7 canÇÕes de um pai para sua filha
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7 CANÇÕES
DE UM PAI PARA SUA FILHA
ÍNDICE
NOTA 2
O DEDO EM RISTE 3
PÉS DE SOL 4
NO SONHO 5
O TROTE 6
ESSE OLHAR 7
ÀS ESCONDIDAS 8
AGITAÇÃO 9
NOTA
Um pai canta. E quando canta, o amor salta e voa, transpõe o coração e anseia por
expirar e emanar dos lábios e dos gestos.
Este é um livro de poemas, ou canções, com imagens. Ou de imagens com canções. São
em número de sete, o número perfeito. Nem mais nem menos. Nasceu da maravilhosa
experiência de ver nascer e crescer uma filha e de a educar, do jogo de quatro olhos gerado
da sua relação. De explorarem os dois o mundo, que uma ainda não conhece e o outro
julgava conhecer.
Um livro de amor e com amor, deste teu pai babado, para ti, minha filha…
Caroline Sophie Ventura Duarte
(n. 26/01/08)
2
O DEDO EM RISTE
O dedo em riste da criançalê os olhos escrevem se a voz ainda é infante
nas margens do riorecessos de pequeninas colmeiasmultímodas ondulantes de coro rio um longo sobressalto
o sorriso da criança no riopintaa carvão e aguarelade assombroe novidadea sua canção
– Papá, qu'é aquilo?
3
11/07/09 passeio no Douro entre Porto e Gaia
PÉS DE SOL
Descalçae de alma nua, a criançapenetra o limiar hermético do nosso olhar
mergulha os pés sem máculapara a inauguração da areiapor baixo há brasas quentespasso a passo pé ante pétitubeia sobre o manto do sol
como sobre a erva hesitanteum tenro gamo conquista o espaço prudentedeixa marcosna superfície de poalha amarela
afinal a praia é agora delae são os seus pés agora firmesquem pela areia difunde a claridade e no nosso olhar deixa um raio de solindelével
27/10/09
4
NO SONHO
Queria ver-te os olhos, minha filha,mas escondeste-os de mim
Entraste num navioou numa nave espacialbateste as asaspara ondesó tu podes ir
sonhas, minha filha?com que sonhas tu?
não se vê sobressalto em tia placidez da pela da tua fronteé um rio de trigo maduroo teu respirar os dedos do ventoque tangem velasos teus cabelos os canais e afluentes de navegação de alto mar
não me queres levar na cabina de pilotagemou no cesto da gávea?levar-me a montar um cometa em pleno voo?a encalhar num atol de coral?se te fizeres amiga de um duende de jardimpedes-lhe dois malmequeres, um para mim e outro para a mamã?
é melhor que eu me calee te deixe só com o teu soninhotens todo o teu sonho para percorrerao acordares terás para cantaraltissonantes epopeias e maviosos poemas
5/12/09
5
O TROTE
O tenro corpofirmado na sela
Uma pequena mãoadestrando pela rédeao minúsculo grão de ar
da apreensão e do espanto
A outra mão não se retémde pousar uma festinha
no enriçado da crina
E a menina trotatrota o pónei
gentil
A vozinha canta uma ordeme o pachorrento bojo da montada
desliza sobre os cascosnum chão de seda
E a menina trotatrota o pónei
suave
Nesse trote que podiatornar-se galope
embrenhar florestas e rasar planíciescontornar vales e transpor penhascos
ou riscar uma nuvem no espaçomas que trota e risca apenas
a abóbada do nosso olhar
11/02/10
6
Caroline 1/05/09 parque termal e de lazer de Amnéville http://www.amneville.com (departamento do Mosela região da Lorena) com 15 meses.
ESSE OLHAR
Nesse olharnão olho o que por trásdele possa existir
olho só o olharde rosto colado à bocaem abertura de rosaaureolada de espantoao enigma do olhardo que olha o teu olhar
queria saber o que sabesintuir para onde lanças o pensamentoa cavalo no olharou que sigilos nele se oculta
o que compreende o teu olharde que astros perscrutas as revoluçõesou se ouros garimpas nas nuvensnão é ao meu olhar desvendado — ou talvez simplesmenteinquiras a barba os fios grisalhos do cabelo do teu paiou coloques bandeiras nas rugasque no rosto os anos lhe cinzelaram
esse olhar pronto a explodirnuma epifania coloridaque cativou o meu olhar e em flores o meu peito incendiou
12/02/10
7
ÀS ESCONDIDAS
— Cucu!
A criança brinca às escondidasmas o riso revelou-ae salta à vista de todoscomo as asas de um pássarose dão ao dorso transparente do vento
um monstro sideral espreitada sua casa de nuvense esparge claridade
ao assomar por detrás da ombreira da portarindo um— Cucu!
13/02/10
8
AGITAÇÃO
Menina,quando
te agitasé o mundo
que se agita
é um prenúnciode fim das eras
as tuas mãos puxam e estremecem
as placas tectónicas
o sobrolhosolta os ventos
e atiçatempestades de areia
na praia
qual lança ao céuum grito teu
sobressalta as nuvense eclode o furor
do tornado
saídos das órbitasos olhos
são projécteis arremessados
contra a película
da paciênciados teus papás
10/03/10
9