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ISSN 1415-482X • Ano 12 • Nº 49 • Agosto-Setembro-Outubro/2009.

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[email protected]

Dourados Ano 12 - No 49 Págs. 1-92 Ago. - Set. - Out./2009

Page 4: Revista Arandu # 49

CARO LEITORAno 12 • No 49 • Ago./Set./Out./2009

ISSN 1415-482X

EDITADO POR

Rua Mato Grosso, 1831, 10 Andar, Sl. 01Tel.: (67) 3423-0020 / 9238-0022Dourados, MSCEP 79804-970Caixa Postal 475CNPJ 06.115.732/0001-03

Revista Arandu: Informação, Arte, Ciência, Literatura /Grupo Literário Arandu - No 49 (Ago.-Set.-Out./2009).Dourados: Nicanor Coelho Editor, 2009.

TrimestralISSN 1415-482X

1. Informação - Periódicos; 2. Arte - Periódicos;3. Ciência - Periódicos; 4. Literatura - Periódicos;5. Grupo Literário Arandu

PUBLICAÇÃO DO

[

EditorNICANOR COELHO

[email protected]

Conselho Editorial ConsultivoÉLVIO LOPES, GICELMA DA FONSECA

CHACAROSQUI e LUIZ CARLOS LUCIANO

Conselho CientíficoCARLOS MAGNO MIERES AMARILHA,

LUCIANO SERAFIM, MARIA JOSÉMARTINELLI SILVA CALIXTO, MARIO

VITO COMAR, NICANOR COELHO, PAULOSÉRGIO NOLASCO DOS SANTOS e PLÍNIO

SAMPAIO CATARINO

Editor de ArteLUCIANO SERAFIM

A Revista Arandu nesta 49ª edição um grupode publica artigos produzidos pelos

professores do curso Normal Superior daUEMS (Universidade Estadual de Mato Grossodo Sul).

É um momento de grande alegriacompartilhar com os leitores e com acomunidade universitária em geral esta ediçãoque marca as comemorações dos 12 anos deexistência da Revista Arandu, considerada umadas melhores publicações científicas da regiãoCentro-Oeste.

O curso Normal Superior (Pólo deDourados) da Universidade Estadual de MatoGrosso do Sul, completa dez anos de criação eencerra suas atividades. Para comemorar estadata que foi organizado a VI Jornada deEducação da Região da Grande Dourados; a XSemana e o I Encontro de Acadêmicos e Egressosdo Curso Normal Superior.

Dez Anos Dez! Esse é o tema da jornadaque pretende compartilhar com a sociedade ascontribuições, as memórias, os feitos; enfim, aexperiência, os “erros” e “acertos” ocorridosdurante essa caminhada na formação deprofessores da Educação Infantil e Anos Iniciaisdo Ensino Fundamental.

O evento reúne toda a comunidadeacadêmica, além de alunos e egressos do cursoe, de modo especial, os professores, quecontribuíram sobremaneira para que o cursoNormal Superior cumprisse os objetivospropostos e, consequentemente, atingisse suafinalidade: a formação de professores capazesde estabelecer atitudes questionadoras, críticase equilibradas em direção ao exercício dacidadania.

Educando na pesquisa, cultivando oconhecimento, não só como fonte central demudanças contemporâneas, mas, princi-palmente, humanizando-o. O curso NormalSuperior cumprir com dignidade sua missão e aRevista Arandu registra mais este feito para ahistória da educação sul-mato-grossense.

Nicanor CoelhoEditor

CARO LEITOR

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Ano 12 • No 49 • Ago./Set./Out./2009 SUMÁRIO[O Curso Normal Superior da UEMS:Interiorizando o Ensino Superior em Mato Grosso do Sul ................ 5

Maria Bezerra Quast de Oliveira

Formação de professores no Mato Grosso do Sul:Trajetória e repercussão do Curso Normal Superior da UEMS ....... 10

Almerinda Maria dos Reis Vieira Rodrigues

Uma viagem inesquecível ................................................................. 18Roberto Padim Silveira

Os desafios enfrentados na implementaçãodo Curso Normal Superior nos 10 anos de oferta ............................. 20

Maria José de Jesus Alves Cordeiro

Olhares sensíveis na formação de professores: A arte e seu ensino(Memórias do Curso Normal Superiorda Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul) .......................... 27

Maria Cristina Ruiz Benito

Reflexões da prática pedagógica vivenciadano Curso Normal Superior ............................................................... 33Ângela M. P. Faccenda

Curso Normal Superior Pólo de Dourados/UEMS:Tecendo história na História ............................................................ 37

Lucrécia Stringuetta MelloNilva Celestrino Rocha Narcizo

A universidade no contexto da diversidade étnico cultural ............. 44Rosely A. Stefanes Pacheco

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CAPES - Classificada na Lista Qualiswww.capes.gov.br

ISSN - International Standard Serial Number

Latindex - www.latindex.org

GeoDados - www.geodados.uem.br

O tempo e a memória: Histórias de professores em formaçãonos 10 anos do Curso Normal Superior-Dourados (MS) ................. 53

Neide Araujo Castilho Teno

A hipermídia e a rede semântica na aprendizagem ......................... 66Otília Aparecida Tupan Schoenherr

A práxis docente no Curso Normal Superior:Os desafios e os aprendizados numa perspectiva freireana ............. 72

Paulo Sérgio Gomes Soares

O Curso Normal Superior da UEMS:Considerações sobre experiências vivenciadasnum processo de ensinar e de aprender ........................................... 81

Alzira Salete Menegat

]INDEXAÇÃO

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RESUMOO presente artigo constitui-se numa pesquisa descritiva que focaliza a

operacionalização do curso de graduação Normal Superior, analisando aspectos teóricos epráticos da sua implantação, inclusive a justificativa para sua criação e, ao mesmo tempo, aviabilidade da modalidade adotada pela Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul paraa formação de professores.

Palavras-chave: curso Normal Superior, formação de professores.

ABSTRACTThe following article is based on a descriptive research which is focused on the

graduation process at University Level, analyzing theoretical and practical aspects of itsimplementation, including the justification for its creation and, at the same time, the viabilityof the method adopted by the Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul for teachersgraduation.

Keywords: University Level, teachers graduation.

O CURSO NORMAL SUPERIORDA UEMS: INTERIORIZANDO

O ENSINO SUPERIOREM MATO GROSSO DO SUL

Maria Bezerra Quast de OLIVEIRAUniversidade Estadual de mato Grosso do Sul (UEMS)

A educação é uma preocupação cons-tante das sociedades modernas como

forma de assegurar às novas gerações o aces-so ao conhecimento historicamente cons-truído, bem como, enfrentar as constantesmudanças que o progresso traz. Todavia, osproblemas que se apresentam são diversos,variando apenas de acordo com os recursosmateriais e humanos e, principalmente, daconsciência das sociedades específicas.

Considerando suas especificidades eprocurando melhorar a educação, o Estadode Mato grosso do Sul criou a UniversidadeEstadual de Mato Grosso do Sul, a partir de

uma proposta política contemplada na pri-meira constituinte em 1979 e implantada em1993 na cidade de Dourados/MS,redesenhando o cenário educacional.

Esse novo modelo de Universidadedeveria operar mudanças significativasquanto à qualidade do ensino no Estado,levando um ensino superior de qualidadeaos professores-alunos que, em função dadistância entre as cidades, encontravam di-ficuldades em se qualificar.

A Universidade Estadual de MatoGrosso do Sul (UEMS) iniciou suas ativida-des em Dourados e mais 13 unidades de

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/20096 ]ensino distribuídas por todo o Estado e umescritório de representação em CampoGrande. Uma instituição regional e descen-tralizada, cuja missão maior é a “interio-rização do ensino”, fundamentada na pró-pria LDB, que no seu artigo 87 §3º propõe“(...) programas de capacitação para todosos professores em exercício utilizando, tam-bém para isto, os recursos da educação àdistância”.

O esforço se desenvolve no sentidode contemplar a democratização do ensino,a profissionalização do professor e a repre-sentação dos atores envolvidos no processoeducativo e, certamente, possibilita decisõese alternativas mais adequadas e urgentes àformação de professores.

Historicamente a criação e o estabe-lecimento das escolas destinadas ao prepa-ro específico dos professores para o exercí-cio de suas funções está ligada àinstitucionalização da instrução pública nomundo moderno, ou seja, à implementaçãodas idéias liberais de secularização e exten-são do ensino primário a todas as camadasda população – fato que não se concretizou,apesar das iniciativas governamentais e lu-tas da sociedade civil.

A preocupação com a seleção de pro-fessores existia antes que se fundassem asprimeiras instituições destinadas à forma-ção: as escolas normais. Estas foram insufi-cientes para preparar o pessoal docente dasescolas primárias. Esta realidade, emboradiferenciada nos dias atuais, não mudou,constatando-se ainda um número conside-rável de professores leigos que ministramaulas na Educação Infantil e Anos Iniciais doEnsino Fundamental em todo o Brasil.

Neste contexto, com o objetivo deatender as necessidades da população, prin-cipalmente aquela mais desassistida, criou-se o Curso de Graduação Normal Superior,habilitação em magistério na Educação In-

fantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamen-tal, através da Resolução CEPE/UEMS nº131, de 6 de outubro de 1999 e em dezem-bro do mesmo ano obteve-se a aprovaçãodo Projeto Pedagógico, por meio da Deli-beração CEE/MS nº 5656.

Adotando o pensamento deBrezezinski (1996) concebeu a formação doprofissional da educação básica, almejando:

que ele tenha domínio do conteúdo e acompreensão crítica daquilo que ensinae faz (...) conheça novas tecnologias eque as utilize de acordo com o projetopolítico de emancipação das classes me-nos privilegiadas; de um educador quetenha na sua formação, uma especi-ficidade que contribui para o trabalhocoletivo e interdisciplinar na escola; quetenha a compreensão das relações entrea escola e a sociedade (...).

O curso de graduação Normal Su-perior, organizado de forma diferenciadados demais cursos oferecidos pela Institui-ção, foi o primeiro a entrar em funciona-mento em nível nacional nesta modalidade.Uma proposta inovadora de formação deprofessores, bem como um programa decapacitação que atendia às demandas dosnovos tempos.

A Lei 9394/96 – Diretrizes e Bases daEducação Nacional – instituiu as bases paraa definição de políticas estabelecendo ru-mos para a formação dos profissionais daEducação. A partir dela, em todo o Brasil,aconteceram debates, questionamentos ereflexões sobre o papel do professor e doscursos de formação dos profissionais, coma finalidade de dar respostas às exigências ehabilidades requeridas na/pela referida lei.

Repensar a formação do professorsob uma visão crítica e competente supu-nha ações que deveriam contemplar umaproposta de formação de professores, bem

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7ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [como um processo permanente decapacitação que possibilitasse a compreen-são das demandas, isto é, um

...outro tipo de pedagogia, determinadapelas transformações ocorridas no mun-do do trabalho nesta etapa de desenvol-vimento das forças produtivas, de modoa atender às demandas da revolução nabase técnica de produção, com seus pro-fundos impactos sobre a vida social. Oobjetivo a ser atingido é a capacidade paralidar com a incerteza, substituindo a ri-gidez pela flexibilidade e rapidez, de for-ma a atender a demandas dinâmicas quese diversificam em qualidade e quantida-de. (KUENZER,1998, p. 39)

A partir das necessidades sul-mato-grossenses que, em 1999 apontava um totalde 1887 professores sem a devida formaçãopara o exercício da docência, ou seja, profis-sionais que assumiram essa função para aqual não estavam habilitados, percebeu-sea necessidade de alternativas viáveis de for-mação, construída sob a diretriz de umaprática sócio-educacional efetiva.

A implantação do Curso NormalSuperior, sugerindo a identificação dos fun-damentos teóricos e práticas do trabalho emeducação, seus paradigmas e tendênciasvoltados à construção do conhecimento eàs políticas sociais como perspectiva de umapedagogia integrada ao contexto histórico,político, econômico e social, possui, comocitado anteriormente, uma organização di-ferenciada, com apoio da metodologia deEAD, concentrando suas aulas presenciaisnos finais de semana de acordo comcronogramas pré-estabelecidos, oferecidasquinzenalmente e de forma concentrada.Neste sentido, o projeto, mais uma vez, pri-ma pelo pioneirismo.

Quanto às concepções pedagógicascontempladas no PPP visam cumprir o pa-

pel da Universidade na formação profissio-nal, com uma redefinição que permite acom-panhar a sociedade e, ao mesmo tempo, quedefine os contornos do exercício profissio-nal contemporâneo, entendendo a forma-ção do professor como tarefa que se realizaao mesmo tempo em que acontecem as ino-vações.

Proposto como uma nova maneirade fazer educação, pautado em uma con-cepção e uma prática de ruptura com as for-mas tradicionais de se ensinar na Universi-dade; uma ruptura epistemológica, onde oprofessor forma-se a partir da própria atu-ação, ou seja, um programa de formaçãoem serviço em que o professor é convidadoa abandonar a postura passiva, para se tor-nar um sujeito ativo no processo. “Nessecotidiano, ele aprende, desaprende,reestrutura o aprendido, faz descobertas e,portanto, é nesse lócus que muitas vezes elevai aprimorando a sua formação.”(CANDAU,1997, p.57).

Assim entendido – e tendo comoponto de partida para a formação do pro-fissional da educação a compreensão da so-ciedade em sua dinamicidade – o curso pre-coniza uma concepção curricular que levaem conta a experiência dos alunos-profes-sores em sala de aula, proporcionando areflexão e a otimização de sua prática do-cente, procurando superar práticas e visõesfragmentadas do processo de ensinar eaprender, através da flexibilização que asse-gure possibilidades de aprofundamento daformação básica e estimule opções diferen-ciadas de atuação profissional.

Para sua efetivação foram firmadosconvênios com diversos municípios do es-tado, consistindo na viabilização de trans-porte, alimentação e hospedagem dos pro-fessores-alunos para participar das aulaspresenciais, bem como em seminários, jor-nadas, semanas acadêmicas, fóruns etc, uma

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/20098 ]vez que precisavam se deslocar de seusmunicípios para chegar até a unidade daUEMS onde o curso é oferecido.

O curso, já nos primeiros anos defuncionamento, despertou o interesse demuitos professores que ainda não tinhamformação superior, fato que pode ser com-provado pelo número de alunos matricula-dos desde a sua implantação: 2000 – 423 alu-nos; 2001 – 671 alunos; 2002 – 1011 alunos;2003 – 1225 alunos; 2004 – 1224 alunos; em2005 – 204; em 2006 – 369. Para melhor fun-cionamento o curso foi organizado em doispolos: Campo Grande, formado pelos mu-nicípios de Campo Grande, Jardim, Coxim,Miranda e Paranaíba; e Dourados, forma-do pelos municípios de Dourados,Amambai, Mundo Novo, Naviraí, NovaAndradina e Ponta Porã agregando a estesos municípios circunvizinhos.

No primeiro ano havia uma únicacoordenação para os dois pólos e os profes-sores reuniam-se quinzenalmente por vídeoconferência e mensalmente de formapresencial. Todavia esta organização dificul-tava o funcionamento, principalmente noque se referia aos problemas mais urgen-tes, o que levou a uma reorganização e atu-almente há uma coordenação em cada polo.

É possível perceber que houve porparte da comunidade um grande interessepelo curso, de maneira que foi necessárioreformular o projeto pedagógico que pre-via o oferecimento de especialização a to-dos os concluintes. Seguidamente foi feitauma alteração com vistas a melhoria do cur-rículo e também da bibliografia.

Após quatro anos de funcionamen-to, para fins de certificação, a Universidadesolicitou o Reconhecimento do curso du-rante o ano de 2003 e em função disso, oConselho Estadual de Educação, após to-dos os procedimentos legais, através daDeliberação CEE/MS nº 7511, 18/2/2004 –

reconhece o Curso Normal Superior - Ha-bilitação em Educação Infantil e Anos Inici-ais do Ensino Fundamental, autorizado pormeio da Resolução CEPE-UEMS Nº 316, de27/09/2003 por 05 anos, a partir de 2004. Emseu Parecer assim registra a Comissão Ava-liadora:

..., a Comissão recomenda o reconheci-mento do Curso, sugerindo à UEMS re-alizar estudos para viabilizar o Curso Nor-mal Superior, como um curso regular,considerando a existência de demandaampliação dos processos de orientação adistância, fazendo uso constante dastecnologias informação/comunicação nametodologia da Modalidade de Educa-ção a Distância. (Processo 29/035799/04 fl. 488).

Em fevereiro de 2004, realizou-se aformatura da primeira turma do Curso eneste ano realiza-se a formatura da 7ª tur-ma. É importante registrar que o curso temuma pequena evasão e um baixo índice dereprovação, tome-se como referência a pri-meira turma, (apenas 17% dos ingressantesevadiram ao longo do curso), se comparadacom outros cursos da UEMS e mesmo comoutras Instituições de Ensino Superior. Dos423 alunos que ingressaram no ano de 2000,351 alunos concluíram o curso em 2003.

A criação e a implantação do CursoNormal Superior constitui para a UEMS umfato significativo e histórico, uma vez quemarca a criação de um curso de formaçãode professores que prioriza a formação con-tinuada e o atendimento as demandas reaisda educação em nosso Estado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Curso Normal Superior pretendeureduzir a disparidade existente entre a forma-

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9ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [ção dos professores do ensino público, sem seesquecer de suas três bases de ação: o ensino,a pesquisa e a extensão. Concretiza uma açãoda Universidade Estadual de Mato Grosso doSul rumo ao atendimento das demandasemergentes do Estado, respondendo a aspec-

REFERÊNCIAS

BREZETINSKI, I. Pedagogia, pedagogos e formação de professores. Campinas : Papirus,1996.

CANDAU, V. Formação continuada e professores: tendências atuais. In: CANDAU, V.(Org.) Magistério: construção cotidiana. Petrópolis : Vozes, 1997.

KUENZER, Acácia Z. As mudanças no mundo do trabalho e a educação: novos desafiospara a gestão. In: FERREIRA, Naura S. C. Gestão democrática de educação: atuais tendên-cias, novos desafios. São Paulo : Cortez, 1998.

Ministério da Educação. Lei 9394/96 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

Universidade Estadual de Mato Grosso Do Sul. Projeto Político Pedagógico do Curso deGraduação Normal Superior – 2000 e 2002.

tos inovadores do mundo contemporâneo,além de contribuir, por meio de propostascomo a deste curso, para flexibilização e op-ções diferenciadas de currículo, na perspecti-va de fazer educação inclusiva e criar alternati-vas para a transformação.

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RESUMOFalar sobre o Curso Normal Superior é me expor ao risco de divagar entre possibi-

lidades e feitos de forma tendenciosa já que meu olhar sobre o mesmo se volta mais paraas questões positivas pois até mesmo aquelas que se constituíram em erros foram impor-tantes para construirmos acertos. Assim, procurando colocar o curso como ações realiza-das em função das necessidades da sociedade, fato que tem se repetido na história do nossoEstado, procurei inseri-lo na história geral da formação de professores expondo de formapanorâmica sua trajetória e procurando realizar uma análise, a partir das respostas aoquestionário aplicado aos alunos, de suas repercussões.

Palavras-chave: Mato Grosso do Sul, Normal Superior, formação de professores

ABSTRACTDiscussing about University level is exposing myself to the risk of wandering the

possibilities and feats in a biased way owing to the fact that my view is kept on the positiveissues, even those who made mistakes were important to make it right. Therefore, trying toplace the course as accomplished actions taken according to the needs of society, fact whichhas been repeated in the history of our State, I have sought to insert it into the generalhistory of teacher education by exposing a panoramic view of his career and trying toaccomplish an analysis, from the responses to the questionnaire given to students, from itsrepercussions.

Key words: Mato Grosso do Sul, University level, teachers’ graduation.

FORMAÇÃO DE PROFESSORESNO MATO GROSSO DO SUL:

TRAJETÓRIA E REPERCUSSÃODO CURSO NORMAL SUPERIOR

DA UEMSAlmerinda Maria dos Reis Vieira RODRIGUES

Professora Msc da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS)

INTRODUÇÃOINTRODUÇÃOINTRODUÇÃOINTRODUÇÃOINTRODUÇÃO

No Brasil, as políticas de formaçãodocente inicial e continuada sempre estive-ram vinculadas às questões econô-micas,políticas e sociais dos diferentes momentos

e contextos históricos. A história da educa-ção e dos cursos superiores revela aconcomitância entre educação e o desen-volvimento da sociedade e, entre os proje-tos implementados, o Curso Normal Superi-or foi criado para atender às determinações

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11ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [da Lei de Diretrizes e Bases da EducaçãoNacional 9394/96, visando minimizar o nú-mero elevado de educadores leigos nos vá-rios estados brasileiros.

Especificamente no estado de MatoGrosso do Sul, o referido Curso foi ofertadona Universidade Estadual de Mato Grossodo Sul-UEMS, durante os anos de 2000 a2009, especificamente para atender os edu-cadores com vínculo na rede pública. En-quanto um projeto com demanda/temposlimitados, ele enfrentou polêmicas oriun-das de outras Instituições nacionais que,preocupadas com a qualidade da formaçãode professores no Brasil, questionaram umaproposta que previa a utilização de algunsrecursos à distância.

Enfrentando debates e preconceitosde todas as formas, o Curso sobreviveudurante dez anos e, sem a pretensão de as-sumir uma postura defensiva, torna-se ob-jeto deste trabalho, cujo objetivo principal érefletir acerca do seu papel para com as po-líticas nacionais de formação de professo-res no Brasil, suas limitações e possibilida-des. Para discutir a questão, resgatamos avoz dos protagonistas dessa historia, ou seja,dos profissionais egressos, que, por meiode um questionário, avaliaram as contribui-ções do Curso para sua formação profissio-nal. Dos 946 concluintes, aproximadamen-te 20% participaram do estudo.

UM RÁPIDO PASSEIO PELAHISTORIA: SITUANDO

O CURSO NORMAL SUPERIORNA HISTÓRIA DA FORMAÇÃO

DE PROFESSORES

De acordo com Tanuri, (2000, p.62)“[...] o estabelecimento das escolas destina-das ao preparo específico dos professorespara o exercício de suas funções está ligadoà institucionalização da instrução pública no

mundo moderno [...]”. No Brasil, apesar denão representar prioridade no governo,desde o Império fez parte das expectativasdo mesmo para a formação das novas gera-ções (CURY, s.d, p.31 ).

Formar professores tornou-se umaquestão nacional mais séria quando foiestabelecida a Lei 15 de outubro de 1827que determinou a abertura de escolas deprimeiras letras em todas as cidades, vilas elugares populosos. Abrir escolas exigiu comomedida complementar a formação de pro-fessores para suprir as escolas criadas.

Como resolver esse problema nacio-nal sem as condições necessárias, sem expe-riência que subsidiasse tanta transformação?A saída, que nos parece hoje absurda edescomprometida, foi a de delegar a cadaprovíncia, através do Ato Adicional de 18342,a responsabilidade de formar seus própriosprofessores, no âmbito da escola normal, quefoi a única responsável pela formação de pro-fessores das “primeiras letras” até 1930.

As preocupações desse período seestendiam também em relação à formaçãode professores do segundo grau que resul-tou na organização da Faculdade Nacionalde Filosofia, da Universidade do Brasil, influ-enciados em parte pelo ideário da escola nova.

Assim como o país, Mato Grossodesde o início das preocupações, buscouresolver as questões de formação de pro-fessores acompanhando as tendências deoutros estados brasileiros e, segundo Alves(1986, p.42), em 1842, criou uma Escola Pri-mária Normal em Cuiabá, que teria sido, “aterceira do Brasil em sua modalidade, so-mente antecedida pelas de Niterói (1835) eda Bahia (1836)”.

A criação de escola normal em MatoGrosso não foi suficiente para atender aonúmero de escolas primárias esparramadaspelo interior do estado e nem o número deescolas criadas atendia toda ou a maior par-

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200912 ]te da população que se encontrava pelo vastoterritório matogrossense. Segundo Tanuri,2000, a escola normal, no início, abria e fe-chava por falta de condições.

De acordo com Rodrigues (2006),em 1930 o estado de Mato Grosso contavacom apenas três Escolas Normais, das quaisduas eram públicas: a Escola Normal deCuiabá que sobrevivera ao processo de cri-ação e extinção e a Escola Normal JoaquimMurtinho e a Escola Normal Dom Bosco,particular, mantida pelas freiras salesianas,em Campo Grande, sendo as duas últimascriadas em 1930. Essas escolas normais fo-ram fechadas 10 anos após sua criação e,segundo Alves Laci (1998) em substituição,foram instituídos, cursos complementares,de apenas 01 ano, “[...] que não garantiam aformação dos docentes”. Em Campo Gran-de, esses “estudos especializados”3 foramimplantados desde 1939, que passou a fun-cionar anexo ao Liceu Campograndense.

Em 1947, através do Decreto Lei n.634 de 31 de janeiro de 1947, as escolas Nor-mais foram reabertas no Estado de MatoGrosso (ARAUJO, 1997). De acordo comMarcílio (1963, p. 196-2000), o Ensino Nor-mal seria ministrados em dois ciclos, sendoo primeiro, com o título de curso normalregional, destinado ao curso de regentes doensino primário, com duração de 4 anos,correspondente ao ginasial e, o segundo,como que uma especialização, com duraçãode três anos, destinado àqueles que termi-nassem o ginasial ou a primeira fase do cur-so normal, era destinado à formação de pro-fessores primários4 . Tudo conforme a LeiOrgânica do Ensino Normal, instituida pelodecreto lei 8530/1946 que “fixou normas paraa implantação desse ramo de ensino em todoo território nacional” (ROMANELLI, 1986,p. 163).

De acordo com Filho “ [...] em 1941,cerca da metade dos professores em exercí-

cio, no estado, não haviam recebido qual-quer orientação específica para o trabalhoque realizam. [...]”. A necessidade de for-mação de professores continuou a ser umproblema no Estado. Somente no final dosanos 1940, verificou-se um aumento de es-colas destinadas à formação de professo-res. Araújo (1997, p. 121) salienta que naporção sul do Estado, por cerca de 10 anos,somente ocorreram cursos intensivos. OCurso Normal só passou a ser ministradoem três anos a partir de 1958, respeitando oDecreto n. 555.

A primeira Lei de Diretrizes e Basesda Educação Nacional, Lei Federal 4024/61,estabeleceu as normas válidas para todo osistema educacional brasileiro e, em relaçãoà formação de professores, situou o ensinonormal no ensino médio.

Em 1971, com as modificações im-pressas pela Lei 5692/71, a formação do pro-fessor primário (1ª a 4ª série) passou a serespecificamente ao nível do 2º grau, em cur-sos de 3 ou 4 anos, podendo atuar até 5ª ou6ª série, ou habilitação em três anos, comestudos adicionais de 1 ano. O curso nor-mal passou a ser denominado Habilitaçãopara o Magistério e a formação de profes-sores para atuar nesse curso foi delegadaaos cursos superiores de pedagogia.

Nos anos 1990 a situação da educa-ção no Brasil ainda se apresenta problemá-tica. Em meio a muitos professores sem omínimo de formação se misturam outrosque são considerados leigos por atuaremem áreas não condizentes com a formação.Isso só foi alterado frente ao impositivo daLei de Diretrizes e Bases da Educação Naci-onal Lei 9394/96, em seus artigos n.º 63 e 87,quando da decisão nacional, de todo funda-mental e necessária, de elevar o nível supe-rior aqueles educadores que já se encontra-vam em sala de aula.

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13ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [A CRIAÇÃO DO CURSO

NORMAL SUPERIOR

Em 1999, a partir de estudos realiza-dos pela Secretaria de Estado de educaçãode Mato Grosso do Sul e Prefeituras Muni-cipais, verificou-se uma demanda de 1887profissionais em sala de aula de instituiçõespúblicas com formação em nível médio es-parramados pelo estado.

Assim, pautados na missão deinteriorizar o ensino superior, procurou-segarantir que a UEMS, criando o Curso Nor-mal Superior, atendesse as determinaçõesda Constituição Federal de 1988 quanto aeducação como direito de todos e dever doEstado (...) Art,205, e à LDB 9394/96, queem suas disposições transitórias, art. 87 § 4º,preconizava que no prazo de dez anos “so-mente serão admitidos professores habili-tados em nível superior”(...), considerandotambém a extinção progressiva do CursoNormal/Magistério como formação do en-sino médio.

O Curso Normal Superior criado em1999 começou a funcionar em 2000 comouma graduação equivalente à pedagogia,mas com funcionamento flexibilizado deforma a permitir a participação dos profis-sionais residentes nos pontos mais distan-tes do Estado. Considerando a extensãoterritorial, projetou-se o funcionamento docurso inicialmente em 8 municípios, dividi-da a coordenação em dois pólos: Douradose Campo Grande.

Foram firmados convênios com di-versas prefeituras, com vistas a possibilitara locomoção dos professores/alunos dosdiferentes municípios do Estado para o pólomais próximo. O convênio visava a viabiliza-ção do acesso dos alunos às aulas presenciais,ficando sob responsabilidade da Prefeiturao transporte, a alimentação dos alunos, bemcomo a dispensa de suas atividades docen-

tes nos dias de aula presencial, previstassempre às sextas-feiras e sábados. Foi esta-belecido, também, convênio com a Secreta-ria de Estado de Educação visando possibi-litar o acesso a professores vinculados à redeestadual de ensino.

Para o cumprimento dessa tarefa, oNormal Superior adotou uma metodologiadiferenciada, considerando como ponto departida a cultura e o conhecimento já trazi-dos pelos alunos, de suas experiências pes-soais e profissionais. Assim, nos días das au-las eram discutidos os textos, as experiênci-as, as pesquisas. A diferença é que ao ler so-bre educação, suas posibilidades e limitações,os alunos do Curso Normal, por ja estaremem sala de aula, puderam refletir teoría eprática de forma mais eficaz. As dificuldades,as dúvidas eram superadas pela disponi-bilização de uma linha telefônica gratuita paraos alunos, fax, endereço eletrônico e, por al-gum tempo, aulas por teleconferencia. ,Essametodología, revelou-se uma das experiên-cias mais inovadoras da UEMS, em um mo-mento em que o mundo se encontraglobalizado pelos meios de comunicação enovas tecnologias de informação.

É necessário evidenciar que tomou-se o cuidado necessário no uso dessas no-vas tecnologias, alternando aulas presenciaisem grupo, com atividades de auto-estudo,além de orientações, atendimento persona-lizado e realização de Jornadas Acadêmicas,com publicações das palestras e da produ-ção dos alunos em CDrom e livros. A estru-tura curricular modular, materializada nacompactação de carga horária em finais desemana constituiu-se num recurso que semostrou extremamente eficaz para superara fragmentação do conhecimento, que seimpõe ao aluno do sistema regular. A expe-riência mostrou que esse é um caminho re-volucionário, que poderá ser seguido poroutros cursos superiores, com ganhos na

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200914 ]aquisição de conhecimentos. Além do que,essa formatação modular oferece a vanta-gem de reduzir os custos do curso e facilitaro acesso do aluno à universidade.

O Pólo de Dourados, ao longo deseus dez anos de funcionamento realizou 6vestibulares, sendo 22 turmas entre os Mu-nicípios de Dourados, Amambai, MundoNovo, Naviraí, Nova Andradina e PontaPorã, totalizando 946 os profissionais for-mados por esse pólo.

Considerando que o curso que oraestudamos foi projetado exclusivamentepara os profissionais das redes públicas, seuprincipal objetivo era proporcionar reflexãoe a otimização da prática docente e contri-buir para melhorar a realidade didático-pe-dagógica da educação sulmatogrossense,democratizando o acesso ao conhecimento.

Após a meta alcançada em termosnuméricos, quais teriam sido as reais con-tribuições do Curso? Teria apenas seguidoas tendências das políticas para a formaçãode professores diminuindo os dados esta-tísticos?

REPERCUSSÕES

Frente a essas questões foi realizadoum questionário, no qual elaboramos 13questões sendo 11 de múltipla escolha e 2argumentativas. Dessa amostragem, as ques-tões que nos importam para este trabalhosão: a número 7 que trata sobre a continui-dade de estudos após conclusão do curso, anúmero 9 que questiona a aprovação ou nãoem concursos e a número 13 sobre quais ospontos mais relevantes e menos relevantesdo curso. O questionário foi encaminhado atodos os alunos via e-mail, cujo endereço ain-da se mantinha o mesmo nos arquivos doCurso. Respon-deram a esse questionário196 alunos de todos os municípios em quefuncionou o Curso.

Assim, quanto a continuidade dosestudos, desconsiderando os 71 alunos queestão concluindo o curso em 2009, 82 de-ram continuidade aos estudos, sendo 4 emnível de mestrado e 78 com especialização.Dentre esses, 7 alunos responderam terdado continuidade aos estudos a partir dascapacitações dos municípios; alguns alunosfizeram outra graduação ou mais de umaespecialização. Ainda com relação a esteitem, 35 alunos responderam não ter dadocontinuidade aos estudos, mas indicam emoutras questões terem participado de pro-gramas ofertados pelos municípios.

“A metodologia favoreceu o desenvolvimen-to do hábito de leitura. Adquiri o hábito deestudar nos finais de semana.”(Mires, 2003)

Assim, muito mais do que habilitarprofessores, cobrança da política de forma-ção de docentes, o curso propor-cionoucondições para que grande parte dos alu-nos seguisse buscando maiores qualifica-ções, inserindo – o no espaço acadêmico.

Com relação ao questionamentosobre a participação em concurso e quantoao resultado deste (questões 8 e 9), tambémé necessário desconsiderar os alunos queestão concluindo o curso em 2009. Dosegressos , 89 participaram de concursos, sen-do que desses apenas 5 não foram aprova-dos. Do total de questionários respondi-dos, 30 responderam não ter participado deconcurso e, dentre esses, alguns justificaramque já eram efetivos.

Com isso podemos perceber que aconclusão do curso lhes possibilitou, além docertificado, condições de garantir seu espaçono mercado de trabalho, autonomia, elabo-ração e confronto de novos conhecimentos.

“Mudou minha visão de mundo.” (Neusa,2003)

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15ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [

“Para mim é um curso de excelência; não é atoa que a maioria das pessoas que prestam con-curso passam bem colocadas, como no meucaso, passei em 4 lugar. Em Caarapó a maioriadas professoras que passaram no mesmo con-curso que eu, fizeram ou estavam cursando oNormal Superior.”(Marilene, 2006)

Quanto à última questão onde sesolicitou que relatassem os aspectos maisrelevantes e menos relevantes do curso, asrespostas foram diversas e por isso foramagrupadas de acordo com as idéias e repre-sentam grupos:

Aspectos mais relevantescitados:

- metodologia voltada para a sala deaula;

- orientações dos trabalhos;- trocas de experiências entre colegas e

professores experientes;- conhecimentos adquiridos deu base

para o trabalho em sala de aula; melhorou aatuação profissional

- carga horária diferenciada, com aulasnos finais de semana possibilitou a freqüên-cia;

- as disciplinas se relacionavam umascom as outras;

- por estarmos em sala de aula, a rela-ção teoria e prática era constante;

- favoreceu a reflexão do cotidiano, asdificuldades dos alunos.

- Profissionais comprometidos;-Qualidade dos materiais;- participação em eventos externos e

em semanas acadêmicas do Curso;- profissionais comprometidos;- Trabalho de elaboração própria, pes-

quisas, projetos, estágios, aprendemos a fa-zer artigos, resumos fichamentos;

- O curso nos obrigou a estudar, discu-

tir, refletir nosso dia a dia e com isso obser-vamos mudanças.

Aspectos menos relevantescitados:

- aulas não era todos os fins de semana;- alguns professores não estavam pre-

parados para trabalhar nesse curso semi-presencial;

- ausência de espaço físico específico parao curso (nas primeiras turmas);

- exigência de vínculo com a rede;- falta de maiores recursos tecnológicos,

materiais e livros para pesquisas;- poderia ser mais encontros com carga

horária menor...seria menos desgastante;-distancia entre aluno e professor tor-

na-se difícil no momento da realização dostrabalhos;

- Muito material para estudo;- algumas disciplinas com pouca carga

horária;- alguns alunos foram aprovados sem

condições;- alguns encontros eram muito próxi-

mos dos outros, dificultando a realização detodas as leituras e tarefas, uma vez que to-dos nós somos profissionais regulares e te-mos trabalho todos os dias.

A partir dos elementos apre-senta-dos, podemos analisar o impacto proporci-onado pelo curso normal superior no Esta-do, não só de certificar professores para asescolas das redes públicas, mas proporcio-nar crescimento profissional e intelectual dosprofessores, produzindo autonomia, trocade saberes, conhecimento e olhares diferen-tes sobre as coisas do mundo e as questõesque permeiam a profissão professor. A tro-ca de experiências, as reflexões sobre a pró-pria prática possibilitaram condições demelhoria e, consequentemente uma melhoratuação nos espaços escolares.

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200916 ]Falando agora como uma das pro-

fessoras mais antigas do curso normal su-perior pólo de Dourados, que enfrentou opreconceito de profissionais dos diferentescursos da UEMS e de outras instituições eque em nenhum momento desacreditou daproposta de um curso de qualidade aindaque fosse mais flexível, isso se deve por com-partilhar das idéias de Alves (1998) quandonos alerta para o paradoxo da escola comoestá organizada atualmente, ainda calcadanos princípios de uma sociedade manufatu-reira, proposta por Comênio, em detrimen-to dos avanços tecnológicos atuais. Um dospontos mais importantes destacados nestaexperiência, compreendo tenha sido o fatode o curso ser somente para professores jáem sala de aula o que possibilitou um retor-no mais rápido, uma vez que eles podiam sereportar diretamente às suas salas de aula.A troca foi mais intensa! Como sou profes-sora do curso de Pedagogia no sistema re-gular, posso dizer que a maior eficácia docurso Normal se deve a isso.

Aprendi muito com os grupos comos quais compartilhei, coordenando discus-sões orientando trabalhos, discutindo filmes,debatendo textos. Também me tornei maisflexível, não permissiva, mas atenta e tole-rante aos limites e ritmos diferenciados.Refletindo minha própria prática pude to-mar decisões diferenciadas para situaçõesdiversas, sendo umas mais acertadas queoutras. Me tornei mais humilde ao replanejare reavaliar minhas diferentes disciplinas.Conheci e trabalhei com diferentes profes-sores que contri-buíram para a minha for-mação. Ao incentivar vôos mais altos tam-bém me lancei a tal aventura e tenho medesafiado constantemente.

Assim, o Curso Normal Superior,longe de resolver os problemas da educa-

ção, se constituiu num instrumento provo-cador em que alunos e professores, a partirdas diferentes aprendizagens, tem se desen-volvido de acordo com as condições e inte-resses individuais.

“Me fez ver a vida de uma maneira diferente,a acreditar mais em mim, a defender meuspontos de vista [...] , profissionalmente mi-nhas atitudes mudaram. “(Maria O. S, 2005)

Sabemos que novas demandas deformação de professores surgem conformea sociedade aumenta. Os últimos dados doINEP (2009) sobre a formação de professo-res no Brasil dão conta de que dos 1.882.961existente hoje no Brasil, distribuídos pelosdiversos Estados e pelas diferentes séries daEducação Básica que compreende a Educa-ção Infantil, ensino fundamental e ensinomédio, 15.963 professores ainda atuam pos-suindo apenas formação no Ensino Funda-mental que compreende, atualmente, o 9ano; 607.105 concluiram o ensino médio ,mas destes, apenas 499.217 possuem for-mação em Magistério.

Como vemos, o Brasil ainda enfren-ta problemas com relação à formação deprofessores. Será necessário novo estudo apartir do ano 2010, prazo determinado paraadequação à legislação para verificarmosdesse número qual é a parcela que se deveao estado do MS. Concordo com Neliana(formanda em 2008) quando diz que “a edu-cação [em Mato Grosso do Sul] perderámuito com a extinção desse curso”.

“A metodologia utilizada pelos professores mefez estudar muito e entender que nessa profis-são é necessário ler e refletir muito.”(Ana Célia, 2008).

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17ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [NOTAS

1 Documento disponível em http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/conselheiro.pdf.Capturado em junho de 2004.2 O Ato Adicional de 1834 promoveu a descentralização do ensino elementar etransformou os Conselhos Provinciais em Assembléias Legislativas provinciais compoderes para regulamentar a instrução pública e também seus estabelecimentos.3 Termo utilizado por Lourenço Filho, Diretor do Instituto Nacional de EstudosPedagógicos, ao fazer a Introdução do Regulamento da Instrução Pública de MatoGrosso, de 1942.4 Justificamos a utilização das Leis em segunda mão pelo fato de não termos obtidoacesso aos documentos originais, ainda que tenham sido dispensados esforços paratanto.

REFERÊNCIAS

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RESUMOUma viagem inesquecível é um breve artigo que relata a importância do Curso

Normal Superior da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul – UEMS, na graduaçãode professores. A importância de proporcionar um curso com horários diferenciados,levando a Universidade até os Municípios, permitindo com isso a oportunidade da qualifi-cação desses profissionais e o que isso representa para o desenvolvimento da educação namaioria dos Municípios do Estado.

ABSTRACTUnforgettable trip is a succinct article that reports the importance of the Normal

College Course of the University of the State of Mato Grosso do Sul – UEMS, in graduationof teachers. The importance of provide a course with special schedules, leading university tothe municipalities, permitting thereby the opportunity of the qualification of theseprofessionals and what it represents to the development of the education in the majority ofthe municipalities of State.

UMA VIAGEM INESQUECÍVELProf. Msc. Roberto Padim SILVEIRA

Fiquei pensando em várias formas de de-finição para intitular este artigo, confes-

so que fiquei até um pouco preocupado, poisnada que vinha em meu pensamento tinhauma forma de expressão forte que realmen-te pudesse definir o que foi essa grande ex-periência profissional ao trabalhar comoprofessor no Curso Normal Superior – Pólode Dourados, da Universidade Estadual deMato Grosso do Sul. Após meditar bastan-te, entendo que o título “Uma Viagem Ines-quecível” foi a melhor escolha, pois real-mente foi uma grande viagem que teve umaduração de 7 anos, tempo este de muito tra-balho, dedicação, ministrando as discipli-nas de Psicologia da Educação, Psicologia doDesenvolvimento e Literatura Infantil. Du-rante esta jornada, tive a oportunidade desentir e comprovar a grande importânciaque foi para os profissionais de educação, a

implantação do Curso Normal Superior.Importante sobre vários aspectos, como ode levar a Universidade até as populaçõesmais distantes dos grandes centros; propor-cionar horários diferenciados para que oprofessor não precisasse se ausentar de seutrabalho para se qualificar; proporcionaruma troca de experiências tão rica entre asmais diferentes comunidades; enfim, cum-prir o papel social proposto pela Universi-dade Pública de levar a educação aonde delase fizer necessário.

Durante essa viagem, situações dasmais inusitadas, até aquelas consideradassimplórias, foram transcorrendo, difícil aquicitar todas, mas existiram algumas que é im-possível deixar de lado, como a aluna quedormiu no ônibus e só acordou quando suacidade já tinha ficado bem para traz; como oprofessor que resolveu ministrar sua aula na

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19ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [reserva indígena e depois não sabia comoretornar; professor que foi para a unidadetrabalhar e era o seu dia de folga; ônibus que-brado e atraso de alunos estavam sempre napauta. Acadêmicos trazendo seu almoço, afamosa “matula”, pois não tinham dinheiropara o restaurante; a socialização na hora dasrefeições se transformou em atos para servirde exemplos para muita gente.

Quando me perguntavam como eufazia para conciliar entre dar aulas em dife-rentes unidades, não sabiam meus interlo-cutores que aquilo me fazia bem, me reali-zava internamente, por saber que estavaproporcionando condições para o cresci-mento intelectual de pessoas que não tinhamcomo fazer um curso superior se não fossedessa maneira, nos moldes especialmenteestabelecido pelo Curso Normal Superior.

Mas você viaja com o seu carro? E odesgaste? Simplesmente respondia isso é ode menos, carro foi feito para rodar. Naverdade essas viagens tornaram-se rotinasnesse tempo de trabalho, mas uma rotinamuito salutar, pois ofereciam oportunida-des de se conhecer tantos lugares, cidades,comunidades, estradas, até mesmo a paisa-gem de cada local, etc.

Por falar em conhecer, não possodeixar de citar o que aprendemos também,a cultura de cada comunidade, o modo sim-ples da educação do campo, a união de cadagrupo em defesa de suas prioridades e, prin-cipalmente, a vontade e a motivação dosacadêmicos em busca de novos conhecimen-tos.

O Pólo de Dourados formou duran-te esse período de 10 anos um grande nú-mero de profissionais da educação, maisprecisamente 946 professores. Estes pro-fissionais atuam hoje em vários municípiosdo Estado. São docentes qualificados e quedesempenham a profissão do magistériocom maior segurança, sabedoria e, acima

de tudo, com a autoestima elevada, por pos-suir na sua bagagem acadêmica um cursosuperior.

Já que estamos falando de números,podemos multiplicar esses 946 profissionaispelo número de alunos, na proporção de 30por cada professor, teremos um total de28.380 crianças recebendo esse benefícioanualmente, crianças recebendo uma edu-cação proporcionada por técnicos gradua-dos e capacitados, e isso tem feito uma gran-de diferença. Já pensou você parar para ima-ginar que a sua atuação como professorcontribuiu nesse processo e hoje auxilia naformação educacional dessas crianças? Écom certeza motivo de muito orgulho paraqualquer profissional que ama o que faz. Ese somarmos esses 946 professores do Pólode Dourados com os 1.094 formados peloPólo de Campo Grande, teríamos, na mes-ma proporção, mais de 60.000 crianças re-cebendo uma educação de qualidade emnosso Estado. Isso tudo é o que representao Curso Normal Superior da UniversidadeEstadual de Mato Grosso do Sul.

E você leitor, que neste momento estátomando conhecimento deste memorávelfeito realizado pela UEMS, pode estar seperguntando, mas um programa que alcan-çou tanto sucesso, atendeu aos objetivospara os quais foi implantado, levou a Uni-versidade para os mais distantes locais des-te Estado, por que está sendo encerrado,uma vez que a demanda ainda existe? É umquestionamento difícil de ser respondido eeu não vou aqui enumerar justificativas paraa resposta, diria somente que foi um Proje-to, um Projeto com prazo para iniciar e ter-minar, e se está sendo concluído com tantosucesso, temos que dar os parabéns paratodos que dele fizeram parte.

Foi realmente uma grande viagem,uma jornada inesquecível com uma experi-ência profissional rica em todos os sentidos.

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OS DESAFIOS ENFRENTADOSNA IMPLEMENTAÇÃO DO

CURSO NORMAL SUPERIORNOS 10 ANOS DE OFERTA

Profª Drª Maria José de Jesus Alves Cordeiro1

Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul

1 Doutora em Educação-Currículo pela PUC/SP; Docente efetiva; Líder do Grupo de Estudos e Pesquisa emEducação, Gênero, Raça e Etnia; Pró-Reitora de Ensino da UEMS de outubro de 2000 a maio de 2005.

RESUMO

Este artigo deriva-se da palestra de abertura da Semana Acadêmica do Curso Nor-mal Superior da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul – UEMS, realizada em 2009em comemoração aos dez anos do curso. O objetivo foi discutir os desafios enfrentadosdurante o processo de implementação do curso, considerado uma proposta inovadora,mas que sofreu severas críticas no ambiente acadêmico da UEMS e das demais instituiçõesdo Brasil. No entanto, a despeito de tudo isso, o curso se encerra com um saldo altamentepositivo de ingresso e de sucesso acadêmico dos egressos, bem como de todo seu corpodocente que ao longo do processo deram mostras de que desenvolver um trabalho deforma coletiva fortalece o grupo e a proposta em execução.

Palavras-Chaves: Normal Superior – Implementação -Desafios

ABSTRACTThis article derives from the opening lecture of the Normal Superior’s Academic

Week in the State University of Mato Grosso do Sul (UEMS) held in 2009, an event tocelebrate the ten years anniversary of the course. The goal was to discuss the challengesfaced during the implementation process of the course, considered an innovating proposalthat had suffered severe critics in the academic environment of UEMS and other institutionsin Brazil. However, despite all this, the course is finished with a positive number of studentsenrolled and graduated who have professional success, and all it’s professors who throughoutthe process have shown that the collective development of a work strengthens the proposalrunning and the own group.

Key-words: Normal Superior, Implementation Process, Challenges.

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21ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [

O processo de globalização e o capitalis-mo trouxeram para a escola contradi-

ções que fazem dessa uma reprodutora dasestruturas de dominação e ao mesmo tem-po, um campo de interpelação dessas es-truturas. Para Aguiar (2006, p.152)

Quando a escola oferece situações de de-safios e de aprendizagens que levam aoquestionamento do senso comum, e decriatividade, ela possibilita a efetivaçãode mudança para patamares superiores.O exercício desse papel implica a tomadade decisões político-pedagógicas em vá-rias instâncias do sistema educacional eda escola.

Na perspectiva de fazer da escola umlocal de transformação, do exercício dacriatividade, da autonomia e tomada de de-cisões, segundo Rodriguez e Vargas (2008) apartir dos anos de 1990 as políticas de forma-ção docente ganharam centralidade nas dis-cussões de projetos de reformas educacio-nais na América Latina e, por conseguinte noBrasil. Nos debates e formulação de diversosdocumentos internacionais e nacionais, apa-rece de modo implícito a responsabilidadedo estado em oferecer e assegurar as opor-tunidades de formação inicial e continuadaaos docentes da Educação Básica. Um dosobjetivos da política de formação de profes-sores é melhorar a qualidade e os resultadosdos serviços educativos oferecidos.

No Brasil as discussões levam a cria-ção do Curso Normal Superior, uma pro-posta de formação inicial em serviço para osdocentes da Educação Infantil e séries iniciaisdo Ensino Fundamental. A proposta criouuma grande polêmica que perdura até hojeno âmbito da Pedagogia, considerada o úni-co lócus de formação docente nesses níveisde ensino.

Entretanto, a despeito de toda sortede críticas e embates teóricos, o Curso Nor-

mal Superior foi criado e dado às instituiçõesde ensino superior a autonomia de oferta. AUniversidade Estadual de Mato Grosso doSul – UEMS saiu à frente das demais institui-ções do país tendo criado em 1999 e ofertadoem 2000 o primeiro curso Normal Superiordo Brasil. O curso da UEMS foi oferecidopela primeira vez no vestibular do ano 2000com 400 (quatrocentas) vagas, sendo 200 (du-zentas) para o Pólo de Dourados e 200 (du-zentas) para o Pólo de Campo Grande.

A oferta de vagas nos durante essesanos atendeu os seguintes municípios emcada pólo:

- Pólo de Dourados - Dourados,Amambai, Mundo Novo, Navirai, NovaAndradina, Ponta Porá. Nesse pólo ingres-saram 1078 acadêmicos e formaram-se até2008 um total de 801 egressos. Para 2009deverão se formar 130.

- Pólo de Campo Grande - CampoGrande, Aquidauana, Cassilândia, Coxim,Jardim, Paranaíba. Nesse pólo ingressaram1236 acadêmicos e formaram-se até 2008um total de 860 egressos. Para 2009 deverãose formar 190.

Durante este período e incluídos nosdados apresentados tivemos ainda dois cur-sos específicos para os indígenas: emAquidauana para os Terenas e em Amambaípara os Guaranis. A partir de dezembro de2003, a exemplo dos demais cursos, o Nor-mal Superior também ofereceu vagas nascotas para negros e indígenas com preen-chimento das mesmas.

Ao ofertar esse curso, a UEMS to-mou a decisão de contemplar a maioria dapopulação docente em exercício com umprojeto educativo alicerçado em pressupos-tos que ultrapassam a visão restrita de for-mação acadêmica inicial e, considera umtodo social, econômico, político e pedagógi-co de modo a construir novo panoramaeducacional na rede pública de ensino do

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200922 ]estado, principalmente no atendimento aexigência legal de professores em exercíciocom ensino superior até 2010.

O projeto pedagógico inicialmenteaprovado em 1999 sofreu posteriores alte-rações visando atender especificidades eorientações legais emanadas pelos órgãoscompetentes dentro e fora da UEMS. Noentanto, essas alterações só contribuírampara a melhoria do currículo e qualidade docurso. Um dos pontos que chama atençãono curso é a realização de reuniões pedagó-gicas contínuas do corpo docente. Além dis-so, o perfil do egresso (professor) que des-de a primeira oferta está claro para os do-centes e discentes. Esse aspecto foi constan-temente assegurado através do trabalho dacoordenação do curso.

O professor formado neste cursoapresenta um perfil de:

- pesquisador reflexivo, que parte dasperspectivas de análise de caráter intra—escolares centrados em variáveis internas dopróprio desenvolvimento profissional, con-siderando as dimensões contextuais e polí-tico-ideológicas, as interações entre culturaescolar e o universo cultural dos diferentessujeitos presentes na realidade escolar e,

- habilitado para atuar no ensino, naprodução e difusão do conhecimento, emdiversas áreas da educação, tendo a docênciacomo base de sua formação. Portanto, umprofissional capaz de:

- identificar problemas socioculturaise educacionais e de propor respostas criati-vas às questões da qualidade de ensino;

- articular ensino e pesquisa na pro-dução do conhecimento e na prática peda-gógica;

- dominar processos e meios de co-municação em suas relações com os pro-blemas educacionais, ou seja, comprometi-do ética e politicamente com o conjunto dapopulação que atende.

No entanto, mesmo com um proje-to pedagógico dessa natureza o curso en-frentou desafios durante sua imple-mentação. Os principais desafios foram:

1 - Enfrentar o discurso acadêmicodiscriminatório dentro e fora da UEMS,principalmente da área da Pedagogia, queapontava o curso como aligeirado e de máqualidade.

2 - Construção de parcerias communicípios e estado para subsidiar a pre-sença dos professores nos dias de aulaspresenciais e eventos dos cursos, bem comooutras despesas inerentes as aulas.

3 - Resistência e omissão de algunsprofessores lotados no curso em assumirpoliticamente a defesa de um curso consi-derado “diferente e criticado”.

4 - Uso do concurso específico e lo-tação no curso Normal Superior por partede vários docentes hoje efetivos, apenascomo via de ingresso na UEMS, pois muitosdeles faziam parte do grupo encarregadodas críticas desfavoráveis, não contribuindocom o curso.

5 - Corpo docente na quase totali-dade de professores cedidos e convocadoscomo resultando da situação anteriormen-te comentada.

6 - Dificuldade dos discentes em rela-ção à metodologia do curso, pois já possuí-am uma postura considerada “viciada” emouvir o professor e, nesse curso exigia-separticipação no processo de construção desua aprendizagem e articulação do conheci-mento teórico com sua prática cotidiana.

7 - Deficiência na infra-estrutura dainstituição em relação às necessidades deatendimento da proposta principalmente naparte referente à carga horária, à distância eviagens dos docentes aos pólos de ofereci-mento.

8 - A quantidade de pólos e alunosatendidos.

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23ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [Enquanto Pró-Reitora de Ensino no

período de outubro de 2000 até maio de2005 pude acompanhar passo a passo todaimplementação do projeto, as dificuldades,o esforço coletivo do grupo de professoresque aos poucos foram assumindo politica-mente o curso, vencendo os desafios e ga-rantindo a formação de egressos compro-metidos com a educação e a escola pública,tornando-se um curso de referência naUEMS. Como isso foi possível diante de tan-tos desafios?

Em se tratando do discurso acadê-mico discriminatório dentro e fora daUEMS, a melhor maneira de enfrentamentofoi a demonstração do trabalho realizadopelo curso, como por exemplo, as semanasacadêmicas realizadas em parceria com asprefeituras, secretarias de educação e ou-tros segmentos ligados ao assunto. A serie-dade, capacidade de organização egerenciamento das atividades, bem como aqualidade dos palestrantes escolhidos ano aano, a apresentação de trabalhos científicoscom publicação em CD indexado aos pou-co foi minando esse discurso e ensejandono âmbito dos demais cursos o desejo detambém fazer eventos com a mesma quali-dade técnica e pedagógica que o NormalSuperior sempre realizou.

Tudo isso foi possível a partir dasparcerias realizadas com os municípios nosentido de garantir aos professores lotadosem suas redes, a oportunidade decapacitação em serviço. Dessa forma, a uni-versidade ao criar o Curso Normal Superi-or colocou em execução sua missão deinteriorizar o ensino ao mesmo tempo emcumpria o disposto na Lei nº 9.394, de 1996,quando trata dos profissionais da educaçãocomo citado abaixo.

Art. 61. A formação de profissionais daeducação, de modo a atender aos objeti-

vos dos diferentes níveis e modalidadesde ensino e às características de cada fasedo desenvolvimento do educando, terácomo fundamentos:I – a associação entre teorias e práticas,inclusive mediante capacitação em ser-viço;II – aproveitamento da formação e ex-periências anteriores em instituições deensino e outras modalidades.

As prefeituras celebraram convêni-os nos quais garantiam o deslocamento,hospedagem e alimentação dos professo-res discentes, bem como a prestação de al-guns serviços como: cedência de funcioná-rios para atuar como supervisor nos pólos,cópias ou compra de materiais didáticos,auxílio nas despesas das semanas acadêmi-cas.

Se fora da universidade o curso ga-nhava cada vez mais apoio, incentivo e soli-citações de abertura de turmas nos maisvariados pontos do estado, dentro do pró-prio curso ainda borbulhavam comentáriospor parte de alguns professores no sentidode fechar o curso e abrir um de Pedagogia.Muitos ao perceberem que o curso se for-talecia cada vez mais, optaram pela saída domesmo, se lotando em outros cursos de li-cenciatura e, continuando dali a crítica malsucedida.

No ano de 2000 foi realizado um con-curso público para professores, específicopara o curso Normal Superior. No entanto,o que verificamos na oportunidade foi quemuitos dos que fizeram o concurso não ti-nham a intenção de trabalhar neste, masapenas ingressar na universidade e o maisrápido possível mudar de curso. Alguns des-ses docentes faziam parte do grupo contrá-rio à existência do Normal Superior e, por-tanto, não ficaram para construir a históriaque hoje completa dez anos de absolutosucesso.

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200924 ]Mesmo com um número de docen-

tes considerado grande na visão daquelesque criticavam a oferta do curso, temosconsciência de que a carga horária de lota-ção dos docentes deste curso sempre foimaior do que de qualquer outro da UEMS.O que os críticos de plantão não viam ounão queriam ver, era a quantidade de tur-mas e pólos diferentes que cada professoratendia em sua disciplina ao ponto de mui-tos docentes ministrarem mais de 15 horasaulas durante o ano letivo.

Outro fator preponderante é a jor-nada de horas aulas que são ministradas deforma seguida, chegando a 20 horas sema-nais em dias de sexta e sábado, além do vo-lume expressivo de trabalhos e avaliaçõesque cada um deve orientar e corrigir tantode forma presencial quanto à distância.

Para dar sustentabilidade ao cursopermitindo a oferta nos vários pólos de for-ma continuada até que a demanda fosse exau-rida, como Pró-Reitora autorizamos a lota-ção de um número fixo de professores efeti-vos e cedidos nos pólos de Dourados e Cam-po Grande a partir dos quais atenderiam osdemais. Na época foram lotados uma médiade 8 (oito) docentes em cada pólo. A cadaano que passava a demanda aparecia e maisturmas foram oferecidas, ocasionando a ne-cessidade de ampliação do corpo docente.No entanto, sabedores de que esta demandaem algum momento seria completamenteatendida, optamos pela lotação de professo-res convocados para completar o quadro.

A medida tinha também como ob-jetivo evitar que o Curso Normal Superiorservisse mais uma vez como ponto de pas-sagem para aqueles que apenas visavamusufruir da oportunidade de ingresso nacarreira acadêmica.

Em relação aos discentes, acredita-mos que o maior desafio tenha sido mudara perspectiva que cada um traz em relação à

sala de aula, pois esses professores faziam efazem parte de uma cultura do “ouvir”, oucomo dizia Paulo Freire, de uma educaçãobancária, na qual o professor fala e o alunoescuta. A metodologia usada no Curso Nor-mal Superior a qual tem parte da carga ho-rária à distância, outra parte concentradaem finais de semana, exigência de constru-ção de projetos além da monografia e está-gios, causou impacto nos discentes gerandoa necessidade de mudança de postura, há-bitos de estudos e a forma de ver e pensar aeducação, inclusive a que praticam em suasala de aula.

Para viabilizar o uso de metodologiaa distância que no inicio do curso era feitoapenas via correios, o curso foi equipadocom aparelho de fax e um telefone 0800 einternet, oportunizando assim o contato di-reto e mais freqüente entre professores ealunos. Nasce assim o sistema de plantãosemanal dos docentes. Para os alunos, o te-lefone 0800 representa comunicação semcustos de qualquer ponto do estado, poisprecisavam apenas de um aparelho orelhão.Além disso, o uso de metodologia de ensi-no a distância de acordo com Preti (2000)cria a possibilidade de o discente construirsua autonomia política e pedagógica, ou seja,ser sujeito da aprendizagem.

O currículo do curso Normal Supe-rior proporciona uma “aprendizagem quese concretiza através do diálogo entre sujei-tos que interagem com o mundo e produ-zem cultura” (BENASSULY, 2002 p.190),possibilitando aos professores discentes dis-cutir seu ato ou ação educativa, ao mesmotempo em que, junto com os docentes for-madores pensar as relações educacionais epedagógicas tecidas no cotidiano do espaçopolítico que ocupam.

Baseados nessas concepções, os do-centes do curso reformularam o projetopedagógico do curso Normal Superior du-

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25ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [rante sua oferta, pois segundo Benassuly(2006, p.192)

Um processo de ensino-aprendizagemque privilegie a prática pedagógica po-tente e criativa deve ser articulado comprojetos pedagógicos pensados e elabo-rados para além da visão estreita dadisciplinariedade, da linguagem frag-mentada e dos conteúdos prontos e cris-talizados dos livros didáticos e compro-metidos com uma discutibilidade de altaqualidade política e emancipatória queprivilegia a razão crítica.

Na construção de uma prática peda-gógica que forma para além do mercado detrabalho, o foco deve estar centrado no fa-zer história, pois fazer história é saber pen-sar. Saber pensar a sociedade é parte essen-cial do saber fazer para transformar. Estapostura exige de nós educadores oenfrentamento e a superação de alguns de-safios inerentes a nossa função docente, taiscomo, entender:

• o que é ensino e o que é aprendiza-gem;

• a relação intrínseca entre os dois;• a função do professor/mestre e a

função do aluno/aprendiz nessa relação;• como devemos orientar e mediar a

construção do conhecimento;• que devemos assumir as dificulda-

des e buscar novos conhecimentos e novastécnicas;

• a necessidade de estabelecer cone-xões entre os conteúdos ensinados e os as-pectos sociais, culturais e históricos da vidado aluno/aprendiz;

• que a avaliação serve para diagnós-tico e mudança na prática pedagógica;

• que as dificuldades encontradas

podem se transformar em possibilidades denovas aprendizagens.

Acreditamos que esta foi e continuasendo até o momento a prática exercida nocontexto do curso Normal Superior que nãoteve medo de inovar rompendo fronteiras.Fronteiras essas colocadas principalmentepela ditadura do mérito que não deve serdesprezado, mas também não pode ser aúnica ou a mais importante condição exigidano processo ensino-aprendizagem.

Este é um momento de festa no qualcelebramos 10 anos de oferta do curso e 10anos de resistência física, pedagógica e mo-ral da coordenação, secretaria e corpo do-cente que muito cedo perceberam que o tra-balho coletivo é a maior e melhor arma uti-lizada para vencer desafios, obstáculos edescréditos. O “grupo do Normal Superior”como sempre foi chamado se fortaleceu econstruiu uma prática docente no interiorda UEMS que serve de modelo para os de-mais cursos.

Portanto, caros colegas docentes quejá estiveram nesse curso e os que ainda con-tinuam, prezada Profª Leocádia Aglaé PetryLeme, nossa reitora à época da criação eimplementação do curso, Profª Maria Be-zerra Quast, coordenadora desde setembrode 2002, funcionários e demais colaborado-res, quero saudar a todos nesse momentodizendo que esse curso fez a diferença nanossa instituição, no nosso estado e comcerteza em cada sala de aula nas quais cadaum dos nossos egressos seguem construin-do educação. Considero-me extremamen-te privilegiada de fazer parte dessa história,de estar aqui e ter colaborado com a exis-tência e resistência dessa proposta que ago-ra se encerra, mas que deixa sua marca dequalidade no rol das licenciaturas da UEMS.

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200926 ]REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AGUIAR, Márcia A. da Silva. Desenvolvimento com igualdade social, educação gestãoescolar: notas para um debate. In: FERREIRA, Naura Syria Carapeto (org). Políticas Públi-cas e Gestão da Educação: polêmicas, fundamentos e análises. Brasília: Líber Livro Editora,2006.

BENASSULY, Jussara Sampaio. A formação do professor reflexivo e inventivo. In:LINHARES, Célia e LEAL, Maria Cristina (orgs). Formação de Professores: uma crítica àrazão e à política hegemônicas. Rio de Janeiro: DP&A, 2002.

BRASIL. LDB: Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: Lei 9.364, de 1996 queestabelece as diretrizes e bases da educação nacional; e legislação correlata. 2.ed. Brasília:Câmara dos Deputados, Coordenação de Publicações, 2001.

PRETI, Oreste (org). Educação a distância: construindo significados. Cuiabá: NEAD/IE –UFMT; Brasília: Plano, 2000.

RODRIGUEZ, Margarita Victoria e VARGAS, Marilda Bonini. A formação de Professoresna América Latina: um balanço dos debates nos fóruns internacionais 1966-2002. In:RODRIGUEZ, Margarita Victoria e VARGAS, Marilda Bonini (orgs). Políticas Educacionaise formação de professores em tempos de globalização. Brasília: Líber Livro Editora, UCDB,2008.

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OLHARES SENSÍVEIS NAFORMAÇÃO DE PROFESSORES:

A ARTE E SEU ENSINO(Memórias do Curso Normal

Superior da Universidade Estadualde Mato Grosso do Sul)

Maria Cristina Ruiz Benito1

1 Professora do Curso Normal Superior/UEMS e do Curso de Artes Visuais/UNIGRAN e mestranda doPrograma de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.

RESUMOEste estudo apresenta a arte como fio condutor da formação de professores do

Curso Normal Superior da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul e pauta-se napromoção da importância da arte no contexto educativo, envolvendo aspectos teóricos,estéticos, culturais, pedagógicos e artísticos, de forma interdisciplinar. Nesta perspectiva,dialogamos com Barbosa (2002), Araújo (2007), Prado e Soligo (2005), Benjamin (1994),Pereira (1996) e Buoro (2003). Os fios da tessitura deste estudo, entremeados pela açãovivida, apresenta uma proposta de ação pedagógica que privilegia uma formação estética,perceptiva e interdisciplinar, proporcionando a possibilidade do acadêmico/professor per-ceber-se na professoralidade artística, observada na significação de uma ação pedagógicaespecífica ao ensino de arte.

Palavras-Chave: formação estética-pedagogia da arte-trama artística

ABSTRACTThis study presents the art as conductive thread of the teachers’ of the Course

Normal Superior of the State University of Mato Grosso do Sul formation and it is ruled inthe promotion of the importance of the art in the educational context, involving aspectstheoretical, aesthetic, cultural, pedagogic and artistic, in an interdisciplinary way. In thisperspective, we dialogued with Barbosa (2002), Araújo (2007), Prado and Soligo (2005),Benjamin (1994), Pereira (1996) and Buoro (2003). The threads of the tessitura of this study,intermixed by the lived action, it presents a proposal of pedagogic action that it privileges aformation aesthetic, perceptive and interdisciplinary, providing the academic’s / teacherpossibility to notice in the artistic professoralidade, observed in the significance of a specificpedagogic action to the art teaching.

Key Words: aesthetic formation - pedagogy of the art - it schemes artistic

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200928 ]PRA INÍCIO DE CONVERSA:

OS PRIMEIROS FIOS TECIDOS

Precisamos levar a arteque hoje está circunscrita

a um mundo socialmente limitadoa se expandir,

tornando-se patrimônio da maioria e elevando o nível de qualidade

de vida da população.

Ana Mae Barbosa (1991, p. 6).

Pensar em uma ação docente queenvolva a arte como fio condutor do pro-cesso de formação de professores, um dosobjetivos da disciplina Fundamentos eMetodologia da Arte para a Educação In-fantil e anos iniciais do Ensino Fundamen-tal, do currículo do curso Normal Superiorda Universidade Estadual de Mato Grossodo Sul, UEMS, configura-se como uma pro-posta contemporânea do ensino de arte, emque a mesma é considerada importante noespaço educativo por ser importante tam-bém fora deste espaço. Em relação à im-portância da arte na vida das pessoas demaneira informal, observamos também suaimportância de maneira formal, no espaçoeducativo e para que fique claro o potencialdesta via de conhecimento Barbosa (2002,p. 18) afirma que,

[...] por meio da Arte é possível desen-volver a percepção e a imaginação, apre-ender a realidade do meio ambiente, de-senvolver a capacidade crítica, permi-tindo ao indivíduo analisar a realidadepercebida e desenvolver a criatividadede maneira a mudar a realidade que foianalisada.

Pensando nessa importância da artena educação e considerando que o cursoNormal Superior em questão, finaliza suas

atividades neste ano de 2009, percebemos anecessidade de registrar sob a forma de me-mória, a experiência vivenciada na formaçãoestética, sensível, pedagógica, e artística deprofessores/acadêmicos1 que atuam nos anosiniciais do ensino fundamental. Experiênciavivenciada em oito anos2 da referida discipli-na e que é tratada como memorialpriorizando o conhecimento em arte comoformação mediada pela sensibilidade e peloconhecimento formal, uma questão ainda aser pensada e questionada nos cursos de for-mação de professores de arte.

No momento em que registramos aação docente vivida com esses professores/acadêmicos que atuam em escolas públicas,estaduais e municipais, é importante lembrarque este curso foi criado em parceria comprefeituras e Secretaria Estadual de Educa-ção, sob a forma de projeto, para atender aobrigatoriedade de formação superior naação didática desenvolvida na Educação In-fantil e anos iniciais do Ensino Fundamental.

Dessa forma, este estudo foi realiza-do numa proposta de apresentar, por meiode uma tessitura que envolve uma trama es-tética e sensível, os fios vivenciados neste pro-cesso de formação de professores numa pers-pectiva artística interdisciplinar em que a arteé importante pela sua especificidade e nãocomo recurso metodológico para outras árease ou disciplinas e tampouco como propostade decoração e artesanato para as datas co-memorativas desenvolvidas nas escolas. Sur-ge, dessa situação, a luta de professores dearte em favor de uma escola cujos aspectoseducativos contidos no universo da arte, se-jam valorizados e considerados.

Então, este texto apresenta num pri-meiro momento, a história do curso e disci-plina vivenciada nesta etapa de formaçãode professores/acadêmicos e, num segun-do momento, a experiência em forma dememória de momentos vividos intensamen-

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29ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [te nestes oito anos de atuação docente ar-tística em diferentes unidades e turmas eque proporcionaram o desenvolvimento deuma ação docente específica em arte.

O curso inicia suas atividades no anode 1999, numa proposta de atendimento ademanda de formação superior para pro-fessores que atuavam na educação básica,especificamente, educação infantil e anosiniciais do ensino fundamental, sem a refe-rida formação. Esta ação resultou na parce-ria com municípios e estado, considerandoque os professores/acadêmicos deveriam seausentar de suas atividades docentes a cadaquinze dias nas sextas-feiras e sábados,momento em que participam dos momen-tos presenciais, necessitando de substitutospara este período, bem como de ajuda fi-nanceira para o deslocamento até a unida-de em que estudavam.

Assim, a proposta metodológica docurso envolvia a ação didática presencial ecom recursos a distância como atendimen-to via telefone, correios e internet, cuja ca-racterística proporcionou o atendimento daação docente artística pensando nesta for-ma metodológica em que teríamos quedisponibilizar momentos que pudessempesquisar e estudar a ação docente artísti-ca própria e de colegas das escolas em queatuavam.

O final das atividades do curso, mes-mo sem ainda ter atendido a demanda daformação superior de professores da escolapública em sua totalidade, se configura comoum momento histórico do ensino superiorno estado e apresenta resultados satisfa-tórios, tratados em textos por outros cole-gas professores do curso, em relação a apro-vação em concursos públicos para provi-mento de cargo de professores da rede pú-blica de vários municípios e do estado, daação docente significativa neste nível de atu-ação dos professores/acadêmicos e na opor-

tunidade de prosseguimento em estudos depós-graduação.

Diante do exposto o objetivo destese pauta em enfatizar a importância da for-mação estética do professor para a açãodocente artística que aspire “[...] influir po-sitivamente no desenvolvimento cultural dosestudantes por meio do conhecimento dearte que inclui a potencialização da recep-ção critica e a produção.” (BARBOSA, 2002,p. 98), enfim que essa formação possibiliteuma aprendizagem artística significativa nasdiversas áreas em que a arte se faz presentee que proporcione a valorização do proces-so artístico.

A TESSITURA DOS FIOS DAMEMÓRIA: A AÇÃO

DOCENTE ARTÍSTICA.

Na docência artística vivenciada, pro-pusemos uma formação pedagógica espe-cífica em arte, e o fizemos por entender quea arte deve estar em consonância com acontemporaneidade e, por entender quedevemos considerar a sala de aula como umatelier de artista ou o laboratório de um ci-entista, espaço em que são desenvolvidaspesquisas e técnicas num processo criadordinâmico. Essa ação metodológica conside-rou a forma em que o curso se organizava,de maneira presencial e com recursos à dis-tância, numa relação prático-teórica.

Nesta perspectiva, ao assumirmos asaulas da disciplina, pensamos na formaçãode profissionais que atuariam na aprendi-zagem e orientação, também artística, decrianças. Nesta ação docente artística pro-pusemos, por meio de pesquisas no lócusde trabalho destes profissionais, a sensibi-lização dos demais profissionais que atuamno espaço educativo formal, como direto-res, coordenadores e demais professorespara que compreendessem e entendessem

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200930 ]a arte como campo de conhecimento com amesma importância que as demais discipli-nas do currículo escolar, reconhecendo nãosó a necessidade da arte, mas a sua capaci-dade transformadora.

Na trajetória vivenciada, observamosque além da desvalorização do ensino da arteno espaço educativo como uma questão cul-tural observamos outra questão referente àformação do professor que, sem consistên-cia teórica e pedagógica, possibilita em suaação docente uma dicotomia entre o sentidoe o vivido, entre o conhecimento experienciale o formal e conceitual, já que ensinar arteenvolve também aprender arte.

A metodologia utilizada no curso nosproporcionou uma vivência, cujos fios tra-mados neste processo, resultaram em umahistória estética e sensível em que os pro-fessores/acadêmicos, por meio de seus olha-res sensíveis, possibilitaram às crianças comas quais dialogaram artisticamente, a capa-cidade de sonhar, criar, desenhar, pintar, can-tar, dançar, representar, não mais como re-cursos de conhecimentos específicos de ou-tras áreas, mas próprios do conhecimento evivência artísticos.

Essa vivência artística neste períododo Curso proporcionou a possibilidade deentendermos que a arte existe em nossa vidadesde o início da vida humana, pois confor-me Buoro (2003) ela se faz presente comolinguagem desde as primeiras manifestaçõesde que temos conhecimento, pois, uma dasprimeiras referências da existência humanana terra refere-se às imagens, hoje chama-das de imagens artísticas, registradas pelohomem nas cavernas.

Entendendo que o ensino de Artedeva ser considerado uma parte importan-te do currículo por se tratar de um impor-tante trabalho educativo que “[...] procura,através das tendências individuais encami-nhar a formação do gosto, estimula a inteli-

gência e contribui para a formação da per-sonalidade do indivíduo, sem ter como pre-ocupação única e mais importante a forma-ção de artistas”. (KNOENER, 2006, p. 50-51)é que organizamos a ação docente numaproposta de ações que permitissem estu-dos e pesquisas em diferentes linguagensartísticas, como movimento corporal, espa-cial, plástico e visual, pensando na perspec-tiva da professoralidade artística que se con-figura como sendo

[...] a estética do ato de estar sendo pro-fessor. Vir a ser professor é projetar-senum estado quase estável de si, no inte-rior de uma determinada prática profis-sional de modo que ele venha a ser umagente propositor de experiências quecatalisem incursões em direção a si-mes-mo. Que a prática pedagógica e a rotinaescolar, sejam a um só tempo, um impul-so e uma rede. (PEREIRA, 1996, p. 4).

Por meio dessa professoralidade,que proporciona um olhar atentivo para oser professor, discorremos sobre a forma-ção estética desse professor. Este processopedagógico proporcionou a interlocuçãoentre o saber e a prática pedagógica relacio-nada a aspectos históricos e culturais.

Essa dinâmica entre ações como sen-tir, pensar e agir possibilitou uma aprendi-zagem efetiva, a partir de múltiplas experi-ências vividas e que são apresentadas nesteestudo por meio da memória, dos fios teci-dos nesta trajetória em que os momentosvividos no processo de formação artísticade professores que atuam na educação in-fantil e anos iniciais do ensino fundamentalse configuraram como um processo dereviver, já que, a memória é “[...] umatessitura feita a partir do presente, é o pre-sente que nos empurra em relação ao pas-sado, uma viagem imperdível, uma viagemnecessária [...]”(BENJAMIN, 1994, p. 56).

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31ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [

O ARREMATE FINAL:FIOS ENTREMEADOS PELO

TEMPO VIVIDO

Se o hoje já não é o ontemE nem o amanhã é o agora,

Será que algum dia voltaPra ser de novo outra vezO que um dia foi embora.Mas se o hoje já foi ontemE sai do agora o amanhã,Se tempo nasce do tempoO que será do que à tarde

Já era assim de manhã?

(Carlos Rodrigues Brandão, 2004, p. 41)

Em relação à formação artística des-tes professores/acadêmicos, vivenciada emoito anos de atuação na disciplina observa-mos que a significação de uma ação peda-gógica específica ao ensino de arte se fezpresente de forma consistente e sensível, emque a importância da arte em suaespecificidade e como fio condutor do pro-cesso de ensino-aprendizagem nesta fase daeducação básica foi considerado de manei-ra significativa.

À luz das reflexões aqui realizadas epensadas, fazemos algumas consideraçõessobre o tempo vivido nesta história de for-mação de professores proporcionando es-tudos que privilegie um ensino artístico, pri-meiro a possibilidade oferecida aos profes-sores/acadêmicos de uma formação sensí-vel, estética, cultural, pedagógica e teórica,importante na ação da professoralidade ar-tística que pensa uma sociedade melhor emais humana e, segundo, a possibilidade dodesvelamento de ações que proporcionemuma educação prazerosa e interessante

De acordo com Prado e Soligo (2005,p. 47) “[...] a história é feita com o tempo,com a experiência do homem, com suas his-

tórias, com suas memórias”. Portanto, nesteestudo observamos as relações imbricadasna memória de um tempo vivido, as rela-ções interpessoais, espaciais e perceptivasque teceram a trama de uma história de for-mação de professores. Uma formação ar-tística, estética e sensível vivenciada no Cur-so Normal Superior, por dez anos, perce-bendo que “[...] só um saber consciente einformado torna possível a aprendizagemem Arte” (BARBOSA, 2002, p.17).

Para Bosi (1994) o passado é a fontedo presente, portanto não o antecede. As-sim, ao buscarmos o tempo vivido na açãodocente artística na formação de professo-res, o fazemos pelos fios tecidos neste perí-odo e considerando dois lugares: o da for-mação básica presente na ação do profes-sores e a formação vivenciada na disciplinaFundamentos e Metodologia da Arte naeducação Infantil e anos iniciais do ensinofundamental.

Na ação docente específica da disci-plina percebemos, por meio da ação vivida,que a arte, enquanto linguagem a ser co-nhecida, experimentada e fruída, e comoexpressão a ser refletida e exteriorizada,possibilita ações como experimentar, refle-tir, expressar e construir, sendo essa a prin-cipal razão para sua presença no espaçoeducativo, já que a arte trabalha com siste-mas simbólicos culturais, possibilitando acriação de formas únicas de pensamento.Então, tratar a arte no espaço educativocomo área de conhecimento que visa aodesenvolvimento do humano é característi-ca imprescindível para uma educação emarte que se apresente de maneira significa-tiva, multicultural e contemporânea, princi-palmente na etapa em que se encontram ascrianças da fase de que trata a formação docurso Normal Superior, conforme podemosobservar na fala de Araújo (2007, p. 13)quando comenta que:

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200932 ]

Muitas vezes um real e significativo pro-cesso de ensino/aprendizagem em artespode se fundar na experiência sensível,sem esta experiência não é o bastantepara sustentá-lo. Como também, só oconhecimento formal e conceitual dosprincípios da arte, sem a experiência sen-sível não seriam o bastante. Fundamen-tal é que a arte nos toque para que ela sefaça presente de forma viva e atuante nonosso ser.

NOTAS

1 Termo utilizado por considerarmos o fato dos acadêmicos deste curso ter comoobrigatoriedade, ao participarem do processo seletivo para o curso Normal Superior daUniversidade Estadual de Mato Grosso do Sul, UEMS, a atuação docente efetiva em escolaspúblicas.2 A disciplina Fundamentos e Metodologia da Arte na Educação Infantil e Anos Iniciais doEnsino Fundamental começou a ser oferecida no ano de 2001, já que faz parte do currículona turma do terceiro ano.

REFERÊNCIAS

ARAUJO, A. R. F. de. Encruzilhadas do olhar no ensino das artes. Porto Alegre: Mediação,2007.BARBOSA, Ana Mae. A imagem no ensino da arte: anos oitenta e novos tempos. SãoPaulo: Perspectiva; Porto Alegre: Fundação IOCHPE, 1991.______. (org.). Inquietações e Mudanças no Ensino da Arte. São Paulo: Cortez, 2002.BENJAMIN, W. Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e historia dacultura. Tradução Sergio Paulo Rouanet. 7. Ed. São Paulo: Brasiliense, 1994.BOSI, Ecléa. Memória e Sociedade: lembranças de velhos. São Paulo: Cia das Letras, 1994.BUORO, Anamelia Bueno.O olhar em construção: uma experiência de ensino e aprendiza-gem da arte na escola . 6ª ed. São Paulo: Cortez, 2003.BRANDÃO, C. R. O jardim de todos. Campinas: Autores Associados, 2004.KNOENER, Sandra Heinz. O Ensino das Artes na escola: a ótica dos professores de educa-ção infantil. Dissertação de Mestrado em Educação. Universidade do Oeste de Santa Catarina,Campus de Joaçaba-SC, 2006.PEREIRA, M. V. A estética da professoralidade: um estudo interdisciplinar sobre a subjeti-vidade do professor. 1996. 298 f. Tese (doutorado). Programa de Estudos Pós Graduadosem Educação: Supervisão e Currículo. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 1996.PRADO, G.V.T.; SOLIGO, R. Porque escrever é fazer história. Campinas, SP: Graf. FE, 2005.

Assim, a narração dessa trama pre-tendeu desvelar a importância do CursoNormal Superior na formação de professo-res da educação básica da escola pública emnosso estado e a oportunidade dos profes-sores/acadêmicos em ingressar em umauniversidade pública para uma formaçãocontínua. Vislumbramos, dessa forma, umensino voltado para uma aprendizagemlúdica e artística na fase em que atuam.

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Como é do conhecimento de todos, asatuais demandas sociais requerem pes-

soas atuantes, capazes de se comunicaremeficazmente tanto oralmente como na es-crita, isto é, que saibam interpretar os senti-dos das coisas que as cercam, que saibamanalisar os fatos e atuar criticamente em seuespaço social. Essas demandas exigem ha-bilidades e competências que, a maioria, sãoadquiridas no ambiente escolar.

Como professora de Língua Portu-guesa trabalhei no curso Normal Superiorda Universidade Estadual de Mato Grossodo Sul, de 2005 a 2008, ministrando aulasem várias disciplinas desse curso: Prática de

REFLEXÕES DA PRÁTICAPEDAGÓGICA VIVENCIADA

NO CURSO NORMAL SUPERIORÂngela M. P. Faccenda

Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (Curso de Pedagogia)

leitura e produção de textos, Metodologiada língua portuguesa para séries iniciais eLiteratura Infantil. Foi uma experiênciamaravilhosa porque pude ministrar aulaspara alunos-professores que ministram au-las nos anos iniciais. Posso dizer que foiaprendizado muito bom, uma verdadeiratroca de experiências.

O reconhecimento dessa experiên-cia e a trajetória de aprendizagem dos alu-nos levaram-me a reflexão da importânciadessas disciplinas para a formação dessesalunos. Concordo com Bechara (1991, p.23)quando diz que “a escola como um todoharmônico e cada matéria como um com-

RESUMOO conhecimento das práticas vivenciadas no curso Normal Superior levou-me a

fazer uma reflexão acerca das disciplinas ministradas e forma de abordagem de seus con-teúdos. As disciplinas ministradas foram Prática de leitura e produção de texto, Literaturainfantil e Metodologia da língua portuguesa para os anos iniciais. Como resultado dessareflexão conclui que estas disciplinas, como as demais oferecidas pelo curso, foram degrande importância para a formação dos alunos.

Palavras chave: leitura/gramática, práticas pedagógicas, metodologia.

ABSTRACTThe knowledge acquired from the learning experiences at University level led me

into a reflection about the subjects taught and the way of approaching its contents. Thesubjects taught were the reading practice and textual production, Children’s Literature andthe Methodology of Portuguese Language for beginners. As a result of this reflection I cameto the conclusion that these subjects, such as the others offered by the course, played a greatimportance for the students’ graduation.

Key words: reading/grammar, pedagogical practice, methodology.

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200934 ]ponente desta orquestra têm como escopoe fim essencial a cultura integral doseducandos”. É evidente que as demais disci-plinas oferecidas pelo curso também foramimportantes tanto quanto as citadas para aformação desses acadêmicos.

Com o aprendizado adquirido nainteração com estas disciplinas, sintetizo asexperiências vivenciadas ao longo desses anos.

Na disciplina Prática de leitura e pro-dução de textos os alunos tiveram uma visãoda língua e sua realização nos diversos níveisda fala e da escrita. Os textos trabalhadosproporcionaram aos alunos subsídios teóri-cos e práticos que lhes permitissem aprimo-rar suas práticas de leitores e autores, emdiferentes situações de uso da língua.

Ainda no que se refere à leitura ocor-reram discussões e reflexões quanto ao pa-pel de cada um como leitor, bem como aimportância da leitura na vida de cada um,pois, como bem ressalta Ezequiel Teodoro“a pessoa que sabe ler e executa essa práticasocial em diferentes momentos de sua vidatem a possibilidade de desmascarar osocultamentos feitos e impostos pela classedominante, posicionar-se frente a eles e lu-tar contra eles” (1995, p.49). Como explica oautor “a leitura crítica é condição para a edu-cação libertadora” (p.51), que deve fazerparte no dia-a-dia do aluno, assim conse-guirão “Constatar, Cotejar e Transformar”,isto é, a práxis da leitura, dando ênfase aessas habilidades, oportuniza-os para a re-flexão, questionamento e recriação do real.O importante foi que, no decorrer das au-las, os alunos perceberam a necessidade daleitura informativa, de conhecimento e deprazer. Esta sim, teve um significado muitoimportante para eles, enquanto professo-res dos anos iniciais, principalmente com adisciplina de Literatura Infantil.

Trabalhar com Literatura Infantil foifazer os alunos se sentirem crianças, viajar

para outros lugares até então não imagina-do, através do mundo encantado que so-mente os livros proporcionam. Foram trêsencontros prazerosos porque entenderamrealmente o significado da leitura por pra-zer, do imaginário infantil e da importânciado contar e dramatizar histórias para as cri-anças, pois como bem ressalta Abramovich,

É ouvindo histórias que se pode sentir(também) emoções importantes, comoa tristeza, a raiva, a irritação, o bem-es-tar, o medo, a alegria, o pavor, a insegu-rança, a tranquilidade, e tantas outrasmais, e viver profundamente tudo o queas narrativas provocam em quem as ouve- com toda a amplitude, significância everdade que cada uma delas fez (ou não)brotar... Pois é ouvir, sentir e enxergarcom os olhos do imaginário(ABRAMOVICH, FANNY, 1997, p.17).

Um novo pensar, um novo sentir,uma nova atitude e uma nova metodologiadiante da importância da leitura por prazerforam importantes instrumentos deconscientização dos alunos, perceberam quea escola, no cantinho de leitura da sala deaula ou na biblioteca, é o espaço privilegia-do que contribuirá para a proliferação dogosto pela literatura, enquanto forma deprazer e diversão, pois somente a leituraoferece a possibilidade de fugir da própriarealidade, esquecer de si mesmo, vivenciaremoções e sentimentos tão fantásticos quan-to aqueles dos protagonistas das histórias.Além disso, o contato diário com o livro podeser um objeto para que a criança reflita suaprópria condição pessoal e a sociedade emque vive. Assim, segundo Bueno (1999), leré uma atividade prazerosa que estimula ossentidos, gera novas ideias e sentimentoscapazes de criar novas formas de se relacio-nar com a vida, consigo mesmo e com osoutros.

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35ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [Concordo com o autor quando diz

que a leitura estimula os sentimentos, alémdisso, não podemos esquecer que a leiturapor prazer também tem a capacidade deensinar a criança a confrontar seus proble-mas. Ao ler uma fábula ou um conto defadas por exemplo, a criança muitas vezesdescobre seus temores e aprende acontrolá-los e até mesmo superá-los. Issoocorre porque no final das histórias o bemsempre vence o mal, o que proporciona àcriança segurança e conforto.

Segundo Cagliari,

o hábito de ler, ler muito, sempre foi umaforma de preencher a solidão do indiví-duo. (...) Às vezes, para fugir da agitação,recorre-se a uma boa música acompanha-da de uma boa leitura. O ser humanoprecisa conversar consigo mesmo, ter seumomento de solidão, e a leitura é umgrande auxiliar da reflexão, da medita-ção, do voltar-se para dentro de si.(CAGLIARI, LUIZ C. 2004, p.176).

Trabalhar com a disciplina Metodo-logia da Língua Portuguesa para os anos ini-ciais também foi muito instigante. Comotrabalhar a gramática, textos, mas o que écoesão e coerência e como observá-las nostextos, o que são os gêneros textuais!!! Dú-vidas, insegurança em mudar a metodologiade trabalho fizeram parte das preocupaçõesdos alunos. Como nas outras disciplinas,dúvidas e inseguranças foram perdendo for-ça para a ousadia de mudar.

Com os conteúdos sobre o ensinode gramática, os alunos perceberam que agramática não deve ser trabalhada de for-ma mecânica, tradicional. Que trabalhandoa gramática pela gramática não leva os alu-nos a apreciarem os textos, a escreveremmelhor, pois os textos são vistos apenascomo pretextos para trabalhar classes gra-maticais, dígrafos, etc.

Segundo Koch,

a gramática deve ser usada para mostrarcomo os textos funcionam. Para mos-trar quais as pistas que um texto dá paraque o leitor seja capaz de construir umsentido. (...), mas deve haver momentosde reflexão sobre os elementos da línguaque permitem isso. Não se pode abando-nar a gramática nem haver só o ensinogramaticóide. Ficar só na análise sintáti-ca, na classificação abstrata de orações,não leva a nada (KOCH, INGEDOREV., 2007. p. 13-14).

Além disso, continua a autora, se osalunos reconhecerem como os elementosda gramática melhoram a organização tex-tual, o ensino ganha vida, caso contrário seráuma “pedra na sala de aula”, como bemenfatiza Irandé Antunes. Para Antunes (2007,p. 127), nenhum leitor competente lê poe-mas procurando substantivos ou coisas queo valham. O leitor competente lê procuran-do sentidos, emoções, intenções, ditos, pres-supostos.

Essas considerações da autora con-tribuíram para que os alunos percebessemque um texto não é um aglomerado de pa-lavras, mas sim uma unidade de sentido.Assim, explicita Koch sobre texto,

Um texto se constitui enquanto tal nomomento em que os parceiros de umaatividade comunicativa global, diante deuma manifestação linguística, pela atua-ção conjunta de uma complexa rede defatores de ordem situacional, cognitiva,sociocultural e interacional, são capazesde construir, para ela, determinado sen-tido (KOCH, INGEDORE V., 2000, p.25).

Lembra também Antunes (2007,p.37), que nas aulas de português os alunosdeveriam ler e escrever, discutir e reescre-

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200936 ]ver, reler e reescrever mais, para escrever eler de forma sempre mais sofisticada.

Essa foi uma das atividades pratica-das nos encontros e junto do ler, escrever ereescrever conheceram as noções de coe-rência e coesão e as suas especificidades emrelação à fala e à escrita. Para os alunos foiuma experiência muito significativa e gos-tosa, pois perceberam que muitos elemen-tos de coesão, importantíssimo num texto,eram todos gramaticais. E assim estavamaprendendo a trabalhar a “gramática” deforma prazerosa.

Essas atividades praticadas em salatambém deu-lhes possibilidades para dife-renciar os diversos gêneros textuais e

conhecê-los melhor, isto é, saber se esta-vam diante de um conto, um bilhete, umaentrevista, um artigo, uma notícia, bemcomo de serem capazes de reconhecer umtexto que predominam sequências narrati-vas, descritivas, expositivas/argumentativas.

O primeiro e mais importante obje-tivo de uma escola é preparar o aluno paraexpressar-se, oralmente e por escrito, e paracompreender adequadamente o que ouveou lê. Penso que todas as disciplinas ofere-cidas pelo curso Normal Superior contribu-íram muito para a formação dos alunos/pro-fessores e, com certeza, saberão aplicar osconhecimentos adquiridos durante os qua-tro anos de graduação.

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CURSO NORMAL SUPERIOR PÓLOCURSO NORMAL SUPERIOR PÓLOCURSO NORMAL SUPERIOR PÓLOCURSO NORMAL SUPERIOR PÓLOCURSO NORMAL SUPERIOR PÓLODE DOURADOS/UEMS: TECENDODE DOURADOS/UEMS: TECENDODE DOURADOS/UEMS: TECENDODE DOURADOS/UEMS: TECENDODE DOURADOS/UEMS: TECENDO

HISTÓRIA NA HISTÓRIAHISTÓRIA NA HISTÓRIAHISTÓRIA NA HISTÓRIAHISTÓRIA NA HISTÓRIAHISTÓRIA NA HISTÓRIA

RESUMOEste artigo tem por objetivo analisar e refletir sobre as transformações que o Curso

de Graduação Normal Superior da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul – Pólo deDourados trouxe para a formação e o desenvolvimento para a docência da EducaçãoInfantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental, a partir das novas orientações das Políticasde Formação Docente, quanto ao perfil deste profissional. Como referência teórica estabe-leceu-se um diálogo com os autores: Freire (1974, 1986), Nóvoa (1995, 1999), Pimenta (1994,1996), Tardif (2002) e Zeichener (1995). A metodologia utilizada foi a qualitativa consideran-do-se os dados quantitativos. Os dados coletados constam de fontes bibliográficas, análisesde documentos pertinentes e questionários aplicados aos egressos e aos acadêmicos daúltima turma do curso “2009”. O resultado demonstrou a relevância do Curso NormalSuperior da UEMS para a sociedade sul mato-grossense, atingindo os objetivos propostos,oportunizando a formação continuada aos docentes em exercício, formando um profissio-nal reflexivo, crítico transformador de si e da sociedade.

Palavras-chave: Normal Superior, UEMS e Formação Continuada.

ABSTRACTThis article aims to analyze and reflect on the changes that the Undergraduate Normal

Superior State University of Mato Grosso do Sul - Campus de Dourados brought to the trainingand development for teachers of Early Childhood Education and Early Years of ElementaryEducation, from the new Policy Guidelines on Teacher Training, on the profile of this professional. As theoretical framework established a dialogue with the authors: Freire (1974, 1986), Nóvoa(1995, 1999), Pimenta (1994, 1996), Tardif (2002) and Zeichener (1995). The methodology used wasqualitative considering to quantitative data. The collected data set of sources, analysis of relevantdocuments and questionnaires to graduates and academics of the last class of the course “2009”.The results showed the relevance of the Ordinary Course of Higher UEMS to society south ofMato Grosso, achieving the proposed objectives, nurture the ongoing training of teachers inservice, forming a reflective practitioner, critical, transforming themselves and society.

Keywords: Superior Normal, UEMS and Continued Formation

1 Co-autora e Professora do Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade Federal de MatoGrosso do Sul.2 Professora do Curso Normal Superior – Pólo de Dourados “UEMS” e mestranda do programa de PósGraduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.

Lucrécia Stringuetta Mello1

Nilva Celestrino Rocha Narcizo2

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200938 ]INTRODUÇÃO

O desejo de pesquisar sobre a for-mação dos professores-alunos do cursonormal superior é decorrente da trajetóriado meu fazer profissional, enquanto docenteda educação básica e em cursos de licencia-tura, principalmente no referido curso queserá analisado neste artigo. Essa experiên-cia, juntamente com as discussões dos mei-os educacionais e políticos sobre algumasconcepções de formação docente, resultouem várias indagações referentes aos cursosnormais superiores e de pedagogia no Bra-sil, e contribuiu para aumentar as preocu-pações com a construção do processoidentitário desse aluno-professor enquan-to educador e formador de sujeitos, moti-vando o interesse por essa temática.

Atualmente, existe uma grande pre-ocupação sobre o lugar assumido pelo pro-fessor-aluno na relação pedagógica, no pro-cesso de construção de sua identidade en-quanto educador, formador de sujeitos crí-ticos e dos processos de formaçãopermeados por essa construção. Nas duasúltimas décadas do século XX e inicio doséculo XXI muito se discute sobre a impor-tância dos cursos de formação de professo-res da educação infantil e anos iniciais doensino fundamental. Percebe-se uma enor-me distância entre o perfil do professor exi-gido pela realidade e a do professor que estáatuando em nossas escolas. Tais questio-namentos permeiam: as ações dos sistemaseducacionais, as formas institucionais exis-tentes, o modelo vigente de divisão do tra-balho e, principalmente, a função do pro-fessor e a relação deste com o aluno no pro-cesso de ensino-aprendizagem.

Na legislação atual a Lei de Diretri-zes e Bases da Educação Nacional - LDBEN– lei nº. 9.394/96, os Institutos Superiores deEducação - ISEs, são apontados como a ins-

tituição para a formação de professorespara a educação básica e, dentre eles osCursos Normais Superiores – CNSs, comoresponsáveis pela formação de professoresda educação infantil e dos anos iniciais doensino fundamental.

Desde a promulgação da Lei n. 9.394/96, o tema formação de professores para aeducação básica tem causado enormes dis-cussões. Em nível federal e no MEC, foramproduzidos vários documentos e atosnormativos, que serão analisados como fon-tes documentais nesta pesquisa.

Como possibilidade de adequar estaproblemática a nova realidade posta, foi cri-ada uma nova proposta de formação deprofessores nos cursos de licenciaturas, den-tre estas a implantação do curso normalsuperior da “UEMS”, visando atender a estaclientela, que é constituída por professoresatuantes no sistema educacional há váriosanos, objetivando neste estudo, no qual foipermeado das seguintes indagações:

Como e porque surgiu esta novamodalidade de curso de formação docente“Curso Normal Superior”?

Quem são os sujeitos que cursaramo Curso Normal Superior da UEMS - pólode Dourados?

Que tipo de profissional docente,esse curso formou?

Onde estão atuando os egressos docurso Normal Superior da UEMS – pólo deDourados?

Qual a relevância do Curso NormalSuperior da UEMS – pólo de Dourados paraa vida profissional desses egressos?

Estes questionamentos se funda-mentaram a partir das novas concepçõespara a formação docente que têm procura-do responder às novas exigências da socie-dade, buscando formar um profissional ca-paz de apropriar-se das mudanças no mo-mento presente, projetando-se num futuro

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39ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [próximo, Dias (2003, p.41), afirma que:

Este novo profissional deve ser capazde analisar sua própria prática, tomardecisões e atuar num processo educativode forma a construir uma sociedade fun-damentada na concepção histórico-so-cial que tem como paradigma educacio-nal as relações entre cultura, sociedadee educação. Deve ser um profissionalque, além de dominar o conhecimentoespecífico e pedagógico, seja capaz deatentar para as relações estabelecidasentre o processo de ensino-aprendiza-gem e as relações sociais, políticas e cul-turais das quais este processo decorre, etambém de ser o agente de transforma-ção da realidade inerente a ele.

Interferir na formação dos profes-sores que estão em exercício torna-se umatarefa difícil, pois geralmente são apresen-tadas grandes mudanças para esse profissi-onal, que possui marcante consciência polí-tica, teórica e prática conservadora. Esse tra-balho pode revelar todo o processo históri-co de vida, de práticas e teorias defendidas eaplicadas por esse profissional, durante asua vida pessoal e profissional.

Este trabalho iniciar-se com umabreve contextualização histórica da forma-ção docente a partir da promulgação daConstituição brasileira em 1988, da implan-tação da Universidade Estadual de MatoGrosso do Sul e da análise do histórico docurso normal superior da “UEMS”-pólo deDourados. Segundo Masetto (1998) a Uni-versidade deverá objetivar a formação doacadêmico em sua totalidade, isto significalevar em consideração os aspectos, como: oprofissional, o afetivo-emocional, nos quaissão valores necessários para a convivênciacom os demais e com o meio ambiente.

Nesse sentido, supõe-se a necessi-dade de desenvolver uma metodologia para

subdisiar este estudo, utilizando-se da abor-dagem qualitativa considerando-se os da-dos quantitativos dos dados coletados, nosquais constam de fontes bibliográficas, aná-lises de documentos pertinentes, como oProjeto Político Pedagógico do Curso Nor-mal Superior da UEMS – pólo de Doura-dos, e da análise dos questionários aplica-dos aos egressos e aos acadêmicos da últi-ma turma do curso “2009”.

As análises dessas informações ob-tidas revelaram que a qualificação dos pro-fissionais para e educação infantil e dos anosiniciais do ensino fundamental em nível su-perior foi feita na década de 30 no séculoXX, Por um curto espaço de tempo, for-mou profissionais para educação infantil eséries iniciais do ensino fundamental, nosInstitutos Superiores de Educação, anexosàs universidades.

Esta qualificação profissional em ní-vel superior foi retomada com a LDB e pos-suem alterações que serão detalhadas pos-teriormente. A lei 9394/96 - LDB, em seusartigos 62 e 63, propõem a figura do Institu-to Superior de Educação, contendo o cursonormal superior destinado a formar pro-fessores para a educação infantil e séries ini-ciais do ensino fundamental. A regulamen-tação desse curso pelo Conselho Nacionalde Educação ocorreu em 10/8/99 e sua ho-mologação em 10/9/99.

INÍCIO DE UMA NOVA HISTÓRIADA FORMAÇÃO DOCENTE

No final da década 80, começaram aocorrer estudos que tiveram o mérito de“recolocar os professores no centro de de-bates educativos e das problemáticas da in-vestigação” Nóvoa (1995, p. 15), contribuin-do para a compreensão da complexidadedessa profissão e das atuais sociedades, o

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200940 ]que exige por parte dos professores umaampla preparação profissional e maior au-tonomia na condução de suas atividadesprofissionais.

A compreensão dos processos deconstituição do saber fazer docente no localde trabalho abria caminhos para o estudoda escola nos cursos de formação e paranovas possibilidades de se articular a for-mação inicial e a contínua,

Duas razões são apontadas comojustificativas para sua criação: a primeira é anecessidade de elevar a qualificação dosprofissionais dedicados à educação infantile aos anos iniciais do ensino fundamental;sendo a segunda a dissociação entre teoria eprática.

De acordo com Gatti (1997), a ques-tão da formação de professores constitui-seem um enorme desafio para as políticas edu-cacionais, uma vez que a origem dessa for-mação é inadequada e insuficiente, pois, deacordo com os estudos e avaliações disponí-veis, a formação de professores não deu contade instrumentalizar o ensino com profissio-nais adequadamente qualificados. A autoraafirma que “reverter um quadro de má for-mação ou de formação inadequada não éprocesso para um dia ou alguns meses, maspara décadas”. (GATTI, 1997, p.2).

Segundo Guerra (1999), a preocu-pação com a formação de professores édecorrente da consciência dos problemasque surgiram quando se começou a perce-ber, mais claramente, a insuficiência e ine-ficácia na instrumentalização para o exer-cício da docência no quadro da escolarizaçãobrasileira.

Libâneo e Pimenta (1999, p.267) atra-vés das suas reflexões afirmam que:

As investigações recentes sobre forma-ção de professores apontam como ques-tão essencial o fato de que os professores

desempenham uma atividade teórico-prática. É difícil pensar na possibilidadede educar fora de uma situação concretae de uma realidade definida. A profissãode professor precisa combinar sistemati-camente elementos teóricos com situa-ções práticas reais.

Com a edição da Lei de Diretrizes eBases da Educação Nacional 9394/96, e à vistado conteúdo do art. 62, criou-se uma novamodalidade de curso o normal superior, queno interior dos Institutos Superiores de Edu-cação, encarregar-se-ia da formação do pro-fissional da educação infantil e dos anos ini-ciais do ensino fundamental, com o objeti-vo de atender esta deficiência educacional.

Scheibe (2000, p. 16) afirma que:

A instituição, pela LDB de 1996, do Ins-tituto Superior de Educação como novo‘lócus’ para a formação de professores, edo Curso Normal Superior como instân-cia de graduação dos professores para aeducação infantil e para as séries iniciaisdo ensino fundamental, abriu espaçopara que as propostas que não tiveramcondições históricas de se impor no de-bate nacional ressurgissem travestidas emforma de lei. Foram dadas as condiçõespara uma formatação dos cursos de li-cenciatura e de pedagogia com sériasimplicações para a formação qualificadade professores e demais profissionais daeducação. No caso do curso de pedago-gia, tenta-se romper com uma visão or-gânica da formação docente, que vinhasendo construída no país nas últimas dé-cadas, e acentua-se a dicotomia entre aformação para atuar na educação infan-til e séries iniciais do ensino fundamen-tal, e aquela destinada às séries finais des-te nível de ensino e ao ensino médio.

É função da universidade principal-mente a pública, a implementação dessa

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41ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [nova proposta de formação de professores,uma vez que este espaço é compreendidocomo local dinâmico dos saberes, de diálo-go, busca permanente de conhecimentos,atenta às mudanças e renovações, comotambém estimulada a atender as necessida-des educacionais da realidade presente.

A UNIVERSIDADE EMERGENTE

A Universidade Estadual de MatoGrosso do Sul – UEMS foi concebida a par-tir de uma proposta política contempladana Primeira Constituinte do Estado, em1979, e implantada em 1993, na cidade deDourados – MS, delineando um novo pa-norama educacional no estado, uma vezque este enfrentava sérios problemas comrelação ao ensino fundamental e médio,principalmente quanto à qualificação deseu corpo docente.

Para a instalação e implantação des-sa Instituição, os cursos implantados inicial-mente foram sediados em Dourados, sen-do também ofertados temporariamente emunidades de ensino localizadas em toda aextensão do estado. Assim, a UEMS iniciouatividades com sede em Dourados e mais13 unidades de ensino espalhadas por todoo estado.

Após quinze anos de atividades, aUEMS está se apropriando de atividadesinerentes a universidade, principalmente asdas linhas de pesquisa institucional, taiscomo: Meio Ambiente, DesenvolvimentoSustentável, Educação, Políticas Públicas eQuestões Indígenas.

A Universidade Estadual de MatoGrosso do Sul, visando atender a sociedadesul mato-grossense e a proposta da LDB noart. 87, § 4º, criou o projeto na modalidade“Normal Superior” no ano de 2000 com seutérmino em 2010, visando qualificar os do-centes que atuavam na rede de ensino.

De acordo com o levantamento fei-to pela Secretaria Estadual de Educação eprefeituras Municipais em maio de 1999,constatou-se que um mil oitocentos e oi-tenta e sete professores que atuam na edu-cação básica, possuíam somente o curso demagistério do nível médio.

O Curso foi organizado de formadiferenciada, sendo oferecido na modalida-de semi-presencial, sendo que as aulaspresenciais se realizariam nos finais de se-mana e, nos períodos não-presenciais, asatividades pedagógicas e o atendimento aosalunos, sendo estes realizados via telefone,correio, internet e correio eletrônico.

A proposta curricular do curso estáfundamentada na interdisciplinaridade doprocesso educativo e na abordagempluralista da educação, pois formar educa-dores exige possibilitar a esse profissional oentendimento e a capacitação de elaborar ereelaborar o conhecimento, permitindo odiálogo da teoria com a prática.

A concepção deste curso contemplao ensino reflexivo, na concepção de Tardif(2002, p. 39).

[...] O professor é alguém que deve co-nhecer sua matéria, sua disciplina e seuprograma, além de possuir certos conhe-cimentos relativos às ciências da educa-ção e à pedagogia e desenvolver um sa-ber prático baseado em sua experiênciacotidiana com os alunos.

A partir dessas reflexões se faz ne-cessário pensar em um profissional que atuadentro de um contexto sócio-histórico e quepoderá construir a sua prática na realidadeda sala de aula, Pimenta afirma que:

[...] A formação docente deve se confi-gurar como uma política de valorizaçãodo desenvolvimento pessoal profissionaldos professores e das instituições escola-

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200942 ]res, uma vez que supõe condições de tra-balho propiciadoras da formação contí-nua de professores, no local de trabalho,em redes de formação e em parceria comoutras instituições de formação. Isto porque trabalhar o conhecimento na dinâ-mica da sociedade multimídia, daglobalização, da multiculturalidade, dastransformações nos mercados produti-vos, na formação dos alunos, crianças ejovens, também eles em constante pro-cesso de transformação cultural, de valo-res, de interesses e necessidades, requerpermanente formação, entendida comoressignificação identitárias dos professo-res (PIMENTA, 1999, p. 31).

Com os dados obtidos nos questio-nários com esses alunos-professores queparticiparam desta formação em serviço, foipossível analisar de forma sucinta as trans-formações que ocorreram na sua práticadocente, na socialização dessa formação e arecolocação desse profissional no seu con-texto social, ético, político e econômico.

O questionário foi aplicado a 178egressos via e-mail e presencialmente aosacadêmicos da última turma “2009”, poden-do ser verificado que 95% principalmentedos egressos participaram de concurso pú-

blico, e que 90% foram aprovados neste con-curso, ocupando lugares de destaque em suapontuação.

O segundo dado analisado no ques-tionário foi da continuidade dos estudos, noqual se obteve as seguintes informações: 80%desses egressos já concluíram algum tipo decurso de especialização, dando continuida-de a formação continuada.

O terceiro dado analisado foram asdisciplinas mais relevantes e 90% das res-postas obtidas foram que todas as discipli-nas eram de suma importância para a suaformação profissional.

CONCLUSÕES

De porte desses dados obtidos eanalisado, conclui-se que o Curso NormalSuperior da UEMS – pólo de Douradoscumpriu com o seu papel de formar profes-sores compromissados com a sua vida pro-fissional, prestando serviços de grande re-levância para a sociedade sul mato-grossense, pois a instituição bem como ocurso Normal Superior corroborou para aampliação do conhecimento nas mais diver-sas esferas em que estes alunos/professo-res do referido curso estão inseridos.

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A UNIVERSIDA UNIVERSIDA UNIVERSIDA UNIVERSIDA UNIVERSIDADE NOADE NOADE NOADE NOADE NOCONTEXTCONTEXTCONTEXTCONTEXTCONTEXTO DO DO DO DO DA DIVERSIDA DIVERSIDA DIVERSIDA DIVERSIDA DIVERSIDADEADEADEADEADE

ÉTNICO CULÉTNICO CULÉTNICO CULÉTNICO CULÉTNICO CULTURALTURALTURALTURALTURAL

RESUMOEste texto tem entre seus objetivos refletir sobre o processo interétnico estabelecido

entre protagonistas indígenas e não-indígenas no decorrer das aulas de História Indígenaministradas no Curso Normal Superior Indígena na cidade de Amambaí, Estado de MatoGrosso do Sul. Busca-se com o texto lançar um novo olhar na renovação dos estudos do“contato”, enfatizando que apesar dos processos de violência a que os povos indígenasforam submetidos, estes estabeleceram relações com a sociedade envolvente, traduzidasem uma constante negociação simbólica em busca de suas perspectivas de futuro. Nessesentido, a própria noção de Universidade deve ser ampliada para um espaço que dê contada diversidade, que não é única e tampouco homogênea.

Palavras-Chave: Indígenas, Interculturalidade, Educação Superior Indígena

ABSTRACTThis article has for objective to reflect on the intercultural process established between

ethnic actors, indigenous and non-indigenous in the classes of Indigenous History taught inthe course Normal Superior Indígena in the town of Amambaí, state of Mato Grosso doSul. It is desired with the text launch a new look in the renewal of the studies of the “contact”,emphasizing that although the violence processes that indigenous peoples have beensubjected, they have established relations with the surrounding society, as reflected in aconstant negotiation of symbolic search in their future prospects. In this sense, the verynotion of a university should be expanded to an area that encompasses the diversity, defenseof other possibilities beyond the “perspective” universal.

Key-words: Indigenous, Interculturalism, Higher Education for Indigenous People.

1 Doutoranda em Direito (PUCPR), Mestra em História (UFGD) Professora do Curso de Direito e NormalSuperior Indígena (UEMS)

Rosely A. Stefanes Pacheco1

Sempre, e sempre de modo diferente, a pon-te acompanha os caminhos morosos ou apres-sados dos homens para lá e para cá, de modoque eles possam alcançar outras margens (...).A ponte reúne enquanto passagem que atra-vessa (Bhabha, 1998, p.04).

A lição de Bhabha ora transcrita nos fezrememorar o ano de 2003, quando par-

ticipamos, com êxito, do processo seletivoda Universidade Estadual de Mato Grossodo Sul (UEMS), para ministrar aulas noCurso Normal Superior Indígena no

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45ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [Campus de Amambaí. Naquela oportuni-dade tivemos a chance de conviver e trocarexperiências com acadêmicos indígenasGuarani Kaiowá, regularmente matricula-dos naquele Curso e que viviam em aldeiascircunvizinhas àquela cidade2. Além do de-safio de trabalhar com um grupo de acadê-micos, que em sua maioria traziam deman-das específicas, diferentes daquelas a queestávamos habituados, também era neces-sário trilhar por um caminho desconheci-do, pois aquela realidade, até então, não fa-zia parte da nossa práxis como professora.

Foi uma experiência gratificante,uma vez que se estabeleceu um relaciona-mento que ia além do espaço da sala de aulamarcado institucionalmente pelos encontrossemanais. Era necessário ir além dos con-teúdos propostos, pois estávamos traba-lhando com membros de algumas comuni-dades, que em sua maioria, foram silencia-das no decorrer do processo histórico. Por-tanto, era necessário deixar falar, mais queisso, era necessário ouvir a voz do outro.

Assim, para realizar esse trabalhocom os acadêmicos se fez necessário enve-redar por diversas fontes de pesquisa. Des-se modo, buscamos referenciais em diver-sas áreas do conhecimento, em especial aHistória e a Antropologia cultural ou soci-al3. O método etnográfico, também conhe-cido como observação participante, que con-siste na observação direta da vida social e dacultura de grupos humanos foi um auxiliarde grande valia para a efetivação do proces-so. Não obstante a limitação dos encontroscom os acadêmicos, pois os encontros se-guiam um calendário previamente fixado,sentimos a necessidade de adaptar essemétodo aos nossos estudos e reflexões.

Este procedimento científico desen-volvido a partir da segunda metade do sé-culo XIX, concomitantemente na Europa ena América teve sua efetiva consolidação na

prática antropológica com a divulgação doclássico Argonautas do Pacífico ocidental: umrelato do empreendimento e da aventura dosnativos nos arquipélagos da Nova GuinéMelanésia, escrito pelo antropólogo polo-nês Bronislaw Malinowski e publicado pelaprimeira vez em 1922.

Roberto Cardoso de Oliveira, desta-cado antropólogo brasileiro, em sua obra Otrabalho do antropólogo (2000), enfatiza que apesquisa etnográfica consiste em três proce-dimentos básicos: “olhar”, “ouvir” e “escre-ver”. Segundo ele, o olhar e o ouvir fazemparte da primeira etapa dos trabalhos antro-pológicos, aquela que é realizada em campo,isto é, o registro etnográfico de dadosempiricamente observáveis. O escrever cons-titui a segunda etapa das pesquisas, a inter-pretação etnológica, quer dizer, a análise teó-rica dos dados etnográficos obtidos durantea observação do grupo estudado. Dessa for-ma, de posse deste método de observaçãoparticipante e juntamente com referenciaisbibliográficos existentes sobre a temática,buscamos construir um material didático quefosse compatível com a comunidade com aqual estávamos trabalhando, uma vez quesoluções prontas e acabadas, se caso houves-se dignas de crédito, não davam conta da dis-ciplina ministrada. Era preciso verificar juntoaos acadêmicos, principalmente, o que elesentendiam como relevante sobre a históriaindígena para ser tematizado em sala.

Além do que, a própria localização dacidade de Amambaí, onde o curso se desen-volvia era um espaço privilegiado a ser pen-sado e inserido no cotidiano das aulas, poisuma das características desta cidade é a deser próxima ao Paraguai, país com o qualvários acadêmicos mantinham contato, orapor possuírem relações de parentesco na-quele país, ora porque eles próprios lá resi-diam, demonstrando um constante ir e virna fronteira4.

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200946 ]

OUTRO OLHAR

A partir do momento em que astemáticas sócio-culturais indígenas passa-ram a ser discutidas e desenvolvidas em salade aula foi possível perceber com maiorclareza a desmistificação de vários conceitosque outrora foram trabalhados na antro-pologia, na historiografia e em outras áreasdo conhecimento, como verdades absolu-tas. O primeiro deles diz respeito à noçãoda aculturação. Naquele espaço, podia-seperceber como a cultura e a identidade ét-nica se processavam, sem que isso ficassereduzido simplesmente a perdas.

Os sujeitos da história estavam aliem uma interação que desmistificava qual-quer estudo que tenha como pressupostoum processo de aculturação, aquele base-ado na perspectiva de que os indígenas apartir do momento que tivessem contatocom a cultura não-indígena estavam de-signados a desaparecerem, pois corria-seo risco de incorporarem elementos de ou-tras culturas; como se pudesse existir umponto “zero” de cultura.

Sabe-se que a questão cultural emer-ge, hoje, como dado fundamental paracompreender-se os conceitos vivenciadosna trajetória dos povos indígenas. Até pou-co tempo atrás, se acreditava saber comcerteza do que se falava ao se nomeardicotomicamente o tradicional e o moder-no, sem se levar em consideração que ospovos indígenas renovam dia-a-dia seusmodos de afirmação étnico, cultural e polí-ticos. A sociedade não-indígena se tornararefém de um etnocentrismo dissimulado,que não a deixava compreender a dinâmi-ca daqueles povos.

A problemática da relação entre omoderno e o tradicional tomou um novodirecionamento, embora já não se apresen-

te na sua expressão dicotômica antiga. Anoção de hibridismo, central na obra deCanclini (1990), contempla uma nova for-ma de lidar com aquilo que outrora foi pen-sado como uma situação transitória. O queo autor traz de novo é que as identidadesmudam e essa mudança passa eminente-mente pelos processos de apropriação, ouseja, os indígenas ressignificam elementos esímbolos para seguirem traçando pontesentre suas memórias e utopias.

Assim, para refletirmos sobre e cul-tura e identidade é preciso deixar claro aimagem que o senso comum cria sobre osindígenas. Na realidade, tem-se uma ima-gem do índio-hiper-real produzida por en-tidades civis contemporâneas, que operamcom um indivíduo idealizado que guardapouca relação com os índios reais.

Percebemos que as sociedades indí-genas tem sido campo fértil para as maisdiversas projeções e idealizações ao longoda história, quase sempre balizadas em vi-sões estereotipadas. Entre elas, podemoscitar a imagem do índio como metáfora deliberdade natural, ou seja, o índio em com-pleta harmonia com a natureza, ser exóticointocável, ou a imagem do índio como en-trave ao progresso, ligada a um pseudo“atraso” a ser superado.

Com essa formação discursiva naci-onal-popular emergiu no imaginário “po-pular” e muitas vezes na históriamemorialística e na literatura, o ideal indí-gena pré-concebido persistindo em reconhe-cer o índio dentro de um conjunto de ima-gens estereotipadas sobre os índios basea-das em:

[...] habitantes da mata que vive em ban-dos nômades e anda nu, que possui umatecnologia muito simples e tem uma re-ligião própria (distinta do cristianismo).Os elementos fixos que compõem tal re-

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47ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [presentação propiciam tanto a articula-ção de um discurso romântico, onde anatureza humana aflora com mais pro-priedade no homem primitivo, quantona visão do selvagem como agressivo,cruel e repulsivo (OLIVEIRA, 1999).

No Brasil, o desconhecimento oudesprezo pelo papel da diversidade culturalno estímulo e enriquecimento das dinâmi-cas sociais e, principalmente a recusaetnocêntrica da contemporaneidade de so-ciedades de orientação cultural diversa, temsedimentado uma visão quase sempre ne-gativa das sociedades indígenas. Existe umapostura ideológica predominante, de que ospovos indígenas não contam para o nossofuturo, uma vez que muitos os consideramcomo algo arcaico, marcados por uma pers-pectiva de fatalidade de extinção dessas so-ciedades (STEFANES PACHECO, 2006).

Nesta perspectiva, o Estado e os go-vernos como também parte da sociedadebrasileira relutam em aceitar a realidadepluriétnica. Entretanto, os povos indígenastornaram-se visíveis. Não é mais possívelignorá-los. E, nas suas demandas que po-dem ser jurídico-políticas, defendem antesde tudo sua identidade (Llancaqueo, 2004).Por esta razão, questionam uma situaçãoque aí está posta e sinalizam para uma apro-priada mudança de sentido de alguns con-ceitos, tais como: identidade, cultura, fron-teiras, dentre outros.

E, é nesse cenário, que nas últimasdécadas, os indígenas “ressurgem” pratica-mente em toda a América Latina com de-mandas específicas, e passam a atuar pormeio de suas próprias forças, não rejeitan-do aliados, pois a todo momento estão es-tabelecendo contatos com a sociedadeenvolvente e lentamente vão desnudando ahistória e reconstruindo um novo cenário.

Importante destacar que, o ponto

central dos movimentos sociais indígenas,desde o final do século XX, tem sido a exi-gência de reconhecimento e respeito a seusdireitos como sociedades etnicamente dife-renciadas - direitos políticos, territoriais,culturais, econômicos e sociais-; o que levaa afirmação de sua identidade étnica.

Na realidade, o que se pode obser-var é que, passo a passo, em diferentes lu-gares, mais comunidades estão reivindican-do espaços e se fazendo presentes, dentrode um contexto maior, ou seja, global e, pro-curando se organizarem de acordo com suasespecificidades. E, nesse contexto, as socie-dades indígenas querem ser ouvidas a par-tir de um local determinado, como indíge-nas, participando de um processo históricoque, ao contrário do que já foi prognostica-do, apresenta-se como um campo abertode possibilidades (STEFANES PACHECO,2004).

A QUESTÃOA QUESTÃOA QUESTÃOA QUESTÃOA QUESTÃODDDDDA DESMISTIFICAÇÃOA DESMISTIFICAÇÃOA DESMISTIFICAÇÃOA DESMISTIFICAÇÃOA DESMISTIFICAÇÃO

DOS SABERESDOS SABERESDOS SABERESDOS SABERESDOS SABERES

Uma das principais questões a serenfrentada nos encontros com os acadêmi-cos do Curso Normal Superior Indígena, eradespir-nos do mito da hegemonia do saber,com seus conceitos tão bem trabalhado pe-las teorias individualistas, hegemônicasembasadas nos séculos das “luzes”, onde seprivilegiava um tipo de saber em detrimen-to dos demais.

A difícil compreensão da existênciade uma diversidade étnica, de um reconhe-cimento do “outro”, passa pela premissafundamental de que existe uma separaçãoentre os saberes. Portanto, faz-se necessá-rio refletir sobre los saberes coloniales yeurocentricos que dominaram e todaviadominam principalmente o campo das Ci-ências Sociais (Lander, 2007, p.11).

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200948 ]Lander (2007), assinala que os deba-

tes em diversos campos das Ciências Soci-ais, tem evidenciado a notória dificuldadepara formular alternativas teóricas e políti-cas diante das noções apresentadas peloneoliberalismo. Esse compreendido comoum discurso hegemônico de um modelocivilizatório, que propõe valores “básicos”para uma sociedade liberal, “moderna” em“beneficio do ser humano”, e que, por con-seguinte estabelece o que é una buena vida.

Com essas bases, a expressão maispotente da eficácia do pensamento científi-co moderno- especialmente em suas expres-sões tecnocráticas e neoliberais, é o que podeser descrito literalmente com a naturaliza-ção das relações sociais. A sociedade liberalse constitui, desde essa perspectiva e apre-senta-se com capacidade de apresentar suaprópria narrativa histórica, como o conhe-cimento objetivo, científico e universal e asua visão de sociedade moderna como aforma mais avançada, porém, normal, daexperiência humana. Portanto, uma daspropostas do neoliberalismo é a capacidadede constituir-se no sentido comum da soci-edade moderna.

Em contraponto, percebe-se que nabusca por alternativas, a essa realidade pro-fundamente excludente e desigual do mun-do moderno, exige-se um esforço dedesconstrução desse caráter universal e na-tural da sociedade capitalista liberal. Por-tanto, requer o questionamento das pre-tensões da objetividade e neutralidade dosprincipais instrumentos de naturalização elegitimação.

Segundo Lander, (2007) é necessárioum esforço, no sentido de que é possívelidentificar duas dimensões constitutivas dossaberes modernos que contribuem paraexplicar sua eficácia neutralizadora.

A primeira dimensão se refere àssucessivas separações em que estão ampa-

rados o saber do mundo do real, da vidacotidiana que se dão historicamente na so-ciedade ocidental e as formas como se cons-troem o conhecimento sobre as bases desteprocesso de sucessivas separações.

A segunda dimensão é a forma comose articulam os saberes modernos com aorganización del poder, especialmente las re-laciones coloniales/imperiales de poderconstituyentes del mundo moderno (Lander2007, p.14) . Estas duas dimensões servemde sustentação sólida a uma construçãodiscursiva naturalizadora das ciências soci-ais ou dos saberes sociais modernos.

Ocorre a partir daí uma ruptura en-tre a razão e o mundo. A compreensão domundo já não é um assunto que está emsintonia plena com o cosmos, a natureza. Omundo moderno se converte em um meca-nismo desespiritualizado que pode ser cap-tado por conceitos e representaçõesconstruídas pela razão (Lander, 2007). Aquireside a incompreensão entre o mundo oci-dental e as cosmovisões indígenas, uma vezque essa radical separação entre mente emundo, colocou os seres humanos em umaposição externa a natureza.

Essa separação segundo Taylor, nãoestá presente entre outras culturas. E, é apartir desses pilares, dessa separação que amodernidade consegue conceber um tipomuito particular de conhecimento que pre-tende ser objetivo e universal.

Entretanto, a vida cotidiana éexercida, antes de tudo, valendo-se de sa-beres sensíveis e conhecimentos que o inte-lectual apressa-se logo em classificar como“não-científicos”, como se o saber local nãocontivesse qualquer verdade ou validadeprática. Maffesoli, mesmo argumentando apartir do interior da academia, não hesitaem propor um retorno a esse saber das ruas,do povo, com sua sensibilidade e tradição.Na obra O conhecimento comum, o autor

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49ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [acima referido afirma que existe, efetiva-mente, um conhecimento empírico cotidia-no que não pode ser dispensado(MAFESSOLI, 1988, p. 195).

A QUESTÃO DAINTERCULTURALIDADE

Outro desafio constante era eviden-ciar, na prática, durante os encontros comos acadêmicos as noções de intercul-turalidade. Sabíamos que era necessário iralém do espaço reduzido das noções de to-lerância, do elogio puramente estético da“diversidade cultural” e das bondades éticasdo multiculturalismo5, entendido este comosimples folclorização de singularidades de-vidamente caricaturizadas.

Certo é que a interculturalidade sur-ge como resposta ao esgotamento do pro-jeto moderno e as crises do eurocentrimo.Hoje, não pairam dúvidas de que o desco-nhecimento da existência e validade deracionalidades alternativas e a racionalidadeinstrumental dos processos de moderniza-ção industrial do capitalismo ocidental temconduzido a atropelos muitas vezesetnocidas, de exclusão social e cultural damaioria dos indígenas do continente ameri-cano.

Na América Latina ainterculturalidade surgiu como resposta àimposição cultural e à incapacidade dos es-tados nacionais modernos em lidar com osconflitos das identidades. Em nível mundi-al, essa fragilidade dos estados nacionaispode ser observada: “[...] desde el exterior,el fenômeno de la globalización en susdimensiones econômica y cultural- eindirectamente política- está debilitandotanto su soberania política y econômicacomo su cohesión cultural” (ETXEBERRIA,2001, p.20).

Nesse ponto podemos perceber uma

contradição no processo de globalização, poisa globalização dos padrões de consumo, doindividualismo competitivo e a cultura donarcisismo própria do american way of lifeestão produzindo efeitos diversos e contra-ditórios entre si. Por um lado, estamos assis-tindo ao desaparecimento de línguas, práti-cas culturais, rituais ancestrais de gruposmuitas vezes vulneráveis. Por outro lado,presenciamos também o surgimento e for-talecimento das identidades étnicas, os mo-vimentos sociais etnoidentitários. Temos achamada “glocalización” por meio da qual acultura permanece, transformando-se(Castells, 2000). Se por um lado, a globalizaçãoimpõe padrões comuns, pois, difunde umamesma matriz produtiva, baseada na novatecnologia que apaga distâncias, por outro,propicia reações locais que nascem marcadaspelas novas práticas sociais.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕESFINAIS

Na realidade, o que podemos ob-servar é que cada vez mais, os povos estãoreivindicando espaços e se fazendo presen-tes, percebemos dentro de um contextomaior, que as comunidades estão, a cadapasso, se organizando melhor e de acordocom suas especificidades. E, neste contexto,os povos indígenas querem ser ouvidos apartir de um local determinado, como indí-genas, participando de um processo histó-rico que, ao contrário do que já foi prog-nosticado, apresenta-se como um campoaberto de possibilidades.

E, diante desse contexto, é impor-tante uma abordagem que leve em consi-deração as estratégias que os povos indíge-nas vêm procurando estabelecer, apesar daspressões que tentam incapacitá-los, ou areduzí-los a simples tutelados. Nesse senti-do, apesar de todo o processo de violência a

Page 52: Revista Arandu # 49

ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200950 ]que os povos indígenas foram submetidos,entendemos que esses povos, buscam a todoinstante estabelecer estratégias com a soci-edade envolvente, seja no âmbito escolar,territorial, jurídico, político, no sentido deseguirem construindo sua própria caminha-da, em busca do processo de livre determi-nação6.

A respeito dos povos indígenas comoprotagonistas de suas histórias, torna-se in-teressante mencionar o trabalho de Pompa(2002), em que a autora aponta que pesqui-sas recentes estão procurando reescrever ahistória colonial da América indígena, mos-trando um mundo de rápidas mudanças,de adaptações, de negociações, de constru-ções permanentes de identidades no interi-or do quadro político extremamente instá-vel. A autora ainda propõe uma revisão ra-dical do paradigma da conquista tanto navertente da perda quanto no de resistência,que traduzem oposições binárias entre ven-cedores e vencidos, dominantes e domina-dos e deixam para os povos nativos apenasdois papéis, os de vítimas de aniquilação oude mártires da conservação da cultura (POM-PA, 2002, p.22).

Importante observar, que dada a vi-sibilidade política que as populações indíge-nas vêm conquistando, cada vez mais se faznecessário reconsiderar a maneira de sepensar a história do contato, enfatizando oque Pompa argumenta sobre a construçãode uma linguagem simbólica negociada. Es-tudos como os de Pompa (2002), nos levama refletir sobre a história indígena entendi-da não apenas como a história dos índios(em termos ocidentais), mas a, construçãoindígena da história em seus próprios termos(POMPA, 2002, p.22).

A constatação dessa linguagem sim-bólica negociada leva-nos ao entendimentode que esses processos operam num hori-zonte lógico e estratégico de negociação

intercultural, a partir de onde procuramoscontribuir com o debate, já em pauta há al-gum tempo, que é, sobretudo repensar avisão bipolar que constrói o indígena, en-quanto aquele que defende seu espaço aqualquer preço (mesmo que isto represen-te sua destruição) ou, por outro lado, o in-dígena que lenta ou progressivamente éabsorvido pela sociedade envolvente, per-dendo parte de sua suposta originalidadehistórica (Pompa, 2002). Assim, com o estu-do sobre as relações interétnicas que se dãono espaço da Universidade entre indígenase não-indígenas procuramos sinalizar que,nestes processos, as transformações não sãoaplicadas de fora para dentro, mas, ao con-trário, são produzidas, como instrumentosde continuidade.

E, que os povos indígenas revelamprofundo saber histórico, etnográfico e eco-lógico, sistematização jurídica, palavra cu-nhada pelo saber ocidental, refletido em suasidentidades e símbolos. Com já evidencia-do anteriormente, os povos indígenas têmsaberes e modos de vidas próprios, há pro-jetos de sociedades que emanam de suasvivências. Sua existência são movimentos dere-existência, posto que não só lutam pararesistir contra os que invadem seus territó-rios, desmatam e matam, ao contrário, lu-tam por uma forma de existência, por mo-dos diferenciados de viver, ver, sentir, pen-sar, agir e de construir seus direitos.

Portanto, daí a importância não só detrazer o cotidiano dos acadêmicos para o in-terior da Universidade, que bem que pode-ria se chamar Diversidade tendo em vista opapel que ela assumiu, mas também trazer ahistória e o desafio de conhecer e respeitar asdiferenças, pois ela é uma instituição privile-giada, na medida em que possibilita o conta-to entre sujeitos com diferentes visões demundo, podendo promover o seu encontroe a troca de significados e vivências.

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51ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [

NOTAS

2 Importante destacar que nesta turma de 2003, além dos acadêmicos indígenas, duasacadêmicas não-indígenas optaram, no ato da matrícula, fazer parte desta Turma.3 A antropologia cultural ou social é aqui entendida como o campo da antropologia dedica-do ao estudo das sociedades humanas no tempo e no espaço a partir de sua dimensãosociocultural, de acordo com a tradição antropológica de grande parte dos países america-nos.4 Importante destacar que até final do século XIX quando da demarcação fronteiriça e iníciodo século XX, quando foram demarcadas 08 Reservas Indígenas pelo SPI para os GuaraniKaiowá, estes povos não conheciam limites fronteiriços.5 Essa crítica ao multiculturalismo é feita por Diaz Polanco (2006).6 Apesar da relevância não trabalhamos neste texto os processos de autonomia e livredeterminação dos povos indígenas. Nesse sentido ver Barcenas, (2007), Stavenhagem (2006).

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O TEMPO E A MEMÓRIA:O TEMPO E A MEMÓRIA:O TEMPO E A MEMÓRIA:O TEMPO E A MEMÓRIA:O TEMPO E A MEMÓRIA:HISTÓRIAS DE PROFESSORESHISTÓRIAS DE PROFESSORESHISTÓRIAS DE PROFESSORESHISTÓRIAS DE PROFESSORESHISTÓRIAS DE PROFESSORESEM FORMAÇÃO NOS 10 ANOSEM FORMAÇÃO NOS 10 ANOSEM FORMAÇÃO NOS 10 ANOSEM FORMAÇÃO NOS 10 ANOSEM FORMAÇÃO NOS 10 ANOS

DO CURSO NORMALDO CURSO NORMALDO CURSO NORMALDO CURSO NORMALDO CURSO NORMALSUPERIOR-DOURADOS (MS)SUPERIOR-DOURADOS (MS)SUPERIOR-DOURADOS (MS)SUPERIOR-DOURADOS (MS)SUPERIOR-DOURADOS (MS)

Neide Araujo Castilho Teno 1

RESUMOEste texto trata de uma pesquisa sobre a trajetória da formação docente de

alunos /professores do Curso Normal Superior, da Universidade Estadual de MatoGrosso do Sul, no tempo de 10 anos, em que procuramos ressignificar os escritos dosmemoriais e torná-los peças fundamentais para análise da memória institucional. Esteartigo tem como finalidade contribuir para a história da educação de um espaço consi-derado regional reproduzindo por meio dos memoriais de pesquisa a história e aimportância do Curso Normal Superior,bem como da UEMS, como instituição respon-sável pela formação dos profissionais da educação e, mais especificamente, as repre-sentações dos alunos/professores normalistas acerca do papel dessa instituição públicana formação profissional.

Palavras-Chave: Tempo e memória, Curso Normal Superior, formação deprofessores.

ABSTRACTThis text describes a research about the history of students/teachers graduation

at University Level from Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, in 10 yearstime, in which we sought to reframe the memorial written and make them fundamentalkey pieces for analysis of institutional memory. This article aims to contribute toeducation history in a space considered regional reproducing through research memorialthe history and the importance of University level, as well as UEMS, as the institutionresponsible for the graduation of professional educators and more specifically, therepresentation of the “normalistas”(the students from the old teaching graduation forelementary education) concerning this public institution’s role on professional graduation.

Key-words: Time and memory, University level, teachers graduation.

1 [email protected]. Professora da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, UEMS e doutoranda doPrograma de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, UFMS, Linha dePesquisa: Educação, Psicologia e Prática Docente.

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200954 ]INTRODUÇÃO

Toda história tem um tempo e umamemória. O resgate dessas histórias às ve-zes se sobrepõem como fotos em uma tela,outras vezes se sobrepõem uma às outras,como fazem os escritos nas páginas de umcaderno. Este texto trata de uma pesquisasobre a trajetória da formação docente dealunos /professores do Curso Normal Su-perior , da Universidade Estadual de MatoGrosso do Sul no tempo de 10 anos. O res-gate da memória de cursos de formação deprofessores em serviço, numa instituiçãopublica é de fundamental importância paraanalisar a Educação Brasileira.

Este artigo tem como finalidade con-tribuir para a história da educação em umespaço considerado regional reproduzindopor meio dos memoriais de pesquisa a his-tória e a importância do Curso Normal Su-perior, seu percurso ao longo dos anoscomo instituição responsável pela forma-ção dos profissionais da educação e, maisespecificamente, as representações dos alu-nos/professores normalistas acerca do pa-pel dessa instituição publica na formaçãoprofissional.

Os memoriais, objeto da pesquisa,foram tratados em forma de narrativas, umaescrita das experiências e do significado queestavam tendo em sua formação , nas dife-rentes disciplinas e módulos do Curso, coma finalidade de constituir um arquivo dedepoimentos em suportes escritos, que per-mitissem compreender a trajetória dessesalunos nos diversos aspectos , uma vez que,que a escrita de um memorial na formaçãode professor pode constituir um valioso ins-trumento para possíveis reflexões acerca dasteorias e práticas do ser professor.

O material empírico foi construídoem duas disciplinas básicas do Curso: Práti-ca de Leitura e Produção de Textos e Fun-

damentos Metodologia da Língua Portugue-sa na Educação Infantil e Anos Iniciais doEnsino Fundamental e analisados como um“fio de um destino particular e com ele amultiplicidade dos espaços e tempos, a me-ada das relações nas quais ele seinscreve.”(REVEL,1998, p.21).

CURSO NORMAL SUPERIOR/DOURADOS-MS:

UM POUCO DE HISTÓRIA

Ao recuperar parte da história doCurso Normal Superior é preciso lembrarda aprovação da Resolução CNE/CP nº 133,em Janeiro de 2001, sob a alegação de fazercumprir as determinações do Decreto nº3.276/ 99 e do Decreto nº 3.550/2000 (quealterou o termo “exclusivamente” para “pre-ferencialmente”), fato esse que fomentou adiscussão sobre os cursos de pedagogia e asinstâncias de formação , ao estabelecer asregras para autorização de cursos de for-mação de professores: assim a formaçãode professores somente poderia acontecerem universidades e centros universitários enos institutos superiores de educação, cria-dos especificamente para esse fim.

Esse decreto abriu a possibilidade deformação de professores por meio do Cur-so Normal Superior, ou ofereceu a oportu-nidade de as Instituições permanecer comocurso de pedagogia, formando exclusiva-mente o bacharel – especialista para atuarnas tarefas de gestão, supervisão e orienta-ção na instituição escolar.A partir de então ,estudos foram realizados na UEMS quantoaos cursos que poderiam preparar profissi-onais para a atuação na Educação Infantil(zero a seis anos) e nos anos iniciais do Ensi-no Fundamental.

Com base no que dispunha a Reso-lução CNE/CP 1/99, e a manifestação doConselho Nacional, a Universidade Estadu-

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55ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [al de Mato Grosso do Sul, que nasceu com afinalidade de democratizar o acesso ao co-nhecimento e interiorização do ensino noEstado, criou e implantou o Curso NormalSuperior, amparado no reconhecimento dosuporte que as metodologias de ensino adistância prestam, principalmente à forma-ção continuada, e impulsionada pela neces-sidade educacional da rede de ensino públi-co do Estado. Esse Curso é direcionado ape-nas a professores que já atuam em sala deaula, que dispõem da prática docente, masque precisam atender às exigências legaisde formação impostas pelo Art. 87 da LDB:§ 4º Até o final da Década da Educação so-mente serão admitidos professores habili-tados em nível superior ou formados portreinamento em serviço.

O primeiro projeto do Curso Nor-mal Superior foi aprovado e autorizado ofuncionamento pelo Conselho Estadual deEducação em 1999 sob o titulo de Habilita-ção para Magistério nas Séries Iniciais doEnsino Fundamental e EducaçãoInfantil,atendendo os pólos de Dourados ,Campo Grande, e os municípios de PontaPorã Amambaí, Mundo Novo, CoximParanaíba e Jardim. Hoje, o referido Curso,além dos municípios supracitados, atendeaos municípios de Aquidauana, Cassilândia,Naviraí, Nova Andradina e outroscircunvizinhos.

Em 2001, o CEE, manifestou o en-tendimento de que a Universidade detémcompetência para a Autorização de Funcio-namento de seus Cursos. O CEPE – Conse-lho de Ensino, Pesquisa e Extensão, então,aprovou novo projeto de Curso NormalSuperior que habilitava para os anos iniciaisdo Ensino Fundamental.

Assim no o ano de 2000 instalava-seas primeiras turmas do Curso Normal Su-perior, via vestibular , no Pólo de Dourados,Campo Grande e Municípios entorno con-

cretizando assim o Projeto de criação de umCurso de Formação de professor em servi-ço. Se por um outro lado, a UEMS estavarespondendo a um chamado da Secretariade Educação do Estado de Mato Grosso doSul ,que apresentava na época uma deman-da de 1887(mil oitocentos e oitenta e sete)profissionais da Educação, habilitados ape-nas pelo Curso de Magistério de nível médioem exercício na rede pública de Mato Grossodo Sul, nas diferentes regiões, por outro, con-cretizava o anseio das Prefeituras Munici-pais Estaduais , que possuíam em igual pro-porção em seus quadros professores minis-trando aulas sem a formação para a Educa-ção Infantil e as Series Iniciais.

O curso iniciou com professoresefetivos, cedidos e tantos outros contrata-dos para o cumprimento da relação ensi-no-pesquisa e extensão. Constitui-se emum curso de Licenciado em Normal Superi-or, turno integral, , com duração de 4 anos,reconhecido pela Deliberação CEE/MS nº7511, de 18/02/2004, reconhecido por 5 anos,a partir de 2004, até 31/12/2008. Decorridos10 anos os dados gerais apontam um nú-mero de 4.061 egressos no Curso NormalSuperior , somente no pólo de Dourados.

NARRANDO A EXPERIÊNCIA EFALANDO DE MEMÓRIA E

NARRAÇÃO

Narrando a experiência constitui emtecer algumas reflexões sobre relação entrememória e narração como possibilidademetodológica na constituição da história.Utilizo os fios da poetisa fiandeira RaquelNaveira para iniciar a tecitura de um textobuscando , na memória dos que fazem his-tória e lembrando que a narrativa final nãoé nunca verdade absoluta, mas é algumacoisa relativa à versão de cada narrador.Compõe de uma narrativa articulada por

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200956 ]muitas vozes que ora falam, ora silenciammas que podem gerar outras vozes capa-zes de prolongar a voz original.

As narrativas nunca encerram seuciclo, nunca solicitam para encurtar o tem-po e nem podem-se falar em conclusão.Nasnarrações tudo pode acontecer outra vez epode ser de outra forma.Segundo Benja-min (1985, p.215) “os narradores movem-se para cima e para baixo nos degraus desua experiência, como numa escada”, e acen-tua que as pesquisas que se utilizam de nar-rativas precisam ser mais incorporadas nocotidiano das Universidades para que hajamais trocas de experiências, fonte de ondebebem os narradores.

Ginzburg (1996) buscou no passado,entre os Reis algo que pode constituir o fiocondutor na reconstrução de uma parte dahistória e da memória do Curso NormalSuperior da UEMS:

No passado, podiam-se acusar os histori-adores de querer conhecer somente as“gestas dos reis”. Hoje, é claro, não é maisassim. Cada vez mais se interessam peloque seus predecessores haviam ocultado,deixado de lado ou simplesmente igno-rado. “Quem construiu Tebas das seteportas?” – perguntava o “leitor operário”de Brecht. As fontes não nos contamnada daqueles pedreiros anônimos, masa pergunta conserva todo seu peso. (p.15).

Com o olhar nas “gestas dos reis”,pude perceber que transcorrido dez anos aUEMS não construiu ainda sua história enem convocou pedreiros nem reis par a essaempreitada. É tempo de se indagar quaisforam as pessoas significativas, responsá-veis que poderiam re-construir a históriado Curso Normal Superior na UEMS?

Para construção dessa história foifundamental desvincular das “armaduras”dos “falsos conflitos “ das “controvérsias” ,

“da luta pelo espaço” que amarram a Edu-cação e paralisam aqueles que pretendemproduzir algum conhecimento, e retornar aum tempo, ou seja , em que seconsubstanciava a implantação de uma Uni-versidade publica em Dourados, com umafinalidade muito forte a de interiorização doEnsino. Nesse momento era necessário quese construísse conhecimento, fortificasse oensino , de forma que isso pudesse ser par-tilhado no futuro por meio de narraçõesde experiência vividas. Ao assumir o caráterhistórico-cultural do objeto de estudo, quesão as narrações elaboradas, como umaconstrução que se opera entre sujeitos , essaabordagem consegue sair da objetividade ebuscar construir conhecimento na coletivi-dade , procurando compreender o sujeito eatravés dele desvendar o seu contexto.

Traçamos um caminho, o que cha-mamos de método, para narrar as históriasde formação de professor em serviço. Um(método) que poderá não ser o melhor, maso disponível e eficaz para o que se pretendenesse tempo. Análise de conteúdo das me-mórias, histórias narradas foi o suficiente parabuscar no corpo e na voz uma presença realdo sujeito na cena do passado. A história daanálise de conteúdo, sua expansão e sua atu-alização no decorrer dos tempos foi sistema-tizada por Bardan(1979) que segundo a estu-diosa trata de uma análise de comunicações ,com objetivos claros de descrição do conteú-do daquilo que é apresentado , “quantitativoou não, que permitam a inferência de conhe-cimentos relativos as condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensa-gens”, (BARDAN, 1979, p.42). Caminhamospelas veredas da pesquisa qualitativa sob oolhar da análise de conteúdo, unidades deregistro e de contexto.

Dialogamos com alguns teóricos quenos ensinou que o tempo é sempreconflituoso, principalmente o tempo passa-

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57ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [do. A ele se referem, em nível de disputa, amemória e a historia, pois nem sempre a his-tória acredita na memória, e a memória des-confia da reconstituição de fatos que não sepreocupa com os direitos da lembrança . Sarlo(2007,p.44) faz uma critica aos dispositivosda memória e a sua relação com a história,explicando que “(...) não se deve basear namemória uma epistemologia ingênua” e que,portanto, “(...) não há equivalência entre odireito de lembrar e a afirmação de uma ver-dade da lembrança”.Para entender essa criti-ca é preciso contextualizar os fatos, pois aestudiosa referiu-se – no caso europeu apóso Holocausto e no latino-americano após asditaduras militares – pelos testemunhos emprimeira pessoa que foi feito na época .É nes-te contexto que surgiaram as ambigüidadesentre o que era real ou não , existente entrea memória e história: ambas passaram a rei-vindicar o passado, pois é inegável que a his-tória se aproxima das questões advindas damemória.

Sobre tempo e memória sugere Bosi(2003), que memória é aquela que recuperaa beleza do tempo, é aquela que busca ativaro entusiasmo de um tempo que já foi muitoimportante mas que ora se perdeu com opassar do tempo. Sob essa ótica podemosdizer que utilizar de memoriais para com-preender as ressignificancias do sujeito nadamais é que buscar no passado aquilo que,em um tempo se efetivou. As narrações tam-bém funda uma temporalidade, que a cadarepetição e cada momento torna-se a se atu-alizar. É nesse ir e vir de tempo e memória eescritos, que se constituíram os textos pararecompor a trajetória de existência de umcurso de formação de professor.

Os registros realizados nas reuniõespedagógicas do Curso Normal Superior,areconstrução do Projeto Pedagógico, a es-crita dos trabalhos de elaboração própria(TCC) , as vozes dos professores, as ima-

gens registradas das semanas acadêmicas,os registros dos seminários semestrais, seresgatadas, certamente são arcabouços re-presentativos do ser professor em umaUniversidade pública. As escolas Estaduais,Municipais, as Indígenas ou as de Assenta-mentos que constituíram os espaço de exer-cício profissional dos alunos/professores doCurso Normal Superior, são também es-paços de memória onde se concentram todavivência da prática de ensino, e sereconstituídas; nelas se evoca a presença dopassado e do sujeito histórico impregnadode suas experiências pessoais e coletivas.

Certeau (2002)2 em seu artigo sobrea etnografia social apresenta as estratégiasinventadas por operários da fábrica para agirem proveito próprio.As hipóteses levanta-das pelo filósofo sobre os atos de rebeliãocotidiana fundiram-se de tal forma com aideologia das histórias de novos sujeitos donovo passado, que ao adentrar nas históri-as da vida cotidiana , produzidas de modomonográfico no espaço acadêmico,essasmemórias podem revelar um publico quevai além dos bancos da Universidade.O alu-no/professor busca na vida cotidiana da suaescola um quadro de costumes em que sevaloriza os detalhes , o brincar no pátio, omodo de ensinar de um passado que já nãose encontram no presente, ou que se repeteno presente.

Esses sujeitos conforme explicaSarlo(2007p.17))são sujeitos que teriam sidoconsiderados marginalizados, “ignoradosem outros modos de narração do passado,demandam novas exigências de método etendem a escuta sistemática dos “discursode memória”: diários, cartas, conselhos, ora-ções.” Reordenando essa maneira de ideo-lógica e conceitual de Sarlo pode-sedepreender que os alunos do curso NormalSuperior são personagens que coincidemcom essa visão de sujeito , uma vez que ao

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200958 ]retornarem a Universidade depois de umtempo renovam saberes metodologias eascensão social.

Cada pessoa carrega uma história eos relatos dessas histórias são elos que unemo coletivo social e serve como marco que sefinca para dar início a uma história, que nestemomento estamos falando, memória daformação de professor. Halbwachs (1990,p.54), ao argüir que toda memória é coleti-va, de certa forma ele está advertindo parao que é mais imediato, o de garantir a con-tinuidade do tempo e “permitir que resistaà alteridade, ao tempo que muda e às rup-turas, que são o destino da condiçãohumana”.A memória coletiva, a que se refe-re é uma reconstrução do passado que nun-ca é aquele do indivíduo sozinho, mas doindivíduo inserido num contexto, seja fami-liar, social ou nacional. Portanto, para o au-tor, a memória é sempre uma construçãocoletiva.

Memorial como o próprio nomedeclara é a prática de contar as própriasmemórias, caracterizada por uma escritareflexiva. É um exercício de escrever nar-rando as experiências de um tempo passa-do, dos fatos que já ocorreram, para fazersuscitar na mente, além das recordações/lembranças, também informações que cer-tamente constituirão novos sentidos ao pre-sente. Como coloca Bosi (2003), é por meioda memória que o passado surge nas lem-branças, vai mesclando com as percepçõesdo presente, ou vice-versa, as impressõesdo presente interagem com o passado e vaifixando na consciência. Segundo a autoranão existe presente sem passado, as ações,os eventos, os comportamentos quevivenciamos são marcados na memória.Fazer um Memorial é, então, um exercícioorganizado, uma forma de fazer relatos daprópria história, rever a própria trajetóriade vida e aprofundar a reflexão sobre ela,

assim considerando é uma atividade deautoconhecimento.

Experiências do homem com suashistórias e memórias, de acordo com Pradoe Soligo (2005, p. 47) “[...] é feita com o tem-po”. Neste sentido, ao trabalhar com as ques-tões de memória, Kenski (1995) reconheceas transformações vividas pelas pessoas aolongo do tempo, pois, ao recordar, as pes-soas constroem a sua identidade, por meiode um todo coerente, situando questõesimaginárias e reais, aproveitando para pas-sar a limpo o seu passado.

CAMINHANDO PELO MEMORIALDE FORMAÇÃO DE PROFESSOR

Em um outro artigo publicado emCD dialogamos com Morin (2001), Josso(2004) e Nóvoa (2000) por entendermos queesses teóricos falam do mesmo lugar deonde estamos falando - instituições deensino.Não é demais confirmar o que rela-tam esses pesquisadores está ligado a for-mação de professores em exercício, que seconfigura como formação continuada. Éimportante destacar que os autores dosmemoriais aqui apresentados são profissi-onais já em exercício e que segundo Prado eSoligo (2005, p.59) quem escreve o texto “[...]é um sujeito que, ao mesmo tempo, traba-lha e está em processo de formação. Issopossibilita a emergência de um conjunto deconhecimentos advindos da ação, de umconjunto de conhecimentos advindo da for-mação e a inter-relação de ambos.”

Assim, um memorial de formação éuma possibilidade de refletir, de compreen-der nossa própria história e a dos que noscercam, pois já se sabe que ao ser protago-nista de uma historia impregnada das me-mórias não estamos sozinhos, muitos ou-tros fazem parte. Um memorial de forma-ção configura-se como uma maneira de re-

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59ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [flexões sociais, educativas e culturais no qualum sujeito re-elabora e re-situa sua vida emrelação à sociedade e outros sujeitos.

Acerca do não estar sozinho, quan-do Morin3 (2001, p.105), ao estudar sobre aética do gênero humano, argumenta que oindividuo, a sociedade a espécie não sãovistas como coisas separáveis “[...] mas co-produtores um do outro. Cada um destestermos é, ao mesmo tempo, meio e fim dosoutros. Não se pode absolutizar nenhumdeles e fazer um só, o fim supremo da tríade”.

Josso (2004) fortifica a questão domemorial formativo argumentando que épossível falar de autoformação por meio dereflexões de percursos pessoais e profissio-nais. De acordo com esta pesquisadora ofato do sujeito aceitar a tarefa de fazer umabiografia de si mesmo, esse trabalho “[...]dá início à aprendizagem da implicação per-manentemente em jogo, no trabalho indi-vidual e no trabalho coletivo” ( p. 219).

Portanto, a escrita de Memoriaisconstitui-se em uma técnica no processoformativo privilegiado para a compreen-são do processo de formação pessoal e pro-fissional. É uma perspectiva de pesquisamuito presente nas instituições de ensinoSuperior e nos espaços de formação conti-nuada, para os educadores registrarem suashistórias e conhecimentos.

SOBRE A COLETA DA MEMÓRIAEM FORMA DE NARRATIVAS

A coleta dos dados constituiu-se norecolhimento de textos em forma de nar-rações , denominadas de memórias, de to-dos os professores do primeiro e terceiroano do Curso Normal Superior da UEMS,oriundos dos diferentes municípios e dasdiferentes escolas públicas, matriculados nasdisciplinas de Prática de Leitura e Produ-ção de Textos e Fundamentos Metodologia

da Língua Portuguesa na Educação Infantile Anos Iniciais do Ensino Fundamental, doano de 2005 e 2006. Foram analisadas 15(quinze) narrações das 64 (sessenta e qua-tro ) coletadas.

Um dos critérios básicos para limi-tação desses números foi à receptividade evoluntariedade dos professores em partici-par da pesquisa. Sobre este aspecto bemesclarece Kramer e Souza (1996, p.154) aodizer que o que importa não está em definirquantas pessoas devem ser entrevistadas,mas a maneira de como “construir uma redecada vez mais ampla de significados, atravésda qual possamos expandir a compreensãodo fenômeno estudado”. Os nomes aqui re-latados são fictícios conversando a privaci-dades dos sujeitos.

Em termos gerais as narrativas apon-tam para um desvelamento de múltiplashistórias, nas quais puderam dar visibilida-de nas suas trajetórias como leitoras oucomo iniciantes da leitura. Entre os aspec-tos abordados nos memorais destacam-seainda : o tempo e importância de estudarna UEMS; motivos da escolha pelo CursoNormal; convivência das normalistas entresi e com os professores; recordações dosmomentos do tempo das suas escolas .Pre-tendemos trazer a luz dos olhos subsídiospara os estudos que enfocam as práticas deformação vivenciadas pelos professorescomo intuito de fornecer um estudo no ape-nas ao que está explicito , mas aos não –ditos, ou seja, ao que esta implícito.

O QUE NARRAM

O tempo passou mas há na memó-ria, que data de 1835 a primeira Escola Nor-mal4 brasileira, criada em Niterói, Rio deJaneiro, com a finalidade de formar pro-fessores para atuarem no magistério de en-sino primário e era oferecido em cursos

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200960 ]públicos de nível secundário (hoje EnsinoMédio). A partir daí outras tantas foramcriadas e deixaram histórias marcadas pordiversos movimentos conflitos, atravessoua República e chegou aos anos 1940/50, comoinstituição pública fundamental no papel deformadora dos quadros docentes para oensino em todo o país. Portanto é históricaa questão do Normal Superior. Em outrasdécadas já tiveram sua importância e hojetornou realidade enquanto um espaço deformação socialmente aceita, sendo respon-sável pela profissionalização de um grandenúmero professores.

Instigados a memoriar sobre osmotivos que levaram a escolha do Cursona UEMS, muitos foram os motivos quelevavam à escolha pelo Curso Normal: ques-tões familiares, imposição, boa reputaçãoda instituição, questões financeiras, qualifi-cação profissional, principalmente a possi-bilidade de freqüentarem o curso pelo fatoda modalidade da sua oferta em móduloscom aluas integrais em finais de semana.Assim relatam:

“Eu só tinha uma opção, ou fazer essecurso ou continuar nas lidas da casa, dan-do aula sem o magistério mesmo, pois eununca ia conseguir fazer uma Universi-dade morando no sitio, e perto da Aldeia.Eoutra que essa Universidade é boa.” (Alda)

“A busca pelo Curso Normal Superior sedeu por causa das nova lei que fala queprofessor vai perder o cargo se não tiverformação superior.” ( Manoel)

“Uma das razões que eu e minha mãeviemos para cá fazer o vestibular nessecurso foi por conta dos estudos. Meu paisaiu do acampamento do sem terra quenão dava futuro para ninguém , para quegente pudesse estudar. Foi um presenteque ganhamos. Já estamos perto para seformar, o tempo passou que nem vimos.

Agora vamos poder fazer o concurso daprefeitura.” (Marina)

“Não é muito fácil conciliar os vários tra-balhos, atender os alunos na escola , fa-zer merenda para os alunos, cuidar dosfilhos e ainda viajar para fazer esse curso.Ainda bem que eu tive essa oportunida-de de ser aprovada no vestibular e fazerum curso Universitário trabalhando.”(Rosa)

“Na aldeia não tem professor formado,sei que é longe, tenho que vir um trechode bicicleta, mas ainda bem que vamoster uma ajuda da Funai, uma bolsa paraestudar.Esse curso vai se bom.” (Tonico)

A possibilidade de ser professor uni-versitário, poder fazer sua qualificação emserviço, transcender o âmbito doméstico, fo-ram as razões que levaram grande parte delesa ingressarem no curso. Uma leitura dessesaspectos já vem sendo realizado por profis-sionais da educação como a exigência de ní-vel superior para a permanência no magisté-rio de qualquer nível de ensino, levando vá-rios professores em exercício aos CursosNormais Superiores, muitas vezes, não comouma opção motivada por desejo próprio,mas por temor de perder o emprego.Muitosalunos que cursaram ou cursam o NormalSuperior embora não recebem bolsa de es-tudo, por parte do governo Estadual mas háregistros que recebem incentivos por partedas Secretarias Municipais de Educação. Par-te das Prefeituras firmaram convênios com aUniversidade Estadual do Estado e muitoprecariamente alguns professores recebiamgratuitamente a locomoção de sua cidade atéa UEMS, e cópias de materiais necessáriopara as leituras.

Os motivos que levam o sujeito aescolhas de vida passa, sobretudo, por ques-tões filosóficas, isto porque em toda for-mação de professor há que nos remeter a

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61ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [conceitos que envolvem o ser humano e suasrelações com o mundo.Podemos dizer dainterface daquilo que podemos fazer comaquilo que se queremos verdadeiramente.Percebemos que no meio da educação, nãoraras vezes, é impossível separar o pessoaldo profissional conforme explica Nóvoa(2000,p,44) “[...] separar o eu pessoal do euprofissional, sobretudo numa profissão for-temente impregnada de valores e ideaismuito exigentes do ponto de vista doempenhamento e da relação humana [...]”.As narrações de Alda, Manoel, Marina eTonico bem retrata esse pensar filosófico.

Agregado ao desejo de qualificaçãoprofissional as narrações registram fatos deamizades que se solidificaram ao longo dosanos, a maneira que encontraram para so-cialização dos alimentos, necessários paracumprirem a jornada de 8 (oito) horas naUniversidade. Assim falam:

“O ônibus sai muito cedo da minha ci-dade. E o motorista não espera nin-guém. Mas eu gosto de chegar ao ôni-bus para saber o que cada uma estavalevando para comermos juntas no ho-rário do almoço. Até toalhas nos levá-vamos. Eu nunca levei comida só paramim, sempre tinha uma que não tinhacomo levar e aí nos dividíamos, isso nãofalando quando algum professor nãocomia com agente.” (Sueli)

“Nesse curso eu conheci a amizade como convívio com turma. Sempre umaajuda a outra. Essa amizade era estendi-da aos professores também. Temos umaprofessora que leva todos os seu livrospara nossa consulta, ate levávamos paracasa para devolver na próxima semana.Outros professores de amizade não tinhanada, só sabia exigir mas ensinar que ébom nada.” (Sueli)

“Isso é o imprevisto acontece também.

O motorista demorou de trazer as mar-mitas e nós tivemos que comer as pressapara não perde a aula. E ai tivemos quecontar com a compreensão da professo-ra.” (Marisa)

“Quer saber a verdade eu acho que osprofessores desse curso tínhamos noscomo filhos. Só faltava carregar no colo.Mas nem por isso facilitava as coisas paranos.” (Joel)

Se pensarmos em categoria podemoseleger a afetividade e a amizade como umadelas. A afetividade nas narrações é concebi-da como um sentimento, uma expressão hu-mana que resulta em proteção, cuidado,respeito,amizade e afeição entre aspessoas.Somente em um ambiente afetivo,os alunos serão capazes de produzirem co-nhecimento ,construírem sua auto-estima eparticipar efetivamente das atividades propos-tas e contribuírem para o atendimento dosobjetivos educativos. No caso contrário, o alu-no rejeita o professor e a disciplina por eleministrada, perde o interesse em freqüentar aescola, contribuindo para seu fracasso escolar.

É comum rótulos ao professor quan-to a qualidade de bom ou má professor apartir das relações interpessoais. As compe-tências de um bom professor passa pelas ca-racterísticas técnico-profissionais, demons-tração de domínio do conteúdo e das técni-cas didáticas para o ensino (Mello, 1982). Serbom professor ainda está relacionado comser amigo, compreender e gostar dos alu-nos. Codo &Gazzotti(1999) contribui com essacategoria estabelecendo algumas premissasimportante , que todo trabalho envolve al-gum investimento afetivo, toda afetividadeestabelece compreensão um com osoutros.Assim o que há de diferente no tra-balho da docência está no fato de ser a rela-ção afetiva um catalisador para o sucesso daatividade do professor.

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200962 ]As narrações dos alunos/professores

deste estudo, evidenciaram a importância dascategoria amizade e carinho como um requi-sito básico no sucesso da sua qualificação Astrocas afetivas , para esses docentes tornaramcondição necessária para o domínio do con-teúdo e das ferramentas didático-metodológicas para sua transmissão.

Os alunos/professores revelam o quan-to incorporaram da metodologia do estudoutilizado pelos professores do curso NormalSuperior para suas práticas pedagógicas:

“ Eu nunca tinha feito um projeto naminha vida... foi muito útil as revistasque a senhora trouxe nas aulas pois ser-viu para eu construir o meu projeto deleitura. No fim esse projeto envolveu to-dos da escola até os pais. Os alunos fize-ram passeios na beira do Rio e depoisrelataram sobre o que viram no passeio.Foi uma forma diferente de incentivar aleitura e a escrita.” ( Emilio)

“Uma coisa que eu aprendi nas suas aulasfoi fazer relatório e registrar tudo quefaço na s minhas aulas. Inclusive dos re-gistros de uma semana de atividades comcontos eu já fiz um artigo.” (Norma) “Essa forma da senhora encaminhar asatividades na sala de aula, promovendoleituras antecipadas , ajuda agente se or-ganizar, planejar e com isso a aula rendemais.” (Francisco)

Assim, as narrações apontam para aimportância do contato desses alunos/pro-fessores com diferentes formas de trabalharas atividades articulado a procedimentosmetodológicos das diferentes áreas de co-nhecimento, uma vez que esses alunos sem-pre foram subsidiados por diferentesmetodologias como forma de aprendizageme conhecimento.Experimentaram práticas deentrevistas, relatórios, coleta documentos,

leitura de imagens, elaboração de projetos,artigos, resenhas,dentre outros procedimen-tos científicos. Os termos utilizados por elas,marcam o impacto destas atividades nas suasvidas e condutas pedagógicas.

Quanto a influencia do curso Nor-mal Superior na vida prática desses profes-sores ou possibilidades de mudanças naspráticas pedagógicas em seus vários aspec-tos foram destacados.Assim falam da mo-dalidade de oferta do curso, a convivênciaafetiva e prazerosa, o contato com diferen-tes metodologia teórica-prática – o estudoda sala que favoreceu repensar na maneirade ser professor e uma reflexão sobre aprática , e a dimensão na produção dos sa-beres profissionais. Algumas falas sãoesclarecedoras:

“Fui na Escola Reis Veloso em um proje-to do professor e foi uma tarde muitoproveitosa.Envolveu alunos daquela es-cola e eu pude ver como aquela maneirade trabalhar incentiva os alunos a saber epreservar o meio ambiemte.”(Jacira )

“O projeto de leitura que participei foimuito bom. As crianças ficavam radian-tes, emocionadas. Ali aprendi também ame organizar pois a cada mês tínhamosque prestar relatórios para o programa.Com isso agente aprende a ter o hábitodo registro, e de fazer relatórios.Pena quesó participei um ano.” (Luciana)

“Participar do um projeto de leitura foigratificante pois eu vi que podia fazerisso na minha sala de aula. E ao mesmotempo que eu preparava para a execuçãodas atividades do projeto eu ia crescendocomo pessoa e profissional e enriquecen-do o processo ensino-aprendizagem nasérie que trabalho”. (João)

“Sempre falo para os meus colegas da mi-nha escola que esse curso está sendo mui-to bom para mim, cresci profissionalmen-

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63ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [te e hoje já sou concursada na prefeitura oque eu mais desejava na vida.” (Miriam)

Mediante tais narrações há evidenci-as de como os professores se percebem pro-fessores, retratam o seu desejo e sua busca,acreditaram e venceram na vida profissionale vislumbram valorização e credibilidade nassuas relações com a escola.

Já ouvimos nos quatro cantos quepara ensinar o importante é saber o con-teúdo. Professor que não sabe ensinar éporque não domina o conteúdo.E saber con-teúdo garante que a prática do professorseja eficaz? Mas é preciso compreender,quais elementos seriam necessários para umcurso de formação de professor, nos mol-des do curso Normal Superior superasseessa fala? Estamos em uma luta de campomesmo ou entre campos?Qual a concepçãoEpistemológica pode nos afirmar para en-tender essa luta?

Ao falar em luta de campos recorre-mos em Bourdieu (983) para afirmar que ocampo científico é um sistema de relaçõespermeado por uma luta concorrêncial:

O que está em jogo especificamente nes-sa luta é o monopólio da autoridade ci-entífica definida, de maneira inseparável,como capacidade técnica e poder social;ou, se quisermos, o monopólio da com-petência cientifica. compreendida en-quanto capacidade de falar e agir legiti-mamente (isto é, de maneira autorizadae com autoridade), que é socialmenteoutorgada a um agente determinado(p.122-123)

A partir da definição de campo, de-senvolvida por Bourdieu alguns outros con-ceitos julgamos adequados à nossa, poisesse filosofo pontua que num dado campocientifico pode haver jogo de interesses evalores e com isso pode haver uma concor-

rências no próprio campo. O fato de saberconteúdo confere ao professor credibi-lidade, autoridade e competência. Nessesentido, falar em formação de professor,mesmo na modalidade do Norma Superiorsó ganha legitimidade quando situada emum campo de relações de poder, portanto,com uma dimensão política. A partir daípodemos dizer então que, para alguns cur-sos, existe um discurso e prática legitima-dos de valorizar o conhecimento advindodo campo específico,mesmo que esse cursoseja de curta duração, a distancia ou pura-mente presencial. O curso Normal Superi-or constituiu na memória desses professo-res um espaço privilegiado para conheci-mentos teóricos e práticos e vencer a lutano campo profissional.

Acreditamos que a influencia do cur-so Normal Superior está marcado em umcampo de luta que fica marcado nos regis-tros das narrações onde declaram cresci-mento pessoal e profissional ao qual se re-ferem às aprovações em concurso público.Por outro lado, isso ficou patente quandodeclaram na escrita que os saberes produzi-dos no curso possibilitou a eles professo-res incorporarem em suas práticas peda-gógicas, outras praticas confirmando assim,os aspectos positivos do curso.

ENFIM, O QUE CONSEGUIMOSTRILHAR

As análises aqui realizadas não tive-ram a pretensão de definir verdades, masfoi uma reflexão até certo ponto, para darconta de muitas falas ingênuas de que o cursoNormal Superior não formava professores.O objetivo deste trabalho foi desvelar parteda história da Curso Normal Superior, pormeio de memórias como forma de com-preender o que foi os dez anos de forma-ção docente em um curso de modalidade

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200964 ]diferenciada.

Ao longo do texto procuramosapontar, uma outra possibilidade de leiturasobre “os 10 anos”. Se por um lado houvenarrações que apontavam a construção daidentidade do professor, sua valorizaçãoprofissional, por outro, não tivemos opor-tunidade de registrar os contrapontos daformação docente quanto aos registros dasnarrações que poderiam ser realizadas pe-las Instituições parceiras , ou seja as Prefei-turas Municipais.

A leitura de algumas memórias foium exercício de aprendizagem no sentidode compreender como os professores seposicionam sobre sua formação profissio-nal. As reflexões nos proporcionou aindaperceber o que os professores trazem namemória, suas concepções mas trazem ou-tras características que não foram analisa-das aqui porém suscitou interesse de pes-quisas em outros campos epistemológicos.

Agora só nos resta entregar esse tex-to as críticas roedoras dos ratos.

NOTAS

2 CERTEAU, Michel.A invenção do cotidiano-1artes de fazer.Petripolis:Vozes, 2002.3 Edgar Morin, (pseudônimo Edgar Nahoum) sociologo e filósofo , um dos principaispensadores sobre a complexidade. Autor de mais de trinta livros, entre eles: O método (6volumes), Introdução ao pensamento complexo, Ciência com consciência e Os sete saberesnecessários para a educação do futuro. Indicamos a leitura do último.4 Maioes informações consultar TANURI, L. M. Contribuição para o estudo da EscolaNormal no Brasil. Pesquisa e planejamento. São Paulo, v.13, dez.1970, p. 7-98.; VILLELA,H. O. S. . A primeira Escola Normal do Brasil. In: Clarice Nunes. (Org.). O passado semprepresente. São Paulo: Cortez, 1992, v. , p. 17-42

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A HIPERMÍDIA E A REDESEMÂNTICA NA APRENDIZAGEM

Otília Aparecida Tupan SCHOENHERR1

1 Profa. Msc. da disciplina Informática na educação do Curso Normal Superior da Universidade Estadual deMato Grosso do Sul.

RESUMOO objetivo desta pesquisa foi investigar a eficácia do ambiente hipermídia na apren-

dizagem. Partiu-se do pressuposto de que a tecnologia, em ambiente hipermídia, propor-ciona possibilidades de aprendizagem, pois cria uma rede semântica similar à do cérebrohumano. Esta é uma pesquisa qualitativa, a qual fez uso de revisão bibliográfica. Os resul-tados conseguidos neste estudo sugerem que a hipermídia, baseada na rede semântica,fornece uma tecnologia computadorizada que facilita a integração da nova informação como conhecimento existente na memória humana, necessários para o acomodamento dainformação no cérebro e sua retenção.

Palavras-Chave: Integração - Ambiente hipermídia - Aprendizagem.

ABSTRACTThe purpose of this research was to investigate the effectiveness of the hypermedia

environment in the learning process. It was hypothesized that technology, in hypermediaenvironment, provides possibilities of learning, since it creates a semantic web similar to thehuman being's brain. This is a qualitative research, in which a bibliographic review was used.The results of this research suggest that the hypermedia, based on the semantic web,provides a computed technology that facilitates the integration between the new informationand the knowledge that already exists in the human brain, which is essential to theaccommodation of the information in the brain and its retention.

Key-words: integration - hypermedia environment - learning

INTRODUÇÃO

As Orientações Curriculares (OCs)de 2006 é um documento recente com dire-trizes que visam: "... discutir o problema daexclusão no ensino em face de valores'globalizantes' [...] introduzir as teorias so-bre a linguagem e as novas tecnologias

(letramentos, multiletramentos, multimo-dalidade, hipertexto)..." (OCs, p. 87) Amultimodalidade e o hipertexto são recur-sos usados na linguagem mediada pelocomputador. Uma página multimodal con-tém múltiplos meios de comunicação: visu-al, escrito e sonoro, possibilitando ao leitorescolher assistir a um vídeo inserido na pá-

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67ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [gina ou ouvir um texto sonoro. O fatordiferenciador do ambiente hipermídia, con-siderado ideal para o ensino, é a interação.

Numa visão panorâmica, a qual con-templa tanto o homem primitivo quanto ocontemporâneo, ambos movidos pelo de-safio da sobrevivência é possível, depreenderque, reservadas suas peculiaridades, ambosfazem uso de instrumentos para interagircom o mundo e atingir seus objetivos. Tan-to o homem da caverna quanto o homemda atualidade são mediados por ferramen-tas adaptadas ou criadas para seus objeti-vos que, à medida que deixam de ser úteis,caem no desuso. Segundo Smith (1974), ins-trumentos são criados pelo homem paraeste tornar-se mais eficiente na resoluçãodos problemas cotidianos.

Neste sentido, e a exemplo da histó-ria do ser humano, a inserção do instru-mento em uma situação de ensino é umaproposição, na qual a relação entre o indiví-duo e o objeto de sua ação é mediada peloinstrumento.

E, de acordo com Tajra (1998), "ocomputador funciona como um grandeaglutinador das várias tecnologias existen-tes" ( p.27) . Ela destaca ainda que "o impor-tante, ao se utilizar dos recursos tecnológicosà disposição das práticas pedagógicas, équestionar o objetivo que se quer atingir,avaliando sempre as virtudes e limitaçõesde tais recursos" ( p. 26) .

A tecnologia, por sua vez, pode ensi-nar o aluno a aprender. Papeur (1994) ob-serva que o instrucionismo dá o peixe àscrianças e o construcionismo prefere ensi-nar a pescar e para isso instrumentaliza oaprendiz, é como se ensinássemos a pescarcom boas varas e águas férteis.

Crê-se que o professor, o aluno e ocomputador formam um tripé facilitador doprocesso de aquisição do conhecimento.

HIPERMÍDIA

O ambiente hipermídia não envolvesomente a informação textual, mas, tam-bém, a informação em forma de gráfico, some vídeo. Estes elementos de informaçãomultimídia são interconectados de tal for-ma, que um toque na tela trará material re-levante para o usuário. Não há uma seqüên-cia linear particular imposta.

O processo de explorar é interativo,não linear, controlado pelo usuário, efreqüentemente determinado pela curiosi-dade e interesse do mesmo. Esta é a novaforma de apresentar e organizar a informa-ção através da nova tecnologia. Morgado(1998) afirma ainda que, na hipermídia, ousuário experimenta um certo grau de au-tonomia enquanto navega no hiperespaço,fator que contribui, sem dúvida, para des-pertar estratégias individuais de aprendiza-gem. Pode-se inferir que só o fato de se na-vegar por uma rede de conhecimentos in-terligados, com possibilidades de movimen-tos através desse espaço de informaçãoconceptual, possibilita-se, sem dúvida, oaprendizado. Pode ocorrer, também, demodo acidental, a aprendizagem por des-coberta e experiência pessoal.

Apesar das controvérsias é certo, naopinião da autora, afirmar que há algumconsenso em torno da idéia de que ocorrequalquer tipo de aprendizagem na explora-ção/navegação de um hiperdocumento.

Por ser uma ferramenta para apren-dizagem e ensino, a hipermídia apresentatanto vantagens como limitações. Entre asvantagens, pode-se citar a não-linearidade,a associatividade, a flexibilidade e a eficiên-cia, conforme Liu(1994).

Devido à não-linearidade, diferen-temente do material impresso, não há se-qüência específica, nem início e nem fimóbvios. O aprendiz pode escolher caminhos

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200968 ]diferentes para trilhar o assunto de acordocom seu próprio interesse e objetivo, po-dendo acomodar melhor suas necessidadesindividuais e também estilos diferentes deaprendizagem, além de ser levado de modomais adequado à aprendizagem por desco-berta.

A associatividade na hipermídia re-flete algumas das funções da memória hu-mana, tanto que as informações relaciona-das semanticamente e logicamente podemser "linkadas", formando uma rede. Ahipermídia não é somente uma ferramentaprópria e capaz de representar a base deconhecimento de um especialista em umassunto, mas também uma ferramenta quecapacita os aprendizes a construir a base deseus próprios conhecimentos através deconexões entre as idéias.

Em decorrência da flexibilidade, oaprendiz pode seguir o assunto semantica-mente, mas não necessariamente fisicamen-te, de uma página para a próxima. Não ha-vendo uma ordem imposta, pode-se pularlivremente de uma idéia para outra sem apreocupação de se seguir uma determinadaseqüência, assim como pode-se ser guiadopelo interesse. Devido a sua característicamodular, é capaz de revelar e esconder acomplexidade de um assunto mais facilmen-te do que um método linear. Neste ambien-te, o conteúdo pode ser apresentado emdiferentes níveis de complexidade. A cadanível, o sistema pode informar ao aprendizo próximo nível, mas o usuário não precisaativá-lo, se não estiver interessado. Portan-to, a complexidade do tema pode ser ocul-tada até que o usuário esteja preparado paraela. Esta característica pode ajudar o apren-diz a assimilar e acomodar idéias. O designerpode facilmente acomodar as informaçõesem nós específicos sem afetar o sistema, vis-to que a informação, em um sistemahipermídia, é naturalmente modular.

A eficiência deste ambiente é visível,visto o usuário poder ativar um link de umnó de texto, de um nó de gráfico, ou umacombinação. É mais fácil e mais rápido doque folhear uma enciclopédia ou um vídeo.

Da mesma forma, fica evidente, naspalavras de Liu (1994), que há também des-vantagens. A desorientação, a necessidadede conhecimento específico e controle doaprendiz são características tidas como en-traves neste processo.

O usuário pode facilmente ficar de-sorientado no hiperespaço, diferentementedo que acontece quando se utiliza um livro,em que se sabe quantas páginas se leu; pode-se perder facilmente o senso de localizaçãonum ambiente não linear.

O uso da hipermídia requer um tipoespecífico de alfabetização. Usuáriosiniciantes sentem-se pouco confortáveis comtal sistema em como resultado o ambientetorna-se menos benéfico.

O controle do aprendiz é uma carac-terística que parece ser uma bênção e umamaldição. Como uma estratégia instruci-onal, o controle do aprendiz sugere que ainstrução fica mais motivada e significativae o aprendiz controla suas decisões instru-cionais. Devido à sua natureza altamenteinterativa, o ambiente hipermídia depositagrande quantidade de responsabilidade so-bre o aprendiz e pesquisas têm mostradoque nem todos os aprendizes têm sido be-neficiados por este artifício.

As escolas e a sociedade precisamproporcionar experiências significativas paraos aprendizes. Desde que a aprendizagemocorre quando o indivíduo organiza, reorga-niza, constrói e reconstrói sua própria expe-riência, o papel da escola é proporcionar umambiente adequado onde aprendizes tenhamoportunidades de desenvolver completa-mente seu potencial. O papel do professor é,portanto, oferecer direcionamento e orien-

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69ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [tação apropriados para o aprendiz exercitarseu julgamento e decisão.

Um ambiente de aprendizagemhipermídia, baseado na rede semântica,com ênfase na inter-relação entre idéias eno modelo mental adapta-se completa-mente à não linearidade, associatividade,flexibilidade e eficiência, características datecnologia hipermídia e parece ser capazde fornecer um modelo mental completoe mais coerente.

A teoria de níveis de processamentode Craik e Lockhart (apud LIU, 1994) classi-fica a memória em três níveis de armazena-gem: memória sensorial, memória de curtaduração (MCD) e memória de longa dura-ção (MLD). Todas as informações que rece-bemos através da visão, audição, ou outrossentidos vão diretamente para a memóriasensorial. A informação permanece na for-ma que foi recebida apenas por um segun-do ou dois, e então é perdida. A memóriade curta duração, também chamada dememória de trabalho por alguns, mantém ainformação por um tempo maior, não ne-cessariamente em sua forma original. En-tretanto, a informação da memória de cur-ta duração não é lembrada permanente-mente, assim como a quantidade de infor-mação que ela pode armazenar é de aproxi-madamente sete itens. A memória de longaduração é a memória de nível mais elevado.Sua capacidade é ilimitada; teoricamente,nada do que foi armazenado será perdido.Esta teoria preocupa-se com as diferençasentre a memória de curta duração e a me-mória de longa duração. A informação re-cebida é processada em níveis diferentes. Ainformação na MCD é armazenada usual-mente em formato visual e fonético; a in-formação na MLD, a qual precisa ser pro-cessada em um nível superior para ser retida,é em grande parte semântica. Quanto maisfamiliar e significativo o estímulo, mais pro-

fundo será o nível de processamento, e ainformação ficará retida por mais tempo emelhor acomodada. Os responsáveis poresta teoria dizem que a retenção é uma ques-tão de profundidade e não de velocidade;portanto, para que haja retenção, a infor-mação não pode ser somente repetida, mas,o que é mais importante, precisa ser orga-nizada de forma significativa, isto é, proces-sada em um nível mais profundo. Devido asua capacidade de representar o processomental dentro da memória humana, a redesemântica é um dos formatos de uso maispopular para ilustrar como a informação éassimilada pela mente humana. A rede se-mântica é uma representação conceitual doconhecimento na memória humana. Ela écaracterizada por uma estrutura de rede denós e links e é freqüentemente demonstra-da através de um gráfico, no qual conceitossão representados por nós e a relação entreos conceitos é representada por links.(Conklin, apud Liu, 1994)

A teoria das redes semânticas afir-ma que: a) a memória humana é associativapor natureza e idéias e informações na me-mória são inter-relacionadas umas com asoutras; b) esta inter-relação pode ser des-crita através de nós e links etiquetados queconectam nós e podem ser representadospor uma estrutura em forma de rede, que écapaz de descrever e representar a "bagun-ça" da associação na memória humana.

"Os conceitos não ficam guardados namente da criança como ervilhas em umsaco, sem qualquer vínculo que os uma.Se assim fosse, nenhuma operação inte-lectual que exige coordenação de pensa-mentos seria possível, assim como ne-nhuma concepção geral do mundo."(Vygotsky, 1996, p. 95).

A hipermídia, usando a mesma ter-minologia de nós e links, é uma forma

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200970 ]computadorizada de representar a rede se-mântica na memória humana. Como namemória humana, conceitos e idéias emhipermídia não existem isolados, mas, sim,em associação com outros conceitos e idéi-as. Esta estrutura de rede de informaçãocomputadorizada é a melhor forma de serepresentar a complexidade da mente hu-mana. Através do sistema hipermídia, estacomplexidade pode ser revelada ou escon-dida, visto que pode haver muitas camadasde informações inter-relacionadas; porém,de acordo com o comando do aprendiz, so-mente o conceito mais básico de um assun-to pode ser apresentado primeiro.

Tendo como fundamento as teoriasda estrutura da memória e dos níveis deprocessamento, sabe-se que a informaçãoarmazenada na memória de curta duraçãoprovavelmente será perdida, enquanto quea informação na memória de longa dura-ção, normalmente processada em um nívelmais profundo, será retida. A teoria da redesemântica nos diz que a informação na me-mória existe em uma rede interconectada.Para processar essa informação em um ní-vel mais profundo, necessita-sefreqüentemente do estabelecimento de co-nexões entre o novo pedaço de informaçãoe a rede existente de informação. Ao se ela-borar um conceito, estabelecem-se amar-ras semânticas entre este novo conceito e osjá existentes promovendo-se a sua compre-ensão e retenção. Quanto mais amarras se-mânticas um conceito tem com os já exis-tentes, mais estabilizado ficará. Se este novoconceito tem apenas uma ou duas amarrascom os outros conceitos, ele provavelmen-te virará para um lado e outro ao redor de sie ficará desconectado; mas, se ele tiver mui-tas amarras semânticas com os outros con-ceitos, seus movimentos dentro da rede se-mântica serão confinados e conseqüente-mente estabilizados.

CONCLUSÃO

Sabe-se que a aprendizagem se dáatravés da abstração; porém, previamente,este processo precisa passar por etapas con-cretas, reflexivas. O instrumento usado deforma adequada e sábia pelo mestre podeser um amigo sem par.

A tecnologia colocada à disposiçãodo professor e do aluno objetiva o desen-volvimento das potencialidades individuaisdo aprendiz, processo que pode conduzir àautonomia na aquisição do conhecimento.O software e a Internet são fontes de saberque distribuem a informação, oportuni-zando o ensino/aprendizagem a todos, atéaos menos favorecidos geograficamente,particularidade diferenciadora de grandevalor deste novo cenário tecnológico.

O computador, no ambiente esco-lar, desempenha o papel de mediador entreo aprendiz e o conteúdo; daí surge a neces-sidade urgente de se preparar os professo-res de escolas públicas para esse novo tem-po de inovações tecnológicas na educação,possibilitando, assim, uma relação mais es-treita com a atual revolução tecnológica, ca-racterizada pela ampliação da capacidadeintelectual humana na produção, visto queas mudanças tecnológicas respondem àsexigências de qualidade em face do novocontexto econômico. Igualmente importanteé a passagem desta prática para o aluno.Saviani (1994) afirma que deve haver umaestreita ligação entre a educação e o traba-lho, considerando-se que a educaçãopotencializa o trabalho.

Neste estudo, considerou-se o po-tencial da hipermídia para a estruturaçãode ambientes de aprendizagem. Constata-se que este ambiente potencializa a "alfabe-tização tecnológica" como necessária parase navegar e transformar a informação em

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71ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [conhecimento, e conclui-se que o ambientehipermídia é a grande estrela" disponibilizadapela high technology a qual viabiliza ainteração on line, desafio deste ambiente,assim como a flexibilidade que possibilitaao usuário adequar-se ao seu nível de de-senvolvimento, ao navegar neste ambiente

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A hipermídia, baseada na rede semântica,fornece uma tecnologia computadorizadaque facilita esta integração da nova infor-mação com a estrutura de conhecimentoexistente na memória humana, necessáriospara o acomodamento da informação nocérebro e sua retenção.

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A PRÁXIS DOCENTE NO CURSONORMAL SUPERIOR:

OS DESAFIOS E OS APRENDIZADOSNUMA PERSPECTIVA FREIREANA

Paulo Sérgio Gomes SOARES1UEMS/UFSCar/FUNDECT

1 [email protected] Graduado em Filosofia (UNESP: 1997), mestre em Epistemologia, Lógica e Filosofia daCiência (UNESP: 2004), doutorando no Programa de Pós-Graduação em Educação da UFSCar (2008/2011).Atualmente, é professor de Filosofia na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.

RESUMORESUMORESUMORESUMORESUMO Diante da realidade educacional brasileira, ser educador não supõe apenas ensinar,

mas refletir acerca das condições do processo educativo, acerca de temáticas sociais, cultu-rais e ambientais e acerca da disposição física e psicológica no enfrentamento de situaçõesexistenciais adversas, ou seja, exige reflexão sobre os problemas de ensino e aprendizagem,sobre a relação escola e sociedade e sobre a realização ético-profissional do educador. Oseducadores e educadoras que cursam o Normal Superior parecem conscientes destes pro-blemas, já que possuem a experiência docente, embora lhes falte uma ferramenta essencialpara tratá-los adequadamente: a teoria. Refletir teoricamente sobre a prática exige o traba-lho filosófico de abstração da realidade tal como ela é e tal como ela poderia ser, justificandoa existência da disciplina “Fundamentos filosóficos da Educação” na grade curricular docurso. O objetivo deste artigo é mostrar como esta disciplina contribuiu para a formaçãodestes educadores e educadoras, no sentido de auxiliar na reflexão teórica sobre a prática,expondo os desafios e aprendizados encontrados durante as 102h de convivência em meioa atividades pedagógicas e discussões político-pedagógicas dentro de uma perspectivafreireana.

Palavras-Chave: Curso Normal Superior, Fundamentos filosóficos da Educa-ção, Paulo Freire.

ABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACTIn front of the Brazilian educational reality, being a teacher does not only mean teach

but also reflects about the conditions of the educational process, concerning to social,cultural and environmental themes as well as physical and psychological constitution whilefacing unfavourable existential situations, that is, requires reflection about teaching andlearning problems in relation to school and society about ethical-professional fulfilmentfrom the teacher. The persons who attend teacher-training course seem to be aware ofthese problems since they have experience in teaching, although there is a lack of an essentialtool to treat them appropriately: the theory. Reflecting theoretically about the practice

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73ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [demands a philosophical work from the concentration of the reality as it is and how it couldbe, justifying the existence of the subject “ Philosophical Fundaments from Education” inthe school grade of this course. This article aims to show how this subject contributes for theformation of these teachers, helping them on the theoretical reflection upon the practice,exposing the learning and the challenges found during the 102 hours of closeness throughteaching activities and political-teaching discussions from Freire’s perspective.

Key-words: Teacher-training Course, Philosophical Fundaments from Education,Paulo Freire.

O APRENDIZADO:O APRENDIZADO:O APRENDIZADO:O APRENDIZADO:O APRENDIZADO:DESCREVER OS PROBLEMASDESCREVER OS PROBLEMASDESCREVER OS PROBLEMASDESCREVER OS PROBLEMASDESCREVER OS PROBLEMAS

E TROCAR EXPERIÊNCIASE TROCAR EXPERIÊNCIASE TROCAR EXPERIÊNCIASE TROCAR EXPERIÊNCIASE TROCAR EXPERIÊNCIAS Após ter trabalhado, em diferentes

cidades do Estado de Mato Grosso do Sul,com várias classes de primeiro ano do Cur-so Normal Superior, sendo filósofo e com adifícil missão de ensinar os “Fundamentosfilosóficos da Educação”2, certamente, hámuito que se contar acerca desta experiên-cia, do quanto se aprende na convivênciacom estes educadores e educadoras. Setransformarmos tal experiência em metá-fora, a expressão para o sentimento é a se-guinte: como uma fruta, literalmente, ama-durece-se no pé.

A maioria dos alunos e alunas docurso Normal Superior trazia consigo mui-tas experiências de sala de aula, alguns atu-ando a longos anos e outros a menos tem-po, mas todos envolvidos pelas mesmasproblemáticas acerca da educação. Portan-to, não são apenas alunos e alunas de umcurso de graduação, mas pessoas que co-nhecem a prática docente. Portanto, nesteartigo, serão chamados de educadores eeducadoras.

Partindo desta consideração, umavirtude fundamental que um docente do

Curso Normal Superior tinha de cultivar erao respeito pelo conhecimento que eles dei-xavam aflorar no calor das discussões, mes-mo porque isto representava as múltiplastrocas de experiências, além da clara per-cepção de que não são “recipientes vazios”de conteúdo, nem tão pouco passivos.

Conviver, dentro de um processodialético de ensino e aprendizagem em quetanto o docente, quanto os educadores eeducadoras compartilhavam experiências,foi muito produtivo e significou um grandeaprendizado para todos, dado que o con-texto existencial, isto é, a condição do edu-cador pensando-se a si mesmo, foi vincula-da aos problemas da educação e da arte deeducar. Ao compartilharem as experiênci-as, foi possível observar o surgimento deinúmeros problemas pedagógicos,epistemológicos, metodológicos, político-sociais, éticos, etc., que permeavam (epermeiam) os processos de ensino e apren-dizagem, e, isto se tornava muito evidentenas suas falas, descrições, reflexões, quei-xas, etc., embora sem uma reflexão teóricaconsistente.

Esta ausência de teoria, num primei-ro momento, não se constituiu em obstácu-lo, apenas reforçou um pressupostofreireano, o de se aprender a construir o

2 Título da disciplina ministrada.

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200974 ]objeto gnosiológico e/ou epistemológico apartir das experiências dialógicas; era umaforma de acercar-se do objeto a ser conhe-cido, - a Educação -, nas suas várias facetas erecortes, em “comunhão”. Numa educaçãoproblematizadora e dialógica, diz Freire(1987: 68), “ninguém educa ninguém, nin-guém educa a si mesmo, os homens se edu-cam entre si, mediatizados pelo mundo”.

Depreende-se deste postulado, doisfatores para o aprendizado: o epistemológicoou gnosiológico e o político. A relação entresujeito e objeto que perfaz a teoria do conhe-cimento defendida por Paulo Freire é extre-mamente crítica, pois conduz o educando atéo objeto do conhecimento a partir daproblematização e o coloca em confrontodireto com ele, numa situação de desafio. Essaé verdadeiramente a condição do educador,a de alguém que está defronte para um gran-de desafio, do qual quanto mais se aproximae procura compreender, dentro de um pro-cesso dialético entre teoria e prática, maisobtém respostas e se fortalece, mais se liber-ta na luta cotidiana de transformar a realida-de educacional. A sua inserção crítica na rea-lidade reforça o compromisso com a educa-ção, e, “assim é que se dá o reconhecimentoque engaja” (Idem: 70).

O pressuposto epistemológico é tam-bém condição para um processo de alfabeti-zação política. Ao discutir os problemas edu-cacionais a partir de suas experiências pesso-ais, os educadores e educadoras criaram umambiente em que o conflito de opiniões agu-çava a crítica. O ambiente conflituoso criadopelo universo da linguagem era politicamen-te bem vindo. “Assim, nos será possível, emdiferentes momentos, e não necessariamen-te ao mesmo nível, começar a perceber a realcompreensão do contexto lingüística: ‘o pro-cesso da alfabetização política’, em que o subs-tantivo alfabetização aparece metaforicamen-te” (FREIRE, 2002: 103).

Desta perspectiva, o que pareciammeras opiniões se mostrou frutífero comométodo epistemológico para revelar a inti-midade do pensamento individual em dis-cursos extremamente críticos e inquietos emrelação ao modelo educacional vigente, aodescaso do poder público com a qualidadeda educação, a insuficiência de recursos téc-nico-pedagógicos, as perdas salariais e a ins-tabilidade financeira; a escola e a adminis-tração escolar, o ambiente de trabalhoconflituoso, o autoritarismo, o desgaste fí-sico e psicológico, os problemas de saúde, ainsatisfação; os alunos e a comunidade, osvalores, a diversidade social e cultural, ospreconceitos, a violência, o direito de apren-der, os projetos, a cidadania, etc.; e, o pro-fessor a olhar-se para si mesmo como serhumano e como profissional com uma res-ponsabilidade ética imensa e um compro-misso histórico-social de transformação darealidade (à medida que educa para algumfim). Este processo catártico e, metaforica-mente, de alfabetização política, permeouàs 102 horas de cada curso ministrado, mos-trando a existência de uma curiosidade in-quieta e questionadora, inclinada a desvelara realidade e produzir ação.

O processo de politização precisavaser pensado no interior dos espaços escola-res, da relação estreita entre escola e socie-dade e do próprio educador, como ser sociale, portanto, político, que veicula ideologia.

Não há ambiente escolar neutro epor diferentes motivos: a) se educa formal-mente para algum fim; b) a política interfe-re no cotidiano escolar; c) a escola dissemi-na ideologias; d) as desigualdades sociaisestão estampadas na figura dos educandosde escolas periféricas, etc. Assim, ficou evi-dente que era possível haver educação neu-tra, como não há educador neutro. O pro-fissional neutro que apenas ensina a leituradas palavras também veicula uma ideolo-

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75ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [gia, a ideologia dominante, justamente pornão se comprometer com a transformaçãode estruturas sociais injustas.

O professor Paolo Nosella, ao co-mentar o engajamento político dos educa-dores nos primeiros anos pós-ditadura mi-litar (1964-1985), ressalta uma sensível dife-rença entre o professor que assumia a neu-tralidade e o educador compromissado comas mudanças na estrutura social. O autorafirma o seguinte:

o professor que não assume plenamen-te a função de educador e se exime desua responsabilidade de ensinar a leitu-ra do mundo, para restringir-se à leituradas palavras – utilizando expressõesfreireanas -, era considerado um técni-co asséptico, reducionista, que reeditavana prática pedagógica a velha tese daneutralidade científica (NOSELLA,2005, p. 226-227). O educador profissional possui um

compromisso histórico com a transforma-ção da realidade e a educação é a sua ferra-menta, embora isso seja pouco relevantese, antes, não tenha um compromisso éti-co consigo mesmo e admita para si mesmoque educação e política não se misturam.Admitir tal fato indica um falso compro-metimento. Tal como ressalta Freire (2008:19-20):

Pois bem, se nos interessa analisar ocompromisso do profissional com a so-ciedade, teremos que reconhecer que ele,antes de ser profissional, é homem. Deveser comprometido por si mesmo. Comohomem que não pode estar fora de umcontexto histórico-social em cujas inter-relações constrói seu eu, é um ser au-tenticamente comprometido, falsamen-te ‘comprometido’ ou impedido de secomprometer verdadeiramente.

E continua, dirigindo-se aos educa-dores:

Não devo julgar-me, como profissional,‘habitante’ de um mundo estranho; mun-do de técnicos e especialistas salvadoresdos demais, donos da verdade, proprie-tários do saber, que devem ser doados aos‘ignorantes e incapazes’. Habitantes deum gueto, de onde saio messianicamentepara salvar os ‘perdidos’, que estão fora.Se procedo assim, não me comprometoverdadeiramente como profissional nemcomo homem. Simplesmente me alie-no. (Idem: 20-21). Evidentemente, o profissional

engajado é comprometido e seu trabalhocontra-ideológico consiste em desalienar.Desalienar tem um sentido político de tor-nar inquieto e promover a subversão, desubstituir o ajustamento pela integração(FREIRE, 2005). Dessa forma, toda educa-ção deve consistir na formação gradual daconsciência de classe, para que as classespopulares ganhem voz e capacidade de par-ticipar, “integradamente”, com a elite, dodestino da sociedade. É preciso romper coma “cultura do silêncio”, fomentando um pro-cesso gradual de desalienação e formaçãocultural a fim de tirar do outro – do domi-nante – a responsabilidade exclusiva de re-solver os problemas sociais e aproximar amassa das decisões políticas que modificamo curso da história. Afinal, o pressuposto dademocracia é a participação consciente damassa na vida pública.

De certa forma, este trabalho dedesalienação estava em curso nas aulas de“Fundamentos filosóficos da Educação”,dado que os educadores e educadoras aoexpressarem suas opiniões rompiam com a“cultura do silêncio” e juntos construíam oseu objeto de forma mais contextualizada.O fruto das discussões sobre os problemas

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200976 ]da educação, certamente, constituíram fo-cos de percepção acerca da realidade quepoderiam, posteriormente, auxiliar numafilosofia da práxis.

A filosofia da práxis é expressa notrabalho do educador como mediador polí-tico entre a escola e a vida comunitária deforma orgânica. Em texto publicado origi-nalmente em 1961, na Revista Brasileira deEstudos Pedagógicos, e republicado 2005,Freire diz o seguinte: “O que a nossa escolatem de fazer é identificar-se com as diversascaracterísticas regionais e locais do Brasilatual [...]” (2005: 104) a fim de produzir edu-cação política contextualizada para formara base do conhecimento social do indivíduo,aquilo que, normalmente, pode-se definircomo cidadania.

Para concluir este tópico, afirmamosque o aprendizado foi a troca de experiên-cias e a descrição dos problemas educacio-nais enfatizados pelos educadores e educa-doras que, vindos de diversas cidades doEstado para as aulas nas diferentes unida-des da UEMS, trouxeram suas significativascontribuições para construir nosso objetode estudo a partir da prática.

Vimos que as opiniões, mesmo queconflituosas, configuravam-se como leitu-ras empíricas que apenas precisavam dorefinamento teórico; algo muito próximo dosaber comum, seguindo os parâmetrosfreireanos, que representava e lia o mundosituando sua condição existencial no discur-so e que, agora, estava pronto para ser re-presentado pela escrita historicamentecontextualizada. Enfim, eram pessoas queconviviam diariamente com a realidade edu-cacional e tinham diante dos olhos o ambi-ente perfeito para a investigação científica,embora lhes faltasse algumas ferramentasessenciais para se iniciar uma pesquisa. Es-tava na hora de alçar vôo do senso comum,- “do senso comum à consciência filosófica”,

como diria o professor Saviani (2004).

OS DESAFIOS: ABSTRAIROS DESAFIOS: ABSTRAIROS DESAFIOS: ABSTRAIROS DESAFIOS: ABSTRAIROS DESAFIOS: ABSTRAIRA REALIDA REALIDA REALIDA REALIDA REALIDADE E PENSARADE E PENSARADE E PENSARADE E PENSARADE E PENSAR

TEORICAMENTETEORICAMENTETEORICAMENTETEORICAMENTETEORICAMENTE A reflexão tecida neste segundo tó-

pico tem como objetivo aproximar estasduas diferentes esferas do conhecimento, aFilosofia e a Educação, mostrando como serelacionam e como se concretizou tal rela-ção, do ponto de vista metodológico, nodecorrer da disciplina “Fundamentos filo-sóficos da Educação”.

A despeito de todo aprendizadoobtido na troca de experiências, descriçãode problemas, construção do objeto einteração entre docente e educadores e edu-cadoras, o desafio estava reservado e se re-sumia a três questões filosóficas: Como de-finir o que é Filosofia? Como se processa otrabalho filosófico de abstração da realida-de? Como a Filosofia pode contribuir parao trabalho do educador?

A dimensão filosófica na educação éinquestionável. Tendo em vista que todaeducação possui uma finalidade, e à medidaque há a exigência dos pressupostos do co-nhecimento seguro para tornar-se Ciênciada Educação, a Filosofia abre os seus com-partimentos e tira de seu arcabouço teóricoos methodos, as discussões acerca dos valo-res, as abstrações e justificativas para a con-secução desta finalidade. A Filosofia forne-ce modelos explicativos.

Desta perspectiva, a formação doeducador é incompleta sem a compreensãode como as concepções epistemológicas,axiológicas, metafísicas e, também, ideoló-gicas do conhecimento foram aplicadas àprática educativa ao longo da história e comose dá a sua aplicação no contexto atual. Astendências pedagógicas que orientaram aprática educativa, ao longo da história, pos-

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77ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [suem um contexto social vinculado às idéiasque influenciaram profundamente as ações.Atualmente, as tendências metodológico-pedagógicas que orientam a prática não fo-gem a regra.

Sendo assim, todos os problemas equestionamentos, sugeridos no tópico an-terior pelos educadores e educadoras, ne-cessitavam de uma análise filosófica a partirdos métodos (epistemologia), dos valores(axiologia), das idéias (ideologia), e da con-cepção teórica de ser que se quer formar(metafísica) conforme o contexto históricoatual. Somente assim, a experiência que elesadquiriram com a prática de ensino (comtodos os problemas pedagógicos vinculadosaos de ordem estrutural, organizacional,social, etc.) poderia ser fundamentada. Adimensão da pesquisa se faz necessáriaquando a prática apresenta problemas.

Ao comentar o valor da Filosofia e oseu ponto de partida, Saviani (2004: 10) con-flui para a análise que ora apresentamos.Segundo o autor, “o ponto de partida da fi-losofia é, pois, esse algo a que damos o nomede problema. Eis, pois, o objeto da filosofia,aquilo de que trata a filosofia, aquilo queleva o homem a filosofar: são os problemasque o homem enfrenta no transcurso desua existência”.

Então, eles (os educadores e educa-doras) ao perceberem que se a realidade edu-cacional apresenta problemas, parecendoenigmas insolúveis, precisavam investigar assuas causas, fundamentando-as com expli-cações teóricas para produzir conhecimentocontextualizado. Afinal, “a ciência se inicia comproblemas. Um problema significa que háalgo errado ou não resolvido com os fatos.Seu objetivo é descobrir uma ordem invisívelque transforme os fatos de enigma em co-nhecimento” (ALVES, 2001: 43-44).

Se diz que a prática sem a teoria émero ativismo ou, ainda, que expressa ape-

nas opiniões sem fundamento que beiramo senso comum; e a recíproca, a teoria sema prática, pode dar origem a ideologias no-civas por forjar idéias que não têm vínculoscom a realidade concreta e existencial. Asideologias surgem quando as idéias são se-paradas do contexto em que foram conce-bidas (CHAUI, 1984). Então, se estes educa-dores e educadoras possuem a experiênciaprática e conhecimentos sem fundamenta-ção, o desafio era levá-los a pensar teorica-mente, perfazendo a concepção de práxiseducativa.

No entanto, com o decorrer das au-las, dois problemas interferiram nos mo-mentos de reflexão em grupo e no desen-volvimento das atividades pedagógicas: oceticismo e a resistência à teoria.

O primeiro ficava evidente nos dis-cursos compartilhados de experiências oumesmo em momentos de reflexão teóricasobre textos específicos, algo como umadescrença de que haja algum método cien-tífico que funcione na prática de ensino.Havia sempre alguém para dizer que a rea-lidade é diferente e que a teoria não auxilianos momentos difíceis, ou que teoria é teo-ria e prática é prática, como se não houves-se vínculo algum entre elas.

Diante do contexto social e educaci-onal tão cheio de problemas, o educadorparece sem esperanças de que a sua práticatransforme, ou ao menos, influencie a reali-dade. Assim, não se compromete e deixa-se conduzir pela ideologia dominante, na-turalizando a circunstância, a ponto de, sim-plesmente, admitir que é assim e não podeser de outra forma. Em resumo, assume apostura de que nada se pode fazer paratransformar um “pau que nasce torto”.

Contudo, a superação deste ceticis-mo, cuja origem é o senso comum, é gradu-al, embora ao final da disciplina tenha sidopossível perceber claramente uma evolução

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200978 ]nos discursos, mais coerentes e coesos, e naqualidade dos trabalhos e atividades apre-sentadas.

O segundo problema surgia duran-te as atividades individuais ou coletivas queenvolviam a leitura e a interpretação de tex-tos: a resistência à teoria. Vale lembrar quetal resistência ocorria por duas razões, a sa-ber, ou porque havia carência de entendi-mento devido a dificuldades com a leiturarigorosa e conceitual e, por conseguinte,problemas de interpretação, ou por não seter o hábito da leitura, principalmente, detextos científicos. Ambos os problemasmostraram e existência de dificuldades emabstrair e realidade e representá-la teorica-mente. No entanto, estes eram obstáculosque só poderiam ser superados lentamenteao longo de todo o curso de graduação, jáque estavam voltados especificamente paraa formação do pesquisador.

Enfim, filosoficamente dizendo, arealidade educacional precisa ser pensadanão somente tal como era na prática, mas apartir da teoria e o mundo precisa ser pen-sado tal como é, historicamente constituí-do, e tal como poderia ser, após ser trans-formado pelo trabalho humano. Normal-mente, isto causa estranhamento aos quese habituaram a vislumbrar somente o tra-balho empírico de intervenção.

O trabalho de pensar a realidadeeducacional e o mundo, tal como poderiamser, envolve os pressupostos filosóficos (mé-todo, valores, idéias, etc.), as condições exis-tenciais do ser e o contexto social em queestá inserido.

Com base no existencialismo cristãopresente nas idéias de Paulo Freire, só se per-mite pensar o homem como um processoinacabado, um tornar-se homem estreita-mente relacionado ao contexto sócio-histó-rico de transformação da natureza, já que aotransformar a natureza e produzir a cultura

transforma-se a si mesmo, num processodialético contínuo. Assim, o homem é umser histórico, que produz história no proces-so criativo de fazer-se homem, seja nas rela-ções sociais, nas relações de trabalho, seja noprocesso educativo. Neste último, criatividadee curiosidade distinguem a capacidade hu-mana do estado animal pela capacidade detransformar a natureza em cultura.

“Não haveria criatividade sem a cu-riosidade que nos move e que nos põe paci-entemente impacientes diante do mundoque não fizemos, acrescentando a ele algoque fizemos” (FREIRE, 1996: 35), sem deixarde pensar no que ainda podemos fazer.

O pressuposto de homem como serinacabado ou em processo constante dehumanização faz da educação a chave paraa lapidação do espírito e para uma vida so-cial qualitativamente melhor.

Compartilhamos com Jaeger (1995:04) a idéia de que

a educação participa na vida e no cresci-mento da sociedade, tanto no seu desti-no exterior como na sua estruturaçãointerna e desenvolvimento espiritual; e,uma vez que o desenvolvimento socialdepende da consciência dos valores queregem a vida humana, a história da edu-cação está essencialmente condiciona-da pela transformação dos valores váli-dos para cada sociedade. À estabilidadedas normas válidas corresponde a soli-dez dos fundamentos da educação. Dadissolução e destruição das normasadvém a debilidade, a falta de seguran-ça e até a impossibilidade absoluta dequalquer ação educativa (p.04). Para o educador, a Filosofia se defi-

ne como processo contínuo de abstraçãoda realidade e reflexão constante acerca dospressupostos que fundamentam o ato deeducar.

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79ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [ CONSIDERAÇÕESCONSIDERAÇÕESCONSIDERAÇÕESCONSIDERAÇÕESCONSIDERAÇÕES

Lecionar no Curso Normal Superi-

or foi um privilégio para poucos docentes. O curso está se extinguindo, pois nasceucom data definida para o seu fim. Aquelesque compartilharam de alguma forma como percurso de sua existência sabem que osfrutos colhidos foram e são de muito boaqualidade. Os educadores e educadoras for-mados, e os formandos das últimas turmas(2009), mostraram persistência, paciência,muita disposição para (re) significar a suaprática educativa e vontade de melhorar asua qualidade profissional.

A práxis docente no Curso NormalSuperior representou, para este que escre-veu este artigo, um incalculável aprendiza-do profissional e humano e a superação demuitos desafios. Procuramos descrever esteaprendizado no primeiro tópico, ressaltan-

do o compromisso ético e político do edu-cador com a transformação da realidade.Educar é auxiliar o outro a torna-se homem,é humanizar a condição humana,contextualizando-a historicamente e exis-tencialmente.

No Projeto Pedagógico (Curso Nor-mal Superior: 14), consta, na disciplina “Fun-damentos filosóficos da Educação”, item “ob-jetivo”, o seguinte: “Fornecer fundamenta-ção filosófica que permita ao acadêmico re-fletir sobre sua prática com base no saberconstruído historicamente”. Consideramoso objetivo atingido!

No segundo tópico, os desafios deeliminar o ceticismo, o senso comum e aresistência à teoria foram graduais e, no fun-do, representaram a condição pedagógicada qual um docente deve ser orgulhar: acontribuição na formação acadêmica de seusalunos, mesmo que estes já sejam educado-res e educadoras.

BIBLIOGRAFIA

ALVES, Rubem. Filosofia da Ciência: introdução ao jogo e suas regras. 3ª ed. São Paulo:Loyola, 2001.

CHAUI, Marilena. O que é ideologia. São Paulo: Brasiliense, 1984.

FREIRE, Paulo. Ação cultural para a liberdade e outros escritos. 10ª edição. São Paulo: Paze Terra, 2002.

____________. Pedagogia do oprimido. 17ª edição. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

____________. Educação e mudança. 31ª edição. São Paulo: Paz e Terra, 2008.

____________. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 39ª edi-ção. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

____________. Escola primária para o Brasil. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos.Brasília: v. 86, n. 212, p. 95-107, jan./abr. 2005.

JAEGER, Werner W. Paidéia: a formação do homem grego. Tradução de Artur M. Parreira.3ª edição. São Paulo: Martins Fontes, 1995.

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200980 ]PROJETO PEDAGÓGICO DO CURSO NORMAL SUPERIOR. Proposta pedagógica: cur-so de graduação Normal Superior - habilitação em magistério na educação infantil a anosiniciais do Ensino Fundamental. Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS):novembro 2002.

SAVIANI, Dermeval. Educação: do senso comum à consciência filosófica. 15ª edição. Cam-pinas/SP: Autores Associados, 2004.

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O CURSO NORMAL SUPERIORDA UEMS: CONSIDERAÇÕES

SOBRE EXPERIÊNCIASVIVENCIADAS NUM PROCESSODE ENSINAR E DE APRENDER

Alzira Salete Menegat1

RESUMOO objetivo deste trabalho é apresentar um breve relato das experiências que vivenciei

durante o período em que atuei no Curso Normal Superior, que foi de meados de 2003 ameados de 2006. Esse período, a principio, parece um tempo curto, mas hoje nas comemo-rações dos dez anos de curso, ao rememorar os momentos de orientação de conteúdos dediversas disciplinas, vejo que foram tempos de inúmeras experiências. Por isso, resolviescrever em forma de relato, rememorando o diálogo que mantive com acadêmicos/as-educadores/as, numa relação de ensinar e apreender. Nessa troca, por diversas vezes,concluímos (professora e acadêmicos/as-educadores/as) que o conhecimento é inquietantee está em constante construção especialmente quando se estende para além dos muros dauniversidade, como o fez o Curso Normal Superior.

Palavras-Chave: Educação, Curso Normal Superior, relato de experiências.

ABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACTThe aim of this work is to present a brief report of the experiences I had during the

time I worked in the Teaching Course in Higher Education, which was from early 2003 toearly 2006. At first, that period seems a short amount of time, but today in the celebrationsof the course’s tenth anniversary when those moments of tutoring for the contents of theseveral subjects are recollected, I notice that those were times that had numberless

1 Graduada em História pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Campus de Corumbá.Mestre em Sociologia pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Câmpus de João Pessoa. Doutora emSociologia pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Araraquara.Professora adjunta da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) e professora no Curso de CiênciasSociais (Bacharelado), no Mestrado em História. Desenvolve pesquisas em áreas de assentamentos ruraiscom apoio da FUNDECT e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq.Juntamente com a professora Marisa de Fátima Lomba de Farias, coordena o Curso de Licenciatura emCiências Sociais/PRONERA, pautado na Metodologia da Alternância. “Minha experiência com o NormalSuperior tem sido um importante auxiliar em minhas atuais atividades junto ao Curso de Licenciatura emCiências Sociais/PRONERA, da UFGD”, ressalta.

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200982 ]experiences. Therefore, I decided to write in the form of a report, recalling the dialoguesthat I had thanks to which I could teach as well as learn. In this exchange, for several times,we concluded (professor and graduate students) that knowledge is disquieting and it is in aconstant process of construction specially when it is extended over the walls of the universityas the Teaching Course in Higher Education has done.

Key-words: Education, the Teaching Course in Higher Education, report of theexperiences.

Quando me convidaram para escreversobre o Curso Normal Superior, da

Universidade Estadual de Mato Grosso doSul (UEMS), refleti sobre o que deveria es-crever, e me veio, logo, uma primeira von-tade, a de realizar uma análise teórica sobrea metodologia adotada no curso, num mo-delo que se assemelha à Metodologia daAlternância, recente nas universidades bra-sileiras, e, por isso, diferenciada daquelaempregada nos demais cursos da UEMS.

No entanto, à medida que fuirememorando o período em que atuei nes-se curso, de 2003 a meados de 2006, que noprimeiro momento parece um tempo cur-to, mas hoje, ao rememorá-lo, vejo que fo-ram tempos de inúmeras experiências pormim vivenciadas, que me levam a perceberaquele período como um tempo longo eseqüencial2 . Isso me fez compreender que,para este momento, outras consideraçõessão necessárias e estão mais voltadas paraavaliações, numa espécie de balanço da mi-nha atuação enquanto professora/pesqui-sadora. Por isso, resolvi escrever em formade relato sobre as experiências que vivencieie potencializei no curso Normal Superior.

A decisão em escrever no formatode relatos de experiências, não deve ser en-tendida como uma tentativa de comprovarou de negar os resultados do Curso Nor-mal Superior, mas configura-se, antes, numaavaliação de minha própria atuação, no diá-logo que mantive com os/as acadêmicos/as-

educadores/as3 .No período em que atuei no Nor-

mal Superior, dialoguei, em cada ano letivo,com acadêmicos/as-educadores/as dividi-dos/as entre turmas de seis Unidades doPólo de Dourados, dentre elas: Dourados,Mundo Novo, Naviraí, Amambaí, PontaPorã e Nova Andradina. Havia, ainda, noalcance do Normal Superior, turmas emoutras seis Unidades do Pólo de CampoGrande, das quais não tive participação.

Nas turmas que constituíam o Pólode Dourados, o diálogo foi fecundo, especi-almente, porque eram acadêmicos/as-edu-cadores/as, que atuavam junto ao alunadodas redes de educação municipal, nos mu-nicípios onde residiam, fato que lhes possi-bilitava vivenciar múltiplas realidades, asquais, durante nossas aulas, foram mani-festadas. Isso fez com que os momentos deaulas se constituíssem em importantes es-paços de troca de saberes, e também numapossibilidade para o questionamento de atu-ações, minhas e deles/as, em relação à traje-tória acadêmica, de construção de conheci-mentos e de sujeitos sociais.

Mesmo vivenciando realidades pró-ximas, cada um/a trazia diferentes formasculturais, o que produzia a necessidade dese discutir conhecimentos seguindo as ori-entações de Caudau (2002), partindo dasrepresentações vivenciadas pelas pessoasque constituem o processo de conhecimen-to, cunhado nas concepções da realidade,

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83ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [construídas numa multiplicidade cultural.Tais subjetividades foram por mim perce-bidas nos trabalhos monográficos que ori-entei, quando tive contato com as trajetóri-as e experiências e, principalmente, percebios resultados de análises que havíamos par-tilhado nas aulas, o que indicava mudançasno dia-a-dia, resultantes das ações cotidia-nas desenvolvidas durante o Curso.

O Normal Superior, iniciado no anode 2000, foi possível pelo esforço conjuntoentre administração e docentes da UEMS, eSecretarias Municipais dos municípios deabrangência dos/as acadêmicos/as/educado-res/as. Contribuiu para mudanças em mui-tas frentes, desde àquelas relacionadas à vidade cada um/a deles/as, nas atuações coletivase de educadores/as que desempenhavam nasredes municipais de ensino, nos/as professo-res/as da UEMS, envolvidos/as com as ativi-dades de efetivação do Normal Superior, emesmo em outros setores da UEMS, especi-almente naqueles em que não se percebiaum consenso em relação ao aceite dametodologia empregada no curso, tendo-aconcebido, por vezes, com olhares negativos.

A metodologia adotada pelo CursoNormal Superior foi pautada por uma pro-posta de ensino diferenciada dos demais cur-sos da UEMS, organizada com aulaspresenciais e concentradas, oferecidas nosdias de sextas-feiras e sábados, e tambémcom parte da carga horária destinada paramomentos não presenciais. Estes últimos,desenvolvidos nas comunidades em que os/as acadêmicos/as-educadores/as viviam, sen-do acompanhados/as pelos/as professores/as responsáveis pelas diversas disciplinas.

Na nova metodologia, aconteceu apreposição de uma nova concepção para aconstrução de conhecimentos na universida-de, como os recomendados por Rodrigues(2001), Alves (200), Freire (1996), Brandão(2004), na qual o/a professor/a deixa de ser o

centro e passa a ser o/a mediador/a do co-nhecimento, criando condições para umaeducação inclusiva, num compromisso coma transformação social e, principalmente,numa estreita relação entre a universidade ea sociedade, encurtando os espaços que his-toricamente as separaram. Essa metodologia,na UEMS, pode ser entendida como umaação pioneira e também um grande desafioassumido pela UEMS, propondo mudançasna maneira tradicional de ensino.

No entanto, esse fato também pro-vocou olhares de recusa em relação ao cur-so, repercutindo em debates, por vezes,conflituosos, concebendo grupos distintosno interior da universidade, os que comba-tiam e os que defendiam o curso. Os/as aca-dêmicos/as-educadores/as, por sua vez,numa tentativa de afirmação de status quoacadêmico, em relação ao Normal Superi-or, nomearam o curso enquanto “O Nor-mal”, que trazia o sentido da defesa, de queaquele era um curso que deveria ser aceitona instituição e por ela propagar-se.

Assim, o Normal Superior encerrasuas atividades em 2009, atendendo diver-sas turmas de acadêmicos/as, distribuídasentre seis Unidades do Pólo de Dourados eoutras seis Unidades do Pólo de CampoGrande. As Unidades do Pólo de Douradosforam às seguintes: Dourados, NovaAndradina, Ponta Porã, Naviraí, Amambaíe Mundo Novo, formando 790 acadêmicos/as, destes/as 12 provenientes de comunida-des indígenas.

Quanto às seis unidades do Pólo deCampo Grande foram: Aquidauana,Cassilândia, Coxim, Jardim, Paranaíba, Cam-po Grande, formando, entre os anos de 2000a 2009, um total 856 acadêmicos/as, dos quais33 são indígenas. Em seu total, o NormalSuperior contribuiu com a formação superi-or de 1.646 educadores/as da rede municipalde diversos municípios de Mato Grosso do

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200984 ]Sul, e que atuam na Educação Infantil e nasSéries Iniciais do Ensino Fundamental.

No entanto, o alcance do NormalSuperior ultrapassou as Unidades, porqueestas se constituíram enquanto espaços cen-trais de pequenas regiões, e para elas con-vergiram acadêmicos/as-educadores/as deoutros municípios localizados no entornodas Unidades. Assim, seu alcance foi amploe se efetivou em três sentidos: a) produziucondições de pertencimento acadêmicopara pessoas distanciadas geograficamentedas universidades; b) encurtou distâncias ediferenças culturais, uma vez que reuniuacadêmicos/as-educadores/as de diferentesespaços sociais-culturas; c) estreitou relaçõescom a comunidade, por meio de convêniosfirmados com as Secretarias Municipais deEducação. Estas últimas fomentaram parteda infra-estrutura necessária ao curso, es-

pecialmente na viabilização do transportedos/as acadêmicos/as-educadores/as para asUnidades da UEMS, bem como a liberaçãodeles/as das atividades que desempenha-vam na rede municipal de educação, nos diasem que ocorriam aulas do Normal Superi-or, momentos em que passavam para a con-dição de acadêmicos/as.

O esforço conjunto empreendidoentre a equipe da UEMS e as Secretarias deEducação Municipal para a efetivação e de-senvolvimento das atividades do NormalSuperior lhe confere louvor pelo compro-misso que assumiu e assegurou com a co-munidade. Assim, a UEMS se concretizoucomo uma universidade comprometida coma interiorização do conhecimento, o que seexpressa nos números de formandos/as doNormal Superior, como apresentado nosquadros a seguir.

NÚMERO DE EGRESSOS DO CURSO

NORMAL SUPERIOR DAS UNIDADES DA UEMS DO PÓLO DE DOURADOS

Unidade Curso Total de Egressos

Ponta Porã Normal Superior 151

Nova Andradina Normal Superior 138

Naviraí Normal Superior 134

Mundo Novo Normal Superior 37

Dourados Normal Superior 202

Amambaí Normal Superior 116

Amambaí Normal Superior Indígena 12

TOTAL: 790

FONTE: Secretaria do Curso Normal Superior da UEMS. Dados obtidos no mês de setembro de 2009.

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85ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [

Os números de formandos/as doCurso Normal Superior demonstram comojá foi mencionado, que se trata de um cursoque contribuiu para a propagação do co-nhecimento em lugares de Mato Grosso doSul, distantes dos núcleos urbanos centrais,como se pode ver pelos resultados das Uni-dades de Nova Andradina, Jardim, Coxim eAmambaí. Colaborou, ainda, para oquestionamento do conhecimento, seja navida de acadêmicos/as-educadores/as, deprofessores/as da UEMS, nas ações das Se-cretarias dos Municípios e comunidades deonde os/as acadêmicos/as-educadores/as

NÚMERO DE EGRESSOS DO CURSO

NORMAL SUPERIOR DAS UNIDADES DA UEMS DO PÓLO DE CAMPO GRANDE

Unidade Curso Total de Egressos

Paranaíba Normal Superior 41

Jardim Normal Superior 203

Coxim Normal Superior 131

Cassilândia Normal Superior 37

Campo Grande Normal Superior 355

Aquidauana Normal Superior 56

Aquidauana Normal Superior Indígena 33

TOTAL: 856

TOTAL GERAL (pólos de Dourados e Campo Grande): 1.646

FONTE: Secretaria do Curso Normal Superior da UEMS. Dados obtidos no mês de setembro de 2009.

eram oriundos/as, bem como na própriahistória da UEMS, enquanto instituição queaceitou o desafio de iniciar uma novametodologia de ensino.

Assim, é possível notar que o Nor-mal Superior cumpriu com a meta que esta-beleceu, de propor conhecimentos de nívelsuperior a professores/as da rede municipalde diversos municípios de Mato Grosso doSul, que ainda não detivessem essa forma-ção. Nesse sentido, contribuiu com este im-portante segmento do setor educacional, cri-ando condições de melhoria na formação deeducadores/as que atuam na Educação In-

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200986 ]fantil e nos Anos Iniciais do Ensino Funda-mental, da rede municipal de ensino, objeti-vo principal do Normal Superior.

No entanto, seus resultados forampara além dos inicialmente objetivados, con-figurando-o como o promotor de uma ca-minhada com inúmeros cruzamentos, emque hoje é possível perceber que ocorremreencontros de caminhos e de caminhan-tes. Observo esse reencontro acontecendoem muitos momentos, dentre eles quandoparticipo de cursos de formação continua-da, nos quais a presença de antigos/as aca-dêmicos/as-educadores/as do Normal Su-perior é uma constante. Além disso, vejosuas presenças nas salas de aula em que atu-almente atuo, enquanto professora naUFGD, especialmente no Curso de Licenci-atura em Ciências Sociais/PRONERA4 ,mestrado em História e mestrado em Edu-cação. Com isso, demonstram caminharpara além do ponto de chegada de um cur-so de graduação, numa constância em cons-truir e renovar conhecimentos.

Nesse sentido, o Normal Superiorparece ter sido, para as pessoas que deleparticiparam o iniciar dessa caminhada, es-tendendo-a para outros caminhos possíveis,como numa possibilidade já indicada porBoaventura de Souza Santos (2004) quandonos diz que é possível construir um outroconhecimento, a partir do momento em quese potencializa as experiências dos sujeitos,o que pode resultar em transformações so-ciais das realidades vivenciadas, contribuin-do para mudanças positivas. Vejo que essafoi à meta defendida pelo Normal Superior,em conjunto com as Secretarias de Educa-ção de diferentes municípios de Mato Gros-so do Sul, visando potencializar novasmetodologias, que permitissem aos acadê-micos/as-educadores/as, que estivessem lo-calizados/as distantes da Universidade, pú-blica e de qualidade, chegarem até ela e dela

participarem enquanto acadêmicos/as.A aplicação de uma nova metodo-

logia, no que se pode compará-la à Metodo-logia da Alternância, como a defendida porMolina (2006), inovadora na UEMS, se ana-lisada àquela formulada para os demais cur-sos da UEMS, contribuiu para a inserção deacadêmicos/as-educadores/as no espaço dauniversidade, produzindo renovações nãoapenas em suas vidas, como também nasações que desenvolvem nas comunidadesem que atuam.

Minha experiência com o NormalSuperior teve início junto à turma do muni-cípio de Mundo Novo, num ano em que aprimeira turma do Curso, representada emmuitas outras turmas, presentes em diver-sas unidades do Pólo de Dourados, bemcomo daquelas do Pólo de Campo Grande,da UEMS, estava prestes a concluir os estu-dos. Daquele período, guardo valiosas ex-periências porque pude dialogar com aca-dêmicos/as-educadores/as de diferentes lu-gares da região sul de Mato Grosso do Sul.Além disso, por serem educadores/as nosmunicípios em que viviam traziam cotidia-namente para as aulas, múltiplas experiên-cias, decorrentes do processo de ensino-aprendizagem que desenvolviam, o qual sefez presente nas disciplinas que ministrei,dentre elas: “Trabalho de Elaboração Pró-pria”, “Estágio Curricular Supervisionado” e“Fundamentos e Metodologia de EstudosSociais na Educação Infantil e Anos Iniciaisdo Ensino Fundamental”, e também duran-te as orientações dos trabalhos monográficosde final de curso e dos relatórios de estágio.

Nesse diálogo, pude ensinar e apre-ender, como numa simbiose, já apresenta-da e defendida por Paulo Freire, e que foipossível em virtude das experiências do vi-vido dos diferentes grupos de acadêmicos/as-educadores/as, somadas aos conheci-mentos teóricos que detínhamos. Nessa tro-

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87ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [ca, por diversas vezes, pude (e puderam –os/as acadêmicos/as-educadores/as) con-cluir que o conhecimento é inquietante eestá em constante construção, especialmentequando se estende para além dos muros dauniversidade, num partilhar necessário edefendido por muitos estudos, como nosde Zemelman (2004), Santos (2004), Candau(2002) e outros.

Além das experiências adquiridasnesse diálogo, no período em que estive noNormal Superior, pude, ainda, vivenciar epartilhar, com a equipe pedagógica do Cur-so, da construção de conhecimentos queseguiam metodologias diferenciadas, comconteúdos oferecidos em aulas presenciaise não presenciais. As aulas presenciais acon-teciam de forma concentrada nos dias desextas-feiras e sábados e as não presenciaiseram realizadas nas comunidades, quandoparte dos conteúdos de cada disciplina eradesenvolvida pelos/as acadêmicos/as-edu-cadores/as em suas comunidades, sob a ori-entação de docentes responsáveis pelas dis-ciplinas. Essa nova metodologia requeria dogrupo pedagógico envolvido, o partilhar daconstrução de conhecimentos e tambémnuma constante avaliação dos processos deensino. Para isso, as reuniões pedagógicasaconteciam semanalmente e com elas aconstrução de uma organização e tambémreorganização de procedimentos, o que seconfigurou em um novo processo de co-nhecimentos que precedeu o envolvimentodo grupo como um todo, desde a coorde-nação de curso, representada, no períodoem que lá estive pela dedicação da profes-sora Maria Bezerra, bem como de todos/asos/as professores/as que compunham aequipe pedagógica.

Pela maneira como o Normal Supe-rior esteve organizado, em turmas espraia-das por diversos municípios de Mato Gros-so do Sul, a equipe de docentes, para minis-

trar aulas e atender a outras atividades doCurso, deslocava-se de Dourados para asUnidades. Essa realidade proporcionou,entre o grupo de docentes, um partilhar deaspectos outros que se estenderam paraalém das práticas pedagógicas e de produ-ções acadêmicas, permitindo o conhecerenquanto pessoas.

Daquele período, guardo lembran-ças das longas viagens, como aquelas que sedestinavam a Nova Andradina, MundoNovo e Amambaí, lugares mais distantes secomparados aos de Naviraí e Ponta Porã, epor isso mesmo traziam a necessidade de seiniciarem em jornadas de trabalho que acon-teciam antes mesmo do amanhecer do sol.Essa era a realidade dos dias de sexta-feira,quando as equipes de professores/as parti-am muito cedo para as diversas unidadesda UEMS, e logo no início da manhã encon-travam “o grupo do Normal” para o desen-volvimento de aulas presenciais por dois diasconsecutivos. Retornávamos a Dourados aoanoitecer do dia seguinte, já no sábado.

Os/as acadêmicos-educadores/astambém vivenciaram as constâncias das vi-agens, uma vez que para comparecerem àsaulas, nas diferentes unidades da UEMS, asquais recebiam acadêmicos/as-educadores/as de diversos municípios, precisavam via-jar e assim se ausentarem do convívio fami-liar, percorrendo, quinzenalmente, muitosquilômetros, que se somados às quilome-tragens que cada um/a precisou percorrer,ao longo dos quatro anos de Normal Supe-rior, ver-se-á que venceram muitos deles,até chegarem ao dia da formatura. As via-gens podem ser consideradas como desafi-os em virtude das distancias e do quebra-quebra dos ônibus e das vans que os/astransportavam, e que pelo precário estadode conservação, nem sempre permitiram achegada ao destino. Por isso, vivenciamosmomentos em que os ônibus e as vans pas-

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200988 ]saram a compor os espaços pedagógicos,mencionados nas aulas, numa necessidadede relatarem dificuldades motivadoras doatraso e/os acontecimentos vivenciados.

A vida familiar de cada acadêmico/a-educador/a, especialmente das acadêmi-cas, também fez parte do processo pedagó-gico, uma vez que diversas foram às crian-ças geradas durante a trajetória dos anos docurso e, de acordo com a conjuntura famili-ar de cada uma delas, exigiu por parte dasmães-acadêmicas, levarem filhos/as, aindapequeninos/as, bebês e crianças, para den-tro das salas de aulas, tornando-os/as, deforma involuntária, desde muito cedo, alu-nos/as universitários/as.

Diante desse cenário, na rememo-ração de acontecimentos nas diferentes tur-mas e Unidades da UEMS, é possível desta-car múltiplos momentos e que não com-põem apenas o espaço dos diálogos acadê-micos que aconteciam durantes as aulas,mas que o processo pedagógico se esten-deu para as viagens, as aulas, os alojamen-tos, os momentos de alimentação e as fes-tas, aspectos múltiplos que produziram en-tre eles/as uma corrente de solidariedade,de um partilhar constante, que ultrapassouo acadêmico. Desses momentos, partilheido café da manhã na Unidade de Ponta Porã,em que o grupo trazia pão, café, manteiga,biscoitos, numa primeira atividade de cadaencontro. Assim se iniciavam as discussões.Participei dos almoços do grupo de Doura-dos, num partilhar de alimentos e de boasconversas. Seguindo essa lógica, havia o lan-che das tardes nos grupos de NovaAndradina, Amambaí e de Naviraí (e dasconfraternizações, nos bares, nas noites desextas-feiras, especialmente no grupo deNova Andradina).

Diferentes situações foram sendoproduzidas, como aquelas de um grupo deAmambaí que participava das aulas na Uni-

dade de Ponta Porã, e que atribuía vida aobjetos, como as conhecidas “vanssanduicheiras”, assim nomeando o meio detransporte que os/as levava de um ponto aoutro. Quando as aulas se estendiam, semtempo para a parada do lanche, este era re-alizado no momento do retorno às cidadesde origem, na van sanduicheira.

Chamou-me a atenção a preocupa-ção de todas as turmas com a formatura,especialmente no ano de 2005, quando fuiconvidada para ser paraninfa daquela tur-ma e pude observar, no envolvimento dogrupo, um novo significado para a forma-tura, do qual, até então, eu mesma, pouco ohavia considerado. Faziam da formatura umgrande evento que deveria ser comemora-do. Para isso, iniciavam, desde os primeirosanos, na arrecadação de recursos para ogrande dia, que culminava com festejos, or-ganizados com vestimentas especiais, tor-nando-o um marco em suas vidas. A for-matura pareceu-me um momento que tra-duzia a eles/as dois significados: primeiro,como comemoração, por terem consegui-do passar em um vestibular e cursar umauniversidade pública e de qualidade – opertencimento à UEMS –, vencendo difi-culdades em relação às distâncias geográfi-cas que os/as separava da universidade, bemcomo distâncias sociais, já que muitos/asacadêmicos/as-educadores/as não dispu-nham de condições financeiras que lhes per-mitissem participar de uma universidadeque não fosse pública.

O segundo fator se deve ao esforçointelectual que empreenderam e também dosmúltiplos outros esforços, como ausênciasno âmbito familiar e de trabalho, uma vezque atuavam enquanto educadores/as e, porisso, era preciso se ausentar nos dias de sex-tas-feiras, quando havia a necessidade de vi-ajarem para as aulas. Isso fez com que a for-matura fosse vista como um sonho, efetiva-

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89ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/2009 [do na conquista de um diploma de gradua-dos/as em curso de nível superior.

Assim, o contato com o grupo doNormal foi fecundo e observo que se cons-tituiu em momentos que oportunizaram re-flexões sobre as atuações, produzindoquestionamentos e elaborando conhecimen-tos, confrontando idéias que perpassaramo conhecimento intelectual, associando-asa prática cotidiana, especialmente aquelavivenciada pelos/as acadêmicos/as-educado-res/as, criando condições para sua renova-ção. Acredita-se que essa é uma das metasatribuídas à Universidade e que a funda-menta, num diálogo que viabiliza a forma-ção plena, com conhecimentos e condiçõesobjetivas e experimentadas, que permitemproduzir, quem sabe, outra sociedade, numarelação transformadora, como a defendidapor Boaventura de Souza Santos (2004) aoalertar para a necessidade dos/as intelectu-ais terem a preocupação em produzir co-nhecimentos com prudência. Isso requerconsiderar as experiências vivenciadas, paraque assim sejam asseguradas as condiçõespossíveis para a construção de uma vidadecente e de empoderamento dos sujeitos5 .

Empoderamento aqui entendido naconcepção defendida por Deere e León(2002), enquanto um processo que requerpossibilidades de questionamentos paraque se efetivem transformações em rela-ção aos poderes construídos socialmente,e que nem sempre são percebidos/esten-didos a todas as pessoas que constituem otecido social. Nesse sentido, o acesso à edu-cação superior, para pessoas que vivenciamdificuldades econômicas e de isolamentogeográfico, se constitui em elementos fun-damentais e necessários para a produçãode autonomia e de construção de novossujeitos sociais, enfim, cria condições deempoderamento de pessoas. Os resulta-dos do Normal Superior são percebidoscomo os de um curso que produziu condi-ções para autonomia de pessoas.

Acredito nessa relação e vejo quecursos com metodologias diferenciadas, secomparadas às tradicionais, criam novascondições de inserção de pessoas distantesfísica e socialmente das universidades, comoos/as do Normal Superior, produzindo, as-sim, possibilidades de mudanças sociais quepermitem a construção de cidadania.

NOTAS

2 Encerrei minhas atividades na UEMS e no Curso Normal Superior em agosto de 2006,após ter obtido aprovação em concurso público na UFGD, momento em que passei aintegrar o quadro de docentes do Curso de Ciências Sociais e do Mestrado em História.3 Os/as nomeio enquanto acadêmicos/as-educadores/as porque eram educadores/as dasredes municipais de diversos municípios de Mato Grosso do Sul, atuavam na EducaçãoInfantil e nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental. Entre eles/as, as mulheres eram amaioria, mas como defendo uma linguagem inclusiva, nas análises que apresento, fareireferência a ambos.4 O Curso de Licenciatura em Ciências Sociais/PRONERA, da UFGD, está sendo oferecidopara 58 pessoas de assentamentos rurais de Mato Grosso do Sul, e nasceu de uma parceriaentre a UFGD/MDA/PRONERA/INCRA de Mato Grosso do Sul e os Movimentos Sociais

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ANO 12 ••••• No 49 ••••• AGO/SET/OUT/200990 ]Rurais de Mato Grosso do Sul (MST, MMC, COAAMS, FETAGRI, CUT, CPT e FAF). O quese está pretendendo com o curso é formar licenciados/as em Ciências Sociais com umaformação humanística, capazes de atuar como profissionais críticos da realidademultidimensional da sociedade brasileira, do processo educacional e nas organizações dosmovimentos sociais. Sua proposta pedagógica está pautada na Metodologia da Alternânciae ancorada nas experiências dos sujeitos, construídas ao longo das lutas por terra e porcidadania. Acredita-se que com o curso, se está fortalecendo a educação e a possibilidade deação qualificada nas áreas de Reforma Agrária, além de contribuir para que ocorra o acessoà educação e à escolarização referenciada num paradigma do campo, como um direitoconstitucional das pessoas dele provenientes.5 Nas atividades que atualmente desenvolvo, junto à turma de Licenciatura em CiênciasSociais/PRONERA, da UFGD, observo novamente o processo de emancipação de pessoas,quando vejo o envolvimento do grupo na discussão dos pressupostos teórico-metodológicosdo curso para uma análise crítica da sociedade e da realidade brasileira, intentando compreendê-la em suas interfaces globais, regionais e locais. Objetivam, nas discussões, entender a realida-de que vivem, associada ao compromisso com as transformações sociais que preconizam, nabusca por melhoria de vida das pessoas nos assentamentos de reforma agrária.

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