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'O GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA PROPOSTA DE TRABALHO POR MEIO DE SEQUÊNCIA DIDÁTICA

Autora: Neiva Dariva1

Orientadora: Profa. Dra Terezinha da Conceição Costa-Hübes (UNIOESTE)2

RESUMO: Trabalhar com os gêneros discursivos na sala de aula é um desafio que nós, professores de Língua Portuguesa, estamos enfrentando a partir da organização das Diretrizes Curriculares do Estado Paraná (PARANÁ, 2008). Para isso, buscamos uma metodologia que propicie não só abordar o gênero, mas atrelá-lo aos eixos da oralidade, da leitura, da análise linguística e da produção de textos, garantindo, assim, o trabalho com a língua em todas essas perspectivas. Diante do exposto, o objetivo deste artigo é relatar uma proposta de trabalho com Jovem e Adulto, envolvendo, principalmente, a prática da leitura, por meio de textos do gênero discursivo poema, adotando, para isso, a metodologia da sequência didática. Para desenvolver as reflexões teóricas, pautamo-nos principalmente em Bakhtin (1992) e Marcuschi (2003), no que se refere às reflexões sobre gêneros; Koch e Elias (2006) para tecermos reflexões sobre a leitura; Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004) para compreensão da proposta da sequência didática; Costa-Hübes (AMOP, 2007) e Costa-Hübes (2008), da qual adotamos os encaminhamentos metodológicos adaptados para o trabalho com sequências didáticas nas aulas de Língua Portuguesa. A partir da seleção do gênero poemas, desenvolvemos atividades com foco especial na leitura, as quais fizeram parte do Projeto de Implementação Pedagógica aplicado em uma turma da Educação de Jovens e Adultos – II Segmento. Assim, podemos dizer que o desenvolvimento desse artigo articula-se à concepção da Língua Portuguesa proposta nas Diretrizes Curriculares dos Jovens e Adultos e também, nas Diretrizes Curriculares da Rede Pública do Estado do Paraná. As atividades estão centradas na construção e reconstrução de conhecimentos pelos sujeitos envolvidos na execução do trabalho com a Produção Didática. PALAVRAS CHAVE: leitura; gênero discursivo poema; sequência didática.

1 Introdução

A importância da leitura e da escrita na Educação de Jovens e Adultos é o

tema da nossa pesquisa. Reconhecendo as dificuldades dos educadores em

despertar o interesse pela leitura, é que propomos alguns encaminhamentos

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didáticos, utilizando algumas técnicas e recursos, aplicando, dessa forma, outras

metodologias para trabalhar a leitura, a escrita e a produção do gênero discursivo

poema, com alunos matriculados no Centro de Educação Básica de Jovens e

Adultos (doravante, CEEBJA).

Nesse sentido, provocamos reflexões acerca da necessidade de ler como

uma prática social. Na concepção de linguagem assumida pelas Diretrizes

Curriculares da Educação Básica (de ora em diante, DCE) (PARANÁ, 2008), a leitura

é um ato dialógico, interlocutivo, que envolve demandas sociais, históricas, políticas,

econômicas, pedagógicas e ideológicas de determinado momento. Ao ler, o

indivíduo busca as suas experiências, os seus conhecimentos prévios, a sua

formação familiar, religiosa, cultural, enfim, as várias vozes que o constituem.

Portanto, ao implementar nossa ação pedagógica, procuramos incentivar no

Jovem e no Adulto a prática da leitura por meio de textos do gênero poema, de

maneira que estimulasse o interesse pela leitura, ampliasse seus conhecimentos de

mundo e desenvolvesse sua sensibilidade. Partindo da realidade social e cultural do

aluno em relação ao processo de ensino-aprendizagem, constatamos que é

necessário repensarmos uma educação de qualidade, para a formação do

conhecimento. Nesse sentido, consideramos importante, na proposta de pesquisa,

elaborar um encaminhamento didático com a intenção de formar sujeitos reflexivos,

ativos, capazes de construir seu próprio conhecimento, ao serem despertados para o

prazer da leitura. Como diz Silva: “[...] a prática da leitura é um princípio de

cidadania” (SILVA 2005, p. 57).

O nosso propósito, então, no trabalho com poemas, foi que o aluno

aprendesse a fazer uma leitura crítica, transportando informações para o uso do

cotidiano, pois ao ser preparado para ser leitor, que tivesse o olhar voltado à

criticidade, contribuindo com seu exercício de cidadania, condição indispensável a

fim de que se torne sujeito de sua própria história.

Este trabalho de leitura e escrita foi elaborado para oferecer aos alunos do

CEEBJA a oportunidade de melhor desenvolver suas competências de leitura e

escrita de poemas, uma vez que o cidadão ativo e consciente é aquele que melhor

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consegue realizar uma leitura universal que o possibilite tornar-se agente

transformador e construtor de sua própria história. Quando o aluno lê, analisa e

escreve bem, se aproxima mais do sucesso em diferentes situações de sua

existência, pois é lendo, escrevendo e compreendendo, numa perspectiva crítica,

que constrói seus conhecimentos, adquirindo mais cultura, destacando-se, assim, do

restante da multidão, da massa manipulada por aqueles que leram um pouco mais.

Para desenvolver as reflexões teóricas, pautamo-nos, principalmente nas

concepções de leitura de Koch e Elias (2006) quando afirma que “a leitura de um

texto exige muito mais que o simples conhecimento linguístico compartilhado pelos

interlocutores, participando, de forma ativa, da construção do sentido e da interação

pela linguagem” (KOCH e ELIAS, 2006, p. 7); Nos encaminhamentos metodológicos

propostos por Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), seguindo a adaptação proposta

por Costa-Hubes (2008); e ao aporte teórico de Bakhtin (1992) e Marcuschi (2003)

para a compreensão de gêneros discursivos. Adotamos, assim, a metodologia da

sequência didática (doravante, SD) que consiste num conjunto de atividades

escolares em torno de um gênero, com a finalidade de auxiliar o aluno a ler, falar e

escrever em diferentes situações de comunicação.

Dessa forma, o propósito deste artigo é apresentar resultados da pesquisa e

implementação pedagógica que desenvolvemos durante o PDE, nos anos de 2011 e

2012, socializando reflexões teóricas, proposições didáticas e encaminhamentos

práticos que desenvolvemos a partir do tema Gênero Discursivo Poema com alunos

do CEEBJA, durante o período de agosto a dezembro de 2011. Com isso,

desejamos apresentar alguns resultados conquistados durante esse percurso de

estudo e pesquisa.

Para isso, o artigo está organizado da seguinte forma: primeiramente

traçamos algumas reflexões sobre a importância dos gêneros discursivos na vida do

ser humano como instrumentos de comunicação e socialização, pois quanto maior

for esta ligação com o discurso, melhores condições de inserção à sociedade e ao

poder de crítica, fundamental para que sejam cidadãos participativos e aptos a

exercerem a cidadania; em seguida, apresentamos uma breve descrição do nosso

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objeto de estudo: o Gênero Discursivo Poema; na seção seguinte, discorremos

sobre a SD, uma proposta de trabalho com gêneros discursivos, a qual serve para

dar acesso aos alunos à prática de novas linguagens; e finalmente, focalizamos a

importância da pesquisa, relatando o desenvolvimento do trabalho com o gênero

discursivo poema, que contribuiu de maneira significativa para o desenvolvimento

das habilidades de leitura, análise e escrita. Desenvolvemos, assim, um trabalho

enfatizando a essência da leitura no contexto escolar e social, indicando a

problemática da falta de leitura e suas consequências no processo de ensino e

aprendizagem e seus reflexos no comportamento dos alunos e melhoria da condição

social e humana.

E, finalmente, para que esse trabalho se realizasse com eficiência, não

poderíamos deixar de mencionar pessoas importantes como a professora e Dra.

Terezinha da Conceição Costa-Hübes, nossa orientadora, pelo incessante e

incansável trabalho, dedicação e competência em nos orientar e, sempre firme e

exigente incentivava e indicava a direção certa a tomar, sobretudo, nos momentos

de maior dificuldade.

A professora e Dra. Terezinha foi interlocutora perspicaz e interessada em

participar das nossas inquietudes e co-autora da nossa aprendizagem,

ensinamentos e orientações durante a realização do PDE. Agradecemos à

confiança, o carinho e o incentivo depositados em nosso projeto de leitura,

interpretação e escrita de poemas.

Aos meus filhos, Pablo Anaxágoras e Monalisa, pelo incentivo e carinho, pois

sempre pensei ensiná-los, todavia, foi com eles que aprendi.

2 Definição dos gêneros

A proposta de trabalho com os gêneros nas aulas de Língua Portuguesa foi

introduzida no Brasil com a publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais

(doravante, PCN) (BRASIL, 1998). Nesse documento se propõe uma educação

comprometida com a cidadania, tendo como ponto de partida a realização do

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cidadão como portador dos direitos e deveres. Depois, com a elaboração e a

publicação das DCE (PARANÁ, 2008), a proposta de trabalho com os gêneros é

retomada e reforçada, e os gêneros são vistos como “formas comunicativas que não

são adquiridas em manuais, mas sim nos processos interativos” (MACHADO, 2005,

p. 157), ou seja, é uma prática social que deve orientar a ação pedagógica com a

língua. Nesse sentido, para falar, ler ou escrever sempre se utiliza algum gênero do

discurso.

Partindo desse pressuposto e compreendendo que há uma grande

diversidade de gêneros discursivos oral ou escrito, formal ou informal, que são

referências importantes para os alunos obterem conhecimentos, cultura e

aprendizagem, cumpre a nós, professores de Língua Portuguesa, propiciar aos

alunos situações de aprendizagem que envolvam os gêneros discursivos. Para isso,

é preciso que entendamos melhor a que está posto nos documentos, recorrendo à

base teórica para ouvir o que os pesquisadores têm a dizer sobre isso.

Segundo Bakhtin (1992), os gêneros existem e estão a serviço da interação,

pois não para nos comunicar, recorremos sempre a um gênero do discurso. Para

isso, alguns gêneros são adaptados, transformados, renovados, multiplicados ou até

mesmo criados a partir da necessidade que o homem tem de se comunicar com o

outro. Independente de onde esteja, de que lugar estejamos falando, é importante

lembramos que “os diversos campos da atividade humana estão ligados ao uso da

linguagem” (BAKHTIN, 1992, p. 261) e em cada um deles encontramos diferentes

gêneros, cada qual atendendo a um propósito comunicativo. Temos como exemplos

os gêneros do discurso eletrônico. Uma necessidade dos tempos modernos (e-mail,

chat, blog, videoconferência interativa, MSN, fórum de discussão) e, tantos outros,

que são criados e transformados pela cultura tecnológica, na qual estamos inseridos.

Os gêneros variam assim como a língua, a qual é viva e não estanque. As

ações comunicativas mediante a língua não acontecem com elementos linguísticos

isolados. Elas se dão, conforme Bakhtin (1992), como discurso.

Para Marcuschi (2003), gênero é

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[...] toda manifestação verbal se dá sempre por meio de textos realizados em algum gênero. Portanto, gêneros textuais são encontrados em nossa vida diária, são formas culturais e cognitivas de ação social. São atividades discursivas orais ou escritas necessárias e importantes para a interlocução humana (MARCUSCHI, 2003, p. 19).

Os gêneros são práticas sociais e quanto maior for esta ligação com o

discurso, melhores condições de inserção à sociedade e ao poder de crítica,

fundamental para que seja cidadão participativo e apto a exercer a cidadania.

Há uma enorme pluralidade de gêneros discursivos, por meio dos quais nos

são garantidas as informações, os conhecimentos, enfim, a socialização. Nessa

concepção, os gêneros discursivos são importantes instrumentos sociais, que

podem ser usados na escola como mecanismos para melhorar o ensino da

linguagem oral, escrita, formal e informal, de uma maneira mais prática e eficaz.

Nesse sentido, Bakhtin (1992) afirma ainda que, “quanto melhor dominarmos os

gêneros tanto mais livremente os empregamos, tanto mais plena e nitidamente

descobrimos neles a nossa individualidade (onde isso é possível e necessário)”

(BAKHTIN, 1992, p. 285).

Sendo assim, ressaltamos a importância do trabalho com os gêneros nas

aulas de Língua Portuguesa com o objetivo de ampliar a capacidade comunicativa

dos alunos. Por isso, entendemos que os gêneros são unidades concretas nas quais

se deve sustentar o ensino. São pontos de referência para o aluno, operando como

“entidades intermediárias que permitem estabilizar os elementos formais e rituais

das práticas” (DOLZ & SCHNEUWLY, 2004, p. 68), de forma que o aluno possa

interagir a partir do reconhecimento de determinado gênero. Nesse sentido, os

gêneros são tidos, pois, “como as unidades concretas nas quais se deve dar o

ensino” (DOLZ & SCHNEUWLY, 2004, p.68).

Quando dominamos um gênero, não dominamos uma forma linguística e sim

uma forma de realizar linguisticamente objetivos específicos em situações sociais

particulares. Como afirma Bronckart, “a apropriação dos gêneros é um mecanismo

fundamental de socialização, de inserção prática nas atividades comunicativas

humanas” (BRONCKART, 1999, 103), o que permite dizer que os gêneros operam,

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em certos contextos, como formas de legitimação discursiva, já que se situam numa

relação sócio-histórica com fontes de produção que lhes dão sustentação muito além

da justificativa individual.

Segundo Marcuschi (2003), A expressão “gênero” sempre esteve, na tradição

ocidental, especialmente ligada aos gêneros literários, mas já não é mais assim,

como lembra Swales, ao dizer que “hoje, gênero é facilmente usado para referir uma

categoria distintiva de discurso de qualquer tipo, falado ou escrito, com ou sem

aspirações literárias” (SWALES, 1990, p.33). Os gêneros, na realidade, não são

entidades naturais como flor, pedra, estrela, pássaros, rios, mas são artefatos

culturais construídos historicamente pelo ser humano.

Assim, não é difícil constatar que nos últimos dois séculos foram as novas

tecnologias, em especial as ligadas à área de comunicação, que propiciaram o

surgimento de novos gêneros discursivos. Na realidade, não são propriamente as

tecnologias que originaram os gêneros, mas sim, a intensidade dos usos dessas

tecnologias e suas interferências nas atividades comunicativas diárias. Dessa forma,

os grandes suportes tecnológicos da comunicação foram o rádio, a televisão, a

internet, o jornal, a revista, presença marcante e grande centralidade nas atividades

comunicativas da realidade social que ajudaram a criar gêneros novos e de acordo

com as inovações dos tempos tecnológicos. Surgiram, assim, formas discursivas

novas, tais como editoriais, artigos de fundo, notícias, telefonemas, telegramas,

telemensagens, teleconferências, videoconferências, reportagens ao vivo, cartas

eletrônicas, (e-mails), bate - papos virtuais (chats) e muitos outros que a todo

instante vão surgindo. Todavia, outros gêneros permaneceram e se cristalizaram na

comunicação humana como formas eruditas de interação. Dentre esses,

destacamos o poema, foco desse estudo, sobre o qual discorremos a seguir.

2.1 Gênero Discursivo Poema

Para compreender a poesia precisamos ser capazes de envergar a alma da criança, como se fosse uma capa

mágica, e admitir a superioridade da sabedoria

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infantil sobre a do adulto. (Johan Izinga)

Conforme exposto no Wikipédia1, o poema é a arte literária de escrever

versos. É o mais antigo texto que já existiu na história da humanidade. Os textos

eram escritos em versos, rimas, ritmos, repetições e figuras de linguagem e não era

difícil memorizar para depois recitar em praças públicas. Um poema é uma obra

literária geralmente apresentada em versos e estrofes (ainda que possa existir prosa

poética, assim designada pelo uso de temas específicos e de figuras de estilo

próprias da poesia).

Fortemente relacionado com a música, a beleza e a arte, o poema tem as

suas raízes históricas nas letras de acompanhamento de peças musicais. Até a

Idade Média, os poemas era cantados. Só depois o texto foi separado do

acompanhamento musical. Tal como na música, o ritmo tem uma grande

importância.Um poema também faz parte de um sarau (reuniões em casas

particulares para expressar artes, canções, poemas, poesias etc).

Na grécia antiga, o poema foi a forma predominante de literatura. Os três

gêneros lírico, dramátaico e épico eram escritos em forma de poesia. A narrativa,

entretanto, foi tomando importância, ficando a poesia mais relacionada com o gênero

lírico.

Efetivamente, existe uma diferença entre poema e poesia. Segundo o

dicionário Ferreira (1999), poema tem oriegem no grego poiema, o que se faz e do

latim poema obra em verso. Composição poética de certa extensão, com enredo,

poemeto, epopéia. Composição de estrutura livre para instrumento único ou

instrumento solista. Poema dramático. Designação genérica das peças e

espetáculos nos quais os elementos psicológicos, dramáticos, visuais, musicais,

coreograficos convergem para o simbólico, o fantástico, o lírico. Poema sinfônico.

Peça orquestral em um só movimento, de caráter descritivo e de forma muito livre.

Já, poesia, para Ferreira (1999), do grego profesis, ação de fazer algo, e do latim

1 http://pt.wikipedia.org/wiki - pesquisado em: 15 de março de 2012.

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poese, arte de escrever em verso. Composição poética de pequena extensão.

Entusiasmo criador, inspiração. Aquilo que desperta o sentimento do belo. O que há

de elevado ou comovente nas pessoas ou nas coisas. Encanto, graça, atrativo.

Poesia pura. Corrente da poesia moderna que renuncia à expressão de sentimentos

individuais ou ao material anedótico.

O poema tinha uma forma fixa: seus versos eram metrificados, isto é,

observavam os acentos, a contagem silábica, o ritmo e as rimas. Conforme Lyra

(1986), a contagem silábica dos versos foi sempre muito valorizado até o início do

século XX, quando a obra que não se encaixasse nas normas de metrificação não

era considerada poesia. Isto mudou com a influência do Modernismo, movimento

cultural, surgido na Europa, que buscava ruptura com o Classicismo. Atualmeante, o

ritmo dos versos foi liberado e temos os chamados “versos livres” que não seguem

nenhuma métrica.

Tendo em vista sua constituição discursiva, capaz de suscitar sentimentos e

trabalhar com a sensibilização, e de grande importância e necessidade trabalhar

com o gênero poema para que o aluno se desperte para a poesia existente dentro

dele e, a partir desse incentivo, passe a ler e a escrever poemas com emoção e

sensibilidade. É interessante ler poemas com a alma, como alimento para a

espiritualidade e não apenas como pretexto para as atividades pedagógicas. A

pretensão da leitura de poemas é matizar a alma com poesias, de forma que

transbordem no olhar e no sorriso.

Os textos poéticos são elementos-chave de expressividade e interação. Por

organizar-se em uma estrutura que lhe é peculiar e por destacar-se pela sua função

poética, é importante distinguir que quando falamos de poemas, estamos nos

referindo ao texto, à obra em versos, à arte de escrever textos poéticos. O poema é

um gênero textual elaborado em versos, podendo ter rimas ou não. Cada conjunto

de versos recebe o nome de estrofes. Os poemas podem apresentar uma ou mais

estrofes, de acordo com a criatividade do aluno. Já quando nos referimos à poesia,

interpretamo-na como a essência da arte em versos, o encanto, a graça, o atrativo

que emanam da forma, da estrutura, da organização escrita (ou falada), ou seja, a

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poesia é aquilo que desperta o sentimento do belo, da imaginação, da fantasia, da

comoção. Em outras palavras, a poesia é a sonoridade, a sensibilidade, a essência,

a musicalidade, a revelação dos sentimentos e das emoções que as pessoas

sentem a partir da leitura do poema.

Sendo assim, a intenção de textos desse gênero pode ser variada: emocionar

o leitor, chamar a atenção para o belo, apresentar o encanto, a indignação, a fé, a

esperança do poeta frente às situações da vida. As palavras ou expressões do

poema podem ter vários significados, sendo necessária à interpretação do que as

pessoas querem expressar.

Ao produzir um poema, o autor pode assumir a voz de um adulto, de uma

criança, de um objeto, de um animal, de um profissional, entre outros. Para fazer

isso, ele precisa imaginar como é o ser representado, o que ele diria, sentiria, como

agiria. O “eu” presente nos versos revela-se ao leitor, conforme as intenções do

autor. Por essa razão, a voz que fala no poema recebe o nome de eu-poemático.

Portanto, é importante não confundir o autor do poema com o eu poético. O autor de

um poema é aquele que escreve o texto poético e o eu poético é a voz que fala no

poema.

Ao optarmos pelo trabalho com o gênero poema, esperamos demonstrar o

significado e abrangência do aprendizado como uma nova concepção de vida.

Trabalhar com a literatura e o prazer estético das obras foi um grande desafio. Como

diz Fernando Pessoa: “Quem não vê bem uma palavra, não pode ver bem uma

alma” (PESSOA, 1997, p. 9). Assim, na seção seguinte, descrevemos a metodologia

que orientou nossas ações com o poema na sala de aula.

3 Sequência Didática como uma proposta de trabalho com os gêneros

Um procedimento possível para o trabalho com os gêneros é a Sequência

Didática (SD), pois ela tem como objetivo proporcionar ao aluno situações de

aprendizagens, por meio das quais possa reconhecer e refletir sobre determinado

gênero. Essa metodologia foi elaborada por um grupo de pesquisadores suíços, os

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quais a definem como “um conjunto de atividades escolares organizadas, de

maneira sistemática em torno de um gênero oral ou escrito” (DOLZ, NOVERRAZ e

SCHNEUWLY, 2004, p 97), que visam ao aperfeiçoamento das práticas de escrita e

de produção oral e estão principalmente centradas na aquisição de procedimentos e

de práticas de determinados gêneros selecionados para atenderem a fins

específicos de trabalho com a linguagem.

Portanto, as SD servem para dar acesso aos alunos à prática de novas

linguagens ou de outras dificilmente absorvidas pela aprendizagem, ou seja, “As

sequências didáticas visam ao aperfeiçoamento das práticas de escrita e de

produção oral e estão, principalmente, centradas na aquisição de procedimentos e

de práticas” (DOLZ, NOVERRAZ E SCHNEUWLY, 2004, p. 97). Assim, conforme os

autores, uma SD tem, precisamente, “a finalidade de ajudar o aluno a dominar

melhor um gênero de texto, permitindo-lhe, assim, escrever ou falar de uma maneira

mais adequada numa dada situação de comunicação” (DOLZ, NOVERRAZ E

SCHNEUWLY, 2004, p. 97).

A proposta de trabalho com os gêneros é assim esquematizada pelos autores:

FIGURA 1 - Esquema da Sequência Didática FONTE: Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p.98)

O trabalho com o gênero discursivo, conforme a proposta dos autores

genebrinos, parte da apresentação de uma situação de interação, por meio da qual

se pretende envolver o aluno numa situação social de escrita ao produzir um texto

de determinado gênero. Em seguida, o aluno é convocado para uma produção

inicial, quando “estaria atendendo uma situação real de comunicação, em dada

Módulo

1

Módulo

2

Módulo

n

Apresentação

da situação Produção

inicial

Produção

final

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esfera social, revelando as representações que têm do gênero em questão” (DOLZ,

NOVERRAZ E SCHNEUWLY, 2004, p. 95-128). A primeira produção é o marco

inicial para a preparação de diversos módulos, outra etapa da SD, que dariam conta

dos possíveis problemas que nela apareceriam, na intenção de fornecer, aos alunos,

os instrumentos necessários para produzirem um bom texto do gênero selecionado.

A SD teria, como atividade conclusiva, uma produção final que oportunizaria ao

aluno colocar em prática a aprendizagem que aconteceu em cada módulo, sendo

possível, a partir de então, uma avaliação de todo o processo.

Na proposição da produção didática, seguiremos a adaptação metodológica

propostas por Costa-Hübes (AMOP, 2007) e Costa-Hübes (2008), na qual a SD se orienta

a partir da seguinte forma de organização:

1 APRESENTAÇÃO DE UMA SITUAÇÃO ( finalidade da produção) 2 SELEÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL ( o que dizer, para quem dizer, como dizer, local de circulação, quando dizer). 3 RECONHECIMENTO DO GÊNERO SELECIONADO, por meio de: a) Pesquisa sobre o gênero. b) Leitura de textos do gênero, explorando e estabelecendo relações entre: - sua função social - seu conteúdo temático - sua estrutura composicional (características, tipologia predominante). - seu estilo (análise linguística). c) Seleção de um Texto do Gênero para um estudo mais específico: - função social - conteúdo temático - estrutura composicional - estilo (análise linguística) 4 PRODUÇÃO DE TEXTO do gênero, tendo em vista a necessidade apresentada na situação inicial. 5 REESCRITA DO TEXTO produzido com a finalidade de aproximar o máximo possível dos modelos que circulam socialmente. 6 CIRCULAÇÃO DO GÊNERO, que tem como parâmetro os interlocutores definidos socialmente ( apud AMOP, 2007, p. 18 ).

Conforme o exposto, na adaptação foi incluído um módulo de reconhecimento

do gênero, antes da produção inicial, a fim de garantir ao aluno um conhecimento

maior do gênero em estudo. Assim, a SD passou a ser esquematizado da seguinte

forma:

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FIGURA 2 - Esquema da SD adaptada por Costa-Hübes FONTE: Swiderski e Costa-Hübes (2009)

Conforme Costa-Hübes (2009), a inserção do módulo de reconhecimento do

gênero, com atividades que contemple a leitura, a pesquisa e a análise linguística

com textos do gênero, antes da etapa de produção inicial, sustenta-se em oferecer,

aos alunos, momentos de estudos, de leitura e de análise de outros textos do

gênero, favorecendo o seu reconhecimento antes de iniciar a proposta de produção

(oral ou escrita).

Nesse contexto de ensino, as SD têm por meta melhorar as práticas de

ensino da leitura e da produção escrita, fundamental para o aprendizado mais

eficiente e de qualidade. É nesse sentido que a leitura e a escrita se tornam

imprescindíveis, pois propiciam ao ser humano um conhecimento maior de

aprendizagem, cultura de mundo e entendimento da palavra.

Assim, adotar os gêneros como objeto de ensino e as Sequências didáticas como encaminhamento metodológico de trabalho com os gêneros, é uma forma de criar condições para que os alunos sejam confrontados com diferentes práticas de linguagem historicamente construídas, oportunizando a sua reconstrução e a sua apropriação (COSTA-HÜBES e BAUMGÄRTNER, 2007, p. 17 ).

Por isso, é interessante e fundamental trabalhar o gênero discursivo poema,

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pois a interação do aluno com a poesia estimula a criatividade e, assim, surgirão

textos próprios e criativos.

4 Relatando uma experiências de trabalho com o gênero discursivo poema

A implementação da intervenção pedagógica realizou-se no decorrer de

agosto a dezembro de 2011, numa turma mista de Ensino Fundamental e Ensino

Médio, no período noturno, no CEEBJA de Capanema, na disciplina de Língua

Portuguesa.

A nossa experiência com a execução da SD com o gênero discursivo poema

foi decisiva para que houvesse qualidade de ensino, aprendizagem e conhecimento.

Todos os alunos eram Jovens e Adultos, com idade entre 18 e 60 anos, com uma

imensa vontade de aprender, todavia com uma grande diferença cultural e intelectual

entre eles.

Assim, nesta seção, descreveremos as atividades, os acontecimentos e as

experiências vivenciadas com alunos do CEEBJA, ao aplicarmos a SD, com o

objetivo de atender às necessidades desses educandos no que se refere à prática

de leitura, à análise e à produção escrita de poemas.

Para o desenvolvimento da proposta, iniciamos com a Apresentação da

Situação de Interação, por meio do gênero poema. No intuito de envolvê-los com o

gênero e com as atividades que seriam desenvolvidas, conversamos longamente

sobre a existência do poema na vida das pessoas, despertando o interesse e a

vontade de ler e escrever poesias e, por meio dessa experiência, fundamentaram

suas opiniões, prepararam-se melhor para ler, escrever e interpretar poesias. Para

envolvê-los ainda mais, combinamos que depois de muitas leituras de textos do

gênero e algumas atividades envolvendo a escrita, eles produziriam um poema para

depois serem lidos na sala de aula, no coletivo, em casa para a família, no saguão

da escola e, finalmente, fariam um recital para todos os alunos da escola e, também

na Rádio Tropical da cidade.

Para despertar esse interesse inicial, os alunos tiveram contato com uma

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imensidade de poemas que estavam estampados em todos os lugares da sala e da

escola. Foi proporcionada uma diversidade de livros de poesias de autores da região

e, ainda de autores da literatura brasileira para que lessem, copiassem e discutissem

sobre os temas abordados.

Na etapa seguinte, partimos para as atividades de Reconhecimento do

gênero, conforme orientações de Costa-Hübes (AMOP, 2007) e Costa-Hübes (2008).

Para isso, iniciamos com a atividade de Pesquisa. Nesse momento, solicitamos que

os alunos fossem ao Laboratório de Informática pesquisar poemas que envolvessem

suas emoções, que apresentassem temas curiosos e que se identificassem com sua

vida. Esse foi um momento complicado, pois muitos nunca tiveram contato com um

computador e muito menos com Internet, mas conseguiram, com nossa ajuda e dos

colegas que já tinham conhecimento, pesquisar e levar na sala de aula alguns

poemas para serem lidos e apresentados como trabalhos orais e escritos.

Ainda no intuito de reconhecerem melhor o gênero, o passo seguinte consistiu

em envolvê-los em diferentes atividades de leitura como: leitura silenciosa e oral,

interpretação e análise das temáticas, discussões em duplas e depois nos grandes

grupos. Leitura orientada, questionamentos e pesquisa sobre o autor, observação

sobre a data em que foi escrito o poema, paralelos entre um tema e outro,

indagações sobre o assunto, hipóteses sobre o que levou o autor a escrever,

comentários sobre o tema do texto e a vida do aluno, questionamentos orais e

depois escritos, construção de paráfrases, declamações, apresentações

dramatizadas. Uma vez que percebemos estar garantido o reconhecimento do

gênero, compreendemos que tinha chegado o momento de os alunos produzirem o

seu próprio poema. Para isso, retomamos a proposta inicial que consistia em

desenvolver a leitura, análise e produção escrita do gênero discursivo poema com

alunos do CEEBJA.

Nossa dinâmica era instigar no aluno a reflexão acerca da importância e da

necessidade de ler como uma prática social e, sobretudo, através dessa arte de

saber ler e escrever poesias, buscar a cultura e o conhecimento. Essa atividade

despertou o interesse em ler, discutir e escrever textos próprios do gênero,

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estimulando, dessa forma, o gosto pela leitura, ampliação dos conhecimentos de

mundo e desenvolvendo no aluno a sensibilidade, a emoção e a satisfação em

produzir pela primeira vez um poema.

Dentre as diversas atividades de leituras que desenvolvemos com os alunos,

destacamos uma, a partir do seguinte texto trabalhado e produzido por nós:

Ontem, eu Chorei...

Ontem, chorei... Ao me deparar com alguém Que buscava na incerteza

A certeza de nada encontrar E assim pude ler

Naquele olhar A sua alma

Que pedia socorro Um olhar de ódio pela humanidade

Um olhar de ódio pela vida Um olhar de ódio por ele mesmo

Um olhar de ódio por mim Um olhar frio, distante, fugaz

Que ficou registrado Na minha memória

E minha alma se desnorteou Se a vida lhe foi cruel

È porque sua “alma é pequena” E nessa incerteza estava ali

Para buscar um sentido para a vida Todavia, nada encontrou E do nada desapareceu

Para se encontrar novamente Na escuridão da sua alma

E por isso, eu chorei...

Autora: Neiva Dariva – Professora PDE - Ano 2006. Poema escrito como registro vivenciado pela professora com um aluno da

penitenciária, que preferiu voltar para a cela a assistir as aulas de Português.

Uma vez lido o poema, discutimos sua temática, conservando sobre seu

conteúdo e sua relação com o contexto de produção. A partir daí, encaminhamos as

seguintes atividades:

a) Quem escreveu o texto? b) Onde? c) Quando? d) Como? e) Por quê? f) Qual o assunto explorado?

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g) Quem são os leitores desse gênero? h) Qual a função social do gênero? i) Para que interlocutores são escritos?

ATIVIDADES COM OS ALUNOS 1. Quem era este aluno? Por que ele reagiu desta forma? Tente descobrir. 2. Por que a autora do poema chora? 3. O que significa “alma pequena” explique. 4. Por que o aluno da penitenciária preferiu voltar para a cela? Comente... 5. Vocês já ouviram falar em “solário da prisão”? Onde? Quando? O que significa? 6. A expressão um olhar de ódio pela humanidade, utilizada no poema, é uma maneira de

comunicação mais apropriada para ser usada em a) ( ) textos poéticos b) ( ) documentos comerciais c) ( ) reuniões sociais d) ( ) telegrama 7. Relate por escrito no seu caderno e leia para os colegas o que significa “escuridão da sua alma”.

8. Retire do poema o verso que mais lhe chamou atenção e explique por que ele foi selecionado.

9. Se você tivesse que mandar alguns versos do poema “Ontem, eu chorei” para quem

mandaria? E quais você enviaria? Escreva-os em seu caderno e leia para os colegas. Por que, selecionou esses versos?

(A proposta de produção consistia em conduzir a produção de um poema

voltado para temas relacionados com a vivência cotidiana dos alunos como trabalho,

lazer, família). Depois de produzido e revisado (por nós e pelo autor), os poemas

seriam lidos na sala, para os colegas, no saguão da escola, na família e também na

rádio da cidade Acreditamos que, para desenvolver um bom trabalho nesta

modalidade de ensino, não podemos deixar de considerar as relevantes

contribuições de Bakhtin quando diz que “a produção escrita possibilita que o sujeito

se posicione, tenha voz em seu texto, interagindo com as práticas de linguagem da

sociedade” (BAKHTIN, 1992, p. 289).

Depois dos textos produzidos, orientamos os alunos para a reescrita dos

textos, pois entendemos que reescrita de um texto é o conjunto de procedimentos

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por meio do qual um texto é trabalhado até o ponto em que se decide que está, para

o momento, suficientemente bem escrito. “Pressupõe a existência de rascunhos

sobre os quais se trabalha, produzindo alterações que efetuam tanto o conteúdo

como a forma do texto” (BRASIL, 1998, p. 80). Durante as atividades de reescrita,

corrigimos os textos dos alunos, juntamente com eles, colocando os devidos critérios

a serem observados numa produção de texto, identificando os problemas e, assim,

tornando-os mais claros e compreensíveis.

Para esse procedimento aplicavam os conhecimentos sobre a língua,

acrescentando, retirando, deslocando ou transformando o texto. Tudo feito com a

participação do aluno em situações individuais ou coletivas, bem como sobre a

orientação da professora, que exigia uma reflexão e organização das ideias.

No decorrer das reescritas dos textos, observamos, com cada aluno, o não

atendimento ao comando da proposta da produção dos textos como: cumprir os

números mínimos e máximos de linhas especificados, deixar claro o objetivo do

texto, respeitar as características do gênero proposto, ou seja, demonstrar ter

conhecimentos sobre o tema proposto e utilizar tais conhecimentos em favor dos

objetivos do seu texto, sem fazer cópia literal de texto usado como estímulo para a

produção de outros. Ainda, nos aspectos estéticos abordamos a legibilidade da letra,

a composição adequada dos versos e estrofes, margens regulares e ausência de

rasuras. Nos aspectos relativos ao domínio gráfico, exigimos correta ortografia,

acentuação dentro da nova reforma ortográfica e pontuação adequada. Dentro dos

aspectos relativos ao domínio da norma culta observamos a colocação pronominal, a

concordância verbal e nominal e ainda, a regência verbal e nominal. Nos aspectos

de coesão, atentamos para a coerência na exposição das ideias e argumentos,

encadeamento entre as partes do texto. E nos aspectos argumentativos,

trabalhamos a originalidade na constituição do tema. Eis, aqui, alguns textos

poéticos produzidos pelos alunos.

SOU CEGA, MAS QUERO SER FELIZ Desde o momento

PRIMEIRA CAIXINHA DE SOM Como é bom ouvir um som

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Em que cheguei ao CEEBJA Senti uma enorme sensação De medo, angústia e solidão Tive, então, uma louca vontade De gritar e correr para casa Mas, felizmente, a professora E demais funcionários da escola Me acolheram muito bem Assim, senti força, coragem E vontade de vencer Sou muito discriminada na cidade Ainda sofro com isso, Mas, com o incentivo e apoio das pessoas Quero superar todas as barreiras E, daqui para frente, ser feliz A minha cegueira não incomoda ninguém E a minha bengala São os olhos que enxergam por mim E me dirige para onde ir Desse modo, a vida se tornará mais bela A escola a minha esperança E eu, muito mais feliz. Autora: Ivanir Zambonin de Paula

Lindas melodias, linda canção Apenas num simples objeto Feito de ferro e plástico Com um tom suave ou grave Solto ou preso, o som é alegria Entusiasmo e calmaria Como se fosse um sonho Começando e terminando Conforme o ritmo Os passos se formam E o mundo gira No carnaval ao funeral No quarto ou na sala Como é bom ouvir um som.

Autor: Adriano Rochembach

VOCÊ É ETERNO Sou nascido no inverno Mas, sou feliz no verão Já vivi muitas primaveras Mas, gosto de todas as estações Sou nascido em 83 E vou viver até 2043 Sou uma boa pessoa Não discrimino ninguém Então me respeite, que eu sempre vou querer bem Do mal só colhe o mal E do bem só o bem Então, seja feliz Que serei também Seja humilde e sincero

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Que os anjos digam amém Pense no futuro Pense sempre além E, para terminar, quero dizer Que com Deus você vai ver Que bênçãos, na sua vida, você vai ter.

Autor: João Henrique Wisniewski

Finalmente, depois de todos os textos revisados, entendemos que havia

chegado a hora de sua circulação social, pois conforme Bakhtin, alguns gêneros são

adaptados, transformados, renovados, multiplicados ou até mesmo criados a partir

da necessidade que o homem tem de se comunicar com o outro, tendo em vista que

“todos os diversos campos da atividade humana estão ligados ao uso da linguagem”

(BAKHTIN, 1992, p. 261). Garantir a função social da língua é melhorar as

condições de inserção à sociedade e ao poder da crítica, fundamental para que o

aluno seja cidadão participativo e apto a exercer a cidadania.

Foi significativo trabalhar o poema com os alunos do CEEBJA, pois, além de

aprenderem ler, conhecer e escrever poemas tornaram-se autores, protagonistas de

suas próprias obras literárias. Leram muito, pesquisaram vários autores, ficando,

desse modo, a par do mundo fantástico dos escritores da literatura brasileira.

Também, socializaram seus textos na igreja, comunidade, no jornal da cidade, na

emissora de rádio, em recitais na escola, fazendo dos alunos cidadãos capazes de

escrever obras literárias. Muitos alunos não eram capazes de ler um texto na frente

dos colegas, muito menos na comunidade em que vivem, mas, a partir desse

trabalho, tornaram-se leitores assíduos em qualquer circunstância e lugar, deixando

marcas peculiares de humor, inteligência, criticidade, brincadeiras. Realizaram o

fantástico, o real, o possível e o impossível.

Considerando todo o trabalho desenvolvido, podemos afirmar que foi

importante ampliar o horizonte cultural dos alunos, mostrando-lhes a riqueza e valor

da literatura para a vida. Foi também um grande desafio no processo ensino-

aprendizagem trabalhar com as diversidades especiais humanas, exigindo maestria

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e buscas constantes das mais variadas formas de como ensinar o deficiente visual, o

deficiente intelectual, o drogado, o esquizofrênico, o detento, o gordo cheio de

preconceitos e o negro vivendo a discriminação na pele, além dos outros que

compunham a turma dos dezenove alunos.

Houve espaço para exposição de opiniões, ideias, apresentações, recitais na

escola, na comunidade e Rádio Tropical da cidade. A proposta de ensino de leitura e

escrita de poesias abriu espaço para a construção de um conhecimento mais

significativo, propondo uma reflexão incentivadora e promovendo mudanças e

transformação de conceitos necessários à construção da própria cidadania e

também, a percepção e a valorização do auto-conhecimento e, sobretudo, do ser

humano.

Tudo isso, foi percebido ao longo das aulas, por meio de atividades orais,

exercícios variados, produções escritas, atividades de oralidade, leituras coletivas,

recitais. Ficou claro que, através da leitura, a noção sólida de comprometimento,

socialização e mudanças culturais foi percebida notoriamente.

Foi, realmente, desafiador trabalhar com alunos de EJA. Como saber lidar

com tantos alunos diferentes? Ainda que, notadamente, trabalhoso, construímos um

ambiente especial só para atender as dificuldades da deficiente visual. Esta passou

a frequentar as aulas da Hora Atividade, um modo pedagógico de ensinar,

favorecendo o seu aprendizado e necessidades. Trabalhamos o Braille, aprendemos

a manusear programas só para cegos, tentamos entender um mundo

completamente diferente do nosso, todavia, gratificante, nobre e enriquecedor para

que houvesse uma oportunidade digna também para os deficientes que querem um

espaço na sociedade. No computador, preparado com programas especiais, foi um

tanto complicado, mas aos poucos, fomos nos entrosando e, assim, superando as

dificuldades e complicações que iam aparecendo. Desta experiência pedagógica e

desafiadora, brotaram textos elaborados com muita sensibilidade e emoção, os

quais revelaram a realização pessoal para os alunos com deficiências especiais,

sobretudo, oportunidade de inclusão ao mundo da aprendizagem, cultura e

socialização.

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Por tudo isso, afirmamos que valeu a pena passarmos por mais essa

experiência didático-pedagógica.

5 Considerações finais

Nosso objetivo, nesse artigo, foi relatar uma proposta de trabalho com Jovem

e Adulto, envolvendo, principalmente, a prática da leitura, por meio de textos do

gênero discursivo poema, adotando, para isso, a metodologia de Sequência

Didática, desenvolvendo, dessa forma, alunos mais conscientes e críticos de sua

realidade. Assim, por meio da aplicação da metodologia da SD com o gênero

poema, buscamos mostrar, através da leitura, reflexão, análise e escrita, que o aluno

da EJA também é capaz de pensar, fundamentar, aprender, e numa reflexão e

análise, compreender o processo de ensino e aprendizagem e, sobretudo, do prazer

da leitura no ensino de Jovens, Adultos e Idosos.

Nesse sentido, podemos afirmar que a implementação pedagógica,

propiciada pelo trabalho com o gênero poema, contribuiu de maneira significativa

para o desenvolvimento das habilidades de leitura, análise e escrita dos alunos, bem

como para com a nossa compreensão sobre o trabalho com os gêneros na sala de

aula, propiciando, assim, a participação social, a capacidade de atuação construtiva

e transformadora.

Ao propor um projeto de implementação pedagógica com o gênero poema, o

objetivo maior foi investir na formação de alunos leitores e críticos, capazes de

discutir, discernir, decidir e transformar o meio em que vivem, além de despertar

sensibilidades e emoções, condições próprias de textos desse gênero. E na

perspectiva de garantir tal objetivo, optamos por uma metodologia de ensino, a SD.

Diante da perspectiva de que a leitura é fundamental no desenvolvimento do

ser humano, o trabalho realizado com os alunos do CEEBJA serviu para que

analisássemos e aprendêssemos a ler e a entender, adentrando no texto,

conversando com o texto, socializando os conhecimentos para a vida e, assim,

escrever textos poéticos com mais segurança, originalidade e compreensão.

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A partir dessa proposta de leitura, análise e escrita, passamos a ser mais

complexos, interessados e conhecedores da arte de ler para aprender e, desse

modo, perceber melhor o mundo em que vivemos. Mudamos, também, os costumes,

os hábitos culturais e, o conhecimento adquirido, através da leitura, foi se tornando

uma necessidade para o desenvolvimento humano, cultural e econômico.

Esse universo de aprendizado sobre o trabalho realizado com o gênero

discursivo poema, fez com que avaliássemos melhor nossa prática pedagógica e

constituir, assim, uma forma inovadora de aproximação do aluno com as obras

literárias e, ainda, como incentivo para ler e construir, com prazer, textos poéticos.

Portanto, podemos afirmar que essa experiência vivenciada por meio do PDE

possibilitou-nos crescimento intelectual, ampliando nossos conhecimentos teórico-

científicos e práticos, preparando-nos, ainda mais, para o exercício da profissão

docente.

REFERÊNCIAS

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