schistosomíase urinária: caso clínico raro e breve revisão · the known pathway and...

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50 Rodrigo Garcia, Ricardo Silva, Álvaro Nunes, Lurdes Correia, Helena Correia, Tomé Lopes Schistosomíase Urinária: caso clínico raro e breve revisão | Acta Urológica – Junho de 2013 – 30 (2): 50-54 Casos Clínicos Schistosomíase Urinária: caso clínico raro e breve revisão Urinary schistosomiasis: an unusual clinical case and brief review Data de Submissão: 7 de abril de 2013 | Data de Aceitação: 14 de agosto de 2013 Autores: Instituições: Correspondência: Rodrigo Garcia , Ricardo Silva , Álvaro Nunes , Lurdes Correia , Helena Correia , Tomé Lopes Interno do Internato Complementar de Urologia do Centro Hospitalar Lisboa Norte Assistente Hospitalar Graduada do Serviço de Anatomia Patológica do Centro Hospitalar Lisboa Norte Assistente Hospitalar Graduada do Serviço de Urologia do Centro Hospitalar Lisboa Norte Diretor do Serviço de Urologia do Centro Hospitalar Lisboa Norte Rodrigo Garcia – Serviço de Urologia – Centro Hospitalar Lisboa Norte – Hospital de Santa Maria – Avenida Professor Egas Moniz 1600 LISBOA – E-mail: [email protected] 1 1 1 2 3 4 1 2 3 4 Resumo Introdução: Caso Clínico: Discussão: A schistosomíase ou bilharziose é uma parasitose dos climas quentes, endémica em 76 países em desenvolvimento. África e Médio Oriente são as regiões mais afetadas, surgindo de forma mais localizada na Ásia e no continente Americano. Embora rara em Portugal, estão descritos alguns casos isolados no Algarve e em imigrantes das ex- -colónias. O é o princi- pal agente da schistosomíase urinária, apresentan- do tropismo pelo plexo venoso perivesical. Apresenta-se o caso clínico de um doente de 37 anos, raça caucasiana, natural e resi- dente em Portugal, e negando viagens para fora do continente Europeu, que recorreu ao serviço de urgência apresentando um quadro de hematúria total. Foi realizada uretrocistoscopia, evidenciando vá- rias lesões endoluminais polipóides de base alar- gada, submetidas a biópsia por via transuretral. O exame anatomo-patológico revelou tratar-se de schistosomíase urinária, com numerosas formas e ovos de . A schistosomíase urinária pode ter uma apresentação clínica semelhante à neoplasia da bexiga. Apesar de rara nesta zona geográfica, tor- na-se relevante a consciencialização para este tipo de parasitose, tendo em conta os crescentes fluxos migratórios com origem em regiões endémicas. O diagnóstico de schistosomíase urinária num doente de raça caucasiana, natural e residente em Portugal, e negando viagens para fora do continen- Schistosoma haematobium S. haematobium te Europeu, além de raro, levanta algumas questões acerca do modo e focos de transmissão conhecidos do . schistosomíase, hematúria, bexi- ga, neoplasia S. haematobium Schistosomiasis, also known as bilharziasis, is a parasitic disease of warm clima- tes. It’s endemic in 76 developing countries. Africa and Middle East are the most afflicted regions, being more restrained in the Asian and American conti- nent. Although rare in Portugal, there are a few re- ported cases in Algarve and among immigrants from the former colonies. Schistosoma haemato- bium is the causative agent of urinary schistoso- miasis, being attracted to the perivesical venous plexus. We present a case report of a 37 year- old man, caucasian, born and resident in Portugal, and denying travel outside of Europe, who presen- ted to the emergency department with total hema- turia. Cistoscopy showed several endoluminal poly- poid lesions that were biopsied by transurethral access. The histological examination revealed uri- nary schistosomiasis, containing many S. haema- tobium worms and eggs. The urinary schistosomiasis may have a clinical presentation similar to the bladder tumor. Although rare in this geographical area, it’s impor- tant to be aware for this kind of parasitosis, in view Palavras-chave: Introduction: Clinical Case: Discussion: Abstract www.apurologia.pt

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50Rodrigo Garcia, Ricardo Silva, Álvaro Nunes, Lurdes Correia, Helena Correia, Tomé LopesSchistosomíase Urinária: caso clínico raro e breve revisão | Acta Urológica – Junho de 2013 – 30 (2): 50-54

Casos Clínicos

Schistosomíase Urinária: caso clínico raro e breve revisão

Urinary schistosomiasis: an unusual clinical case and brief review

Data de Submissão: 7 de abril de 2013 | Data de Aceitação: 14 de agosto de 2013

Autores:

Instituições:

Correspondência:

Rodrigo Garcia , Ricardo Silva , Álvaro Nunes , Lurdes Correia , Helena Correia , Tomé Lopes

Interno do Internato Complementar de Urologia do Centro Hospitalar Lisboa NorteAssistente Hospitalar Graduada do Serviço de Anatomia Patológica do Centro Hospitalar Lisboa

NorteAssistente Hospitalar Graduada do Serviço de Urologia do Centro Hospitalar Lisboa Norte

Diretor do Serviço de Urologia do Centro Hospitalar Lisboa Norte

Rodrigo Garcia – Serviço de Urologia – Centro Hospitalar Lisboa Norte – Hospital de Santa Maria– Avenida Professor Egas Moniz 1600 LISBOA – E-mail: [email protected]

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Resumo

Introdução:

Caso Clínico:

Discussão:

A schistosomíase ou bilharziose é umaparasitose dos climas quentes, endémica em 76países em desenvolvimento. África e Médio Orientesão as regiões mais afetadas, surgindo de formamais localizada na Ásia e no continente Americano.Embora rara em Portugal, estão descritos algunscasos isolados no Algarve e em imigrantes das ex--colónias. O é o princi-pal agente da schistosomíase urinária, apresentan-do tropismo pelo plexo venoso perivesical.

Apresenta-se o caso clínico de umdoente de 37 anos, raça caucasiana, natural e resi-dente em Portugal, e negando viagens para fora docontinente Europeu, que recorreu ao serviço deurgência apresentando um quadro de hematúriatotal.Foi realizada uretrocistoscopia, evidenciando vá-rias lesões endoluminais polipóides de base alar-gada, submetidas a biópsia por via transuretral.O exame anatomo-patológico revelou tratar-se deschistosomíase urinária, com numerosas formas eovos de .

A schistosomíase urinária pode ter umaapresentação clínica semelhante à neoplasia dabexiga. Apesar de rara nesta zona geográfica, tor-na-se relevante a consciencialização para este tipode parasitose, tendo em conta os crescentes fluxosmigratórios com origem em regiões endémicas.O diagnóstico de schistosomíase urinária numdoente de raça caucasiana, natural e residente emPortugal, e negando viagens para fora do continen-

Schistosoma haematobium

S. haematobium

te Europeu, além de raro, levanta algumas questõesacerca do modo e focos de transmissão conhecidosdo .

schistosomíase, hematúria, bexi-ga, neoplasia

S. haematobium

Schistosomiasis, also known as

bilharziasis, is a parasitic disease of warm clima-

tes. It’s endemic in 76 developing countries. Africa

and Middle East are the most afflicted regions, being

more restrained in the Asian and American conti-

nent. Although rare in Portugal, there are a few re-

ported cases in Algarve and among immigrants

from the former colonies. Schistosoma haemato-

bium is the causative agent of urinary schistoso-

miasis, being attracted to the perivesical venous

plexus.

We present a case report of a 37 year-

old man, caucasian, born and resident in Portugal,

and denying travel outside of Europe, who presen-

ted to the emergency department with total hema-

turia. Cistoscopy showed several endoluminal poly-

poid lesions that were biopsied by transurethral

access. The histological examination revealed uri-

nary schistosomiasis, containing many S. haema-

tobium worms and eggs.

The urinary schistosomiasis may have

a clinical presentation similar to the bladder tumor.

Although rare in this geographical area, it’s impor-

tant to be aware for this kind of parasitosis, in view

Palavras-chave:

Introduction:

Clinical Case:

Discussion:

Abstract

www.apurologia.pt

Casos Clínicos

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of the increasing population flows originating from

endemic regions. The diagnosis of urinary schisto-

somiasis in a caucasian patient, who was born and

resident in Portugal, denying travel outside of Euro-

pe, is uncommon and raises some questions about

the known pathway and transmission sites of S.

haematobium.

schistosomiasis, hematuria, bladder, tu-

mor.

Schistosoma haematobium

S.

mansoni, S. japonicum e S. haematobium

Schistosoma haematobium

S. haematobium

Keywords:

A schistosomíase é uma parasitose provocada pelainfeção pelo tremátodo Schistosoma.As primeiras referências a esta doença remontam àantiguidade existindo ilustrações egípcias datadasde 1534 a.C. que descrevem meticulosamente osseus sintomas. Em 1851, um parasitologista ale-mão a trabalhar num hospital do Cairo, TheodoreBilharz, identificou pela primeira vez formas adul-tas de em autópsias,sendo esta patologia designada também por Bilhar-ziose.Estão identificadas três espécies principais desteparasita responsáveis por infeções no humano (

) .O é o principal agenteda schistosomíase urinária, apresentando tropis-mo pelo plexo venoso perivesical. Esta patologiaestá associada a diversas complicações a nível doaparelho urinário, nomeadamente uropatia obstru-tiva e carcinoma pavimentocelular da bexiga.De acordo com os dados da Organização Mundialde Saúde, estima-se que a schistosomíase afetecerca de 200 milhões de pessoas, das quais, 80 a 90milhões estão infetadas com .Esta patologia permanece endémica em 76 paísesem desenvolvimento, predominando nas regiões daÁfrica sub-Sahariana e do Médio Oriente, seguidasde uma distribuição mais localizada a nível da Amé-rica do Sul e da Ásia .Esta parasitose é rara em Portugal, tal como no re-manescente continente Europeu, estando descri-tos muito poucos casos de Schistosomíase no nos-so país.Uma das primeiras referências bibliográficas a estapatologia em Portugal remonta a 1921, que relataa existência de focos na região de Tavira, correlacio-nados com a imigração de regiões tropicais endémi-cas. Estão também descritos casos no nosso país, deimigrantes das ex-colónias ultramarinas .Descreve-se o caso clínico de um doente de 37anos, raça caucasiana, natural e residente em Por-tugal, a quem foi diagnosticada Schistosomíaseurinária após ressecção transuretral de pseudotu-mor vesical.

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Introdução

Caso Clínico

Doente do sexo masculino, 37 anos de idade, raçacaucasiana, de naturalidade Portuguesa e negandoviagens para fora do continente Europeu, recorreuao serviço de urgência apresentando um quadro dehematúria total. Referia uma história de episódiosde hematúria terminal intermitente nos 6 mesespregressos. Mencionava disúria e sintomatologiaurinária baixa de armazenamento arrastada comcerca de 3 anos de duração.Negava dor abdominal, febre, corrimento uretral,comportamentos sexuais de risco ou alterações doforo gastrointestinal.Antecedentes pessoais ou familiares irrelevantes.Não apresentava quaisquer alterações ao exame ob-jetivo, nomeadamente ao exame abdominal ou dasregiões ano-rectal e genital. Laboratorialmentesem alterações a nível do hemograma, parâmetrosinflamatórios, função hepática ou da função renal.O exame sumário de urina revelava eritrocitúria>100 por campo de grande ampliação. Realizouecografia renal e vesical e radiografia do aparelhourinário que não apresentavam quaisquer altera-ções.Tendo em vista o esclarecimento de um quadro dehematúria macroscópica, foi efetuada Uretrocis-toscopia, que evidenciou várias lesões endolumi-nais polipóides de base alargada, hiperemiadas anível do trígono e das paredes vesicais posterior elateral esquerda (figura 1).Realizou uma tomografia computorizada abdómi-no-pélvica que revelou ausência de hidronefrose,ureter esquerdo moderadamente dilatado a níveldos dois terços distais e espessamento com ligeiro

Figura 1) Uretrocistoscopia: Lesões hiperemiadas de aspeto polipóidenas paredes vesicais posterior e lateral esquerda.

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Casos Clínicos

grau de hiperdensidade da parede vesical lateralesquerda (figura 2).Foi submetido a biópsia vesical por via transuretral,tendo o exame anatomo-patológico fornecido odiagnóstico, ao revelar cistite polipóide crónicacom infiltrado inflamatório de predomínio eosino-fílico associado a reação granulomatosa do tipocorpo estranho com numerosas formas e ovos deSchistosoma, com aspetos morfológicos sugestivosde . Sem evidência de células neo-plásicas (figuras 3 e 4).Os exames culturais de urina, bacteriológico e pa-rasitológico, foram negativos.Com base no diagnóstico de Schistosomíase uriná-ria, realizou terapêutica com Praziquantel em to-ma única (40 mg/kg), constatando-se significativamelhoria da sintomatologia urinária, bem comomelhoria imagiológica do processo de uropatiaobstrutiva e desaparecimento das lesões endovesi-cais em exame cistoscópico após 8 semanas.

S. haematobium

Discussão

EpidemiologiaA Schistosomíase, também designada por Bilhar-ziose, é uma parasitose típica dos climas quentes.Constata-se um claro predomínio no continenteAfricano e Médio Oriente, estimando-se em cercade 200.000 o número de mortes anuais por Schis-tosomíase. Nos países em desenvolvimento, é su-plantada somente pela Malária, no que respeita ataxas de infeção e impacto na saúde pública .Constitui a causa mais frequente de hematúria nasregiões endémicas.Afeta ambos os sexos, com um pico de incidênciana adolescência, na faixa etária entre os 11 e os 15anos.Esta patologia tem vindo a adquirir um crescenteinteresse por parte dos países desenvolvidos, devi-do ao fenómeno da globalização e aos intensos flu-xos migratórios.

1, 2

Figura 2) TomografiaComputorizada: Dilatação doureter esquerdo a nível dos 2

terços distais e hiperdensidadedas paredes posterior e lateral

esquerda da bexiga.

Figura 3) H&E, 20x: Mucosa vesical com inflamação crónica e ovos dena lâmina própria.Schistosoma

Figura 4) H&E, 40x: Ovos de presença deesporão terminal.

Schistosoma haematobium –

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Estão identificadas várias espécies de schistoso-mas: , , ,

, e .O aparelho urinário é infetado somente pelo

, que migra para os plexos venosos vési-co-prostáticos e é eliminado preferencialmente porvia urinária. As restantes espécies afetam predomi-nantemente o sistema digestivo .

Na evolução clínica da Schistosomíase urinária épossível distinguir quatro fases :- Eritema e prurido cutâneo algumas horas após ocontacto com água contaminada;- Fase toxémica, 4 a 8 semanas após a infeção,coincidindo com a primeira deposição de ovos doparasita. Pode ser assintomática ou provocarmesmo Síndrome de Katayama, caracterizado porfebre, urticária, cefaleias, artralgias, dor abdomi-nal, esplenomegália, linfadenopatias e eosinofilia;- Um estadio mais avançado, correspondente à eli-minação de ovos na urina, ocorre meses ou mesmoanos após a exposição ao parasita, predominandoa sintomatologia urinária. A hematúria terminale intermitente é o sinal mais relevante, podendoser acompanhada de LUTS (

) irritativos como frequência urinária,dor suprapúbica com a micção ou disúria. Umabexiga contraída, de baixa capacidade, pode ser ob-servada neste estadio, quando o volume de elimi-nação dos ovos atinge o seu máximo (dor pélvica esuprapúbica, urgência e incontinência). Nesteestadio, os ovos de Schistosoma podem ser diag-nosticados na urina. A colheita deve ser realizadaentre as 11h e as 14h, correspondente ao períodocircadiano de maior excreção;- A uropatia obstrutiva por Bilharziose surge, nahistória natural da doença, alguns anos após a infe-ção. É provocada pela reação inflamatória intensa epelas lesões fibrosas irreversíveis em resposta aosovos do parasita. As lesões mais frequentes nestafase, são a esclerose e calcificação da parede vesicale ureteral e a estenose ureteral. Esta última apre-senta significativa relevância prognóstica. Habi-tualmente assintomática, pode ser bilateral e cul-minar em insuficiência renal crónica. Atinge maisfrequentemente o ureter terminal justavesical.Outra das consequências patológicas possíveis daSchistosomíase é a neoplasia da bexiga, predomi-nantemente o Carcinoma Pavimentocelular. No en-tanto, verifica-se uma superior incidência de Car-cinoma de Células de Transição da bexiga nos doen-tes infetados por , comparativa-mente aos não infetados, sendo nestes casos maisagressivo, apresentando maior probabilidade de re-cidiva e surgindo em faixas etárias tendencial-mente mais jovens .

S. mansoni S. japonicum S. mekongi S. hae-

matobium S. intercalatum S. mattheei

S. hae-

matobium

Lower Urinary Tract

Symptoms

S. haematobium

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Clínica

Patogénese

Diagnóstico

Os ovos do parasita depositam-se o mais próximopossível do urotélio. Durante a infeção activa, osovos provocam significativa irritação dos tecidos. Oexame microscópico revela agregados polipóidesconstituídos por granulomas separados por tecidode granulação edemaciado e infiltrados por eosinó-filos, linfócitos e plasmócitos. Estes granulomascompostos podem mesmo formar lesões semelhan-tes a abcessos, preenchidos com eosinófilos e ovos.As formas adultas residem, habitualmente, em pe-quenas veias .Estas lesões polipóides podem provocar obstruçãoureteral ou, raramente, obstrução ao esvaziamentovesical.Os ovos calcificados e rodeados por tecido fibrosodenso, provocam uma reação inflamatória crónica,promovendo a proliferação e a metaplasia da muco-sa e potenciando o desenvolvimento de neoplasia,predominantemente Carcinoma Pavimentocelular.Várias teorias propostas sugerem que estes liber-tam substâncias que promovem a atividade onco-génica de outros agentes carcinogénicos .

Os exames laboratoriais podem revelar-se úteis. Ohemograma pode evidenciar leucocitose, eosino-filia e anemia normocítica hipocrómica. Em fasesavançadas pode existir alteração da função renal. Oexame sumário de urina tipo 2 pode revelar eritro-citúria e piúria, sendo expectável não apresentarqualquer alteração numa fase crónica .Os exames complementares de imagem, como a ra-diografia simples do aparelho urinário, a ecografiareno-vesical e a urografia endovenosa, permitemavaliar essencialmente os efeitos e complicaçõesda parasitose. A apresentação clássica de bexigacalcificada ou “bexiga em porcelana” é altamentesugestiva da doença. A urografia endovenosa poderevelar hidronefrose, hidroureter, estenose urete-ral e defeitos de preenchimento vesical ou ureteral.A cistografia permite avaliar a redução da capaci-dade vesical, devendo os defeitos de repleção seresclarecidos com cistoscopia.Os exames endoscópicos possibilitam a visualiza-ção direta das lesões e a obtenção de biópsias. Naprimeira fase da doença, é possível visualizar gra-nulomas, erosões e congestão da mucosa. Numafase posterior, é possível a identificação de zonas demucosa brilhante com aspeto de granitado sub-mucoso ( ), que correspondem à de-posição de ovos calcificados, principalmente emtorno do cólo vesical e meatos ureterais; tubércu-los amarelados de halo hiperémico e “úlceras lacri-mejantes”, com localização predominante a nívelda cúpula vesical, designadas desta forma pela ima-gem de gotejo hemático obtida com a distensão

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sandy patches

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vesical. As lesões papilares, eritematosas inflama-tórias são visualizadas predominantemente na cú-pula e paredes laterais. De salientar o facto de quena Schistosomíase vesical podem coexistir lesõesem diferentes estadios de evolução.O diagnóstico definitivo é dado pela presença degranulomas e ovos de em biópsias ve-sicais .

O fármaco de eleição para o tratamento da Bilhar-ziose é o Praziquantel, administrado na dosede 40 mg/kg em toma única ou repartido em 2 do-ses (2 doses de 20 mg/kg num dia). A sua escolhadeve-se ao facto de ser eficaz no tratamento das trêsespécies que infetam habitualmente o Homem.O sucesso terapêutico é determinado pelo desapa-recimento dos ovos na urina. Importa salientar quenenhum dos fármacos reverte as sequelas da infe-ção ou previne a re-infeção .O tratamento cirúrgico deve ser equacionado paraas complicações decorrentes do processo inflama-tório crónico, como é o caso da estenose ureteral,refluxo vésico-ureteral, bexiga de baixa capacidadecom significativa repercussão na qualidade de vida,úlcera lacrimejante ou carcinoma pavimentocelu-lar.

A Schistosomíase urinária, apesar de rara nestazona geográfica, pode ter uma apresentação clíni-ca semelhante à neoplasia da bexiga, devendo ser aprimeira hipótese diagnóstica a equacionar emdoentes com hematúria, provenientes de regiõesendémicas.Apesar dos esforços desenvolvidos pela Organiza-ção Mundial de Saúde, em que se salientam a inves-tigação para o desenvolvimento de uma vacina, ascampanhas de instrução às populações e campa-nhas escolares de administração de Praziquantelem massa, nos países endémicos, a erradicação dadoença é atualmente improvável.Deste modo, torna-se cada vez mais relevante aconsciencialização da comunidade médica, no-

Schistosoma

per os

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Tratamento

Conclusão

meadamente urológica, para este tipo de parasito-se tipicamente tropical, tendo em conta os cres-centes fluxos migratórios com origem em regiõesendémicas.O diagnóstico de Schistosomíase urinária numdoente de raça caucasiana, natural e residente emPortugal, e negando viagens para fora do continen-te Europeu, região não endémica, além de raro, le-vanta algumas questões acerca do modo e focos detransmissão conhecidos do .

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Referências

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