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CÃes & Cia • 400 48 Mundo das Aves Tempo de ninhos! U ma das características mais evidentes que distinguem as aves dos demais grupos de vertebrados é a transformação dos membros anteriores em asas. Com isso, seus “braços” e “mãos” só podem ser utilizados para o voo, impossibilitando diversos aprovei- tamentos comuns para os mamíferos, como a apreensão dos alimentos. O resultado é a transferência da função de ferramentas multi- tarefas para o bico e para os pés. Entre as diversas atividades que as aves podem desempenhar com o bico, estão a construção de ninhos e abrigos. Com uma maestria ímpar no mundo animal, constroem estruturas admiráveis, frequentemente maio- res e mais pesadas que elas próprias e que, com sua complexidade, desafiam os pesqui- sadores. Claro que, por outro lado, existem também construções extremamente simples, que nada mais são que uma mera depressão no solo. De simples a complexo Os ninhos não são exclusividade do mundo das aves. Jacarés e Crocodilos, por exemplo, também são capazes de transpor- tar e acumular material para nele depositarem seus ovos. Entretanto, apenas entre as aves essas estruturas atingem um admirável grau de dificuldade, relacionado com a evolução de cada grupo de espécies. Quanto maior, mais complexo o ninho. Aves como as ratitas (grupo que inclui os Avestruzes, Emas e Casuares, por exemplo) e os tinamiformes (Inhambus e Macucos) constroem ninhos extremamente simples, for- mados apenas por uma ligeira depressão no solo, na qual a fêmea deposita os ovos e o macho os incuba. Talha-Mares, algumas Gai- votas e outras aves aquáticas também cons- troem ninhos muito simples, provavelmente por causa da ausência de material “de cons- trução” disponível nos locais escolhidos para nidificação. O efetivo transporte desse material e a construção um pouco mais elaborada dos ninhos começam a ser vistos nos galiformes (Faisões, Codornas, Galinhas, Mutuns, Jacus) e nos anseriformes (Patos, Gansos, Cisnes, Marrecos). O Mutum e o Jacu macho, por exemplo, trançam galhos verdes intensamen- Por LUÍS FÁBIO SILVEIRA Entre as tantas peculiaridades interessantes apresentadas pelas aves, os seus ninhos se destacam pela grande variação de formas, materiais, localizações e pela nobre função de, a partir do mês de setembro, abrigar ovos e filhotes te até formarem um cesto de estrutura sólida e segura. Patos e Cisnes, além de construírem o ninho com a vegetação mais próxima, ar- rancam plumas da região do peito e as usam para contribuir no aquecimento dos ovos. Galhos secos e trançados parecem re- presentar uma escolha muito ampla no mun- do das aves. Com o auxílio do bico, elas car- regam esse material, às vezes maiores que elas próprias, para construir ninhos. Fazem isso espécies tão distintas quanto Gaviões, Biguás, Garças, Tuiuiús, Pombos e os mais diversos passarinhos. O material é arranjado habilmente de modo a acomodar, por um longo período, a ave que chocará os ovos e também os filhotes que deles virão. Eviden- temente, o grau de capricho desses ninhos é muito variado. Enquanto Gaviões constroem estruturas capazes de suportar facilmente o peso de um homem, Pombos produzem ninhos tão frágeis que permitem observar os ovos por baixo, mas que ganham solidez com a liga formada pelas fezes dos filhotes entre os gravetos. Ninhos em cavidades Se, por um lado, é grande a variedade de aves que nidifica no clássico ninho aberto, em forma de cesto, um grupo tão amplo quanto esse foi capaz de selecionar uma estratégia reprodutiva diferenciada, nidificando em cavi- dades, naturais ou não. Aqui entram os Papa- gaios, Jacamins, Surucuás, Martins-Pescado- res, alguns Falcões, Corujas, Tucanos e muitas espécies de passarinhos, como os Arapaçus e algumas da família do João-de-Barro, por exemplo. Também entram os responsáveis por proporcionar cavidades “não-naturais” para um sem número de animais: os Pica-Paus. A construção de ninho em cavidade, na- tural ou não, é tarefa das mais triviais para uma ave, diferentemente da seleção da cavidade adequada, alvo de grande disputa inclusive por outros usuários, como Macacos e Gam- bás. Ocos e galerias escavadas em barrancos, por exemplo, são locais privilegiados, já que dificultam o acesso por quem não é escalador nato, caso de muitos predadores. Encontrar uma boa cavidade, portanto, corresponde Beija-Flor: capaz de construir estrutura altamente elaborada Paulo Silva

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tipos de ninhos

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  • Ces & Cia 40048

    Mundo das Aves

    Tempo de ninhos!

    Uma das caractersticas mais evidentes que distinguem as aves dos demais grupos de vertebrados a transformao dos membros anteriores em asas. Com isso, seus braos e mos s podem ser utilizados para o voo, impossibilitando diversos aprovei-tamentos comuns para os mamferos, como a apreenso dos alimentos. O resultado a transferncia da funo de ferramentas multi-tarefas para o bico e para os ps.

    Entre as diversas atividades que as aves podem desempenhar com o bico, esto a construo de ninhos e abrigos. Com uma maestria mpar no mundo animal, constroem estruturas admirveis, frequentemente maio-res e mais pesadas que elas prprias e que, com sua complexidade, desafiam os pesqui-sadores. Claro que, por outro lado, existem tambm construes extremamente simples, que nada mais so que uma mera depresso no solo.

    De simples a complexoOs ninhos no so exclusividade do

    mundo das aves. Jacars e Crocodilos, por exemplo, tambm so capazes de transpor-tar e acumular material para nele depositarem seus ovos. Entretanto, apenas entre as aves essas estruturas atingem um admirvel grau de dificuldade, relacionado com a evoluo de cada grupo de espcies. Quanto maior, mais complexo o ninho.

    Aves como as ratitas (grupo que inclui os Avestruzes, Emas e Casuares, por exemplo) e os tinamiformes (Inhambus e Macucos) constroem ninhos extremamente simples, for-mados apenas por uma ligeira depresso no solo, na qual a fmea deposita os ovos e o macho os incuba. Talha-Mares, algumas Gai-votas e outras aves aquticas tambm cons-troem ninhos muito simples, provavelmente por causa da ausncia de material de cons-truo disponvel nos locais escolhidos para nidificao.

    O efetivo transporte desse material e a construo um pouco mais elaborada dos ninhos comeam a ser vistos nos galiformes (Faises, Codornas, Galinhas, Mutuns, Jacus) e nos anseriformes (Patos, Gansos, Cisnes, Marrecos). O Mutum e o Jacu macho, por exemplo, tranam galhos verdes intensamen-

    Por LUS FBIO SILVEIRA

    Entre as tantas peculiaridades interessantes apresentadas pelas aves, os seus ninhosse destacam pela grande variao de formas, materiais, localizaes e pela nobre funo de, a partir do ms de setembro, abrigar ovos e filhotes

    te at formarem um cesto de estrutura slida e segura. Patos e Cisnes, alm de construrem o ninho com a vegetao mais prxima, ar-rancam plumas da regio do peito e as usam para contribuir no aquecimento dos ovos.

    Galhos secos e tranados parecem re-presentar uma escolha muito ampla no mun-do das aves. Com o auxlio do bico, elas car-regam esse material, s vezes maiores que elas prprias, para construir ninhos. Fazem isso espcies to distintas quanto Gavies, Bigus, Garas, Tuiuis, Pombos e os mais diversos passarinhos. O material arranjado habilmente de modo a acomodar, por um longo perodo, a ave que chocar os ovos e tambm os filhotes que deles viro. Eviden-temente, o grau de capricho desses ninhos muito variado. Enquanto Gavies constroem estruturas capazes de suportar facilmente o peso de um homem, Pombos produzem ninhos to frgeis que permitem observar os ovos por baixo, mas que ganham solidez com a liga formada pelas fezes dos filhotes entre os gravetos.

    Ninhos em cavidadesSe, por um lado, grande a variedade de

    aves que nidifica no clssico ninho aberto, em forma de cesto, um grupo to amplo quanto esse foi capaz de selecionar uma estratgia reprodutiva diferenciada, nidificando em cavi-dades, naturais ou no. Aqui entram os Papa-gaios, Jacamins, Surucus, Martins-Pescado-res, alguns Falces, Corujas, Tucanos e muitas espcies de passarinhos, como os Arapaus e algumas da famlia do Joo-de-Barro, por exemplo. Tambm entram os responsveis por proporcionar cavidades no-naturais para um sem nmero de animais: os Pica-Paus.

    A construo de ninho em cavidade, na-tural ou no, tarefa das mais triviais para uma ave, diferentemente da seleo da cavidade adequada, alvo de grande disputa inclusive por outros usurios, como Macacos e Gam-bs. Ocos e galerias escavadas em barrancos, por exemplo, so locais privilegiados, j que dificultam o acesso por quem no escalador nato, caso de muitos predadores. Encontrar uma boa cavidade, portanto, corresponde

    Beija-Flor: capaz de construir estrutura altamente elaborada

    Paul

    o Si

    lva

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    Lus Fbio Silveira doutor em Zoologia e curador das colees ornitolgicas Museu de Zoologia da USP; membro do Comit Brasileiro de Registros Ornitolgicos (CBRO); pesquisador associado da World Pheasant Association (UK); autor de doze livros sobre aves e de dezenas de artigos cientficos publicados.

    Joo-de-Barro: constri sua prpria cavidade

    praticamente a uma temporada reprodutiva bem-sucedida.

    Diversidade de materiaisAlm de galhos, as aves tambm usam di-

    versos materiais. Ninhos feitos com pequenos pedregulhos so construdos por Pinguins e outras aves marinhas, enquanto os Beija- Flores so capazes de construir estruturas altamente elaboradas, utilizando musgos, li-quens e paina, amarrando tudo com teias de aranha. Os ninhos de Beija-Flores so to constantes na forma e no material utilizado que possvel, em muitos casos, identificar a espcie apenas pelo tipo de ninho.

    Os passarinhos levaram a construo de ninhos ao extremo da complexidade. Difcil no ficar admirado com a tenacidade de um Japu ou Xexu, que constri o ninho em for-ma de saco utilizando finas fibras vegetais, s vezes carregadas por centenas de metros. Essas aves, ainda, costumam construir os ni-nhos prximos uns dos outros, em colnias numerosas e quase sempre perto de um vespeiro, adicionando proteo aos ovos e aos filhotes. Outra espcie cujo ninho cha-ma a ateno o Joo-Graveto que, como o prprio nome indica, utiliza milhares de finos gravetos para a construo de um ni-nho enorme, que pode ultrapassar um me-tro e meio de comprimento e pesar mais de 30 quilos, isso tudo feito por um passarinho que mede pouco mais de 15 centmetros. Os ninhos dessa laboriosa espcie, que capaz tambm de construir cmaras falsas para iludir os predadores, e que podem se transformar em autnticos condomnios, fa-zem parte da paisagem do interior brasileiro, j que essas avezinhas so muito tolerantes presena humana.

    Crin

    Dua

    rteXexu: os ninhos, em forma de saco, ficam um perto do outro

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    Talha-Mar: uma depresso no solo basta para cuidar dos ovos

    Papagaio: nidifica em cavidades

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