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Nacionalismo e Conflitos tnicos no Cucaso
Subverso e colapso do Estado na Transcaucsia Czarista e Sovitica (1830-1991)
Joo Pedro Teixeira Romo Sequeira
Orientador: Professor Doutor lvaro Correia de Nbrega
Aos Povos do Cucaso Pintura de Dmitry Stakhievich Moor 1921.
Dissertao para obteno de grau de Mestre
Em Estratgia
JUNHO 2014
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Nacionalismo e Conflitos tnicos no Cucaso
Subverso e Colapso do Estado na Transcaucsia Czarista e Sovitica
(1830-1991)
Joo Pedro Teixeira Romo Sequeira
Dissertao para a obteno do Grau de Mestre em Estratgia
Orientador: Professor Doutor lvaro Lus Correia de Nbrega
Junho 2014
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i
"The Soviet State modernized, terrorised, and Russified
the Caucasus but also gave it new kinds of nationalism."1
1 Cf. Waal, Thomas De, The Caucasus: An Introduction, Oxford University Press, Londres, 2010. p.107.
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ii
RESUMO
Esta dissertao considera as questes fundamentais suscitadas pelo nacionalismo e
pelos problemas tnicos na Transcaucsia Czarista e Sovitica entre 1830 e 1991, que em
ltima anlise podero ter fomentado a queda do regime sovitico nesta regio. Procede-se
inicialmente a uma anlise histrica do Cucaso at sua anexao total pelas tropas russas
no sculo XVIII com o intuito de procurar a origem dos conflitos tnicos existentes nesta
regio um dia apelidada como Jabal al-sun, as montanhas das lnguas. Posteriormente a
dissertao aborda a criao e russificao do Cucaso czarista que antecede a sovietizao
da mesma regio que tambm analisada numa perspectiva do estudo da relao entre as
polticas operadas pelos soviticos na regio e o desencadear de sentimentos nacionalistas
que conduziram emancipao dos povos no-russos cujo mpeto poder ter sido talvez
maior do que qualquer estratgia de subverso deliberada ao regime sovitico. Por ltimo o
texto centra-se no binmio existente entre a crise do comunismo e o ressurgir do
nacionalismo cujos conceitos acrescem do quadro das j turbulentas relaes existentes
entre eles, pondo em causa a argumentao da nomenklatura sovitica que afirmava a
erradicao dos conflitos entre as muitas nacionalidades da URSS que se prova terem sido
apenas silenciadas durante 70 anos custa do uso da fora tendo posteriormente
reemergido custa da reduo das polticas de presso operada durante a Perestroika,
tendo um papel preponderante na formao dos movimentos populares nacionalistas e
independentistas emergentes.
Palavras-chave
Transcaucsia Rssia Imperial Unio Sovitica Armnia Gergia Azerbaijo
Nacionalismo Subverso do Estado Conflitos tnicos no Cucaso Russificao
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iii
ABSTRACT
This thesis seeks to address various fundamental questions raised by nationalistic and
ethnical issues in the Tsarist and Soviet Transcaucasia between 1830 and 1991 that could
have a decisive impact in the fall of the Soviet regime in this region. The text provides a
historical analysis of the Caucasus region until the Russian conquest in the XVIII century,
aiming to explore the origins of the ethnic conflicts in this region that used to be called jabal
al-sun, the mountain of languages. Primarily the thesis approaches the Tsarist state-building
of the Caucasus that precedes the Soviet state building in the same region that is
subsequently studied focusing on the relation among the Soviet politics in this region and
the triggering of the sense of nationalism that may have empowered the emancipation of
the non-Russian peoples whose urges maybe have outstanded any other deliberated
subversion strategy against the Soviet regime. The last section explores the binomial relation
among the crisis of the communism and the resurgence of the nationalism whose concepts
emerge in the frame of the turbulent relations between them, jeopardizing the Soviet
nomenklaturas reasoning of the ethnical conflicts elimination. That proves that those
conflicts were not but silenced during 70 years by the usage of Soviet repression force since
they suddenly reemerge as soon as those repression measures were slightly slackened
during the perestroika period, all claiming an important role in arising the popular
nationalism and independence movements.
KEYWORDS
Transcaucasia Russian Empire Soviet Union Armenia Georgia Azerbaijan
Nationalism Subversion of State Power Ethnic Conflicts in the Caucasus Russification
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1
NDICE
LISTA DE SIGLAS ........................................................................................................ 3
INTRODUO .............................................................................................................. 4
1. O Problema de Pesquisa ........................................................................................ 4
2. Questes de Investigao e Objectivos ................................................................. 6
3. Metodologia de Investigao .................................................................................. 6
4. Conceitos Operacionais ......................................................................................... 9
4.1. Estado, Nao, Nacionalismo e Etnicidade ...................................................... 9
4.2. Conceito de Subverso .................................................................................... 15
4.3. Estratgia de Subverso de um Estado ........................................................... 16
CAPTULO PRIMEIRO
A HERANA HISTRICA DO CUCASO
1. As Montanhas das Lnguas .................................................................................. 19
2. O Bero da Civilizao ......................................................................................... 22
2.1. Entre a Grcia e a Prsia As Satrapias do Cucaso .................................. 24
2.2. A Civilizao Romana As Provincias Romanas do Cucaso ...................... 25
2.3. O Califado Abssida Chegada de Uma Nova F ........................................ 27
2.4. As Invases Mongis A Nova Rota da Seda .............................................. 32
2.5. As Invases Timridas A F Pela Fora da Espada ................................... 34
2.6. Luta entre Otomanos e Persas O Novo Jogo ............................................. 38
2.7. A Conquista Russa do Cucaso A Russificao ......................................... 39
CAPTULO SEGUNDO
CRIAO E RUSSIFICAO DO CUCASO CZARISTA
1. Russificao e Impacto nas Culturas da Transcaucsia ........................................ 47
2. A Diversidade tnica e a Industrializao .............................................................. 51
3. O Emergir dos Nacionalismos e a Queda do Czarismo ......................................... 55
4. A I Guerra Mundial, a Revoluo Russa e o Fim do Czarismo no Cucaso .......... 59
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CAPTULO TERCEIRO
CRIAO E SOVIETIZAO DO CUCASO
1. A Criao da Transcaucsia Sovitica ................................................................... 66
2. A Construo de uma Ordem Socialista no Cucaso ............................................ 71
3. Korenizatsiya vs Russificao ................................................................................ 75
4. O Impacto da Sovietizao na Transcaucsia ....................................................... 77
5. A Diversidade tnica e o Fracasso das Polticas de Integrao ............................ 83
6. O Crescimento do Nacionalismo e a Mudana Poltica da URSS no Cucaso ..... 88
CAPTULO QUARTO
A CRISE DO COMUNISMO E O RESSURGIR DO NACIONALISMO
1. Estado e Nao na URSS ...................................................................................... 92
2. A Crise Estrutural do Estado Sovitico ................................................................... 94
3. Os Movimentos Nacionalistas e a sua Contribuio para o Colapso Sovitico ..... 96
4. A Poltica de Represso Sovitica ......................................................................... 98
5. A Glasnost, a Perestroika e o Enfraquecimento Sovitico no Cucaso ................. 100
6. O Nacionalismo como Estratgia de Subverso do Estado ................................... 102
7. A Ecloso do Conflito do Alto Carabaque .............................................................. 106
8. A Ascenso do Nacionalismo e o Colapso da URSS na Transcaucsia ............... 110
8.1. Armnia ............................................................................................................ 110
8.2. Azerbaijo ......................................................................................................... 114
8.3. Gergia ............................................................................................................. 117
CONSIDERAES FINAIS ......................................................................................... 120
BIBLIOGRAFIA ............................................................................................................. 125
NDICE DE ANEXOS .................................................................................................... 133
ANEXOS ........................................................................................................................ 134
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SIGLAS UTILIZADAS
CUP Comit de Unio e Progresso, Comit Otomano (1890-1918)
Guberniia Subdiviso territorial do Imprio Russo sob responsabilidade de um governador.
KGB Polcia Secreta do Estado Sovitico1
OA Oblast Autnomo, territrio administrativo sovitico designado para pequenos grupos
tnicos , muitas vezes parte de uma maior unidade territorial (RSS) A sub-unidade de Oblast
o Raion.
OE Oramento de Estado
RDA Repblica Democrtica Alem
RFA Repblica Federal da Alemanha
RSS Repblica Socialista Sovitica
RSSA Repblica Socialista Sovitica Autnoma, unidade territorial nacional com um
estatuto reduzido quando comparada com um RSS, mas com mais direitos do que um OA.
URSS Unio das Repblicas Socialistas Soviticas.
USD Dlar Americano2
1 Komityet Gosudarstvennoy Bezopasnosty, em lngua russa.
2 United States Dollar, em lngua inglesa.
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4
INTRODUO
1. Problema da Pesquisa
Em meados dos anos oitenta era quase inimaginvel que no final dessa mesma dcada
passassem a existir quinze novos Estados em lugar da URSS. Mas o colapso da URSS acabou
por registar-se extinguindo-se assim a arquitectura geopoltica dominante durante a maior
parte do sculo XX, num processo que conduziu o mundo ao fim da Guerra-fria que o vinha
dividindo desde o ps-guerra da II Guerra Mundial.
A URSS foi uma superpotncia nuclear com 74 anos de existncia durante os quais passou
por duas guerras mundiais, mas no deixou de ser um regime ditatorial terrvel em que
foram aniquilados milhares de Soviticos, condio de carcter essencial para uma complexa
revoluo social cujos ideais polticos foram capazes de inspirar milhes de pessoas no
mundo inteiro. Ora, posto isto, como acabou a URSS por entrar em colapso chegando
mesmo ao ponto da desintegrao?
O fim da URSS deve-se a variados factores, sendo que o factor econmico potenciado
pela desastrosa situao financeira do pas aps vrios anos a despender fundos numa
corrida desenfreada ao armamento, pelo menos at ao desastre de Chernobil, o mais
consensual. Porm o facto dos Comunistas terem herdado, aps a Revoluo Bolchevique,
um Estado criado pela expanso Czarista durante quase quatro sculos, perodo durante o
qual um grande nmero de naes foi anexada e russificada fora, leva a que esta
dissertao no pretenda focar-se tanto na aco de Mikhail Gorbachov, como chave de
todo o processo que levou ao fim da Unio Sovitica, mas no papel dos conflitos tnicos
internos da URSS, principalmente na regio do Cucaso, e na sua consequente contribuio
para a subverso do estado e posterior desintegrao do regime Sovitico.3
Assim, a necessidade de entendimento e interpretao patente na abordagem qualitativa
gerou a pergunta de pesquisa - Foram o nacionalismo e os conflitos tnicos uma estratgia
de subverso ao estado Sovitico na Transcaucsia? que automaticamente fez com que o
objecto de estudo se debruce o nacionalismo e os conflitos tnicos na Transcaucsia,
apoiado numa vasta investigao documental acerca de se os mesmos tero ou no
3 Cf. Katsiaficas, George, The Subversion of Politics: European Autonomous Social Movements and the Decolonization of Everyday Life, Humanities Press International, Nova Jrsia, 2006. p.13.
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5
fomentado a perda de influncia e posterior colapso do regime sovitico na regio
supracitada.
A natureza subjectiva e complexa que estimula a interpretao e a induo do
investigador, to caracterstica na abordagem qualitativa, fez com que partida para a
realizao deste trabalho a formulao das hipteses de resposta fossem as seguintes:
Sim porque foram o principal veculo de fomento do dio contra o regime sovitico e o
colonizador russo.
Sim porque contriburam para o desenvolvimento de uma conscincia verdadeiramente
nacionalista
Sim porque potenciaram uma ambio legtima dos lderes das repblicas soviticas da
Transcaucsia em assumir o destino das suas naes em detrimento do colonizador russo
Sim porque criam focos de instabilidade e conflito na Unio Sovitica
Sim porque foram os conflitos inter-tnicos os principais elementos causadores da ecloso
do Conflito no Alto Carabaque, que muito enfraqueceu o poder Sovitico na regio
Sim por em ltima anlise muito contriburam para o golpe de Estado em Moscovo que
causou o final da URSS.
Sim porque foram os principais elementos que proporcionaram a independncia das novas
naes que agora existem no espao ps Sovitico da Transcaucsia.
De referir que a situacionalidade das hipteses de resposta supracitadas, que se cingem a
respostas positivas no que concerne responsabilidade do nacionalismo e dos conflitos
tnicos na Transcaucsia terem sido elementos fulcrais na subverso ao Estado Russo e
Sovitico na Transcaucsia.
Quanto delimitao do mbito cronolgico tornou-se apropriado escolher como balizas
temporais as datas de 1830 de 1991. O ano de 1830, sendo a data do trmino da guerra
russo-circassiana, remete-nos para a conquista do Cucaso pelo Imprio Russo que de
acordo com Mackinder, possibilitou a sua afirmao como um emergente estado pivot
assente num quadro geogrfico nico de dualismo asitico-europeu.4 A segunda data,
4 Para H.J. Mackinder a realidade geogrfica assenta nas vantagens da centralidade do lugar e na capacidade e eficincia no que concerne ao movimento de ideias, bens e pessoas. Em 1904 ele teorizou que a rea interior da Eursia, caracterizada pelo seu interior frio e isolado e impenetrvel por mar era a rea pivot da politica mundial cujo controlo poderia ser a base para o domnio mundial. Vide; Mackinder, Sir Halford John, Democratic Ideals and Reality: A Study in the Politics of Reconstruction, H. Holt, Londres, 1919.
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prende-se com a ocorrncia do Golpe de Estado no ms de Agosto de 1991 em Moscovo,
que em ltima anlise se revelou bastante importante para os movimentos de
independncia das repblicas Soviticas ao abalar decisivamente as foras conservadoras
soviticas conduzindo depois queda da URSS.
2. Questes de Investigao e Objectivos
Alm do superior interesse do objecto de estudo, pouco explorado na bibliografia
portuguesa, at pela anlise da formulao das hipteses de resposta que datam de quando
se ponderou a realizao do presente trabalho torna-se notrio que os objectivos do mesmo
tero de passar pela pesquisa e investigao de temas que se prendem com a construo de
identidades nacionais e religiosas no espao em estudo, a Transcaucsia Sovitica. Tendo
sempre porm presente a necessidade de investigao da relao da construo das
identidades nacionais referidas com a opresso de que eram vtimas os povos nativos que
poucas semelhanas partilhavam com os colonos russos quer em termos de cultura, religio
e tambm de idioma.
Concluindo que houve de facto a criao de sentimentos nacionalistas fomentados pela
opresso das polticas de assimilao Russas e posteriormente Soviticas, torna-se de
carcter essencial que este trabalho se foque no estudo da interaco entre os sentimentos
nacionalistas nos diversos grupos tnicos da Transcaucsia e as manobras subversivas, sem
precedentes no interior das fronteiras soviticas, que conduziram a uma perda de influncia
da Rssia e posteriormente da URSS na regio em estudo. S assim se cr ser possvel
estimular o desenvolvimento de novas compreenses sobre o emergir de um verdadeiro
mpeto independentista nas Repblicas Soviticas situadas na Transcaucsia Sovitica, que,
em ltima anlise, levou os seus dirigentes a rejeitar a autoridade central completa,
proposta por Moscovo.
3. Metodologia de Investigao
Apesar da inacessibilidade das fontes primrias patrocinada pela distncia geogrfica das
mesmas, mesmo tendo o autor vivenciado um perodo longo de observao de um
fenmeno ps queda do Muro de Berlim, na Albnia, pas que experienciou um regime
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Comunista, embora com contornos muito singulares e por isso diferentes da regio em
estudo, apraz-se dizer que a especificidade e a dificuldade do estudo sobre o nacionalismo
justifica uma anlise qualitativa e tendencialmente descritiva na qual o seu autor procura
aprofundar a compreenso dos fenmenos em estudo nacionalismo, etnicidade, conflitos
tnicos, e, subverso do estado interpretando-os luz de estudos realizados por outros
autores sem ter a principal preocupao com a representatividade numrica bem como
generalizaes estatsticas conforme requerido pela perspectiva de anlise quantitativa.5
Assim, o modelo de investigao seguido foi um modelo qualitativo atravs da pesquisa
bibliogrfica e da anlise documental que se centrou na abordagem multidisciplinar
privilegiando a Histria da regio do Cucaso e dos seus povos, que se justifica porque os
conflitos tnicos no Cucaso, localizado entre a Europa e a sia, e desde sempre uma
posio estratgica, podem explicar-se recorrendo antiga histria desta regio que se
estende desde as estepes russas at ao deserto persa. Dito isto, a abordagem
multidisciplinar supracitada foi assente numa perspectiva Histrico-Antropolgica,
Sociolgica, Poltica, e tambm Econmica, no seguimento da base do mtodo qualitativo
que nos ltimos 30 anos vem ganhando uma inequvoca valorizao no que concerne
pesquisa em cincias sociais.6
A abundncia de literatura anglo-saxnica sobre este assunto vasta e por isso
contrastante com a pouca explorao que o tema merece pela historiografia nacional, e at
mesmo no que concerne a tradues para lngua Portuguesa. Assim, aps uma inventariao
global seleccionou-se um conjunto de obras maioritariamente em lngua inglesa, francesa e
espanhola, desde obras acadmicas at memrias e dirios de personalidades polticas
associadas ao objecto de estudo, delineou-se uma estrutura narrativa com elementos
analticos adequados ao objecto de estudo, organizada cronologicamente ao longo dos
diversos captulos embora alguns temas pudessem beneficiar em ser analisados
autonomamente (por exemplo a questo do conflito do Alto Carabaque, entre outras).
5 Entre as pessoas que iniciam um projecto de pesquisa, havia uma histria que nenhum bom pesquisador qualitativo deveria sujar as suas mos com nmeros. s vezes esse sentimento apoiado por criticas profundas da base lgica subjacente a algumas anlises quantitativas in Silverman, David, Interpretao de Dados Qualitativos: Mtodos para Anlise de Entrevistas, Textos e Interaes, Bookman, Porto Alegre, 2009, p.58.
6 A pesquisa qualitativa (...) um guarda-chuva que abriga uma srie de tcnicas de interpretao que procuram descrever, descodificar, traduzir, e qualquer outro termo relacionado com o entendimento e no com a frequncia de ocorrncia das variveis de determinado fenmeno in Cauchick, Paulo, Costa,Srgio, e Fleury, Afonso, Metodologia de Pesquisa, Elsevier Brasil, Rio de Janeiro, p.53.
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Uma das preocupaes fundamentais durante a investigao relacionou-se com a
formulao de um critrio de pluralismo no que concerne data de publicao, antes ou
depois do final da URSS, da bibliografia e documentao utilizadas. Este critrio prendeu-se
com o facto da bibliografia ser limitada tanto pela censura ou influenciada pela propaganda,
no caso de obras oriundas da URSS, como pela dificuldade do acesso informao caso se
tratem de obras oriundas de pases externos URSS.
Como instrumento de investigao o autor interpretou luz de uma reviso de literatura e
da anlise documental de diferentes teses que abordavam o facto da URSS algum dia poder
vir a desintegrar-se devido aos seus problemas internos, nomeadamente a debilidade
econmica que assolava o Estado Sovitico, o ascendente muulmano e os crescentes
problemas tnicos na sia Central e na Eursia,7 considerando que mesmo assim, a
desintegrao da Unio Sovitica acabou por constituir um dos momentos mais
imprevisveis de toda a histria aps ter sobrevivido durante anos a vrias guerras-civis bem
como ao isolamento internacional.8 Prova disso, que, tanto os analistas ocidentais como
Soviticos previam que ao longo do tempo, as diferenas nacionais entre os povos da URSS
iriam diminuir, o que conduziria assimilao dos grupos tnicos mais pequenos pela grande
massa russa.9
Contudo a percepo do autor luz da identificao, explorao e interpretao dos
fenmenos estudados e formulados conceitualmente acerca das situaes vividas
nomeadamente no Cucaso vieram ao longo do estudo a desmentir a perspectiva da
primeira da anlise dos dados. Justificando por isso o facto de este trabalho incidir sobre o
estudo do nacionalismo e dos conflitos tnicos no Cucaso como principal estratgia de
subverso operada na Transcaucsia Czarista e Sovitica entre os anos de 1830 e 1991, que
culminou, na independncia da Armnia, Azerbaijo e Gergia.
7 () Os peritos ocidentais tinham sido inquiridos em 1987 acerca de um eventual colapso da URSS e a opinio unnime registada era a de que essa situao constitua uma hiptese muito improvvel, seno mesmo impossvel () todavia houve alguns peritos que admitiam pensar na hiptese de um eventual colapso do regime Sovitico in Beissinger, Mark R., Nationalism Mobilization and the Collapse of the Soviet State: a tidal approach to the study of nationalism, Cambridge University Press, Cambridge, 2002, p.2.
8 Cf. Kissinger, Henry, Diplomacy, Simon & Schuster, Nova Iorque, 1994. pp.762-763.
9 O mtodo qualitativo pode imprimir a sua subjectividade na anlise dos resultados impedindo a sua replicao uma vez que outro pesquisador no observar necessariamente os mesmos aspectos do pesquisador original in Fonseca, Regina Clia Veiga da, Metodologia Do Trabalho Cientfico, IESDE Brasil SA, Curitiba, 2011. pp.35-36.
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4. Conceitos Operacionais
Do latim conceptus, de concipere, o mesmo que cumcaptare, o conceito uma unidade
de pensamento que exprime um termo cujos significados so declarados por definies,
apenas servindo de referncia, os conceitos nunca so verdadeiros nem falsos, mas apenas
mais ou menos teis.10 No entanto, tratando-se de conceitos operacionais deve citar-se
Adriano Moreira:
Os conceitos operacionais parecem de uma utilidade inegvel, como instrumento de
arrumo e sistematizao da realidade observada, mas a sua natureza convencional no pode
ser esquecida, a margem de arbitrariedade do investigador tem como limite a utilidade
metodolgica.11
Como tal, numa tentativa de operacionalizar o quadro terico-conceptual de forma a
limit-lo dentro de definies optou-se primeiramente por integrar nesta seco alguns dos
conceitos operacionais mais dominantes que embora requeiram uma certa elasticidade mes-
mo nessas definies, em virtude de serem permanentemente citados ao longo da
dissertao carecem de ser aqui explicitados de forma a facilitar a articulao da estrutura
da dissertao com os assuntos que sero posteriormente tratados.
4.1. Conceitos de Estado, Nao, Nacionalismo e Etnicidade
Etimologicamente, nao deriva do latim natione, do verbo nasci que significa nascer e
por extenso ter a origem, provir, comear.12 Mas o conceito de Nao passou a ser uma
importante componente poltica aps o sculo XVIII na sequncia da luta poltica que
caracterizou o perodo da Revoluo Francesa.13 Embora, segundo Kant, conceito seja toda a
10 Vide; Centro de Estudos do Pensamento Poltico;
Disponvel em: http://www.cepp.iscsp.utl.pt [Consultado dia 11 de Junho de 2014 s 13:00]
11 Cf. Moreira, Adriano, Enciclopdia POLIS, vol 1, col.s 1061-1065
12 Cf. Machado, Jos Pedro, Dicionrio Etimolgico da Lngua Portuguesa (com a mais antiga documentao escrita e conhecida de muitos dos vocbulos estudados), 3 vols, Editorial Confluncia/ Livros Horizonte), Lisboa, 1967, vol.II, pp.1639-1640, Apud Graa, Pedro Borges, A Construo da Nao em frica, Almedina, Coimbra, 2005.p.20.
13 Vide; Maltez, Jos Adelino, Princpios de Cincia Poltica Introduo Teoria Poltica, Instituto Superior de Cincias Sociais e Polticas, Lisboa, 1996, p.396.
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noo que geral, sem ser absoluta, foi o conceito de Nao que passou a ser a frmula
legitimadora do acesso do Povo ao Poder ao viabilizar e proporcionar uma nova frmula de
controlo do Estado com base num conceito objectivo de Povo enquanto Nao, um conjunto
maioritrio de indivduos reconhecidos como tendo em comum o facto de pertencerem
mesma realidade geo-histrica, reclamando por isso a deteno do Poder Poltico em
oposio natureza transnacional das casas reais reinantes.14
De acordo com a noo Ocidental de Nao, existem quatro elementos que so
considerados como sendo os seus pilares fundadores.15 O territrio, que representa as
origens de um grupo. A comunidade poltico legal, que com um propsito apenas poltico
assenta na ideia da construo da ptria, e da igualdade dos membros do grupo que assenta
na construo da cidadania. E a existncia de uma ideologia cvica e cultura comuns, ou seja,
a existncia de um conjunto de critrios, sentimentos e ideias que unem a populao em
torno da sua terra natal.16
Ora, uma nao , antes de mais, uma comunidade de origem com grande importncia
ancestral, no entanto o factor territorial comea apenas a ganhar importncia a partir do
momento em que o povo objecto de aspiraes nacionalistas, que incitam mobilizao
popular. Porm Adriano Moreira aludindo definio de Wilson concede mais importncia
ao factor sociolgico do que propriamente territorial salientando desta forma o carcter do
projecto nacionalista que, ainda de acordo com Adriano Moreira, tender tanto para a
represso interna de dissidncias como para fomentar um expansionismo geogrfico custa
de outras comunidades:
De acordo com o conceito consagrado com a orientao de Woodrow Wilson consagrado
aps o final da I Guerra Mundial entendido como uma comunidade na identificao
sociolgica e avaliada como a expresso mais slida da solidariedade que orienta a deciso
14 Cf. Graa, Pedro Borges, op cit., p.20.
15 Devido localizao geogrfica do Cucaso, deve tambm considerar-se a acepo oriental da nao, que privilegia a componente tnica em maior escala do que a cvica e territorial, como se verifica na acepo Ocidental supracitada. Vide Gulick, Sidney Lewis, The East and the West: a study of their psychic and cultural characteristics, C.E Tuttle Co., 1963; Gammer, Moshe, Ethno-Nationalism, Islam and the State in the Caucasus Post Soviet Disorder, Routledge, Londres, 2008; Jersild, Austin, Orientalism and Empire: North Caucasus Mountain Peoples and the Georgian Frontier (1845-1917), McGill-Queens University Press, Montreal & Kingston, London Ithaca, 2003.
16 Acerca da dualidade nacionalidade/etnia, vide Delannoi, Gile, e, Taguieff, Pierre-Andr, Thories du Nationalism, Nation, Nationalit, Ethnicit, ditions KIm, Paris, 1991.
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de suportar em comum as adversidades, os desafios, os projectos, mantendo-se assim na
sucesso das geraes, e, ambicionando a suficincia dos meios, recursos e determinao
para gerir politicamente, com independncia, os seus destinos.17
Definindo o conceito de nacionalismo como uma preferncia pelo que prprio da nao
a que se pertence, torna-se um conceito ambguo que pode desencadear no de patriotismo
ao associar-se a uma doutrina poltica que faz da nao um absoluto18. Como um conceito
bsico de patriotismo intelectualizado e arvorado em doutrina (do nacional), o nacionalismo
est presente na histria mesmo antes da formulao do conceito, pelo menos desde o final
da idade mdia, onde se verificaram vrios fenmenos de desintegrao de imprios que
deram lugar a vrios Estados-nao que de alguma forma justificaram a sua existncia como
um Estado, ou entidade organizada politicamente, numa ideia de nao, embora algo
ambgua.
Foi porm, em pleno Imperialismo, poca em que o globo se repartia por vrias esferas de
influncia, que comearam a emergir caractersticas tnicas e territoriais ligadas com o
fenmeno da nao embora este no assumisse ainda mais do que um sentimento de forte
relao com a prpria ptria em relao s outras naes. Pode dizer-se que se tratava ainda
de um conceito muito exclusivista que recusava todos e quaisquer valores e/ou interesses
que viessem de fora da sua nao. Da ao nacionalismo estarem sempre associados
conceitos como grupo tnico, raa, etnicidade e populaes genticas.
As transformaes histricas que juntaram o conceito de Estado, sociedade poltica
autnoma, ao conceito de nao, conjunto de indivduos ligados por uma comunho de
cultura e de tradies (em que a identidade de lngua, de religio ou de raa so
importantes, sem serem necessrias, podem ser compreendidas no contexto da revoluo
industrial nos ltimos anos do sculo XIX.
A base da formao do Estado-nao e da ideologia nacional tratou-se de um fenmeno
originado simultaneamente com uma massificao crescente do nacionalismo que
desencadeou por si s uma luta ideolgica bastante impulsionada pelas muito em voga
17 Cf. Prefcio de Adriano Moreira, em: Graa, Pedro Borges, op cit., p.8.
18 Cf. Costa, J. Almeida, e, Melo, A. Sampaio de, Dicionrio da Lngua Portuguesa 5 edio, Porto Editora, 1977. p.983.
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teorias raciais e Darwinistas aliadas a uma luta pela sobrevivncia. Embora Lord Acton tenha
escrito que foi o Estado que deu origem Nao e no a Nao que antecedeu o Estado,
efectivamente estes dois conceitos difundiram-se nesta altura emergindo juntos num
movimento filosfico que via no regresso natureza e aos sentimentos primrios do
passado a forma de fazer face industrializao e a uma profunda e inerente crise de valores
sociais por si patrocinada.
A principal caracterstica do nacionalismo foi a degradao da nao a um simples
conceito de expresso tnica e territorial, da terra e da ptria, um sentimento espontneo
de nao que permitiu alguma agregao civil e poltica, uma exaltao do Estado nacional,
considerado como uma instituio essencial para a realizao dos direitos sociais,
econmicos e culturais de um povo, cujo prestgio e glria exigem uma posio dominante
no mundo. Tratou-se de um fenmeno transversal ao qual aderiram vrias classes sociais
devido s capacidades do conceito de nacionalismo advogar uma forma de reagir opresso
da sociedade contempornea de uma forma diferente daquela que era a solidariedade
socialista. Outra das principais motivaes psicolgicas deste fenmeno prendeu-se
especialmente com a possibilidade de vrios individuos que no se puderam afirmar
individualmente passarem a ter a oportunidade de se afirmar no seio de uma nao, numa
sociedade mais justa patrocinada pela unio entre classes.
Os pases em que o nacionalismo se afirmou maioritariamente foram a Frana e a
Alemanha onde o idealismo nacionalista alemo fez emergir a etnicidade como
consequncia da descoberta histrica da Alemanha antiga e pag e na concepo de um
povo como um elemento de unidade da nao, patente nos escritos ticos de Fichte, Kant,
que falam da superioridade do povo alemo, e de Hegel, que v na afirmao de uma nao
sobre a outra o cumprimento do destino do mundo governado pela razo universal,
principais bases da grandeza e do poder da Weltpolitik.19 Em Frana, na II Repblica, um
regime como uma forte averso parlamentarista e anti-clerical fez emergir um nacionalismo
militante inflamado pela ideia de revanche face s regies da Alscia e da Lorena fenmeno
19 Em termos antropolgicos, o conceito de etnicidade tem muitas vezes uma conotao discriminatria, isto porque se uma pessoa est, de facto, definida em termos tnicos, isto enfatiza muitas vezes o papel que determinado individuo forado a desempenhar numa determinada sociedade.
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ao qual se juntou um forte sentimento de dio face s populaes judaicas incitado pelo
affair Dreyfus em 1894.20
Conforme o pensamento de Rousseau de que sem uma ptria no h um povo, so
inegveis as ligaes entre o conceito de nacionalismo e o de etnicidade visto que a base do
nacionalismo a unidade da nao, entendida como a unidade do povo que se identifica
com a raa.21 A exaltao da nao , portanto, equivalente exaltao de um povo e de
uma raa com fronteiras tnicas definidas numa nao que assim se distingue das outras de
uma forma mais ou menos violenta sendo o nacionalismo um fenmeno muitas vezes
agressivo e irracional.22
A onda de nacionalismo e xenofobia que invadiu a Europa no final do sculo XIX esteve
sempre associada a uma necessidade de poder e de expansionismo da nao, algo muito
inerente a Estados-nao conforme se verificou nas Guerras dos Balcs em 1912-1913, uma
regio que foi motivo de interesses, rivalidades, dios nacionalistas de vrias potncias
nacionalistas e onde nada surpreendentemente teve nicio a I Guerra Mundial tambm
muito fomentada por interesses nacionalistas. Alis, o nacionalismo uma ideologia algo
perigosa devido a fornecer de uma forma intrinseca uma apoio emocional necessrio para
guerras entre estados, conforme se verificou nas duas Guerras Mundiais, das quais no foi a
principal causa da sua origem, mas sim a principal ferramenta de propaganda.
O conceito de nacionalismo divide-se em vrias reas de influncia quando aplicado
numa sociedade de um Estado-nao psicolgico, histrico, econmico e poltico. No plano
econmico, o nacionalismo representa os interesses da indstria e do capitalismo nacional
que se unem de forma a proteger a nao da concorrncia estrangeira. Existe tambm um
plano psicolgico que se relaciona com o facto de o nacionalismo ser a expresso do
optimismo das classes dominantes que , tendo ganho a sua hegemonia por meio de
competio social, se sentem legitimadas pela nao e por isso com margem para reforar a
sua posio. Outra vertente do plano psicolgico do nacionalismo tem a ver com o facto de
20 O general Alfred Dreyfus foi um general do exrcito francs, acusado de ser culpado de espionagem para a Alemanha, o maior inimigo do Estado francs. Apesar de se provar a sua inocncia, Dreyfus acabou por ser considerado culpado devido a ser judeu.
21 Racismo, strictu sensu, reconhecer as diferentes raas humanas, mas para dizer que uma superior a outra, por isso pode ser assumido, em nome da superioridade, que todas as formas de explorao, opresso se justificam em nome do poder.
22 Cf. Pfaff, William, The wrath of Nations: Civilization and the furies of nationalism, Simon & Schuster, Nova Iorque , 1993 pp.53-4.
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este constituir um terreno frtil nas classes mais pobres para as quais as conquistas da nao
so verdadeiros objectivos de vida que aproximam as massas para a direco do Estado a
quem compete assegurar as relaes sociais a nvel nacional.
Tambm associado com o poder e o expansionismo da nao nomeadamente na era do
colonialismo europeu desenvolve-se o conceito de etnicidade que consiste num grupo de
pessoas que se identificam ou so associadas umas com as outras, ou mesmo por terceiros,
com base em semelhanas culturais ou biolgicas.23 Tal como no conceito de nacionalismo o
conceito de etnicidade divide-se em vrias reas de influncia quando aplicado numa
sociedade de um Estado-nao. Assim, o conceito de etnicidade pode ou no fomentar o
conceito de nacionalismo e de unio nacional na medida em que a questo dos grupos
tnicos, da raas, traos culturais, lingusticos e religiosos, quando semelhantes, so
elementos unificadores de uma filosofia nacional da nao ou a ela referente. Mas que ao
serem diferentes podem constituir linhas de fractura que conduzem ao antagonismo aberto
entre os grupos tnicos, originando a tendncia de os pases com maior diversidade tnica
serem mais frgeis especialmente face a convulses sociais internas ou a ameaas
externas.24
Como conceito aglutinador de todos os conceitos supracitados existe ainda o conceito de
ressentimento, que, subitamente, pode intervir de forma determinante e transversal em
todos eles, conforme escreveu Marc Ferro:
Como os vrus que julgamos mortos quanto esto apenas adormecidos, o ressentimento,
subitamente reactivado, ganha vida para surpresa daqueles que nem sequer suspeitavam da
sua existncia. (...) O fenmeno do ressentimento partindo das abordagens filosficas de
Nietzsche em genealogia da moral em 1887 mas tambm dos escritores que giraram em
torno do fenmeno Rousseau, Dostoivski, Camus (...) afecta tanto grupos ou naes ou
comunidades inteiras mais difcil de apreender do que a luta de classes ou mesmo o
racismo. Entre outras razes porque se manteve latente e pode interferir, tanto na luta de
classes e o racismo, como com o nacionalismo ou outros fenmenos.25
23 Vide, Poutignat, Philippe, Teorias da etnicidade, UNESP, So Paulo,1998.
24 Cf. Giddens, Anthony, Sociologia, Fundao Calouste Gulbenkian, Lisboa, 2004. pp.258-259.
25 Cf. Ferro, Marc, O Ressentimento na Histria, Teorema, Lisboa, 2008. pp.6-7.
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4.2. O Conceito de Subverso
Num sentido lato subverter significa arruinar, revolucionar, revolver, e, subverso
significa o acto ou o efeito de subverter. Para uma melhor compreenso do processo
subversivo h que considerar a existncia de uma ordem prvia, um status quo ante, que
por via de uma determinada causa, mais ou menos complexa entra num processo de
ruptura, mudando brusca e profundamente para uma nova situao.26
Existem vrias definies do termo subverso, mas as mais comuns definem o conceito de
subverso como sendo na sua essncia, um processo transitrio no seio de um Estado,
embora no deixando por isso de constituir um instrumento fundamental de toda uma
aco que visa causar uma ruptura conjuntural, ou um enfraquecimento do poder27, a uma
ordem vigente, substituindo-a ou no por outra.28
Para Raymond Aron a origem da subverso, isto , o que leva ao processo de ruptura est
sempre no descontentamento das massas que so orquestradas e incitadas a agir contra o
governo, enfraquecendo o Estado atravs de motins, manifestaes, rebelies forando
as instituies a adoptar novas ideias.29
Antnio de Sousa Lara, sustenta-se em Aron ao identificar o processo social como
sendo potenciador de uma ruptura, total ou parcial, de uma dada ordem conjuntural
caracterizada pela informalidade ou marginalidade de actuaes e pela incompatibilidade de
projectos relativamente aos valores e ordem jurdica institudos, com vista substituio
dessa ordem por outra.30
A ideia da existncia de uma marginalidade nas actuaes levadas a cabo por e no interior
de uma determinada sociedade visando a substituio da ordem vigente, tambm
corroborada pelo General Abel Cabral Couto, que define o mesmo conceito como uma luta
conduzida no interior de um dado territrio, por uma parte dos seus habitantes, ajudados e
26 Cf. Lara, Antnio de Sousa, Cincia Poltica Estudo da Ordem e da Subverso, Universidade Tcnica de Lisboa Instituto de Cincias Sociais e Polticas, Lisboa, 2004. p.301.
27 Cf. Muchielli, Roger, La Subversion, CLC, Paris, 1976, p.9.
28 Struggles always have primacy over the institutions-apparatuses of power (especially the State), even though they are invariable inscribed within their field. The other danger we must take care to avoid is the essentialist conception of power (including the State) according to which struggles (the social) can only subvert power to the extent that they are external to it in Poulantzas, Nicos, State, Power, Socialism, Verso Classics Edition, Londres, 2000. p.149.
29 Cf. Aron, Raymond, Paix et Guerre entre les Nations, Calmann-Lvy, Paris, 1988, p.517.
30 Cf. Lara, Antnio de Sousa, op cit., p.302.
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reforados ou no pelo exterior, contra as autoridades de direito ou de facto estabelecidas,
com a finalidade de lhes retirar o controlo desse territrio ou, pelo menos, de paralisar a sua
aco.31
Tanto Sousa Lara como Cabral Couto so unnimes na ideia de criao de uma ruptura
mas, no entanto Cabral Couto considera que essa ruptura, que levar a uma eventual
paralisao da aco, constitui j a subverso, mas para Sousa Lara, apenas existe subverso
quando uma ordem vigente substituda por outra. Tambm para Jorge de Miranda a
questo da substituio de uma ordem, status quo ante, por outra, tambm parece ser
considerada fundamental, que alm de considerar o termo subverso como um ataque
insidioso ou violento, a uma ordem poltica e social estabelecida, refere ainda que esse
ataque tem como principal objectivo a substituio da ordem vigente, a mdio ou longo
prazo, por outra.32
Assim que um Estado subvertido, deparamo-nos com uma problemtica jurdica,
extremamente complexa, a que se tem dado o nome de sucesso de Estados. Um Estado
sucedido poder ficar submetido a vrias vicissitudes, entre elas: A cessao da sua
soberania ou da administrao de um Estado relativamente a certo territrio seja por
incorporao dele no territrio de outro Estado ou por transferncia de administrao, seja
por ele se tornar o territrio de um novo Estado; Cessao da prpria soberania do Estado
por anexao por outro Estado, por integrao em Estado composto ou por fuso com outro
ou outros Estados dando origem a um novo Estado.33
4.3. A Estratgia de Subverso de um Estado
Em termos gerais, a subverso visa uma mudana na ordem vigente, ou at mesmo a
substituio dessa ordem, e, a estratgia a arte e a cincia de edificar, estruturar e
empregar meios num dado meio e tempo, de forma a alcanar objectivos, que no caso de
uma estratgia de subverso, so a subverso de um Estado.
31 Cf. Couto, Abel Cabral, Elementos de Estratgia Apontamentos para um Curso, vol. II, pg. 211, Instituto de Altos Estudos Militares, Lisboa, 1989
32 Cf. Miranda, Jorge de, Enciclopdia Luso-Brasileira de Cultura, Edies Verbo, Lisboa So Paulo, 1999, p.751.
33 Cf. Miranda, Jorge, Curso de Direito Internacional Pblico, Principia, Lisboa, 2002. pp.230-231.
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Uma estratgia de subverso visa encontrar os melhores meios para subverter um Estado,
e estes meios podem ser vrios, bastando apenas que visem derrubar e substituir a ordem
estabelecida. Podem ser atentados, presses opinio pblica, enfraquecimento da classe
mdia (pedra angular de uma sociedade), manifestaes, entre outras estratgias de
subverso, e os agentes subversivos podem ser jornalistas, sindicalistas, e at terroristas,
variando no caso de tratar-se de uma subverso manifesta ou de uma subverso coberta.34
Apesar da ideia de subverso de um Estado ser de difcil concretizao no panorama
actual dos Estados modernos, no deixam de existir inmeras estratgias visando esse
objectivo. A essas estratgias podemos chamar-lhes ameaas, visto que em quase todas
colocada em causa a segurana dos cidados de qualquer Estado onde estas estejam ou
sejam implantadas.
Na formulao de qualquer estratgia, segundo a tipologia do General Cabral Couto, so
identificveis trs fases() os aspectos operacionais (ligados utilizao dos meios), os
aspectos genticos (relacionados com a gerao e a criao de novos meios) e os aspectos
estruturais (correspondentes composio, organizao ou articulao dos meios).35
Conferindo a uma estratgia, o objectivo de subverter um Estado enfraquecendo e
desgastando o Poder e desmoralizando/desanimando os cidados torna-se imperativo
identificar as melhores formas quer de estruturar, quer de operacionalizar a estratgia. Estas
devero ser adequadas justamente ao objectivo anteriormente delineado, ou seja, devero
adequar-se ao Estado que se pretende subverter.36 Para que se saiba exactamente que
estratgia utilizar, e sabendo que os Estados fracos so mais susceptveis de serem
subvertidos, necessrio, em primeiro lugar, avaliar a fora do Estado.
Manuel Dez-Alegra Guterrez, citando o Almirante francs Adolphe Lepotier, refere a
existncia de trs aspectos de tal forma fundamentais que o que deles emana confere s
naes a sua verdadeira fora, o seu poder. So eles, a Geoestratgia da superfcie e da
34 Uma aco de subverso manifesta sustentada na propaganda, agitao de massas, contestao violenta, atentados polticos ou no terrorismo. A subverso coberta pode materializar-se atravs de mediatismo terrorista, boatos, rumores, desinformao, e do recrutamento. in Fontoura, Lus, Lio de Estratgia de Subverso, Instituto de Cincias Sociais e Polticas, Lisboa, Novembro de 2009.
35 Vide Couto, Abel Cabral, Elementos de Estratgia - Apontamentos para um Curso, vol. II, pg. 211, Instituto de Altos Estudos Militares, Lisboa, 1989.
36 Cf. Correia, Armando, Estratgia Martima Norte-Americana: Trabalho de Aplicao do Modelo de Gesto da Aco Estratgica, Instituto Superior de Cincias Sociais e Polticas, Lisboa, Fevereiro de 2008
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populao, a Tecno-estratgia, dos recursos e do potencial cientfico, e a Psico-estratgia, da
conquista dos crebros e dos coraes.37
Com efeito, a estratgia de subverso de um Estado apenas bem-sucedida quando a
opinio pblica desse Estado persuadida, atravs, ou no, da aco psicolgica, da
substituio da ordem vigente acabando por causar uma ruptura num dos trs aspectos
conferidores da fora dos Estados.38 Caso essa ruptura se verifique, o Estado no saber, ou
ver-se- incapaz de fazer uso das suas capacidades, sendo forado a uma mudana.
37 Cf. Gutirrez, Manuel Diez-Alegra, Geopoltica y Geoestrategia, Madrid, p.224.
38 Cf. Fontoura, Lus, Lio de Estratgia de Subverso, Instituto de Cincias Sociais e Polticas, Lisboa, Novembro de 2009.
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CAPITULO PRIMEIRO
A Herana Histrica do Cucaso
this country is interesting as the central point of passage in
most of the great national migrations of ancient times (...)
Crossing the Caucasus the Scythians penetrated into Asia (...)
the Persian monarch Cyrus conquered this country and
Alexander the great appears in all the legends of Caucasus. Here
too was the stronghold of Mithridates (...) the Romans ruled this
country for centuries and introduced into it Christianity (...) in
after times here arose the kingdoms of Armenia and Georgia
partially dependent of Byzantium (...)the Mongols and Tartars
inundated the country (...) Islamism extirpated or suppressed
Christianity (...) and Persians struggled for mastery (...) until
Russia supplanted both these powers 39
1. As Montanhas das Lnguas
H vinte e cinco milhes de anos atrs duas enormes massas de terra colidiram num lugar
que ficaria conhecido como a interseco entre a Europa e a sia. A coliso entre estas duas
massas gigantes foi to forte que deu origem a uma muito irregular cadeia de setecentos
quilmetros de picos e montanhas que se estende desde as enormes estepes da Eursia at
s terras altas e ridas a leste da Anatlia e a oeste da Prsia.
Uma das principais imagens da regio que Julius Von Klaproth40 considerou um dia estar
entre as mais extraordinrias e menos conhecidas do mundo antigo, so sem dvida as suas
impressionantes montanhas. E talvez por isso, durante sculos, para muitos, o Cucaso,
39 Cf. Haxthausen, Baron Von, Transcaucasia: Sketches of the Nations and the Races between the Black Sea and the Caspian, Chapman and Hall, Londres, 1854. pp.xiii-xv.
40 Cf. Klaproth, Julius Von, Travels in The Caucasus and Georgia Performed in the years of 1807 and 1808 by command of Russian Government, Henry Colburn, Londres, 1814. p.1.
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pouco mais significava do que glidas, altas e muito longnquas montanhas que constavam
porm de lendas imemoriais, como a lenda de Prometeu, aquele que por ter roubado o fogo
dos deuses para o dar aos homens, foi castigado por Zeus que o acorrentou nos cumes
glidos do Cucaso durante 30 mil anos.
O interesse acadmico da regio do Cucaso deve-se muito ao facto de se tratar de uma
regio bastante complexa no que respeita sua vertente etnolingustica, histrica e tambm
geogrfica. No que concerne vertente geogrfica, existe a ideia de que o Cucaso se trata
apenas e s de montanhas, j que os territrios na costa do Mar Negro, na Gergia, bem
como as paisagens ridas e desrticas, as chamadas estepes, do centro do Azerbaijo so
tambm marcas icnicas da geografia da regio. Porm so de facto as montanhas a
principal marca do Cucaso, e, devido a ter sido sempre uma zona de passagem durante a
histria, muito comum na bibliografia inglesa dedicada regio ser-lhe atribudo o termo
mountain pass, que carece na lngua portuguesa, conforme escreveu Gonalo Cadilhe, de
uma traduo capaz de prestar a devida dimenso palavra pass: A expresso um passo
de montanha no nos diz nada, no a associamos a uma abertura na muralha, a uma fenda
na linha da crista, a um pequeno desfiladeiro que permita mais agilmente passar de um lado
de uma cordilheira para o outro. Talvez por no termos tido, na nossa Histria, cordilheiras
para atravessar. 41
Mas ao contrrio da nossa histria, a histria de todos os povos que colonizaram, ou
apenas passaram pelo Cucaso, envolve a passagem da alta cordilheira montanhosa, onde
se ergue o impressionante Monte Kazbek, a mais de 5 mil metros de altitude, que marca
uma faixa de oitocentos quilmetros, que separa o Mar Negro do Mar Cspio, e divide o
Norte, do Sul do Cucaso, onde se erguem as montanhas Lesser, que conferem uma
paisagem muito montanhosa Armnia e ao Azerbaijo, e tambm o mtico monte Ararat
na fronteira com a Turquia.
Outra das imagens do Cucaso desde tempos imemoriais o carcter comercial das suas
cidades de onde provinham os tapetes com que Assrios e Babilnios ornamentavam os
templos dos seus deuses bem como os palcios dos seus reis, semelhantes aqueles que
41 Cf. Cadilhe, Gonalo, Qualquer coisa nos lugares: Uma Travessia do Khyber, publicado na revista Viso no dia 28 de Fevereiro de 2013. p.97.
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Romanos e Gregos importariam sculos mais tarde.42 A descrio de Marco Polo da antiga
cidade de Laiassus algures na costa do Mar Negro, onde teve incio o seu priplo atravs da
Rota da Seda, apesar de ser talvez uma das primeiras descries do Cucaso visto por um
Ocidental, muito sculos mais tarde pode ainda retratar qualquer cidade costeira do Mar
Negro: uma cidade porturia muito movimentada (...) com muitos mercadores de Veneza e
Gnova e de outros lugares que negoceiam especiarias de todo o tipo, seda e l.43
Pode definir-se geograficamente o Cucaso como uma ponte entre a Europa e a sia
numa rea que compreende 440,194 km sendo as suas fronteiras, a depresso de Kuma-
Manych, que se pensa poder ter sido na antiguidade um corredor entre os Mares Cspio e
de Azov, a Norte, o Mar Cspio a leste, a fronteira entre Gergia-Armnia-Azerbaijo e a
Turquia-Iro a Sul, e o Mar Negro e o Mar de Azov a Oeste. Fazem uma barreira de quase
1300 quilmetros entre o Mar Cspio e o Mar Negro separando-os das grandes plancies
russas a norte. 44
As montanhas os maiores elementos potenciadores das mais particulares caractersticas
da regio como a conhecemos hoje, como por exemplo a sua diversidade tnica
caracterizada pela maior densidade de lnguas do planeta, apesar de situar numa rea
compacta com uma populao de apenas 15 milhes de pessoas. Para que se compreenda o
conceito de multiculturalidade no Cucaso, cingindo a abordagem apenas ao Sul do Cucaso,
a rea geogrfica em que incide esta dissertao, aqui existem cerca de dez nacionalidades,
divididas em 3 grupos tnicos - Azeris, Georgianos e Armnios onde se inserem diferentes
nacionalidades como Ossetas, Abecsios, Curdos Muulmanos e Yezidi, Talysh e Lezgin, e
todos estes povos falam lnguas incompreensveis entre si - O azeri pertence ao grupo de
lnguas trquicas da famlia lingustica altaica. O georgiano uma das lnguas caucasianas, e
o armnio trata-se de uma lngua separada includa na famlia das lnguas indo-europeias. As
diferenas no se cingem ao mbito lingustico, sendo que em termos religiosos os Azeris
so muulmanos, a maioria xiitas sendo que existe uma minoria sunita no norte do pas. Os
42 Cf. Gulbenkian, Calouste S., La Transcaucasie et la Pninsule DApchern Souvenirs de Voyage, Librairie Hachette et Co., Paris, 1891, pp.161-162.
43 Cf. Polo, Marco, The Travels of Marco Polo, Wordsworth Editions, Aug 1, 1997 - Biography & Autobiography. pp.14-16.
44 Sobre a Depresso de Kuma-Manych Vide: Scott, E. M., Alekseev,, Andrey, e, Zaitseva, Ganna, Impact of the Environment on Human Migration in Eurasia: Proceedings of the NATO Advanced Research Workshop, held in St. Petersburg, 15-18 November 2003, Springer, 3 Nov 2004. pp.91-107.
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Armnios e os Georgianos so Cristos Ortodoxos e tm os seus centros religiosos em
Echmiadzin e Tflis, respectivamente.
A cadeia montanhosa sim o centro do Cucaso e no uma linha divisora no entanto,
costume falar-se de Cucaso do Norte e de Cucaso do Sul, sendo que a fronteira a Sul
natural, e situa-se ao longo do Rio Araks, e est delimitada desde 1921 com o Tratado de
Kars45 assinado no dia 21 de Outubro de 1921 entre as Repblicas Socialistas Soviticas da
Transcaucsia e pela Turquia46 A terminologia, Sul do Cucaso, ou Transcaucsia, delimitao
geogrfica do objecto de estudo desta tese, apenas utilizada desde a independncia da
Armnia, Gergia e Azerbaijo, apesar desta regio ser j anteriormente conhecida pelo
termo Russo Zakavkazye, que significa, para l das montanhas.
2. O Bero da Civilizao
Pensa-se que o Cucaso seja habitado desde o ano 200 mil a.C. encontrando-se entre as
regies onde assentam as razes das primeiras estruturas organizadas da humanidade que
remontam ao perodo do Crescente Frtil.47 Tratando-se durante milnios de uma zona de
passagem e no de colonizao, os primeiros povos a instalarem-se nos vales do Mtkvari e
do Rioni, antes da chegada das tribos Trcias, Frgias, Msias e Bitnias provenientes das
montanhas dos Balcs e das vastas plancies da Trcia, eram povos nmadas saqueadores
que remontam ao perodo do final da Idade do Bronze.48
45 Sobre o Tratado de Kars, Vide; Kamenev, Lev, Prince Leopold of Bavaria, Joffe, Adolph, Chicherin, Georgy, Altfater, Vasili, Sokolnikov, Grigory,e, Karakhan, Lev, Articles on Treaties of Soviet Republics, Including: Treaty of Kars, Treaty of Brest-Litovsk, , Peace of Riga, Hephaestus Books, 29 Sep 2011, e Treaties of Armeni: Treaty of Kars, Treaty of Batum, Treaty of Alexandropol, Bishkek Protocol, Nvarsak Treaty, 2009 Armenia-turkey Accord, General Books LLC, 2010
46 O Tratado continha clusulas territoriais que afectaram a Armnia. A Rssia limitou as ambies territoriais da Turquia discutidas no Tratado de Brest-Litovsk e no Tratado de Batumi. A cidade de Batumi voltou a ser pertena da Gergia, enquanto que Alexandropol e a linha frrea at Erev passaram a fazer parte do territrio armnio. Como compensao pela perda da cidade de Batumi a Turquia obteve uma parcela do territrio armnio acima do Rio Araxes, no distrito de Surmalu, enquanto o Naquichevo se tornou um protectorado do Azerbaijo.
47 Cf. Kaeter, Margaret, The Caucasian Republics, Nations in Transition Series, Facts on File, Nova Iorque, 2004. pp.4-5.
48 Cf. Allen, William Edward David, A History of the Georgian People: From the Beginning Down to the Russian Conquest in the Nineteenth Century, Taylor & Francis, Londres, 1932. p.11.
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A perda da hegemonia da civilizao Egpcia, e dos vrios outros reinos da Idade do
Bronze,49 foi o primeiro passo para que ocorressem uma srie de mudanas irreversveis,
como a queda de Troia e o desabar do poderoso Imprio Hitita na Anatlia central, que
mudariam para sempre o mapa da sia Ocidental.50
Porm a histria destes povos, descritos por Herdoto, no sculo V a.C., como vrias
tribos muito diferentes entre si, no muito conhecida antes das invases Romanas da
dcada de 70 a.C.51
A histria anterior presena romana cinge-se a muito poucas fontes, sendo a mais
creditada, Moiss de Khoren, um historiador armnio da idade mdia que baseou os seus
estudos nos arquivos histricos dos antigos Babilnios, Assrios e Persas.52 Dos seus estudos
sobre o Cucaso Meridional consta que a Armnia e a Gergia foram colonizados pelo
Imprio Babilnico, e mais tarde pelos Assrios, que aproveitando o facto do Imprio
Babilnico ter entrado num estado de anarquia, que culminou com o extermnio da dinastia
Kassite,53 chegaram s terras do Cucaso como forma de vingar a Rainha Semramis,
alegadamente desprezada pelo Rei Ara da Armnia.54
Durante os cinco sculos seguintes, at ao incio da nossa era, e, antes da chegada de
povos como os Citas, os Cimrios, os Medos e os Persas provenientes do Norte e do Leste,
foram os Assrios quem continuou a dominar a regio assegurando assim os antigos valores
por que h muito esta se regia.
As outras potncias dominantes eram o Reino do Urartu55, que contava com regras de
sociedade civil herdadas dos Babilnios, e os recm-nascidos Estados brbaros da Frgia,
49 Cf. Cotterell, Arthur, The Encyclopedia of ancient civilizations, Penguin Books, London, 1980, p.45.
50 BC 1240 The fall of Troy was a major event in the battle for control of the trade between Baltic and Mediterranean seas (..) BC 1235 The Hittites were invaded by the Sea People, bringing their collapsing empire to an end. The center of iron prodution then shifted to the Balkan Peninsula. in Mountain, Harry, op. cit., p.16.
51 Cf. King, Charles, op. cit. p.3.
52 Cf. Khorne, Mose de, Histoire d'Armnie, Typ. armnienne de Saint-Lazare, Veneza, 1841.p.99.
53 Sobre as origens dos Imprios Babilnico e Assrio, Vide; Drummond, Sir William, Origines: Babylonian empire. Assyrian empire. Empire of Iran, Baldwin and co., Londres, 1824.
54 Smiramis, cause de sa premire passion pour le bel Ara () le fils n de lui et de sa bien aime femme, Nouart, enfant g de douze ans la mort dAra; Smiramis, pleine de confiance en ce jeune prince, le met la tte de notre pays: Ara meurt, dit-on, dans la guerre contre Smiramis () le dernier de ceux qui vcurent sous lempire des Assyriens, depuis Smiramis ou Ninus est () notre Barouir () aid puissamment par Varbace le Mde, ravit le royaume de Sardanapale () ainsi Varbace semparant des tats de Sardanaple, commande lAssyrie, Ninive in . Khorne, Mose de, op.cit., pp.93-97.
55 Acerca do Reino do Urartu, Vide; Piotrovski, Boris Borisovich, Urartu, Cresset Press, Londres, 1969, e Frankel, David, The ancient kingdom of Urartu, British Museum Publications, Londres, 1979.
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Ldia e Bitnia que se baseavam numa estrutura social muito semelhante do Imprio Hitita,
talvez por se localizarem nos seus antigos territrios.56
Contudo o final do mundo antigo na regio ficaria marcado pelo inexorvel aumento da
esfera de influncia Persa. O Imprio Aquemnida, ou Primeiro Imprio Persa, sob comando
astucioso de Ciro, o Grande, conquistou o Reino de Medos, em 550 a.C., que fez com que as
montanhas do Cucaso passassem a estar ligadas historicamente Prsia.57
2.1. Entre a Grcia e a Prsia As Satrapias do Cucaso
Em 500 a.C. o Imprio Persa, estava no seu apogeu. Estendendo-se desde os Balcs e o
Norte de frica, a oeste, at India, a Leste, era o maior e mais poderoso imprio do mundo
antigo. Porm a expanso helnica inspirada pelo advento cultural de Atenas continuava a
ser uma ameaa crescente na costa do Mar Egeu, uma zona nevrlgica no corao do
Imprio Persa.
As tribos gregas comearam a instalar-se na sia no final do segundo milnio a.C. Os
Elios foram os pioneiros seguidos dos Jnios que se estabeleceram numa regio da costa
sudoeste da Anatlia que passou a chamar-se Jnia e cuja maior cidade era Mileto.58 A partir
do sculo VI a.C. os Milsios colonizaram e criaram cidades em diversos pontos dos mares
Negro e Egeu que foram, excepo de Mileto, anexadas por Creso, o ltimo rei da Ldia.
Aps a morte do Rei Creso da Ldia, em 546 a.C., o Imprio Persa de Ciro II levou a cabo
fortes aces militares que consumaram a anexao da regio pondo fim s ambies
independentistas de algumas cidades Jnias.59 Contudo, embora os persas no tivessem
56 Cf. Allen, William Edward David, op.cit., p.11.
57 After the Medes had helped the Chaldeans crush the Assyrians, the Persian King, Cyrus (the Great), moved to take over all the surrounding lands. He defeated the King of Medes in 550 B.C. and made their capital at Ecbatana his own () Cyrus showed that he meant to reject the Assyrian way of taking power. Rather than terrorizing his opponents, he sought to win them over by reasonable and decent treatment in Greer, Thomas H., e Lewis, Gavin, A Brief History of the Western World, Cengage Learning, Stamford, 2004. p.46.
58 Cf. Nossov, Konstantin , Greek Fortifications of Asia Minor 500-130 BC: From the Persian Wars to the Roman Conquest, Osprey Publishing, Long Island City, 2012.
59 Between 500 and 386 BC Persia was for policy-making clashes in the largest Greek states a constant preoccupation (...) the situation for the far more numerous smaller states of mainland Greece was different inasmuch as a distinctive policy of their own toward Persia was hardly an option for most ot the time in Britannica Educational Publishing, Ancient Greece: From the Archaic Period to the Death of Alexander the Great, The Rosen Publishing Group, Nova Iorque, 2010. p.65.
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desmantelado as estruturas sociais das comunidades gregas, estes recusavam-se a aceitar o
sistema das satrapias, mesmo sendo estas governadas por gregos.60
Em 499 a.C., meio sculo aps a conquista persa da regio, estalou uma enorme revolta
na cidade de Mileto qual rapidamente aderiram outras cidades vizinhas, alm de Atenas
que enviou alguns navios de combate, mas que rapidamente acabou esmagada pelas foras
persas que condenaram a Jnia a prestar vassalagem e a pagar elevados tributos ao Imprio
Persa.61 A Jnia s seria libertada, por Atenas, no ano 479 a.C. aps a vitria dos Gregos
sobre os Persas na Batalha de Mcale.62
Em 329 a.C. Alexandre, o Grande havia j conquistado o Imprio Persa, anexando-o ao
Imprio Macednio que passou a englobar todo o mundo civilizado conhecido, desde a
Grcia at ndia. Todavia, o imprio entrou em colapso logo aps a morte de Alexandre e
rapidamente se desintegrou.63
2.2. A Civilizao Romana As Provncias Romanas do Cucaso
A morte de Alexandre significou para o Cucaso um perodo de enorme turbulncia, que
durou quase sete sculos, em que a regio foi palco de sangrentos conflitos, em que as suas
fronteiras eram disputadas por Gregos, Romanos e Persas. Os confrontos blicos comearam
na dcada de 70 a.C. com uma guerra entre Gregos e Romanos, na qual os exrcitos
60 Throughout the cities, the Persians installed Greek puppet rullers. After the doomed Ionian Revolt, Persian rule was harshly reaffirmed in Sacks, David, Murray, Oswing, e, Brody, Lisa R., Encyclopedia of the Ancient Greek World, Infobase Publishing, Nova Iorque, 2009. p.1
61 No entanto o domnio persa na regio foi devidamente reestruturado pelo rei Drio I:
Cyrus preferred to rule through his own governors rather than through vassals (...) Darius reformed the organization of Persian rule (...) when Ionia was reassessed after the Ionian revolt (...) Dariuss reorganization consisted of a redivision of the satrapies, splitting up some and joining together others along traditional ethnic or national lines, and the determination of a fixed tribute based on the productive capacity of the region. He appointed a governor for each satrapy (...) who was responsible to the Great king himself (...) for the payement of the annual tribute, the raising of military levies, the administration of justice in Cook, John Manuel, The Persian Empire, Schocken Books, Berlim, 1983.pp.167-182. apud Gorman, Vanessa B., Miletos; The Ornament of Ionia: A History of the City to 400B.C.E, University of Michigan Press, Michigan, 2001. p.127.
62 In the Persian invasions of mainland Greece (490 and 480 B.C.E.), Ionian troops and ships crews were made to fight as Persian levies against their fellow Greeks. In 479 B.C.E, a seaborne force of mainland Greeks landed in Ionia, beat a Persian army at the battle of Mycale, and liberated Ionia in Sacks, David, Murray, Oswyn, e, Brody, Lisa R., op cit p.168
63 Acerca das conquistas de Alexandre o Grande, e da sua estratgia militar, vide: Lonsdale, David J., Alexander the Great: Lessons in Strategy, Routledge, Londres, 2007, e, Sheppard, Ruth, Alexander the Great at War: His Army His Battles His Enemies, Osprey Publishing, Oxford, 2008.
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Georgianos tambm entraram, lutando ao lado dos primeiros, sob comando de Mitridates, o
Grande, contra as legies romanas comandadas por Lculo e Pompeu.64
A vitria dos Romanos no terminou com as hostilidades no Cucaso visto que cedo
estalaria a guerra entre estes e o Imprio Arscida, ou Parta, que trouxe vitrias e derrotas
de parte a parte, que durante quase cinco sculos possibilitaram a extenso do seu territrio
para Oeste custa do moribundo Imprio Selucida.65
A rota comercial por onde transitavam as caravanas de mercadorias oriundas da China
passava pela Prsia e pela Babilnia, partes integrantes do territrio do Imprio Arscida,
que exigia elevados tributos ao Imprio Romano como condio para que a to desejada
seda oriunda da China pudesse chegar at Roma.66
A conquista do Reino da Armnia cuja posio no mapa se situava estrategicamente entre
os dois Imprios passou por isso a ser cada vez mais importante e ambicionada por ambos.
Facto que deu origem a mais uma guerra com incio por volta do ano 65 em que o Imprio
Romano derrotou o Imprio Arscida embora em condies muito particulares.67
Reinava o Imperador Romano Alexandre Severo, quando o Imprio Arscida, durante
quatrocentos anos um dos mais persistentes inimigos de Roma, mergulhou numa Guerra
Civil de enormes propores que o enfraqueceu de tal forma que acabou por ser anexado no
ano 226 pelo vizinho Imprio Sassnida que assim se tornava no inimigo mais forte e temido
pelos Romanos.68
Apoiados na sua grande capacidade militar os Persas Sassnidas asseguraram o domnio
da Mesopotmia atravs da captura do Imperador Valeriano, em 260, que forou os
Romanos retirada da regio onde apenas conseguiriam regressar trinta e sete anos depois
j aps a diviso do Imprio. As guerras entre os Bizantinos e os Persas Sassnidas causaram
64 Cf. Gulbenkian, Calouste S., La Transcaucasie et la Pninsule DApchern Souvenirs de Voyage, Librairie Hachette et Co., Paris, 1891. p.xvii.
65 Cf. Liu, Xinru, The Silk Road in World History, Oxford University Press, Oxford, 2010. p.22.
66 Cf. Freeman, Charles, Egypt, Greece and Rome: Civilizations of the Ancient Mediterranean, Oxford University Press, Oxford, 2004. pp.359-360.
67 disputes over Armenia around 65 C.E brought Rome and Parthia back into direct conflict. Parthia lost out here, and Armenia went into the Roman fold, although the peace settlement allowed a Parthian ruler to sit on the Armenian throne, but under a Roman authority in Stokes, Jamie, Gorman, Anthony, e Newman, Andrew, Encyclopedia of the Peoples of Africa and the Middle East, Facts on File Library of World History, Infobase Publishing, Nova Iorque, 2009. p.549.
68 Cf. Mennen, Inge, Power and Status in the Roman Empire, AD 193-284, Coleco Impact of Empire Vol 12, BRILL, Boston, 2011. p.30.
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inmeras baixas, entre elas o Imperador Bizantino Juliano que morreu em combate em
363.69 Fustigado por mais de quatro sculos de guerras o Imprio Sassnida entrou num
declnio que se agudizou no ano 628, data em que a sua capital Ctesifonte foi capturada
pelos Bizantinos que impuseram aos Sassnidas a devoluo dos seus antigos territrios que
estes lhes tinham conquistado.70
O Imprio Sassnida capitulou, entre os anos 642 e 649, quando invadido pelos rabes
Muulmanos que os obrigaram a reconhecer a lei do profeta Maom, os mesmos rabes
que menos de cinco anos antes tinham invadido tambm o Egipto e capturado as cidades de
Alexandria e Babilnia aos Bizantinos. Com a conquista muulmana da Prsia, o rio Oxos, ou
Amu Dria, passou a ser a fronteira entre o Califado rabe e os territrios Turcos.71
2.3. O Califado Abssida A Chegada de uma Nova F
Em 632, data da morte de Maom, tinham-se j convertido uma srie de tribos rabes
sua f, que, aps a morte do profeta deram incio a uma campanha de conquista, ou guerra
santa com o objectivo de espalhar a sua religio pelo mundo. Aproveitando alguma
debilidade do Imprio Bizantino os rabes expandiram-se em direco sia Menor,
entrando nas montanhas do Cucaso no ano de 640, onde ficou estabelecida a fronteira
Norte do Califado aps vrias derrotas no Norte do Azerbaijo, infligidas pelos Cazares72 que
evitaram assim a invaso muulmana da Europa Oriental.73
As populaes indgenas do Cucaso ofereceram pouca resistncia aos ocupantes rabes,
e em menos de trs sculos, embora as reas montanhosas apenas comeassem a
apresentar alguns traos culturais e religiosos mistos, as zonas costeiras do Mar Cspio
estavam inteiramente convertidas ao Islo. A miscigenao dos rabes com as gentes do
Cucaso deu origem a que as elites indgenas passassem por um processo de arabizao
69 Cf. Penrose, Jane, Rome and Her Enemies: An Empire Created and Destroyed by War, Osprey Publishing, Oxford, 2008. p.255.
70 Cf. Wilcox, Peter, Rome's Enemies (3): Parthians and Sassanid Persians, Osprey Publishing, Oxford, 1986. pp.3-4.
71 Cf. Tucker, Spencer C., A Global Chronology of Conflict: From the Ancient World to the Modern Middle East: From the Ancient World to the Modern Middle East, ABC-CLIO, Santa Brbara, 2009. p.202.
72 People of Turkish origin who lived in southern Russia and adopted Judaism in the 8th century in Schreiber, Mordecai, Schiff, Alvin I., e, Klenicki, Leon, The Shengold Jewish Encyclopedia, Schreiber Publishing, Portland, 2003, p.156.
73 Cf. Kaeter, Margaret, op cit.. p.11.
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quer a nvel lingustico quer a nvel administrativo quer tambm nas artes. O perodo de
domnio rabe no Cucaso fez com que a regio tivesse atingido uma prosperidade e um
desenvolvimento sem paralelo na sua antiga histria, ficando por isso conhecido como a
Idade de Ouro.74
A revolta de Babak que durante mais de vinte anos se espalhou pela Prsia, desde o
Azerbaijo, pondo em causa a liderana do mapa regional do Califado Abssida, teve
diferentes consequncias quer na Armnia quer no Azerbaijo.75 A ocupao rabe do
Azerbaijo cingia-se s plancies ricas em minerais onde se desenvolveram cidades como
Ardebil e Tabriz, e por isso o Zoroastrismo e a cultura ancestral Persa estava ainda algo viva
nas reas montanhosas do Azerbaijo muito resguardadas de qualquer influncia da
conquista rabe. Apenas durante a grande campanha Muulmana, que ocorreu nos califados
dos califas Abssidas Al-Mamun e do seu sucessor Al-Mutasim, os exrcitos leais ao califa
esmagaram a rebelio de Babak e subjugaram finalmente as populaes indgenas das
montanhas azeris lei do profeta.76
A situao era bem diferente nas frteis plancies do rio Arax bem no centro da provncia
Muulmana da Armnia sediada na antiga cidade armnia de Partav que os rabes
renomearam de Bardha'a. Outrora fundada pelo Imperador Sassnida Kavadh I, devido sua
localizao estratgica localizada a poucos quilmetros da confluncia dos rios Kura e Terter,
era agora a maior cidade do Cucaso, a Bagdade deste pas, o local de residncia dos
74 While under Arab power, the region reached a Golden Age. (...) Citizens enjoyed the freedom to build their own businesses catering to the many traders traversing their lands (...) the arts also underwent significant advancement during this time, building on the skills developed through contacts with the Far East amd western Europe. Carpet weavers created intricate designs based on Arabic symbolism (...) Paper was being manufactured in the late 700s in the Arab city of Baghdad (...) the Arabs took this invention and translated nearly every important written document from every culture under Arabic control in Kaeter, Margaret, op cit. p.12.
75 Babak Khorramdin (795-838) era conhecido como Ppak que significa jovem pai. Foi um dos lderes revolucionrios polticos e religiosos khurramitas Persas "os da religio alegre mais activos na luta contra o Califado Abssida. A rebelio de Babak visava o regresso s antigas glrias persas da pregar uma religio algo prxima do zoroastrismo a antiga religio do Imprio Aquemnida, ou I Imprio Persa.
Sobre a Revolta de Babak e a sua luta contra o Califado Abssida vide; Crone, Patricia, Babaks Revolt, Aula leccionada na University of California, Los Angeles UCLA, em 25 de Fevereiro de 2005; Disponvel em: www.parstimes.com/history/babak.pdf [Consultado dia 01 de Maro de 2013 s 10:00]
76 Cf. Kennedy, Hugh, The Early Abbasid Caliphate: A Political History, Taylor & Francis, Londres, 1986. p.28.
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governadores rabes da Armnia e o maior centro de poder rabe no Cucaso,
ultrapassando as cidades comerciais de Derbent e Tifls.77
Uma aliana de prncipes Bagrtidas da Armnia, herdeiros da nobreza Armnia e
descendentes de uma famlia que no sculo I tinha servido a Dinastia dos Artxias, e
desempenhado tambm um papel proeminente durante o perodo do Imprio Sassnida,
encetou uma luta contra a hegemonia Abssida, que coincidiu, curiosamente, com o passar
da defensiva ofensiva por parte dos Bizantinos no leste do pas, o que levou a um novo
equilbrio de foras na Armnia. Usando a posio estratgica da histrica cidade de Ispir, no
Leste da Anatlia, como trunfo, a aliana Bagrtida conseguiu resistir aos ataques
muulmanos, embora as suas tropas fossem duplamente mais numerosas. Aps a vitria, o
prncipe Bagrtida Ashot V foi reconhecido, pelo Califa Abssida Al-Musta'in, em 861, como
Prncipe dos Prncipes e governador da Armnia, e quatro anos depois como Ashot I, Rei
de um Estado semiautnomo, tornando-se assim no primeiro Rei Bagrtida e
consequentemente no fundador desta Casa Real que governaria a Armnia at 1045.78
Apesar dos rabes terem conquistado a sua capital Tfils em 645, o principado de Kartli-
Ibria, nome antigo da Gergia, permaneceu sempre muito ligado culturalmente ao Imprio
Bizantino, bem como consideravelmente independente face aos seus ocupantes rabes,
maioritariamente devido ao Rei Mariano III ter declarado o Cristianismo como religio de
Estado na Gergia no ano de 330. Em 888 o Rei Armnio Ashot I coroou, o tambm
Bagrtida, Adarnase IV como Rei da Ibria, tornando-se este o primeiro Bagrtida a reinar na
Gergia, dando inicio a um perodo de mais mil anos em que o pas foi governado por
membros desta Casa Real.79
No sculo X o poder rabe j no se encontrava no seu auge e comeava a acentuar-se a
falta de unio entre os trs califados reinantes, centrados no Cairo, em Crdova e em
Bagdade.80 O Califado Abssida no chegou at segunda metade do sculo X sendo que
77 Cf. Houtsma, Martijn Theodoor, E.J. Brill's First Encyclopaedia of Islam: 1913-1936, BRILL, Boston, 1993. p.656.
78 Cf. Kurkjian, Vahan M., A History of Armenia, Indo-European Publishing, Nova Iorque, 2008. p.150.
79 Cf. Adalian, Rouben Paul, Historical Dictionary of Armenia, Scarecrow Press, Lanham, 2010. p.xxxvi.
80 "In the tenth century the chair of Muhammad was disputed by three caliphs, who reigned at Bagdad, Cairoan, and Cordova, excommunicated each other, and agreed only in a principle of discord that a sectary is more odious and criminal than an unbeliever" in Gibbon, Edward, e, Smith, William, The Student's Gibbon: The
History of the Decline and Fall of the Roman Empire, Harper & Bros., Nova Iorque, 1857. p.406.
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aps a conquista da sua capital pela Dinastia Buyida, uma dinastia xiita oriunda da Prsia, a
lei de Bagdade deixou de se repercutir no seio das fronteiras do Califado cujos territrios
foram posteriormente conquistados por diferentes emirados muulmanos. Apesar da
Dinastia Buyida no ter abolido o Califado Abssida, que conservou o seu prestgio dinstico
e religioso, os abssidas sunitas tornaram-se marionetas controladas pelos Buyidas xiitas e
viram a sua esfera de poder reduzida cidade de Bagdade.81
O vazio de poder ocasionado pelo declnio da Dinastia Buyida que ainda controlava o
Califado Abssida foi ocupado por uma Dinastia de Turcos Oguzes conhecidos tambm como
Turcos Seljcidas, embora fossem originrios da sia Central.82 O Califa Abssida Al-Qa'im
pediu auxlio ao Sulto Tughril Beg da Dinastia Seljcida para que o ajudasse a fazer face
ameaa do Califado Fatmida e restaurar Bagdade e a lei sunita.83 Os Seljcidas, com
ambies imperialistas, acederam ao pedido do Califa e aps conquistarem Bagdade
instalaram-se no poder, relegando mais uma vez o califa para um plano secundrio, apesar
de este, tambm sunita, se manter como lder da comunidade Islmica.84
A partir das suas terras de origem, prximas do mar de Aral, os Turcos Seljcidas
avanaram at Prsia e ao Iraque, e posteriormente regio da Anatlia, com o objectivo
de invadir e derrubar o Imprio Bizantino.85 J durante o sultanato de Mehmed Alp Arslan,
entre os anos de 1064 e 1068, os Turcos Seljcidas tinham chegado s terras do Sul do
Cucaso, no Sul da Gergia e na Armnia Ocidental, onde se depararam com diferentes
nveis de resistncia por parte dos Estados do Cucaso.86
A Armnia que durante o reinado de Gagik I tinha conseguido manter-se mais ou menos
afastada das lutas entre o Imprio Bizantino e os rabes, entrou aps a morte do monarca,
numa luta sucessria entre os seus dois filhos, Joo I de Ani e Ashot IV o Valente, que
81 Cf. Ramirez-Faria, Carlos, Concise Encyclopedia Of World History, Atlantic Publishers & Dist, Nova Deli, 2007. p.102.
82 Cf. Pavlidis, Theo, Topics in Middle East History - Chapter 7: Divisions within Islam and within the Caliphate: Internal Strife and Split of the Caliphate. 2010.
83 Esposito, John L., Sachedina, Abdulaziz Abdulhussein, The Islamic World: Abbasid-Historian, Oxford University Press, Oxford, 2004. p.2.
84 Sobre as conquistas dos Turcos Seljuques e a sua expanso no Cucaso, Vide; Hodgson, Marshall G. S., The Venture of Islam, Volume 2: The Expansion of Islam in the Middle Periods, University of Chicago Press, Chicago, 1977.
85 In the middle of the 11th century the Seljuk Turks erupted onto the scene (...) the Bizantine Empire was largely reduced to its European territories, the Seljuk Turks ruled from the Aegean to the borders of India in Scott, Richard, e, Dennis, Peter, Decline and Fall: Byzantium at War, Osprey Publishing, Oxford, 2008. p.5.
86 Cf. Coene, Frederik, The Caucasus - An Introduction, Routledge, Londres, 2009. p.113.
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culminou com a diviso do Reino em duas partes. Esta diviso fragilizou o pas que depois da
morte de ambos foi reivindicado e anexado pelo Imprio Bizantino, apesar de Gajik II filho de
Ashot IV ter subido ao trono e reinado ainda durante dois anos at ter sido deposto pelos
Bizantinos em 1045.87
Depois de ter conquistado a Armnia aos Bizantinos em 1064 o Imprio Seljcida focou-se
na conquista da Gergia onde comeou a desferir constantes ataques que, aliados ao
desgastante jogo poltico com os Bizantinos, bem como a vrios outros problemas internos,
fizeram com que em 1089 o Rei Jorge II abdicasse do trono em favor do seu filho David IV.
Contando com o seu pai como assessor nos primeiros anos do seu reinado David IV
implementou inovadoras reformas que permitiram que o Reino da Gergia que entre 1110 e
1118 David IV tivesse j conquistado a maior parte dos territrios anexados pelos Turcos
Seljcidas ao Reino da Gergia com a excepo de Tifls que atravs da conquista das
cidades mais prximas se tinha convertido numa espcie de enclave Seljcida. Ameaado
pelo avano deste Estado Cristo, o Sulto Seljcida Mahmud formou uma coligao de
Estados Muulmanos reuniu um vasto e experiente exrcito, e declarou uma Guerra Santa
Gergia, que apesar de ter menos de metade do nmero de efectivos acabaria por expulsar
os Seljcidas aps a miraculosa vitria na Batalha de Didgori, em 1121. A Gergia completou
a sua reunificao no ano seguinte com a reconquista de Tifls e de Shirvan que se tornou um
Estado-cliente da Gergia trs anos depois.88
Um ano antes da sua morte o Rei David Agmashenebeli, o construtor em georgiano,
sabendo tirar partido do declnio do Imprio Bizantino, e do recuo do Imprio Seljuque,
libertou e anexou a Armnia s terras da Coroa Georgiana, tornando-se tambm Rei da
Armnia. Assim, data da sua morte a Gergia entrava na sua Idade de Ouro sendo uma
forte potncia regional e uma das mais importantes naes do Leste Cristo cujo territrio
se estendia desde o Norte do Cucaso e da Prsia, para Leste, em Direco da sia Menor.89
87 Cf. Chamechan, Michael, History of Armenia: From B. C. 2247 to the Year of Christ 1780, Or 1229 of the Armenian Era - Volume 2, Bishop's College Press, Calcut, 1827 pp.149-153.
88 Cf. Mikaberidze, Alexander, op. Cit., pp.275-276.
89 Cf. Suny, Ronald Grigor, The Making of Georgian Nation, Indiana University Press, Bloomington, 1994. pp.37-38.
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2.4. As Invases Mongis A Nova Rota da Seda
Por volta do ano de 1206, Genghis Khan unificava as tribos Mongis criando uma
poderosa dinastia, e atravs da sua superior estratgia militar, principalmente atravs de
arqueiros a cavalo, entre os quais, devido tolerncia religiosa dos Mongis, se
encontravam guerreiros Uigures, Turcos e Persas, dava incio s conquistas do Imprio
Mongol.90
A primeira vez que os Georgianos tiveram conhecimento das invases Mongis foi em
1220 quando os mensageiros do Rei Jorge IV, filho e sucessor da Rainha Tamar, lhe
relatavam a chegada de um povo que falava uma lngua estranha e que estava a devastar a
Armnia. O rei reuniu um exrcito e partiu pouco depois para Khunani, no Afeganisto, para
defrontar os Mongis mas as suas tropas foram dizimadas e o prprio rei morreria em
combate, em 1223, sucedendo-lhe no trono a sua irm Rusudan.91