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Sale and Lease Back ULP - Universidade Lusófona do Porto “Sale and Lease Back” Mestrado de Direito - Jurídico Forenses IDP I - Instituições de Direito Privado I Fernando Américo Magalhães Ferreira Outubro de 2009 1

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UNIVERSIDADE LUSÓFONA DO PORTOSale and Lease BackMestrado: Jurídico Forenses 2008/2009disciplina: Instituições de Direito Privado Idocentes: Almeno de Sámestrando: Fernando Américo Magalhães Ferreira

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Sale and Lease Back

ULP - Universidade Lusófona do Porto

“Sale and Lease Back”

Mestrado de Direito - Jurídico Forenses

IDP I - Instituições de Direito Privado I

Fernando Américo Magalhães Ferreira

Outubro de 2009

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Sale and Lease Back

Índice

I. NOTA PRÉVIA....................................................................................................3

II. INTRODUÇÃO................................................................................................... 4

III. BREVE REFERÊNCIA HISTÓRICA E ASPECTOS PRÁTICOS.....................6

IV. CARACTERIZAÇÃO GERAL DO SALE AND LEASE BACK.......................8

Caracteristicas e pontos comuns...........................................................................9

A questão da opção de compra...........................................................................10

Ponto de vista pessoal sobre a opção de compra................................................11

Pacto de recompra..............................................................................................12

V. NATUREZA . POSIÇÕES DOUTRINÁRIAS..................................................13

Leasing e Sale and Lease Back são a mesma coisa............................................14

Sale and Lease back é um negócio indirecto......................................................16

VI. A QUESTÃO DO PACTO COMISSÓRIO........................................................18

VII. BREVE ALUSÃO DA RESOLUÇÃO DE CONTRATO..................................22

VIII. CONCLUSÕES / POSIÇÃO ADOPTADA.......................................................24

IX. BIBLIOGRAFIA .............................................................................................. 27

Outros trabalhos.................................................................................................28

Acórdãos............................................................................................................28

Legislação..........................................................................................................28

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Sale and Lease Back

I. NOTA PRÉVIA

Não sendo o direito a-histórico, deve ser o reflexo das relações que emergem da sociedade

num determinado momento, e por consequência não deve ser criado direito em contra

corrente aos comportamentos tidos como licitos pela comunidade.

Na conjuntura actual de crise global, e a escassez de meios de financiamento tradicional,

coloca o “sale and lease back”1 como uma alternativa vantajosa para as partes contratantes.

Uma das missões do gestor, é maximizar a rentabilidade dos recursos disponíveis.

1 As designações de “leasing” / locação financeira, assim como “sale and lease back” / locação financeira restitutiva, serão utilizadas no decorrer do estudo tanto na versão inglesa como na portuguesa. Prefere-se designar de “ Sale and Lease Back” em vez da tradução “Locação Financeira Restitutiva”, e locação financeira em vez de “leasing”, por razões que decorrem do conceito originário, mas sem grande cuidado de coerência.

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Sale and Lease Back

II. INTRODUÇÃO

1. O “Sale and Lease Back”2, basicamente consiste na venda de um bem a uma empresa de

financeira com a intenção de recompra3 através de locação financeira. O locatário,

apesar da venda, continua a utilizá-lo.

2. Para o locatário, a grande vantagem é que obtém liquidez imediata, sem ter que abrir

mão de um activo, de que continua a ter o gozo. Pois no SLB, diferentemente da locação

financeira, o bem já está a ser utilizado pelo locatário. Pode acontecer que o locatário

utilize a liquidez gerada pela venda do bem, para realizar outro novo investimento, mas

não para o gozo de um bem de que já goza, La Palisse não diria melhor.

3. Para o locador, sendo o titular da propriedade do bem locado, tem a grande vantagem do

bem servir muito mais que garantia, sem as complicações de uma garantia real, como

por exemplo uma hipoteca, que é a garantia tipica de um empréstimo. No SLB, o

locatário transfere para o locador a propriedade de um bem, que a maioria da doutrina

defende que é a título de garantia do crédito obtido.

4. Na opção de compra, o único que se vincula é o locador. Se o locatário não optar pela

compra, ou não cumprir o contrato de locação financeira, o locador não precisará de

outra garantia4, tem o bem, muito embora não seja esse o seu escopo.

5. Muito embora este tipo de financiamento também se aplique a particulares, tem grande

impacto nas empresas. Quando por exemplo uma sociedade necessita de um

determinado bem, dependendo do fim que visa satisfazer, tem basicamente três

alternativas: a). Compra-o com o seu fundo de maneio. b) Contrata um empréstimo. c)

Celebra um contrato de locação financeira. Noutra perspectiva, uma sociedade pode

garantir o seu equilibrio financeiro, ou rentabilizar o seu imobilizado: a) Reorganizando

o seu endividamento, transformando dividas de curto prazo em médio e longo prazo. b)

Ou através da venda definitiva, por regra, de activos não afectos à actividade principal.

c) Ou recorre ao SLB de activos, neste caso normalmente afectos às sua actividade.

2 De ora em diante SLB3 Esta não é o conceito tradicional, mas prefiro referir recompra do que apenas opção de compra, pois na prática, quem recorre ao “sale and Lease back”, não tem a intenção de se desfazer definitivamente do bem.4 Na prática sabemos que não é assim que se passa, a entidade financeira por vezes, dependendo da segurança que o cliente lhe merece, exige que o locatário mais se obrigue, agora sim, com a função clara de garantia.

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Sale and Lease Back

6. Em termos económico-financeiros, mais propriamente na gestão de recursos disponíveis,

em boa verdade, não restam dúvidas que o SLB é um meio de financiamento, e se for em

situação de crise, mais para suprir défices de tesouraria do que para realizar um

investimento gerador de riqueza. De facto, uma situação de crise, por exemplo como a

que actualmente atravessamos, muito dificilmente se conseguirá justificar um

investimentto para aumento de capacidade produtiva, e se for apenas para redução de

custos, constacta-se que a banca protege-se do risco do incumprimento de um contrato

de empréstimo, exigindo, para além de garantias reais da sociedade, avales pessoais dos

responsáveis. O decréscimo acelerado do volume de negócios, leva a um défice de

tesouraria. Acontece que nestas situações, por um lado, a banca não está muito

disponível para aumentar o seu envolvimento, tendo relutância em emprestar para suprir

défices de tesouraria, por outro, a sociedade tem relutância em alienar parte do seu

património a preços abaixo do seu valor. Nestas circunstâncias o recurso ao “sale and

lease back” é uma forma de obter uma liquidez,

7. Sabemos, e nesta conjuntura de crise e défice orçamental, até as pessoas colectivas

públicas, são “tentadas” a financiar-se através desta modalidade5, seja porque de outra

forma não obteriam receitas para as suas despesas, seja porque politicamente serve para

mascarar um défice excessivo6.

8. Como ensina Almeno de Sá, a locação financeira é um contrato de financiamento em

sentido lato7, mas na realidade, a doutrina não é unânime quanto à natureza deste

contrato, e o consequente regime a aplicar, de que decorrem perguntas a responder:

É um verdadeiro contrato de Locação Financeira ?

É um esquema de alienação em garantia?

Ofende a proibição do pacto comissório?

É um negócio indirecto de contrato de mútuo ?

5 http://www.portugal.gov.pt/pt/GC16/Governo/ConselhoMinistros/ComunicadosCM/Pages/20041125.aspx“(…) 16. Resolução do Conselho de Ministros que autoriza a alienação bens imóveis pertencentes ao património de determinados institutos públicos, bem como o arrendamento (leaseback) de bens imóveis pelos institutos públicos anteriores proprietários. (…) A operação financeira que envolve os activos imobiliários do domínio privado do Estado e do património próprio dos institutos públicos responde em justa medida a desideratos de maximização da rentabilização dos recursos patrimoniais imobiliários.(…)

6 Tribunal de contas , Acórdão .º 38/2007 - 01.Mar.2007 - 1ªS/SS7 Curso de mestrado de direito, Instituições de Direito Privado, Universidade Lusófona do Porto, 2008/2009

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III. BREVE REFERENCIA HISTÓRICA E ASPECTOS PRÁTICOS

Breve referência histórica.

Esta figura, não é recente, já existem referências a este tipo de contrato no tempo da

Suméria, mais de dois mil e quinhentos anos antes de Cristo. Na realidade, o SLB é mesmo

anterior ao leasing, pelo menos é o que nos é dado a conhecer pelos documentos

encontrados da antiguidade. Uma venda, continuando o antigo proprietário a usufruir do

bem, pagando ao novo dono prestações durante um prazo, para no final o readquirir. O

novo dono não tinha por intenção ficar com o bem, o que queria era ganhar com a cedência

do seu gozo. O antigo titular do bem pretendeu obter liquidez, sem se desfazer dele

definitivamente, nem do seu rendimento.

Mas a sua versão actual e notoriedade reporta ao final do século XIX e inicio do século

XX, nos Estados Unidos da América, mas não nos vamos deter sobre este aspecto.

O Sale and Lease back

Em condições normais, já o disse, o proprietário que contrata um “sale and lease back”, não

se quer desfazer do bem, se o pretendesse em vez desta alternativa, optaria pela alienação

pura e simples, e neste caso, evitaria os custos da remuneração do locador. Fá-lo por

variadas razões, principalmente porque: a) Não quer abrir mão do bem definitivamente,

precisa dele para manter o seu negócio, e pretende na maioria das vezes, simplesmente

obter liquidez, para suprir algum défice de tesouraria que acredita ser temporário. b) Ou

ponderando a alternativa de o alienar, a conjuntura de mercado não é favorável à alienação

de bens, e mantém o bem na expectativa de aguardar melhores dias.

Assim, a característica essencial do SLB, não será apenas o gozo do bem, mas a venda de

um activo sem se desapossar8 dele, continuando com o seu gozo e usufruir da sua

rentabilidade.

O Leasing

A característica essencial do contrato de locação financeira, tem a ver com o gozo de um

bem pelo locatário, e que vir a ser seu proprietário não é facto preponderante, mas que lhe

8 Sabemos que a posse de uma coisa, não necessita da titularidade da sua propriedade

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Sale and Lease Back

interessa usufruir com a finalidade de obter lucro directamente desse gozo.

Ora é nesta característica do gozo de um bem que existe a grande diferença entre a Locação

Financeira e o SLB. É que o locatário, neste caso, já tem o gozo do bem, já obtem

rendimento dele. Então o verdadeiro fundamento deste tipo de contrato não será

simplesmente o gozo, mas outra coisa. O que pretende é obter liquidez, e normalmente não

pretende desfazer-se definitivamente do bem, se o quizese simplesmente o alienaria, …

definitivamente.

Contabilisticamente a locação financeira, porque na prática, ocorre materialmente a

compra de um activo: O locador deve, no momento inicial do contrato, afectar o seu

património, acrescentando ao seu activo o valor do bem contratado, como se fosse

propriedade sua, devendo também registar no passivo igual valor. À medida que vai

pagando as rendas, deve contabilizar separadamente custo financeiro e a amortização de

capital, como se fosse, por analogia, … um empréstimo. Do lado do activo, deve proceder

às depreciações legais, consoante preveja adquirir o bem no final do contrato, ou não. Neste

caso o prazo é o prazo do contrato, naquele caso, se pretende adquirir, o prazo será o prazo

normal de depreciação normal o tipo de bem.

Contabilisticamente, é muito distinto da locação operacional, pois neste caso o locatário

regista as rendas totalmente como custo, e o locador regista o bem no seu activo.

No caso do Sale and Lease back, o bem, apesar da venda, nem chega a sair do activo9.

Aplicam-se as mesmas normas contabilisticas do leasing, com uma única diferença, é que o

bem já existia no activo do locatário, e mantém-se no activo, … apesar da venda.

Estas regras também são adoptadas nos contratos públicos10

A Contabilidade Pública, faz uma tipificação distinta de locação, locação financeira e

Locação–venda, nos contratos públicos, que constatamos no Diário da República, 2ª série,

nº 156 de 14 de Agosto de 2006, página 14996, pelo que se depreende que locação

financeira (leasing ) e locação-venda ( sale and lease back ), não são a mesma coisa.

IV. CARACTERIZAÇÃO E NATUREZA DO SALE AND LEASE BACK

9 Norma legal contabilística, directiva 45 Sistema nacional contabilistico.10 Diário da República, 2ª série, nº 156 de 14 de Agosto de 2006, página 15101.

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Sale and Lease Back

Antes de passar ao estudo das diferentes posições doutrinárias, vamos tentar caracterizar o

contrato de que estamos a apreciar.

Como referi, aprioristicamente o contrato de locação financeira é o que desde logo se

assemelha ao “sale and lease back”, e por consequência vamos atinar fundamentalmente na

averiguação da natureza do contrato de “Sale and lease back”, identificando quando

oportuno aspectos relevantes para este estudo, nomeadamente da pertinência com a locação

financeira, cujo regime está regulado pela lei 149/95 de 24 de Junho, e sucessivas

actualizações.11

Almeno de Sá propõe desde logo distinguir a Locação Financeira em dois grupos12: a) Um

Empresarial, para o investimento, valores mobiliários (…). b) e outro de Bens de consumo,

para a aquisição de habitação, veículos (…)

E isto é importante, pois se trata a locação financeira de bens de consumo, tem

comulativamente que obedecer à Lei do crédito ao consumo.

O “leasing” é uma forma de “consumo de crédito” e temos que chamar à colação a lei do

crédito ao consumo, que de forma suscinta tem algumas particularidades, como por

exemplo: a obrigatoriedade da redução a escrito, assinatura das partes, a obrigatória a

entrega de exemplar ao consumidor, cuja não entrega provoca a nulidade do contrato. A

nulidade por vício de forma, só pode ser invocada pelo locatário, e esta exigência tem

paralelismo com o contrato promessa.

Deve-se pois articular o artº 3º da lei da locação financeira com a lei do crédito ao

consumo.

Sendo subsumivel nas duas leis, aplicar-se-á em 1º lugar a lei do crédito ao consumo e só

depois a lei da locação financeira.

Defende-se que o próprio contrato de locação financeira não é um verdadeiro contrato de

locação. Do ponto de vista do professor referido, é um contrato de financiamento, ou seja,

um contrato de crédito em sentido amplo, e esta coincide, como já referi na introdução, com

a posição da maioria dos gestores e economistas, e com a maioria da doutrina.

11 149/95 de 24 de Junho ( diploma base ), 285/2001 de 3 de Novembro, 265/1997 de 2 de Outubro, 30/2008 de 25 de Fevereiro.12 Almeno de Sá, Instituições de Direito Privado ,Curso de Mestrado de Ciências Juridico forenses, Universidade Lusófona do Porto, 2008/2009

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Sale and Lease Back

Resumidamente teremos em sentido amplo, o financiamento para resolver determinados

problemas financeiros, onde se incluem o leasing e o factoring de entre outros, e em sentido

restrito a entrega de dinheiro. Na realidade, através da “intermediação” de uma entidade

financeira, o fornecedor tem a vantagem de receber “ a pronto” o preço do bem, e o

locatário obter o bem sem o esforço financeiro da imobilização de capital por esse

pagamento a “pronto” ou as complicações de outras formas tradicionais de crédito.

O fornecedor vê facilitada a venda dos seus bens, e recebe de imediato o preço, o banco

realiza um negócio de onde retira rendimentos, e na pior das hipóteses ficará com um bem

nas suas mãos, que terá que vender a outrém se o locatário não cumprir, e o locatário goza

dos rendimentos de um bem, que em princípio se deve pagar a ele próprio, é essa a

intenção. Muito provável que em muitas situações, de outra forma tal desiderato não seria

atingido.

Na realidade o banco, não quer adquirir o bem para si, não pretende usufruir das suas

qualidades, o que o banco pretende é que o locatário pague as rendas todas, e que fique com

o bem, e não que no final do contrato o locatário lhe restitua esse mesmo bem.

Prova desta intenção, são os acórdãos que validam as cláusulas que estipulam o vencimento

antecipado de todas as rendas, como alternativa à resolução no caso de incumprimento do

locatário ( Raquel Tavares Reis13 referindo o estudo de Rui Pinto Duarte )Este fcato,

também serve para reforçr a posição de que as rendas nõa tê a mesma natureza da locação

simples, onde as rendas vincendas não são exigíveis.

Caraterísticas da locação financeira e pontos comuns com o “Sale and lease back”

Retira-se da lei da locação financeira, as seguintes características essenciais, que para melhor percepção apresentamos esquematicamente:

1. Obrigação de ceder o gozo de uma coisa2. O locador é e continua a ser o proprietário da coisa locada3. O gozo é temporário4. O gozo é retribuído5. O bem, obejcto do contrato é adquirido por indicação do locatário6. O locatário pode adquirir o bem decorrido o prazo

13 Reis, Raquel Tavares, “O Contrato de locação financeira no direito português: elementos essenciais”, Revista de Gestão e Desenvolvimento, 11, 2002, página 138 e 139

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Sale and Lease Back

7. O preço está ou é predeterminável pelo contrato

Há uma coincidência nos elementos essenciais, e a única diferença é o facto de no Sale

and Lease back , o fornecedor e o locador são a mesma pessoa física.

De facto a principal divergencia doutrinal está no carácter tripartido do leasing e apenas

bipartido do SLB. Mas será mesmo assim ? Se tomarmos à letra o plasmado no artº 1 da lei

da Locação financeira, poderemos afirmar que há a necessidade de três sujeitos distintos ?

Alguns autores, nomeadamente para Sebastião da Nobrega Pizaro e Raquel Tavares Reis, a

relação tripartida é condição tipificante da locação financeira, e por consequência o SLB,

não se subsume na lei da locação financeira, remetendo para a venda e para a locação,

previstos nos artºs 874º e 1022º do código civil.

Para outros, por exemplo Diogo Leite Campos, Gravato Morais e Pestana de Vasconcelos,

o carácter trilateral não é requisito essencial, nem resulta obrigatório do regime jurídico da

Locação financeira, defende que o SLB é apenas uma modalidade da locação financeira.

Neste sentido o acórdão do STJ de 28 de Outubro de 1999, processo nº 99B635

A opção de compra

Um outro aspecto é tentar perceber a natureza da opção de compra no leasing e no sale and

lease back.

No leasing, decorre directamente do artº 1º do D/L 149/95, que nos diz claramentte que o

locatário “ pode comprar”, o mesmo é dizer, que compra se quizer e se quizer não compra.

Ora aqui esta uma característica que faz aproximar a Locação Financeira mais do “ hire-

purchase” ou seja, locação-compra. O que significa que o “nosso” Leasing na sua tradução

de locação financeira, aproxima-se mais do “consumo de crédito”14 do que uma pura

necessidade de gozo de um bem para obter dele rendimento, sem necessidade de o adquirir.

O facto de ser opção e não acordo de compra, distancia os contratos de locação financeira

da venda a prestações com reserva de propriedade

14 Razão tem Almeno de Sá

10

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Sale and Lease Back

Não esqueçamos que a opção de compra no termo do contrato é exercida através de um

novo contrato de compra e venda, ou seja, não é pelo simples facto do contrato de locação

financeira ter chegado ao seu termo que a opção se torna eficaz.

Esta opção de compra é um direito potestativo do locatário, que da parte do locador é uma

sujeição, a de vender no termo do contrato, prestação que se vinculou unilateralmente.

Se o locatário não exercer o seu direito, tudo fica como está, o locador continua com o bem

e o locatário fica obrigado a restituir o bem e desobrigado do contrato. Mas se optar pela

compra, tem que agir no sentido de celebrar outro contrato, neste caso de compra e venda.

Gravato de Morais defende outra solução, diz que estamos perante uma obrigação

alternativa ( artº 543º CC ), pois existem pelo menos duas alternativas, e o locatário tem

pois a faculdade de adquirir, realizando o novo contrato de compra, ou de não adquirir, e o

contrato de locação financeira caduca, obrigando-o a restituir o bem.

O meu ponto de vista sobre a questão da opção de compra no Sale and Lease Back.

No entanto, na esteira do conceito que ousei apresentar na introdução deste trabalho,

normalmente no “sale and lease back”, esta opção é transformada num acordo de compra

ou pacto de retoma15, traduzido, por exemplo, num contrato de promessa de compra venda

celebrado simultaneamente com os contratos de compra venda do bem e do contrato de

locação financeira, que vêm reforçar a defesa da classificação do SLB como união de

contratos e não como um contrato misto.

O pacto de retoma tem uma lógica, e é, podemos dizer, condição obrigatória,

principalmente quando o bem tem especifidades únicas, que a mais ninguém interessa que

não seja ao locatário/vendedor.

Teoricamente, e apenas teoricamente, o termo do contrato coincide com o termo da vida

útil do bem, sendo o seu valor se não nulo, pelo menos de valor muito reduzido. Na prática,

por via de regra isso não sucede, não terá terminado o periodo de vida do bem.

15 Nenhuma da Doutrina que tive acesso não refere este aspecto, mas na prática assim acontece.

11

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Sale and Lease Back

E o locatário, no seu perfeito estado de juízo, não abdicará da compra, seja para si

directamente ou para a esfera de sua influência, possibilidade esta consagrada na própria

lei.

A radicalização de exemplos, quase sempre ajuda a perceber os pontos de vista, e

tomemos o seguinte exemplo do SLB de uma Marca.

A Marca, ou melhor o seu valor que se consubstancia no “goodwill”, bem intangível, é um

bem que não pertence ao activo imobilizado16, não aparece numa conta de balanço, mas a

verdade é que se calhar, é o único bem de uma sociedade que é eterno.

Imaginemos que é a Marca de uma sociedade que é o objecto mediato do “sale and lease

back”. Não passa pela cabeça de ninguém, que o proprietário da Marca, a venda, que com o

apuro da venda, a rentabilize e a valorize, e no termo do contrato de leasing, valendo a

Marca muitíssimo mais, abdique de a comprar pelo valor residual e a dê de barato ao

locador !!

Pelo contrário, fácil é de ver, que o vendedor/locatário, queira garantir através de uma

cláusula de pacto de retoma a compra da “sua” Marca, que tanto serve de garantia para o

locador, admisssível na lei da locação financeira, como para o vendedor.

Neste exemplo, podemos então verificar que existe uma diferença substancial entre a

simples locação financeira e a locação financeira restitutiva.

Neste pressuposto, a opção de compra no termo do contrato de “ sale and lease back”, é

uma mera figura de retórica, mas indispensável para que se possa enquadrar o contrato de

“sale and lease back”, no contrato de locação financeira.

Vamos analizar o pacto de retoma17

No pressuposto que o pacto de retoma é uma forma de garantia, quem a presta é o próprio

fornecedor/vendedor, que no caso do “sale and lease back” é o locatário. E essa garantia

serve para o incumprimento, ou para a opção de compra.

Podemos contrapor o pacto de retoma com a venda a retro, prevista no artº 927º CC.

16 Mas que é registado contabilisticamente noutros sistemas, nomeadamente americano.17 Pode por-se a questão de ser uma verdadeira garantia

12

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Sale and Lease Back

A diferença é que o vendedor na venda a retro tem a faculdade, e no pacto de retoma o

vendedor tem a obrigação. Mas o que acontece é que o pacto de retoma no “sale and lease

back”, ao contrário da locação financeira simples ( leasing), é mais uma garantia para o

locatário que para o locador. Este, como já tivemos oportunidade de verificar, já é o

proprietário do bem locado.

V. NATUREZA JURÍDICA – POSIÇÕES DOUTRINÁRIAS

O tipo legal de contrato que o SLB mais se aproxima, e que a maioria da doutrina defende

que se subsume numa das suas modalidades, é o contrato de Locação Financeira, cujo

regime está previsto no D/L nº 149/ 95 de 24 de Junho, actualizado pelo D/L nº 30/2008 de

25 de Fevereiro.

Artº 1º - Noção

Locação financeira é o contrato pelo qual uma das partes se obriga, mediante retribuição, a ceder à outra o gozo temporário de uma coisa, móvel ou imóvel, adquirida ou construída por indicação desta, e que o locatário poderá comprar, decorrido o período acordado, por um preço nele determinado ou determinável mediante simples aplicação dos critérios nele fixados.

Fácil é de ver que a noção, no mínimo controversa, que apresentei na introdução deste

modesto trabalho, é bem diferente. A noção que apresentei é a noção não jurídica mas, de

acordo com a impressão do destinatário18, é a que as partes visam atingir.

Mais adiante estaremos em condições para estabelecer um conceito jurídico de Locação

Financeira Restitutiva, a tradução de “Sale and Lease Back”, fornecida por Leite Campos19.

Se em termos económico-financeiros é mais uma forma de obter liquidez, em termos

jurídicos, coloca-se a questão de saber se é uma modalidade de locação financeira, ou outra

coisa. Das posições seguidas pela doutrina podemos identificar basicamente duas, que

vamos analisar.

a) Uma que identifica “o sale and lease back” como uma das modalidades de “leasing”, e consequentemente regulada sem reservas pela lei da locação financeira.

b) Outra que defende que o “sale and lease back” não é uma verdadeira locação financeira mas na realidade um contrato indirecto de financiamento, sendo a venda uma garantia

18 Artº 236º do código Civil19 Campos, Diogo Leite Campos, “ nota sobre a admissibilidade da locação financeira restitutiva ( lese back), no direito português, 1982.

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prestada ao credor. Neste caso coloca-se a questão da proibição do pacto comissório20 que também vamos necessáriamente analisar.

A questão coloca-se porque o “sale and lease back”, não tem consagração normativa no

direito português.

Vamos então apreciar as diferentes posições das duas principais Doutrinas

Como já se referiu, uma defende que o Sale and Lease Back se subsume na locação

financeira, e outra doutrina rejeita esta posição e entende que o Sale and Lease Back é um

contrato indirecto de crédito e que a venda consubstancia uma alienação em garantia.

a) “Leasing” e “sale and lease back” são a mesma coisa.

“A modalidade de locação conhecida como sale and lease back, apenas diverge da operação típica de leasing, por haver confusão nas pessoas do vendedor e do locatário (…)“21

Cumpre então, primeiro, como ponto de partida, esclarecer sobre alguns aspectos

fundamentais relativos ao leasing.

Parte da Doutrina, de entre outros Diogo Leite de Campos, Duarte Pestana de Vasconcelos,

Calvão da Silva e Rui Pinto Duarte, Gravato Morais, defendem que no “sale and lease

back”, tudo se passa como se fosse um verdadeiro contrato de leasing, sendo a única

diferença, o facto do locatário ser não só quem indica o bem, mas o próprio fornecedor.

Na lei nada obsta a que o fornecedor não possa ser o locatário.

Como poderemos classificar o Sale and Lease back ?

No Leasing, existem dois contratos, mas apenas existe um contrato de locação Financeira

entre o Locador e o Locatário, sendo a compra do bem entre o formecedor e o locador.

No “Sale and Lease Back”, entre o locador, e o locatário, que é ao mesmo tempo

fornecedor, existem igualmente dois contratos, interdependentes, por isso em inglês se diz “

sale and lease back” e não apenas “lease back”: Um contrato de compra venda e um

contrato de locação financeira do mesmo bem

20 E do pacto marciano mas que neste trabalho não vamos apreciar, mas cujas conclusões doutrinárias apontam para as mesmas do pacto comissório21 Pestana de Vasconcelos, Duarte Vieira, “ A locação Financeira”, 1985

14

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Sale and Lease Back

Estamos perante uma união de contratos22, que mantêm a sua individualidade, o de compra

e venda e o de locação financeira, simultâneos, e dependentes, ligados entre si por um nexo

funcional. Um não se celebra sem o outro. Não se trata de um contrato misto, onde se

reuniriam elementos de dois ou mais contratos típicos

Principais argumentos a favor desta posição

Os seguidores desta doutrina sustentam a sua posição essencialmente em três argumentos:

O 1º argumento refere-se ao plasmado no artº 1º da lei da locação financeira, quanto à

selecção do equipamento, que nos diz que o bem é “(…) adquirido por indicação do

locatário”. Nestes termos, o Sale and Lease Back vai contra o princípio da locação

financeira? Entende-se que não, pois a lei não impõe que o fornecedor e o locatário sejam

distintos, só obriga o locador a comprar determinado bem indicado pelo locatário. Neste

sentido o Acórdão da Relação de Lisboa de 18 de Março de 1999, refª JTRL002748223.

O 2º argumento tem a ver com a estrutura do negócio: a) Tanto o leasing como o sale and

lease back, têm sempre dois contratos. Um de compra e venda, entre o fornecedor e o

locador, que opera a transferência imediata e sem reserva da propriedade, aplicando-se o

regime previsto no artº 874º CC e obedece a forma especial, nos termos do artº 875º, ou

seja, escritura pública ou, de acordo com o D/L 116/2008, documento autenticado.

Outro de locação financeira, entre o locador e o locatário

O 3º argumento relaciona-se com o número de sujeitos intervenientes: O leasing tem três

sujeitos contratantes, o locatário, o fornecedor, e o locador. No sale and lease back, também

existem três sujeitos contratantes, sendo que a diferença é que neste apenas são duas

pessoas físicas e naquele são três, pois como já vimos, o fornecedor e o locatário são a

mesma pessoa no Sale and lease back.

Devemos ainda salientar que, como refere Almeno de Sá, “sendo o sale lease back um

contrato mais simples”, existem cláusulas características do contrato de leasing que não se

aplicam, por exemplo o Artº 13º da lei da locação financeira, quanto aos direitos do

22 Morais Antunes, Ana Filipa, “ O contrato de locação financeira restitutiva, Univ. Católica, Lisboa, 200823 “ sumário: I - Quer o locador, quer o locatário podem fornecer os bens locados. II - A locação financeira não é só a modalidade em que o utente obtém, em locação financeira, um bem móvel ou imóvel adquirido pela sociedade de locação financeira a um terceiro, ou mandado construir por ela mesma. III - O bem, móvel ou imóvel, pode ser adquirido pela sociedade de locação financeira ao utente.IV - Esta modalidade, denominada "sale and leaseback" , nos países anglo-saxónicos ("locação financeira restitutiva") tem grande importância prática.”

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Sale and Lease Back

locatário e do fornecedor. Não faz sentido no “sale and lease back”, pois o fornecedor e o

locatário são a mesma pessoa física

Em conclusão, o “sale and lease back”, não viola o principio constante da norma do artº 1º

da lei da locação financeira, e por isso considera esta doutrina uma modalidade de locação

financeira e não um contato com outra natureza.

b) O “sale and lease back” é um negócio indirecto de contrato de empréstimo

Outra doutrina defende que se trata de um negócio indirecto, de contrato de empréstimo,

sendo o contrato de compra venda uma forma de garantia desse contrato indirecto de

empréstimo, e neste caso, coloca-se a questão da ilicitude do “ sale and lease back”

considerando a proibição do pacto comissório e mesmo do pacto marciano24.

Neste sentido o Acórdão nº 38/2007 de 1 de Março de 2007 do Tribunal de Contas25.

Nota: Buscar jurisprudência nesta jurisdição serve pelo menos para ajudar a perceber os

diferentes entendimentos sobre a matéria em apreço

Vistas bem as coisas, o locatário não pretende apenas, no caso do “sale and lease back”, o

gozo do bem locado, pois que já o gozava, pretende outro sim, obter um financiamento

dando como garantia o bem alienado. Ora isto aproxima-se da tradicional garantia real, com

a vantagem, para o locador, de não ter que vender judiciamente o bem.

24 Reis, Raquel Tavares, “ o contrato de locação financeira no direito português: elementos essenciais” Revista de gestão e desenvolvimento, 11, 2002“Certa posição considera que o sale and lease-back extravasa a noção tipificada de locação financeira, com fundamento, em primeira linha, na diferença entre a função de financiamento da locação financeira e a do sale and lease-back; enquanto o sale and lease-back é uma pura concessão de crédito pela entrada de dinheiro resultante do pagamento do preço de um bem que se vendeu mas se continua a gozar, reembolsando- -se esse dinheiro faseadamente, a locação financeira é um financiamento da utilização (e eventual aquisição) de um determinado bem.”

25 Acórdão nº 38/2007 de 1 de Março de 2007 do Tribunal de Contas“(…) Da análise da estrutura contratual submetida a visto resulta que o futuro contrato de locação financeira imobiliária a celebrar pelo município consubstancia afinal um contrato de empréstimo de longo prazo, destinado ao saneamento financeiro do município, em que os respectivos imóveis assumem uma função de garantia. (…)”Este acórdão apesar de se referir a pessoas colectivas de direito público, estas quando realizam negócios de direito privado, vestem-se na qualidade de sujeitos de direito privado. Nesta conformidade, se uma pessoa colectiva pública decide celebrar um contrato de locação financeira, mergulha no direito privado, muito embora, elas próprias devam obedecer a regras de direito público administrativo para os poderem celebrar.

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Page 17: Sale and lease back

Sale and Lease Back

Este facto implica necessáriamente colocar a questão de os contratantes, através desta

forma de contrato, estarem a contornar o proibido pacto comissório, previsto no artº 694º

do Código Civil. Será que o contrato de sale and lease back será válido posto nesta situação

de negócio indirecto? Mais adiante analisaremos esta questão.

Principais argumentos a favor do negócio indirecto

Também esta doutrina apresenta três argumentos:

1º argumento, que tem a ver com o princípio da autonomia privada / liberdade contratual,

consagrada no artº 405º CC, como defendem Antunes Varela e Pires de Lima, onde as

partes podem convencionar sobre a forma que mais cumpre os seus interesses, não ficando

sujeita a formas tipicas de contratos.

2º argumento, tem a ver com o momento da transferência, e no caso do Sale and Lease

Back a circunstância da compra venda ser anterior ao contrato de locação, e é-o de forma

definitiva, não condicionada ao cumprimento ou incumprimento do vendedor. No caso do

pacto comissório, o que é proibido é que no caso de incumprimento, o bem, que presta

garantia, passe para o credor.

3º argumento. Cumpridas integralmente as rendas do contrato de locação, o locador tem a

opção de readquirir o bem, pode até nem cumprir com o pagamento do valor residual, e

nesta circunstância, distancia-se do pacto comissório.

Nestes pressupostos o SLB, com natureza de negócio indirecto de contrato de empréstimo

associada a uma venda a título de garantia do crédito, distancia-se de uma forma de pacto

comissório, pois como iremos ver, não ofende o pacto comissório numa interpretação literal

do texto da norma.

Veremos que esta posição quanto à questão do pacto comissória é sujeita a criticas,

nomeadamente quanto à interpretação da norma.

Tendo por fim um financiamento, coloca-se a questão de ser admissível ou não à luz do

ordenamento português, nomeadamente quanto à proibição constante da norma do artº 694º

CC. Será que a venda serve para dissimular outras formas de garantia, como o penhor ou a

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Page 18: Sale and lease back

Sale and Lease Back

hipoteca, tendo por objectivo evitar o recurso á venda judicial, contornando a proibição do

pacto comissório?

Analisemos então a questão da venda do bem para ser locado ser uma forma encoberta de

pacto comissório.

VI. A QUESTÃO DO PACTO COMISSÓRIO

O elemento teleológico, o que pretende a norma ?

No essencial, o pacto comissório é a convenção pela qual o credor e o devedor, em caso de

incumprimento do devedor, o credor pode apropriar-se do bem dado em garantia.

Ora, como nos diz Vaz Serra, a proibição visa proteger o devedor, que estando em situação

fragilizada, vê-se “ forçado” a aceitar condições eventualmente abusivas por parte do credor, que

poderia ficar com um bem, de valor muito superior ao montante da dívida.

Para Remédio Marques e Januário Gomes, são várias as razões para a proibição, para além da

protecção do devedor sob coacção do credor, acrescentando a necessidade do respeito pelos

principios e regras do ordenamento jurídico, necessários para a estabilidade do tráfego jurídico, e a

tutela de outros credores que concorram ao mesmo património.

Esta posição parece melhor traduzir o elemento teleológico da norma do artº 694º.

Convém referir que a violação da norma que proibe o pacto comissório, tem por sanção a

nulidade nos termos do artº 286º CC. Esta norma traduz-se na nulidade de uma cláusula que

estipule que o credor ficará com o bem, em caso de incumprimento do locatário.

Mas será que a probição do pacto comissório apenas se aplica nos casos de garantias reais

de Penhor, Hipoteca ? Será que o “sale and lease back” encobre uma Garantia?

Assim pensou o Supremo Tribunal de Justiça, no seu Acórdão do STJ 99B635 de 29 de Outubro de 1999

“ (…) III - Na locação em lease back o devedor transfere para o credor a propriedade de um bem a título de garantia do crédito obtido. (…) “

A doutrina defende que devemos considerar dois critérios, um funcional e outro estrutural.

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Page 19: Sale and lease back

Sale and Lease Back

O estrutural tem em consideração o momento em que se opera a transferência, ou seja, a

transferência que é dependente do incumprimento é proibida. Mas funcionalmente tem a

ver com o intenção com que as partes celebraram a transferência. Se foi com o intuito de

garantia real, deve ser considerada como pacto comissório e por consequência proibido.

No entanto parece existirem grandes diferenças entre as situações das garantias reais e o

SLB.

Desde logo no SLB o bem é transferido para o locador, através de um contrato de compra

venda, transferência essa de caracter definitivo, independentemente do devedor/locatário

cumprir ou não o contrato de Locação financeira.

Mas no caso do pacto comissório, a questão coloca-se porque o bem pernanece na esfera

jurídica do devedor, que presta uma garantia ao credor, por outro lado, havendo garantia

real, esta não passará pelo incumprimento do locatário/devedor, automáticamente para a

esfera jurídica do credor, tem que haver a intervenção judicial.

Mas qual a eficácia do pacto comissório? Daí que esta questão só se poria no caso de bens

não sujeitos a registo, dados como garantia, ou se as garantias reais não fossem registadas,

mas neste caso, estaria sempre sujeita a ataques com eficácia real, de eventuais outros

credores e de nada valeria o pacto comissório porque proibido e por consequência nulo.

No “sale and lease back”, o locador/ credor continua titular do bem se o locatário/devedor

não exercer o seu direito de opção compra, bem que já estava na sua esfera jurídica, o

locador não fica com o bem em caso de incumprimento, o locador já é o proprietário ab

initio, e não faz sentido colocar-se esta questão, pois já o era, não por força de

incumprimento.

SLB como negócio indirecto de empréstimo

Outra corrente defende que se trata de um negócio indirecto e que se está, na realidade, na

presença de um contrato de empréstimo e não de uma locação financeira e que a venda do

locatário ao locador é uma forma de garantia indirecta.

Será que neste caso o SLB é então que a venda tem por detrás a intenção de garantia ?

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Page 20: Sale and lease back

Sale and Lease Back

Neste caso, a questão da proibição do pacto comissório poderia parecer mais pertinente,

mas a situação é a mesma do leasing, o bem já está na esfera do credor, e não em resultado

do incumprimento.

O que poderá suceder é que as partes, e neste caso o mais interessado em invocar uma

simulação é o locatário, arguindo a nulidade do negócio

Porque não se aplica a questão do pacto comissório

Não se trata pois de um contrato de empréstimo com prestação de garantia real, e o artº

694º CC não se deve aplicar, sendo “ forçado” fazer uma interpretar extensiva a outros

contratos. Se o legislador o quizesse, poderia ter expressamente estatuido na lei.

Ainda porque a venda não está condicionada ao incumprimento, sendo o bem transferido

definitivamente, e apenas o locador se vincula à venda ao locatário, sendo que este poderá

ou não exercer o direito potestativo de optar pela compra no termo do contrato de locação

financeira. Nestes termos, não havendo uma retransmissão automática, que poderia

dissimular que o bem só temporáriamente estaria na posse do credor, também não se pode

colocar a questão do pacto comissório.

Posição adoptada

No entanto, o SLB não é um contrato de empréstimo, a que acessóriamente e por

consequência desse empréstimo, se afecta uma prestação de garantia

Muito respeitosamente discordo da posição de Ana Morais, quando diz que a o SLB visa o

financiamento e que a finalidade de garantia é meramente acessória.

Acho que se deve pegar na questão de outra forma. O financiamento é realizado através da

venda do activo da empresa, e o contrato de locação financeira, é uma forma de continuar a

usufruir desse mesmo activo e normalmente nos caso de SLB, de recuperar o bem. Pois se o

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Sale and Lease Back

não fosse, a empresa simplesmente alienaria o bem e não estava com mais histórias. Assim,

estamos perante duas formas de autofinanciamento no mesmo contrato. Um através da

venda, que aumenta a liquidez do vendedor, outro através da locação financeira.

Mesmo considerando um negócio indirecto, figura semelhante à da simulação, é um

negócio cujos efeitos são queridos por ambas as partes.26

Nestes termos, e justificando com os argumentos favoráveis, é de considerar como válido a

figura do “sale and lease back”, fora do contrato de locação financeira

Deve contudo ressalvar-se determinadas situações, que podem fazer com que o “Sale and

Lease Back” seja abusivo, nomeadamente: a) se entre o locador e o locatário existir outros

negócios creditícios, e que o locador imponha, por exemplo, cláusulas que remetem para

outros contratos. b) ou se entre o valor do bem vendido e o montante recebido for

desproporcional, c) ou se o comprador não é uma entidade que exerce a actividade de

locação financeira27

Nestas situações, o “sale and lease back” está a contornar a proibição legal do pacto

comissório, e por consequência inválido.

26 Vieira de Andrade27 Por exemplo, um usurário que empresta dinheiro, não com uma garantia de hipoteca sobre o imóvel, mas adquirindo esse imóvel, normalmente por preço desproporcionadamente mais baixo. Do estilo de anúncios “ compramos o seu carro e vendemo-lo em suaves prestações”, está-se mesmo a ver, que não é um Sale and lesae back, mas uma forma de contornar a proibição do pacto comissório.

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Page 22: Sale and lease back

Sale and Lease Back

VII. BREVE ALUSÃO SOBRE A RESOLUÇÃO DO CONTRATO DE “SALE AND LEASE BACK”

Analisando os artºs 17º e 18º da lei da locação financeira, verificamos que em termos gerais artº 17º, estabelece uma regra de desaplicação de outras regras, afastando as regras gerais do Código Civil. Esta norma é importante, não por aquilo que remete, mas aquilo que exclui, i.e artº 434º e ss CC, e artº 798º e ss CC. É a regra da prevalência da norma especial face à norma geral.Mas se o Sale and Lease Back for lícito não como modalidade de locação financeira, mas como contrato atípico, poderia ser sustentada não a aplicação da lei da locação financeira, mas as regras do código civil, e neste caso, não seriam afastados os artigos 434º e 798º do código civil.

Abstraindo-nos das várias possiveis situações, centramo-nos na característica

principal dos efeitos da resolução nos contratos de leasing em termos latos

O regime da resolução previsto no artº 434º nº1 CC, prevê a retroactividade, mas no caso da

locação simples, a resolução não abrange as rendas já pagas pelo locatário, pois as rendas

são prestações reiteradas, ( periódicas ou não periódicas ), de acordo com o nº2 do artº

434º CC, nem a antecipação das rendas vincendas.

No entanto, existe uma diferença entre as rendas da Locação simples e a locação financeira

Na Locação simples existe de facto uma relação entre a renda e o gozo da coisa.

Na locação financeira, a renda não tem qualquer relação directa com o gozo, sendo

estabelecida em função da amortização de um preço que o financiador/locador quer ver

recuperado pelo pagamentos do devedor/locatário.

Como nos diz Diogo Leite Campos, “ Não são, como nas rendas locatícias, prestações

periódicas, mas antes uma prestação com cumprimento fraccionado”28

Mas por imposição do artº 17º LLF, com a justificação que de facto o locatário já usufruiu

do gozo da coisa, assume a existência de um nexo entre a prestação e o gozo da coisa.

A jurisprudência vai no sentido de que a natureza da locação financeira se afasta da

natureza da natureza da locação simples, tendo por válidas, em caso de incumprimento do

28 Campos, Diogo Leite, “Nota sobre a admissibilidade da Locação Financeira restitutiva (…),Revista da Ordem dos Advogados, ano 42, Lisboa 1982

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Sale and Lease Back

locatário, as cláusulas que conferem ao locador, o direito de em alternativa à resolução,

exigir o pagamento antecipado das rendas vincendas29.

Neste sentido os acórdãos da relação de Lisboa de 7 de Dezembro de 2004, processo

4056/2004-7

Na alternativa de resolução, por imposição do artº 17º LLF, o locatário não só perde o “seu”

bem, que terá que devolver ao locador, assim como a parte do capital de financiamento já

amortizado.

Como já se referiu, se fosse um “leasing” , a lógica do negócio para o locatário seria o gozo

de um bem, e poderá nunca ser sua intenção adquiri-lo, embora possa optar por fazê-lo.

Mas no “ sale and lease back”, a lógica do locatário é outra, este não quer desfazer-se do

bem, se o quizesse optaria pela venda pura e simples. O motivo não é o financiamento de

um bem de que pretende retirar vantagem, pois já tem essa vantagem, o que ele quer é

liquidez.

Neste sentido, o “sale and lease back”, considerado puramente como locação financeira é

um risco mais elevado para o locatário, do que se fosse um contrato de empréstimo.

O tema da resolução do sale and lease back, merece um estudo mais profundo, e as

soluções vão decorrer necessarimeente da subsunção ou não deste tipo de contrato à lei da

locação financeira.

29 Por exemplo, Acórdãos do STJ de 20 janeiro de 1999 e de 10 de fevereiro de 2000,

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Page 24: Sale and lease back

Sale and Lease Back

VIII. CONCLUSÕES

O Sale and Lease Back30, embora antecedente à Locação Financeira ( leasing), não está

tipificado na lei, e tem por objectivo principal a obtenção de crédito para aumento de

liquidez, através da venda de activos sem prescindir da sua rentabilidade, ou seja, é uma

alternativa de autofinaciamento, através da alienação de activos, sem perder a vantagem

imediata de continuar a usufruir desse activo obtendo rendimento económico e financeiro.

Tem por isso uma natureza financeira.

Distingue-se da locação financeira por várias ordens de razão.

A locação financeira, visa a obtenção do gozo de um bem, planeando a satisfação de

necessidades comerciais que libertem fundos suficientes para cobrir os encargos do

financiamento, e com a vantagem face à locação simples, da possibilidade da aquisição do

bem, no termo do contrato. Tem na sua essência, tem uma justificação claramente distinta

do “ sale and lease back”, aquele pretende ser um financiamento para uso de um

determinado bem, necessário para satisfazer determinada necessidade temporária, e este

pretende ser um financiamento para suprir uma necessidade de Fundo de Maneio..

Por via de regra, ao celebrar-se um contrato de “sale and lese back”, não se pretende

desfazer do bem que se vende, nem se pretende apenas usá-lo, pois já o estava a fazer,

pretende-se liquidez e a maximização da rentabilidade de activos

O Sale and Lease back é uma alternativa, muito interessante para a economia, ao

pagamento a pronto pagamento, e é pacífico afirmar que esta modalidade de obter crédito,

promove o crescimento do Produto Nacional.

Tendo em consideração as vantagens deste tipo de contrato, num contexto de crise, ou de

dificuldade de acesso ao crédito tradicional, as empresas têm este tipo de financiamento,

utilizando o modelo do Sale and Lease Back, que por ser uma forma que se traduz num

crédito de risco reduzido para o locador, possibilita um acordo mais célere.

30 Arriscaria, com o merecido respeito por Diogo Leite Campos, discordar da tradução de Sale and lease back, como locação financeira restitutiva, esta tradução aproxima-se mais do apenas “ lease back”. A tradução para “ sale and lease back”, salvo melhor opinião, deverá ser compra/venda e locação financeira, e não locação financeira restitutiva

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Page 25: Sale and lease back

Sale and Lease Back

Quanto à questão do SLB ser um contrato dissimulado, ou indirecto, por exemplo, o que as

partes quereriam celebrar seria um contrato de empréstimo, e que a venda do bem, serviria

como garantia não só para o contrato de locação financeira, mas para outros

financiamentos, ou que o devedor se encontre numa posição claramente fragilizada face ao

credor, ou que pretenda diminuir o património por forma a beneficiar um credor face aos

demais, é pertinente, mas só nesta situação de fraude à lei se poderá considerar o SLB como

ilícito.

O problema que se coloca é se esta forma de negócio se subsume numa forma de alienação

em garantia, e nesta situação ofender a proibição do pacto comissório, e isto prende-se com

o facto de alguma da doutrina defender que para além da função de financiamento, o SLB

também a função de garantia, ou seja, a venda será uma alienação em garantia, embora não

prevista na lei, mas que uma interpretação extensiva, a abrangeria . De facto, tendo em

consideração os pressupostos teleológicos que subjazem na proibição do pacto comissório,

pode defender-se a aplicação da proibição a outras formas de garantia desde que

ofendessem os pressupostos da proibição.

A proibição do pacto comissório é um fundamento para alguma doutrina considerar o SLB

ilicito, pois às luz das razões que estão subjacentes à proibição, deve ser alargada a outras

formas de garantia para além das directamente previstas.

Por consequência, tendo em consideração o fim de protecção da norma, devem ser

abrangidos os negócios jurídicos que acordem a transferencia de propriedade para o credor

em caso de incumprimento do devedor.

Mas a venda do bem, não é uma garantia que presta à entidade financeira, é uma venda

“tout court”, que permite encaixar “dinheiro vivo”. O locador ao ser o proprietário do bem,

não precisa de garantia.

Entendo que é pacífico que se a forma tem por intenção contornar a proibição, então deve

ser inadmissivel, e por consequência ferido de nulidade. Se tal não for a intenção, mas

simplesmente uma vantajosa forma de autofinanciamento, então nada obstará a que seja

admissivel este forma atípica de contrato.

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Page 26: Sale and lease back

Sale and Lease Back

O Sale and Lease Back, é um contrato não tipificado na lei, sendo uma união de contratos

de compra e venda e de locação financeira, autonomos quanto à sua estrutura, mas

dependentes

Por consequência a minha posição é a de que o “ sale and lease back” não se pode subsumir

num simples contrato de locação financeira31, mas também não será um negócio indirecto

de contrato de empréstimo, será para alguma doutrina um contrato misto 32., sendo o “ sale

and lease back”, assim como o leasing, negócio jurídico complexos que incorporam

elementos de diferentes tipos de comtrato,. Para outra doutrina, que eu partilho, será uma

união de contratos, pois que mantêm, consubstanciado num contrato de locação financeira e

contrato de compra e venda, embora dependentes, cada um a sua autonomia

Finalmente, tendo presente a natureza financeira do SLB, e o intuito subjacente, o contrato

visa principalmente o autofinanciamento, a venda é condição “sine qua non” para o obter,

ou seja, sem a qual não se realizaria a Locação financeira e não o inverso. O vendedor

poderia obter esse aumento de liquidez pela venda pura e simples, mas perderia a vantajem

do gozo do bem. Assim, o que parece é que o contrato de locação financeira é a forma do

vendedor, para além de obter liquidez, por um lado poder continuar a usufruir do bem,

obtendo a rentabilidade que lhe é afecta, e por outro lado, ainda com a vantagem acrescida

de poder vir a recuperar esse mesmo bem.

O mesmo é dizer que a venda é em si um negócio autónomo e principal e não

meramente acessório ao negócio da locação financeira, nomeadamente como garantia.

Por consequência, não se poderá concluir ex-ante qual será a intenção, pelo que só em cada

caso concreto se poderá aferir da intenção subjacente.

Nestes pressupostos, no meu entender nada obstará que o contrato de SLB seja licito

tanto como modalidade de contrato de locação financeira, como contrato atípico nos

termos que analisamos.

31 Como defendem de entre outros, Diogo Leite de Campo, Duarte e Pestana de Vaasconcelos32 Posição defendida por de entre outros por Sebastião Nobrega Pizarro e Raquel Tavares dos Reis

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Sale and Lease Back

IX. BIBLIOGRAFIA

Antunes Varela, João de MatosDas Obrigações em Geral – Vol IAlmedinaCoimbra, 1994

Campos, Diogo Leite P.A Locação Financeira na ótica dos utentesRevista da Ordem dos Advogados, ano 43Lisboa 1983

Nota sobre a dmissibilidade da Locação Financeira Restitutiva ( lease back) no direito PortuguêsRevista da Ordem dos Advogados, ano 42Lisboa 1982

Morais Antunes, Ana FilipaO Contrato de Locação Financeira Restitutiva Universidade Católica EditoraLisboa, 2008

Morais, Fernando CravatoManual de Locação FinanceiraAlmedinaCoimbra, 2006

Pestana de Vasconcelos, Duarte A Locação FinanceiraRevista da ordem dos Advogados, ano 45Lisboa, 1985

Sá, Almeno de Clausulas Contratuais GeraisCoimbra editoraCoimbra, 2008

Direito BancárioCoimbra editoraCoimbra 2008

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Sale and Lease Back

OUTROS TRABALHOS SOBRE O TEMA

Rodrigues, Edgar Contrato de (sub)locação, após operação de sale and Lease Back Trabalho no ambito do curso de mestrado da Faculdade de Direito da Universidade Nova de LisboaObtido na Internet, 2008/2009

Tavares dos Reis, Raquel O Contrato de Locação Financeira no Direito Português: elementos essenciaisRelatório de mestrado de Ciências Juridico Empresariais da Universidade de CoimbraObtido na internet, 2008

ACÓRDÃOS

Tribunal de Contas nº 23/2007 – 17 Dezembro 2007 – 1ª S/PLRecurso ordinário nº 19/2007, processo 213/07

Tribunal de Contas nº 38/2007 – 01 Março 2007 – 1ª S/SSProcesso 1987/06

Tribunal da Relação de Lisboa de 18 de março de 1999Nº JTRL00027482

Supremo Tribunal de Justiça 99B635 de 25 de janeiro de 1999Nº JSTJ00040034

LEGISLAÇÃO

Decreto lei 30/2008 de 25 de FevereiroDiário da República I série, de 25 de FevereiroPág.s 1210 -1211

Decreto lei 149/95 de 24 de JunhoDiário da República I série-A de 24 de JunhoPág 4091- 4094

Decreto lei 105/ 2004 de 8 de maio Versão da CMVM

http://www.cmvm.pt/NR/rdonlyres/69E8B817-BCA6-4B40-A4D8-36F7B5961397/2669/DLn105_2004.pdf

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