processo de desenvolvimento de produtos na indústria … · iv congr. bras. gestão e desenv. de...

10

Click here to load reader

Upload: vuongdieu

Post on 20-Sep-2018

212 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Processo de desenvolvimento de produtos na indústria … · IV Congr. Bras. Gestão e Desenv. de Produtos - Gramado, RS, Brasil, 6 a 8 de out de 2003 – – desenvolvimento de produtos:

IV Congr. Bras. Gestão e Desenv. de Produtos - Gramado, RS, Brasil, 6 a 8 de out de 2003

4o CBGDP LOPP/PPGEP/UFRGS 1

Processo de desenvolvimento de produtos na indústria de biscoitos: Estudos de casos em fabricantes de médio porte

Antonio Roberto Giriboni Monteiro (UNOPAR / UFSCar) [email protected] Manoel Fernando Martins (UFSCar) [email protected]

Resumo

Durante a década de 90, a cadeia agroindustrial do trigo passou por profundas transformações devido à desregulamentação do setor, abertura de mercado e início do plano real. Tais transformações apresentaram grandes reflexos no importante segmento de produção de biscoitos, fazendo com que novos produtos sejam constantemente lançados. Com o objetivo de caracterizar o processo de desenvolvimento de produtos neste setor, foram realizados estudos de caso em duas empresas, fabricantes de biscoitos de médio porte. O principal resultado obtido foi à caracterização destas empresas como enfocadas em custo total de acordo com a classificação de Porter (1986), atendendo principalmente um mercado de classes sociais mais baixas, onde a diferenciação e a qualidade apresentam uma importância muito menor que o custo. Conclui-se que estas empresas buscam a diferenciação de seus produtos para agregar maior valor a suas atividades e a expansão de mercado, porém, investimentos em desenvolvimento são cautelosos, para evitar aumento de preço dos produtos ao consumidor. Palavras-chave: Processo de desenvolvimento de produtos, Indústria de biscoitos, Agroindústria.

1. Introdução Na primeira metade da década de 90, o setor moageiro e dos produtos derivados da farinha de trigo no Brasil passaram por grandes transformações. Nunca, na história do setor, transformações tão importantes ocorreram em espaço de tempo extremamente curto (JACOBSEN 2001a).

Em 1990, o país abria o mercado para produtos importados, com taxa de importação muito abaixo das quais o mercado nacional praticava até então. Produtos de diversas nacionalidades invadiram o país. No setor de biscoitos, os produtos vinham principalmente da Argentina, uma vez que este país tinha tradição na produção dos mesmos.

De acordo com Jacobsen (2001b), mesmo antes de a indústria ter algum tipo de reação à entrada dos produtos importados, ainda em 1990, o governo desregulamentou o mercado nacional do trigo. Até aquele momento este grão só podia ser comercializado por intermédio do Banco do Brasil, o qual controlava desta forma, o preço do produto retardando o processo de melhoria de qualidade dos grãos. Tanto que, durante o monopólio, o Brasil produzia 75% do trigo consumido, poucos anos após a queda do monopólio o país produzia apenas 25% do total que consumia. Isto devido, principalmente, a várias décadas de um mercado fechado, controlado por uma empresa estatal, que priorizava o volume de produção nacional e deixava de lado a produtividade agrícola e a qualidade do produto. Segundo o IBGE (2002), atualmente, a produção nacional está próxima a um terço do consumo.

Com estas mudanças, as empresas aqui instaladas puderam conhecer melhor a principal matéria-prima da fabricação dos biscoitos, e, aos poucos, exigir dos moinhos produtos adequados aos seus processos de fabricação.

Page 2: Processo de desenvolvimento de produtos na indústria … · IV Congr. Bras. Gestão e Desenv. de Produtos - Gramado, RS, Brasil, 6 a 8 de out de 2003 – – desenvolvimento de produtos:

IV Congr. Bras. Gestão e Desenv. de Produtos - Gramado, RS, Brasil, 6 a 8 de out de 2003

4o CBGDP LOPP/PPGEP/UFRGS 2

Segundo Monteiro (1996), a indústria encontrava-se em um mercado em que a concorrência internacional aumentava com a abertura de mercado, por outro lado, abria-se a possibilidade de melhorar sua performance, com a compra de farinha de trigo que melhor se adaptava a seu processo, a preço regido pelo mercado. Em 1994, o plano Real é colocado em prática, e há um aumento significativo da parcela da população Brasileira com poder de compra para o mercado de biscoitos.

Neste novo cenário, empresas nacionais e multinacionais aqui instaladas investiram algumas centenas de milhões de dólares na modernização e ampliação de seus parques industriais. Empresas que ainda não produziam no país também passaram a adquirir fábricas para participar deste mercado que, nos primeiros três anos do plano Real, teve um crescimento total próximo a 50% em volume de produção, e muitas indústrias só não vendiam quantidades maiores por falta de capacidade de produção instalada.

Segundo dados da SIMABESP (2002), após os primeiros anos do plano Real, o aquecimento da economia foi diminuindo, frustrando algumas previsões de crescimento de mercado. Porém, os investimentos em ampliação de capacidade produtiva já estavam sendo concluídos, e as empresas teriam, neste novo contexto, que trabalhar em um mercado muito competitivo.

De acordo com a ABIMA (2002), a principal conseqüência desta expansão dos parques instalados, somado aos acontecimentos do início da década de 90, foi um grande avanço de qualidade nos biscoitos fabricados no Brasil. Fechando, desta forma, o mercado aos produtos importados. Fechamento ocorrido pela produtividade industrial e não mais por legislações protecionistas, ou seja, atualmente o Brasil tem o mercado de biscoitos totalmente aberto, porém, o volume de importações é bastante inexpressível, não chegando sequer a 1% do consumo nacional.

Ainda segundo a ABIMA (2002), a segunda conseqüência, bastante perceptível pelo consumidor neste mercado, foi à necessidade de as empresas lançarem novos produtos, uma vez que, com suas capacidades instaladas ociosas, começaram a buscar alternativas para conquistar o mercado. O consumidor pôde perceber esta alteração ao comparar as gôndolas dos supermercados nos setores de biscoitos, que atualmente, conta com diversas marcas, tipos, formatos e tamanhos de embalagens, e, há menos de dez anos, tinha-se poucas variedades, tais como laminados (Maria e Maisena), Crakers e poucos sabores de recheados.

Em função destas situações, segundo SIMABESP (2002), os preços do produto ao consumidor vêm sofrendo uma redução ao longo dos últimos cinco anos, quando avaliado em dólar. As matérias-primas gordura e farinha de trigo, representam mais de 80% do valor dos ingredientes e têm suas cotações fixadas no mercado internacional em dólar, portanto elas não tiveram redução neste período, isto indica que as empresas trabalharam com margens apertadas e com maior produtividade.

Diante deste quadro, as empresas aqui instaladas buscaram no processo de desenvolvimento de novos produtos uma estratégia, de longo prazo, para se manterem competitivas neste mercado. Entretanto, os modelos para desenvolvimento de produto que algumas das maiores organizações adotaram são, segundo Mizuta (2000), adaptações às condições brasileiras.

Por outro lado, de acordo com Carvalho & Romano (1999), as empresas fabricantes de biscoito de médio e pequeno porte, caracterizadas por serem de estrutura familiar e com reduzida estrutura administrativa, respondem por 50% do volume produzido de biscoitos no Brasil. Entretanto, pouco se sabe sobre o processo de desenvolvimento de produto – PDP - destas empresas.

Page 3: Processo de desenvolvimento de produtos na indústria … · IV Congr. Bras. Gestão e Desenv. de Produtos - Gramado, RS, Brasil, 6 a 8 de out de 2003 – – desenvolvimento de produtos:

IV Congr. Bras. Gestão e Desenv. de Produtos - Gramado, RS, Brasil, 6 a 8 de out de 2003

4o CBGDP LOPP/PPGEP/UFRGS 3

Portanto, a caracterização do PDP das empresas de médio porte poderá servir para um melhor entendimento do setor e também para compreender o desenvolvimento de produto de um setor onde se tem pouco estudo a respeito do assunto.

O objetivo deste trabalho é apresentar dois casos estudados sobre o processo de desenvolvimento de produtos (PDP) dos fabricantes de biscoitos de médio porte, comparando-os com um modelo de desenvolvimento de produto proposto pela literatura.

A estrutura do trabalho foi estabelecida para, em um primeiro momento, caracterizar a indústria de biscoito no Brasil. Em seguida um modelo de gestão de desenvolvimento de produto para indústria de alimentos é apresentado. Posteriormente, são apresentados a metodologia utilizada para o desenvolvimento do trabalho e os resultados dos casos estudados. Finalmente são tecidas as conclusões do trabalho.

2. Caracterização da indústria de biscoitos O biscoito é um produto composto principalmente por farinha de trigo, gordura e açúcar, com teor de umidade bastante baixo o que lhe proporciona uma longa vida de prateleira, se acondicionado em embalagem com eficiente proteção à entrada de umidade (MONTEIRO, 1996). A tabela 1 mostra o comportamento do mercado nacional de biscoitos no final da década de 90.

1995 1996 1997 1998 1999 2000

Produção e Vendas (mil tonelada) 850 952 1.003 1.068 1.089 1.012

Consumo per capta (kg/ano) 5,5 6,0 6,3 6,7 6,6 6,1

Preço médio ao mercado (R$/kg) 2,15 2,25 2,35 2,57 2,59 2,78

Faturamento Brasil (milhões R$) 1.827 2.142 2.357 2.744 2.800 2.837 Fonte: SIMABESP 2002

TABELA 1 - Perfil do Setor de Biscoitos.

De acordo com a SIMABESP (2002), o Brasil conta atualmente com 876 fábricas de biscoitos, mais de 200 estão instaladas no Estado de São Paulo. A concentração no setor de biscoitos está cada vez mais acentuada. Três grandes marcas detêm mais de 25% da produção nacional em um mercado que consome mais de um milhão de toneladas por ano do produto.

A suíça Nestlé, com as marcas São Luís, Tostines e Ailiran, é a líder no setor, com quase 13% da produção nacional, seguida pela francesa Danone, com as marcas Aymoré, Danone e Triunfo que representam pouco mais de 12% da produção.

Seguindo as grandes Multinacionais, quatro empresas nacionais detêm uma produção equivalente: M. Dias Branco, Marilan, Mabel e Bauducco. Segundo a revista Food Ingredients (2002), o grupo argentino Macri, que recentemente adquiriu as marcas Zabet, Isabela e Adria, pretende consolidar-se a partir de 2002 entre os cinco principais fabricantes do país.

Segundo a SIMABESP (2002), atualmente, o Brasil é o maior produtor mundial de biscoitos, com mais de um milhão de toneladas ao ano, que representa mais de um bilhão de dólares. Os valores de importação e exportação do produto são pouco significantes, portanto, a produção e consumo nacional se equilibram.

Apesar desse grande consumo, existe um potencial de aumento de produção. Ao se comparar o consumo brasileiro per capita com outros países como Holanda, Inglaterra, Irlanda, Bélgica

Page 4: Processo de desenvolvimento de produtos na indústria … · IV Congr. Bras. Gestão e Desenv. de Produtos - Gramado, RS, Brasil, 6 a 8 de out de 2003 – – desenvolvimento de produtos:

IV Congr. Bras. Gestão e Desenv. de Produtos - Gramado, RS, Brasil, 6 a 8 de out de 2003

4o CBGDP LOPP/PPGEP/UFRGS 4

e Suíça, percebe-se que estes consomem mais de 10 kg do produto por habitante por ano, enquanto, este número chega a quase seis no Brasil, tendo sido pouco superior a 6kg/habitante/ano no final da década de 90.

Segundo El-Dash, Camargo & Diaz (1980), existem basicamente seis categorias para os produtos desta indústria, esta divisão dá-se em função de diferentes processos de fabricação, inerentes a cada produto. Não é possível produzir outro tipo de biscoitos numa mesma linha de produção, sem que esta passe por modificações, em alguns casos é até mesmo impossível.

Para estes autores, os biscoitos são divididos em recheados, semidoces (Maria / Maizena), doces (moldados / estampados), crakers (cream craker / água e sal), wafers (alguns autores não consideram wafers como biscoitos) e outros (snaks e extrusados). Atualmente, está é a divisão mais empregada para caracterização de fabricantes de biscoitos.

Produtos % mercado % valor

Recheados 31,6 32,4

Maria / Maizena 10,4 8,5

Secos e doces 15,7 14,3

Crakers 22,5 18,0

Wafer 7,0 11,2

Outros 12,9 15,6 Fonte: ACNielsen 2002

TABELA 2 - Segmentação por classe de Biscoitos em 2000.

De acordo com a SIMABESP (2002) e ACNielsen (2002), os dois grupos que vêm aumentando sua participação no mercado nos últimos anos são recheados e wafers, produtos de valor agregado maior que a média dos demais, como é possível verificar na tabela 2, a porcentagem de valor (R$) destes setores é maior que a porcentagem em volume de vendas (kg).

3. Processo de desenvolvimento de produtos

As empresas estão constantemente desenvolvendo novos produtos para manter sua competitividade, uma vez que, os produtos apresentam ciclos de vida. Estes podem ser extremamente curtos ou durarem muitos anos, no entanto, a tendência é em um dado momento do produto, as vendas entrarem em declive até não ser mais viável economicamente sua produção.

Para a permanência da empresa no mercado, quando um produto entra em declínio, é necessário existir produtos em outras etapas do ciclo de vida, inclusive produtos sendo desenvolvidos, para o processo manter-se ao logo do tempo.

Para as empresas da indústria de biscoito, investir no processo de desenvolvimento de produtos, ganhou importância para a sobrevivência no mercado Por um lado, este apresenta melhores condições tecnológicas para a produção, com possibilidade de especificações de matérias-primas, aquisições de equipamentos importados de produção com taxas alfandegárias menores e grande avanço no setor de produção de embalagens, permitindo a flexibilização de produção a custo baixo.

Page 5: Processo de desenvolvimento de produtos na indústria … · IV Congr. Bras. Gestão e Desenv. de Produtos - Gramado, RS, Brasil, 6 a 8 de out de 2003 – – desenvolvimento de produtos:

IV Congr. Bras. Gestão e Desenv. de Produtos - Gramado, RS, Brasil, 6 a 8 de out de 2003

4o CBGDP LOPP/PPGEP/UFRGS 5

Por outro lado, com o mercado competitivo, os consumidores estão mais acostumados com novos produtos, em todos os setores da economia, e não aceitam consumir tanto tempo o mesmo produto, encurtando muito o ciclo de vida dos produtos desta indústria.

De acordo com a ABIMA (2002) as empresas fabricantes de massas e biscoitos podem ser divididas em grupos, com os quais se pode criar uma relação entre as estratégias competitivas de Porter (1986) e os ciclos de vida dos produtos:

– Empresas inovadoras: lançam produtos constantemente para atender clientes específicos cada vez mais. Podem ser relacionadas à estratégia de enfoque, e seus produtos têm ciclos de vida curtos.

– Empresas tradicionais: os lançamentos de produtos ocorrem, porém, com uma freqüência menor. Apresentam características semelhantes às descritas na estratégia de diferenciação, e o ciclo de vida do produto é maior.

– Empresas de produção de baixo custo: as características são as mesmas das empresas que utilizam a estratégia de liderança no custo total. Neste caso, o ciclo de vida dos produtos tende a ser longo.

Dentre as diversas metodologias que podem ser utilizadas como referência para gerenciar o processo de desenvolvimento de produtos, entre elas pode-se destacar os modelos de Fuller, Pugh (1996) e Wheelwrigth & Clark (1992). A de Fuller será utilizada como referência neste trabalho por atender ao setor alimentício. Fuller (1994) estabelece seis etapas para o desenvolvimento de produtos alimentícios: concepção de idéias, conceituação, desenvolvimento, produção, avaliação por consumidores e teste de mercado. Esta metodologia é bastante difundida na indústria de alimentos pela especificidade de sua elaboração para este setor.

– Concepção de idéias. Nesta etapa trabalha-se com idéias surgidas das mais diversas fontes, desde opiniões e sugestões obtidas nos serviços de atendimento ao consumidor ou diretamente nos pontos de venda e, até mesmo, opiniões pessoais de gerentes e proprietários da empresa. Porém, as necessidades do consumidor sempre deverão ser conciliadas com os objetivos e estratégias da empresa.

– Conceituação. As idéias que se mostrarem interessantes passam por um processo de conceituação, no qual boa parte dos processos de desenvolvimento de novos produtos são finalizados, devido a alguma inviabilidade do projeto, seja ela mercadológica ou técnica.São realizadas, nesta etapa, pesquisas de mercado, estudos de viabilidade financeira e de manufatura do produto.

– Desenvolvimento. A fase de desenvolvimento requer a maior quantidade de recursos e tempo, em todo processo, pois nela projeta-se o processo e criam-se as especificações do produto. Uma fase de desenvolvimento mal conduzida pode gerar custos acima do previsto nas fases subseqüentes, e, até mesmo, o fracasso do produto antes ou após o lançamento. Segundo Maffin & Braiden (2001), mais da metade dos processos de desenvolvimento implicam mudanças nos processos de fabricação, ou aquisição de novos equipamentos ou tecnologias, e mais de 80% dos casos envolvem o desenvolvimento de novos fornecedores ou ampliação do mix de produtos fornecidos pelos atuais.

– Produção. Inicia-se a produção em escala piloto, porém, com as mesmas especificações de uma futura produção industrial, para não ocorrer alterações organolépticas no produto planejado. Nesta etapa, podem surgir necessidades de adaptação do processo produtivo,

Page 6: Processo de desenvolvimento de produtos na indústria … · IV Congr. Bras. Gestão e Desenv. de Produtos - Gramado, RS, Brasil, 6 a 8 de out de 2003 – – desenvolvimento de produtos:

IV Congr. Bras. Gestão e Desenv. de Produtos - Gramado, RS, Brasil, 6 a 8 de out de 2003

4o CBGDP LOPP/PPGEP/UFRGS 6

devido a falhas no projeto ou no desenvolvimento. Quanto menor a atenção nas fases anteriores, maiores serão os gastos com tais mudanças.

– Avaliação por consumidores. Na indústria de alimentos, o teste com consumidores é feito através de avaliações sensoriais, com uma amostragem estatística de pessoas que potencialmente podem vir a consumir o produto.

– Teste de mercado. Finalmente, é realizado um teste de mercado. Normalmente, utiliza-se uma cidade ou região como referência e, em caso de sucesso, o produto passa a ter a distribuição planejada inicialmente para ele. Caso contrário, volta-se às etapas anteriores do processo para corrigir eventuais erros e, em casos mais extremos, o produto fracassa.

Geralmente, entre cada fase do processo de desenvolvimento de produtos existe um momento de avaliação e decisão sobre a continuidade do projeto. Isto pode ocorrer de forma mais ou menos informal, no entanto, Cooper (1990) estabelece etapas bem formalizadas, chamando-as de Stage-gates®. Ou seja, paradas formais, para a decisão sobre a continuação ou não do projeto, são fatores decisivos para o sucesso do processo de desenvolvimento.

4. Metodologia de pesquisa De acordo com a SIMABESP (2002) o Brasil em 2002 tinha quase 900 fábricas de biscoitos, aproximadamente 250 moinhos de trigo, diversas fabricas de insumos para a indústria de biscoito, e algumas empresas prestadoras de serviços tecnológicos para este setor.

As fábricas de biscoitos apresentam-se nos mais diversos portes e avanço tecnológico, tendo desde empresas com apenas 8 funcionários, fornecedora de biscoitos para uma grande rede de fast food, até indústrias com quase de 2000 funcionários apenas no setor produtivo, com distribuição dos produtos em todo o país. A diversidade de acesso à tecnologia destas empresas também é bastante grande, tendo no país fábricas instaladas, totalmente controladas por PLC (Controladores Lógicos Programáveis), onde poucos operadores conseguem obter um grande volume de produção, até empresas onde a fonte de energia para os fornos ainda é a lenha, e toda a operação ocorre de forma bastante manual.

Diante a este cenário escolheram-se os estudos de caso como melhor forma de caracterizar o segmento dos médios fabricantes de biscoitos.

Os resultados foram obtidos através de entrevistas, realizadas com funcionários envolvidos diretamente como o processo de desenvolvimento de produto, das organizações estudadas.

O roteiro composto por 25 perguntas abertas, visou responder questões relativas a: caracterização da empresa; caracterização do processo do desenvolvimento de produtos dentro da empresa; envolvimento de fornecedores no PDP e comportamento e tendências do setor sob o ponto de vista da empresa.

5. Resultados e análises Estudo de caso 1 - Empresa A

Foi possível observar como principais características da empresa A e seu processo de desenvolvimento de produtos:

– Empresa de médio porte, fabricante de biscoitos.

– 250 funcionários produzindo 700 toneladas de biscoitos por mês (capac. 1000 ton).

– Distribuição em todo país, principalmente Norte.

– Não existe um PDP formalizado na empresa.

Page 7: Processo de desenvolvimento de produtos na indústria … · IV Congr. Bras. Gestão e Desenv. de Produtos - Gramado, RS, Brasil, 6 a 8 de out de 2003 – – desenvolvimento de produtos:

IV Congr. Bras. Gestão e Desenv. de Produtos - Gramado, RS, Brasil, 6 a 8 de out de 2003

4o CBGDP LOPP/PPGEP/UFRGS 7

– O crivo decisório do PDP está focado no proprietário.

– É possível identificar 5 etapas no PDP.

– A empresa considera o PDP importante, desde que não consuma muitos recursos, diminuindo a competitividade de seus produtos.

– O PDP é bastante limitado devido à falta de acesso as novas tecnologias de fabricação. Algumas atividades de desenvolvimento em parceria com fornecedor de aroma vem sendo realizadas.

Estudo de caso 2 - Empresa B

Foi possível observar como principais características da empresa B e seu processo de desenvolvimento de produtos:

– Empresa de médio porte, fabricante de biscoitos, macarrão, doces.

– 400 funcionários produzindo 1500 toneladas de biscoitos por mês (cap. 2000 ton).

– Distribuição em todo país, principalmente Norte e Centro-oeste.

– Crivo decisório do PDP está focado nos proprietários.

– Não existe um PDP formalizado na empresa.

– Um novo modelo de PDP, formal, será implantado em 2003.

– É possível identificar 6 etapas no PDP proposto.

– Pretende-se dobrar o portfólio de produtos em 2003.

– Processos de desenvolvimento em parceria poderão ocorrer. A tabela 3 resume as características das empresas e entrevistados e suas ligações com o processo ou departamento de desenvolvimento de produtos.

Características Empresa A Empresa B

porte médio médio

origem do capital nacional nacional

entrevistado gerente industrial gerente fabricação

volume produção 700 ton/mês 1500 ton/mês

mercados atendidos nordeste / norte centro-oeste / norte

número de funcionários 250 400

responsável pelo D. P. Gerente industrial Gerente fabricação

existência de depto. D. P. não não

TABELA 3 – Caracterização das empresas fabricantes de biscoito

Em relação ao processo de desenvolvimento de produtos nas empresas pesquisadas, os fabricantes de biscoitos de médio porte acreditam na importância do desenvolvimento de produtos para a expansão dos negócios da empresa, porém, não contam com metodologias formalizadas para tal processo, e nem com departamentos de desenvolvimento. Porém, foi

Page 8: Processo de desenvolvimento de produtos na indústria … · IV Congr. Bras. Gestão e Desenv. de Produtos - Gramado, RS, Brasil, 6 a 8 de out de 2003 – – desenvolvimento de produtos:

IV Congr. Bras. Gestão e Desenv. de Produtos - Gramado, RS, Brasil, 6 a 8 de out de 2003

4o CBGDP LOPP/PPGEP/UFRGS 8

possível observar a existência de um líder, responsável pela condução do processo, entretanto, dependendo constantemente da decisão dos proprietários sobre a continuidade ou não do projeto.

Outro fator possível de observar nas empresas é que os funcionários do setor passam cada vez mais por treinamentos. Os convênios com instituições de ensino e pesquisa vêm tornando-se mais freqüentes e as empresas procuram aprimorar seus sistemas internos da qualidade, principalmente em função de fiscalizações sanitárias.

Outro fato observado nas empresas entrevistadas, é a idéia de desenvolvimento de novos produtos, na maioria das vezes, a partir da concorrência. Através da análise das características e das vendas dos produtos, principalmente, dos grandes fabricantes, tenta-se reproduzir algo semelhante. Outra fonte importante de informações para a criação de novos produtos são os vendedores e distribuidores pois trazem sugestões de produtos consumidos por determinadas regiões.

TABELA 4 – Fases do PDP nas empresas comparadas ao modelo de Fuller (1994)

De uma forma geral, as empresas trabalham com o processo de desenvolvimento de produtos dividido em três ou quatro fases.

A tabela 4 mostra as diversas fases do desenvolvimento de produtos nas empresas pesquisadas. Estas fases foram descritas a partir das informações obtidas nas entrevistas, não existindo de forma documental nestas organizações. Estas etapas são comparadas ao modelo proposto por Fuller (1994)

6. Conclusões É possível observar, nas empresas fabricantes de biscoitos de médio porte estudadas, que o modelo de desenvolvimento proposto por Fuller (1994) ou os demais identificados na literatura, não são seguidos no PDP, porém, nota-se algum tipo de seqüência, mesmo não formalizada, neste processo.

Outra deficiência bastante comum nas empresas estudadas, de médio porte, é uma certa indefinição das responsabilidades e poderes do líder de desenvolvimento de produtos. Por este motivo as atividades costumam consumir tempos maiores que os necessários, ou, em alguns casos, etapas importantes como avaliação da capacidade de produção e fornecimento não são adequadamente realizadas, podendo desta forma se chegar a bons produtos, mas com produção inviável.

Page 9: Processo de desenvolvimento de produtos na indústria … · IV Congr. Bras. Gestão e Desenv. de Produtos - Gramado, RS, Brasil, 6 a 8 de out de 2003 – – desenvolvimento de produtos:

IV Congr. Bras. Gestão e Desenv. de Produtos - Gramado, RS, Brasil, 6 a 8 de out de 2003

4o CBGDP LOPP/PPGEP/UFRGS 9

Para estas empresas o desenvolvimento de produtos não tem a mesma importância na estratégia de negócios como ocorre com as de grande porte, uma vez que trabalham mais próximas à liderança no custo total, com produtos denominados commodities (crakers, Maria, Maisena e rosquinhas), cujo fator mais importante é a oferta de preço baixo a uma qualidade razoável. Os mercados Norte e Nordeste são grandes consumidores destes produtos, além de existir uma demanda significativa para atender programas governamentais, como merenda escolar.

As empresas fabricantes de biscoitos de médio porte têm como objetivo, em longo prazo, melhorar o processo de desenvolvimento de produtos, por visualizarem isto como alternativa para mudar o tipo de mercado e, conseqüentemente, agregar maior valor ao produto.

Um forte fator limitante às empresas de médio porte, no desenvolvimento de uma maior quantidade de produtos, está relacionado ao acesso as tecnologias de processo. Estes fabricantes, normalmente, adquirem equipamentos usados dos grandes fabricantes, desta forma, trabalham com as tecnologias disponíveis neste mercado, dificultando o desenvolvimento de produtos inovadores.

O método utilizado, nas empresas consultadas, de avaliação sensorial, pode ser um dos fatores de limitação do desenvolvimento de produtos, pois é utilizado de forma parcial, normalmente, sem grande atenção para a representatividade da amostragem e com avaliações estatísticas pouco precisas. Ou seja, é feita uma degustação por algumas pessoas e, se a maioria aprovar, o produto é considerado adequado. No entanto, muitas vezes, neste processo, além de não existir significância estatística, os pesos das opiniões são diferentes, em função do nível hierárquico ocupado pelos avaliadores dentro da empresa.

Uma avaliação sensorial feita em condições inadequadas pode apresentar resultados falsos, por estarem aparentemente baseados em metodologias reconhecidas, inclusive estatisticamente, a empresa pode fazer investimentos em projetos pouco viáveis.

As parcerias entre fabricantes de médio porte, fornecedores e prestadores de serviços podem ser consideradas como potenciais, ou seja, existe disposição de fornecedores e prestadores de serviços em trabalhar com estas parcerias, mas os fabricantes ainda utilizam pouco esta vantagem oferecida, e provavelmente, este é o grande diferencial que os grandes fabricantes possuem.

Em relação ao tempo médio de desenvolvimento de produtos, a grande maioria dos projetos desenvolvidos pelos fabricantes de biscoitos estudados, ocorre em poucos meses, desde a concepção da idéia até o lançamento do produto final, fato este bastante compreensível tendo em vista que boa parte dos lançamentos consiste em extensões de linha.

A expansão de mercado depende basicamente do aumento de renda da população e exportação. No primeiro caso o empresário tem menos controle, no entanto, em relação às exportações, a infra-estrutura existente nestas empresas, se somado aos serviços e suprimentos disponíveis, tornam bastante viável a expansão deste setor.

Diante do quadro apresentado, as empresas de médio porte do setor de produção de biscoitos, estudadas, visualizam a importância do processo de desenvolvimento de produtos, porém, devido aos vários anos que este mercado foi fechado à concorrência internacional, ao difícil acesso às tecnologias e à estratégia focada no custo total, este processo deverá ser gradual, a medida que estes fabricantes busquem agregar maior valor aos produtos tentando sair pelo menos com parte de suas linhas de produtos dos denominados commodities do setor.

De uma forma geral conclui-se que este setor vem amadurecendo bastante, entretanto, há muito ainda a ser feito. As empresas fornecedoras e prestadoras de serviços, com pessoal

Page 10: Processo de desenvolvimento de produtos na indústria … · IV Congr. Bras. Gestão e Desenv. de Produtos - Gramado, RS, Brasil, 6 a 8 de out de 2003 – – desenvolvimento de produtos:

IV Congr. Bras. Gestão e Desenv. de Produtos - Gramado, RS, Brasil, 6 a 8 de out de 2003

4o CBGDP LOPP/PPGEP/UFRGS 10

bastante qualificado, deverão ser as que profissionalizarão este importante segmento da economia nacional, agregando maior valor aos produtos dos médios fabricantes.

7. Referências bibliográficas ABIMA –Análise do Mercado - Associação Brasileira das Indústrias de Massas Alimentícias – 2001 Disponível em http//:www.abima.com.br/mercado1.htm. Acesso em 09/08/2002.

CARVALHO, D., ROMANO, A. L. – Controle de Qualidade de Trigo e Derivados e Tratamento e Tipificação de Farinhas – Granotec do Brasil, Curitiba, 1999.

COOPER, R. G. Portfolio management for product development - 2002. – disponível em http://www.u3.dk/portfolio-management.html Acesso em 28/02/2003. Innovation Management U3 Consulting and Seminars.htm

EL-DASH, A. A., CAMARGO, C. O., DIAZ, N. M. – Fundamentos da Tecnologia de Panificação – Secretaria da Indústria, Comércio, Ciência e Tecnologia do Estado de São Paulo, 1980.

FOOD INGREDIENTS (revista) – Pesquisa e Desenvolvimento na Indústria de Alimentos e Bebidas nº19 – ano IV – jul/ago – 2002.

FULLER, G. W. New Food Development – from Concepts to Marketplace. United States: CRC Press, 1994.

IBGE - Confronto das Safras de 2001 e das Estimativas para 2002 - Brasil - Outubro de 2002 disponível em http://www.ibge.net/home/estatistica/indicadores/lspa/default.shtm. Acesso em 15/12/2002.

JACOBSEN, L. A. - Um Pouco De História E Política Do Trigo – EMBRAPA / Trigo – Passo Fundo RS, 2001a – disponível em http://www.cnpt.embrapa.br/agromet/b_5006.html. Acesso em 13/09/2002.

JACOBSEN, L. A. - Novo Cenário Para A Triticultura – EMBRAPA / Trigo – Passo Fundo RS,, 2001b – disponível em http://www.cnpt.embrapa.br/agromet/bo_tri6.html. Acesso em 13/09/2002.

MAFFIN D , BRAIDEN P.- Manufacturing and supplier roles in product development –International Journal of production economics – 69/2001 205 – 213 - Elsevier science – 2001.

MIZUTA, C. Y. Análise da Organização e da Gestão do Processo de Desenvolvimento de Produto na Indústria Alimentar - Estudo de casos no Segmento de Biscoitos e de Laticínios - Dissertação apresentada ao Departamento de Engenharia de Produção da Universidade federal de São Carlos – UFSCar, São Carlos , 2000.

MONTEIRO, A. R. G. – Produção de Biscoitos – Relatório de Estagio Supervisionado – apresentado ao Departamento de Engenharia e Tecnologia de Alimentos – UNESP – São José do Rio Preto, 1996.

PORTER, M. E. – Estratégia competitiva, técnicas para análise de indústrias e da concorrência – Ed Campus – Rio de Janeiro – 1986.

ROZENFELD, H., AMARAL, D. C., TOLEDO, J. C., CARVALHO, J. O Processo de Desenvolvimento de Produtos – Fabrica do Futuro – editora Banas, 2000.

SIMABESP – Estatísticas Sobre a Produção e Consumo de Biscoitos , 2002 – disponível em http://www.simabesp.org.br/simabesp.htm. Acesso em 15/12/2002.

TOLEDO, J. C. Qualidade e Controle de Qualidade Industrial Conceitos, Determinantes e Abordagens - Dissertação apresentada ao Departamento de Engenharias de da Universidade Federal do Rio de Janeiro – COPPE/UFRJ, Rio de Janeiro , 1986.