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Estoque de carbonoTRANSCRIPT
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ALTERAÇÃO NOS TEORES E ESTOQUES DE CARBONO ORGÂNICO EM UM
LATOSSOLO APÓS 23 ANOS SOB DIFERENTES PREPAROS DE SOLO E
CULTURAS DE INVERNO1
BELLINASO, Roque Junior Sartori2; SANTOS, Danilo Rheinheimer dos3; CALEGARI, Ademir4; TIECHER, Tales5; PICCIN, Rogério2; GUBIANI, Elci2; BENDER, Marcos Antonio2; SCHAEFR, Gilmar Luiz2
1 Trabalho de Pesquisa da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).
2 Estudante do curso de Agronomia da UFSM, Santa Maria, Rio Grande do Sul.
3 Professor do Departamento de Solos da UFSM, Santa Maria, Rio Grande do Sul.
4 Pesquisador do Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR), Área de Solo, Londrina, Paraná.
5 Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Ciência do Solo da UFSM, Santa Maria, Rio
Grande do Sul. E-mail: [email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected]
RESUMO
A transformação de ambientes naturais em áreas de cultivo causam quedas drásticas nos
estoques de carbono do solo. Contudo, sistemas conservacionistas de cultivo com rotações de
culturas podem ser uma importante ferramenta para atingir a sustentabilidade dos sistemas agrícolas.
O objetivo deste trabalho foi avaliar a influência do sistema de manejo e das plantas de cobertura de
inverno nos teores e estoques de carbono orgânico total no solo, tendo como referência o sistema
natural original sob mata nativa. O cultivo de plantas de cobertura aumentou os teores de carbono
orgânico total na camada mais superficial do solo em ambos os sistemas de manejo, sendo que os
maiores valores foram observados no sistema plantio direto onde o estoque de carbono assemelhou-
se com o da mata, especialmente quando se cultivou tremoço azul no inverno, demonstrando ser um
modelo sustentável de agricultura.
Palavras-chave: Sistema plantio direto; Sistema de cultivo convencional; Plantas de cobertura;
Sequestro de carbono.
1. INTRODUÇÃO
O solo possui o terceiro maior estoque de carbono (C) no globo terrestre, sendo,
aproximadamente, quatro vezes maior que o da vegetação e 3,3 vezes maior que o da
atmosfera, e por isso os ecossistemas terrestres (solo + vegetação) são considerados um
grande dreno de C (Machado, 2005). A substituição de sistemas naturais como a mata
Atlântica e a floresta Amazônica por áreas de exploração agrícolas representa uma grande
contribuição para o aumento das emissões de gás carbônico (CO2) para a atmosfera
(Scholes e Breemen, 1997). Nesse sentido, práticas agrícolas que visam seqüestrar C
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atmosférico, como o sistema de plantio direto (SPD) sem revolvimento do solo, pode atenuar
o efeito estufa. Já no sistema de cultivo convencional (SCC), devido ao constante
revolvimento do solo, há a oxidação biológica do carbono orgânico incrementando CO2 na
atmosfera (Reicosky e Forcella, 1998). O aumento do C no solo promove também melhorias
em seus atributos físico-químicos, como o aumento da atividade microbiana, da capacidade
de troca de cátions, melhor infiltração de água e resistência dos agregados. Além disso, a
escolha da espécie de cobertura é de suma importância para incrementar C ao sistema, pois
as plantas apresentam potenciais diferentes em adicionar C no solo (Gonçalves e Ceretta,
1999). O objetivo deste trabalho foi avaliar a influência do sistema de manejo e das plantas
de cobertura de inverno nos teores e estoques de carbono orgânico total no solo, tendo
como referência o sistema natural original sob mata nativa.
2. METODOLOGIA
O experimento foi instalado na Estação Experimental do Instituto Agronômico do
Paraná (IAPAR) no município de Pato Branco, Sudoeste do Paraná (52° 41' W e 26° 07' S).
O clima da região é subtropical úmido, Cfb, segundo classificação de Köppen, com
precipitação média anual de 1.200 a 1.500 milímetros. O relevo é suave ondulado com
pendentes entre 4-7% de declividade. O solo é um Latossolo Vermelho Aluminoférrico,
muito argiloso, formado a partir de rochas de derramamento basáltico.
A área experimental era coberta por Mata Atlântica até 1976, quando esta foi
derrubada, passando-se a cultivar o solo com milho (Zea mays L.) e feijão (Phaseolus
vulgaris L.), sob o SCC, com aração e gradagens leves. A partir do inverno de 1986 foram
definidos os tratamentos, que consistiam em 12 cultivos de plantas anuais de inverno sob
dois sistemas de preparos de solo (SPD e SCC). No presente estudo foram avaliados os
tratamentos cultivados com tremoço azul (Lupinus angustifolius L.), ervilhaca peluda (Vicia
villosa R.), aveia preta (Avena strigosa S.), nabo forrageiro (Raphanus sativus L.), trigo
(Triticum aestivum L.), e pousio, sob SCC (uma aração e duas gradagens antes de cada
cultivo) e sob SPD.
Os tratamentos de inverno foram implantados em 12 dos 23 cultivos (1986-1990,
1992, 1994, 1999-2001, 2005 e 2008). Em 1991, 1995, 1996, 1998, 2006 e 2009 cultivaram-
se aveia preta, e em 1997, 2002-2004 e 2007 foi cultivada aveia preta consorciada com
nabo forrageiro em todas as parcelas, exceto no tratamento pousio. Em 1993, todas as
parcelas permaneceram em pousio. As plantas (tremoço, ervilhaca peluda, aveia preta e
nabo forrageiro) foram controladas no estádio de pleno florescimento através de rolo-faca,
ou pela aplicação de herbicidas (pousio), sendo que ocasionalmente, após o rolo-faca, o
controle da vegetação era complementado com herbicida. As parcelas com trigo foram
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colhidas até 1995 (sete cultivos), e seus resíduos deixados na superfície do solo antes do
preparo de solo para o cultivo de verão. Nos demais anos o trigo foi manejado como as
demais plantas de cobertura. No verão, toda a área era cultivada com soja (Glycine max L.)
ou milho, sendo a soja cultivada 13 vezes (1989-1991, 1993, 1995, 1997, 1998, 2000-2002,
2004, 2005 e 2007) e o milho 9 (1986-1988, 1992, 1994, 1996, 1999, 2003 e 2008). Em
2006 não foi realizado nenhum cultivo de verão.
A adubação foi realizada sempre nos cultivos de verão sendo a mesma quantidade
de fertilizante aplicado em todos os tratamentos. Fósforo, potássio e 1/3 do nitrogênio (N)
foram aplicados na linha de semeadura, e o restante 45 dias após. O total de fertilizantes
aplicados durante o período foi 1510 kg ha-1 de P2O5, 805 kg ha-1 de K2O e 501 kg ha-1 de N.
Durante o período de condução do experimento foi aplicado calcário em superfície seis
vezes, num total de 11,5 Mg ha-1 (1,0; 2,0; 3,0; 1,5; 2,0; 2,0 Mg ha-1 de calcário em todas as
parcelas, em 1989, 1992, 1995, 1999, 2001 e 2006 respectivamente).
As amostras de solo foram coletadas em outubro de 2009, em duas trincheiras
abertas em cada parcela, em cinco profundidades (0-5, 5-10, 10-20, 20-30 e 30-40 cm). As
subamostras das duas trincheiras de cada parcela foram misturadas para compor a amostra
da respectiva profundidade. Também, foi coletada amostra de solo sob mata nativa, em área
contígua a área experimental. Logo após a coleta, o solo das amostras foi seco em estufa
de circulação forçada de ar à ± 60oC, moído, peneirado em malha de 2,0 mm e armazenado.
O teor de COT foi estimado pelo método de combustão úmida com H2SO4
concentrado e K2Cr2O7. O estoque de C no solo foi calculado conforme metodologia
proposta por Fernandes e Fernandes (2008) para solos sob diferentes condições de manejo,
corrigindo os estoques de C para uma mesma massa de solo. A fórmula utilizada foi:
)] x Ctn
onde: Cs = estoque de C total, corrigido em função da massa de solo de uma área de
referencia; = somatório dos estoques de C da primeira a penúltima camada
amostrada no tratamento considerado (Mg ha-1); Mtn = massa de solo da ultima camada
amostrada no tratamento (Mg ha-1); = somatório da massa total de solo amostrado
sob o tratamento (Mg ha-1); = somatório da massa total de solo amostrado na área
de referência (Mg ha-1); Ctn = teor de C do solo da ultima camada amostrada (Mg de C Mg-
1de solo).
Para análise da variância dos dados de COT e estoque de C o seguinte modelo
estatístico foi utilizado:
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Yijkl = µ + Bi + Pj + erro a(i, j) + Sk + erro b(i, k) + PSjk + erro c(i, j, k) + Cl + erro d(i,l) + PCjl +
erro e(i, j, l) + SCkl + erro f(i, k, l) + PSCjkl + erro g(i, j, k, l)
onde µ = média experimental; B = blocos (i = 1, 2, 3); P = planta de inverno (j = 1, 2, 3, 4, 5,
6); S = sistema de manejo do solo (k = 1, 2); C = camada de solo (l = 1, 2, 3, 4, 5) e erro =
erro experimental. Quando os efeitos dos tratamentos foram significativos a 5% de
probabilidade de erro pelo teste de F, as diferenças entre as médias dos tratamentos de
inverno, sistemas de manejo de solo e camadas de solo foram comparadas pelo teste de
Tukey (HSD) (P<0,05).
Posteriormente, em cada camada de solo o teor de COT da área de referência sob
mata nativa (n=3) foi comparada com o solo cultivado sob SPD (n=18) e sob SCC (n=18)
utilizando o teste não-paramétrico de Mann-Whitney U.
3. RESULTADOS E DISCUSSÕES
O solo sob SPD apresentou maior teor de COT na camada 0-5 cm e estoque de C
até a 20 cm de profundidade, comparativamente ao SCC, igualando-se nas demais
camadas. Isso foi devido o manejo conservacionista do solo, eliminando o revolvimento do
mesmo. Já no SCC, o revolvimento do solo estimula a oxidação biológica do C, explicando
os menores estoques de C encontrados sob SCC até 20 cm de profundidade (Tabela 1).
Ambos os sistemas de preparo de solo apresentaram teores de COT inferiores aos
encontrados no solo da mata em todas as camadas devido à alta adição de resíduos no solo
e grande quantidade de serrapilheira presente na superfície do solo e ao menor contato de
microorganismos, reduzindo a velocidade de decomposição. Contudo, o estoque de C no
solo sob SPD até 40 cm foram próximos aos encontrados no solo da mata (Tabela 1).
Tabela 1: Teor e estoque de carbono orgânico total (COT) no solo afetado pelo
sistema de manejo de solo após 23 anos.
Camada SPD SCC Mata P-valor SPD ‡
P-valor SCC ‡
SPD SCC Mata
cm Teor de COT, g kg-1
†
Estoque de C, Mg ha-1
0-5 33,3 aA 22,9 aB 41,2 0,008 0,002 28,7 A 20,7 B 29,9 5-10 23,7 bA 22,7 aA 30,5 0,002 0,002 43,5 A 35,1 B 37,8 10-20 21,0 cA 21,8 aA 24,4 0,017 0,125 59,9 A 52,5 B 57,5 20-30 17,9 dA 18,1 bA 22,1 0,006 0,024 87,4 A 82,5 A 90,5 30-40 15,7 dA 15,2 cA 19,1 0,024 0,017 98,7 A 93,9 A 102,9 SPD, sistema plantio direto; SCC, sistema de cultivo convencional. † Valores para cada sistema de manejo de solo em cada camada são as médias de seis tratamentos de inverno (n=18); médias seguidas pela mesma letra maiúscula na linha e pela mesma letra minúscula na coluna não são significativamente diferentes pelo teste de Tukey a P < 0,05. ‡ Probabilidade de diferença entre o solo da floresta e o solo cultivado sob SPD ou SCC pelo teste Mann-Whitney U.
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Tabela 2: Teor e estoque de carbono orgânico total (COT) do solo afetado pelo sistema de
manejo do solo e culturas de inverno após 23 anos.
Fator Cultura de inverno
Aveia Ervilhaca Nabo Pousio Tremoço Trigo
Sistema de manejo † Teor de COT, g kg-1
SPD 22,6 aAB 21,5 aBC 21,8 aBC 20,8 aC 23,6 aA 22,8 aAB SCC 21,0 bA 19,8 bAB 20,0 bAB 19,0 bB 19,7 bAB 21,2 bA
Camada ‡ Teor de COT, g kg-1
0-5 28,8 aA 27,9 aA 28,0 aA 24,9 aB 29,6 aA 28,5 aA 5-10 24,1 bA 22,6 bAB 23,0 bAB 21,1 bB 23,8 bA 23,8 bA 10-20 22,0 bA 20,5 bA 21,4 bA 20,4 bA 21,7 bA 22,3 bA 20-30 19,0 cA 16,8 cA 17,4 cA 17,6 cA 18,5 cA 18,7 cA 30-40 15,3 cA 15,6 dA 14,7 cA 15,5 dA 14,7 cA 16,8 dA
Camada ‡ Estoque de C, Mg ha
-1
0-5 25,6 AB 24,9 AB 25,2 AB 22,1 B 24,1 AB 26,5 A 5-10 40,1 A 38,6 A 39,0 A 36,3 A 39,5 A 42,3 A 10-20 58,3
A 55,4 A 55,5 A 51,7 A 57,0 A 59,4 A
20-30 87,5 A 82,7 A 84,3 A 80,2 A 85,5 A 89,5 A
30-40 99,4 A 93,7 A 95,3 A 91,3 A 96,5 A 101,6 A SPD, sistema plantio direto; SCC, sistema de cultivo convencional. † Valores para cada sistema de manejo de solo em cada tratamento de inverno são a media de 5 profundidades (n=15); médias seguidas pela mesma letra minúscula na coluna, e médias seguidas pela mesma letra maiúscula na linha, não são estatisticamente diferentes pelo teste de Tukey a P < 0,05. ‡ Valores para cada camada dentro de cada tratamento de inverno são a média de dois sistemas de manejo de solo (n=6); médias seguidas pela mesma letra minúscula na coluna e médias seguidas pela mesma letra maiúscula na linha, não são estatisticamente diferentes pelo teste de Tukey a P < 0,05.
O cultivo do solo no inverno aumentou os teores de COT em ambos os sistemas,
principalmente no solo das camadas superficiais. O efeito do cultivo de plantas hibernais no
estoque de carbono no solo foi significativo somente quando considerado o solo da camada
0-5 cm e no SPD (Tabela 2). O uso de plantas de cobertura aumenta a deposição de
material orgânico no solo em comparação ao pousio, resultando em maior teor de COT no
solo da camada superficial do solo sob cultivo de plantas no inverno. Contudo, o sistema de
manejo do solo e as plantas de cobertura não influenciaram os teores de COT em
profundidade, diferenciando-se somente na camada mais superficial do solo, corroborando
com os resultados obtidos por Gonçalves e Ceretta (1999). Além disso, esses autores,
comparando quatro plantas de cobertura e pousio em sucessão ao milho em SPD,
observaram também que a maior produção de massa seca e resíduos vegetais resultaram
em maior teor de COT na camada superficial do solo cultivado com tremoço azul (Tabela 2).
4. CONCLUSÃO
O cultivo de plantas de cobertura aumentou os teores de COT na camada mais
superficial do solo em ambos os sistemas de manejo, sendo que os maiores valores foram
observados no SPD onde o estoque de C assemelhou-se com o da mata, especialmente
quando se cultivou tremoço azul no inverno, demonstrando ser um modelo sustentável de
agricultura.
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5. REFERÊNCIAS
FERNANDES, F. A.; FERNANDES, A. H. B. M. Cálculo dos estoques de carbono do solo
sob diferentes condições de manejo. Corumba: Embrapa Pantanal (Comunicado Técnico,
69), dez. 2008. Disponível em:
http://www.cpap.embrapa.br/publicacoes/download.php?arq_pdf=COT69. Acesso em: 20 de
junho de 2012.
GONÇALVES, C. N.; CERETTA, C. A. Plantas de cobertura de solo antecedendo o milho e
seu efeito sobre o carbono orgânico do solo, sob plantio direto. Revista Brasileira de Ciência
do Solo, 23:307-313, 1999.
MACHADO, P. L. O. A. Carbono do solo e a mitigação da mudança climática global.
Embrapa Solos, 2005. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/%0D/qn/v28n2/23657.pdf.
Acesso em: 25 de junho de 2012.
REICOSKY, D. C.; FORCELLA, F. Cover crop and soil quality interactions in
agroecosystems. J. Soil Water Conservation, 53:224-229, 1998.
SCHOLES, R. J.; BREEMEN, N. The effects of global change on tropical ecosystems.
Geoderma, 79:9-24, 1997.