o computador na sociedade do conhecimento valente

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  • Publicao: OEA_NIED/UNICAMP http: www.nied.unicamp.br/oea

  • O COMPUTADOR NA SOCIEDADE

    DO CONHECIMENTO

  • O COMPUTADOR NA SOCIEDADE

    DO CONHECIMENTO

    Organizado por: Jos Armando Valente

    Coordenador do Ncleo de Informtica Aplicada Educao

    Universidade Estadual de Campinas

    Ncleo de Informtica Aplicada Educao Nied Universidade Estadual de Campinas Unicamp Cidade Universitria Prof. Dr. Zeferino Vaz

    Bloco V da Reitoria 2o Piso Distrito de Baro Geraldo 13083-970 Campinas, SP

    Telefones: (019) 788 7350 e 788 8136 Fac-smile: (019) 788 8136 (Ramal 30)

    http://www.nied.unicamp.br [email protected]

  • FICHA CATALOGRFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL DA UNICAMP

    C739

    O computador na sociedade do conhecimento/Jos Armando Valente, organizador Campinas, SP:UNICAMP/NIED, 1999. 156p.

    1. Tecnologia educacional. 2. Inovaes educacionais. 3. Ensino auxiliado por computador. 4. Informtica Brasil. 5. Professores Formao. I. Valente, Jos Armando. II. Ttulo.

    20.CDD 371.3078 370.2854 001.510981 370.71

    NDICES PARA CATLOGO SISTEMTICO

    1. Tecnologia educacional 371.3078 2. Inovaes educacionais 371.3078 3. Ensino auxiliado por computador 370.2854 4. Informtica Brasil 001.510981 5. Professores Formao 370.71 Este trabalho foi patrocinado pela Organizao dos Estados Americanos OEA, pela Secretaria de Educao a

    Distncia SEED/MEC, e pela Universidade Estadual de Campinas UNICAMP. Entretanto, os pontos de vista aqui expressos no representam necessariamente a opinio destas instituies.

  • APRESENTAO

    Getlio Carvalho

    Este conjunto de textos escritos por Jos Armando Valente e por seus colegas do Ncleo de Informtica Aplicada Educao, da Universidade Estadual de Campinas, possivelmente desagradar os que privilegiam o ensino como forma de reproduzir a cultura vigente, mediante uma insero calculada das crianas e dos jovens na vida comunitria. A preocupao dos autores do presente trabalho se centra no papel que pode desempenhar a escola na preparao dos estudantes para enfrentar as mudanas do mundo contemporneo. Sua viso do ensino, entretanto, no o isola do contexto cultural em que se situa. Ao contrrio, o que se prope uma contnua interao da escola com outras instituies sociais com vistas gradual transformao cultural de todos os componentes, sem os quais as expectativas em torno da aprendizagem no podem realizar-se de modo satisfatrio. Tal proposta implica no somente uma nova mentalidade como tambm novas prticas pedaggicas.

    Entre as expectativas que as novas prticas pedaggicas tendem a suscitar inclui-se a ruptura do ciclo da pobreza em que se debate um grande nmero de estudantes discriminados em funo da renda familiar, status social, regio onde residem, ou deficincias de ordem fsica ou mental e do sentimento de impotncia, ou de desnimo, que contagia importantes estratos de nossa populao. Se o ensino tradicional tivesse respostas para tamanhos desafios, seguramente j as teria oferecido sociedade, apesar do reconhecido isolamento em que se encontra a instituio escolar, vtima da carncia de recursos e de controles obsoletos, geradores de inrcia e conformismo.

    Como a escola ainda tem um grande potencial de mudana, possvel, dentro de certos parmetros, esperar dos docentes, administradores, alunos e comunidade iniciativas concertadas de alterao do status quo. Esta a promessa que encerram os projetos elaborados e executados com o apoio de instituies de ensino e pesquisa como o Laboratrio de Estudos Cognitivos, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e o Ncleo de Informtica Aplicada Educao, da Universidade Estadual de Campinas que deu origem a este livro. Estes projetos, que utilizam o computador e outros meios para criar ambientes favorveis construo do conhecimento, resultam da convico de que, embora seja lenta, a mudana na escola tem de acompanhar, na medida do possvel, o ritmo de progresso de outros segmentos da sociedade, particularmente o do setor produtivo, onde o trabalho em equipe e a criatividade no se coadunam com um sistema escolar amparado sobretudo na memorizao de contedos e na transmisso de dados e informaes de cima para baixo.

    Jos Valente enfatiza o papel que assumem esses projetos na articulao de esforos promovidos por centros de pesquisa universitria, pela rede pblica de ensino e pela comunidade. Desde a implantao do Projeto EDUCOM, ressalta, procurou-se adotar, no Brasil, polticas de ensino sustentadas na experincia obtida no mbito escolar, o que, segundo ele, no ocorreu necessariamente em outros pases. Alm disso, a experincia brasileira se destaca pelo uso do computador como instrumento de mudanas pedaggicas profundas, apoiadas nas atividades desenvolvidas por alunos e professores. Em outros pases o que se buscou com a informtica no passou, muitas vezes, de tentativas de automatizao do ensino sem maiores inovaes no processo educacional.

    medida que os mencionados projetos produzam um conhecimento baseado numa atividade concreta (um artigo, a soluo de um problema do cotidiano ou um objeto qualquer do interesse dos alunos) e se relacionem com o contexto de sua utilizao, possvel esperar do esforo educativo, alm da solidariedade grupal, um sentimento de realizao que motivar professores e alunos a buscar novas formas de pensar e de conduzir o complexo processo de ensino e aprendizagem. Esta talvez a mensagem mais otimista que se pode deduzir da presente coletnea.

  • AUTORES

    - Fernanda Maria Pereira Freire Pesquisadora do Ncleo de Informtica Aplicada Educao, da Universidade Estadual de Campinas. Fonoaudiloga, mestranda na rea de Neurolingustica, do Instituto de Estudos da Linguagem da Unicamp. Principais tpicos de interesse: uso do computador no contexto das alteraes lingustico-cognitivas; formao presencial e a distncia de profissionais na rea de Informtica na Educao e da Educao Especial.

    - Helosa Vieira da Rocha Docente do Instituto de Computao e pesquisadora do Ncleo de Informtica Aplicada Educao, da Universidade Estadual de Campinas. Bacharelado e mestrado em Cincia da Computao e doutorado em Engenharia Eltrica. Tpicos de pesquisa e interesse: criao e desenvolvimento de ferramentas computacionais para uso em educao a distncia, uso de Inteligncia Artificial em Educao e desenvolvimento de interfaces computacionais para a interao homem-computador.

    - Jos Armando Valente Coordenador do Ncleo de Informtica Aplicada Educao, da Universidade Estadual de Campinas e professor convidado do Programa de Ps-graduao em Educao: Currculo da Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo. Tpicos de pesquisa incluem criao de ambientes de aprendizagem baseados no computador, desenvolvimento de metodologia de formao usando computadores para ser usada em escolas e em empresas de forma presencial ou a distncia, e estudo do potencial do computador como ferramenta educacional.

    - Joo Vilhete Viegas dAbreu Pesquisador do Ncleo de Informtica Aplicada Educao, da Universidade Estadual de Campinas. Mestre em Engenharia Eltrica/Eletrnica, da Faculdade de Engenharia Eltrica e Computao da Unicamp. Doutorando em Engenharia Mecnica da Unicamp. reas de pesquisa e interesse incluem desenvolvimento de ambientes de robtica educacional (hardware e software), implementao e construo de dispositivos eletrnicos e eletromecnicos interfaceveis com o computador para fins educacionais, desenvolvimento de ambientes de aprendizagem baseados na utilizao de dispositivos robticos e utilizao do Sistema LEGO-Logo em Escolas de 1o e 2o Graus, Universidades e em instituies no formais de aprendizagem.

    - Maria Ceclia Calani Baranauskas Docente do Instituto de Computao e Vice-coordenadora do Ncleo de Informtica Aplicada Educao da Universidade Estadual de Campinas. Bacharelado e mestrado em Cincia da Computao e doutorado em Engenharia Eltrica. Os principais tpicos de pesquisa: criao de ambientes de aprendizagem baseados no computador, uso de Inteligncia Artificial em Educao e interao homem-computador.

    - Maria Ceclia Martins Pesquisadora do Ncleo de Informtica Aplicada Educao da Universidade Estadual de Campinas. Mestre em Educao na rea de Psicologia Educacional da Faculdade de Educao da Unicamp. Doutoranda na rea de Multimeios do Instituto de Artes da Unicamp. Principais tpicos de interesse: desenvolvimento de ambientes educacionais alternativos baseados em multimdia; estudo do papel dos recursos multimdia no processo de aprendizagem.

    - Maria Elisabette Brisola Brito Prado Pesquisadora o Ncleo de Informtica Aplicada Educao, da Universidade Estadual de Campinas. Mestre em Educao na rea de Psicologia Educacional da Faculdade de Educao da Unicamp. Doutoranda em Educao no Programa de Educao: Currculo da Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo. Principais tpicos de interesse: formao presencial e a distncia de profissionais na rea de Informtica na Educao e da Educao Especial.

  • APRESENTAO DO LIVRO

    O esforo dos setores educacionais dos governos federal, estadual e municipal, bem como das instituies de educao particular, na disseminao dos computadores nas escolas e na capacitao de educadores para implantar atividades de Informtica na Educao, constituram os motivos que nos levaram a produzir esse livro. Nunca antes no Brasil houve tanta efervescncia nessa rea como nos dias de hoje. Atualmente possvel identificar aes sistmicas, em todos os recantos do pas, indicando o compromisso do setor educacional com a introduo da informtica na escola.

    O livro o produto de um trabalho coletivo dos pesquisadores do Ncleo de Informtica Aplicada Educao (Nied) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Nasceu no mbito do projeto Formao de Professores Via Telemtica, financiado pela Organizao dos Estados Americanos (OEA) desenvolvido pelo Nied em parceria com o Laboratrio de Estudos Cognitivos (Lec) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

    O objetivo foi reunir um conjunto de artigos de cunho terico, fundamentando as aes de formao de educadores na rea de Informtica Educao e contextualizando a abordagem pedaggica que temos incentivado na introduo do computador nas atividades de sala de aula. Lutamos pela implantao da informtica na educao, porm visando a realizao de mudanas na escola como um todo, envolvendo todos os segmentos, procurando adequ-la s mudanas que esto ocorrendo em outros setores da sociedade. fato que estamos adentrando na era da sociedade do conhecimento. Assim, a escola deve ocupar um papel de maior destaque, sendo a instituio por excelncia, na qual o conhecimento deve ser desenvolvido, estimulado e aprofundado. A escola ainda tem se preocupado com a transmisso da informao e pouco tem sido feito em termos de processar essa informao no sentido de construir conhecimento e desenvolver habilidades importantes como saber pensar, criar e aprender. Nesse sentido, ser bastante paradoxal falar e viver em uma sociedade na qual a moeda o conhecimento e pensar em uma escola na qual esse bem ainda no existe. como falar em um banco onde no h dinheiro. Assim, mudana como palavra de ordem e a utilizao da informtica auxiliando o processamento da informao e, consequentemente, a construo de conhecimento, norteiam todos os captulos do livro.

    O primeiro captulo faz um breve histrico da caminhada da informtica na educao no Brasil, procurando mostrar as peculiaridades do que tem sido realizado, contrastando-o com o que acontece em outros pases como Estados Unidos e Frana.

    No segundo captulo so explicitadas as mudanas que esto ocorrendo na nossa sociedade e discutidas algumas idias de como essas mudanas devero ocorrer tambm na escola. Isso significa que a escola como um organismo da sociedade no vai ficar imune s mudanas, porm elas devem ser determinadas pelos educadores e no ficarem merc ou, serem impostas, por outros segmentos da sociedade.

  • No terceiro captulo so discutidos os diferentes usos da informtica na sociedade. Procuramos resgatar algumas modalidades de uso que j tinham sido discutidas em outras obras publicadas pelo Nied, porm incluindo novas modalidades que esto emergindo, como a multimdia e a Internet.

    No quarto captulo so retomadas cada uma das diferentes modalidades de uso da informtica, analisando-as luz do processo de construo de conhecimento.

    No quinto captulo so apresentadas e discutidas as maneiras como os diferentes tipos de software podem contribuir para a realizao de projetos educacionais e como esses projetos podem servir de objetos de reflexo e de mecanismos de significao das teorias psico-pedaggicas.

    Finalmente, no sexto captulo so discutidas as diferentes abordagens de formao de professores para a rea de Informtica na Educao que tm sido utilizadas e como essa formao tem evoludo desde a abordagem mentorial para as que utilizam recursos de educao a distncia.

    Espero que os leitores possam encontrar os subsdios para a fundamentao do trabalho de informtica aplicada educao que tm realizado e que possam criar um contexto muito mais amplo para as atividades de implantao da informtica na escola. O problema da mudana educacional que estamos enfrentando no trivial e vamos necessitar de muita fundamentao para nos certificarmos de nossas concepes e vencermos essa fase de transio na qual nos encontramos.

    Aproveito a oportunidade para agradecer aos autores que colaboraram com a realizao dessa obra. A contribuio de cada um foi fundamental para construir um todo que muito mais do que a soma dos seis artigos. Agradeo tambm OEA pelo financiamento do livro e pelo apoio de seus profissionais, bem como ao Ministrio da Educao, na figura do diretor do Programa de Informtica na Educao (ProInfo), Cladio Salles, e da coordenadora da rea de capacitao do ProInfo, Nara Lucas, que sempre prestigiaram o trabalho que realizamos. Tambm quero agradecer Viviane Therezinha de Faria Fonseca pela editorao do livro e Manoel Loureno Filho que cuidou administrativa e financeiramente da realizao dessa obra. todos o meu agradecimento.

    Jos Armando Valente

  • NDICE

    1 Informtica na Educao no Brasil: Anlise eContextualizao Histrica ...........................................

    01

    2 Mudanas na Sociedade, Mudanas na Educao: OFazer e o Compreender .................................................

    29

    3 Uma Taxanomia para Ambientes de AprendizadoBaseados no Computador .............................................

    49

    4 Anlise dos Diferentes Tipos de Software Usados naEducao ....................................................................

    89

    5 Projeto Pedaggico: Pano de Fundo para Escolha deum Software Educacional ........................................

    111

    6 Formao de Professores: Diferentes AbordagensPedaggicas .....................................................................

    131

  • Jos Armando Valente 1

    Captulo 1

    INFORMTICA NA EDUCAO NO BRASIL: ANLISE E CONTEXTUALIZAO HISTRICA

    Jos Armando Valente

    INTRODUO

    A utilizao de computadores na educao to remota quanto o advento comercial dos mesmos. Esse tipo de aplicao sempre foi um desafio para os pesquisadores preocupados com a disseminao dos computadores na nossa sociedade. J em meados da dcada de 50, quando comearam a ser comercializados os primeiros computadores com capacidade de programao e armazenamento de informao, apareceram as primeiras experincias do seu uso na educao. Por exemplo, em 1955, foi usado na resoluo de problemas em cursos de ps-graduao e, em 1958, como mquina de ensinar, no Centro de Pesquisa Watson da IBM e na Universidade de Illinois Coordinated Science Laboratory (Ralston & Meek, 1976, p. 272).

    No entanto, a nfase dada nessa poca era praticamente a de armazenar informao em uma determinada seqncia e transmiti-la ao aprendiz. Na verdade, era a tentativa de implementar a mquina de ensinar idealizada por Skinner. Hoje, a utilizao de computadores na educao muito mais diversificada, interessante e desafiadora, do que simplesmente a de transmitir informao ao aprendiz. O computador pode ser tambm utilizado para enriquecer ambientes de aprendizagem e auxiliar o aprendiz no processo de construo do seu conhecimento.

    O termo informtica na educao que apresentamos nesse livro refere-se insero do computador no processo de ensino-aprendizagem de contedos curriculares de todos os nveis e modalidades de educao. Ao longo desse captulo, mostramos e discutimos as vantagens e desvantagens como mquina de ensino e como auxiliar do processo de construo do conhecimento.

    Uma vez isso posto, a primeira distino que necessrio explicitar que essa viso elimina o uso do computador para ensinar contedos de cincia da computao ou "alfabetizao em informtica". Nesse caso, o aluno usa a mquina para adquirir conceitos computacionais, como princpios de funcionamento do computador, noes de programao e implicaes do computador na sociedade. Essa abordagem tem sido bastante divulgada nos Estados Unidos da Amrica como computer literacy e tem sido a soluo que muitas escolas, no Brasil, tm encontrado para inserir o computador no processo ensino-aprendizagem. Para tanto, o atual currculo incrementado com a disciplina "Introduo Informtica", cujo objetivo ensinar computao. Certamente, isso permitir ao aluno conhecer o computador. Porm, do ponto de vista educacional, no altera o modo como os contedos das outras disciplinas so ministrados.

    Uma outra abordagem muito comum nas escolas, hoje, a utilizao do computador em atividades extra classe, com o intuito de ter a informtica na escola porm, sem modificar o esquema tradicional de ensino. Certamente, essa abordagem no se encaixa no que entendemos como informtica na educao. Em geral, essa atividade extra classe desenvolvida por um especialista em informtica, cuja funo desenvolver alguma atividade de uso do computador na escola. Essa abordagem tem sido adotada, em geral, por escolas que desejam ter o computador implantado nas atividades educacionais, mas no esto interessados em resolver as dificuldades que a insero do computador na disciplina normalmente acarreta, como a alterao do esquema de aulas, ou o investimento na formao dos professores das disciplinas.

    A informtica na educao que estamos tratando, enfatiza o fato de o professor da disciplina curricular ter conhecimento sobre os potenciais educacionais do computador e ser capaz de alternar adequadamente atividades tradicionais de ensino-aprendizagem e atividades que usam o computador.

    No entanto, a atividade de uso do computador pode ser feita tanto para continuar transmitindo a informao para o aluno e, portanto, para reforar o processo instrucionista, quanto para criar condies do aluno construir seu conhecimento.

    Quando o computador transmite informao para o aluno, o computador assume o papel de mquina de ensinar e a abordagem pedaggica a instruo auxiliada por ele. Essa abordagem tem suas razes nos mtodos tradicionais de

    Ncleo de Informtica Aplicada Educao Nied/Unicamp

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    ensino, porm em vez da folha de instruo ou do livro de instruo, usado o computador. Os software que implementam essa abordagem so os tutoriais e os de exerccio-e-prtica.

    Quando o aluno usa o computador para construir o seu conhecimento, o computador passa a ser uma mquina para ser ensinada, propiciando condies para o aluno descrever a resoluo de problemas, usando linguagens de programao, refletir sobre os resultados obtidos e depurar suas idias por intermdio da busca de novos contedos e novas estratgias. Nesse caso, o software utilizado pode ser os software abertos de uso geral, como as linguagens de programao, sistemas de autoria de multimdia, ou aplicativos como processadores de texto, software para criao e manuteno de banco de dados. Em todos esses casos, o aluno usa o computador para resolver problemas ou realizar tarefas como desenhar, escrever, calcular, etc.. A construo do conhecimento advm do fato de o aluno ter que buscar novos contedos e estratgias para incrementar o nvel de conhecimento que j dispe sobre o assunto que est sendo tratado via computador.

    A abordagem que usa o computador como meio para transmitir a informao ao aluno mantm a prtica pedaggica vigente. Na verdade, a mquina est sendo usada para informatizar os processos de ensino existentes. Isso tem facilitado a implantao do computador nas escolas, pois no quebra a dinmica tradicional j adotada. Alm disso, no exige muito investimento na formao do professor. Para ser capaz de usar o computador nessa abordagem, basta ser capaz de inserir o disquete ou, quando muito, ser treinado nas tcnicas de uso de cada software. No entanto, os resultados em termos da adequao dessa abordagem no preparo de cidados capazes de enfrentar as mudanas que a sociedade est passando, so questionveis. Tanto o ensino tradicional, quanto sua informatizao, preparam um profissional obsoleto.

    Por outro lado, o uso do computador na criao de ambientes de aprendizagem que enfatizam a construo do conhecimento, apresenta enormes desafios. Primeiro, implica em entender o computador como uma nova maneira de representar o conhecimento, provocando um redimensionamento dos conceitos j conhecidos e possibilitando a busca e compreenso de novas idias e valores. Us-lo com essa finalidade, requer a anlise cuidadosa do que significa ensinar e aprender bem como, demanda rever o papel do professor nesse contexto.

    Segundo, a formao desse professor envolve muito mais do que prov-lo com conhecimento sobre computadores. O seu preparo no pode ser uma simples oportunidade para passar informaes, mas deve propiciar a vivncia de uma experincia que contextualiza o conhecimento que ele constri. o contexto da escola, a prtica dos professores e a presena dos seus alunos que determinam o que deve ser abordado nos cursos de formao. Assim, o processo de formao deve criar condies para o docente construir conhecimento sobre as tcnicas computacionais, entender porque e como integrar o computador na sua prtica pedaggica, e ser capaz de superar barreiras de ordem administrativa e pedaggica, possibilitando a transio de um sistema fragmentado de ensino para uma abordagem integradora de contedo e voltada para a resoluo de problemas especficos do interesse de cada aluno. Dessa forma, o curso de formao deve criar condies para que o professor saiba recontextualizar o aprendizado e as experincias vividas durante a sua formao para a sua realidade de sala de aula, compatibilizando as necessidades de seus alunos e os objetivos pedaggicos que se dispe a atingir.

    Finalmente, a implantao da informtica, como auxiliar do processo de construo do conhecimento, implica em mudanas na escola que vo alm da formao do professor. necessrio que todos os segmentos da escola alunos, professores, administradores e comunidade de pais estejam preparados e suportem as mudanas educacionais necessrias para a formao de um novo profissional. Nesse sentido, a informtica um dos elementos que devero fazer parte da mudana, porm essa mudana muito mais profunda do que simplesmente montar laboratrios de computadores na escola e formar professores para a utilizao dos mesmos.

    No Brasil, as polticas de implantao da informtica na escola pblica, tm sido norteadas na direo da mudana pedaggica. Embora os resultados dos projetos governamentais sejam modestos, esses projetos tm sido coerentes e sistematicamente tm enfatizado a mudana na escola. Isso vem ocorrendo desde 1982, quando essas polticas comearam a ser delineadas. No entanto, essas polticas no so claramente defendidas por todos os educadores brasileiros e a sua implantao sofre influncias de abordagens utilizadas em outros pases como Estados Unidos da Amrica e Frana. Nesses pases, a utilizao da informtica na escola no tem a preocupao explcita e sistmica da mudana. O sistema educacional possui um nvel muito melhor do que o nosso e a informtica est sendo inserida como um objeto com o qual o aluno deve se familiarizar. Portanto, os objetivos da insero da informtica nesses pases so muito mais modestos e fceis de serem conseguidos: envolvem menos formao dos professores, menor alterao da dinmica pedaggica em sala de aula e pouca alterao do currculo e da gesto escolar.

    Embora o contexto mundial sobre o uso da informtica na educao sempre tem sido uma referncia para as decises que foram tomadas aqui, no Brasil, a nossa caminhada muito peculiar e difere daquilo que se faz em outros pases. No entanto, se compararmos os avanos pedaggicos conseguidos por intermdio da informtica no Brasil e em outros pases, os resultados so semelhantes e indicam que ela praticamente no alterou a abordagem pedaggica. Mesmo nos pases como Estados Unidos e Frana, locais onde houve uma grande proliferao de computadores nas escolas e um

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    grande avano tecnolgico, as mudanas so quase inexistentes do ponto de vista pedaggico. No se encontram prticas realmente transformadoras e suficientemente enraizadas para que se possa dizer que houve transformao efetiva do processo educacional, como por exemplo, uma transformao que enfatize a criao de ambientes de aprendizagem, no qual o aluno constri o seu conhecimento e tem o controle do processo dessa construo. Ainda o professor quem controla o ensino e transmite a informao ao aluno.

    A INFLUNCIA DA INFORMTICA NA EDUCAO AMERICANA E FRANCESA NO BRASIL

    A Informtica na Educao, no Brasil, nasceu a partir do interesse de educadores de algumas universidades brasileiras motivados pelo que j vinha acontecendo em outros pases como Estados Unidos da Amrica e Frana. Em 1971, a Primeira Conferncia Nacional de Tecnologia em Educao Aplicada ao Ensino Superior (I CONTECE), realizada no Rio de Janeiro, E. Huggins, especialista da Universidade de Dartmouth, E.U.A., minstrou um seminrio intensivo sobre o uso de computadores no ensino de Fsica (Souza, 1983). Em 1982, no I Seminrio Nacional de Informtica na Educao, realizado em Braslia, Mme. Franoise Faure, encarregada da rea Internacional da Direo Geral das Indstrias Eletrnicas e de Informtica da Frana, ministrou uma das duas palestras tcnicas do evento, a outra foi ministrada por Felix Kierbel, Diretor do Centro Nacional de Ensino de Informtica do Ministrio da Cultura e Educao da Argentina (Seminrio Nacional de Informtica na Educao 1 e 2, 1982).

    Nos Estados Unidos, o uso de computadores na educao completamente descentralizado e independente das decises governamentais. O seu uso nas escolas pressionado pelo desenvolvimento tecnolgico, necessidade de profissionais qualificados e pela competio estabelecida pelo livre mercado das empresas que produzem software, das universidades e das escolas.

    O incio da Informtica na Educao nos Estados Unidos, no princpio dos anos 70, no foi muito diferente do que aconteceu no Brasil. Os recursos tecnolgicos existentes no sistema educacional de 1o e 2o graus nos Estados Unidos em 1975 eram semelhantes ao que existia no Brasil. Segundo Ahl (1977), a tecnologia nas escolas americanas era a do giz e quadro-negro. O nmero de escolas que usavam computadores como recurso educacional era muito pequeno. Por outro lado, as universidades j dispunham de muitas experincias sobre o uso do computador na educao. No incio dos anos 60, diversos software de instruo programada foram implementados no computador, concretizando a mquina de ensinar, idealizada por Skinner no incio dos anos 50. Nascia a instruo auxiliada por computador ou o Computer-Aided Instruction (CAI), produzida por empresas como IBM, RCA e Digital e utilizada principalmente nas universidades. O programa PLATO, produzido pela Control Data Corporation e pela Universidade de Illinois, sem dvida, foi o CAI mais conhecido e mais bem sucedido.

    Entretanto, os sistemas CAIs eram implementados em computadores de grande porte, o que restringia o seu uso pelas universidades e dificultava a disseminao desses programas nas escolas elementares e secundrias. Outra limitao era a dificuldade de produo de material instrucional. No entanto, as dificuldades tcnicas provenientes do fato de os computadores serem de grande porte foram eliminadas com o aparecimento dos microcomputadores no incio dos anos 80.

    O aparecimento dos microcomputadores, principalmente o Apple, permitiu uma grande disseminao dos microcomputadores nas escolas. Essa conquista incentivou uma enorme produo e diversificao de CAIs, como tutoriais, programas de demonstrao, exerccio-e-prtica, avaliao do aprendizado, jogos educacionais e simulao. De acordo com estudos feitos por The Educational Products Information Exchange (EPIE) Institute, uma organizao do Teachers College, da Universidade de Columbia, foram identificados em 1983 trs anos aps a comercializao dos primeiros microcomputadores mais de 7.000 pacotes de software educacionais no mercado, sendo que 125 eram adicionados a cada ms.

    Entretanto, a presena dos microcomputadores permitiu tambm a divulgao de novas modalidades de uso do computador na educao, como ferramenta no auxlio de resoluo de problemas, na produo de textos, manipulao de banco de dados e controle de processos em tempo real. De acordo com essa abordagem, o computador passou a assumir um papel fundamental de complementao, de aperfeioamento e de possvel mudana na qualidade da educao, possibilitando a criao e o enriquecimento de ambientes de aprendizagem. O Logo foi o exemplo mais marcante dessa proposta.

    A linguagem Logo foi desenvolvida em 1967, tendo como base a teoria de Piaget e algumas idias da Inteligncia Artificial (Papert, 1980). Inicialmente, essa linguagem foi implementada em computadores de mdio e grande porte (PDP 11 e PDP 10, respectivamente), fato que fez com que, at o surgimento dos microcomputadores, o uso do Logo ficasse restrito s universidades e laboratrios de pesquisa. As crianas e professores se deslocavam at esses centros para usarem o Logo, e nessas circunstncias, os resultados das experincias com o Logo se mostraram interessantes e promissores. Na

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    verdade, foi a nica alternativa que surgiu para o uso do computador na educao com uma fundamentao terica diferente, passvel de ser usado em diversos domnios do conhecimento e com muitos casos documentados, que mostravam a sua eficcia como meio para a construo do conhecimento por intermdio do seu uso.

    A proliferao dos microcomputadores, no incio da dcada de 90, permitiu o uso do computador em todos nos nveis da educao americana, sendo largamente utilizado na maioria das escolas de ensino fundamental e ensino mdio e universidades. Nas escolas de ensino fundamental e ensino mdio, amplamente empregado para ensinar conceitos de informtica ou para "automao da instruo" por intermdio de software educacionais tipo tutoriais, exerccio-e-prtica, simulao simples, jogos, livros animados. Os resultados desse tipo de uso tm sido questionados em termos do custo e dos benefcios educacionais alcanados (Johnson, 1996).

    As mudanas pedaggicas que podem ser observadas so, atualmente, propiciadas pelo uso da rede Internet. Por intermdio da Internet, os alunos tm a chance de acessar e explorar diferentes bases de dados e construir pginas para registrar os resultados de projetos ou atividades desenvolvidas. No entanto, os artigos que descrevem essas atividades no mencionam a dinmica que se estabelece em sala de aula. Alguns crticos dessa abordagem pedaggica argumentam que a explorao da rede, em alguns casos, deixa os alunos sem referncia, com sensao de estarem perdidos, em vez de serem auxiliados no processo de organizar e digerir a informao disponvel.

    Nas universidades americanas, o computador est sendo usado como recurso para o aluno realizar tarefas. Desde os anos 60, as universidades dispem de muitas experincias sobre o uso do computador na educao. Mesmo assim, previa-se que a disseminao da tecnologia, de maneira rotineira, nos cursos de graduao, ocorreria somente por volta do incio do ano 2000 (Ahl, 1977). E realmente o que est acontecendo com os cursos de graduao nos Estados Unidos.

    Hoje, o computador passou a fazer parte da lista de material que o aluno de graduao deve adquirir e o seu uso se tornou rotineiro em praticamente todas as atividades, desde a produo de documentos, uso em sala de aula e em laboratrio at consulta a banco de dados, comunicao entre alunos e aluno-professor e desenvolvimento das disciplinas. Isso significa que o aluno sai da universidade com um bom conhecimento sobre o uso da informtica. Porm, o processo pedaggico envolvido no preparo do aluno de graduao ainda no sofreu mudanas profundas e enfatiza-se basicamente a transmisso de informao.

    Alm da Internet, outra fonte de mudana pedaggica tem sido os centros de pesquisa em educao, que passam por profundas transformaes. A preocupao atual no mais a produo de software cada vez mais inteligente e robusto para "automatizar a instruo", mas a produo de software que facilite o desenvolvimento de atividades colaborativas e auxiliares no desenvolvimento de projetos baseados na explorao. As atividades dos centros de pesquisa da Xerox e da RAND, por exemplo, mostram que hoje existe a preocupao com a interao homem-mquina, com a realizao de atividades mediadas pelo computador, em vez de o computador ser a supermquina que assume o controle do processo de ensino.

    A formao de professores voltada para o uso pedaggico do computador nos Estados Unidos no aconteceu de maneira sistemtica e centralizada como, por exemplo, na Frana. Nos Estados Unidos, os professores foram treinados sobre as tcnicas de uso dos software educativos em sala de aula, em vez de participarem de um profundo processo de formao. Em outros casos, profissionais da rea de computao tm assumido a disciplina de informtica que foi introduzida na grade curricular como forma de minimizar a questo do "analfabetismo em informtica".

    As universidades americanas ainda so as grandes formadoras de professores para a rea de informtica na educao. Praticamente todas as universidades oferecem, hoje, programas de ps-graduao em informtica na educao e muitos desses cursos esto disponveis na Internet. No entanto, no possvel dizer que o processo de aprendizagem foi drasticamente alterado. A preparao dos profissionais da educao ainda feita com o objetivo de capacit-los para atuarem em um sistema educacional que enfatiza a transmisso de informao. Poucas so as escolas nos Estados Unidos que realmente sabem explorar as potencialidades do computador e sabem criar ambientes que enfatizem a aprendizagem.

    Se nos Estados Unidos as decises educacionais so descentralizadas, na Frana exatamente o oposto. A Frana foi o primeiro pas ocidental que programou-se, como nao, para enfrentar e vencer o desafio da informtica na educao e servir de modelo para o mundo. Isso aconteceu tanto na produo do hardware e do software, quanto na formao das novas geraes para o domnio e produo de tal tecnologia.

    A Frana, enquanto nao, tem uma forte identidade cultural, construda ao longo dos ltimos dois sculos e um estado centralizador e fortemente planejador. A escola pblica fortssima e a particular quase inexistente. Indstria, comrcio, cultura, sade, interagem ativamente com a rede escolar. A perda da hegemonia cultural (e consequentemente da hegemonia econmica) para os Estados Unidos e o ingresso da Frana no Mercado Comum Europeu, levaram os polticos franceses a buscar essa hegemonia por meio do domnio da essncia da produo, transporte e manipulao das informaes encontradas na informtica.

    Assim, a implantao da informtica na educao foi planejada em termos de pblico alvo, materiais, software, meios de distribuio, instalao e manuteno do equipamento nas escolas. No entanto, desde o incio dessa

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    implantao, que aconteceu no final dos anos 60, o debate girava em torno de questes do tipo: deve-se preparar o aluno para dominar a informtica ou deve-se educar por intermdio dela? A informtica deve ser objeto de ensino ou ferramenta do processo de ensino? A questo da mudana na escola nunca foi cogitada. O objetivo da introduo da informtica na educao, na Frana, nunca foi o de provocar mudanas de ordem pedaggica, embora possvel notar avanos nesse sentido, porm, esses avanos esto longe das transformaes desejadas. A sntese dessa histria encontra-se nos livros de Baron & Bruillard (1996), Dieuzeide (1994), e Minc & Nora (1978).

    A implantao da informtica na educao, na Frana, ocorreu, basicamente, em quatro fases. Na primeira fase, no incio dos anos 70, foi feito um grande investimento na preparao de docentes. Entre 1970 e 1976 foram utilizados minicomputador e a partir de 1978, os microcomputadores. Inicialmente, foram formados os professores dos liceus (59, em toda a Frana) por intermdio de cursos de longa durao: um ano, com meio perodo dirio. Os software empregados se caracterizaram como EAO (Enseignement Assist par Ordinateur), o que equivale ao CAI, desenvolvido nos anos 60 nos Estados Unidos. Este tipo de software era adequado s caractersticas rgidas dos equipamentos disponveis e viso educaciona da poca.

    A segunda fase, denominada 10.000 Microcomputadores, iniciou-se em 1978, com o duplo objetivo de desenvolver o uso do computador como ferramenta do processo de ensino de praticamente todas as disciplinas e familiarizar os alunos com a informtica. exatamente nesse perodo, incio dos anos 80, que comeou a disseminar-se na Frana, a linguagem de programao e metodologia Logo com fins educacionais, opondo-se frontalmente s bases conceituais do EAO. Em 1982, o governo francs instalou em Paris o Centro Mundial de Recursos Humanos para a Informtica, sob direo de J.J. Servan Schreiber e direo cientfica de Seymour Papert.

    A terceira fase est relacionada com o terceiro plano nacional, Informatique pour Tous (incio da implantao em 1985), onde houve maior proliferao da informtica no mbito das instituies escolares. Os objetivos continuavam sendo a aquisio do domnio tcnico do uso do software e a integrao de ferramentas computacionais ao processo pedaggico. O programa de informtica na educao da Frana no tinha como objetivo fundamental a mudana pedaggica, mas sim a preparao do aluno para ser capaz de usar a tecnologia da informtica.

    Assim, usando o computador como recurso para o desenvolvimento de tarefas, os professores orientavam a edio de jornais com processadores de texto, a resoluo de equaes do 2o grau, usando planilhas ou, acompanhavam o desenvolvimento de projetos experimentais, registrando os dados em um banco de dados. O Logo era empregado no desenvolvimento de projetos para os nveis de ensino elementar e secundrio.

    Atualmente, a informtica na educao na Frana est na sua quarta fase, iniciada no comeo da dcada de 90. Isso aconteceu graas disseminao progressiva dos computadores nas escolas, notadamente os liceus, colgios e escolas secundrias. Centro de Documentao e de Informao (CDI) foram implantados objetivando a gesto do acervo disponvel e o atendimento de livre servio, em que so disponibilizados equipamentos e software para os alunos desenvolverem suas atividades e estudos. As salas de aulas de disciplinas tais como Fsico-Qumica, Histria-Geografia, cada vez mais so equipadas com computadores, interfaces e software especficos, permitindo a realizao de experincias assistidas por computador EXAO, bem como a observao de fatos histricos ou de situaes geogrficas por intermdio de programas que permitem analisar todo o contexto sob diferentes pontos de vista.

    Talvez, o que mais marcou o programa de informtica na educao da Frana tenha sido a preocupao com a formao de professores. Desde o incio de 1970, a formao de docentes e tcnicos das escolas foi considerada como condio imperativa para uma real integrao da informtica educao. Foram estruturados centros de formao e, no segundo plano nacional, houve uma preparao intensiva dos professores, mas ainda sem uma abordagem pedaggica especfica. Os contedos versavam sobre o estudo do objeto informtica e computadores, bem como sobre introduo a linguagens de programao, sem estabelecer articulaes entre teorias educacionais e prticas pedaggicas com o computador.

    A formao em informtica propriamente pedaggica, iniciou-se a partir do Plano Informtica para Todos (em 1985). Foram desenvolvidos programas de formao de professores, inicialmente com 50 h de durao, remuneradas, uma vez que se realizavam em perodos de frias escolares. Posteriormente, os professores participavam de outras atividades de formao, inclusive estgios de observao e atuao, perfazendo um perodo de aproximadamente 3 meses. Em 1985, foram preparados 100.000 professores, desta maneira.

    Outra preocupao do programa francs tem sido o de garantir a todos os indivduos o acesso informao e ao uso da informtica. Atualmente, isso tem sido reforado pelos projetos de implantao de redes de computadores e de comunicao a distncia para a educao e a formao. No mbito da educao, existe um projeto nacional para colocar em rede os liceus, colgios e escolas, apoiado na tecnologia Internet e na infra-estrutura da rede Renater. Os liceus e colgios dispem de ligaes permanentes na rede Renater, o que lhes permite acolher os projetos das instituies escolares e apoiar o seu desenvolvimento em coordenao com outros centros que tm servios pedaggicos na Internet.

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    Embora na Frana tenham sido propostos inmeros projetos de informtica na educao, para alguns autores, esses projetos no tiveram xito e no provocaram mudanas no sentido de romper o hbito milenar da educao do falar/ditar dos professores. Com a falta de uma poltica maior do que mostrar uma imagem da modernizao, melhor e mais adequada preparao dos docentes, Levy observa que isso aconteceu, entre outras razes, pelo fato de as propostas apresentadas no incorporarem uma demanda por melhores solues tcnicas: O governo escolheu material da pior qualidade, perpetuamente defeituoso, fracamente interativo, pouco adequado aos usos pedaggicos (Levy, 1993, p. 9).

    No entanto, difcil determinar o que significa xito ou mudana em to curto espao de tempo, quando o pretendido formar a cultura de um povo. A Frana avanou em muitos aspectos da informtica aplicada educao e no possvel ingressar em qualquer dos seus domnios sem se consultar esse pas. No entanto, se perguntarmos "O que acontece concretamente na Frana em termos de mudanas pedaggicas advindas do uso da informtica na educao?" em sntese podemos afirmar que a centralizao das decises no trouxe maiores mudanas. Em relao aculturao e aprendizagem por intermdio da informtica, os resultados positivos que puderam ser verificados na Frana freqentemente no foram previstos e a homogeneizao do sucesso da educao mediada pela tecnologia, no ocorreu (Linard, 1990).

    Entretanto, se tais alteraes de perspectivas pedaggicas ocorreram, parte desses avanos se deve informtica. Seguramente, o difcil destacar esta ou aquela causa como o nico agente de avano. Essas causas formam um todo indicativo da gestao longa e difcil do novo. No entanto, esses avanos ainda esto longe das transformaes pedaggicas desejadas.

    Portanto, podemos concluir que a introduo da informtica na educao na Frana e nos Estados Unidos da Amrica provocou um grande avano na disseminao dos computadores na escolas. Porm, esse avano no correspondeu s mudanas de ordem pedaggicas que essas mquinas poderiam causar na educao. As escolas nesses pases tm mais recursos do que as escolas brasileiras e esto, praticamente, todas informatizadas. Mas, a abordagem educacional ainda , na sua grande maioria, a tradicional.

    BREVE VISO HISTRICA DA INFORMTICA NA EDUCAO NO BRASIL

    No Brasil, como em outros pases, o uso do computador na educao teve incio com algumas experincias em universidades, no princpio da dcada de 70. Em 1971, foi realizado na Universidade Federal de So Carlos um seminrio intensivo sobre o uso de computadores no ensino de Fsica, ministrado por E. Huggins, especialista da Universidade de Dartmouth, E.U.A. (Souza, 1983). Nesse mesmo ano, o Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras promoveu, no Rio de Janeiro, a Primeira Conferncia Nacional de Tecnologia em Educao Aplicada ao Ensino Superior (I CONTECE). Durante essa conferncia, um grupo de pesquisadores da Universidade de So Paulo (USP), acoplou, via modem, um terminal no Rio de Janeiro a um computador localizado no campus da USP (Souza, 1983).

    Na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em 1973, o Ncleo de Tecnologia Educacional para a Sade e o Centro Latino-Americano de Tecnologia Educacional (NUTES/CLATES) usou software de simulao no ensino de Qumica. Na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), nesse mesmo ano, realizaram-se algumas experincias, usando simulao de fenmenos de Fsica com alunos de graduao. O Centro de Processamento de Dados da UFRGS dadesenvolveu o software SISCAI para avaliao de alunos de ps-graduao em Educao. Em 1982, o SISCAI foi traduzido para os microcomputadores de 8 bits como CAIMI (CAI para MIcrocomputadores), funcionando como um sistema CAI e foi utilizado no ensino do 2o grau pelo grupo de pesquisa da Faculdade de Educao (FACED), liderado pela Profa. Lucila Santarosa.

    Na UNICAMP, em 1974, desenvolvi com um aluno de iniciao cientfica, Marcelo Martelini, um software tipo CAI, implementado em linguagem BASIC, para o ensino de fundamentos de programao BASIC. Esse CAI foi usado por alunos do Mestrado em Ensino de Cincia e Matemtica, coordenado pelo Prof. Ubiratan D'Ambrsio, realizado no Instituto de Matemtica, Estatstica e Cincia da Computao e financiado pela Organizao dos Estados Americanos (OEA) e Ministrio da Educao (MEC). Em 1975, aconteceu a primeira visita de Seymour Papert e Marvin Minsky ao Brasil, que lanaram as primeiras sementes das idias do Logo. Em 1976, um grupo de professores do Departamento de Cincia de Computao, produziu o documento "Introduo a Computadores (Takahashi et al, 1976), financiado pelo Programa de Expanso e Melhoria do Ensino (PREMEN/MEC). Nesse mesmo ano, foram iniciados os primeiros trabalhos com o uso de Logo com crianas1. Papert e Minsky retornam ao Brasil para ministrar seminrios e participar das atividades do grupo de pesquisa sobre o uso de Logo em educao que tinha se estabelecido. Essas experincias e estudos

    1 Essa experincia era realizado com filhos de professores da UNICAMP e utilizava o nico terminal de raio catodo ligado ao computador PDP 10 que a UNICAMP dispunha.

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    deram origem dissertao de mestrado de Maria Ceclia Calani (1981) e, posteriormente, o grupo de pesquisa foi consolidado com a criao do Ncleo de Informtica Aplicada Educao (NIED), em maio de 1983.

    Em 1981, o Logo foi intensamente utilizado por um grupo de pesquisadores liderados pela Profa. La da Cruz Fagundes do Laboratrio de Estudos Cognitivos (LEC) da UFRGS. O LEC foi criado em 1973 por pesquisadores preocupados com as dificuldades da aprendizagem de matemtica apresentadas por crianas e adolescentes da escola pblica. Os estudos realizados tinham um forte base piagetiana e eram coordenados pelo Dr. Antnio Battro, discpulo de Piaget. O Logo, tambm desenvolvido com bases piagetianas, passou a ser uma importante ferramenta de investigao de processos mentais de crianas de 7 a 15 anos que faziam parte dos estudos do LEC.

    Portanto, existiam no incio dos anos 80 diversas iniciativas sobre o uso da informtica na educao, no Brasil. Esses esforos, aliados ao que se realizava em outros pases e ao interesse do Ministrio de Cincia e Tecnologia (MCT) na disseminao da informtica na sociedade, dispertaram o interesse do governo e de pesquisadores das universidades na implantao de programas educacionais baseados no uso da informtica. Essa implantao teve incio com o primeiro e o segundo Seminrio Nacional de Informtica em Educao, realizados respectivamente na Universidade de Braslia em 1981 e na Universidade Federal da Bahia em 1982 (Seminrio Nacional de Informtica na Educao 1 e 2, 1982).

    Esses seminrios estabeleceram um programa de atuao que originou o EDUCOM e que foi implantado pela Secretaria Especial de Informtica (SEI) e pelo MEC, com suporte do CNPq e FINEP, rgos do MCT. O EDUCOM permitiu a formao de pesquisadores das universidades e de profissionais das escolas pblicas que possibilitaram a realizao de diversas aes iniciadas pelo MEC, como realizao de Concursos Nacional de Software Educacional (em 1986, 1987 e 1988), a implementao do FORMAR Curso de Especializao em Informtica na Educao (realizados em 1987 e 1989), e implantao nos estados do CIEd Centros de Informtica em Educao (iniciado em 1987). Em 1989, foi implantado na Secretaria Geral do MEC o Plano Nacional de Informtica Educativa PRONINFE. Esse programa consolidou as diferentes aes que tinham sido desenvolvidas em termos de normas e uma rubrica no Oramento da Unio, realizou o FORMAR III (Goinia) e FORMAR IV (Aracaj) destinados a formar professores das escolas tcnicas e implantou os Centros de Informtica Educativa nas Escolas Tcnicas Federais (CIET). Detalhes dessa longa caminhada podem ser encontrados em dois livros publicados em 1993, que descrevem as aes do MEC na rea de informtica na educao (Andrade, 1993; Andrade & Lima, 1993). Mais recentemente, foi publicado um artigo por Maria Cndida Moraes (1997), que esteve envolvida com as atividades de informtica na educao do MEC desde 1982 at 1997 e que foi responsvel pela aes de informtica em educao desenvolvidas nesse ministrio.

    Em 1997, foi criado o Programa Nacional de Informtica na Educao ProInfo, vinculado Secretaria de Educao a Distncia SEED, do MEC e sob a coordenao de Cludio Salles. Esse programa implantou, at o final de 1998, 119 Ncleos de Tecnologia Educacional (NTE) em 27 Estados e Distrito Federal, e capacitou, por intermdio de cursos de especializao em informtica em educao (360 horas), cerca de 1419 multiplicadores para atuarem nos NTEs. Estaro sendo entregue em 1999 cerca de 30 mil microcomputadores para ser implantados em escolas e outros 100 NTEs. A meta atingir 3 mil escolas, 21 mil professores e 2 milhes de alunos. O acompanhamento do que est sendo realizado, pode ser feito por intermdio da pgina na Internet, no endereo http://www.proinfo.gov.br/.

    A anlise das aes e polticas de informtica na educao realizadas no Brasil nos permite afirmar que, inquestionavelmente, temos conhecimento e experincias sobre informtica na educao instalados nas diversas instituies do pas. Temos uma abordagem muito particular de atuao nessa rea e acumulado conhecimento e experincias que permitem ao ProInfo realizar as atividades e assumir as metas planejadas. Claro que no se est ignorando o que realizado em outros pases, mas toda a informao e experincia que est sendo utilizada pelos diferentes elementos atuando no programa multiplicadores, professores, tcnicos e administradores so frutos do trabalho que foi desenvolvido nessa rea, no Brasil.

    Essa construo de conhecimento foi possvel porque, diferentemente do que aconteceu na Frana e nos Estados Unidos, as polticas e propostas pedaggicas da informtica na educao, no Brasil, sempre foram fundamentadas nas pesquisas realizadas entre as universidades e escolas da rede pblica. Desde o incio do programa, a deciso da comunidade de pesquisadores foi que as polticas a serem implantadas deveriam ser sempre fundamentadas em pesquisas pautadas em experincias concretas com a escola pblica. Essas foram as bases do projeto EDUCOM, realizado em cinco universidades: Universidade Federal de Pernambuco (UFPe), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Esse projeto contemplou a diversidade de uso do computador em diferentes abordagens pedaggicas, como desenvolvimento de software educacionais e uso do computador como recurso para resoluo de problemas. E, do ponto de vista metodolgico, o trabalho de pesquisa foi realizado por equipes interdisciplinares, formada pelos professores das escolas escolhidas e por um grupo de profissionais da universidade. Os professores das escolas eram os responsveis pelo desenvolvimento do projeto na escola e esse trabalho tinha o suporte e

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    o acompanhamento do grupo de pesquisa da universidade, formado por pedagogos, psiclogos, socilogos e cientistas da computao.

    Portanto, a primeira diferena entre o programa de informtica na educao do Brasil e da Frana e Estados Unidos a relao que se estabeleceu entre os rgos de pesquisa e a escola pblica. Na Frana, as polticas implantadas pelo governo no foram necessariamente frutos da pesquisa e no houve o estabelecimento de uma ligao direta entre os centros de pesquisa e escola pblica. Nos Estados Unidos, embora tenham sido produzidas inmeras pesquisas, estas podiam ou no ser adotadas pela escola interessada em implantar a informtica.

    A segunda diferena entre o programa brasileiro e o francs e americano a descentralizao das polticas e sistemtica de trabalho estabelecida entre o MEC e as instituies que desenvolvem atividades de informtica na educao. Essa sistemtica tem sido diferente at mesmo de quaisquer outros programas educacionais iniciados pelo MEC. No caso da informtica na educao, as decises e as propostas no tm sido totalmente centralizadas no MEC. Elas tm sido fruto de discusses e propostas feitas pela comunidade de tcnicos e pesquisadores da rea. A funo do MEC tem sido a de acompanhar, viabilizar e implementar essas decises. Portanto, no Brasil, as polticas de implantao e desenvolvimento da informtica na educao no so produto somente de decises governamentais, como na Frana, nem conseqncia direta do mercado como nos Estados Unidos.

    A terceira diferena com relao proposta pedaggica e o papel que o computador desempenha no processo educacional. Nesse aspecto, o programa brasileiro de informtica na educao bastante peculiar comparado com o que foi proposto em outros pases. No nosso programa, o papel do computador o de provocar mudanas pedaggicas profundas, em vez de "automatizar o ensino" ou preparar o aluno para ser capaz de trabalhar com a informtica. Essa proposta de mudana sempre esteve presente, desde o I Seminrio Nacional de Informtica na Educao, realizado em Braslia. Todos os centros de pesquisa do projeto EDUCOM atuaram na perspectiva de criar ambientes educacionais, usando o computador como recurso facilitador do processo de aprendizagem. O grande desafio era a mudana da abordagem educacional: transformar uma educao centrada no ensino, na transmisso da informao, para uma educao em que o aluno pudesse realizar atividades por intermdio do computador e, assim, aprender. A formao dos pesquisadores dos centros, os cursos de formao ministrados e mesmo os software educacionais desenvolvidos por alguns centros eram elaborados, tendo em mente a possibilidade desse tipo de mudana pedaggica.

    Embora a mudana pedaggica tenha sido o objetivo de todas as aes dos projetos de informtica na educao, os resultados obtidos no foram suficientes para sensibilizar ou alterar o sistema educacional como um todo. Os trabalhos realizados nos centros do EDUCOM e nos outros centros de informtica na educao, tiveram o mrito de elevar a nossa compreenso do estado zero para o estado atual, possibilitando-nos entender e discutir as grandes questes da rea. Mais ainda, temos diversas experincias instaladas no Brasil que apresentam mudanas pedaggicas fortemente enraizadas e produzindo frutos. No entanto, essas idias no se alastraram e isso aconteceu, principalmente, pelo fato de termos subestimado as implicaes das mudanas pedaggicas propostas no sistema educacional como um todo: a mudana na organizao da escola, na dinmica da sala de aula, no papel do professor e dos alunos e na relao com o conhecimento.

    A anlise das experincias realizadas nos permite entender que a promoo dessas mudanas pedaggicas no depende simplesmente da instalao dos computadores nas escolas. necessrio repensar a questo da dimenso do espao e do tempo da escola. A sala de aula deve deixar de ser o lugar das carteiras enfileiradas para se tornar um local em que professor e alunos podem realizar um trabalho diversificado em relao ao conhecimento. O papel do professor deixa de ser o de "entregador" de informao, para ser o de facilitador do processo de aprendizagem. O aluno deixa de ser passivo, de ser o receptculo das informaes, para ser ativo aprendiz, construtor do seu conhecimento. Portanto, a nfase da educao deixa de ser a memorizao da informao transmitida pelo professor e passa a ser a construo do conhecimento realizada pelo aluno de maneira significativa, sendo o professor, o facilitador desse processo de construo.

    O processo de repensar a escola e preparar o professor para atuar nessa escola transformada, est acontecendo de maneira mais marcante nos sistemas pblicos de educao, principalmente os sistemas municipais. Nas escolas particulares, em geral, o investimento na formao do professor ainda no uma realidade. Nessas escolas, a informtica est sendo implantada nos mesmos moldes do sistema educacional dos Estados Unidos, onde o computador usado para minimizar o analfabetismo computacional dos alunos ou automatizar os processos de transmisso da informao.

    Embora o objetivo sempre tenha sido a mudana educacional e as questes envolvidas na implantao da informtica na escola estejam mais claras hoje, as nossas aes no foram voltadas para o grande desafio dessas mudanas. Mesmo hoje, as aes so incipientes e no contemplam essas mudanas. Isso pode ser notadamente observado nos avanos da informtica e nos programas de formao de professores para atuarem na rea da informtica na educao que atualmente esto sendo realizados.

    A FORMAO DE PROFESSORES E A EVOLUO DO COMPUTADOR NO BRASIL

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    A introduo da informtica na educao, segundo a proposta de mudana pedaggica, como consta no programa brasileiro, exige uma formao bastante ampla e profunda dos educadores. No se trata de criar condies para o professor simplesmente dominar o computador ou o software, mas sim auxili-lo a desenvolver conhecimento sobre o prprio contedo e sobre como o computador pode ser integrado no desenvolvimento desse contedo. Mais uma vez, a questo da formao do professor mostra-se de fundamental importncia no processo de introduo da informtica na educao, exigindo solues inovadoras e novas abordagens que fundamentem os cursos de formao.

    No entanto, o que se nota, principalmente nesse momento, que essa formao no tem acompanhado o avano tanto tecnolgico quanto do nvel de compreenso sobre as questes da informtica na educao que dispomos hoje. Isso tem acontecido, em parte, porque as mudanas pedaggicas so bastante difceis de serem assimiladas e implantadas nas escolas. A outra dificuldade apresentada pela velocidade das mudanas da informtica, criando uma ampla gama de possibilidades de usos do computador, exigindo muito mais dessa formao do professor, o que acaba paralisando-o.

    A questo da formao de professores ser amplamente discutida no captulo 6 desse livro. Por hora importante notar que esse processo de formao no Brasil tem passado por trs fases bastante distintas. Essas fases so caracterizadas pela abordagem educacional adotada e pela disseminao e tipo de computadores utilizados.

    A primeira, pode ser caracterizada como a fase da formao artesanal, realizada durante a implantao do Projeto EDUCOM. Os computadores estavam nos centros de pesquisa e eram minicomputadores ou microcomputadores Apple ou I 7000 da Itautec. Essas mquinas eram caras e no dispunham de recursos de software educacionais, como no caso do I 7000, ou recursos tcnicos, como no caso do Apple.

    O Apple foi o microcomputador disseminado nas escolas dos Estados Unidos. Era uma mquina simples, de fcil compreenso e domnio, muito flexvel e relativamente poderosa e robusta. A flexibilidade e fcil domnio fizeram com que fosse possvel o desenvolvimento de todo tipo de software e de hardware para essa mquina. E isso era feito tanto por empresas e por especialistas da rea da computao, quanto por professores, pais, alunos e pessoas que se interessavam pela produo de material a ser utilizado na educao. O resultado foi a avalanche de software educacional produzido, como mencionado anteriormente.

    No Brasil, embora existissem mais de 40 diferentes fabricantes de computadores do tipo Apple e muitos software e hardware disponveis, ele no foi adotado como o computador da educao. Isso aconteceu, principalmente, por limitaes tcnicas, como por exemplo, a impossibilidade de se usar os caracteres da lngua portuguesa. Era impossvel imaginar que o aluno fosse usar um instrumento na escola que no permitisse escrever corretamente palavras da sua lngua. Por outro lado, era impossvel convencer os produtores do Apple a fazerem as alteraes necessrias para superar essa dificuldade. Com isso, o Apple entrou nas empresas e no comrcio, mas no entrou nas escolas.

    O microcomputador adotado na maioria das universidades brasileiras e pelos projetos EDUCOMs foi o I 7000, produzido pela Itautec. Ele possibilitava o uso dos caracteres da lngua portuguesa e diversos software foram desenvolvidos pela Itautec para explorar essas facilidades, como o processador de texto Redator e o Logo Itautec, desenvolvido em colaborao com a UNICAMP. No entanto, pouco software educativo foi desenvolvido para o I 7000 e esse microcomputador acabou servindo para a produo de texto e uso do Logo.

    Portanto, tanto o Apple quanto o I 7000 no chegaram s escolas e seu uso ficou restrito aos centros de pesquisa. A formao dos pesquisadores e dos professores das escolas acontecia nos centros de pesquisa e por intermdio de atividades realizadas conjuntamente, muito similar ao que acontece em um processo de aprendizagem artesanal, do mestre com seus discpulos. Esse processo foi bastante eficaz e propiciou uma formao com qualidade de um grande nmero de profissionais, que foram responsveis pela realizao de pesquisa e trabalhos na rea de informtica na educao. As dificuldades de ordem educacionais e tcnicas eram vencidas pela unio de esforos dos especialistas de diferentes reas da universidade e dos professores das escolas que dispunham da experincia de sala de aula.

    A segunda fase do processo de formao, pode ser caracterizada com a formao em massa e coincide com o aparecimento e disseminao dos microcomputadores MSX nas escolas brasileiras. Para tanto, era necessrio formar professores das escolas, por intermdio dos cursos FORMAR e dos Centros de Informtica Educativa (CIEd) montados nos estados.

    O MSX foi produzido e lanado no mercado em 1986 pela Sharp (Hotbit) e Gradiente (Expert) e voltado para o mercado dos vdeo-jogos. Ele tinha inmeras facilidades de hardware que permitiam implementar animao, quatro canais para produo simultnea de som, 256 cores e usava, como monitor, uma televiso em cores. Essas facilidades permitiam o desenvolvimento de bons software educacionais, inmeros jogos e uma tima verso do Logo. At hoje, mesmo com as

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    facilidades e velocidade dos Pentiuns, o Logo para essas mquinas no dispe das caractersticas que o Logo do MSX dispunha, como por exemplo, animao2.

    Embora a produo dos computadores PC coincida com a do MSX, os PCs foram desenvolvidos para servirem empresa e ao comrcio. Essas mquinas dispunham dos caracteres da lngua portuguesa, mas no dispunham de nenhuma outra caracterstica indispensvel para a educao, como cores, animao, som. Alm disso, o seu preo era proibitivo para as escolas.

    Por outro lado, o MSX no era uma mquina com a mesma flexibilidade do Apple. No dispunha de facilidades para gravar as informaes em disco (inicialmente a informao era gravada em fita cassete) ou ligar-se a impressoras ou mesmo a outros dispositivos. Alm disso, o MSX no dispunha de um processador de texto ou programas de planilha e banco de dados. Ele era mais parecido com um brinquedo do que um computador. A escola que adotasse o MSX para desenvolver atividades, usando o Logo, deveria dispor de alguns computadores I 7000 ou PC para produzir textos, planilhas ou banco de dados. Era irnico que um sistema educacional pobre como o nosso, tivesse que dispor de dois tipos de computadores para dar conta das atividades desenvolvidas na escola.

    Com todas as facilidades e dificuldades do MSX, ele foi adotado como o computador para a educao. Muitas escolas adquiriram essa mquina para implantar a abordagem Logo, como as 50 escolas da rede municipal de Educao da cidade de So Paulo e todos os centros de pesquisa em informtica e educao. Os EDUCOMs da UFRJ e UFMG produziram bons software educativos para o MSX. Empresas e pessoas interessadas em informtica na educao tambm produziram esses software encorajados pelos Concursos de Software Educacionais promovidos pelo MEC.

    A simplicidade do MSX e o fato de no dispor de muitas alternativas do ponto de vista de software, reduziu a questo do uso do computador na educao em termos de dois plos: o uso do Logo ou de software educacionais como jogos, tutoriais, etc.. Tendo o professor optado por um desses plos, a formao e o domnio dessa abordagem educacional era gradativa e sem muitos percalos. Por exemplo, no caso do Logo, era s ligar o MSX que a Tartaruga aparecia na tela. O professor acabava se sentido confortvel e familiarizado com a informtica. No era preciso enveredar por atalhos como sistemas operacionais, diferentes hardware e diferentes software, e o professor podia se concentrar mais nas questes pedaggicas do uso do computador na educao. As questes pedaggicas estavam sendo trabalhadas em um ambiente relativamente seguro e de fcil domnio.

    O curso FORMAR foi montado para capacitar professores nesse contexto. O curso no se preocupava com o domnio do computador e nem com o domnio de diferentes software. Como ser visto no captulo 6, os cursos FORMAR I e II utilizaram basicamente o MSX e alguns I 7000. Mas, esses cursos consistiram em fornecer condies para o professor aprender sobre comandos do Logo grfico e alguns comandos do Logo lista, sobre como construir um software educacional, como usar um processador de texto e aprender sobre alguns princpios de como o computador funciona. Essas atividades ocupavam praticamente metade da carga horria. A outra metade era dedicada formao sobre a parte pedaggica como usar esses recursos em situaes educacionais. No se falava em sistema operacional, no havia necessidade de dominar o mouse, abrir janelas e integrar diferentes software como o caso dos atuais sistemas do Windows ou saber integrar diferentes mdias vdeo, foto, animao, texto, som na construo de sistemas multimdias.

    Assim, a calmaria da era MSX foi tumultuada pela descontinuidade da produo desses microcomputadores em 1994 e pelo aparecimento do sistema Windows para o PC. O Windows possibilitou o desenvolvimento de inmeros programas para praticamente todas as reas. Surgiram tambm outras modalidades de uso do computador na educao, como uso de multimdia, de sistemas de autorias para construo de multimdia e de redes, como ser visto no captulo 3. A questo educacional atualmente no pode ser dicotomizada em dois plos, como na era do MSX.

    Certamente, o Logo ainda se mantm como possibilidade para o aluno programar o computador e aprender por intermdio do ciclo descrio-execuo-reflexo-depurao, como ser discutido no captulo 4. No entanto, o aprendizado por meio desse tipo de interao com o computador tambm possvel, quando se usa outros software como os sistemas de autoria e software abertos como planilhas, banco de dados e simulaes. Esses sistemas possibilitam ao aluno descrever a resoluo do problema para o computador e, por meio desse processo, adquirir novos conceitos e estratgias. Portanto, hoje o Logo no a nica opo que o professor dispe para criar ambientes de aprendizagem, usando o computador.

    Por outro lado, se esses novos software ampliam as possibilidades que o professor dispe para o uso do computador na construo do conhecimento, tambm demandam um discernimento maior por parte do professor e, conseqentemente, uma formao mais slida e mais ampla. Isso deve acontecer tanto no domnio dos aspectos

    2 Isso acontecia nos MSX, porque essas mquinas foram desenvolvidas para permitir a implementao de jogos e vdeo-jogos. O controle da animao e do som era feito por hardware. Os MSX dispunham de chips para controlar essas facilidades, o que nos Pentiuns tm que ser feito via software.

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    computacionais quanto do contedo curricular. Sem esses conhecimentos, muito difcil o professor saber integrar e saber tirar proveito do computador no desenvolvimento dos contedos. A nossa experincia, observando professores desenvolvendo atividades de uso do computador com alunos, tem mostrado que os professores, freqentemente, no tm uma compreenso mais profunda do contedo que ministram e essa dificuldade impede o desenvolvimento de atividades que integram o computador.

    Assim, as novas possibilidades tecnolgicas que se apresentam hoje tm causado um certo desequilbrio no processo de formao do professor. Sair do MSX e passar para o sistema Windows, significou um salto muito grande. O professor, diante dessas novas possibilidades, tem se sentido bastante inseguro e, praticamente, a sua formao tem que ser refeita. O sentimento o de que voltamos estaca zero. Isso s no totalmente verdade, porque o professor que usou o MSX possui uma boa noo da base pedaggica que sustenta o uso do computador na educao e tem acumulado muita experincia nessa rea.

    Mas se essas novas tecnologias criam certas dificuldades, facilitam outras. Por exemplo, a ligao desses computadores na rede Internet possibilita professores e alunos estarem em permanente contato com uma quantidade de informao jamais pensada. Professores podem estar em contato direto com os centros de formao. Por intermdio desse contato, os docentes das escolas e os pesquisadores dos centros de informtica na educao podem interagir e trocar idias, responder dvidas, participar de debates via rede, receber e enviar reflexes sobre o andamento do trabalho. Esse contato tem contribudo tanto para a formao do professor quanto para auxili-lo na resoluo das dificuldades que encontra na implantao da informtica nas atividades de sala de aula, como acontece no trabalho que estamos realizando com o Colgio Me de Deus, de Londrina, PR (Valente, 1998) e ser discutido no captulo 6. Mesmo os cursos de formao podem explorar as facilidades da rede para minimizar os efeitos da retirada do docente do seu contexto de trabalho como no curso de formao de professores de Costa Rica, realizado pelo LEC da UFRGS; ou no desenvolvimento de cursos que combinem parte presencial e parte via rede, como acontece atualmente nas experincias de formao realizadas no Projeto de Formao de Professores Via Telemtica, patrocinado pela OEA e realizados no LEC e no NIED.

    Na verdade, a introduo da informtica na educao, segundo a proposta de mudana pedaggica, como consta no programa brasileiro, exige uma formao bastante ampla e profunda do professor. No se trata de criar condies para o professor dominar o computador ou o software, mas sim auxili-lo a desenvolver conhecimento sobre o prprio contedo e sobre como o computador pode ser integrado no desenvolvimento desse contedo. Mais uma vez, a questo da formao do professor mostra-se de fundamental importncia no processo de introduo da informtica na educao, exigindo solues inovadoras e novas abordagens que fundamentem os cursos de formao. Alm disso, no podemos colocar a responsabilidade da implantao da informtica na escola somente nas costas do professor. A implantao da informtica, segundo uma abordagem inovadora de aprendizagem baseado na construo do conhecimento e no na memorizao da informao, implica em mudanas na escola que podero ser realizadas se houver o envolvimento de todas a comunidade escolar alunos, professores, supervisores, diretores e pais. Essa comunidade deve tambm estar preparada para entender e usar a informtica, bem como dar suporte para as mudanas necessrias na escola de modo que a informtica possa ser implantada segundo uma proposta inovadora, que prepara cidados para viver na sociedade do conhecimento, como ser visto e discutido no captulo 2.

    CONCLUSES

    Nos dois pases analisados, a introduo da informtica nas escolas no produziu a mudana pedaggica como se desejava. Os projetos de mbito nacional ou regional e de grande escala, no lograram atingir os objetivos programados, mesmo quando deixados ao sabor do livre mercado, como no caso do Estados Unidos ou quando so planejados em termos de pblico alvo, equipamentos, materiais, software, meios de distribuio, instalao e manuteno, como o caso da Frana.

    As prticas pedaggicas inovadoras acontecem quando as instituies se propem a repensar e a transformar a sua estrutura cristalizada em uma estrutura flexvel, dinmica e articulada. No entanto, como isto pode ser possvel em projetos de grande dimenses que atingem todo um pas ou, por outro lado, em escolas isoladas? A possibilidade de sucesso est em se considerar os professores no apenas como os executores do projeto, responsveis pela utilizao dos computadores e consumidores dos materiais e programas escolhidos pelos idealizadores do projeto, mas principalmente como parceiros na concepo de todo o trabalho. Alm disso, os docentes devem ser formados adequadamente para poder desenvolver e avaliar os resultados desses projetos.

    Se por um lado, o planejamento idealista no logrou realizar todo o previsto nas metas polticas, alguns avanos pedaggicos podem ser observados no sistema educacional da Frana. O mesmo pode-se dizer dos experimentos nos

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    Estados Unidos ou no Brasil. Nos trs pases, podemos ver novas modalidades de trabalhos interdisciplinares que comeam a ocupar um espao fundamental nas prticas escolares; ligaes entre regies fechadas do pas comeam a se tecer.

    No Brasil, embora a introduo da informtica na educao tenha sido influenciada pelos acontecimentos de outros pases, notadamente Frana e Estados Unidos, a nossa caminhada foi muito peculiar. A influncia exercida por estes pases foi mais no sentido de minimizar os pontos negativos e enfatizar os pontos positivos em vez de servir como modelo para uma reproduo acrtica. No nosso caso, o xito no maior por uma srie de razes, desde a falta de equipamento nas escolas e, portanto, a falta de um maior empenho na introduo da informtica na educao, at um processo frgil e lento de formao de professores. A formao de professores para implantar as transformaes pedaggicas almejadas exige uma nova abordagem que supere as dificuldades em relao ao domnio do computador e ao contedo que o mesmo ministra. Os avanos tecnolgicos tm desequilibrado e atropelado o processo de formao, fazendo com que o professor sinta-se eternamente no estado de "principiante" em relao ao uso do computador na educao.

    Por outro lado, o Programa Brasileiro de Informtica em Educao bastante ambicioso, tendo o computador como recurso importante para auxiliar o processo de mudana pedaggica a criao de ambientes de aprendizagem que enfatizam a construo do conhecimento e no a instruo. Isso implica entender o computador como uma nova maneira de representar o conhecimento, provocando um redimensionamento dos conceitos j conhecidos e possibilitando a busca e compreenso de novas idias e valores. Usar o computador com essa finalidade, requer a anlise cuidadosa do que significa ensinar e aprender bem como demanda rever o papel do professor nesse contexto.

    A formao do professor deve prover condies para que ele construa conhecimento sobre as tcnicas computacionais, entenda por que e como integrar o computador na sua prtica pedaggica e seja capaz de superar barreiras de ordem administrativa e pedaggica. Essa prtica possibilita a transio de um sistema fragmentado de ensino para uma abordagem integradora de contedo e voltada para a resoluo de problemas especficos do interesse de cada aluno. Finalmente, deve-se criar condies para que o professor saiba recontextualizar o aprendizado e a experincia vividas durante a sua formao, para a sua realidade de sala de aula compatibilizando as necessidades de seus alunos e os objetivos pedaggicos que se dispe a atingir. Alm do professor, necessrio trabalhar tambm com outros segmentos da escola, como a administrao e a comunidade de pais, para que possam dar apoio e minimizar as dificuldades de implantao de mudanas na escola. Essas mudanas so necessrias para que a informtica e outras solues pedaggicas inovadoras possam efetivamente estar a servio da formao de alunos preparados para viver na sociedade do conhecimento. Essa sociedade no utpica e, como veremos no prximo captulo, certos servios j se adequaram s novas exigncias. A educao ainda continua nos mesmos moldes do que foi proposto no final do sculo 18!

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

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  • Jos Armando Valente 13

    Seminrio Nacional de Informtica na Educao 1 e 2 (1982). Braslia e Salvador, 1981 e 1982. Anais. Braslia: Secretaria Especial de Informtica (SEI). 1 volume.

    Souza, H.G. (1983). Informtica na educao e ensino de informtica: algumas questes. Em Aberto, ano II, no 17, jun. pp. 1-8.

    Takahashi, E.T, Valente, J.A, Bianchini, S.M., Ferrari, J.O. & Vanini, F.A. (1976). Introduo a Computadores. Verso Experimental, Campinas: IMECC-UNICAMP.

    Valente, J.A. (1998). A telepresena na formao de professores da rea de Informtica em Educao: implantando o construcionismo contextualizado. Actas do IV Congresso Ibero Americano de Informtica na Educao RIBIE98, CD-Rom, /trabalhos/232.pdt.

  • Captulo 2

    MUDANAS NA SOCIEDADE, MUDANAS NA EDUCAO: O FAZER E O COMPREENDER

    Jos Armando Valente

    INTRODUO

    Mudana a palavra de ordem na sociedade atual. Os meios de produo e de servio passam por profundas mudanas, caracterizadas como uma mudana de paradigma do paradigma da produo em massa, do empurrar a produo ("push") para o paradigma da produo "enxuta1", do puxar a produo ("pull"). Essas mudanas implicam profundas alteraes em praticamente todos os segmentos da nossa sociedade, afetando a maneira como atuamos e pensamos. Elas demarcam a passagem para a sociedade do conhecimento, na qual fatores tradicionais de produo como a matria prima, o trabalho e o capital tero um papel secundrio, como apontam diversos pensadores (Drucker, 1993; Naisbitt & Aburdene, 1990; Toffler, 1990). O conhecimento e, portanto, os seus processos de aquisio assumiro papel de destaque, de primeiro plano. Essa valorizao do conhecimento demanda uma nova postura dos profissionais em geral e, portanto, requer o repensar dos processos educacionais, principalmente aqueles que esto diretamente relacionados com a formao de profissionais e com os processos de aprendizagem.

    No entanto, as mudanas que ocorrem na educao so lentas e quase que imperceptveis. Nos pases mais ricos, como Estados Unidos da Amrica e Frana, discutidos no captulo 1, temos enormes avanos tecnolgicos, onde a mudana real e palpvel. Porm do ponto de vista pedaggico, essa mudana , praticamente, inexistente. Ela sempre apresentada no nvel do desejo e no do que realmente acontece. Mesmo no Brasil, a maior parte das escolas se rotulam construtivistas ou cognitivistas e os professores afirmam que preferem a cognitivista. No entanto, acabam praticando a abordagem tradicional (Mizukami, 1986).

    Assim, a questo que se coloca Como as mudanas que esto acontecendo na sociedade devero afetar a Educao e quais sero suas implicaes pedaggicas?

    A mudana pedaggica que todos almejam a passagem de uma educao totalmente baseada na transmisso da informao, na instruo, para a criao de ambientes de aprendizagem nos quais o aluno realiza atividades e constri o seu conhecimento. Essa mudana acaba repercutindo em alteraes na escola como um todo: sua organizao, na sala de aula, no papel do professor e dos alunos e na relao com o conhecimento. Embora tudo indique que a escola dever sofrer ajustes para se adequar aos novos tempos, o quanto ela dever mudar polmico. Ela oscila entre o ensino conservador e a aprendizagem mais liberal (Hirsch, 1996). Porm, ela raramente radical, no sentido de propor o fim da escola exceo de Perelman (1992), que prope a substituio da escola por novos mecanismos de aprendizagem, utilizando a tecnologia de redes de computadores.

    Se a mudana na Educao lenta e quase imperceptvel, a mudana em outros segmentos da nossa sociedade como no sistema produtivo rpida, visvel, afetando drasticamente o nosso comportamento, principalmente o modo de trabalhar e, por conseguinte, o modo de pensar e atuar. A anlise dos sistemas de produo de bens e de alguns servios, mostra que est acontecendo uma verdadeira mudana de paradigma, na concepo de Kuhn2 (1962).

    O que ocorre na produo a passagem do paradigma da produo em massa para o paradigma da produo "enxuta" do Fordismo, que empurra o produto na linha de montagem e, portanto, para o cliente, para uma produo desencadeada pelo cliente puxando o produto da prateleira. Alguns servios, como supermercados, bancos 24 horas e restaurantes "self-service" j operam com base no paradigma enxuto, tambm conhecido como o paradigma do puxar. Embora sutil, a mudana do empurrar para o puxar, implica em alteraes profundas, principalmente, do nvel de formao dos trabalhadores. No Fordismo, o controle da produo est centralizado nas mos de especialistas que planejam a tarefa, fragmentando-a em subtarefas simples para serem dominadas e realizadas por trabalhadores com pouca

    Ncleo de Informtica Aplicada Educao Nied/Unicamp 1 O termo "produo enxuta" uma traduo do termo "lean production" institudo por Womack, Jones & Roos (1990), para designar uma produo sem desperdcios de energia, tempo, material e esforo humano. 2 Thomas Kuhn introduziu a noo de paradigma na sua obra The Structure of Scientific Revolution, para indicar novos conjuntos de conceitos e de mtodos, alm de prticas, artefatos culturais e valores que caracterizam um determinado perodo na rea da cincia.

  • Mudana na Sociedade, Mudana na Educao 30

    qualificao. J a produo enxuta exige trabalhadores melhor qualificados, capazes de assumir responsabilidades, tomar decises, e buscar solues para problemas que ocorrem durante o processo de produo. De fato, o nosso bom desempenho no supermercado, no banco 24 horas e no restaurante "self-service" exige muito mais conhecimento e discernimento do que acontecia quando ramos servidos.

    Essa mudana na produo de bens e nos servios implicar, certamente, em mudanas no sistema educacional. A educao dever operar segundo esse novo paradigma. Isso implicar em professores melhor qualificados, no para empurrar a informao ao aluno, mas para saber criar situaes onde o aluno puxa a informao. Mais ainda, somente ter a informao, no implica em ter conhecimento. O conhecimento dever ser fruto do processamento dessa informao, aplicao dessa informao processada na resoluo de problemas significativos e reflexo sobre os resultados obtidos. Isso exigir do aluno a compreenso do que est fazendo para saber tomar decises, atuar e realizar tarefas. Portanto, a educao no pode ser mais baseada em um fazer descompromissado, de realizar tarefas e chegar a um resultado igual resposta que se encontra no final do livro texto, mas do fazer que leva ao compreender, segundo a viso piagetiana. Nesse sentido, a questo que se coloca para a educao Que aes educacionais devero promover a compreenso?.

    MUDANAS NA SOCIEDADE

    A teoria de Kuhn (1962) explica as mudanas de paradigmas na evoluo do pensamento cientfico e pode ser bastante til para analisar a evoluo dos sistemas de produo: inicialmente, foi a artesanal, seguida da produo em massa e, atualmente, a produo enxuta.

    A produo artesanal usa trabalhadores com grande habilidade e ferramentas flexveis em alguns casos, o prprio trabalhador constri sua ferramenta para produzir. O produto roupa, calado, carro encomendado pelo cliente, sob medida e produzido um por vez. O custo dessa produo alto, porm a qualidade excelente. Esse alto custo faz com que somente uma minoria tenha acesso aos bens produzidos. Muitas vezes, nem mesmo o prprio arteso dispunha de recursos para possuir o que ele prprio produzia.

    Na tentativa de democratizar e fazer com que mais pessoas tivessem acesso aos bens produzidos, Ford idealizou e implantou na sua fbrica de carros as idias da padronizao e da produo em massa. A proposta era produzir em grande escala, baratear o custo de modo que o carro deixasse de ser o brinquedo caro para os ricos e pudesse ser adquirido pela enorme camada mdia da sociedade. Assim, o objetivo da produo em massa padronizar e diminuir o custo do produto em detrimento da sua qualidade. Nesse sistema no mais o cliente que encomenda, mas profissionais com formao especfica que planejam o produto capaz de atender uma ampla gama de necessidades e gostos. A sua produo tambm planejada: o objeto a ser produzido subdividido em partes, padronizadas e produzidas em grande escala por mquinas especiais. Essas subpartes so montadas na linha de produo: um operrio adiciona uma subparte, passa esse item trabalhado para o seu subsequente, que adiciona outra subparte e assim por diante, at obter, no final da linha, o produto acabado. A, a qualidade avaliada e se o produto obtido satisfaz as exigncias mnimas ele vai para o mercado; caso contrrio, o defeito corrigido ou o produto descartado. Portanto, o modelo da produo em massa o empurrar: o planejamento da produo "empurrado" para os operrios, que "empurram" as subpartes na linha de montagem e o produto final "empurrado" para o cliente, que deve ser convencido a consumi-lo.

    Alm da padronizao do produto e da sua produo, a mo de obra barata contribui para o baixo custo do bem produzido. O operrio da linha deve executar o que solicitado, sem questionar ou nem mesmo conversar com os colegas ao seu lado. As operaes que executa so simples e exigem poucas habilidades. Na verdade, Ford dispunha de um trabalhador pouco qualificado: imigrantes analfabetos, vindos de diferentes pases e, portanto, no falavam a mesma lngua. Era impossvel solicitar a esses trabalhadores que se coordenassem e assumissem responsabilidades para a execuo de objetos complexos, como um carro.

    Embora esse modelo tenha atingido os objetivos de barateamento e democratizao do acesso aos bens produzidos, ele demasiado ineficiente e com enormes desperdcios de matria prima, tempo e mo de obra. Gasta-se muito tempo em correo de defeitos, muitos produtos acabados so descartados e os no consumidos implicam em prejuzos financeiros.

    Na tentativa de eliminar esses desperdcios, foi idealizado pelo sistema de produo japons, a produo enxuta (Schonberger, 1982; Womack, Jones & Roos, 1990). Ela combina as vantagens do artesanal grande variedade e alta qualidade e as vantagens da produo em massa grande quantidade e baixo custo. No entanto, a cadeia de produo iniciada pelo cliente. Ele "