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Edição 25, volume 1, artigo nº 6, Abril/Junho 2013 D.O.I.: 106020/1679-9840/2506 www.interscienceplace.org - página 93 de 196 O PROCESSAMENTO AUDITIVO CENTRAL E A DESAFINAÇÃO VOCAL THE CENTRAL AUDITIVE PROCESSING AND VOCAL DISCORD Danielle Gregório dos Santos 1 , Marco Aurélio Carino Bouzada 2 1 Universidade Estácio de Sá/Departamento de Fonoaudiologia, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, [email protected] 2 Universidade Estácio de Sá/Mestrado em Administração e Desenvolvimento Empresarial, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, [email protected] Resumo: Este trabalho visa comparar o desempenho de indivíduos afinados e desafinados nos testes de processamento auditivo e verificar se há relação entre processamento auditivo central e desafinação vocal. No Referencial Teórico, foi conceituada a desafinação vocal e apresentada a classificação dos cantores como sendo monotônicos, desafinados, dependentes ou independentes. Foi definido o processamento auditivo dos indivíduos e, em especial, o processamento auditivo central, assim como a forma como o indivíduo recebe e analisa os sons. Em seguida, foram caracterizadas as desordens do processamento auditivo central e apresentadas as funções do profissional de fonoaudiologia ao lidar com tais desordens. Para atingimento dos objetivos desta pesquisa, foram avaliados indivíduos afinados e desafinados com audição normal, comprovada por meio de exame audiológico. Uma análise estatística foi realizada através de diversos testes qui-quadrado para diferenças em k proporções, uma técnica paramétrica de comparação de proporções populacionais oriundas de diferentes grupos (indivíduos afinados, desafinados e dependentes, no caso). Sua aplicação teve por objetivo verificar se a proporção de indivíduos alterados (segundo o TPD MUSIEK, por exemplo) é a mesma nos grupos de sujeitos afinados, desafinados e dependentes. Os resultados obtidos demonstram que existe relação estatisticamente significativa entre o processamento auditivo central e a desafinação vocal do indivíduo, no caso dos testes TPF e TPD, propostos por Musiek. Foi possível concluir que o indivíduo desafinado é um candidato em potencial para a avaliação e terapia fonoaudiológica e que o fonoaudiólogo é o melhor profissional para avaliar e intervir nos indivíduos desafinados com déficits perceptuais

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Edição 25, volume 1, artigo nº 6, Abril/Junho 2013

D.O.I.: 106020/1679-9840/2506

www.interscienceplace.org - página 93 de 196

O PROCESSAMENTO AUDITIVO CENTRAL E A DESAFINAÇÃO VOCAL

THE CENTRAL AUDITIVE PROCESSING AND VOCAL DISCORD

Danielle Gregório dos Santos1, Marco Aurélio Carino Bouzada2

1Universidade Estácio de Sá/Departamento de Fonoaudiologia, Rio de Janeiro, RJ, Brasil,

[email protected]

2Universidade Estácio de Sá/Mestrado em Administração e Desenvolvimento Empresarial, Rio de

Janeiro, RJ, Brasil, [email protected]

Resumo: Este trabalho visa comparar o desempenho de indivíduos

afinados e desafinados nos testes de processamento auditivo e verificar se há relação entre processamento auditivo central e desafinação vocal. No

Referencial Teórico, foi conceituada a desafinação vocal e apresentada a classificação dos cantores como sendo monotônicos, desafinados, dependentes ou independentes. Foi definido o processamento auditivo dos

indivíduos e, em especial, o processamento auditivo central, assim como a forma como o indivíduo recebe e analisa os sons. Em seguida, foram

caracterizadas as desordens do processamento auditivo central e apresentadas as funções do profissional de fonoaudiologia ao lidar com tais desordens. Para atingimento dos objetivos desta pesquisa, foram avaliados

indivíduos afinados e desafinados com audição normal, comprovada por meio de exame audiológico. Uma análise estatística foi realizada através de

diversos testes qui-quadrado para diferenças em k proporções, uma técnica paramétrica de comparação de proporções populacionais oriundas de diferentes grupos (indivíduos afinados, desafinados e dependentes, no

caso). Sua aplicação teve por objetivo verificar se a proporção de indivíduos alterados (segundo o TPD MUSIEK, por exemplo) é a mesma nos grupos

de sujeitos afinados, desafinados e dependentes. Os resultados obtidos demonstram que existe relação estatisticamente significativa entre o processamento auditivo central e a desafinação vocal do indivíduo, no caso

dos testes TPF e TPD, propostos por Musiek. Foi possível concluir que o indivíduo desafinado é um candidato em potencial para a avaliação e

terapia fonoaudiológica e que o fonoaudiólogo é o melhor profissional para avaliar e intervir nos indivíduos desafinados com déficits perceptuais

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auditivos, ou seja, com desordens do processamento auditivo central.

Palavras-chave: Processamento Auditivo Central; Fonoaudiologia;

Desafinação Vocal; Testes da Capacidade Auditiva

Abstract: This paper aims to compare the performance of the tune and out-

of-tune individuals in the auditive processing tests and check the relationship

between central auditive processing and vocal discord. In the theoretical framework, the vocal discord was conceptualized and it was presented the

singers classification as monotones, out-of-tune, dependent or independent. Auditive processing for individuals has been set as it was, in particular, the central auditive processing, as well as the way in which the individual

receives and analyzes the sounds. Then the central auditive processing disorders were characterized and the professional functions of the speech

therapyist to deal with such disorders were presented. In order to achieve this research goals, we evaluated tuned and out-of-tune individuals with normal hearing, confirmed by audiological exam. A statistical analysis was

carried out through several Chi-square tests for differences in k proportions, a parametric technique for comparing population proportions from different

groups (in this case, tuned, out-of-tune and dependent individuals). Its application was to check if the proportion of altered individuals (according to TPD MUSIEK, for example) is the same for tuned, out-of-tune and

dependent groups of individuals.The results show that there a significant relationship between the central auditive processing and the individual vocal discord for the TPF and TPD tests, proposed by Musiek. It was concluded

that the out-of-tune individual is a potential candidate for evaluation and speech therapy and that the speech therapist is the best professional to

assess and intervene in out-of-tune individuals with perceptive auditive deficits, i.e., with central auditive processing disorders.

Key-words: Central Auditive Processing; Speech, Language and Hearing

Sciences; Vocal Discord; Auditive Capability Tests

1. Introdução

A musicalidade é a qualidade que permite ao indivíduo escutar um fragmento

musical, compreendê-lo, memorizar suas sequências e, eventualmente, reproduzi-lo

com sua própria voz. A musicalidade inclui vários elementos constitutivos, a saber:

ouvido melódico ou musical (permite a reprodução de um som em sua frequência e

duração rítmica corretos); sentido rítmico (tanto a fala como o canto, proporciona a

dinâmica expressiva; seja pela velocidade ou pelos acentos); sentido harmônico

(permite o reconhecimento de vários sons simultâneos – acordes); memória musical

(permite a evocação, tanto do ritmo como da melodia, para reconhecer e reproduzir

o fragmento musical) e a inteligência musical (atua como fator de síntese / união

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entre os vários aspectos que constituem a musicalidade) (SEGRE; NAIDICH, 1981).

Para uma reprodução vocal satisfatória daquilo que ouvimos, é necessário ter

uma boa audição e um processamento sensorial eficiente das informações auditivas

pelo sistema auditivo central (ISHII et al., 2006). Através destes mecanismos, um

som pode ser captado, percebido, compreendido e por fim, reproduzido.

O objetivo deste estudo é comparar o desempenho de sujeitos afinados e

desafinados nos testes de processamento auditivo e verificar se há relação entre

processamento auditivo central e desafinação vocal. Através dos resultados colhidos

nos testes do processamento auditivo, pretendemos mapear as possíveis áreas

disfuncionais, que auxi liarão na intervenção fonoaudiológica dessa população.

Esperamos com esse trabalho evidenciar a importância da atuação

fonoaudiológica no indivíduo desafinado, utilizando como ferramenta a avaliação do

processamento auditivo central, que fornecerá dados de como o mesmo lida com a

informação auditiva por ele detectada, identificando possíveis prejuízos no processo

gnósico auditvo. Acreditamos ser de suma importância o programa de intervenção

fonoaudiológica nas desordens do processamento auditivo, pois permitirá minimizar

ou impedir a permanência dessa disfunção (PEREIRA; SCHOCHAT, 1997).

2. Referencial teórico

O termo desafinação vocal, apesar de uso corrente entre profissionais e leigos, não

é de fácil definição, devido ao fato de depender do contexto em que o termo é

usado. O mesmo pode ser analisado sob o ponto de vista acústico e também

cultural. Como as leis acústicas não são suficientes para justificar a escolha do que

é considerado afinado, a questão dos padrões de afinação pode ser vista como um

fator cultural, uma vez que cada cultura escolhe seus próprios sistemas de afinação.

São definidas como desafinadas aquelas pessoas que, apesar de conviverem com

os padrões musicais comuns à nossa cultura, não conseguem reproduzir

vocalmente uma linha melódica, cometendo erros, entre os intervalos das notas, que

a tornam diferente do modelo sugerido (SOBREIRA, 2003).

Baseando-se no mesmo modelo proposto por Forcucci (1975), os indivíduos

são classificados de acordo com sua reprodução vocal em quatro grupos, a saber:

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● Cantores monotônicos: são considerados os indivíduos que apresentam o

maior grau de dificuldade em conseguir a afinação vocal, em geral,

apresentando também o monotonismo na voz falada. Não conseguem

reproduzir o som proposto, conseguindo apenas modificar a intensidade.

Em geral, esses indivíduos não percebem que cantam diferente do modelo

proposto;

● Cantores desafinados: são indivíduos capazes de seguir parcialmente o

som proposto, gerando distorções na afinação de grau leve a severo. Os

indivíduos deste grupo podem ou não perceber que sua reprodução difere

do modelo proposto, desconhecendo a forma de corrigir seus desvios;

● Cantores dependentes ou semitonados: são indivíduos que tendem a

desafinar, quando cantam sozinhos, mas que são capazes de cantar

satisfatoriamente se acompanhados por outra voz ou instrumento, que lhe

servirá de “voz-guia”;

● Cantores independentes: neste grupo encontram-se a maior parte das

pessoas consideradas afinadas. Podemos dizer que neste grupo os

indivíduos podem cometer alguns desvios na reprodução do modelo

proposto, quando cantam “a capella”, ou seja, sem nenhum

acompanhamento vocal ou instrumental. Os desvios cometidos por estes

indivíduos são aceitos dentro de um padrão de normalidade, por serem

quase imperceptíveis.

O processamento auditivo é o modo como lidamos com as informações

auditivas que recebemos, ou seja, a capacidade de analisar, associar e interpretar

as informações sonoras que nos chegam pelo sentido da audição. Quando

utilizamos somente a terminologia processamento auditivo, estamos então nos

referindo a todas as habilidades auditivas em conjunto, desde a detecção até a

compreensão da mensagem acústica. Já o processamento auditivo central, se refere

aos processos realizados predominantemente pelas estruturas do sistema nervoso

auditivo central e córtex; não considerando a detecção do som (AQUINO, 2002). Em

suma, as atividades periféricas são responsáveis pela sensação do som, enquanto

as centrais são responsáveis pela percepção (SCHOCHAT, 1996).

Segundo vários autores especialistas, esse processo ocorre no sistema

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auditivo periférico (orelha externa, média, interna e VIII par), no sistema auditivo

central (tronco cerebral, vias subcorticais, córtex auditivo - lobo temporal, corpo

caloso) e também em áreas não-auditivas centrais (lobo frontal, conexão temporo-

parietais, lobo occipital) (STEINER, 1999).

A função analisadora do sistema auditivo tem sido nomeada, de forma prática

e corriqueira, entre os profissionais afins, como percepção auditiva, ou percepção da

fala, ou processamento auditivo. A percepção auditiva é, por um lado, a organização

neural das sensações acústicas e, por outro, a sinalização que o indivíduo faz de

algo que apreende no mundo exterior (MACHADO, 2003).

Para que o indivíduo receba e analise os sons, ele possui em seu organismo

um conjunto de estruturas denominado sistema auditivo periférico e central

(PEREIRA; CAVADAS, 1998). Essas estruturas possuem habilidades auditivas

específicas que permitem ao indivíduo adquirir linguagem; armazenar, arquivar

informações acústicas e recuperá-las depois; monitoramento da sua voz, dentre

outras (AQUINO, 2002). As habilidades próprias do processamento que ocorre no

sistema funcional auditivo: primeiro, a atenção, habilidade essa que envolve a

localização da fonte sonora (se vem da direita, da esquerda, de cima ou de baixo), o

destaque de figura-fundo (dirigir a atenção para um som, o que será o foco) e o

fechamento (predizer mediante poucas pistas, de forma possível à fase seguinte, o

reconhecimento), a identificação do sinal que requer uma previsibilidade semântica,

feita pelo reconhecimento do contexto, o qual determina a discriminação entre os

sinais semelhantes, sendo todos amparados pela função de memória e, por último, a

habilidade de integração, que envolve a associação de informações vindas de outros

aspectos perceptivos, de modo que torne o processamento organizado e funcional

(MACHADO, 2003).

Considera-se disfunção auditiva central ou desordem do processamento

auditivo central um distúrbio da audição em que há um impedimento da habilidade

de analisar e/ou interpretar padrões sonoros. Esta inabilidade pode ser o resultado

de um prejuízo da capacidade biológica inata do organismo de um indivíduo e/ou

falta de experienciação em um meio ambiente acústico. Tem como prováveis causas

alterações neurológicas ou alterações sensoriais auditivas (como, por exemplo, as

perdas auditivas condutivas, mesmo as transitórias, decorrentes de episódios de

otite média na infância) (SCHOCHAT, 1996).

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As desordens do processamento auditivo central podem ser divididas em

quatro categorias: decodificação, codificação, organização e decodificação não

verbal ou processo gnósico não verbal. Dentre as queixas mais comuns que os

indivíduos com alteração no processamento auditivo central podem apresentar,

destacam-se: dificuldade para aprender músicas; alterações na pronúncia;

dificuldade de memória (instruções, nomes, estórias, etc.), dentre outras (AQUINO,

2002).

O fonoaudiólogo normalmente não está incluído entre os profissionais

requisitados para trabalhar os indivíduos ditos “desafinados”. Conhecer o

processamento auditivo de cantores afinados pode auxiliar a compreender o fato de

um cantor desafinado ser consequência de sua própria audição atípica (ISHII et al.,

2006). Sendo o fonoaudiólogo responsável em atuar na prevenção, avaliação e

reabilitação dos distúrbios da comunicação humana, é importante ressaltar que esse

é o melhor profissional para assistir indivíduos com déficits perceptuais auditivos

(SCHOCHAT, 1996). Sabe-se, também, que nas alterações do processamento

auditivo a conduta principal é a fonoterapia.

3. Metodologia

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estácio

de Sá. Todos os indivíduos participantes deste estudo foram voluntários. Cada

indivíduo foi esclarecido sobre o intuito do estudo, e o mesmo foi iniciado após o

estabelecimento dos critérios de inclusão, a concordância e assinatura do termo de

consentimento livre e esclarecido. Foram respeitados todos os princípios éticos que

versam a resolução 196/96 do Ministério da Saúde (1996) sobre ética em pesquisa

com seres humanos.

Foram selecionados 17 indivíduos, de ambos os gêneros, na faixa etária de

17 a 71 anos, sendo 6 do gênero feminino e 11 do gênero masculino. Os

participantes foram separados em três grupos, a partir dos resultados obtidos no

Protocolo de Avaliação dos Indivíduos Desafinados (SOBREIRA, 2003; FORCUCCI,

1975; PEREIRA; SCHOCHAT, 1997), a saber: Grupo 1 – afinados (4 indivíduos,

sendo 3 do gênero masculino e 1 feminino); Grupo 2 – dependentes (7 indivíduos,

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sendo 2 do gênero masculino e 5 feminino) e Gupo 3 – desafinados (6 indivíduos,

sendo todos do gênero masculino).

Como critério de inclusão, participaram do estudo apenas os indivíduos com

audição normal comprovada com exame de audiometria tonal liminar.

As avaliações foram realizadas na Clínica de Audiologia do Campus

Rebouças - Universidade Estácio de Sá.

Aplicou-se o Protocolo de Avaliação dos Indivíduos Desafinados, organizado

com base nos trabalhos de Sobreira (2003), Forcucci (1975) e Pereira e Schochat

(1997). Os indivíduos que não reproduziram satisfatoriamente as provas desse

protocolo (com acompanhamento vocal ou instrumental e a capella), foram

classificados de acordo com a incidência de desvios cometidos em dependentes,

desafinados e monotônicos (FORCUCCI, 1975).

O protocolo de avaliação dos indivíduos desafinados foi realizado com os

estímulos apresentados em campo livre, por meio de gravação em disco a laser

tocado em um CD player no Computador HP Brio Modelo BA410.

Posteriormente, os grupos 1, 2 e 3 foram submetidos à avaliação do

processamento auditivo, utilizando-se as provas de Memória Sequencial para Sons

Não-Verbais (MSNV); Memória Sequencial para Sons Verbais (MSV); Localização

Sonora (LS); Staggered Spondaic Word Test (SSW); Teste Dicótico Não-Verbal

(TDNV); Teste Padrão de Frequência (TPF) e Teste Padrão de Duração (TPD),

proposto por Musiek (1994); Teste Padrão de Frequência (TPF) e Teste Padrão de

Duração, proposto por Taborga (1999).

A avaliação simplificada do processamento auditivo foi utilizada nesse estudo,

porque os três testes em conjunto (MSNV, MSV, LS) apresentam sensibilidade de

50% em indivíduos com faixas etárias superiores a 6 anos de idade. Assim, quando

um indivíduo apresenta alterações nos testes dióticos, pode-se afirmar a existência

de uma desordem do processamento auditivo central (STEINER, 1999). É

importante ressaltar que, mesmo que o indivíduo tenha apresentado respostas

adequadas nesses testes, não se pode descartar a hipótese de haver alteração do

processamento auditivo (AQUINO, 2002). As habilidades auditivas avaliadas nestes

testes são, respectivamente, memória sequencial para sons não-verbais e verbais, e

localização da fonte sonora (PEREIRA; SCHOCHAT, 1997).

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Utilizou-se o teste SSW com o objetivo de avaliar o desempenho de cada

orelha, determinando onde está a disfunção; a atenção de cada via auditiva; a

memória imediata e de sequências; e a maturidade do sistema auditivo (MACHADO,

2003). As habilidades auditivas avaliadas são: figura-fundo e ordenação temporal

complexa de sons verbais. O SSW realiza duas análises: uma quantitativa (total de

erros cometidos nas situações de competição e não competição), permitindo-nos

saber o grau de severidade do distúrbio do processamento auditivo central (normal,

leve, moderado e severo) e uma qualitativa (tendência das respostas dadas pelo

indivíduo) (PEREIRA; SCHOCHAT, 1997).

O TDNV tem por escopo investigar a comunicação inter-hemisférica nas

habilidades de atenção seletiva e separação binaural, uti lizando como estímulos

sons não-verbais (AQUINO, 2002). O indivíduo deve focar sua atenção em um

determinado som, ignorando o apresentado na orelha oposta, e associá-lo a uma

figura correspondente exposta em um quadro. A figura encontra-se inserida em um

contexto, que não é o objeto sonoro em si (STEINER, 1999).

Musiek et al. (1980) propuseram os TPF e TPD, que avaliam o

processamento temporal e, especificamente a capacidade de reconhecer, reter e

resgatar a ordem e sequência temporal das informações auditivas. O TPF consiste

na apresentação de 3 tons sucessivos, sendo que um deles difere em frequência

entre os dois. As frequências uti lizadas no TPF são 880Hz (som grave) e 1122Hz

(som agudo), tendo a duração de 500ms e intervalo de 300ms entre os estímulos

(ISHII et al., 2006). No TPD há a apresentação de 3 tons sucessivos, sendo que um

deles difere em duração dos outros dois. Os estímulos têm a duração de 250ms

(som curto) e 500ms (som longo).

Os testes organizados por TABORGA utilizam como estímulo o instrumento

musical flauta transversa. Para o TPF utilizou-se o tom 440 Hz (para o som grave) e

o tom 493 Hz (para o som agudo). O TPD utiliza o tom 440 Hz, modificando apenas

o tempo de duração dos estímulos, sendo 161 ms (para o som longo) e 59 ms (para

o som curto). O tempo de intervalo de silêncio entre eles teve a duração média de 50

ms. Os estímulos em cada padrão temporal foram organizados em itens de 3 e de 4

sequências, contendo cada um 10 itens (TABORGA, 1999). A modalidade de

resposta solicitada aos indivíduos avaliados em ambos os testes foi nomeação.

Somente os indivíduos que cometeram erros no TPD e TPF com sequência de 4

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sons realizaram os testes com sequência de 3 sons.

A audiometria tonal liminar foi realizada em uma cabina acusticamente

tratada, com o audiômetro modelo Beltone 2000 Clinical Audiometer, nas

frequências sonoras de 250Hz, 500Hz, 1000Hz, 2000Hz, 3000Hz, 4000Hz, 6000Hz

e 8000Hz. O método escolhido para a determinação do limiar audiológico do

paciente foi o método descendente/ascendente (REDONDO; LOPES FILHO, 1997).

Os testes do processamento auditivo foram realizados em uma cabina

acusticamente tratada, com o audiômetro modelo Beltone 2000 Clinical Audiometer

(de dois canais), com os estímulos apresentados via fones de ouvido, por meio de

gravação em disco a laser tocado em um Cd player da marca Panasonic Portable

Cd Player Sl-S125, estando o mesmo acoplado ao audiômetro.

A análise estatística foi realizada através de diversos (um para cada forma de

avaliação do processamento auditivo) testes χ2 (qui-quadrado) para diferenças em k

proporções, com nível de significância igual a 10%. O teste em questão consiste em

uma técnica paramétrica de comparação de proporções populacionais oriundas de

diferentes grupos (afinados, desafinados e dependentes, no caso) e a sua aplicação

teve por objetivo verificar se a proporção de indivíduos alterados (segundo o TPD

MUSIEK, por exemplo) é a mesma nos grupos de sujeitos afinados, desafinados e

dependentes.

4. Apresentação dos resultados

Para cada um dos testes de avaliação do processamento auditivo, foi realizado um

teste χ2 para verificar se a proporção de indivíduos alterados (segundo o teste de

processamento auditivo em questão) entre os afinados é a mesma que entre os

desafinados e dependentes.

A Tabela 1 a seguir mostra a quantidade de indivíduos alterados e normais

(segundo o TPD MUSIEK) dentro dos grupos de afinados, desafinados e

dependentes (tabela de contingência), além do valor p do teste estatístico para

diferença entre as proporções de indivíduos alterados nos três grupos.

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Grupo Afinados Desafinados Dependentes Valor p

Alterados 0 4 2

Normais 4 2 58,60%

Tabela 1 – Tabela de contingência e valor p do teste para diferença entre proporções (TDP MUSIEK)

Como pode ser observado, a proporção de indivíduos alterados entre o grupo

de desafinados (4 em 6) é bem maior do que entre o grupo de dependentes (2 em 7)

e maior ainda do que entre o grupo de afinados (0 em 4). O valor p do teste χ2

realizado revela que existe apenas 8,60% de probabilidade de essa diferença dever-

se ao acaso (e não à existência de uma diferença real entre as três proporções).

Como o nível de significância adotado foi de 10%, confirma-se que a diferença

encontrada é estatisticamente significante e rejeita-se a hipótese de igualdade entre

as proporções em favor da hipótese de que existe diferença entre as proporções de

indivíduos alterados (segundo o TPD MUSIEK) nos três grupos. Em outras palavras,

há relação, a 10% de significância, entre o processamento auditivo central (medido

pelo TPD MUSIEK) e a desafinação vocal do indivíduo.

O mesmo procedimento estatístico foi feito para as outras formas de

avaliação do processamento auditivo, exceto para o TPD TABORGA 3 sons, já que

apenas indivíduos desafinados (5 deles) realizaram o teste, impossibilitando a

comparação com indivíduos afinados e dependentes. Os resultados estão

apresentados na Tabela 2 a seguir.

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Grupo Afinados Desafinados Dependentes Valor p

Alterados 0 4 2

Normais 4 2 5

Alterados 0 5 3

Normais 4 1 4

Alterados 0 1 2

Normais 0 0 3

Alterados 0 1 0

Normais 4 5 7

Alterados 0 1 2

Normais 4 5 5

Alterados 2 3 4

Normais 2 3 3

Alterados 0 2 1

Normais 4 4 6

Alterados 0 1 0

Normais 4 5 7

Alterados 0 1 0

Normais 4 5 7

Alterados 0 0 0

Normais 4 6 7

Alterados 0 1 0

Normais 4 5 7

Ausente 0 2 0

Presente 4 4 7

Alterados 3 3 4

Normais 1 3 3

Alterados 1 1 1

Normais 3 5 6

Alterados 0 1 0

Normais 4 5 7

Alterados 0 2 2

Normais 4 4 5

TPD Musiek

TPF Musiek

TPF Taborga 3

sons

TPD Taborga 4

sons

TPF Taborga 4

sons

Atenção livre

Atenção

direita

Atenção

esquerda

Seqüência

sonora

Localização

sonora

RCP

S

S

W

Seqüência

verbal

Total de

acertos

Efeito ordem

Efeito auditivo

Tipo A

8,60%

3,38%

27,33%

37,76%

37,76%

43,82%

37,76%

37,76%

12,52%

100,00%

Teste

72,86%

90,16%

T

D

N

V

Avaliação

simplificada

PAC

48,77%

95,87%

38,15%

37,76%

Tabela 2 – Tabela de contingência e valor p do teste para diferença entre proporções (todas as avaliações)

É possível ver que a diferença na proporção de indivíduos alterados entre os

sujeitos afinados, desafinados e dependentes só se mostrou estatisticamente

significativa (a 10%) nos casos das avaliações TPD e TPF - MUSIEK (essa última

sendo a mais significativa de todas). O critério RCP (Avaliação simplificada PAC)

revelou-se quase significativo (com valor p igual a 12,52%).

Nenhum dos outros critérios mostrou-se capaz de mostrar a relação, a 10%

de significância, entre o processamento auditivo central e a desafinação vocal do

indivíduo. Os critérios Atenção livre (TDNV), Sequência verbal (Avaliação

simplificada PAC) e Efeito ordem (SSW) mostraram-se totalmente incapazes de

influenciar a afinação do indivíduo (valores p superiores a 90%).

A sensibilidade dos diferentes testes para detectar alteração no

processamento auditivo nos sujeitos desafinados pode ser entendida como sendo

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inversamente proporcional aos valores p obtidos nos respectivos testes χ2, que

podem ser visualizados, comparativamente, no gráfico 1 a seguir.

Gráfico 1 – Valores p dos testes χ2 referentes a cada forma de avaliação do

processamento auditivo

5. Discussão

Os cantores afinados são indivíduos que emitem melodias de músicas com

harmonia através da voz, emitindo as notas com exatidão (ISHII et al., 2006). Esse

fenômeno foi descrito como musicalidade (SEGRE; NAIDICH, 1981). Para que isto

ocorra, existem alguns pré-requisitos, tais como: ter uma boa audição, tanto

periférica como central, funcionamento adequado do sistema fonatório, entre outros

(ISHII et al., 2006). O indivíduo que não acompanha a melodia musical através do

pitch, pode apresentar alguma alteração cognitiva (HERESNIAK, 2004). Tal relação

não foi observada nos sujeitos participantes desse estudo.

Alguns autores sugerem que o treinamento musical favorece a eficácia das

habilidades auditivas, tais como: atenção e discriminação de frequência, intensidade

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e duração dos estímulos sonoros (SILVA et al., 2000).

De acordo com os relatos de Musiek et al. (1980), os padrões tonais são

reconhecidos como música ou melodia porque são compostos por tons de diferentes

frequências e durações em ordens temporais diversas. Com isso, a exposição à

teoria musical e ao treinamento auditivo são fatores importantes para a análise e

desempenhos dos resultados nessa tarefa de reconhecer padrões de frequência.

Baseado nisso, podemos constatar a associação entre a educação musical e

competência em reconhecimento de padrão de frequência.

Um dado observado é que alguns indivíduos participantes desse estudo,

apesar de serem músicos instrumentistas, obtiveram resultados rebaixados no

Protocolo de Avaliação dos Indivíduos Desafinados (SOBREIRA, 2003; FORCUCCI,

1975; PEREIRA; SCHOCHAT, 1997) e nos testes selecionados para a Avaliação do

Processamento Auditivo. Isso demonstra que o aprendizado musical, nesses casos,

não foi suficiente para que os mesmos realizassem as avaliações propostas

satisfatoriamente.

Através desse estudo, verificou-se que dos testes selecionados para avaliar o

processamento auditivo central, os mais sensíveis para detectar as alterações nessa

população específica foram o TPF e TPD, propostos por Musiek et al. (1980)

(conforme Tabela 2 anterior). Em outras palavras, quanto maior o grau de

desafinação vocal, pior é o desempenho do sujeito nos testes relacionados à

ordenação temporal (TPD e TPF - MUSIEK), conforme revelam os Gráficos 4, 5, 6 e

7 a seguir.

De uma maneira geral, comparando o desempenho de cada grupo em relação

às avaliações realizadas nesse estudo, constatou-se que o grupo de afinados obteve

melhor desempenho do que os grupos dos dependentes e desafinados,

principalmente nos testes que avaliam o processamento temporal (TPD e TPF –

MUSIEK), conforme ilustram os Gráficos 4, 5, 6 e 7 a seguir. Achados semelhantes

foram encontrados por Gil et al. (2000) e Silva et al. (2000), em indivíduos que

desenvolveram habilidades musicais comparados com indivíduos não-músicos.

Pinheiro e Musiek (1985) afirmaram que o desempenho de sujeitos músicos é

melhor do que sujeitos não-músicos no TPF. Em nosso estudo, os sujeitos afinados

obtiveram melhor desempenho no TPF (MUSIEK et al., 1980) do que os grupos 2 e

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3 (conforme Gráficos 6 e 7 a seguir).

Taborga (1999) relatou em seu estudo que o desempenho dos músicos (cerca

de 99% de acertos) no TPF foi melhor e estatisticamente significante em

comparação com os não-músicos (cerca de 60% dos acertos). O desempenho dos

músicos no TPD foi semelhante ao desempenho dos não músicos (cerca de 97% de

acertos) (TABORGA, 1999). Em nosso estudo, o desempenho dos Grupos 1, 2 e 3

nos testes propostos por Taborga (1999) (TPD e TPF de 3 e 4 sons) foi equilibrado e

demonstrou ser estatisticamente insignificante (conforme Tabela 2 anterior).

As habilidades auditivas recrutadas no SSW (ordenação temporal complexa

de sons verbais, memória e figura-fundo), são diferentes das usadas nos TPD e TPF

(reconhecimento de padrões temporais, ordenação temporal de sons não -verbais e

memória). Nesse estudo, observou-se que o desempenho dos Grupos 1, 2 e 3 no

SSW foi equilibrado e que a diferença encontrada foi estatisticamente insignificante

para demonstrar a relação de desafinação vocal e processamento auditivo central,

conforme ilustram os Gráficos 2 e 3 a seguir. Baseado nesses dados, verificou-se

que o SSW não é um teste sensível para detectar alterações do processamento

auditivo em indivíduos desafinados.

Gráficos 2 e 3 – Comparação do desempenho e nível de normalidade dos grupos 1, 2 e 3 no SSW

Os Grupos 2 e 3 tiveram os piores resultados nos TPD e TPF (MUSIEK), se

comparados com o Grupo 1, conforme ilustram os Gráficos 4, 5, 6 e 7 a seguir.

Esses resultados evidenciam que os Grupos 1 e 2 apresentam, em sua maioria,

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desordem do processamento auditivo central do tipo decodificação não verbal ou

processo gnósico não-verbal (dificuldades na análise acústica dos aspectos não-

verbais).

Gráficos 4 e 5 – Comparação do desempenho e nível de normalidade dos grupos 1, 2 e 3 no TPD Musiek

Gráficos 6 e 7 – Comparação do desempenho e nível de normalidade dos grupos 1, 2 e 3 no TPF Musiek

Hall e Mueller (1997) afirmam que os TPD e TPF são sensíveis na detecção

de alterações corticais e inter-hemisféricas e resistentes à perda coclear. No

entanto, apresentam as desvantagens de não serem sensíveis na detecção de

alterações do tronco cerebral e não propiciarem informações sobre a lateralidade da

lesão, em casos de alterações bilaterais, quando aplicados em sujeitos com lesões

de apenas um hemisfério. O corpo caloso atua diretamente na identificação das

sequências de frequência e duração. Alguns autores acreditam que o hemisfério

direito possivelmente reconheça o contorno do padrão acústico e essa informação

percorra as fibras do corpo caloso, para chegar ao hemisfério esquerdo, a fim de

organizar a resposta motora (DIAS, 2005). As sequências de duração são

processadas pelo hemisfério esquerdo e são realizadas associações com áreas intra

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e inter-hemisféricas para a execução da resposta motora (BALEN, 1997). Os dados

supra citados podem servir de base para mapearmos as estruturas anatômicas que

possam estar disfuncionais nos indivíduos pertencentes ao Grupo 2 e 3.

Constatamos através da aplicação do Protocolo de Avaliação dos Indivíduos

Desafinados (SOBREIRA, 2003; FORCUCCI, 1975; PEREIRA; SCHOCHAT, 1997),

que os avaliados obtiveram melhores resultados nos itens “B” e “C” do que nos itens

“A” e “E” (conforme Gráficos 8 e 9 a seguir). Acreditamos que a voz-guia e o

acompanhamento simultâneo do teclado foram fatores facilitadores para a afinação

dos avaliados.

Gráficos 8 e 9 – Protocolo de Avaliação dos Indivíduos Desafinados: Avaliação da

Reprodução Vocal

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6. Considerações Finais

Os testes SSW, TDNV, MSV, MSNV, uti lizados na avaliação do processamento

auditivo central, não foram estatisticamente significantes, nesse estudo, para

relacionar o processamento auditivo central com a desafinação vocal.

Através desse estudo, verificou-se que da bateria de procedimentos utilizados

para avaliar o processamento auditivo central, os mais sensíveis para detectar as

alterações nos sujeitos desafinados foram o TPF e TPD, propostos por Musiek

(1994).

Com base nos resultados colhidos na avaliação do processamento auditivo

central, podemos concluir que a maior parte dos indivíduos alocados nos Grupos 2 e

3 apresentou desordem do processamento auditivo central do tipo decodificação não

verbal ou processo gnósico não-verbal (dificuldades na análise acústica dos

aspectos não-verbais). Os possíveis achados nesse tipo de desordem são:

dificuldades musicais, pobre percepção de ritmo, fala monótona, dentre outros.

Os resultados desse estudo servem de base para afirmarmos que o indivíduo

desafinado é um candidato em potencial para a avaliação e terapia fonoaudiológica

e que o fonoaudiólogo é o melhor profissional para avaliar e intervir nos indivíduos

desafinados com déficits perceptuais auditivos (SCHOCHAT, 1996), ou seja, com

desordens do processamento auditivo central.

7. Referências

AQUINO, A. Processamento auditivo: eletrofisiologia & psicoacústica. São Paulo: Lovise, 2002.

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61, Washington, 1975.

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Federal de São Paulo e Universidade Católica de Petrópolis. Rio de Janeiro, 1999.

Sobre os autores

Danielle Gregório dos Santos possui graduação em Música – Canto pela

Universidade Federal do Rio de Janeiro e graduação em Fonoaudiologia pela

Universidade Estácio de Sá. Atualmente pertence ao Corpo Coral da Fundação

Theatro Municipal do Rio de Janeiro, trabalha na preparação vocal de profissionais

de voz e atua como cantora camerística e operística no meio musical erudito. Tem

interesse e experiência na área de Preparação Vocal e Fonoaudiologia.

Marco Aurélio Carino Bouzada possui graduação em Engenharia de Produção

pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, mestrado em Administração pelo

Instituto Coppead de Administração/UFRJ e doutorado em Administração pelo

Instituto Coppead de Administração/UFRJ. Atualmente é professor adjunto do

quadro permanente do Mestrado em Administração da Universidade Estácio de Sá,

professor titular do curso de graduação em Administração da ESPM e professor do

Curso de Formação em Finanças do COPPEAD (UFRJ). Tem interesse e

experiência na área de Business Games, Logística, Estatística, Métodos

Quantitativos e Pesquisa Operacional.