responsabilidade civil do estado - conexão … · nexo causal. a responsabilidade civil do estado...

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DIREITO ADMINISTRATIVO RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO GUILHERME PEÑA 1 RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO RESPONSABILIDADE CIV IL “LATO SENSU Responsabilidade Civil é o dever jurídico derivado ou secundário de ressarcir ou reparar dano causado pela conduta culposa do agente a outrem. Há uma diferença entre a responsabilidade civil e a responsabilidade penal. 1ª NOTA IMPORTANTE: DISTINÇÃO ENTRE RESPONSABILIDADE CIVIL E PENAL É possível de ser questionada em prova a distinção ontológica 1 entre o tipo de responsabilidade dito civil de outro tipo de responsabilidade tido como penal. Para responder a questão deve-se atentar que, ontologicamente, não há qualquer distinção entre os termos, pois ambos decorrem de ato ilícito. A distinção que existe entre a responsabilidade civil e a responsabilidade penal está na graduação da lesão ao bem jurídico tutelado. Quando a hipótese for de responsabilidade penal a lesão é mais grave, por isso que a responsabilidade penal enseja uma sanção preventiva ou repressiva. A lesão na responsabilidade civil é menos grave, por isso que a sanção, nessa hipótese, não é preventiva ou repressiva, mas sim reparatória ou ressarcitória 2 . 2a NOTA IMPORTANTE: DISTINÇÃO ENTRE OBRIGAÇÃO E RESPONSABILIDADE 1 Parte da filosofia que trata do ser enquanto ser, i. e., do ser concebido como tendo uma natureza comum que é inerente a todos e a cada um dos seres 2 Há distinção técnica entre ressarcir, reparar e indenizar

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D I R E I T O A D M I N I S T R A T I V O

R E S P O N S A B I L I D A D E C I V I L D O E S T A D O

G U I L H E R M E P E Ñ A

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RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

RESPONSABILIDADE CIVIL “LATO SENSU”

Responsabilidade Civil é o dever jurídico derivado

ou secundário de ressarcir ou reparar dano causado pela conduta

culposa do agente a outrem.

Há uma diferença entre a responsabilidade civil e a

responsabilidade penal.

1ª NOTA IMPORTANTE: DISTINÇÃO ENTRE RESPONSABILIDADE CIVIL E

PENAL

É possível de ser questionada em prova a distinção

ontológica1 entre o tipo de responsabilidade dito civil de outro tipo

de responsabilidade tido como penal.

Para responder a questão deve-se atentar que,

ontologicamente, não há qualquer distinção entre os termos, pois

ambos decorrem de ato ilícito.

A distinção que existe entre a responsabilidade

civil e a responsabilidade penal está na graduação da lesão ao bem

jurídico tutelado. Quando a hipótese for de responsabilidade penal a

lesão é mais grave, por isso que a responsabilidade penal enseja uma

sanção preventiva ou repressiva. A lesão na responsabilidade civil

é menos grave, por isso que a sanção, nessa hipótese, não é

preventiva ou repressiva, mas sim reparatória ou ressarcitória2.

2a NOTA IMPORTANTE: DISTINÇÃO ENTRE OBRIGAÇÃO E

RESPONSABILIDADE

1 Parte da filosofia que trata do ser enquanto ser, i. e., do ser concebido como tendo uma natureza comum que é inerente a todos e a cada um dos seres 2Há distinção técnica entre ressarcir, reparar e indenizar

D I R E I T O A D M I N I S T R A T I V O

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OBRIGAÇÃO é o dever jurídico originário ou

primário. É a conduta que a ordem jurídica impõe em primeiro plano,

por isso que existe a obrigação em nível jurídico primário ou

originário que, uma vez violada, dá ensejo a um dever jurídico

derivado ou secundário, que é a RESPONSABILIDADE.

Obrigação é originária ou primária, enquanto

responsabilidade é derivada ou secundária porque decorre da violação

da obrigação. Quando houver uma obrigação violada, seja ela

contratual ou não, isso dará ensejo a uma espécie qualquer de

responsabilidade3.

3a NOTA IMPORTANTE: DISTINÇÃO ENTRE RESSARCIMENTO, REPARAÇÃO E

INDENIZAÇÃO

Segundo JESSÉ TORRES, o conceito de ressarcimento

ou reparação é distinto do conceito de indenização. Ressarcimento e

reparação decorrem de atos ilícitos e são dirigidos a um dano.

Assim, se houver ato ilícito, este gerará um dano que ensejará o

ressarcimento ou a reparação.

A distinção entre ressarcimento e reparação é que o

primeiro é utilizado para dano material, enquanto a reparação é para

dano moral.

Assim, ATO ILÍCITO gera DANO e conseqüentemente

REPARAÇÃO (dano moral) ou RESSARCIMENTO (dano material).

Se a hipótese for de ato lícito, este não gera

dano, mas sim prejuízo, que é indenizado. Portanto, só se pode

falar em indenização quando a hipótese for de ATO LÍCITO, que gerará

PERDA, PREJUÍZO, o que dará ensejo à INDENIZAÇÃO.

Exemplos: Um carro bate no outro causando

danos. A hipótese será de ato ilícito, culposo

que gera danos materiais e enseja o

3 No direito civil há hipóteses de obrigações em que não há responsabilidade – dívida de jogo.

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ressarcimento. Essa hipótese diverge da de

imóvel desapropriado por ente público, a

hipótese será de ato lícito, que gera prejuízo

e dá ensejo à indenização.

É isso que distingue a responsabilidade civil do

Estado da intervenção do Estado na propriedade. A responsabilidade

civil decorre de um ato ilícito, que ensejará o ressarcimento do

dano. De outro lado, a intervenção do Estado na propriedade decorre

de um ato lícito, daí porque, nessa hipótese, será caso de

indenização do prejuízo.

Pressupostos da Responsabilidade Civil “Lato Sensu”

Há um pressuposto de índole objetiva, que é o dano.

Há um pressuposto de índole subjetiva, que é o agente. E também há

pressuposto de índole causal, que é o nexo de causalidade.

* Pressuposto Objetivo: Dano

RESPONSABILIDADE CIVIL * Pressuposto Subjetivo: Conduta do Agente

* Pressuposto Causal: nexo de causalidade

Assim, só se estabelece a responsabilidade civil a

partir do momento em que há uma conduta do agente, que pode ser

culposa ou dolosa, omissiva ou comissiva, com a ocorrência de dano,

que pode ser de qualquer origem – material ou moral – havendo

ligação entre uma coisa e outra – nexo de causalidade entre a

conduta e o dano.

Qualquer responsabilidade civil, de qualquer

espécie, inclusive a objetiva, pressupõe a conduta culposa ou dolosa

do agente. O que pode ser dispensada, na responsabilidade objetiva

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é a prova da culpa, mas é imprescindível que haja uma conduta e que

ela gere um dano.

Espécies de Responsabilidade Civil

A responsabilidade civil subdivide-se, basicamente,

em duas espécies: extracontratual, também chamada de aquiliana, e

responsabilidade civil contratual, conforme a fonte dela seja a lei

ou o contrato.

Se a fonte da responsabilidade for a lei, ela será

extracontratual ou aquiliana. Se a fonte da responsabilidade for o

contrato, ela será contratual.

* Extracontratual ou aquiliana – a fonte é a lei

RESPONSABILIDADE CIVIL

Contratual – a fonte é o contrato

A responsabilidade extracontratual pode ser

objetiva ou subjetiva, conforme haja ou não necessidade da prova da

culpa ou dolo. Se a prova da culpa ou do dolo for imprescindível, a

responsabilidade será subjetiva. De outro lado, se a prova for

dispensável, a responsabilidade será objetiva.

A base da responsabilidade extracontratual está no

art. 159 do Código Civil em Vigor.

Art . 159 do C C V . Aque l e que , po r a ção o u om i s s ão

v o l un tá r i a , neg l i g ênc i a , o u im p ru dênc i a v i o l a r d i r e i t o , o u

caus a r p re j u í z o a o u t r em , f i c a o b r i g ado a repa ra r o dano .

A responsabilidade contratual é subdividida em

obrigação de fazer e obrigação de dar, conforme for o objeto do

contrato. Seu fundamento básico está no artigo 1056 do Código

Civil.

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Art . 1056 do C C V . N ão cum p r i ndo a o b r i g a ção o u

de i x ando de cum p r i - l a pe l o m odo e no t em po dev i do s ,

r e s ponde o devedo r po r pe rda s e dano s .

O contrato pode ser com ou sem instrumento. O

transporte pela van, por exemplo, é um contrato de transporte sem

instrumento físico.

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

A responsabilidade civil do estado pode ser

conceituada da seguinte forma: Dever jurídico secundário ou derivado

imposto às pessoas jurídicas de direito público e pessoas jurídicas

de direito privado prestadoras de serviços públicos de ressarcir ou

reparar os danos que os agentes públicos, no exercício de suas

funções, ou a pretexto de exercê-las houverem causado a terceiros.

1ª NOTA IMPORTANTE: MELHOR DENOMINAÇÃO

Há autores que se referem à Responsabilidade Civil

do Estado (Celso Antônio Bandeira de Mello), outros mencionam

Responsabilidade Civil da Administração Pública (Hely Lopes

Meirelles) e, ainda há outros que se referem à Responsabilidade

Civil do Poder Público (Alexandre de Moraes).

A denominação Responsabilidade Civil da

Administração Pública não é a mais adequada porque nem sempre o dano

decorre de um ato da Administração Pública em estrito senso, pois é

possível a responsabilidade civil por ato jurisdicional, por ato

legislativo.

Também a denominação Responsabilidade Civil do

Poder Público é equivocada porque nem sempre os atos que dão ensejo

à responsabilidade civil são atos de império, ou seja, são atos

decorrentes da prática de um poder público pelo Estado. O Estado

pode praticar atos de gestão, que são atos praticados pelo Estado

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sem estar na condição de poder público e esses atos podem causar

danos que deverão ser ressarcidos pelo Estado.

A expressão mais adequada é a Responsabilidade

Civil do Estado porque é ampla, não gerando dúvidas.

2ª NOTA IMPORTANTE: RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL

A responsabilidade civil do Estado sempre será

extracontratual. Não existe responsabilidade civil contratual do

Estado. A responsabilidade do Estado ou será objetiva ou será

subjetiva.

A violação de normas de contratos administrativos

não dá ensejo à responsabilidade civil do Estado, pois é caso de

INADIMPLEMENTO DO CONTRATO ADMINISTRATIVO PELO ESTADO, sujeito às

regras pertinentes.

A única fonte de responsabilidade civil do Estado é

a Constituição.

A responsabilidade civil do Estado é sempre

extracontratual, sendo, em regra, OBJETIVA e, excepcionalmente

SUBJETIVA.

3ª NOTA IMPORTANTE: ART. 37, §6º, DA CR’88

O art. 37, §6º fundamenta a responsabilidade civil

do Estado.

Art . 37 , §6º (CR ’88 ) . A s pe s s o a s j u r í d i ca s de d i r e i t o

púb l i co e a s de d i r e i t o p r i v ado p re s t ad o re s de s e r v i ço s

púb l i co s r e s pond e rão pe l o s dano s que s e u s agen te s , ne s s a

qua l i d ade , caus a rem a t e r ce i r o s , / a s s egu rado o d i r e i t o de

r eg re s s o con t r a o r e s pons áve l no s ca s o s de do l o o u cu l pa .

Deve ser separada a primeira parte do dispositivo,

que vai de seu início até a expressão “terceiros”, da segunda parte

do artigo, que se inicia na expressão “assegurado” até culpa.

A parte inicial versa sobre a RESPONSABILIDADE

CIVIL DO ESTADO. A parte final já não versa sobre a

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responsabilidade civil do estado, mas sim da RESPONSABILIDADE CIVIL

DO AGENTE PÚBLICO que causou o dano e que poderá ser eventualmente

responsabilizado individualmente por ação regressiva. A pessoa

jurídica pode ressarcir-se contra a pessoa física que causou o dano.

Na parte inicial do dispositivo não há referência à

culpa, por isso é, em regra, objetiva. Na parte final, há expressa

menção à culpa, por isso tem natureza subjetiva.

Teorias sobre a Responsabilidade Civil do Estado

Historicamente, são 05 as teorias sobre a

responsabilidade civil do Estado:

1) Teoria da Irresponsabilidade Civil do Estado – por essa

teoria, o Estado nunca responderia pelos danos causados a

terceiros por seus agentes. Essa teoria era fundamentada na

intangibilidade da soberania, ou seja, a soberania do Estado

era intangível, o que fazia com que o Estado nunca fosse

responsabilizado por qualquer dano causado a terceiro por seus

agentes. Essa teoria já foi superada há muito tempo em razão

da Teoria da Imputação, também chamada Teoria do Órgão,

segundo a qual os atos que os agentes públicos praticam são

atos do Estado e não do agente. O agente não é o

representante do Estado, mas sim seu presentante.

2) Teoria da Responsabilidade Subjetiva por Culpa do Agente e 3)

Teoria da Responsabilidade Subjetiva por Culpa do Serviço –

As teorias subjetivas exigem a prova da culpa ou dolo para a

responsabilização do Estado. A diferença entre culpa do

agente e culpa do serviço reside no fato de que na primeira

(culpa do agente) é imprescindível que o agente causador do

dano seja individualizado. O Estado responderia pelos danos

causados pelo agente desde que este fosse certo, determinado.

O fato gerador dessa responsabilidade é a falta do agente, ou

seja, a culpa do agente. Na hipótese de culpa do serviço, o

Estado será responsável mesmo que não individualizado o

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agente, mas é obrigatória a prova da falta do serviço. Falta

do serviço é gênero que compreende três espécies: inexistência

do serviço; retardamento do serviço; mau funcionamento do

serviço.

4) Teoria da Responsabilidade Objetiva por Risco Administrativo –

as teorias objetivas não exigem a prova do dolo ou culpa.

Quando a hipótese for de risco administrativo, o nexo causal

pode ser excluído por fato exclusivo da vítima; fato exclusivo

de terceiro; ou caso fortuito e força maior. Não se exige que

se prove a culpa ou o dolo do agente público, mas o Estado

poderá deixar de responder se o nexo causal tiver sido excluído

nessas hipóteses.

5) Teoria da Responsabilidade Objetiva por Risco Integral – por

essa teoria, o Estado responde em qualquer caso, mesmo que

tenha havido fato exclusivo da vítima, fato exclusivo de

terceiro, caso fortuito ou força maior. Não há exclusão do

nexo causal.

A responsabilidade civil do Estado evoluiu desde a

irresponsabilidade até o risco integral. Pela teoria da

irresponsabilidade, o Estado nunca respondia porque se entendia que

a soberania era intangível. Essa teoria foi superada pelo

reconhecimento de que os atos praticados pelos agentes públicos são,

na verdade, atos do Estado, evoluindo-se, assim, para as teorias

subjetivas que exigiam a prova da ocorrência do dolo ou culpa.

Quando a hipótese fosse de culpa do agente, era imprescindível a

individualização do agente. Sendo a hipótese de culpa do serviço,

necessária se fazia a prova da falta do serviço, ou seja, que o

serviço não existia, foi prestado com retardo ou que não funcionou

adequadamente.

Porque a prova da culpa, às vezes, era muito

difícil, evoluiu-se para as Teorias Objetivas, que prescindem da

prova do dolo da culpa. Distinguiu-se o risco administrativo do

risco integral, conforme a possibilidade ou não de exclusão do nexo

causal. Se o nexo causal pode ser excluído por fato exclusivo da

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vítima, fato exclusivo de terceiro, caso fortuito ou força maior, a

hipótese é de risco administrativo. Se não há possibilidade de

exclusão do nexo causal, a hipótese será de risco integral.

É importante saber quais as teorias seguidas no

Brasil. No Brasil, a melhor corrente é a do Prof. Celso Antônio

Bandeira de Mello e do Prof. Oswaldo Aranha Bandeira de Mello, que

distinguem as hipóteses de conduta omissiva e conduta comissiva.

Para eles, se a hipótese for de conduta comissiva,

que é a maioria dos casos, o Brasil acolhe, pelo art. 37, §6º, da

CR’88 a RESPONSABILIDADE OBJETIVA POR RISCO ADMINISTRATIVO.

Em regra, quando o dano decorre de uma ação e não

de uma omissão, a hipótese é de responsabilidade objetiva por risco

administrativo, não sendo necessária a prova do dolo ou culpa, mas o

Estado pode se eximir se comprovar que o dano decorreu de fato

exclusivo da vítima, de fato de terceiro ou de caso fortuito e força

maior.

Se a hipótese for de omissão (ex. surfista de

trem), o Estado responde com base na Teoria Subjetiva da Falta de

Serviço, devendo ficar comprovado que o dano decorreu da

inexistência do serviço, de seu mau funcionamento ou de seu retardo.

O Estado só responderá se ficar provada a falta do serviço, com base

no art. 159 do Código Civil.

Atualmente, no Brasil prevalece o entendimento de

que a responsabilidade objetiva por risco integral não é mais

admitida porque viola alguns princípios constitucionais como o da

ampla defesa e o do contraditório.

OBSERVAÇÃO: Verificar dano ambiental e dano nuclear – casos de

responsabilidade tarifada.

Na hipótese de omissão, há uma parcela da doutrina,

representada pelos Profs.Guilherme Couto e Castro e Sergio

Cavalieiri que defendem que, no caso de omissão específica, deve o

Estado ser responsabilizado objetivamente.

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Esses autores estabelecem uma distinção entre a

omissão genérica e omissão específica. Se o dano decorrer de uma

omissão do dever imediato de agir do Estado, será hipótese de

omissão específica e a responsabilidade do Estado será objetiva (ex.

dever de guarda das crianças em escolas públicas).

Contudo, se a omissão decorrer de um dever de agir

genérico do Estado, ela será genérica e a responsabilidade será

subjetiva (ex. sinalização das estradas).

Citação do livro de Sérgio Cavalieri (Programa

de Responsabilidade Civil, pág. 169): “Quando o

dano resulta da omissão específica do Estado,

ou, em outras palavras, quando a inércia

administrativa é a causa direta e imediata do

não impedimento do evento, o Estado responde

objetivamente, como nos casos de morte de

detento em penitenciária e acidente com aluno

de colégio público durante o período de aula”.4

Alguns autores ainda defendem que nas hipóteses de

danos causados por estrada de ferro, a responsabilidade é por risco

integral, contudo, tal tipo de responsabilidade fere o princípio da

ampla defesa e do contraditório.

Ação de Ressarcimento ou de Reparação

A reparação ou ressarcimento pode ocorrer na via

administrativa como também pela via judicial.

Quanto à via judicial, há três questões importantes

sobre o tema:

Que é o legitimado passivo da ação, o Estado e/ou o agente

público – se é possível o litisconsórcio passivo entre Estado e

agente;

4 Sergio Cavalieri Filho – Programa de Responsabilidade Civil

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Se é possível a denunciação da lide do agente público pelo

Estado;

Se há prazo prescricional para a propositura da ação.

Legitimidade Passiva

Há duas correntes sobre o tema.

Hely Lopes Meirelles defende que a ação de

reparação ou ressarcimento somente pode ser proposta em face do

Estado porque os tipos das responsabilidades são distintos. O

Estado será acionado por responsabilidade objetiva e o agente pela

subjetiva.

Oswaldo Aranha Bandeira de Mello e Celso Antônio

Bandeira de Mello entendem que pode haver litisconsórcio passivo

facultativo, podendo a ação ser proposta em face do Estado e do

agente, sob o argumento de que apesar de os tipos de

responsabilidade serem diferentes, tal não impede a formação do

litisconsórcio, mas deve o autor demonstrar a culpa, o que não

precisaria fazer se a ação fosse proposta só em face do Estado.

No TJRJ prevalece a corrente de que a ação só pode

ser proposta em face do Estado, não sendo admitido o litisconsórcio

passivo facultativo.

Denunciação da Lide

Também há duas correntes sobre o tema.

Maria Sylvia Di Pietro, Diógenes Gasparini e Yussef

Said Cahali sustentam ser obrigatória a denunciação da lide do

agente pelo Estado por força do disposto no art. 70, III, do CPC.

Art . 70 , I I I (C PC ) . A denunc i a ção da l i d e é o b r i g a tó r i a :

. . . . .

I I I – à que l e que e s t i v e r o b r i g ado , pe l a l e i o u pe l o con t r a to ,

a i nden i z a r , em a çã o r eg re s s i v a , o p re j u í z o do que pe rde r a

dem anda .

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Celso Antônio Bandeira de Mello, Lucia Valle

Figueiredo e José dos Santos Carvalho Filho defendem que não pode

ser admitida a denunciação da lide do agente pelo Estado, sendo

inaplicável o artigo 70, III, do CPC porque não deve haver uma

confusão de títulos da responsabilidade civil (objetiva e

subjetiva).

No TJRJ é pacífico de que não cabe a denunciação da

lide do agente pelo Estado nas ações de ressarcimento e reparação.

Há, ainda, um grupo de autores que entendem que a

hipótese não é de denunciação da lide e sim chamamento do terceiro

ao processo (Alexandre Câmara), havendo solidariedade entre o agente

e o Estado.

Prescrição

O prazo de prescrição depende do caso.

Se o responsável for pessoa jurídica de direito

público (União, Estados, Municípios e autarquias), o prazo é de 05

anos, com base no art. 178, VI, do Código Civil em Vigor e no Dec.

20.910/32.

Se o responsável for pessoa jurídica de direito

privado prestadora de serviço público (empresas públicas, sociedades

de economia mista, delegatárias), a prescrição é vintenária – 20

anos – art. 177 do Código Civil em Vigor.

REGIMES ESPECÍFICOS DE RESPONSABILIDADE CIVIL

Responsabilidade Civil do Estado por Atos Administrativos

Na hipótese em que a responsabilidade do Estado

decorre de ato administrativo, há três hipóteses fáticas que são

específicas, tendo regime próprio: (i) responsabilidade tarifada;

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(ii) responsabilidade em decorrência de obra pública; (iii)

responsabilidade pela guarda de coisas e pessoas.

Responsabilidade Tarifada

A responsabilidade tarifada ocorre sempre quando há

disposição legal que limita o ressarcimento ou reparação em caso de

sinistro, sendo inerente às atividades perigosas. Algumas leis

limitam o montante de ressarcimento ou reparação para as atividades

perigosas como, por exemplo, a energia nuclear (art.9º da lei

6453/77) e navegação área (Convenção de Varsóvia).

No que tange a eventuais desastres atômicos –

energia nuclear – o artigo 9º da Lei 6453/77 dispõe que danos

decorrentes de acidentes nucleares só podem ser ressarcidos até um

determinado valor, sendo caso, portanto, de responsabilidade

tarifada.

O único autor que trata dessa matéria – Paulo

Afonso L. Machado afirma - que esse artigo não foi recepcionado pelo

art. 37, §6º, da CR’88 que, de forma alguma, estabelece limites à

responsabilidade do Estado.

A segunda hipótese de responsabilidade tarifada no

Brasil diz respeito à navegação aérea. O Brasil ratificou a

Convenção de Varsóvia que limita a responsabilidade civil em

determinados casos, especialmente no que se refere ao extravio de

bagagem.

Atualmente, há três correntes sobre o tema.

Há uma primeira corrente que defende que a

limitação ainda existe, pois só poderia ser afastada se o Brasil

tivesse denunciado, formalmente, a Convenção. Uma segunda corrente

defende que a limitação foi revogada pelo artigo 6º, VI, do CDC, que

afirma que, em nenhuma hipótese, os danos ao consumidor podem ser

limitados. Por fim, uma terceira corrente, que é a corrente seguida

pelo STJ, defende que a limitação é aplicada aos danos materiais,

sendo ilimitada a reparação dos danos morais. Contudo, tanto o STJ

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quanto o TJRJ admitem que, em casos extremos, o ressarcimento dos

danos patrimoniais não seja limitado.

Responsabilidade Decorrente de Obra Pública

Segundo Cretella Jr., deve-se distinguir o dano

oriundo da obra pública do dano decorrente de culpa do empreiteiro.

Na hipótese de dano oriundo da obra, o dano decorre

da simples existência da obra pública. A existência da obra causa o

dano, independentemente de ser ela regular ou não (ex. obra que

prejudica o comércio – tapumes fechando a entrada da loja). Quando

for essa a situação, a responsabilidade do Estado é direta, devendo

a ação ser proposta somente em face do Estado.

Quanto o dano decorrer de culpa do empreiteiro,

ele, na realidade, está vinculado a uma irregularidade na execução

da obra e não da simples existência dela. Nesse caso, a

responsabilidade do Estado é subsidiária, somente respondendo se

constatada a insolvência do empreiteiro. A ação deve ser proposta

em face do empreiteiro, tão somente5.

Responsabilidade por Guarda de Pessoas e Coisas Perigosas

A responsabilidade do Estado, nesse caso, deve ser

verificada na medida da situação de risco por ele criada. O Estado

responde na medida da situação de risco por ele criada.

Um detento preso em Bangu foge da prisão e rouba

uma casa - a causa do dano não foi a fuga do bandido, mas sim o

roubo, entretanto, deve ser verificado se o Estado conferiu uma

condição para que tal fato ocorresse.

É por conta disso que o Estado só responde na

medida do risco por ele criado, ou seja, se no processo houver prova

de que o Estado deu condição para a ocorrência do dano, ele será

responsabilizado.

5 Sergio Cavalieri não concorda com essa tese, afirmando não haver motivos e nem fundamento jurídico para essa distinção. Segundo ele, “se a obra é do Estado e sempre deriva de um ato administrativo de quem ordena a sua execução, não faz sentido deixar de responsabiliza-lo simplesmente porque a mesma está sendo executada por um particular. ... Tenha-se em vista que o executor da obra é um agente do Estado e,

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Contudo, se não houver qualquer liame entre o dano

verificado e a situação de risco criada pelo Estado, este não será

responsabilizado.

Ex. se o bandido fugiu do presídio há dez dias

atrás e roubou uma residência ontem, não há

qualquer ligação entre a fuga e o dano, daí

porque o Estado não será responsabilizado. O

Estado responderá se, logo após a fuga, o

bandido vier a causar um dano a terceiro.

Responsabilidade Civil do Estado por Ato Jurisdicional

Os dispositivos legais pertinentes são o art. 5º,

LXXV, da CR’88 e o art. 630 do CPP.

O Estado só responde por danos causados por ato

jurisdicional se os danos decorrerem de: (i) erro judiciário e; (ii)

prisão por tempo superior ao fixado em sentença penal condenatória.

O Estado não responde por atos jurisdicionais, salvo somente nessas

duas hipóteses.

Erro Judiciário

É o erro manifesto, crasso. Não se trata de uma

aferição equivocada da prova, o erro deve ser manifesto, evidente

(ex. prender a pessoa errada).

Há uma parcela da doutrina que entende que a

responsabilidade civil do Estado por erro judiciário é restrita à

esfera penal. Contudo, tal posição não é a que prevalece, pois a

CR’88 não restringe a responsabilidade somente para essa hipótese.

Prisão por tempo superior ao fixado na sentença

condenatória

como tal, a Administração responde pelo dano que ele vier a causar, admitindo-se a responsabilidade solidária do executor da obra no caso de ter agido com culpa, o que, sem dúvida, torna a posição da vítima mais garantida” (Programa de Responsabilidade Civil – pág. 174/175).

D I R E I T O A D M I N I S T R A T I V O

R E S P O N S A B I L I D A D E C I V I L D O E S T A D O

G U I L H E R M E P E Ñ A

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Um dia de prisão a mais já dá ensejo à

responsabilização do Estado.

No que tange à prisão provisória, há uma posição

minoritária da doutrina (Celso Antônio Bandeira de Mello) que

entende que o Estado pode ser responsabilizado se o preso vier a ser

absolvido. Mas o TJRJ não adota esse entendimento.

NOTA IMPORTANTE: O fato de o Estado não responder por

danos causados por atos jurisdicionais que não decorram

de erro judiciário ou prisão por tempo superior não

impede que haja a responsabilização pessoal da

autoridade judiciária – art. 130 do CPC – se comprovado

o dolo ou a culpa gravíssima deste.

Responsabilidade Civil do Estado por Atos Legislativos

O Estado responde em duas hipóteses: (i) por regras

abstratas e genéricas desde que inconstitucionais; (ii) por regras

individuais e concretas, ainda que constitucionais.

Ex. Decreto expropriatório. O Estado responde

por esse fato porque a regra jurídica é

individual e concreta caso tenha causado danos

a terceiros. Lei inconstitucional que cause

danos a terceiros. O Estado também responde

nessa hipótese.

NOTA IMPORTANTE: Uma coisa é a responsabilidade

civil por norma jurídica inconstitucional.

Outra coisa é responsabilidade civil por ato

praticado com fundamento em norma jurídica

inconstitucional. No primeiro caso, a hipótese

é de responsabilidade por ato legislativo,

enquanto no segundo a responsabilidade decorre

de ato administrativo. Se a norma por si só

causou o dano, a responsabilidade é por ato

D I R E I T O A D M I N I S T R A T I V O

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legislativo. Se o dano for causado por conta

de um ato praticado com base na norma, a

hipótese será de responsabilidade por ato

administrativo.