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A designer Bea Feitler teve uma produção intensa. Projetou traba- lhos icônicos, tendo participado de momentos-chave da história do design brasileiro e do norte-americano. Nascida em 1938 no Rio de Janeiro, mudou-se aos 18 anos para estudar na New York School of Design. Ao fim da graduação, retornou ao Brasil. Após um curto período na então recém-criada revista Senhor, fundou, em parce- ria com Jaguar e Glauco Rodrigues, o Estúdio G – empreitada que não duraria muito. Já como freelancer, desenhou uma série de capas para a Editora do Autor, as quais denunciavam, de antemão, uma de suas mais fortes características: o uso desenvolto da tipografia. Em 1961, retornou a Nova York e logo foi contratada como assistente de arte da revista Harper’s Bazaar. Tornou-se, em 1963, codiretora de arte, posição que ocupou até 1971. À frente da publicação, Bea atua- lizou o legado de seu mais emblemático editor de arte, Alexey Bro- dovitch, ao incorporar elementos da arte pop e op – mesmo assim, a reverência ao espaço vazio e a condição de protagonista que a imagem fotográfica ocupava na revista foram preservadas. Daí a sua relação tão próxima com o universo da fotografia, que se estenderia por toda a vida. Dirigiu outras tantas publicações e projetou outros tantos livros. Morreu de câncer, no Rio, em 1982, momento em que trabalhava em um novo projeto, a revista Vanity Fair. A serrote traz um recorte dessa produção até agora pouco docu- mentada (a editora Cosac Naify trabalha em um livro com obras de Bea, a ser lançado no próximo ano). Da parceria com Richard Avedon, publicamos três projetos que demonstram as afinidades entre o discurso do fotógrafo e da designer. A relação de Bea com a dança, da qual era devota, rendeu os cartazes e os programas da companhia de Alvin Ailey, que trazemos aqui. E, por fim, um pro- jeto brasileiro, a revista Setenta. À direita, layouts de Bea Feitler para a revista Rolling Stone

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A designer Bea Feitler teve uma produção intensa. Projetou trabalhos icônicos, tendo participado de momentos-chave da história do design brasileiro e do norte-americano.

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A designer Bea Feitler teve uma produção intensa. Projetou traba-lhos icônicos, tendo participado de momentos-chave da história do design brasileiro e do norte-americano. Nascida em 1938 no Rio de Janeiro, mudou-se aos 18 anos para estudar na New York School of Design. Ao fim da graduação, retornou ao Brasil. Após um curto período na então recém-criada revista Senhor, fundou, em parce-ria com Jaguar e Glauco Rodrigues, o Estúdio G – empreitada que não duraria muito. Já como freelancer, desenhou uma série de capas para a Editora do Autor, as quais denunciavam, de antemão, uma de suas mais fortes características: o uso desenvolto da tipografia. Em 1961, retornou a Nova York e logo foi contratada como assistente de arte da revista Harper’s Bazaar. Tornou-se, em 1963, codiretora de arte, posição que ocupou até 1971. À frente da publicação, Bea atua-lizou o legado de seu mais emblemático editor de arte, Alexey Bro-dovitch, ao incorporar elementos da arte pop e op – mesmo assim, a reverência ao espaço vazio e a condição de protagonista que a imagem fotográfica ocupava na revista foram preservadas. Daí a sua relação tão próxima com o universo da fotografia, que se estenderia por toda a vida. Dirigiu outras tantas publicações e projetou outros tantos livros. Morreu de câncer, no Rio, em 1982, momento em que trabalhava em um novo projeto, a revista Vanity Fair. A serrote traz um recorte dessa produção até agora pouco docu-mentada (a editora Cosac Naify trabalha em um livro com obras de Bea, a ser lançado no próximo ano). Da parceria com Richard Avedon, publicamos três projetos que demonstram as afinidades entre o discurso do fotógrafo e da designer. A relação de Bea com a dança, da qual era devota, rendeu os cartazes e os programas da companhia de Alvin Ailey, que trazemos aqui. E, por fim, um pro-jeto brasileiro, a revista Setenta.

À direita, layouts de Bea Feitler para a revista Rolling Stone

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Capa da revista Senhor, com um desenho de Bea, e dois projetos produzidos para a Editora do Autor: O homem nu, de Fernando Sabino, e a coleção Antologia Poética

Foto de Richard Avedon na capa da Harper’s Bazaar, um layout tipográfico para Ms. e a reprodução da edição brasileira do livro The Beatles, com ilustrações de Andy Warhol – na qual o crédito à designer vai logo na capa 

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Bea & Avedon Os dois se conheceram na Harper’s Bazaar, para a qual produziram diversas capas e ensaios fotográficos. A prolífica parceria foi estendida, em alguns momentos, para além dos domínios da revista. Juntos criaram o cartaz para a campanha “Hire the handicapped”, no qual uma foto de Avedon é solarizada em tons de azul e vermelho. Tratamento parecido dariam para a série de quatro imagens dos Beatles, originalmente produzidas para serem veiculadas na revista Look – e posteriormente transformada em cartazes. As imagens tratadas em alto-contraste evidenciam o desenho da luz dos registros de Avedon e dão espaço para uma contundente intervenção cromática, que particulariza cada um dos quatro retratados. A pose contemplativa de George Harrison, os grafismos desenhados sobre a imagem e o contraste entre um verde cítrico e um luminoso laranja fazem alusão às experiências espirituais indianas do guitarrista. E é curioso notar o contraste que há entre o clima dado às imagens de Lennon e McCartney. Se na primeira são cores quentes e saturadas que definem a figura, na segunda, um fundo azulado esfria a temperatura da fotografia. Os óculos elétricos de Lennon, em uma referência explícita à op-art, se contrapõem ao olhar cândido de McCartney. Bea e Avedon trabalharam também em conjunto no livro Diary of a Century, do fotógrafo francês Jacques Henri Lartigue. A íntima relação travada aqui entre os dois é explicitada já na página de rosto, na qual se credita a edição do livro a Avedon e o design a Bea. Projeto gráfico e edição de imagens têm na publicação uma relação simbiótica. A maneira como as imagens são selecionadas e dispostas incorpora a tensão que existe entre peso e leveza nas fotos de Lartigue. Nas composições, os espaços em branco não servem apenas de moldura para imagens, são elementos fundamentais na construção de layouts assimétricos, que, por fim, reforçam o dinamismo que há nas imagens. As páginas são pensadas em duplas, uma característica do trabalho de Bea. Fotos, por vezes, avançam pela espinha do livro – e o corte, sempre incisivo, dado pela divisão de páginas, é também transformado por ela em assunto.

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Alvin Ailey Bea desenhou em 1971 uma série de cartazes e programas para espetáculos da companhia de dança nova-iorquina Alvin Ailey. Com fotos de Bill King, o material é uma espécie de síntese das idiossincrasias visuais da designer. Mais uma vez, é a fotografia quem dá as cartas na composição. As imagens contrastadas, recortadas e aplicadas a um fundo de cor vibrante se libertam de qualquer tipo de referência espacial. Os corpos voam no espaço do cartaz. As informações de texto, compostas de modo a ocupar toda a extensão horizontal da peça gráfica, são dispostas separadamente por traços também horizontais, outra marca de Bea. O contraste entre esse bloco denso e estanque de texto e a forma orgânica das imagens reforça a ideia de movimento e ritmo que marca o universo da dança.

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Setenta No início da década de 1970, Bea desenhou para a editora Abril a revista Setenta. O projeto foi realizado às escondidas, pois a designer tinha, nesse momento, um contrato com a revista norte-americana Harper’s Bazaar. O que vemos como resultado traz muito daquilo que já havia realizado na Harper’s; a edição impecável das imagens, a incorporação do espaço da página dupla – ora com imagens que passam de página a pagina, ora com espelhamentos – e os layouts extremamente arejados. Mas Bea abandona aqui uma característica importante das revistas feminas, o uso de tipos serifados – a Setenta, já em seu logotipo, ostenta uma fonte com um desenho geométrico. Ela trouxe também, de Nova York, alguns colaboradores. Bill King foi um exemplo. Ele realizou um ensaio de moda praia em Copacabana. Em outro ensaio, Claudia Andujar foi levada ao Alto-Xingu para fotografar junto aos índios um editorial de moda. Nas duas páginas que fecham este ensaio, as modelos, também fotografadas por Claudia Andujar, parecem estar diante de um espelho por uma intervenção da edição de arte

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