o acidente e as lições aprendidas no caso da deepwater horizon

9
O acidente e as lições aprendidas no caso da Deepwater Horizon Autor: Diego Tavares Bonfim No dia 20 de Abril de 2010, por volta das 21h local, no Golfo do México, uma explosão na plataforma de perfuração Deepwater Horizon, de propriedade da empresa Transocean e operando para a BP - British Petroleum, deu início ao que é registrado como um dos mais graves acidentes do setor de Exploração e Produção de Petróleo. A unidade afundou após 36 horas de intenso incêndio, deixando onze pessoas mortas, dezessete feridas e o poço Macondo, a 48 milhas náuticas da costa e 148 milhas náuticas do porto de recursos mais próximo, no estado da Louisiana, aberto por 87 dias consecutivos no que é considerado o maior vazamento da história dos Estados Unidos, talvez mesmo um dos maiores a nível mundial. Cerca de cinco meses após o acidente, uma comissão interna da BP, formada por diversos profissionais do setor, divulgou um relatório com a descrição dos eventos anteriores a esse fatídico dia, desde o início do poço por uma outra plataforma até o descontrole do mesmo alguns minutos antes da primeira explosão a bordo da D. Horizon. Relata ainda todas as tentativas realizadas para tentar fechar o BOP e intervir no poço aberto. O Relatório é concluído com oito motivos considerados como chave para a ocorrência de tão grave acidente. Esse artigo busca relatar os eventos anteriores ao descontrole do poço, os oito motivos-chave que formaram a cadeia que levou ao acidente e os procedimentos considerados adequados para o controle de tais situações, de interesse a todos do setor, especialmente no Brasil, já que nosso trabalho de E&P em águas profundas até mesmo superam os do Golfo do México. O objetivo é dar divulgação aos riscos de uma operação tão sensível e tão rotineira no offshore. 1 - Conceitos Importantes: Blow-Out e Perfuração O que ocorreu a bordo da Deepwater Horizon foi uma situação de descontrole do poço, o chamado Blow-Out. Mas para entendermos o que é um evento de controle de Poço como esse, é preciso que entendamos o passo-a-passo de uma perfuração e as características de um reservatório de Petróleo.

Upload: dpureza123

Post on 11-Nov-2015

16 views

Category:

Documents


3 download

DESCRIPTION

O Acidente e as Lições Aprendidas No Caso Da Deepwater Horizon

TRANSCRIPT

  • O acidente e as lies aprendidas no caso da Deepwater Horizon

    Autor: Diego Tavares Bonfim

    No dia 20 de Abril de 2010, por volta das 21h local, no Golfo do Mxico, uma exploso

    na plataforma de perfurao Deepwater Horizon, de propriedade da empresa

    Transocean e operando para a BP - British Petroleum, deu incio ao que registrado

    como um dos mais graves acidentes do setor de Explorao e Produo de Petrleo. A

    unidade afundou aps 36 horas de intenso incndio, deixando onze pessoas mortas,

    dezessete feridas e o poo Macondo, a 48 milhas nuticas da costa e 148 milhas nuticas

    do porto de recursos mais prximo, no estado da Louisiana, aberto por 87 dias

    consecutivos no que considerado o maior vazamento da histria dos Estados Unidos,

    talvez mesmo um dos maiores a nvel mundial.

    Cerca de cinco meses aps o acidente, uma comisso interna da BP, formada por

    diversos profissionais do setor, divulgou um relatrio com a descrio dos eventos

    anteriores a esse fatdico dia, desde o incio do poo por uma outra plataforma at o

    descontrole do mesmo alguns minutos antes da primeira exploso a bordo da D.

    Horizon. Relata ainda todas as tentativas realizadas para tentar fechar o BOP e intervir

    no poo aberto. O Relatrio concludo com oito motivos considerados como chave

    para a ocorrncia de to grave acidente.

    Esse artigo busca relatar os eventos anteriores ao descontrole do poo, os oito

    motivos-chave que formaram a cadeia que levou ao acidente e os procedimentos

    considerados adequados para o controle de tais situaes, de interesse a todos do setor,

    especialmente no Brasil, j que nosso trabalho de E&P em guas profundas at mesmo

    superam os do Golfo do Mxico. O objetivo dar divulgao aos riscos de uma

    operao to sensvel e to rotineira no offshore.

    1 - Conceitos Importantes: Blow-Out e Perfurao

    O que ocorreu a bordo da Deepwater Horizon foi uma situao de descontrole

    do poo, o chamado Blow-Out. Mas para entendermos o que um evento de controle de

    Poo como esse, preciso que entendamos o passo-a-passo de uma perfurao e as

    caractersticas de um reservatrio de Petrleo.

  • 1.1 - O Reservatrio

    Um reservatrio de petrleo uma rocha que rene uma srie de condies e

    caractersticas determinantes. So elas: Porosidade: nem toda rocha pode ser um reservatrio. Rochas no so corpos nicos, mas

    sim formados por minsculos gros de minerais. necessrio que a granulometria da rocha seja adequada, isso porque o hidrocarboneto fica armazenado nos espaos vazios entre os gros. Portanto, se os gros forem muito pequenos ficaro bastante compactados e esse espao tambm insuficiente; j se forem muito grandes, a rocha pode ser muito quebradia, o que a torna inadequada para ser um bom reservatrio. Os tipos mais comuns de rochas reservatrio so as carbonticas ou arenticas.

    Permeabilidade: a medida da comunicao existente entre os poros da rocha, formando enormes "dutos" por onde o petrleo pode circular. definida por uma frmula que no convm a este estudo, mas de extrema importncia seu clculo para a engenharia do poo, uma vez que deseja-se produzir a maior parte do reservatrio possvel, ou seja, o objetivo que o hidrocarboneto flua dos pontos mais distantes do reservatrio para o interior do poo. Isso s pode ser atingido se houver uma grande comunicao entre os espaos vazios, os poros, da rocha reservatrio.

    Presso Natural: dadas as diversas localizaes das rochas reservatrio nas placas tectnicas, natural que elas apresentem-se a presses extremamente maiores que a atmosfrica. a diferena entre a presso do reservatrio e a presso no interior do poo que faz com que o hidrocarboneto migre para o duto formado pelo poo, e assim suba at a rea de produo. Durante a perfurao, essa presso deve ser bem monitorada e controlada, utilizando-se para isso o fluido de perfurao, mais conhecido como "Lama". Durante toda a perfurao, a lama segue por dentro do tubo de perfurao (Drill Pipe) e ferramentas da coluna (heavy-weights, espaadores e motores) desde a plataforma, pressionada para baixo por enormes bombas, at aberturas na broca. Ao mesmo tempo que resfria a broca e carreia os cascalhos resultantes do movimento de rotao da mesma para a unidade martima, a lama exerce presso sobre as paredes do reservatrio, na mesma intensidade da presso natural do poo, de modo a eliminar o diferencial de presso existente. Essa presso monitorada continuamente, sempre exercendo a presso na coluna para contrabalancear o reservatrio.

    1.2 - A perfurao

    A execuo de um poo de petrleo depende de tantos fatores que seria invivel

    discutir todos neste artigo. Basicamente o principal estudo deve ser feito focando as

    rochas que sero atravessadas, as presses que sero enfrentadas e os intervalos em que

    hidrocarbonetos iro surgir. Do estudo dessas diversas variveis resulta um projeto de

    engenharia de poo, indicando os revestimentos, densidades da lama a utilizar, presses

    provveis a serem encontradas, etc.

    Um poo construdo na forma de um grande funil. Os primeiros metros de

    profundidade utilizam tubos de revestimento de 30 polegadas de dimetro. A partir de

    determinada profundidade, a ser definida no estudo do gradiente de presses do

    reservatrio, outro revestimento de menor dimetro, normalmente 20 polegadas,

    assentado. E essa sequncia de reduo gradativa do dimetro de revestimento segue at

    a coluna de revestimento atingir uma mdia de 9 polegadas, no trecho ultrapassando o

    reservatrio que contm o hidrocarboneto a ser produzido. A cada assentamento de

    coluna de revestimento, ocorre uma operao de cimentao, para completar o espao

    vazio entre o tubo de revestimento e a parede do reservatrio, de modo que no ocorra

    nenhum tipo de diferencial de presso nesse pequeno espao que induza o

    hidrocarboneto a fluir. A partir do momento em que a perfurao atinge profundidades

    onde comeam a surgir bolses de gs e pequenas reservas de leo, colocado sobre a

    cabea do poo uma pea chamada BOP, sigla de Blow-out Preventer, que fecha, de

  • maneira automtica, por comando remoto ou local, o poo em caso de uma eventual

    diferena de presso sbita, ou por reconhecimento, por parte da equipe de perfurao a

    bordo da plataforma, da presena de hidrocarbonetos no fluido de perfurao.

    A intervalos regulares a operao paralisada, para medies no poo, a chamada perfilagem. Utilizando ferramentas diversas, mede-se a porosidade, permeabilidade, presses e presena de lquidos no reservatrio. Quando todo o assentamento de revestimento est pronto e a cimentao confirmada, seja por testes de presso ou por perfilagem, introduz-se os risers rgidos de produo no interior do poo, que so tubos semelhantes aos de perfurao, mas com 7 polegadas de dimetro. Na ponta dessa coluna de produo uma srie de equipamentos posicionada, visando a segurana e a viabilidade da produo. Uma vez que toda a estrutura esteja posicionada, d-se o canhoneio, que a exploso controlada de uma massa plstica, fazendo com que a energia rasgue o revestimento e a cimentao, expondo somente um pequeno trecho de reservatrio ao interior do poo. Ser por esse trecho que o leo fluir. Eventualmente pode ser necessrio uma operao de estimulao do poo, por meio de cidos que circulem por todo a sistema, visando facilitar o incio da produo do hidrocarboneto.

    1.3 - Blow-Out

    Um blow-out ocorre quando no mais possvel controlar a presso no interior

    do poo, e os hidrocarbonetos ganham as condies adequadas para fluir livremente no

    sistema. Vrios podem ser os motivos de um blow-out, estando entre os principais uma

    falha nas bombas de lama, falha no clculo de densidade do fluido de perfurao e no

    controle de injeo ou retirada de fluido no poo.

    Na ocasio de descontrole de poo e o consequente ingresso de leo e gs na

    coluna de perfurao, esses hidrocarbonetos que inicialmente estavam com suas

    molculas bastante comprimidas devido s altas presses do reservatrio comeam

    expandir conforme se deslocam por presses cada vez menores. Se nada for detectado, o

    leo e o gs prosseguiro o caminho at o interior da plataforma, onde bastar uma

    pequena centelha para causar uma enorme exploso na massa gasosa que estar livre no

    ambiente.

    Um blow-out no ocorre de uma hora para outra, so necessrias at algumas

    horas para que esse processo acontea. Os primeiros sinais notados referem-se

    densidade da lama: com o ingresso de leo e gs, o fluido tende a diminuir sua

  • densidade por estar na verdade misturado com hidrocarbonetos naturalmente mais leves

    que a lama. Outro ponto a ser observado continuamente o peso que a coluna de

    perfurao apresenta: h de se ter controle da quantidade de tubos e ferramentas na

    coluna, e o peso de cada uma durante a instalao ou interveno em peas do poo;

    durante a perfurao, fora o peso da coluna ainda h a fora que a plataforma exerce

    para baixo, em conjunto com o movimento de rotao da broca. Esse peso importante,

    pois quando o reservatrio comea a produzir esse leo indesejado normal que o fluxo

    exera uma fora para cima, diminuindo o peso observado na coluna. a fase inicial do

    blow-out, e conhecido como kick.

    A principal ferramenta para evitar o descontrole o BOP. Formado por 3

    equipamentos distintos, cada um com uma capacidade e caracterstica prpria, o BOP

    fecha o poo de maneira emergencial, evitando que o leo atinja a unidade. Uma vez

    entendido o motivo que levou o descontrole do poo, pode-se abrir novamente a

    ferramenta para efetivamente retomar o controle e encerrar essa produo indesejada

    que o blow-out.

    2 - O Poo da Deepwater Horizon

    O reservatrio onde situa-se o poo da D. Horizon situa-se no campo de

    Mississipi Canyon, bloco 252, chamado de Macondo. Era um poo de explorao que

    visava a deteco de hidrocarbonetos em quantidade economicamente vivel. A

    profundidade inicialmente projetada era de 19.150 ps, com assentamento de 8 colunas

    de revestimento e testes de produo baseados em gradientes de presso controlados

    utilizando o BOP fechado.

  • O poo teve incio no dia 06 de outubro de 2009, com a plataforma "Marianas", de propriedade da Transocean. Em 08 de novembro de 2009 o poo foi fechado devido passagem do furaco Ida pela regio. A Marianas ficou seriamente avariada pelo furaco e precisou abandonar a locao para reparos em um estaleiro, sendo substituda pela Deepwater Horizon no dia 31 de janeiro de 2010.

    A D. Horizon era uma plataforma de apenas 9 anos de vida operacional, tendo

    em seu histrico 30 poos construdos sem nenhum evento de controle de poo srio.

  • Equipada com sistema de posicionamento dinmico de classe 3, tinha capacidade de

    perfurar a lminas dgua mximas de 3.000 metros, podendo atingir at 35.000 ps de

    profundidade.

    O poo foi reiniciado em fevereiro de 2010, com algumas anormalidades em

    presses nas rochas, que eram maiores do que as inicialmente previstas, mas ainda

    dentro das capacidades da sonda. A operao teve trs paralisaes por eventos de

    controle de poo anteriores s do dia 20 de abril: no incio de maro encontrou-se uma

    zona e forte presso de poros, que fez com que a circulao do poo fosse perdida e o

    BOP fechado; em 08 de maro ocorreu um kick que inclusive danificou parte da coluna

    de perfurao e fez com que um tudo de perfurao ficasse preso no interior do poo;

    em 04 de abril o poo novamente perdeu circulao, a uma profundidade de 18.260 ps.

    A perfurao retornou aps esse ltimo evento, prosseguindo at uma profundidade de

    18.360 ps atingida no dia 09 de abril. Uma perfilagem foi feita durante os cinco dias

    seguintes, para identificar as zonas produtoras do reservatrio. Uma limpeza de toda a

    coluna de poo foi realizada circulando fluido de completao (fluido mais limpo que a

    lama de perfurao), para condicionar o poo a uma futura produo.

    No dia 16 de abril foi aprovado o abandono temporrio do poo, uma vez que os

    objetivos exploratrios haviam sido atingidos. Comeou ento o procedimento para

    cimentao de uma pequena coluna de revestimento de 9 polegadas, chamada liner, at

    a profundidade de 18.304 ps, visando instalao futura de equipamentos de fundo

    para a produo. Foi durante esse procedimento que ocorreu o acidente da Deepwater

    Horizon.

    2.1 - As horas anteriores ao acidente

    Desde o dia 19 de abril, aps o assentamento da ltima coluna de tubulao, a

    operao chave era a cimentao desse pequeno trecho. Aps a concluso da operao,

    um teste chamado presso negativa teve incio, para verificar a integridade do poo.

    Consiste em retirar a lama por outro fluido mais leve, fechar o BOP deixando somente

    uma rede especfica, a linha de kill (uma rede especial do BOP para acesso direto ao

  • interior poo em caso de necessidade de ao de controle) aberta para observar o fluxo

    no sistema. Se houver ingresso de hidrocarboneto no poo, o fluxo na linha de kill ser

    detectado, verificando que o poo no est ntegro. Ao contrrio, se no houver fluxo

    significa que a cimentao foi adequada, e a prxima operao tem incio.

    Segundo o relatrio da BP, os membros que participaram do teste o

    consideraram satisfatrio e prosseguiram para a prxima fase, que seria posicionar um

    plugue de cimento prximo ao reservatrio e instalar um equipamento de fundo

    chamado Locking Sleeve bem acima do revestimento imediato zona produtora,

    visando o isolamento do reservatrio de maneira segura e consequente retirada do BOP

    e encerramento do poo.

    Ainda segundo o relatrio da BP, o BOP foi reaberto considerando o poo

    ntegro e a operao teve incio na noite do dia 20 de abril, por volta das 20h50min.

    Durante os minutos seguintes, enquanto a plataforma fazia a circulao e troca de

    fluidos necessria para preparar a descida das ferramentas seguintes, um desequilbrio

    hidrosttico fez com que o poo comeasse a permitir o fluxo de leo, provavelmente

    no momento em que uma das bombas de lama teve sua vazo reduzida. Nos registros

    que seguiram, atravs de monitoramento dos indicadores da plataforma, enviados de

    forma real-time para a base operacional da BP, verificou-se uma srie de indcios de

    alteraes na densidade da lama, bem como das presses no poo. A equipe a bordo da

    unidade no conseguiu reconhecer esses indcios at que o leo j estivesse atingido a

    coluna de riser logo abaixo da plataforma. Uma ao equivocada do encarregado de

    perfurao, provavelmente por no avaliar adequadamente a quantidade de leo que j

    estava se deslocando na coluna, fez com que o fluido impregnado de leo fosse

    direcionado para o interior da plataforma, para um tanque de recebimento e posterior

    separao entre o fluido e o hidrocarboneto.

    Uma srie de eventos em sequncia culminou na exploso a bordo da D.

    Horizon. O tanque de recebimento do fluido misturado com o leo era pequeno para a

    quantidade destinada. Quando o mesmo encheu, o fluido vazou pelo suspiro, para o

    interior de uma sala de bombas de servio, espalhando leo e gs pelo ambiente. Neste

    ponto o encarregado da perfurao deu ordem para fechar o BOP, e um navio que

    operava com a unidade se afastou para fora da zona dos 500 metros.

    O que acontece a seguir so fatos muito rpidos. Na sala onde o suspiro

    inundava de gs e leo o ambiente, havia uma captao de ar da praa de mquinas,

    para injeo nos motores de combusto interna que movimentavam os geradores. Esse

    ar, rico em mistura explosiva devido ao volume de gs no ambiente, foi direcionado aos

    geradores 3 e 6. Quando o ar, j bastante rico, misturou-se ao combustvel normal do

    gerador em um dos tempos da combusto interna, ocorreu um disparo no nmero de

    rotaes dos geradores, ocasionando a primeira exploso, na praa de mquinas. Aps

    dez segundos, uma segunda exploso de maior magnitude atingiu toda a Deepwater

    Horizon. Outras exploses menores foram ouvidas.

    Desde o momento inicial em que os operadores da sonda detectaram,

    tardiamente, o descontrole do poo, at o final com o abandono da plataforma, no

    conseguiu-se fechar o BOP por nenhum dos seus comandos remotos. A plataforma

    afundou, 36 horas depois da primeira exploso, com o insucesso nas tentativas de

    controlar o fogo, continuamente alimentado pelo poo aberto logo abaixo. Sucessivas

    tentativas foram feitas com o intuito de fechar localmente o BOP, usando ROVs, mas

    nada foi alcanado. Aps 87 dias de intenso vazamento no Golfo do Mxico, um poo

    de interveno foi perfurado ao lado do poo original, injetando lama de alta densidade

    e cimento para fechar o poo.

  • 3 - Os motivos

    O relatrio da BP aponta no um, mas oito motivos considerados chave na

    ocorrncia desse acidente. Como em todo estudo de caso, uma rvore de acontecimentos

    foi montada, demonstrando como essa cadeia de eventos culminou em uma situao

    desastrosa. Os 8 motivos so os que seguem descritos abaixo, com a ilustrao retirada

    do relatrio da BP:

    1. A cimentao do revestimento feita no dia anterior no foi feita adequadamente. O cimento era

    de um tipo leve e com presena de nitritos. Provavelmente houve desprendimento de nitrognio, que fez com que ocorressem falhas na integridade do cimento que no resistiram presso natural do poo e permitiram o fluxo de leo. A BP concluiu que houve falha na avaliao do cimento, avaliao de risco da operao e falha na interpretao do teste de presso negativa feito no poo algumas horas aps a cimentao. A cimentao ficava a cargo da Halliburton.

    2. A barreira instalada sobre o topo do reservatrio, a locking sleeve, permitiu a passagem de leo do reservatrio para o interior do poo. No haver a possibilidade de avaliar a pea, uma vez que foi destruda com as aes realizadas para o fechamento do poo. A BP conclui que pode ter havido uma falha na produo da pea ou uma falha na instalao por parte da equipe de perfurao.

    3. O teste de presso negativa foi mal interpretado. Antes do abandono temporrio do poo, foi feito um teste de presso negativa, substituindo a lama por fluido mais leve, como a gua do mar, criando um ambiente hidrosttico desigual de maneira controlada. Houve vrios indcios de ingresso de leo no poo, mas tanto a equipe da BP, quanto a equipe da Transocean, no souberam interpretar os resultados do teste.

    4. O fluxo no foi identificado pela equipe de perfurao antes que o leo chegasse no riser. Essa demora em responder ao blow-out foi um fator complicador, j que havia uma condio de balano hidrosttico muito difcil de ser controlado. Cerca de 40 minutos seriam necessrios para que o leo migrasse at a plataforma, portanto houve uma forte demora na resposta.

    5. A ao tomada de maneira a responder ao blow-out, migrando o fluido para o interior da sonda em vez de modificar o fluxo para a rede que jogaria para o ambiente externo (overboard

  • discharge), foi o fator gerador da exploso na plataforma. Caso o fluido tivesse sido jogado no mar haveria mais tempo para preparar uma resposta adequada ao evento, e mesmo o impacto ambiental seria menor, sem contar na perda das 11 vidas.

    6. A sala que continha o suspiro do tanque e o separador de leo e gs do fluido de perfurao continha uma srie de captaes de ar e suspiros de outros sistemas. O sistema de separao tambm foi mal utilizado, j que ele no possua capacidade de atender a toda a quantidade de fluido destinada a ele quando o encarregado da perfurao direcionou o fluxo do poo para o sistema.

    7. O sistema de deteco de gs e incndio no alertou para a presena de gs em locais que no eram classificados como eletricamente protegidos, como dutos de ar condicionado e ventilaes em geral da plataforma.

    8. Os 3 modos de acionar o BOP em situaes de emergncia falharam. As exploses desarmaram ou destruram o sistema de desconexo de emergncia, que seria o mtodo primrio de acionamento. Os dois controles eletrnicos do BOP, chamados de pods amarelo e azul, no acionaram o BOP automaticamente com a perda de energia da plataforma ou perda da hidrulica do sistema: o pod amarelo apresentava uma vlvula solenide defeituosa e que portanto no atuou; o pod azul apresentava sua bateria de acionamento descarregada.

    4 - Concluses

    Como todo acidente, este tambm se desenvolveu a partir de falhas de

    interpretao, manuteno e avaliao cautelosa de todas as etapas do poo. Uma

    operao rotineira da sonda deveria ter sido mais planejada, e o treinamento da equipe

    de perfurao ser melhorado, no intuito de identificar com rapidez provveis falhas e

    acontecimentos do poo.

    O acidente da Deepwater Horizon acende uma enorme luz amarela no setor

    offshore, em especial no Golfo do Mxico e aqui no Brasil, onde os poos caminham

    cada vez mais para guas profundas. O investimento que ocorre no avano tecnolgico

    de novos e melhores equipamentos, plataformas com maior capacidade e velocidade de

    perfurao, brocas mais efetivas, engenharia de poo avanada, tambm deve ocorrer na

    manuteno custosa que essa tecnologia carrega com ela, e principalmente no

    treinamento e desenvolvimento de aptides na equipe de trabalhadores que atua dia-a-

    dia no setor. No basta saber como operar o equipamento, deve-se saber seus princpios.

    No basta olhar indicadores e medidores e agir conforme uma regra pr-programada,

    deve-se entender o que aqueles valores significam e a implicao de um fator no total da

    engenharia do poo.

    Necessitamos de profissionais mais bem treinados e capacitados, com maior

    qualificao para ocupar determinadas posies. Entende-se que a experincia

    fundamental, mas ela deve vir acompanhada de uma slida base tcnica do trabalho

    realizado. O comprometimento e a comunicao entre as diversas operaes conjuntas

    que ocorrem a bordo deve ser exigncia pessoal, de maneira a no permitir que uma

    cadeia perigosa de eventos comece a se desenvolver. Falta o investimento humano no

    setor, comprometimento com as pessoas que esto trabalhando para atingir resultados,

    no somente com os resultados.

    Diego Tavares Bonfim Coordenador-Geral do Centro de Simulao Aquaviria.

    Oficial de Nutica formado pela Escola de Formao de Oficiais da Marinha Mercante

    no Rio de Janeiro, ps-graduado em Engenharia de Petrleo e Gs. Conta com

    experincia de bordo nas funes de Operador de Posicionamento Dinmico em

    embarcaes RSV e plataformas de perfurao de sexta gerao, e oficial de quarto em

    navios graneleiros.