia se supor a uma
primeira vista.
Além do que foi apresentado naquele capítulo, há uma outra questão que aflora,
mas também como conseqüência daquilo. Há uma lacuna ética em geral nos
sistemas de Avaliação de Desempenho (Farah, 2000). Lacuna essa que tende a se
consolidar e alargar a partir do momento em que se considera não ser possível que
um instrumento montado sobre bases cartesianas seja ético (Bauman, 1998),
principalmente quando este trata o homem como recurso, ou seja, como meio,
quando para a ética o homem é tratado como um fim (Chanlat, 1999).
Isso tudo, aliado ao fato do sistema assim montado manter os integrantes da
organização distantes do acesso às estruturas de informação e comunicação,
retirando-os as oportunidades de vida (Lash, 1997b), traz descontentamento e até
descrédito com relação a ele.
139
O sistema de Avaliação de Desempenho é mais um instrumento da
administração que visa atender ao seu objetivo de alcance da eficácia nas
organizações (Chanlat, 1999).
Este selo da eficácia, caracterizado por indicadores de lucratividade,
produtividade, entre outros, pressupõe um equilíbrio interno entre os interesses
conflitantes dos empresários e dos funcionários da organização. Pressuposição essa
advinda da formação da ciência administrativa, surgida sobre o paradigma da
Economia Clássica. Entretanto, cada tipo de sociedade demanda um equilíbrio
diferente, o qual deverá ser demonstrado (Douglas, 1998).
Assim, ao se iniciar a apresentação do sistema de Avaliação de Desempenho
do Exército Brasileiro, coloca-se mais uma indagação: até que ponto um instrumento
desses pode ser importado para a gestão pública, mais especificamente para uma
instituição como o Exército, e apresentar os mesmos resultados que se espera dele
no setor privado, considerando, já na essência, que os objetivos desses distintos
tipos de instituições são diferentes?
5.2 Propósitos e Objetivos
Os propósitos e objetivos do sistema de Avaliação de Desempenho adotado
pelo Exército Brasileiro estão definidos em portaria emitida pelo Comandante do
Exército. São estes os propósitos (Brasil, 2001a):
“I - sob o ponto de vista individual:
a) fornecer à Instituição a imagem de cada um de seus integrantes;
b) detectar possíveis desvios comportamentais e suas causas;
c) possibilitar o planejamento e o desenvolvimento de ações para a correção
de desempenhos insatisfatórios;
140
d) facilitar a designação de tarefas compatíveis com a efetiva qualificação do
indivíduo; e
e) permitir o constante aperfeiçoamento do avaliado;
II - sob o ponto de vista organizacional:
a) subsidiar a formulação da política de pessoal; e
b) subsidiar o aprimoramento do sistema de ensino”.
Já quanto aos objetivos, tem-se os seguintes (idem):
“I - direcionar o militar aos cargos mais adequados;
II - subsidiar, em particular, os processos de promoção, de movimentação, de
outorga de honrarias e condecorações, de seleção para cursos, estágios, comando
(chefia ou direção) de organização militar (OM), instrutores ou monitores de
estabelecimentos de ensino e missões no exterior, dentre outros;
III - estimular a maior produtividade; e
IV - permitir que o militar, mediante o conhecimento de sua avaliação, aperfeiçoe o
seu desempenho”.
Ao serem observados os propósitos e objetivos, duas inadequações emergem:
uma interna a eles e outra na sua ligação com a organização.
Internamente, percebe-se a conjugação de elementos de desenvolvimento com
elementos de premiação. Há uma série de problemas para qualquer sistema de
avaliação quando esses dois tipos de objetivos antagônicos se encontram (vide
seção 3.1 – Propósitos e Objetivos da Avaliação de Desempenho).
Assim, ao adotar ambos num mesmo sistema, o Exército já está abrindo mão de
conseguir atingi-los. Na prática, só se verifica a ocorrência do elemento de
premiação, mais ainda não de forma plena, fato este melhor explorado nas seções
5.4 e 5.6.
Abordando mais especificamente os objetivos em si, tem-se que eles estão
compatíveis com o que é pregado pela literatura, apesar de um deles estar
141
causando o antagonismo entre a premiação e o desenvolvimento. Contudo, dos
quatro objetivos determinados pelo sistema, três carecem de mecanismos
institucionais que possibilitem a operacionalização necessária dos seus
desdobramentos.
Com relação ao objetivo de direcionamento do militar aos cargos mais
adequados, a ausência do estabelecimento de perfis para os cargos existentes no
Exército faz com que, mesmo que se conheça perfeitamente cada um dos seus
integrantes, a adequação homem-cargo não tem como ocorrer via sistema.
Ao determinar como objetivo do sistema o de estímulo ao aumento da
produtividade, indicadores claros da produtividade das atividades desempenhadas
pelos indivíduos abrangidos pelo sistema seriam necessários, os quais não existem.
Assim, não há como determinar até que o ponto o sistema consegue promover o
estímulo se não há como medir os seus resultados.
O objetivo de aperfeiçoamento de desempenho por parte do avaliado é
prejudicado pela coexistência de objetivos de premiação no mesmo sistema, bem
como por outros fatores que serão apresentados no decorrer deste capítulo.
Por fim, com relação ao objetivo relacionado à premiação (II), há o chamado
sistema de Valorização do Mérito, objeto da seção 5.6, que trata de operacionalizar
os resultados da avaliação para a consecução daquele objetivo.
Na sua ligação com a organização, não se verifica uma ligação explícita,
tampouco prática, entre os objetivos da avaliação e aqueles da organização,
definidas pela estratégia da organização.
O planejamento estratégico para as unidades do Exército está enquadrado
como a terceira etapa do Programa de Administração pela Qualidade Total.
(Andrade, 1999). Portanto, antes de traçar a linha geral do que deve ser buscado
142
pela organização, ele está envolto em outro processo que não se pode definir até
que ponto prejudica na definição da estratégia da organização.
Além disso, a ligação entre o planejamento estratégico e as suas etapas
antecessoras e o sucessoras são praticamente inexistentes (idem). Assim, mesmo
tendo nos propósitos do sistema o de fornecer subsídios à formulação da política de
pessoal, esta falta de ligação faz com que não se possa crer na capacidade do
sistema de avaliação efetivamente contribuir para tal.
É importante observar como esta falta de ligação com a estratégia, em parte
também pela própria indefinição e falta de interligação dela com as atividades da
organização, vem somente reforçar os problemas relacionados à questão da
inovação, já citados no capítulo anterior.
Mesmo assim, o fornecimento de subsídios pelo sistema não implica no seu
desenho baseado na estratégia da organização, mas apenas algo que poderia
contribuir para a formulação da mesma. Logo, manteria-se a crítica, mesmo que os
subsídios fossem fornecidos.
E como uma conseqüência direta da independência do sistema com relação à
estratégia, já se pode adiantar que dificilmente ele servirá para o aprimoramento da
organização (Coens et Jenkins, 2000).
O problema da falta de interligação com a estratégia da organização é ainda
acentuado se for considerado que não somente a sua falta de definição precisa
prejudica o desenho do sistema de Avaliação de Desempenho, mas também a falta
de uma estratégia específica para as questões de cunho administrativo, descolada
da parte operacional no que tange às questões já levantadas anteriormente e que
trazem limitações para o presente estudo (vide seções 2.6 e 4.5).
143
Ademais, esta falta de definição explícita da estratégia prejudica toda a análise
do sistema em si, já que, desde o princípio da constituição do mesmo, não há um
norte pelo qual o pesquisador possa se guiar. Assim, devido a esta falta de âncora
estrutural, a capacidade analítica para se apontar as causas fica prejudicada,
resultando no fato de que elas devam ser consideradas mais como fortes evidências
do que verdades inquestionáveis.
Concluindo, independente dos objetivos, a Avaliação de Desempenho implica
num ambiente de relacionamento entre as pessoas de espontaneidade e confiança
(Bergamini et Beraldo, 1988).
Logo, não bastará adequar os objetivos ou criar os mecanismos ausentes para a
operacionalização dos mesmos, se anteriormente não forem sanadas as questões
apresentadas no capítulo 4 – Transformações Sócio-Culturais da Sociedade e suas
Implicações para o Exército Brasileiro.
5.3 Método de Avaliação
O método de avaliação utilizado deverá ser aquele julgado pela organização
como o mais adequado para auxiliar na consecução dos objetivos do sistema. Ou
ainda, para tal, ela poderá utilizar mais que um método em conjunto.
O Exército utiliza três métodos: vertical, lateral e auto-avaliação. Destes, os dois
últimos só são utilizados durante os cursos de formação e aperfeiçoamento (Brasil,
2001a). Pelo método vertical, entende-se a avaliação somente do subordinado pelo
superior, não ocorrendo a avaliação do superior pelo subordinado.
Desta forma, para efeitos da consecução dos objetivos do sistema, somente o
método vertical deverá ser considerado, já que os mesmos se referem ao
desempenho funcional.
144
A utilização deste método pelo Exército é um dos fatores que contribuem para
que os seus objetivos não sejam alcançados. Sendo identificados dois os principais
elementos concorrendo para tal.
Em primeiro lugar, já foi abordado na seção 3.3 – Métodos de Avaliação – que a
maneira organização tratará a avaliação como um todo é determinante para o
sucesso da mesma, mesmo quando da utilização do método, ou conjunto de
métodos, adequado.
Já foi apresentado que, pelas características e dinâmica do poder no Exército
Brasileiro, a Avaliação de Desempenho exerce um papel em certa medida coercitivo,
ou ainda, pode resultar numa má avaliação daqueles que agirem de forma
inovadora.
No primeiro caso, mesmo não dispondo de mecanismos para a medição da
produtividade, pode-se dizer que na medida em que a coação do avaliador inibe o
comportamento inovador, ele estará indo contra os objetivos tanto de
desenvolvimento pessoal, pois, em princípio, pode-se dizer que a inovação está
presente no desenvolvimento, quanto de estímulo de aumento da produtividade, pois
também pode-se dizer que, de alguma forma, a inovação deve resultar em aumento
de produtividade.
No segundo caso, sendo mal avaliado, o seu resultado no sistema de
valorização do Mérito, atrelado ao objetivo da premiação, será pior, o que resultará,
em última instância, na premiação de outros que não os mais merecedores.
Ademais, se a avaliação não é precisa, o conhecimento sobre o indivíduo também
não o será, prejudicando a consecução do objetivo de direcionamento do militar para
o cargo mais adequado.
145
O segundo elemento, não totalmente descolado do primeiro, tem também
ligação direta com os objetivos de adequação ao cargo, de desenvolvimento e de
produtividade. Mesmo que se considere como justo o julgamento feito pelo
avaliador, quanto mais completa a visão que se tenha do indivíduo, maiores serão,
em princípio, as possibilidades do mesmo descobrir caminhos para o seu
desenvolvimento, possibilitando também um aumento na produtividade e, para o
Exército, que ele possa melhor adequar o indivíduo ao cargo.
Conseqüentemente, a avaliação feita por outras pessoas que não somente o
superior hierárquico seria altamente recomendado. Sendo que a avaliação 360º
seria o método capaz de proporcionar a melhor visão.
Além disso, agora considerando a presença do viés no julgamento do avaliador,
esta visão mais completa provavelmente seria suficiente para fornecer elementos
que levassem à conclusão da presença do mesmo, contribuindo, desta forma, para
que o objetivo de premiação fosse perfeitamente atingido, além das contribuições já
citadas para a consecução dos demais objetivos.
O argumento fortemente defendido no Exército contra este tipo de avaliação é
que ele iria contra a hierarquia, um dos pilares da instituição militar, já que os
subordinados utilizariam este tipo de avaliação com espírito revanchista.
Douglas (1998) apresenta uma perspectiva de cultura que poderia ser descrita
como um universo de profecias auto-realizáveis. Enquanto não se implanta este
método de avaliação, em conjunto com os treinamentos dados aos indivíduos para
avaliarem, o único tipo de avaliação que os subornidados farão dos superiores será
aquele informal, carregado com forte criticismo e reação advinda dos mecanismos
de dominação existentes.
146
Estas avaliações informais, em maior ou menor grau, acabam chegando aos
ouvidos de alguns superiores hierárquicos que, então, acreditam que este
comportamento seria levado para um sistema de avaliação 360º, provovando quebra
da hierarquia.
Com isso, cria-se um ciclo que se auto-alimenta. O medo por parte dos
superiores de que o criticismo seja levado para a avaliação, os leva a argumentar
contra ela. Por outro lado, enquanto ela não existir, manter-se-á a noção da
Avaliação de Desempenho como instrumento de dominação, alimentando a reação e
o criticismo.
Portanto, seria necessário que se quebrasse tal ciclo para que, enfim, um outro
método pudesse ser empregado, trazendo melhores contribuições para que o
sistema atinja seus objetivos.
Por último, há uma questão ligada ao método, mas que normalmente não é
abordado, pois está implícito a ele: os avaliadores. Ao se falar em avaliação vertical,
supõe-se a avaliação do subordinado pelo superior. Todavia, no Exército Brasileiro,
não necessariamente aquele que é o superior direto do avaliado procede à
avaliação.
Somente os oficiais de carreira são avaliadores (Brasil, 2001a). Portanto,
sargentos que estejam sob a subordinação direta de outro sargento ou de oficial
temporário, ou os oficiais de carreira que estejam sob a subordinação direta de
oficial temporário, são avaliados por outros oficiais, muitas vezes a chefia imediata à
sua.
Como o avaliador normalmente não trabalha diretamente com o avaliado, sendo
esta a única fonte de informações para se traçar o perfil do mesmo, já se pode supor
que há uma perda no nível da qualidade da avaliação feita.
147
É prática usual que o superior direto seja chamado pelo responsável pela
avaliação para prestar as informações necessárias. Entretanto, se for considerado
que não necessariamente a visão de ambos coincida, não é incomum ocorrer do
avaliador deixar com que sua visão sobre o avaliado prevaleça.
Como compete aos comandantes selecionarem os avaliadores (idem), acontece
também casos em que o indivíduo não é avaliado pelo seu superior direto, mesmo
este sendo oficial de carreira. Normalmente isso ocorre quando, de fato, algum
sargento trabalha numa seção administrativa, mas como acontece com todos os
sargentos, ele está também lotado numa companhia de origem, sendo o
comandante desta companhia quem o avalia.
Em todos estes casos, então, além dos elementos que concorrem para que o
método não contribua para a consecução dos objetivos da Avaliação de
Desempenho, a imperfeição da informação sobre o avaliado é potencializada.
5.4 Etapas da Avaliação
Além do método, o exame das etapas da avaliação traz à tona outros elementos
importantes para a compreensão das falhas existentes no sistema de Avaliação de
Desempenho do Exército Brasileiro, reforçando os outros já apresentados.
A freqüência da avaliação é semestral (Brasil, 2001b), ocorrendo em janeiro e
julho de cada ano. Entretanto, em tese, ela deve ser contínua e permanente (Brasil,
2001a).
Para tal, existem os chamados “períodos de observação”, que vão
respectivamente até 30 de dezembro e 30 de junho, com os quinze dias seguintes
destinados ao preenchimento das fichas de avaliação (Brasil, 2001b).
148
À rigor, simplificando a descrição, observa-se três etapas distintas no processo
de Avaliação de Desempenho no Exército. Uma primeira constituida do período de
observação, uma segunda constituida do preenchimento das fichas de avaliação e a
terceira que se constitui do recebimento, pelo avaliado, do resultado da avaliação,
chamado “perfil”.
Fazendo um comparativo com as etapas da Avaliação de Desempenho
apresentadas na seção 3.4, já se tornam evidentes alguns dos elementos
importantes citados anteriormente.
O primeiro ponto é que não há um planejamento para o desempenho no
período. Ou seja, não há estabelecimento de metas, indicadores ou controles do
desempenho.
A única coisa que há são os itens constantes da ficha de avaliação, sem que
haja, porém, indicadores que os possibilite medir, caso não ocorra um prévio acordo
entre o avaliador e o avaliado.
Assim, sem a existência destes indicadores, passa a ser extremamente
subjetivo e de difícil qualquer comprovação de aumento de produtividade ou do
próprio desenvolvimento individual.
Além de prejudicar esses dois objetivos, a falta de indicadores precisos para os
itens a serem avaliados invariavelmente criará distorções nas avaliações,
acarretando distorções na classificação dos desempenhos e, em conseqüência,
fazendo com que o objetivo de premiação não seja atingido de forma justa.
E o mais curioso é que na ficha de avaliação de quase todos os oficiais há um
item cujo enunciado é “atinge os resultados estabelecidos pela chefia imediata”
(Brasil, 2001b), sendo que não se observa de maneira geral qualquer chefia
estabelecendo resultados a serem atingidos, com exceção de tarefas específicas às
149
quais são determinados prazos, ou outras obrigações, mas somente pontuais no
momento em que cada tarefa é passada.
A segunda etapa, que seria a execução, constando dos treinamentos
necessários e da execução das atividades, também apresenta problemas.
Em primeiro lugar, se não há estabelecimento prévio dos indicadores, não há
como se estabelecer quais seriam os treinamentos necessários para que o
desempenho pudesse ocorrer.
Outro ponto importante é que se a falta dos indicadores ocasiona uma distorção
no resultado final da avaliação, tampouco serão confiáveis os resultados das
avaliações anteriores como parâmetros para se determinar qualquer necessidade de
treinamento ou mesmo melhoria de desempenho durante o exercício das atividades.
Seguindo esta mesma trilha, na falta dos indicadores, os indivíduos exercem
suas atividades sem ter nunca a certeza de estarem caminhando na direção certa
com relação à qualidade do seu trabalho. Em outras palavras, não se sabe a que
nível de desempenho na ficha de avaliação corresponde aquele que eles estão
efetivamente realizando.
Este caminhar sem rumo é sensação corrente entre os integrantes do Exército.
O máximo de percepção que se tem quanto ao desempenho é a percepção do
indivíduo quanto a reação da chefia durante o correr do ano, todavia, é raro, se não
inexistente, aquele indivíduo que sabe efetivamente qual a correspondência entre os
valores dos conceitos atribuidos ao desempenho e o real desempenhar das
atividades.
Em resumo, pode-se dizer que a ausência da primeira etapa do processo de
Avaliação de Desempenho comprometerá qualquer probabilidade de sucesso da
150
segunda etapa. E, como se verá a seguir, se não há parâmetros para o
desempenho, tampouco haverá para avaliá-los.
A terceira etapa é o controle do desempenho, ou a avaliação propriamente dita.
Neste ponto, deveria haver a comparação dos resultados obtidos com os esperados.
Contudo, se não há o estabelecimento de indicadores, de metas, não há base de
comparação. Não havendo base de comparação, o julgamento passa a ser
extremamente subjetivo, independentemente do instrumento de avaliação que venha
a ser utilizado. Pois se o instrumento serve para medir o desempenho, na ausência
de parâmetros de medição, qualquer resultado é possível.
A conseqüência direta é que, além da distorção natural presente no resultado da
avaliação, será reforçada a idéia de que esta é um instrumento de subjugação (vide
seção 4.5), ficando os avaliados à mercê da boa vontade do avaliador. Como então,
estimular a produtividade e o desenvolvimento pessoal se o indivíduo não percebe
reflexo disso na avaliação?
A última etapa seria da ação corretiva, na qual se buscaria corrigir os desvios
verificados. Mais uma vez, a falta da definição de parâmetros implicará na ignorância
do que deverá ser corrigido e em que medida tal correção deverá se dar.
De qualquer maneira, esta etapa é iniciada com o feedback dado ao avaliado
sobre o seu desempenho. No Exército, oficialmente o feedback que existe é
somente a entrega ao avaliado do seu perfil, ou seja, do resultado quantificado de
sua avaliação. É facultado aos avaliadores mostrar a ficha de avaliação aos
avaliados (Brasil, 2001a). Tal ocorrência não somente é pouco freqüente, como
também se resume a uma explanação por parte do avaliador sobre o desempenho
do avaliado, não havendo, na quase totalidade dos casos, possibilidade de diálogo
ou alteração da avaliação feita.
151
O papel do feedback para a posterior melhoria do desempenho individual é de
fundamental importância. Entretanto, a realização da entrevista de avaliação não é
prática no Exército. Na maioria dos casos, o único feedback de que dispõem é o
valor numérico da avaliação recebida, tanto glogal, quanto por item.
Assim como os indivíduos não sabem o que de desempenho real corresponde
aos valores dos conceitos avaliados, a quase totalidade considera que o simples
valor numérico não dá subsídios para que se possa saber como melhorar o
desempenho.
Isto, em conjunção com o fato da freqüência do feedback ser semestral, faz com
que o avaliado passe seis meses sem saber como melhorar seu desempenho
passado, nem sabendo como está desempenhando suas atividades no presente. O
que se revela como uma forte incongruência ao se prescrever a avaliação como
sendo contínua.
Finalizando, mesmo se houvesse a presença da entrevista de avaliação, com o
diálogo entre o avaliador e o avaliado sobre o desempenho deste, o tipo de relação
hierárquica e com todos os atributos da dinâmica de poder e dominação já
apresentados, impossibilitariam a comunicação de se dar da forma necessária para
que o feedback cumprisse o seu papel de ponto de partida para o aperfeiçoamento
do indivíduo no Exército.
5.5 O Instrumento de Avaliação
O maior alimentador de dados para o sistema de Avaliação de Desempenho é a
ficha de avaliação preenchida, o instrumento de avaliação utilizado pelo Exército.
Cujo resultado, também, tem o maior peso para o sistema de Valorização do Mérito
(Brasil, 2003a).
152
Em linhas gerais, o instrumento utilizado pode ser classificado como sendo de
Escala Gráfica, a despeito do mesmo ser um pouco diferente do instrumento
tradicionalmente conhecido como tal.
Ele é composto de duas partes: uma constando “atributos da área afetiva” e
outro referente ao “desempenho funcional” (Brasil, 2001b).
Na parte relativa aos “atributos da área afetiva”, caberá ao avaliador escolher
oito, de uma relação de quarenta e dois, que “mais se evidenciam no avaliado”
(idem).
Já na parte relativa ao desempenho funcional, há uma relação de oito
“Proposições Funcionais”, aos quais caberá ao avaliador atribuir graus que variem
de um a cinco, intervalados de um décimo (idem). Estas proposições são diferentes
dependendo da formação do militar, do seu nível hierárquico e da natureza do cargo
ocupado.
Já pela simples descrição do instrumento utilizado, considerando-se os aspectos
positivos e negativos que um instrumento de Escala Gráfica possui (vide seção 3.5 –
Os Instrumentos de Avaliação), já se pode dizer que os aspectos positivos deste
instrumento também se encontram presente no utilizado, com exceção da visão
gráfica e global dos fatores de avaliação envolvido, pois a ficha não é uma tabela de
dupla entrada.
Com relação aos aspectos negativos, porém, ele os mantém, só que
apresentando maior subjetividade, o que aumenta as dúvidas quanto as gradações
utilizadas, grande reducionsimo no processo (apenas oito proposições para definir
todo o desempenho) e o valor numérico, aliado à maior subjetividade, torna o
feedback de pouca validade para o avaliado. Por outro lado, ele apresenta uma
153
predisposição para a redução do efeito tendência central, já que a ficha não é uma
tabela.
O instrumento de avaliação não existe no vácuo. Ele serve ao método de
avaliação adotado pela organização, como também se insere na etapa de controle
do processo de Avaliação de Desempenho.
Desta forma, como o instrumento é um meio, a partir do momento em que foram
identificados problemas tanto no método, quanto nas etapas do sistema adotado
pelo Exército Brasileiro, fatalmente os problemas se repetirão no instrumento. Mas
antes que tal repetição seja interpretada como a mesma ocorrência em dupla
freqüência, cabe ressaltar que, quando dela, o que ocorre realmente é a
potencialização da deficiência identificada. Por exemplo, se a falta do
estabelecimento de indicadores de desempenho faz com que a avaliação seja
subjetiva e o instrumento também possui a característica da subjetividade, logo, esta
subjetividade será muito mais forte, sendo alimentada em duplicidade no sistema.
Além da subjetividade, que provocará distorções no resultado da avaliação,
prejudicando a consecução dos objetivos de premiação, podutividade e
desenvolvimento, o instrumento utilizado traz outros problemas para a sistema.
O valor numérico, bem como a dúvida quanto à gradação, dificulta o
entendimento por parte do avaliado, dificultando o seu desenvolvimento, com
ligações também para o próprio aumento da produtividade.
O reduzido número de proposições também vai nesse sentido. Afinal de contas,
o reducionismo, por si só, já dificulta a identificação de ações concretas que o
avaliado precisa tomar para melhorar o seu desempenho.
154
O objetivo principal da parte relativa aos “atributos da área afetiva” é o, a partir
da identificação das características mais marcantes o avaliado, possibilitar que o
mesmo seja alocado num cargo mais adequado.
No que pese tal objetivo, não obstante a contribuição que tal identificação dá à
consecução dele, esta parte, por si só, não é suficiente. Pois como não há uma
política de treinamento para os indivíduos de forma a melhor os habilitarem a
desempenhar os cargos que ocupam, tampouco novos cargos, também seria
importante o conhecimento mais profundo sobre o desempenho funcional para
possibilitar uma melhor adequação das pessoas aos cargos, o que não é possível
devido ao reducionismo com o qual é caracterizada a parte relativa aos
“desempenho funcional”.
Indo mais além, mesmo considerando que a formação básica deveria habilitar o
militar ao desempenho dos cargos relativos à sua especialização, é bastante comum
ver oficiais e sargentos mais antigos em funções administrativas sem que tenham
formação para tal, bem como que passaram por um longo período sem ocupar
determinado cargo, mesmo tendo sido o conhecimento com relação ao mesmo
abordado durante a formação. Estas situações requereriam treinamento para melhor
capacitação do indivíduo, o que não existe. (Isso sem considerar os treinamentos
necessários para possibilitar o aperfeiçoamento no desempenho do cargo).
Os problemas do instrumento utilizado não terminam aí. Considerando agora os
critérios que deveriam ser observados para a elaboração do instrumento, ele, além
de suscitar dificuldades para a consecução dos objetivos do sistema, também pode
ser questionado per se.
Com relação a todos os critérios, surge o mesmo problema. A falta de
parâmetros acarreta forte subjetividade da avaliação, potencializada pelas
155
características do instrumento. Estas, por sua vez, impedem que se possa confiar
que desempenhos semelhantes estejam sendo avaliados de forma semelhante, que
se possa afirmar que desempenhos superiores serão melhor avaliados, que a
diferença entre os desempenhos possam ser discriminados (nisso o reducionismo
contribui fortemente) e que as tendências do avaliador sejam neutralizadas pelo
instrumento.
E, cabe recordar, tudo isso é reforçado também pela questão já citada da
avaliação como ferramenta de subjugação, no qual o instrumento, por ser
amplamente subjetivo, só vem a contribuir.
Por fim, cabe ressaltar um problema que não é do instrumento, mas implica na
sua má utilização, conseqüentemente, influenciando negativamente na consecução
dos objetivos da Avaliação de Desempenho.
Não há no treinamento formal dos avaliadores para desempenharem este papel
no Exército. Encoraja-se a leitura das normas que regem o sistema, mas não há
como atestar que os avaliadores estejam preparados para tal.
A conseqüência mais direta e imediata é que esta falta de preparo contribui para
a ocorrência dos fatores que deterioram a validade do sistema, recordando: o
estereótipo, o efeito de halo, o erro de contraste, de semelhança, de primeira
impressão e os fatores situacionais.
Esta falta de preparo só faz aumentar todos os problemas até aqui identificados,
pois mesmo que o método de avaliação escolhido seja o mais adequado, as etapas
estejam perfeitamente configuradas e o instrumento completamente ajustado para
servir aos objetivos do sistema, se aquilo que o faz funcionar não está preparado, a
qualidade da avaliação fica seriamente comprometida.
156
5.6 O Sistema de Valorização do Mérito
O Sistema de Valorização do Mérito, apesar de não ser parte integrante direta
do sistema de Avaliação de Desempenho, tem no resultado deste o seu componente
mais importante (Brasil, 2003a). Por este motivo, então, cabe aqui analisá-lo.
Mesmo sendo considerado um sistema a parte, fica a cargo do seu resultado a
consecução do objetivo de premiação proposto pelo sistema de Avaliação de
Desempenho. Isto porque, para efeitos da operacionalização do referido objetivo,
julgou-se necessário agregar outros componentes da profissão militar englobadas
pela noção de mérito para o Exército Brasileiro. São estes (Brasil, 2003b): avaliação
do pessoal, medalhas e condecorações, elogios, cursos realizados, habilitação em
idiomas, trabalhos úteis, atividades essenciais, tempo de serviço em situações
diversas, tempo de instrutor, auxiliar de instrutor ou monitor, comportamento,
concursos e deméritos.
A cada um destes componentes é dado um valor e um peso que, ao final,
totaliza uma pontuação individual, na qual são ordenados os militares dentro dos
universos considerados (Brasil, 2003b) – que não são os mesmos universos
utilizados na Avaliação de Desempenho, mas sim dentro de cada Arma, Quadro ou
Serviço e dentro do nível de formação.
Para efeitos de esclarecimento, tem-se que os trabalhos úteis são aquelas obras
individuais, podendo ser estudos ou propostas de manuais, entre outros, assim
considerados pelo Estado-Maior do Exército; as atividades essenciais são os
resultados do Teste de Avaliação Física e do Teste de Aptidão de Tiro; e o tempo de
serviço em situações diversas diz respeito aos tempos de serviço desempenhados
em regiões específicas no país ou em missões de paz e a chamada vivência
157
nacional, compreendendo o número de Comandos Militares de Área distintos em
que o militar serviu.
A análise deste sistema, todavia, se dará apenas no que diz respeito ao papel
desempenhado pela Avaliação de Desempenho, bem como dos componentes que
trazem algum tipo de incongruência para ele.
Com relação ao papel desempenhado pela Avaliação de Desempenho, a
implicação é simples e direta. A partir do momento em que se tem um sistema de
avaliação cujo resultado pode ser considerado como impreciso, se não inválido, por
todas as razões já apresentadas, qualquer outro sistema que se utilize deste
resultado como insumo tenderá também a ter resultados imprecisos.
No caso específico do sistema de Valorização do Mérito, no qual é o
componente de maior peso, a conseqüência imediata será um ordenamento que não
necessariamente corresponderá com a realidade em termos mérito individual,
contribuindo para que o objetivo de premiação não seja atingido.
Além da distorção causada pelos resultados do sistema de Avaliação de
Desempenho, o sistema de Valorização do Mérito possui alguns componentes que
atuam como referência circular. Ou seja, componentes que contam pontos para
justamente servir de critério de seleção para acesso a esses mesmos componentes.
A Valorização do Mérito é utilizada como critério de seleção para, entre outras
coisas, outorga de condecorações, matrícula em cursos, movimentações e
nomeação como instrutor, auxiliar de instrutor ou monitor. Por outro lado, estes
também são componentes que a compõem.
Portanto, aqueles que inicialmente são selecionados para qualquer um desses
listados, passam automaticamente a serem os primeiros candidatos para os demais,
e até mesmo para uma nova seleção como instrutor em outra escola, outras
158
movimentações, entre outros. Ou seja, tirando a primeira seleção no início da
carreira, na qual somente o desempenho no curso de formação, a Avaliação de
Desempenho e os resultados dos testes físico e de tiro contarão, em todas as
demais passará a existir uma distorção em direção dos selecionados
cronologicamente antes.
Além disso, para os oficiais, os cursos civis que pontuam são apenas aqueles
cursados por oriundos do IME, da EsSEx ou da EsAEx, dentro da sua área de
formação profissional. Para os oriundos de AMAN, só se forem matriculados pelo
Exército. O problema que se identifica aqui só diz respeito aos oficiais de AMAN,
pois há cursos civis relacionados às atividades destes oficiais, mais especificamente
aos do Serviço de Intendência, Quadro de Material Bélico e Arma de Comunicações,
e que não são computados, indo justamente de encontro ao objetivo de
desenvolvimento.
Nesta mesma linha, para o caso dos sargentos, somente a conclusão do Ensino
Médio conta pontos, também não contribuindo para que os mesmos busquem se
desenvolver.
Por fim, cabe a ressalva de que o ordenamento dentro de cada universo ainda é
passível de uma crítica. Como os universos considerados para a Valorização do
Mérito são diferentes daqueles utilizados para a Avaliação de Desempenho, poderá
ocorrer o caso de militares que ocupam cargos de natureza distinta, sendo, portanto,
suas avaliações balizadas por “proposições funcionais” diferentes, mas que, por
pertencerem à mesma Arma, Quadro ou Serviço, terão as suas diferentes
avaliações utilizadas como insumos para ordená-los por mérito.
Em outras palavras, militares que ocupam cargos diferentes, sendo avaliados de
forma distinta, tendo as suas avaliações comparadas. Isso seria o mesmo que
159
avaliar um piloto de provas pelo tempo em que percorre o circuito, um motorista de
ônibus pela prudência com que conduz o seu veículo e, ao final, querer estabelecer
quem é o melhor deles.
Apesar de normalmente os oficiais e sargentos mais antigos estarem quase
todos ocupando cargos de mesma natureza, com relação aos oficiais e sargentos
mais modernos há uma grande diversidade na natureza dos cargos ocupados, mais
notadamente aos pertencentes ao Serviço de Intendência, Quadro de Material Bélico
e à arma de Comunicações, as formações de AMAN que podem ser consideradas
mais técnicas, mas que também preenchem cargos operacionais.
Concluindo, por tudo o que foi apresentado, o sistema de Valorização do Mérito
surge como uma tentativa de se estabelecer critérios para que o objetivo de
premiação possa ser alcançado, mas acaba sendo vítima das distorções do sistema
de Avaliação de Desempenho e acrescenta ainda outras, não conseguindo, então,
fazer com que aquele objetivo seja atingido de forma precisa.
5.7 O Projeto AVALOP – Avaliação de Oficiais e Praças
Todos os problemas identificados até o agora, apontam para a clara e
inequívoca necessidade de reformulações em todos elementos integrantes do
sistema de Avaliação de Desempenho.
Entretanto, o sistema atualmente em vigor é uma recente reformulação de um
sistema anterior, tendo sido implantado em 2001.
Desta forma, julgou-se pertinente fazer uma breve apresentação deste processo
de mudança, o denominado “Projeto AVALOP”, buscando somente identificar as
razões principais que fizeram com que o sistema atual mantivesse, de maneira
geral, as mesmas falhas que o anterior.
160
O sistema anterior apresentava uma única diferença: o instrumento utilizado.
Aquele era uma escala gráfica tradicional, composto por uma tabela de dupla
entrada, no qual havia três partes: uma relativa a “pautas comportamentais”,
composta por vinte e um itens; uma relativa a “atributos”, composta por nove itens; e
uma relativa ao “desempenho funcional”, composta por oito itens (Brasil, 2000b).
Para cada um dos itens havia uma gradação variando de um a cinco, em intervalos
de cinco décimos, no qual o avaliador deveria marcar a pontuação que atribuisse ao
avaliado.
As principais diferenças entre os instrumentos se encontram na pontuação para
as pautas comportamentais e atributos, os quais foram agrupados no novo
instrumento na parte dos “atributos da área afetiva”, bem como a parte relativa ao
desempenho “funcional” se diferenciava somente pela escola de formação e nível
hierárquico, ocasionando com que militares de mesma formação e nível hierárquico,
ocupando cargos de naturezas distintas, fosse avaliados pelas mesmas
proposições.
Um exemplo dessa distorção era a avaliação de um oficial subalterno, formado
pela AMAN, ocupando cargo administrativo, na qual constava a proposição “aceita e
adapta-se a situações de privação geral (de alimento, repouso devido, conforto
físico) ou que exijam grandes esforços e/ou resistência física, mantendo sua
eficiência habitual para agir ou decidir “(idem). De antemão já se pode antecipar a
impossibilidade da constatação desta proposição para alguém ocupando cargo
administrativo.
Visando, portanto, corrigir essa e outras falhas, iniciou-se, em 2000, o Projeto
AVALOP, conduzido pelo Centro de Estudos de Pessoal do Exército (CEP),
localizado no Rio de Janeiro.
161
Inicialmente, o projeto previa o ano de 2000 para coleta de dados acerca da
percepção dos integrantes do Exército quanto à Avaliação de Desempenho e ao
sistema utilizado e da descrição atualizada e pormenorizada das atividades dos
cargos.
Em 2001, previa-se a construção do novo sistema, no qual o instrumento
deveria ser o mais específico possível para cada cargo.
Em 2002, estava previsto o teste do novo instrumento em unidades que seriam
selecionadas para tal, realizando-se os ajustes necessários.
E, finalmente, em 2003 o novo sistema seria implantado.
O primeiro problema enfrentado pelo projeto foi a antecipação de sua conclusão,
com a supressão de etapas importantes.
Por determinação superior, o projeto deveria ser testado já em 2001. Para tal, foi
abandonado o trabalho de descrição dos cargos para fins de avaliação, modificando-
se a concepção do instrumento para as naturezas dos cargos, ao invés da
especificidade deles.
Para determinação das “Proposições Funcionais” que comporiam as fichas,
foram feitas reuniões no CEP, com a participação da equipe do projeto e de oficiais
que serviam naquele Centro e que ocupavam, ou já tinham ocupado, cargos das
diversas naturezas. Nota-se a ausência da presença de sargentos nas reuniões.
Em seguida, o que deveria ser teste, passou a ser implantação em todo o
Exército em 2001, ordem emanada em agosto daquele ano, quando a avaliação,
que até então era anual, tinha o período do preenchimento das fichas prevista para
setembro.
Ou seja, a antecipação do cronograma não somente impediu que o novo
instrumento fosse testado, não adotando o que seria adequado para a configuração
162
do novo sistema (vide seção 3.4 – Etapas da Avaliação de Desempenho), mas
também fez com que ele não reproduzisse as peculiaridades de cada cargo, bem
como modificou os pontos sobre os quais o desempenho passado seria avaliado a
menos de um mês do preenchimento da ficha. Em outras palavras, como se poderia
esperar um bom julgamento se, por um lado, os avaliados não conheciam aquilo no
que seriam avaliados, tampouco os avaliadores sabiam o que deveriam ter
observado durante o ano? E como se poderia confiar no resultado de um
instrumento que sequer havia sido testado?
Outros problemas também emergem da análise do Projeto AVALOP, cabendo
agora apresentá-los brevemente.
A concepção do projeto se deu unicamente com o objetivo da criação de um
novo instrumento de avaliação. Portanto, partiu-se do pressuposto de que a
configuração do sistema estava adequada.
Einstein (apud Coens et Jenkins, 2000) já coloca que os problemas significativos
enfrentados não podem ser resolvidos ao mesmo nível de pensamento em que se
estava quando foram criados. Desta assertiva, pode-se também concluir que a base
epistemológica sobre a qual se cria o conhecimento para a compreensão de um
assunto se enquadra na noção de nível de pensamento.
Portanto, seria necessário que o projeto, no seu andamento, conseguisse se
livrar das estruturas cognitivas que permeiam o Exército Brasileiro (vide seção 4.5 –
Implicações da Pós-Modernidade para a Gestão no Exército Brasileiro) para poder
propor, inclusive, outros métodos de avaliação que melhor pudessem contribuir para
a consecução dos objetivos do sistema, despido do argumento preconceituoso de
quebra de hierarquia, utilizado para justificar a não adoção de um ou outro método.
163
Ou ainda, ponderar até mesmo sobre os próprios objetivos do sistema e as etapas
do processo avaliativo.
Desta forma, abandonando a forma causualística sob a qual foi analisada a
questão da Avaliação de Desempenho e reconhecendo o dualismo presente na
essência do conhecimento (Hessen, 1999), como relação sujeito e objeto, o sistema
resultante do projeto provavelmente estaria muito mais coerente com a realidade da
sociedade em que vivem os integrantes do Exército.
Além do mais, ao conduzir a pesquisa, o CEP agiu de forma isolada. Com
exceção da coleta de dados, para a qual foi utilizada amostra estratificada, o Centro
tratou a reformulação do sistema de Avaliação de Desempenho como um fim em si,
talvez crendo que ele, por si só se encaixasse na organização e também talvez
como conseqüência do pensamento cartesiano.
De imediato, já se percebe que não houve a preocupação do realinhamento dos
objetivos da avaliação com os da organização, ou até mesmo, o que talvez fosse o
caso, o levantamento do questionamento acerca da clareza de definição dos
objetivos do Exército, de forma a possibilitar este alinhamento.
Além disso, esta falta de integração durante a reformulação com as demais
unidades, atuou no sentido de reduzir a sua capacidade de gerar as mudanças
necessárias (Kanter, 1985). Em um sentido, pois não foram disponibilizados canais
de comunicação que transpassassem o Exército e que permitissem que outras
unidades ou mesmo pessoas pudessem contribuir no projeto. E em outro, mas não
muito divergente, que vai na direção da dicotomia pensante versus executante,
ocorrendo o distanciamento entre quem reformulou o sistema e quem estava
inserido nele.
164
A equipe permanente do projeto, composta por psicólogos e um estatístico, é
outro fator problemático. Reconhecendo-se a necessidade da mudança da base
epistemológica para uma nova sobre a qual o projeto deveria ter sido desenvolvido,
também se percebe a necessidade da abertura disciplinar (Chanlat, 1999) para que
o homem, cerne da questão da avaliação, fosse melhor compreendido. Ainda mais
porque não necessariamente os especialistas em comportamento humano, os
psicólogos, sabem exatamente o que vem a ser o certo na questão da avaliação,
pois há outros fatores envolvidos, por eles desconsiderados em suas análises (Beck,
1997a). E um último argumento contra esta composição de equipe vem da noção de
que há um processo social por trás da apropriação de uma idéia (Douglas, 1998), ou
seja, seria necessário considerá-lo ao se pensar em reformulação do sistema de
avaliação, demanda que a formação dos membros da equipe não permitiu constatar.
O último fator identificado é a metodologia utlizada para a coleta de dados. Não
cabe aqui repetir a argumentação apresentada para justificar a escolha da
metodologia utilizada para a realização do presente estudo. No que se refere ao
Projeto AVALOP, então, caberia a utilização do mesmo método, pelas razões já
apresentadas (vide seção 2.5 – Coleta e Análise de Dados).
Cabe aqui a observação de que os aspectos apresentados são inter-
dependentes, na medida em que não se pode precisar com exatidão o quanto um
acaba determinando o outro.
Finalizando, não é surpresa observar que a mudança ocorrida na Avaliação de
Desempenho no Exército, como resultado do Projeto AVALOP, vai perfeitamente ao
encontro da conclusão do estudo de Marques (1994), de que as as mudanças
implementadas simplesmente ocorreram em termos de forma, acarretando na
165
obtenção dos mesmos resultados e, mais especificamente, na manutenção dos
vícios do sistema anterior.
5.8 Considerações Finais
Ao término da apresentação da Sistemática de Avaliação de Desempenho do
Exército Brasileiro, cabe destacar os pontos mais importantes apresentados e
discutidos, para uma melhor compreensão do todo.
Os objetivos antagônicos do sistema já indicam uma predisposição ao fracasso,
reforçada pela falta de mecanismos para a operacionalização necessária de três
deles.
O método de avaliação utilizado também cumpre este papel, tanto por reforçar a
imagem da avaliação como meio de coação, como pela impossibilidade de se
fornecer uma visão completa do indivíduo.
A falta de algumas etapas, com as deficiências das primeiras impactando nas
demais, resulta em avaliações imprecisas, subjetivas, e na impossibilidade objetiva
de correções futuras de desempenho.
O instrumento utilizado é bastante subjetivo, reducionista e suas gradações são
ambíguas e inexatas, potencializando os problemas já identificados no método e nas
etapas.
Além disso, não se encontram nele os critérios que deveriam ser observados na
sua elaboração, o que também faz com que ele contribua para a ocorrência dos
erros de julgamento que implicam na validade do sistema.
A Valorização do Mérito, além de reverberar os problemas da avaliação de
desempenho, ainda acrescenta outras distorções como a presença de componentes
166
que atuam como referência circular e a divisão por universos diferentes daqueles
utilizados pela avaliação.
Por fim, o Projeto AVALOP se caracterizou por uma série de problemas. Estes,
que vão desde a antecipação do cronograma, resultando em cortes de etapas
importantes, passando pela metodologia utilizada e chegando à própria base
epistemológica sobre a qual foi construída.
6 CONCLUSÃO
Ao longo de todo o texto, com o intuito de atingir os objetivos do presente
estudo, buscou-se apresentar os elementos necessários para que uma
compreensão geral do problema fosse conseguida, bem como tudo aquilo julgado
pertinente que teria relação com ele. Com isso, pode-se perceber a real
complexidade e profundidade que o assunto possui, a despeito de qualquer
julgamento prévio que se poderia ter sobre o tema.
Os resultados encontrados na pesquisa são o testemunho não somente da
complexidade e profundidade do tema, mas também um convite para que se
busque, ainda mais, construir o conhecimento acerca de assuntos correlatos que
foram abordados, mas não eram objetivos específicos da pesquisa.
Desta forma, apresenta-se a seguir os principais resultados encontrados,
seguida da conclusão da pesquisa propriamente dita e, por fim, são apresentadas
sugestões de futuros trabalhos que possam aprofundar alguns temas relevantes e
citados neste.
Antes, porém, cabe relembrar as ressaltas apresentadas no início do com
relação aos resultados e às conclusões texto (vide seção 2.6). Por conta das
limitações do estudo e do problema concernente à estratégia (vide seção 5.2), o que
vem apresentado a seguir, de forma eminentemente propositiva, é, em alguns
elementos, mais forte evidência do que causas efetivamente comprovadas. Todavia,
a despeito disso, não deixam de ter o mérito de ao menos apontá-las.
168
6.1 Principais Resultados Encontrados
Os principais resultados encontrados por esta pesquisa, podem ser classificados
em três grandes grupos: os relativos aos própositos e objetivos; ao tratamento dado
ao elemento humano; e à operacionalização do sistema de Avaliação de
Desempenho.
Assim, de forma breve, estes serão apresentados a seguir, buscando-se
destacar aquilo de mais relevante em cada um grupos.
6.1.1 Resultados Relativos aos Propósitos e Objetivos
Os propósitos e objetivos do sitema de Avaliação de Desempenho do Exército
Brasileiro são claramente identificáveis, constando de forma explícita no documento
que o cria.
Entretanto, eles apresentam uma inadequação interna, ao conjugarem objetivos
de desenvolvimento com objetivos de premiação no mesmo sistema. Se não fosse
pela presença destes dois tipos antagônicos de objetivos, os mesmos estariam em
consonância com o que a literatura prega.
Mesmo assim, eles não apresentam ligação explícita com a estratégica da
organização, tampouco uma ligação implícita consegue ser percebida.
Por último, com exceção do objetivo de premiação, os demais não têm suporte
de mecanismos que possibilitem operacionalizar as ações necessárias para que os
mesmos sejam atingidos, partindo do resultado da Avaliação de Desempenho.
169
6.1.2 Resultados Relativos ao Tratamento dado ao Elemento Humano
Um paradoxo curioso surge nestes resultados. Por um lado, considerando o
caráter de dominação presente nas relações humanas no Exército, a Avaliação de
Desempenho poderia ser vista como cumpridora do seu papel de auxiliar na
manutenção desta situação, por ser utilizado como mecanismo de coação.
Todavia, ao se considerar os objetivos do sistema, tal premissa deixa de ter
validade e uma situação nova, com um certo grau de complexidade e
interdependências entre as partes, emerge.
O advento da Pós-modernidade traz conseqüências para a gestão das pessoas
nas organizações. Estas conseqüências são sentidas de forma mais drástica em
instituições como o Exército, com características de Instituição Total.
São percebidas diferenças significativas nas formas como os integrantes de
cada grupo existente no Exército são profissionalmente formados. Por conta das
características de cada formação, estas diferenças fazem com que a Pós-
modernidade seja percebida de forma distinta pelos diversos grupos, gerando
tensões ainda maiores do que numa organização civil. Diferença de percepção esta
que vem sendo aumentada ao passo que há um aumento de capital cultural,
principalmente por parte dos sargentos.
A conseqüência direta é uma contestação de tradições, regras e normas, bem
como até mesmo da autoridade de alguns indivíduos em alguns momentos.
Entre vários, um dos mecanismos de defesa da organização, particularmente
utilizado pelos oficiais, principais defensores das tradições, é a utilização da
Avaliação de Desempenho como instrumento de coação, o que é percebido pelos
avaliados.
170
Com isso, tem-se que o indivíduo, para ser bem avaliado, mantenha a
submissão, evitando inovações fora da norma. Ou ainda, haverá indivíduos que
manterão seu ímpeto inovador, sendo prejudicados em suas avaliações.
Por fim, isso resultará em avaliações com alto grau de distorção, prejudicando a
qualidade das informações que caberia ao sistema de Avaliação de Desempenho
fornecer.
Além disso, não diretamente relacionado ao sistema, mas também com
implicações para ele, tem-se que a restrição ao acesso à informação, fruto da
dicotomia pensante versus executante, traz insatisfação para os integrantes do
Exército e retira deles a possibilidade de maiores ganhos que adviriam da maior
participação.
E também se vislumbra a possibilidade da adoção de uma nova forma de
tratamento, em contradição ao que os estereótipos sobre a profissão militar
normalmente indicariam. Nova forma esta que, em certo grau, estaria relacionada
aos pontos problemáticos da gestão no Exército que prejudicam o sistema de
avaliação.
6.1.3 Resultados Relativos à Operacionalização do Sistema de Avaliação de
Desempenho
O último grupo é aquele que apresenta os resultados de natureza mais técnica
da avaliação propriamente dita. Porém, cabe ressaltar, que estes resultados também
possuem ligação com os demais, muitas vezes potencializando características
negativas já apresentadas.
O método utilizado é somente a avaliação vertical. Método cujo uso isolado é
condenado pela literatura em geral. Ele reforça, desta forma, a utilização da
171
Avaliação de Desempenho como instrumento de coação, trazendo as
conseqüências citadas anteriormente.
Ele não possibilita uma visão completa do avaliado, pois baseia-se num único
julgamento, sendo prejudicial para a consecução de todos os objetivos. Além disso,
nem sempre quem avalia é o superior direto do avaliado, gerando distorções de
percepção na avaliação.
As etapas constituintes do sistema diferem em forma e conteúdo do que prega a
literatura. Não há a etapa do planejamento do desempenho, o que gera a falta de
indicadores de desempenho a serem atingidos. A conseqüência disso é sentida em
todas as fases posteriores, trazendo, de imediato, grande subjetividade para o
julgamento.
Não há fase de treinamento e a falta de parâmetros resulta em falta de base de
comparação para se perceber a necessidade de treinamentos e também para se
perceber a evolução real do desempenho do indivíduo ao longo do tempo. O que
também resulta no fato dos indivíduos, durante o transcurso de suas atividades, não
terem capacidade de verificarem o nível de seus desempenhos em comparação ao
que será avaliado deles.
Esta mesma falta de parâmetros, ao gerar uma avaliação subjetiva, faz com
que não se possa estabelecer de forma clara a correspondência entre o
desempenho real e o avaliado, reforçando a possibilidade da avaliação ser utilizada
como instrumento de coação.
E o feedback dado aos indivíduos, ocorrendo exclusivamente na forma de índice
numérico, sem a existência da entrevista de avaliação, é insuficiente para fornecer
subsídios para que eles melhorem seus desempenhos.
172
O instrumento utilizado para a avaliação é uma escala gráfica modificada. Com
relação ao original, ele aumenta a subjetividade, traz maiores dúvidas quanto as
gradações utilizadas, é muito reducionista e apresenta um valor númerico descolado
de parâmetros objetivos. É importante ressaltar que este aumento de subjetividade
potencializa a já inserida no processo por conta do método e das etapas.
O instrumento ainda é elaborado em desacordo com os critérios pregados pela
literatura, bem como contribui para a ocorrência dos fatores que deterioram a
validade da avaliação.
Além disso tudo, cabe ressaltar que as distorções do sistema de avaliação são
levadas para o Sistema de Valorização do Mérito, responsável pela
operacionalização do objetivo da avaliação de premiação, pois este utiliza os
resultados daquele como principal fonte de dados, sendo acrescentadas outras pelo
próprio sistema de Valorização do Mérito, como as referências circulares e a
utilização de universos diferentes daqueles da avaliação.
Finalizando, o Projeto AVALOP, origem do sistema em uso, se caracterizou por
uma série de erros das mais diversas características, desde a base epistemológica
sobre a qual foi desenvolvido, passando pela metodologia utilizada e chegando até
ao corte de etapas.
6.2 Conclusão
Por tudo o que foi apresentado neste trabalho, pode-se inicialmente concluir que
todos os elementos analisados prejudicam a consecução dos objetivos propostos
pelo sistema.
Desde a formulação dos objetivos, sem ligação com os da organização e com a
presença de antagonismo interno entre eles, passando pela carência de etapas,
173
deficiência do método e do instrumento e chegando até ao tratamento dado ao
elemento humano na gestão no Exército Brasileiro, sucedem-se inúmeras
deficiências dos mais diversos tipos e com as mais diversas implicações.
Estas, por sua vez, concorrem em diversos sentidos para que os objetivos do
sistema não sejam atingidos, sendo necessário um tratamento muito mais amplo e
profundo do que o que foi dado pelo Projeto AVALOP para que um novo sistema
possa efetivamente ter a qualidade necessária.
Assim, pode-se concluir que ao apontar tais deficiências, bem como os aspectos
envolvidos e relacionados com elas, o presente estudo atingiu de forma plena ao
seu objetivo principal, contribuindo não só para o entedimento do tema em si, mas
também descortinando a possibilidade do entendimento de temas com os quais a
Avaliação de Desempenho se inter-relaciona e que podem contribuir para o melhor
entendimento do homem no trabalho.
Como adendo, é interessante observar como as deficiências identificadas no
sistema de Avaliação de Desempenho do Exército Brasileiro convergem com os dos
demais órgãos públicos no que diz respeito aos objetivos. Mas quanto aos métodos
e instrumentos utilizados, os dos demais órgãos carecem de bem menos
deficiências (vide Seção 3.6), mostrando o quanto pior é a realidade do Exército
Brasileiro nestes aspectos.
Finalizando, os resultados e as conclusões do presente estudo encontram forte
convergência com os dos demais trabalhos acadêmicos no assunto (vide Seção
3.7). Isso evidencia o quão longe as organizações brasileiras estão, de maneira
geral, de atingirem o ideal em Avaliação de Desempenho e, particularmente, o
Exército. Portanto, ainda deve ser despendido grande esforço no estudo de tudo
aquilo que a circunda, caso haja a intenção de que, em algum dia, a Avaliação de
174
Desempenho, deixe de ser um faz-de-conta organizacional e passe a representar
uma prática verdadeira, justa e benéfica para as organizações e seus integrantes.
6.3 Sugestões para Trabalhos Futuros
Esta dissertação não é um fim em si. Do que foi exposto, descortina-se a
possibilidade da realização de novos estudos que objetivem aprofundar vários
pontos abordados neste trabalho. Destes, destaca-se:
- a elaboração de um levantamento da cultura organizacional do Exército
Brasileiro, incluindo as várias subculturas existentes, dentre as quais situam-se as
identificadas no capítulo 4;
- um estudo que possibilite com que as unidades tradicionais mudem as
práticas de suas rotinas para outras nas quais as implicações da Pós-modernidade
gerem menos tensões, para algo no sentido daquele vivido pelas unidades
operacionalmente mais ativas;
- um trabalho de melhor definição da estratégia do Exército, contemplando
inclusive a diferenciação necessária para que os trabalhos de cunho administrativo
sejam abordados especificamente nela;
- um projeto de interligação explícita entre a estratégia do Exército e a
operacionalização desta nos seus mais diversos componentes; e
- o desenvolvimento de um novo Sistema de Avaliação de Desempenho que
vise corrigir as deficiências encontradas no atual.
Obviamente que estas sugestões não esgotam as possibilidades de estudos
abertas por esta pesquisa, quais surgem a cada nova leitura do texto e que deverão
ser postas em prática o tão logo instiguem a curiosidade científica e sejam possíveis.
7 REFERÊNCIAS
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