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Fiori - Sobre o poder global

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05_Fiori_60a73.qxd11/22/054:25 PMPage 60[1] Este trabalho foi originalmenteescrito para o seminrio Innovationsystems and development strategiesfor the Third Millenium, realizadono Rio de Janeiro de 3 a 5 de novembrode 2003.[2]Kindleberger,Charles.The world indepression, 1929-39. Berkeley: Univer-sity of California Press, 1973, p. 304.SOBRE O PODER GLOBAL1Jos Lus FioriRESUMOO artigo discute as possibilidades e limites da idia de umagovernana global. O autor retoma a teoria da estabilidade hegemnica e seu desdobramento no debate em torno dasnoesdehegemoniaegovernanamundiais. Examinaentoaconstituioeexpansodeeconomiasepodereshegemnicos desde o sculo XVII, a fim de extrair premissas tericas acerca das condies reais sob as quais pode havergovernabilidade global, para alm de um ideal cosmopolita kantiano.PALAVRAS-CHAVE: hegemonia internacional; governana global;sistema mundial.SUMMARYThe article discusses the possibilities of global governance.Taking the notions of global hegemony and governance as a guideline, the author examines the constitution andexpansion of hegemonic powers since the 17th century. Further on, he puts into question the notion of cosmopolita-nism proposed by Kant and discusses the actual possibility of a global government.KEYWORDS: international hegemony; global governance; world system.NOVOS ESTUDOS73 NOVEMBRO 2005 61A mera preservao da existncia social exige, na livre competio, umaexpanso constante.Quem no sobe,cai.E a expanso significa o domniosobre os mais prximos e sua reduo ao estado de dependncia. [...] o quetemos um mecanismo social muito simples que, uma vez posto em movi-mento,funciona com a regularidade de um relgio.Norbert Elias, O processo civilizadorFoi no incio da dcada de 1970 que Charles Kindleber-ger e Robert Gilpin formularam a tese fundamental que mais tarde foichamada de teoria da estabilidade hegemnica. O mundo enfrentavaas primeiras manifestaes da crise internacional que se seguiu ao fimdo sistema de Bretton Woods e derrota dos Estados Unidos no Vietn,e os dois autores estavam preocupados com a possibilidade de que serepetissem a crise e a Grande Depresso dos anos 1930, por falta de umaliderana mundial. Foi quando Kindleberger afirmou que o bom funcio-namento de uma economia liberal mundial necessita de um estabiliza-dor e de um s pas estabilizador2 um pas que provesse o sistemamundial de alguns bens pblicos indispensveis para o seu funciona-mento, como uma moeda internacional e o livre-comrcio, ou da coor-denao das polticas econmicas nacionais e da promoo de polticasanticclicas de eficcia global.A tese de Kindleberger tinha uma natureza05_Fiori_60a73.qxd11/22/054:25 PMPage 61[3]Gilpin, Robert. The political eco-nomyof theinternationalrelations.Princeton:Princeton University Press,1987, p. 88.[4]Carr, Edward H. The twenty yearscrisis, 1919-39. Nova York: Perennial,2001, p. 211.[5]Aron,Raymond.Paz e guerra entreas naes. Braslia: Editora Universi-dade de Braslia, 1962, p. 47.[6] Cf. McKeown, Timothy J. Hege-monic stability theory and 19th cen-tury tariff levels in Europe. Interna-tional Organization, vol. 37, no 1, 1983;Rogowski, Ronald. Structure, gro-wth and power: three rationalist ac-counts. International Organization,vol. 37, no 4, 1983; Stein, Arthur. Thehegemons dilemma: Great Britain,the United States,and the internatio-naleconomicorder. InternationalOrganization, vol. 38, no 2, 1984; Rus-set, Bruce. The mysterious case ofvanishing hegemony or, is Mark Twa-in really dead?. International Organi-zation, vol. 39, no2, 1985; Snidal,Duncan. The limits of hegemonicstability theory. International Orga-nization, vol. 39, no 4, 1985.claramente normativa, mas se apoiava numa leitura terica e compa-rativa da histria do sistema capitalista. Como sintetizou Gilpin: aexperincia histrica sugere que, na ausncia de uma potncia liberaldominante, a cooperao econmica internacional mostrou-se extre-mamente difcil de ser alcanada ou mantida3. Kindleberger falou ini-cialmente de uma liderana ou primazia, mas depois um nmerocada vez maior de autores passou a utilizar o conceito de hegemoniamundial. s vezes com a conotao pura e simples de um poder acimade todos os demais; outras vezes com uma conotao mais grams-ciana,de um poder global legitimado pelos demais Estados,graas efi-ccia convergente de sua governana mundial.A tese no era completamente nova, pois j havia sido formuladaquase que literalmente por Edward Carr em 1939 no seu clssico ensaioA crise dos vinte anos. Carr era um realista e estava discutindo o problemada manuteno da paz entre Estados soberanos no momento emque comeava a II Guerra Mundial , mas sua concluso era muitoparecida com a de Kindleberger e Gilpin: a condio da legislaointernacional o super-Estado4. Uma traduo para o campo interna-cional do velho e conhecido argumento hobbesiano: Antes que sedesignem o justo e o injusto, deve haver alguma fora coercitiva.Alguns anos depois, Raymond Aron praticamente afirmava o mesmoao dizer que no haveria paz mundial enquanto a humanidade notivesse se unido num Estado Universal5. Aron privilegiava o imprioda lei, conforme a viso cosmopolita e liberal de Kant, mas reconheciaa importncia da poltica de poder, como o prprio Kant, que tam-bm dissera no seu devido tempo que o homem um animal que, aoviver entre outros da mesma espcie, tem necessidade de um senhorque o obrigue a obedecer a uma vontade universalmente vlida. Todosfalavam em preservao da paz, e no do bom funcionamento da econo-mia internacional, como Kindleberger e Gilpin, mas todos reconhe-ciam, em ltima instncia, a necessidade de algum tipo de poder pol-tico supranacional como condio de uma ordem mundial estvel,fosse ela econmica ou poltica.Durante a dcada de 1980, a teoria da estabilidade hegemnica foisubmetida a uma crtica minuciosa por suas inconsistncias tericas ehistricas. Vrios autores questionaram a idia de que Inglaterra hou-vesse promovido intencionalmente a adeso dos demais pases aopadro-ouro no sculo XIX, e demonstraram historicamente que namaioria dos casos o comportamento dos pases hegemnicos se orien-tou pelos seus prprios interesses nacionais, por vezes transformando-se mais em obstculo do que em condio da estabilidade internacio-nal6. Susan Strange, em particular, mostrou que as crises sistmicas aolongo da histria tm sido causadas muito mais por fatores internos sociedade e economia do pas hegemnico do que pelo comporta-mento dos pases que usufruem e contestam o sistema7. Nessa mesmalinha, Andrew Walter conclui que62 SOBRE O PODER GLOBAL Jos Lus Fiori05_Fiori_60a73.qxd11/22/054:25 PMPage 62[7]Strange, Susan. The persistentmyth of lost hegemony. InternationalOrganization, vol. 41, no 4 1987.[8]Walter, Andrew. World power andworld money. Londres:Harvester Whe-atsheaf, 1993, p. 249.a funo hegemnica do estabelecimento e da manuteno de regras devia servista como de limitado valor descritivo. A distino entre os papis da imposi-o de regras, do estmulo coordenao poltica entre os Estados e da gesto ede uma cautelosa superviso do sistema monetrio e financeiro internacionalnos habilitava a entender melhor as diferentes pretenses hegemonia quehaviam se apresentado8.Por outro lado, a histria das ltimas dcadas do sculo XX tambmcontradisse a teoria da estabilidade hegemnica. Nestes ltimos trintaanos, em particular aps a segunda metade dos anos 1980, o mundoesteve sob a liderana incontestvel de uma s potncia, orientada porum forte commitment liberal. Como propunha Kindleberger, durante esseperodo os Estados Unidos arbitraram isoladamente o sistema monet-rio internacional, promoveram ativamente a abertura e a desregulaodas economias nacionais e o livre-comrcio, incentivaram a convergn-cia das polticas macroeconmicas e atuaram pelo menos em parte como last resort lender em todas as crises financeiras que abalaram omundo dos negcios, mantendo, ao mesmo tempo, um poder incon-trastvel nos planos industrial, tecnolgico, militar, financeiro e cultu-ral. Apesar de tudo isso, o mundo viveu nesse perodo uma conjunturade grande instabilidade sistmica, tanto no campo financeiro como nodas relaes poltico-militares.A despeito das crticas tericas e das inconsistncias histricas, apreocupao inicial de Kindleberger e Gilpin tornou-se o denominadorcomum de uma extensa literatura sobretudo nos Estados Unidos acerca da crise da hegemonia norte-americana.E sua tese comum a res-peito da necessidade mundial de pases estabilizadores ou hegem-nicos transformou-se no foco de um longo debate acadmico sobre oconceito e as funes das hegemonias mundiais, que algum tempodepois se prolongou na discusso sobre o que se convencionou chamarde governana global.De um lado se alinharam, desde o incio, os realistas ou neo-rea-listas de variados matizes, aprofundando a discusso sobre a origem eo poder dos Estados hegemnicos e sobre as formas de sua gesto glo-bal, baseadas na sua capacidade material e no seu controle sobre asmatrias-primas estratgicas, os capitais de investimento, as tecnolo-gias de ponta, as armas e as informaes. Kindleberger e Gilpin perten-ciam a esse grupo, inaugurado por Edward Carr. Mas a tambm seincluam os estruturalistas, como Susan Strange, que criticavam ateoria da estabilidade hegemnica mas reconheciam a existncia depoderes estruturais globais, controlados por sucessivas potnciasdominantesecapazesdeinduzircomportamentoscoletivossemnecessidade do uso da fora. Da mesma forma, um grupo de autoresmarxistas ou neomarxistas, como Immanuel Wallerstein e GiovanniArrighi, partia do conceito e da histria do modern world system paraconcluir que ao longo dos ltimos quinhentos anos a competio entre63 NOVOS ESTUDOS73 NOVEMBRO 200505_Fiori_60a73.qxd11/22/054:25 PMPage 63[9] Wallerstein, Immanuel. The mo-dern world system. Nova York: Acade-mic Press, 1974; Arrighi, Giovanni. Acrisis of hegemony.In:Amim,Samireoutros. Dynamicsof globalcrisis.Londres: The MacMillan Press, 1982.VertambmArrighi, Giovanni. Olongo sculo XX. Rio de Janeiro/SoPaulo: Contraponto/Unesp, 1994.[10]Hardt, Michael e Negri, Antonio.Imprio. Rio de Janeiro: Record, 2001.[11] Keohane, Robert e Nye, Joseph.Power and Interdependence: world poli-tics in transition.Boston:Little Brown,1977, pp. 19, 55 e 20.os Estados nacionais europeus s no degenerou em caos poltico eeconmico graas ao comando de trs grandes potncias hegemnicascapazes de organizar ou governar o funcionamento hierrquico dosistema mundial criado na Europa durante o sculo XVI algo comociclos hegemnicos comandados sucessivamente pelos Pases Bai-xos, no sculo XVII, pela Gr-Bretanha, no sculo XIX, e pelos EstadosUnidos, no sculo XX9. Mais recentemente, Antonio Negri e MichaelHardt introduziram no campo marxista a tese de que o mundo j esta-ria sendo governado por uma nova forma de imprio ps-nacional,uma espcie original de supra-estrutura poltica correspondente auma economia mundial que j teria sido globalizada pela ao desna-cionalizante do capital10.Numa posio oposta dos realistas colocaram-se, desde a primeirahora, os liberais ou pluralistas, como Joseph Nye e Robert Keohane,os verdadeiros pais da idia de governana global. Estavam convenci-dos como Negri e Hardt, muito mais tarde da perda de importn-cia dos Estados nacionais e da possibilidade de criao de uma novaordem poltica e econmica mundial, estabilizada e gerida com base emregimes supranacionais legtimos, capazes de funcionar com eficciamesmo na ausncia de potncias hegemnicas. Segundo Keohane eNye, verdadeiras tramas de regras, normas e procedimentos que regu-larizariam comportamentos e controlariam efeitos [...] e que, uma vezestabelecidas, seriam difceis de erradicar ou rearranjar. Mas mesmoeles reconheciam a existncia de situaes em que no h normas e pro-cedimentos consensuais ou em que as excees s regras so maisimportantes que os casos de aderncia11. Nessas circunstncias, a hie-rarquia e o poder dos Estados permaneceriam decisivos para a definiodos regimes e das solues impostas comunidade internacional. Umaqualificao necessria, mas que reabre o problema da coordenao ougovernana de um sistema que segue sendo interestatal. Raymond Arontentou resolver essa dificuldade propondo uma distino entre doistipos de subsistemas internacionais que coexistiriam lado a lado: ummais homogneo e o outro mais heterogneo, dependendo do grauem que os Estados envolvidos compartilhassem ou no concepes evalores internacionais.Mas Aron no consegue explicar por que as gran-des divergncias e guerras quase sempre se deram no mbito dos siste-mas homogneos, o que refora a tese realista de que no haveria pos-sibilidadedegovernanamundialsemumaclaradefiniodasupremacia entre as grandes potncias.Resumindo, no h dvida de que a teoria da estabilidade hege-mnica no resiste prova da histria e de que os conceitos de hege-monia e ciclos hegemnicos parecem excessivamente associadosa uma viso funcionalista do sistema mundial. Como se o hege-mon fosse um ente virtual mais do que real, uma espcie de exign-cia funcional do sistema poltico criado pela Paz de Vestflia e do sis-tema econmico criado pela expanso e globalizao das economias64 SOBRE O PODER GLOBAL Jos Lus Fiori05_Fiori_60a73.qxd11/22/054:25 PMPage 64[12]Braudel, Fernand. A dinmica docapitalismo. RiodeJaneiro: Rocco,1987, pp. 85 e 82.nacionais europias: a exigncia funcional de um poder estabiliza-dor da economia e de um poder pacificador das relaes entre osEstados soberanos.Mas quais foram,ao longo da histria,esses poderes ou gestores glo-bais? Como foi que eles definiram as normas e regras prprias dos regi-mes de governana mundial? Que relao haveria entre esses poderes eo processo de globalizao dos mercados e da economia capitalista? Soperguntas que permanecem sem respostas a menos que se faa umareconstituio analtica cuidadosa do processo de organizao dos pri-meiros Estados e economias nacionais capazes de se expandir para forade si mesmos e impor sua liderana ou hegemonia sobre os demais Esta-dos do sistema mundial.ORIGEM E EXPANSO DO PODER E DA ECONOMIA GLOBAISAo estudar a formao dos primeiros mercados nacionais euro-peus, no terceiro volume de Civilizao material, economia e capitalismo dossculos XV-XVIII, Fernand Braudel defende a tese de quea economia nacional umespao poltico que foi transformado pelo Estado,em virtude das necessidades e inovaes da vida material, num espao eco-nmico coerente, unificado, cujas atividades passaram a se desenvolver emconjunto numa mesma direo.E conclui que s a Inglaterra realizou essa faanha precocemente,mediante a revoluo que criou o mercado nacional ingls12. Oessencial nesse ponto que Braudel afirma que os primeiros mercadose economias nacionais, que nasceram na Europa, no foram uma obraespontnea ou expansiva da diviso do trabalho provocada pela ten-dncia dos indivduos troca de mercadorias: foram uma obra dopoder e uma estratgia poltica do Estado, que recortou e extraiu onovo espao econmico de um conjunto mais amplo e preexistente,que Braudel chamou de economia-mundo europia. Karl Marx des-creve esse mesmo momento do nascimento da economia nacionalinglesa no Captulo XXIV do Capital, em que trata do processo da acu-mulao originria:As diversas etapas da acumulao originria tiveram seu centro, por ordemcronolgica mais ou menos precisa, na Espanha, Portugal, Holanda, Frana eInglaterra. Mas foi na Inglaterra, em fins do sculo XVII, que esse processo seresumiu e sintetizou sistematicamente no sistema colonial, no sistema dadvida pblica, no moderno sistema tributrio e no sistema protecionista.Em grande medida, todos esses mtodos se baseiam na mais avassaladora dasforas. Todos eles se valem do poder do Estado.Nesse novo contexto econmico nacional, diz Marx,65 NOVOS ESTUDOS73 NOVEMBRO 200505_Fiori_60a73.qxd11/22/054:25 PMPage 65[13] Marx, Karl. El Capital. Mxico:Fondo de Cultura Econmica, 1980,pp. 638 e 685.a dvida pblica se converte numa das mais poderosas alavancas da acumula-o originria. Funciona como uma varinha mgica que infunde virtude pro-criadora ao dinheiro improdutivo e o converte em capital sem exp-lo aos ris-cos [...], como se fosse um capital chovido do cu13.A relao entre o Poder e o Dinheiro,ou entre prncipes e banqueiros, muito antiga e remonta s cidades do Norte da Itlia, onde nasce o sis-tema bancrio moderno, ligado ao comrcio de longa distncia e admi-nistrao das dvidas do Vaticano. Da vm os primeiros emprstimospara as guerras travadas pelos donos do poder, como Eduardo II daInglaterra, que no sculo XIV se endividou com a banca de Siena parafinanciar a tomada do Pas de Gales. Saiu vitorioso da guerra mas nopagou sua dvida, o que levou o sistema bancrio de Siena falncia etransferiu para Florena a hegemonia financeira da Itlia. Isso se repetiumuitas vezes, como na relao de Carlos V com os banqueiros alemesque financiaram a contnua expanso de suas guerras e territrios, at omomento em que ele decretou a moratria de 1557, responsvel pelafalncia da Casa dos Fugger.Mas o que Marx descreve no sculo XVII uma relao absoluta-mente diferente entre o poder e o dinheiro, que s foi possvel depois darevoluo econmica de que fala Braudel. Uma vez que a Inglaterravirou uma ilha e constituiu sua economia nacional, a relao entre osgovernantes e os banqueiros mudou de natureza. Nessa nova realidadeno mais se tratava de uma relao e de um endividamento pessoais doprncipe com uma casa bancria de qualquer nacionalidade: a relao deendividamento se dava entre o Estado e os bancos de uma mesma uni-dade territorial ou de uma mesma economia nacional. A dvida pblicatornou-se portanto interna, administrada por algum tipo precursor deBanco Central, e pde se transformar na base do sistema bancrio e decrdito da Inglaterra.Como conseqncia, nasce um interesse nacional ingls que simultaneamente econmico e poltico, e essa unidade se transformanuma fora propulsora gigantesca e sem equivalente na histria passadada acumulao do poder e da riqueza,uma fora que ultrapassar as fron-teiras nacionais da Inglaterra. Trata-se de um verdadeiro salto qualita-tivo na histria do poder, do dinheiro e do sistema mundial. Inicia-seento a escalada do poder nacional ingls na direo do poder global ouda hegemonia mundial.E essa expanso que criar as bases materiaisde uma nova economia mundial, diferente da economia-mundo deque fala Braudel, que ainda era organizada em torno das grandes cidadesmercantis da Itlia e do Norte da Europa.Na hora dessa revoluo, no entanto, a Inglaterra no estava s. Pelocontrrio, j existiam um sistema poltico e uma rede de Estados euro-peus que vinham se consolidando desde o sculo XIV mediante umasucesso quase infinita de conflitos que culminaram na Guerra dos 30Anos (1618-48), o verdadeiro bero das soberanias nacionais. Foi a Paz66 SOBRE O PODER GLOBAL Jos Lus Fiori05_Fiori_60a73.qxd11/22/054:25 PMPage 66de Vestflia, assinada em 1648, que consagrou o princpio da soberanianacional e gerou o sistema poltico-estatal europeu. Mas ao consa-grar o princpio da soberania criou um sistema de poder anrquico, noqual o exerccio do equilbrio de poder e a guerra se tornaram as duasformas conhecidas e possveis de resoluo dos conflitos entre os Esta-dos soberanos. Configurou-se, assim, uma forma primitiva de gover-nana supranacional.Portanto, o novo sistema estatal nasceu competitivo e movido pelapossibilidade permanente da guerra. nesse contexto que se deve com-preender a radicalizao do mercantilismo ingls praticado por Crom-well logo depois da revoluo de 1648. Naquele momento, criar umaeconomia nacional consistiu sobretudo numa estratgia de guerra deum pas inferiorizado frente ao poder econmico holands e ao podermilitar de Lus XIV. A partir da, e da exploso do poder ingls, todos osdemais Estados europeus tentaram repetir a mesma estratgia, de modoque se multiplicou o nmero das economias nacionais, mas sem omesmo sucesso dos ingleses.Em sntese, as primeiras economias nacionais nasceram como umaestratgia de guerra defensiva dos primeiros Estados territoriais europeuse depois se transformaram numa imposio do sistema poltico interesta-tal,cuja regra nmero um era a continuidade e a intensificao permanenteda competio poltico-militar entre seus Estados-membros.Como resul-tado, desde o incio o sistema poltico europeu esteve sob o controle com-partido ou competitivo de uns poucos Estados que impuseram aos demaissua liderana poltico-militar e econmica. Foram as grandes potncias,que nunca passaram de seis ou sete, que desde o incio se transformaramno ncleo dominante de todo o sistema. Na entrada do sculo XVIII,depois da decadncia de Portugal,Espanha,Sucia e Polnia,esse pequenoclube ficou restrito a Frana,Holanda,Inglaterra,Rssia,ustria e Prssia,delimitados em conjunto por suas fronteiras militarizadas com o ImprioOtomano.Mas mesmo entre esses pases j existia uma hierarquia,na quala Frana de Lus XIV se destacava ao lado da Holanda e da Inglaterra. Em1748 Frederico II da Prssia dizia, sem nenhum tipo de dvida, que aInglaterra e a Frana eram os poderes que determinavam o que aconteciana Europa. Por outro lado, a mobilidade dentro desse sistema sempre foimuito lenta e as barreiras entrada de novos scios criadas pelaspotncias ganhadoras sempre muito altas.Nesse ponto da histria pe-se uma questo terica decisiva para a dis-cusso do problema da governabilidade mundial: por que surge e semantm, ao longo da histria desse tipo de sistema poltico, a vontadeimperial de expanso dos Estados e economias nacionais que est naorigem de todas as guerras? O socilogo norte-americano Charles Tilly,um dos maiores pesquisadores da origem do sistema estatal, responde:Os europeus seguiram uma lgica padronizada de provocao da guerra: todoaquele que controlava meios substanciais de coero tentava garantir uma67 NOVOS ESTUDOS73 NOVEMBRO 200505_Fiori_60a73.qxd11/22/054:25 PMPage 67[14] Tilly, Charles. Coero, capital eEstados europeus. So Paulo: Unesp,1993, p. 127.[15] Elias, Norbert. O processo civiliza-dor. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Edi-tor, 1976, vol. 2.rea segura dentro da qual poderia desfrutar dos lucros da coero e mais umazona-tampo fortificada, para proteger a rea segura. Quando as potnciasadjacentes estavam perseguindo a mesma lgica, o resultado era a guerra14.Mas Tilly no explica por que os prncipes e Estados sentem a necessi-dade inicial de criao de suas primeiras zonas de segurana. Eleafirma que a guerra uma conseqncia inevitvel do processo de expan-so territorial dos Estados, mas tampouco explica a razo da prpriaexpanso. Apesar disso, no difcil entender que a criao das zonas-tampo responde a uma necessidade e a um sentimento defensivo e quea guerra no uma conseqncia da expanso territorial dos Estados,como pensa Tilly, mas a sua principal causa. A guerra no est no fim doprocesso de expanso territorial: est na sua prpria origem e acaba setransformando na sua primeira causa ou primeiro motor.Norbert Elias expe essa tese de forma extremamente clara no seuProcesso civilizador, como vimos na epgrafe deste texto. Em sntese, todagrande potncia estar sempre obrigada a seguir expandindo o seupoder, mesmo em perodos de paz. Em primeiro lugar porque a guerra uma possibilidade constante e inevitvel das relaes entre as grandespotncias; em segundo lugar porque ela s pode ser protelada pela con-quista ou acumulao de mais poder; e em terceiro lugar porque nessesistema, como sentenciou Elias, quem no sobe, cai15.Resumindo nosso ponto de vista, o sistema poltico e econmicomundial no foi produto de uma simples e progressiva somatria de ter-ritrios, mercados, pases e regies. Historicamente, foi uma criao dopoder: do poder expansivo e conquistador de alguns Estados/economiasnacionais europeus que durante o sculo XVII se transformaram nopequeno grupo das grandes potncias. At o sculo XIX o sistema mun-dial se restringia quase que exclusivamente aos Estados europeus, aosquais se agregaram,no sculo XIX,os novos Estados independentes ame-ricanos. Mas foi s na primeira metade do sculo XX que o sistema incor-porou no seu ncleo central duas potncias expansivas extra-euro-pias,os Estados Unidos e o Japo,um pouco antes que o Estado nacionalse generalizasse,j na segunda metade do sculo XX,como a forma domi-nante de organizao do poder poltico territorial atravs do mundo.Alm disso, do nosso ponto de vista, o sistema mundial no existiriana sua forma atual caso no tivesse ocorrido na Europa um casamentoentre os Estados e as economias nacionais. E a partir desse momento oque muitas vezes se chama de globalizao o processo e o resultadode uma competio secular entre esses Estados/economias nacionais. Ahierarquia, a competio e a guerra dentro do ncleo central do sistemamundial marcaram o ritmo e a tendncia do conjunto na direo de umimprio ou Estado universal e de uma economia global. Mas esse movi-mento no tem nada a ver com o avano de uma espcie de razo hege-liana de natureza global e convergente. Ao contrrio, um movimentoque avana sempre liderado por algum Estado/economia nacional em68 SOBRE O PODER GLOBAL Jos Lus Fiori05_Fiori_60a73.qxd11/22/054:25 PMPage 68[16]Kissinger, 2001, p. 84.particular. Por isso mesmo nunca se completa, j que sempre acaba sedeparando com a resistncia das demais vocaes imperiais do sis-tema. Os ganhadores transitrios dessa competio sempre foram osque conseguiram chegar mais longe e garantir de forma mais perma-nente o controle de territrios polticos e econmicos supranacionais,mantidos na forma de colnias, domnios ou periferias independentes,mas pouco soberanas.Contudo,s duas das grandes potncias lograramimpor o seu poder e expandir as fronteiras de suas economias nacionaisat quase o limite da constituio de um imprio mundial: a Inglaterra eos Estados Unidos.Esse processo deu um passo enorme depois da gene-ralizao do padro-ouro e da desregulao financeira promovida pelaInglaterra na dcada de 1870. E deu outro passo gigantesco depois dageneralizao do padro dlar flexvel e da desregulao financeirapromovida pelos Estados Unidos a partir da dcada de 1970.POSSIBILIDADES E LIMITES DE UMA GOVERNANA MUNDIALPara discutir as possibilidades reais de governana desse sistemamundial que estamos examinando, necessrio partir das premissastericas acima apresentadas para poder analisar melhor a experinciahistrica conhecida. Como vimos, trata-se de um sistema movido porduas foras poltico-econmicas contraditrias. Por um lado atua a ten-dncia na direo de um imprio ou Estado universal, que no tem nadaa ver com o sonho federativo e cosmopolita de Kant: seria sempre umimprio imposto por um Estado aos demais Estados nacionais. E nessecaso o projeto da governana coletiva teria de enfrentar o problema deque os imprios no tm interesse em operar dentro de um sistemainternacional; eles aspiram a ser o prprio sistema internacional16. Poroutro lado, porm, o sistema mundial sempre contou com uma contra-tendncia aos projetos imperiais que aponta na direo da anarquiacriada pela Paz de Vestflia e de sua recusa a qualquer tipo de poder supe-rior s soberanias nacionais. Mas a experincia histrica ensina que seno houve imprio mundial tampouco houve caos, porque o sistema sehierarquizou e criou,na prtica,vrias formas individuais ou coletivas degesto supranacional da paz, da guerra e da economia. Formas de gestoimperfeitas e transitrias, quase sempre atropeladas e destrudas pornovos impulsos da tendncia imperial. no mbito dessa dinmica contraditria do sistema mundial quese deve pensar o que foi, ou possa ser, uma situao de hegemonia e degovernabilidade globais. Um hegemon no pode ser nem nunca ser ape-nas um gerente funcional, nem tampouco uma forma ou funo institu-cional que possa ser ocupada por qualquer tipo de governante coletivo.Ao contrrio, a hegemonia mundial foi e sempre ser uma posio depoder disputada e transitria, e nunca ser o resultado de um consensoou de uma eleio democrtica. A posio hegemnica, portanto umaconquista, uma vitria do Estado mais poderoso num determinado69 NOVOS ESTUDOS73 NOVEMBRO 200505_Fiori_60a73.qxd11/22/054:25 PMPage 69[17] Strange, op. cit.momento, e nesse sentido ao mesmo tempo um ponto na curvaascendente desse Estado rumo ao imprio mundial. um tpico pontode passagem, um momento de negociao ou um movimento tticoimposto pela estratgia ascensional dos candidatos ao imprio global.Mas foi quando ocuparam essa posio transitria que os pases hege-mnicos puderam exercer as funes de um governo global, mais oumenos favorveis ao desenvolvimento econmico e poltico dos demaismembros do sistema.Por outro lado, na histria do sistema mundial s houve hegemoniade fato quando ocorreu coincidncia ou convergncia dos interesses evalores da potncia ascendente com os das demais grandes potnciastransitoriamente derrotadas ou superadas pela escalada imperial dosdois nicos grandes vitoriosos dessa histria: a Inglaterra e os EstadosUnidos. S nos momentos excepcionais em que se deu essa convergn-cia que se pode ao mesmo tempo falar de hegemonia e pensar na pos-sibilidade da existncia eficaz de regimes internacionais capazes de sus-tentar ou regular algum tipo de governana mundial. Assim, s se podefalar de uma verdadeira hegemonia mundial em dois momentos da his-tria do sistema moderno:entre 1870 e 1900 e entre 1945 e 1973.E foi snesses momentos de convergncia e harmonia de interesses que even-tualmente existiram regimes internacionais e instituies multilate-rais eficazes. Fora dessas circunstncias na ausncia de harmonia econvergncia de interesses entre as grandes potncias , a governanamundial suporia a existncia de um nico sistema poltico, em que asdivergncias pudessem ser resolvidas democraticamente. Mas no sis-tema mundial em que vivemos a nica possibilidade de existncia deuma jurisdio poltica unificada seria sob a gide de um imprio global,que , por definio, o oposto de um sistema internacional.Mesmo assim, a cooperao mantida entre as grandes potnciasnesses dois nicos perodos hegemnicos da histria baseou-se emsituaes objetivas, regras e instituies completamente diferentes. Nocaso da hegemonia inglesa no existiram regimes nem instituies mul-tilaterais ou supranacionais, e a cooperao resultou das prprias carac-tersticas da Inglaterra, que tinha uma economia extremamente aberta edependente do seu comrcio externo. E a prpria estabilidade da librasempre dependeu dos supervits obtidos pela economia colonial dandia e da cooperao dos bancos centrais da Frana e Alemanha. O sis-tema monetrio internacional baseado na moeda inglesa no foi objetode nenhum tipo de acordo ou regime monetrio pactuado entre as gran-des potncias. Ao contrrio, foi um sistema que nasceu da adeso pro-gressiva dos demais Estados/economias europeus, obrigados a utilizara libra nas suas novas investidas comerciais e imperiais sobre ummundo que j era territrio econmico ingls. Foi um perodo em quea coordenao mundial da Inglaterra foi feita sem regimes ou institui-es multilaterais, apenas com o uso dos poderes estruturais de quedispunha a Inglaterra e de que fala Susan Strange17.70 SOBRE O PODER GLOBAL Jos Lus Fiori05_Fiori_60a73.qxd11/22/054:25 PMPage 70Em toda a histria do sistema mundial moderno, o nico perodoem que foi tentado o exerccio de uma governana global,com base numsistema de regimes e instituies supranacionais, foi entre 1945 e 1973,durante a hegemonia dos Estados Unidos, conquistada com a vitria naII Guerra Mundial. Mas ainda assim preciso lembrar que vrios dessesregimes e instituies concebidos na primeira hora da vitria militarjamais se concretizaram, como no caso da Organizao Mundial doComrcio e da prpria implementao de alguns dos acordos de BrettonWoods. Na verdade, a economia norte-americana sempre foi fechada, aocontrrio da inglesa; s na segunda metade do sculo XX que ela acele-rou seu processo de globalizao,na hora em que os Estados Unidos exer-ceram seu poder poltico para organizar uma ordem mundial, na qual acooperao e a convergncia entre os principais pases capitalistas sedeveram muito mais ameaa da Guerra Fria e ao medo da mobilizaodas grandes massas insatisfeitas, dentro e fora da Europa, do que opopor um regime democrtico de governana internacional.A partir dos anos 1980 os Estados Unidos abandonaram o sistemamonetrio internacional pactuado em Bretton Woods, e o fim desseregime monetrio no levou o sistema a nenhuma crise terminal. Pelocontrrio, destravou a vocao imperial dos Estados Unidos, que desdeento acumulam contnuos ganhos de poder com o novo sistema mone-trio dlar flexvel. E com o desaparecimento do regime geopolticobipolar em 1991 desapareceu tambm a base tico-ideolgica em que sefundara a cooperao entre as grandes potncias capitalistas. A dcadade 1990 talvez tenha sido o momento da histria em que o sistema mun-dial chegou mais perto do seu limite imperial, dos pontos de vista pol-tico, econmico e ideolgico. Mas desde 2000 estamos assistindo rapidssima reverso desse processo e volta da outra tendncia do sis-tema:a tendncia anarquia.O que parecia ter sido a vitria final do libe-ralismo anglo-saxo foi cedendo lugar, uma vez mais, defesa dos inte-resses nacionais e das zonas de influncia de cada uma das grandespotncias. O que parecia ter sido uma vitria quase religiosa do libera-lismo foi, de fato, o fim de uma era quase religiosa e a volta ao mundonu e cru das soberanias e dos interesses nacionais. Por outro lado, des-de a dcada de 1980, mas em particular nos anos de 1990, desapareceucompletamente a convergncia de interesses econmicos entre as gran-des potncias. Nesse perodo a economia norte-americana cresceude forma quase contnua, enquanto as economias das demais potn-cias estagnaram e a possibilidade de mobilidade da periferia dentro dosistema ficou praticamente reduzida aos casos da ndia e da China, doispases que questionam potencialmente a liderana norte-americana.Sob todos os pontos de vista, o mundo nunca esteve to longe dequalquer coisa que se possa chamar de hegemonia ou ordem mundial. Apotncia imperial do momento defende h duas dcadas a desregulaode todos os mercados e sistemas de comunicao, energia e transportes.E vem abandonando sucessivamente todos os acordos,compromissos e71 NOVOS ESTUDOS73 NOVEMBRO 200505_Fiori_60a73.qxd11/22/054:25 PMPage 71[18]Ferguson, Nial. Thecashnexus.Londres:Penguin Books,2001,p.416.regimes internacionais que afetem sua capacidade de ao unilateral.Sua moeda agora rigorosamente universal e no obedece a nenhumregime, apenas s decises soberanas do FED. Sua economia nacionalconquistou espaos fundamentais na direo da globalizao da suamoeda,dvida e sistema de tributao.Mas ao mesmo tempo estilhaou-se o apoio sua liderana moral-internacional, e cada uma das grandespotncias se dedica hoje a recolher os cacos e a redefinir seus interes-ses e espaos de influncia, de costas para os Estados Unidos.Nesse cenrio internacional, a idia ou projeto de uma governanamundial mantm a beleza tica kantiana e segue sendo uma bandeira ouutopia poltica vlida, mas no uma realidade provvel. Sua existncia,quase impossvel neste momento, no pode servir de base para nenhumtipo de clculo estratgico durante a prxima dcada talvez durante asprximas. A menos que seja o caso da governabilidade mundial preconi-zada pelos conservadores, como Nial Ferguson, professor de Harvard eum dos mais festejados historiadores britnicos contemporneos:Em vez de se retrair como um caramujo dentro de uma concha eletrnica, osEstados Unidos deveriam se devotar a uma participao mais ampla. Assimcomo o livre-comrcio,isso no ocorre naturalmente,mas requer slidos alicer-ces institucionais de lei e ordem.O papel que cabe aos Estados Unidos como umimprio estabelecer essas instituies onde elas no existam, se necessrio como na Alemanha e no Japo em 1945 com uso de fora militar18.A mesma utopia e o mesmo projeto liberal dos fisiocratas franceses dosculo XVII, que tambm achavam que o bom funcionamento de umaeconomia de mercado requereria uma governana tirnica que elimi-nasse os conflitos da vida poltica. Mas de preferncia um tirano quefosse economista, liberal e fisiocrata.Jos Lus Fiori cientista poltico e professor titular do Instituto de Economia da UFRJ.72 SOBRE O PODER GLOBAL Jos Lus FioriRecebido para publicao em 2 de setembro de 2005.NOVOS ESTUDOSCEBRAP73, novembro 2005pp. 61-7205_Fiori_60a73.qxd11/22/054:25 PMPage 7205_Fiori_60a73.qxd11/22/054:25 PMPage 73