1. direitos da crianÇa e do adolescente no brasil...
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Sobral, ano 5, v.1, n. 9, Jul/Dez 2016, p. 5-17. ISSN: 2317-2649
1. DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NO
BRASIL: PERCURSO HISTÓRICO
CHILD’S AND ADOLESCENT’S RIGHTS IN BRAZIL: HISTORICAL JOURNEY
RESUMO
O presente artigo retrata a figura da criança e do adolescente no Brasil ao longo de um processo histórico-social sobre a relevância dada ao trato, bem como os direitos a elas instituídos. Tendo como principal objetivo analisar e pesquisar a partir de leituras, sobre as leis de amparo e proteção que garantam à criança e ao adolescente o pleno desenvolvimento de sua cidadania. O trabalho infantil também foi um marco histórico que não podia deixar de ser citado neste artigo. O embasamento teórico se dá pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (1990) que foi um marco histórico substituindo o Código de Menores. Embora haja uma Constituição, Estatutos, Políticas Educacionais, Projetos e incentivos, ainda se pode observar uma parte da população brasileira carente de orientação e, muitas vezes, à margem do progresso. É necessário a mobilização e o engajamento de todos na promoção dos cuidados e formação de conceitos capazes de tornar a sociedade brasileira voltada para a valorização do infanto-juvenil.
PALAVRAS-CHAVE: Direitos. Proteção à criança e o adolescente. Sociedade. Trabalho infantil. Violência.
ABSTRACT This article presents child’s and adolescent’s picture in Brazil during a historic-social process about the importance given to this process and about the rights given to them. The main objective is, through readings, to search and analyze the laws that support and protect child and the adolescent in order to grant full development of their citizenship. Work for young children was also a historical mark that could not be left without mentioning in this article. The theoretical fundamental was based in the Child’s and Adolescent’s Bylaw (1990) that was a historical mark that has replaced the Underage Code. Although there is a Constitution, a system of Laws and Rules, Educational Policies, projects and incentives, still one can see that a great portion of the Brazilian population needs orientation and is, many times, sidelines of progress. A mobilization and engagement of everyone is necessary in the promotion of care and training concepts that can return the Brazilian Society to valuing the children and adolescents.
KEY WORDS: Rights. Protection of Children and Adolescents. Society. Child’s work. Violence.
SABRINA FONTENELE ARAGÃO -
INTA
DEBORAH DUARTE BRITO
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INTRODUÇÃO
Ao longo da história surgiu a necessidade de se criar leis para a sociedade brasileira, onde
garantissem os direitos da criança e do adolescente, por suas razões explicadas nas mudanças ocorridas
na sociedade. Leis necessárias para garantir o direito de uma vida digna e de qualidade.
Sabe-se que a família e a escola têm o dever de preparar as crianças e os adolescentes para a
vida e protegê-los contra todo e qualquer tipo de perigo, proporcionando-lhes uma vida social respeitável.
Em 1923, foi criado o Juizado de Menores, tendo Mello Mattos como o primeiro Juiz de Menores
da América Latina. No ano de 1927, foi promulgado o primeiro documento legal para a população menor
de 18 anos: o Código de Menores, que ficou popularmente conhecido como Código Mello Mattos. O
Código de Menores estabelecia diretrizes para o trato da infância e juventude regulamentando questões
como trabalho infantil, tutela e pátrio poder (mais tarde denominado de “poder familiar”), delinquência
e liberdade vigiada. O Código de Menores revestia a figura do juiz de grande poder, sendo que o destino
de muitas crianças e adolescentes ficava a mercê do julgamento e da ética do juiz.
Após o Código de Menores, surgiu no período de 1937 a 1945, conhecido como Estado Novo, os
programas assistencialistas, que dentre eles, destaca a obrigatoriedade do ensino.
Em 1950, foi instalado o primeiro escritório do UNICEF - Fundo das Nações Unidas para a Infância
no Brasil, em João Pessoa, na Paraíba, liderando e apoiando algumas das mais importantes
transformações na área da infância e da adolescência no País, como as grandes campanhas de imunização
e aleitamento, a aprovação do artigo 227 da Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do
Adolescente, o movimento pelo acesso universal à educação, os programas de combate ao trabalho
infantil, às ações por uma vida melhor para crianças e adolescentes no Semiárido brasileiro. (UNICEF,
2016, online).
Através das diretrizes fornecidas pela Constituição Federal de 1988, o Estatuto da Criança e do
Adolescente foi criado em 13 de julho de 1990 e sancionado em Lei Federal nº 8.069, é o reflexo dos
avanços obtidos em favor do reconhecimento das necessidades da proteção integral a criança e
adolescente. É a mais avançada legislação que se criou no Brasil, voltada para o público infanto-juvenil, e
traz como premissa a ideia de que a criança e o adolescente devem ser vistos como cidadãos em
desenvolvimento, tendo seus direito à proteção e ao acesso irrestrito à educação, entre outras garantias
que possibilitem seu desenvolvimento integral.
Baseado nesses pressupostos, muito se vem criando em termos de documentos que direcionam
os parâmetros educacionais, tanto nas escolas como nas famílias, a fim de nortear pais e educadores em
sua empreitada de garantir a seus filhos e alunos o desenvolvimento pleno de suas habilidades.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB (Lei nº 9394/96) e Parâmetros Curriculares
Nacionais são também documentos que vêm reforçar a necessidade de democratização da escola e o
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cuidado especial que se deve dispensar ao público alvo da educação básica. Enfatiza-se, nesses
documentos, a necessidade de priorizar a busca por uma educação de qualidade e da participação efetiva
das famílias e do Estado. Essa prática promoverá uma sociedade de cidadãos conscientes, bons
profissionais e líderes responsáveis pelas mudanças necessárias à construção de uma vida digna para
todos os brasileiros.
CRIANÇA E SOCIEDADE
Diversos povos habitavam o Brasil muito antes da chegada dos Portugueses em 1500. Seus
costumes e culturas eram baseados em seus antepassados, onde viviam da agricultura, caça e pesca.
Moravam em aldeias e suas tarefas eram divididas em grupos. Naquela época, as crianças desde cedo
ajudavam seus pais nessas atividades; os meninos ficavam com os trabalhos difíceis e as meninas com as
mães aprendendo a tecer e cuidar das ocas. E quando brincavam, tinham que confeccionar seus próprios
brinquedos com os poucos recursos que possuíam. Após a chegada dos portugueses, as crianças e
adolescentes também foram “dominados” e colocados aos seus serviços (GOMES, CAETANO, JORGE,
2008).
Em tempos de colonização, as crianças eram obrigadas a irem para as guerras, principalmente
as abandonadas nas ruas. Elas ajudavam a carregar pólvoras e municiar canhões. Os adultos e as crianças
se misturavam nas atividades sociais diversas e adquiriam os conhecimentos pelas experiências nas
vivências sociais. As crianças ao longo da história foram marcadas pela desigualdade, exclusão e
dominação.
Em contrapartida, com a vinda dos Europeus, vieram as crianças elitizadas, que possuíam
professores particulares e frequentavam escolas com uma educação privilegiada da época. Essas crianças
tinham amas e babás que cuidavam de sua higienização, eram bem assistidas e acompanhadas pelos
funcionários do senhorio. Os Europeus possuíam suas maneiras de organizar a hierarquia da família que
correspondiam aos ideais católicos onde o pai e a mãe deveriam ser casados perante a igreja. A isso se
unia o conhecido patriarcalismo brasileiro, onde o homem era o chefe da família; a mãe e os filhos eram
subordinados. O pai seria o centro de todas as organizações, repartindo as divisões de tarefas, mas tanto
os homens como as mulheres cuidavam dos negócios, como os pequenos comércios, lavouras, plantações,
fazendas e na comercialização dos escravos (PRIORI, 2006). Porém, criava-se um distanciamento de
relacionamentos e carência de afeto dos próprios pais até que chegassem a certa idade em que
aprenderiam sobre os negócios da família. Para as crianças havia poucas condições de socialização, como
afirma Lahire (2003):
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Se até meados do século XX as sociedades eram mais fechadas e as socializações infantis aconteciam de maneira controlada, pois os pequenos ficavam expostos basicamente à socialização realizada pela família, as sociedades contemporâneas são extremamente diferenciadas e possuem poucas condições de estabilidade nos seus procedimentos de socialização. (LAHIRE, 2003, p. 34).
Nesse aspecto as crianças sempre foram compreendidas como “menores” que precisariam ser
amparados e protegidos para a transformação de futuros adultos adaptados à sociedade. Eram vistos
como a ‘semente do futuro’.
Durante a escravidão no Brasil, alguns filhos de escravos eram separados dos pais depois que
completavam oito anos de idade, para serem vendidos ao trabalho em outras casas, e muitas vezes
sofriam maus tratos, abusos e explorações infantis. Depois da Lei do Ventre Livre de 1871, os filhos dos
escravos foram considerados em condição de liberdade, segundo mostra o documento histórico descrito
abaixo:
A Princesa Imperial Regente, em nome de S. M. o Imperador e Sr. D. Pedro lI, faz saber a todos os cidadãos do Império que a Assembleia Geral decretou e ela sancionou a lei seguinte:
Art. 1.º - Os filhos de mulher escrava que nascerem no Império desde a data desta lei serão considerados de condição livre.
§ 1.º - Os ditos filhos menores ficarão em poder o sob a autoridade dos senhores de suas mães, os quais terão a obrigação de criá-los e tratá-los até a idade de oito anos completos. Chegando o filho da escrava a esta idade, o senhor da mãe terá opção, ou de receber do Estado a indenização de 600$000, ou de utilizar-se dos serviços do menor até a idade de 21 anos completos. No primeiro caso, o Governo receberá o menor e lhe dará destino, em conformidade da presente lei [...]. § 6.º - Cessa a prestação dos serviços dos filhos das escravas antes do prazo marcado no § 1.º se por sentença do juízo criminal reconhecer-se que os senhores das mães os maltratam, infligindo- lhes castigos excessivos.
Art. 2.º - O governo poderá entregar a associações, por ele autorizadas, os filhos das escravas, nascidos desde a data desta lei, que sejam cedidos ou abandonados pelos senhores delas, ou tirados do poder destes em virtude do Art. 1.º- § 6.º.
§ 1.º - As ditas associações terão direito aos serviços gratuitos dos menores até a idade de 21 anos completos, e poderão alugar esses serviços, mas serão obrigadas - 1.º A criar e tratar os mesmos menores - 2.º A constituir para cada um deles um pecúlio, consistente na quota que para este fim for reservada nos respectivos estatutos - 3.º A procurar-lhes, findo o tempo de serviço, apropriada colocação. (Documento histórico, A Lei do Ventre Livre de 1871, online).
A Lei do Ventre Livre trouxe pouca melhoria de vida para muitas crianças negras no Brasil, pois
as mulheres em cativo eram obrigadas a abandonar seus filhos visto que não podiam ficar com eles; e se
as crianças permanecessem com suas mães, teriam logo que ajudar nos trabalhos.
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No Brasil Colônia, as crianças não eram vistas como sujeitos, viam-se impedidas de exercer seu
espaço na sociedade e muitas vezes eram negligenciadas. Paschoal e Machado (2009) afirmam sobre isso:
No Brasil colonial, o filho ocupava uma posição secundária na família; uma imagem despida de atrativos tinha direito a uma atenção genérica, não personalizada. A família colonial ignorava a criança ou a subestimava, privando-a da afeição indispensável ao seu desenvolvimento físico e emocional. A criança tinha uma vida paralela à economia doméstica, era um acessório supérfluo; ao pai-proprietário, interessava o filho adulto. (PASCHOAL, MACHADO, 2009, pág. 78).
Percebe-se que nesse período as crianças e adolescentes não possuíam direitos e nem deveres,
eram postas de lado sem nenhum cuidado familiar adequado. Em alguns casos eram abandonadas nas
igrejas, nas portas das casas, para serem criadas pelas famílias que as encontrassem. Não eram raros os
casos de aborto ou infanticídios, como meio de contracepção em casos de gravidez indesejada. Essas
práticas eram constantes, mesmo sendo consideradas ilegais como afirma Ariès (1989):
O infanticídio era um crime severamente punido, porém, era praticado em segredo, talvez, camuflado, sob a forma de um acidente: as crianças morriam asfixiadas naturalmente na cama dos pais, onde dormiam. Não se fazia nada para conservá-las ou para salvá-las. (ARIÈS, 1989, p.17).
Sabe-se que a prática de aborto continua ilegal em nossos dias, mas existem profissionais que
servem ainda a essa prática, apesar das medidas tomadas para evitá-la. Atualmente existem discussões
que intentam legalizar o aborto, mas quanto a esse assunto ainda não se tem nenhuma lei definida.
Depois, com a Revolução Industrial, no início do século XIX, a estrutura social modificou os
hábitos familiares. Sobre isso Paschoal e Machado (2009) descrevem:
Com o nascimento da indústria moderna, alterou profundamente a estrutura social vigente, modificando os hábitos e costumes das famílias. As mães operárias que não tinham com quem deixar seus filhos utilizavam o trabalho das conhecidas mães mercenárias. Essas, ao optarem pelo não trabalho nas fábricas, vendiam seus serviços para abrigarem e cuidarem dos filhos de outras mulheres (PASCHOAL, MACHADO, 2009, p. 78).
Nesse período, as mães necessitavam trabalhar nas usinas e fábricas para ajudar na renda
familiar, com isso, as crianças ficavam sobre o cuidado de outras mulheres ou eram recrutadas para o
trabalho e incluídas nesse crescimento industrial e econômico. O trabalho infantil era considerado fácil
por serem controlados e custarem menos para os empregadores. Muitas vezes eram colocadas em
condições deploráveis e sub-humanas pela força exercida durante o trabalho. Rizzo (2003) declara como
eram as condições de trabalho:
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Criou-se uma nova oferta de emprego para as mulheres, mas aumentaram os riscos de maus tratos às crianças, reunidas em maior número, aos cuidados de uma única, pobre e despreparada mulher. Tudo isso, aliado a pouca comida e higiene, gerou um quadro caótico de confusão, que terminou no aumento de castigos e muita pancadaria, a fim de tornar as crianças mais sossegadas e passivas. Mais violência e mortalidade infantil (RIZZO, 2003, p. 31).
Para as famílias pobres, a maior preocupação seria a sobrevivência, e os maus tratos e desprezo
pelas crianças eram aceitos pela maioria na sociedade. Eram abandonadas nas ruas, com mazelas que se
tornavam tão comuns, segundo Rizzo (2003).
Devido à precariedade das boas condições para um bom desenvolvimento saudável da criança,
como a falta de higienização necessária e pouco conhecimento médico-pediátrico na época, muitas
crianças eram afligidas pelas mazelas e doenças nas quais vitimaram centenas ao longo da história como
declara Ribeiro (2006).
Havia também as doenças que costumavam afligir e dizimar as crianças, como o sarampo, a varíola, verminoses, dermatoses, tinha e sarna, além da infecção chamada: mal-de-sete-dias, resultante da inflamação do umbigo do recém-nascido. (RIBEIRO, 2006, p. 3).
Observa-se na história da criança brasileira a luta pela sobrevivência diante de uma sociedade
preconceituosa e inculta, e esse resgate é encarar um passado que se compreende, mas que se prefere
ignorar, cheio de anônimas tragédias. O abandono de bebês, a venda de crianças escravas que eram
separadas de seus pais, a vida em instituições que no melhor dos casos significavam mera sobrevivência,
as violências cotidianas que não excluem os abusos sexuais, as doenças, queimaduras e fraturas que
sofriam no trabalho escravo ou operário foram situações que empurraram por mais de três séculos de
história. Contudo, se é verdade que surge uma imagem do autoritarismo e indignidade imposta por
adultos às crianças, surge também uma história de amor materno e paterno, de afeto e de humanidade
das inúmeras pessoas que acima de preconceitos e interesses mesquinhos, deixaram-se ser sensibilizados
com aqueles que, antes de tudo, são os mais carentes e indefesos dos seres humanos. (PRIORI, 1991).
A partir do século XIX, a sociedade mudou a maneira de olhar para as crianças e os adolescentes.
Surgiram então, leis e códigos amparados pelo Estado e abraçados pelas famílias e instituições de apoio.
Segundo o Estatuto da Criança e Adolescente (1990) a criança e o adolescente gozam de todos os direitos
fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta lei,
assegurando-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar
o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.
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Atualmente, possuem uma formação educacional diferenciada comparada a educação dos
séculos passados, devido aos recursos que são utilizados como a tecnologia, os meios de comunicação,
televisão, teatro, cinema, revistas, brinquedos pedagógicos, tornando as necessidades bem diferenciadas
voltadas ao consumismo mercantilista e ao capitalismo das classes dominantes.
Segundo o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), ser criança é um período na vida humana
que vai do nascimento até os 12 (doze) anos de idade incompletos, depois iniciando à adolescência, entre
12 (doze) e 18 (dezoito) anos. As crianças vivenciam no mundo a fase do descobrir, inventar, brincar,
correr, pular, gritar, entre outras. Uma fase que requer muito cuidado dos responsáveis para ajudarem
no crescimento e desenvolvimento como a comunicação, coordenação psicomotora, cognitivo e afetivo.
TRABALHO INFANTO JUVENIL NO BRASIL
No Brasil considera trabalho infantil aquele realizado por crianças ou adolescentes com idade
inferior a 16 (dezesseis) anos, a não ser na condição de aprendiz, quando a idade mínima permitida passa
a ser de 14 (quatorze) anos. Sua origem ocorreu há muito tempo atrás durante a Colonização Portuguesa.
O Brasil tem uma longa história de exploração da mão-de-obra infantil por ser mais barata e
com mais facilidade de adaptar-se. As crianças pobres, órfãs e abandonadas sempre trabalharam para os
“capitalistas” no início da industrialização, pois visavam também, o aprendizado de uma ocupação futura
definitiva.
Muitos começavam cedo à luta pela sobrevivência. A maioria destas crianças não recebia
qualquer tipo de remuneração, pois ajudavam os pais no trabalho para aumentar a produtividade da
produção familiar.
A luta pela erradicação do trabalho infantil deu início na década de 80. Nessa época ficou
estabelecido pela Constituição Federal de 1988 que era dever da família, do Estado e da sociedade:
Assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Art. 227 da Constituição Federal de 1988).
Já o Art. 7º, inciso XXXIII (alterado pela Emenda nº 20, de 15 de dezembro de 1998) estabelece
como idade mínima de 16 (dezesseis) anos para o ingresso no mercado de trabalho, exceto na condição
de aprendiz, a partir dos 14 (quatorze) anos. O trabalho doméstico, segundo a Lista das Piores Formas de
Trabalho Infantil – (Lista TIP) determinou:
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É um anexo do Decreto nº 6481/2008, que regulamenta, no Brasil, a Convenção Nº 182 da Organização Internacional do Trabalho - OIT, sobre as piores formas de trabalho infantil. Ela tem 93 itens de proibição. Desdobra-se em: I) Trabalhos prejudiciais à saúde e à segurança; II)Trabalhos Prejudiciais à Moralidade. No primeiro tópico, contempla atividades desenvolvidas em setores da agricultura, pecuária, silvicultura e exploração florestal; pesca; indústria extrativa; indústria da transformação; produção e distribuição de eletricidade, gás e água; construção; comércio (reparação de veículos automotores objetos pessoais e domésticos); transporte e armazenagem; saúde e serviços sociais; serviços coletivos, sociais, pessoais e outros; serviço doméstico e outras que envolvem riscos em quaisquer situações. (TST, 2008, online).
Das piores formas de trabalho infantil, submete o trabalhador aos riscos como esforços físicos
intensos, isolamento, abuso físico, psicológico e sexual, longas jornadas de trabalho, trabalho noturno,
calor, exposição ao fogo, posições antiergonômicas e movimentos repetitivos, tracionamento da coluna
vertebral, e sobrecarga muscular. Tais riscos trazem como possíveis consequências à saúde, afecções
musculoesqueléticas (bursites, tendinites, dorsalgias, sinovites, tenossinovites), contusões, fraturas,
ferimentos, queimaduras, ansiedade, alterações na vida familiar, transtornos do ciclo vigília-sono,
deformidades da coluna vertebral, síndrome do esgotamento e neurose profissional; traumatismos,
tonturas e fobias. Tudo isso justifica a proibição segundo o Tribunal Superior do Trabalho. (TST, 2008,
online).
No Brasil é proibido o trabalho infantil, segundo afirma o Estatuto da Criança e do Adolescente
no artigo 67, pois o trabalho infantil pode causar prejuízos à formação e desenvolvimento da criança e do
adolescente, além da exploração que elas vivenciavam com os trabalhos exaustivos, acabavam deixando
de ir à escola, potencializando assim o regime de escravidão, onde trabalham muito e ganhando nada ou
quase nada.
O ingresso ao mercado de trabalho é a partir dos 18 (dezoito) anos de idade, porém, no Brasil a
população sempre começou a trabalhar muito cedo devido aos problemas sociais e econômicos
enfrentados pela maioria da população de baixa renda, e devido às necessidades familiares, estas passam
a deixar que as crianças trabalhem para ajudar no sustento do lar. A maioria dessas crianças trabalhava
como vendedores ambulantes, catadores de papeis, guardador de carro, entre outros.
O governo, juntamente com as organizações de cooperação internacional como a UNICEF
(Fundo das Nações Unidas para a Infância), promoveram a defesa dos direitos das crianças e adolescentes,
contribuindo para as necessidades básicas e para um bom desenvolvimento, tais como: sindicatos,
fundações privadas, campanhas de conscientização e mobilizações sociais, com intuito de beneficiar essas
vitimas da exploração do trabalho infantil.
Com a elaboração e a aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente em 1990, introduziu-
se no Brasil um novo paradigma na maneira de abordar e tratar o assunto do trabalho infantil, com a
proteção integral dos direitos. Também em 1992, vigora o Programa Internacional de Eliminação do
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Trabalho Infantil da Organização Internacional do Trabalho (OIT). A prioridade do programa são as
crianças que trabalham em condições de risco na produção industrial, agrícola, comercial, entre outros.
Em 1990, foi criada a Fundação Abrinq pelos direitos da criança; instituição sem fins lucrativos,
com o objetivo de mobilizar a sociedade para questões relacionadas aos direitos da infância e da
adolescência. Seu trabalho é pautado pela Convenção Internacional dos Direitos da Criança (ONU, 1989),
Constituição Federal Brasileira (CF, 1988) e Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA, 1990).
A Fundação desenvolveu o programa Empresa Amiga da Criança, comprometidas a eliminar o
trabalho infantil e ainda mantém programas de profissionalização e educação para adolescentes carentes,
incentivando-os para a qualificação no mercado de trabalho.
Desde 2004, o Ministério da Educação vem acelerando o enfrentamento das injustiças que
persistem na educação com o intuito de superação das desigualdades, buscando meios para proporcionar
o acesso e a permanência de todas as crianças na escola, e com isso espera-se garantir o direito às
diferenças. Como afirma Rizzini: “A criança que não estuda não terá alternativas, ela irá perpetuar na sua
condição de miséria, tornando-se um adulto mal remunerado por falta de qualificação profissional, onde
acaba por comprometer a sua existência e a dos seus, num círculo sem fim”. (RIZZINI, 1999). Ao
compreender e entender sobre o histórico vivenciado por muitas crianças e adolescentes, fica esclarecido
sobre a importância dos direitos ao lhe assegurar sua parte no convívio social e o futuro deles está no
amparo da sociedade, do Estado e família.
CONCEITOS SOBRE ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
Depois da Segunda Guerra Mundial, ante a existência de milhares de crianças órfãs ou
deslocadas de seus pais e família, as Organizações das Nações Unidas (ONU) resolveu criar um Fundo
Internacional de Ajuda Emergencial à Infância Necessitada. Surge assim o UNICEF - United Nations
International Child Emergency Fund (Fundo das Nações Unidas para a Infância), em 11 de outubro de
1946, com o objetivo de socorrer as crianças dos países devastados pela guerra.
Em seus primeiros três anos, os recursos do Fundo foram encaminhados para o auxílio
emergencial (sobretudo em alimentos) para as crianças dos países arrasados pela guerra da Europa e da
China, como também às crianças refugiadas da Palestina (1948 a 1952) vítimas da criação do Estado de
Israel. Pela primeira vez tinha-se o reconhecimento internacional de que as crianças necessitavam de
atenção especial (MARCILIO, 1998, p.3).
Em 1927, foi promulgada a Primeira Legislação sobre a Infância no Brasil: Código de Menores,
devido ao surgimento dos maiores índices de “delinquência infantil”.
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Naquela época devido às condições sociais dessas crianças a margem da sociedade, vindas de famílias
desestruturadas e do abandono dos pais. Esses menores “delinquentes” eram vistos pela sociedade como
marginais, criminosos e doentes, tornando-se uma problemática para o governo. Sobre isso Silva (2013)
afirma:
Foi nesse período histórico que o governo republicano começou a tomar medidas mais incisivas e autoritárias sobre a questão do aumento da “delinquência”: formulando leis, decretos e criando novas instituições correcionais com objetivo, de acordo com o discurso oficial, de resgatar essa infância abandonada. Enfim, foi entre o final do século XIX e as primeiras décadas do século XX que a questão da infância marginalizada tomou um novo rumo político e social, tornando-se uma questão de Estado (SILVA, 2013, p.3).
Em 1987 constituiu-se a Comissão Nacional da Criança e Constituinte, instituída por Portaria
Interministerial e por representantes da Sociedade Civil organizada. Criou-se a Frente Parlamentar
Suprapartidária pelos Direitos da Criança e multiplicou-se por todo o País os Fóruns de Defesa da Criança
e do Adolescente. Foram estes esforços conjugados do Governo e da Sociedade Civil que garantiram a
redação dos três artigos da Constituição de 1988 que defendem os direitos das crianças. A homologação
dos dispositivos da Carta Magna (o primeiro longo processo histórico que levaria ao surgimento do
Constitucionalismo), em favor da infância, fundados na Declaração dos Direitos Humanos e na Declaração
dos Direitos da Criança, foi estabelecida o Estatuto da Criança e do Adolescente, este documento legal
representa uma verdadeira revolução em termos de doutrina, ideias, práxis, atitudes nacionais ante a
criança. Em sua formulação contou, igualmente, com intensa e ampla participação do governo e,
sobretudo, da sociedade, expressa em organizações como a Pastoral do Menor, o UNICEF, a Ordem dos
Advogados do Brasil (OAB), o Movimento Nacional dos Meninos e Meninas de Rua, movimentos de igrejas
e universidades, dentre tantos outros órgãos. (MARCILIO, 1998, p.6).
O Estatuto da Criança e do Adolescente surgiu de uma longa trajetória de lutas para garantir o
direito e deveres dos menores, instituído pela Lei nº 8.069 no dia 13 de julho de 1990, fornecida pela
Constituição Federal de 1988. O ECA são conjuntos de normas e ordens jurídica com o objetivo de
proteção integral da criança e do adolescente com regulatório dos direitos humanos. O mundo
globalizado e as mudanças socioambientais impõem novos desafios às políticas públicas, em particular,
às políticas educacionais, principalmente em países emergente como é o caso do Brasil.
Ao longo do século XX, muitos indicadores sociais mostram que é consenso do ECA nas
mudanças da concepção e no tratamento da infância e do adolescente. Todos são portadores de direitos
e necessita de atenção, alimento, de uma escola de qualidade e atendimentos adequados na saúde. A
criança deve ser prioridade absoluta de todas as ações municipais, tomando o eixo central na discussão
dos direitos.
Contudo, o Estatuto da Criança e do Adolescente foi uma tentativa de resgatar a divida social
que o Brasil possui com as crianças e adolescentes, mas ainda acredita-se que não é a totalidade do
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idealismo, precisa mais ainda ser adaptada com a realidade e a prática. Por meio de medidas
socioeducativas previstas no ECA, o objetivo é de ajudá-los a recomeçar e a prepará-los para uma vida
adulta de acordo com o socialmente estabelecido.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante dos fatos relatados, constatamos que o processo histórico dos direitos da criança
e do adolescente no Brasil foi marcado por um período de descaso e violência, onde os mesmos eram
vistos como meros objetos de fácil manipulação na sociedade. É notável ainda, um descuido para com
estes indivíduos onde eram tratados de maneira discriminatória e muitas vezes negligentes. Somente
após muitos anos de discussões, em torno dos casos crescentes de violências e mudanças políticas, é que
se pôde enxergar a criança e o adolescente como sujeitos de direitos e com necessidades de proteção.
Considerando que encontram-se em desenvolvimento pela capacidade no discernimento para
a maturidade física e psíquica, surge a necessidade de uma proteção especial e integral para que seus
direitos sejam resguardados, haja vista que, as vivências durante o período infanto-juvenil refletem em
seu desenvolvimento e formação de personalidade, consequentemente, refletem em nossa sociedade.
Atualmente, apesar do amparo como o Estatuto da Criança e do Adolescente (instituído pela Lei nº
8.069/90), ainda são constatados casos de violência praticada contra eles.
Mediante o exposto, e considerando que as Leis estão em constantes mudanças, emerge a
necessidade de medidas mais eficazes que garantam a proteção integral da criança e do adolescente e
assegurar a prática constante e operante.
REFERÊNCIAS
ARIÉS, Philipe. História Social da Criança e da Família. Rio de Janeiro: Guanabara S.A.1981.
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