mÚsculo esquelÉtico 2

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RADIOLOGIA MUSCULO-ESQUELÉTICA II Prof. Rodrigo Aguiar Este capítulo focará principalmente as patologias ósseas e articulares, que podem ser divididas em doenças traumáticas, inflamatórias, infecciosas, degenerativas e tumorais. Em grande parte dos casos, o estudo radiológico convencional é o necessário para o diagnóstico correto. Contudo, em alguns casos torna-se necessário o uso de outros métodos de imagem, incluindo o ultrasom, tomografia computadorizada e ressonância magnética.TRAUMAA gra

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RADIOLOGIA MUSCULO-ESQUELTICA II Prof. Rodrigo Aguiar Este captulo focar principalmente as patologias sseas e articulares, que podem ser divididas em doenas traumticas, inflamatrias, infecciosas, degenerativas e tumorais. Em grande parte dos casos, o estudo radiolgico convencional o necessrio para o diagnstico correto. Contudo, em alguns casos torna-se necessrio o uso de outros mtodos de imagem, incluindo o ultrasom, tomografia computadorizada e ressonncia magntica.

TRAUMAA grande maioria das consultas mdicas de urgncia est relacionada a traumatismo. Neste tipo de situao o estudo radiolgico o principal mtodo diagnstico, reservando-se geralmente a tomografia para avaliar fraturas complexas e complicaes, principalmente no esqueleto axial. Existem sries bsicas de trauma para as diversas regies avaliadas. Como regra, as incidncias frontal e perfil (ou oblqua) so requisitadas, pois em alguns casos, a fratura pode ser identificada somente em uma das incidncias, enquanto nas outras o estudo encontra-se normal (fig. 1 e 2).

F ig u ra 01. F rat u ra d a d if ise d o III met acarp o ( setas) v isv el ap en as n a in cid n cia em p e rf il ( B) . In cid n cia f ro n t al ( A)

F ig u ra

02.

F rat u ra

da

cab ea

do

r d io ,

co m

ext en so

in t ra- art icu lar,

id en t if icad a ap en as n a in cid n cia o b lq u a ( set a) , en q u an t o as in cid n cias f ro n t al ( A) e p erf il ( B) en co n t ram- se n o rma is.

O

radiologista

enfrenta

um

dilema

no

paciente

traumatizado.

O

reconhecimento da fratura. Embora isso parea simples, requer que o profissional tenha um detalhado conhecimento anatmico da regio para no confundir variaes anatmicas normais ou superposio de outras patologias com a leso traumtica (fig. 3).

F ig u ra 3. In cid n cias o b lq u as d e p s d e p acien t es d if eren t es. Em A n o t e a f rat u ra n a b ase d o V met at arso ( set a) ext en den d o - se su p erf cie art icu la r, en q u an t o em B n o te o cen t ro d e o ssif icao secu n drio ( cr cu lo ) d a b ase d o V met at arso ( v aria o d a n o rmalid ad e)

As fraturas so solues de continuidade do osso. Podem ser classificadas de diversas formas: FRATURA COMPLETA X INCOMPLETA (fig. 4 e 5) Fratura completa aquela que apresenta soluo de continuidade de toda a espessura ssea, enquanto a incompleta ainda preserva alguma parte do osso sem leso, geralmente ocorrendo em crianas (fratura em torus e galho verde).

F ig u ra 4. Co n ceit o : F rat u ra co mp let a X in co mp let a.

A

B

C

F ig u ra 5. ( A) F r at u ra co mp let a d a d if ise t i b ial; (B) F rat u ra in co mp let a d a d if ise rad ial e u ln ar. No t e q u e p art e d as c o rt icais d o rd io e mero n o est o f rat u rad as; ( C) F rat u ra t ip o t o ru s . No t e apen as u ma lin h a escle r t ica ssea d o rd io a sso c iad o a u m ab au lamen t o d a co rt ical ( set as) .

TRAO DE FRATURA (fig. 6) Existem traos de fratura de diversas formas. Linear, oblquo, espiral, em asa de borboleta e cominutiva. Este ltimo tipo de trao de fratura a que apresenta maior dificuldade de tratamento e consolidao, pois no foco fraturrio sseo encontra-se fragmentado em diversos pedaos. Como regra, quanto mais linear o trao de fratura, melhor a aposio entre os fragmentos e mais rpida ser a consolidao.

Fig u ra 6. Alg u n s t ip o s d e d ire o d e t rao d e f rat ura.

DESVIADA X NO DESVIADA (fig. 7) Os fragmentos de uma fratura podem estar desviados. O desvio sempre referido com relao ao fragmento distal da leso. Os desvios podem ser angulares, rotacionais ou do comprimento sseo. O estudo com incidncias perpendiculares importante para avaliar o desvio, pois pode passar como normal em uma determinada incidncia e somente ser identificado na outra incidncia.

F ig u ra 7. Co n ceit o s : T ip o s d e d esalin h amen t o d e f rat u ras.

INTRA-ARTICULAR X EXTRA-ARTICULAR Deve-se estar atento se o trao de fratura compromete a superfcie articular ssea. Nestes casos, o alinhamento dos fragmentos deve ser o mais congruente possvel para evitar perda da amplitude do movimento articular ou artrose precoce.

FRATURA PATOLGICA (fig. 8) Fratura patolgica aquela que ocorre em um osso previamente doente, com uma fora que um osso normal suportaria. Em grande parte dos casos este tipo de leso ocorre em casos de pacientes osteoporticos ou com leso tumoral associada. As margens da fratura devem ser avaliadas para averiguar se as mesmas se completam, como em um quebra-cabea. Se isso no for possvel, a possibilidade de leso associada deve ser considerada.

F ig u ra 8. Co n ceit o s d e f rat u ra p o r est r ess e e p at o l g ica.

FRATURA POR ESTRESSE (fig. 8) Este tipo de fratura ocorre em um osso saudvel submetido uma carga constante e repetitiva (figs. 9 e 10). Geralmente associado a atletas com ritmo de treinamento intenso e pacientes sedentrios que resolvem comear uma nova atividade fsica ou que mudam ou aumentam bruscamente a carga de treino.

F ig u ra 9. Ev o lu o d e f rat u ra p o r e st ress e n o t ero md io d a d if ise t ib ial. No t e em A a p rese n a d e reao perio s t eal e u ma lin h a t ransp aren t e p o uco d ef in id a n a co rt ical tib ial. Alg u n s d ias d e p o is se o b serv a melh o r a lin h a de f rat u ra co rt ical.

F ig u ra 10. L in h a d e f r at u ra esc ler t ica n a t u b ero sid ad e p o st erio r d o calc n eo in d ican d o u ma f rat u ra p o r est res se.

FRATURA-LUXAO Alm da leso ssea propriamente dita (fratura), o paciente apresenta uma perda do alinhamento articular (figs. 11 e 12) Quando esta perda parcial, denomina-se subluxao, e quanto total, luxao. Nestes casos, alm da leso ssea definida, o paciente apresenta uma srie de leses ligamentares e de estruturas intra-articulares associadas.

A

B

F ig u ra 11. A F rat u ra- lu xao ( su b lu xa o ) an t ero - in f erio r g len o - u meral. No t e as lin h as d e f rat u ra d a cab e a u meral asso ci ad o a u ma p erd a d o alin h amen t o art icu lar co m a g len id e. B L u xao an t ero- in f erio r d a cab e a f emo ral em r elao a o acet b u lo d ev id o u m t rau ma d e alt a en erg ia.

A

B

Figura 12. Fratura-luxao do tornozelo. Nota-se fratura da difise distal da fbula, do malolo medial da tbia e rotura (distase) da articulao tbio-fibular proximal, associado a luxao tbio-talar.

CONSOLIDAO SSEA NORMAL

A velocidade normal da consolidao ssea da fratura varia conforme algumas variveis, incluindo a idade do paciente, as condies do osso fraturado, o grau de imobilizao ou o tratamento empregado. Mas, em geral, a linha de fratura se consolida atravs de reao ssea endosteal e periosteal, formando um calo sseo na regio da fratura, com um desaparecimento gradual da linha fraturaria (fig. 13).

A

B

F ig u ra 13. Co n so lid a o sse a n o rmal. N o t em o d esapar ecime n t o g rad u al d a lin h a d e f rat u ra ass o ciad o a f o rmao d e calo sseo n a reg io n a d if ise f emu ral ( A) e rd io e u ln a d ist ais ( B)

COMPLICAES So diversas as complicaes do trauma. Infeco superposta, principalmente em pacientes que apresentam fratura exposta (fig. 14).F ig u ra 14. In f eco ssea ap s f rat u ra n o t ero d is t al d o f mu r, co mp ro met en d o a c o n so lid ao e lev an d o co m a u ma n o - u n io e sclero s e ssea d as

acen t u ad a

marg en s f rat u rad a s co m f o rmao h ip ert r f ica d e calo sseo , co n t u d o sem f o rmao d e p o n t es sseas

co mp let as.

Desvio ou deformidade do membro (fig. 15).F ig u ra 15. ( A) da de F r at u ra t b ia f o rma do e t ero f b u la, e rrad a, md io - d ist al co n so lid ad a

lev an d o a u ma d ef o rmid ad e an g u lar ssea. ( B) a O u ma p acien t e ciru rg ia foi p a ra

su b met id o

co rre o d a d ef o rmid ad e, h av en d o ag o ra alin h amen t o s at isf at rio d as est ru t u ras sse as.

Dficit de crescimento sseo Artropatia degenerativa secundria (fig. 16).

Figura 16. paciente com seqela de fratura e luxao gleno-umeral, mostrando importante reduo do espao articular e ostefitos marginais, mais

evidente na margem inferior do mero.

Miosite ossificante (fig. 17).

A

B

F ig u ra 17. M io sit e ssif icant e. Em A n o t e a d en sif ica o d e p art es mo les adjacen t es a u ma reg io t rau mat iz a d a, co m cal cif ica o na t o p o g raf ia,

co rresp o n d en d o a f ase in ici al d a mio sit e o ssif ican te. Em B n o t e u ma mio sit e o ssif ican t e em u ma f ase av an ad a, co m o ssif icao d e p art es mo les adjacen t e a u ma leso t rau mt ic a p rv ia.

Reduo da amplitude de movimento articular, com perda funcional do membro.

Osteonecrose (fig.18).

F ig u ra 18. O st eo n ecr o se d o t ero md io e p ro ximal do esc af o id e d ev id o a f rat u ra p rv ia. Dev id o in su f icin cia v ascu lar ca u sad o p ela f rat u ra, o o sso n ecro sad o en co n t ra- se mais esc ler t ico d eco rr en t e da f alt a d e v aso s san g u n eo s n o rmais p ara a r eab so r o d o o sso lesado .

Distrofia Simptico-Reflexa (algoneurodistrofia) (fig. 19).

Figura 19. Paciente com histria prvia de trauma no tornozelo mostrando uma intensa osteopenia comprometendo os ossos do p e tornozelo, em uma rea onde no houve diretamente a fratura. Uma das causas relacionadas esta doena seria uma irregularidade da atividade do sistema nervoso simptico, levando a uma maior vascularizao local e reabsoro ssea.

Pseudoartrose (fig. 20) - Quando a fratura no consolida, com a formao de uma neoarticulao onde deveria existir apenas osso. Geralmente isso ocorre nos casos de mobilidade excessiva dos fragmentos sseos, com no fixao adequada e em casos de leses com muita perda ssea ou desvascularizao local, impossibilitando o processo de consolidao.

A

B

F ig u ra 20. rea s de p seu d o art ro se d a f ib u la p ro ximal ( A) e f b u la e t b ia n o t e ro md io ( B) , mo st ran d o a n o u n io en t r e o s f rag men t os ss e o s, p ermit in d o em alg u n s caso s a mo b il id ad e p at o l g ica d o memb ro .

Anquilose sinostose ssea: Formao de pontes sseas entre ossos que anatomicamente no deveriam existir, imobilizando o membro lesado.

TRAUMA NO ACIDENTAL EM CRIANAS

Os profissionais mdicos devem estar atentos com esta situao. Fraturas em crianas com diferentes fases de evoluo e em lugares especficos, como nas regies metafisrias (fig. 21) e pores posteriores dos arcos costais devem ser cuidadosamente analisadas. Importante salientar que doenas metablicas e displsicas tambm podem causar leses semelhantes, devendo-se correlacionar com os dados clnicos e laboratoriais do paciente.F ig u ra 21. F rat u ras met af isri as su sp eit as d e t rau m a n o acid en t al em crian as ( set as) .

DOENAS DEGENERATIVAS

As doenas degenerativas so responsveis por grande parte das queixas dos pacientes nos consultrios. A artrose compromete principalmente adultos com idade mais avanada e idosos, podendo se manifestar tanto nas articulaes do esqueleto perifrico (joelho, ombro, quadril, tornozelo, mo e p), quanto no esqueleto axial (coluna vertebral). A artrose caracteriza-se radiograficamente por uma srie de achados de imagem que indicam que a articulao est desgastada. Os principais so reduo do espao articular, esclerose do osso subcondral, osteofitose marginal, cistos sseos subcondrais (fig. 22).Figura 22. Achados radiogrficos de

artrose. Reduo assimtrica do espao articular, mais evidente no compartimento lateral, esclerose ssea subcondral com cistos intra-sseos (geodos) e osteofitose marginal.

Em geral as articulaes que suportam maior peso so as mais comprometidas, como as do membro inferior (figs. 23, 24, 25 e 26) e a coluna vertebral. Contudo devido atividade laboral, algumas articulaes do membro superior, principalmente a mo tambm podem ser comprometidas (figs. 27 e 28). Como j exposto no captulo sobre o trauma, quando a superficie articular fraturada no anatomicamente corrigida, a possibilidade de artrose secundria muito provvel (fig. 29).

A

B

Figura 23. Artrose do quadril em dois pacientes mostrando padres de reduo do espao articular. Em A nota-se reduo do espao articular superior enquanto em B a reduo medial. Em ambos casos existem esclerose ssea e cistos subcondrais e osteofitose marginal.

A

B

C

F ig u ra 24. Art ro se d o jo elh o p red o min an d o n o co mp art imen t o med ial, co m red u o d o esp a o art icu lar, escl ero s e e cist o s s seo s su b co n d rais e o st eo f it o se marg in al ( A e B) . Em C exist e u ma art rose av an ad a, p ro v o can d o u ma d ef o rmid ad e an g u lar d o jo elh o .

F ig u ra

25.

Art ro se co rp o s

do

co mp art imen t o

f mu ro- t ib ial no

med ial

do

jo elh o e

asso ciad o p o st erio r.

liv res

in t ra- art icu lares

reces so

su p ra- p at elar

F ig u ra 26. Est u d o p o r Res so n n cia M ag n t ica p o n d erad a em T 1 e T 2 G RE mo st ran d o co rp o s liv res in t ra- art icu lare s n o recesso p o st er io r d o jo elho , mais e sp ecif icam en t e n a b o ls a d o sem imemb ran o so - g ast ro cn mio med ial ( set as) .

F ig u ra

27.

Ap es ar se

de

m en o s co m do co m

f req en t e, art ro se memb ro

co mp arad o a rt icu la es p acien t es

das

in f erio r,

id ad e av an ad a p o dem ap resen t ar art ro se do o mb ro , mo st ran d o o st e f it o s ca b ea d ev e u meral. se r

caract e rst ico s in f erio res Nest es na

c aso s, a

semp r e de

d escart ad a

h ip t ese

le so

d eg en erat iv a secu n d ria t r au ma o u leso d o man g u it o ro t ad o r.

F ig u ra 28. Ar t ro p at i a d eg en er at iv a da mo co mp ro met en d o co mo lu g ares as

caract e rst ico s art icu la es

i n t erf aln g icas

p ro ximais ( n d u lo s d e Bo u ch ard ) e d ist ais ( n d u lo s d e Eb erd ein ) , alm da do art icu lao p o leg ar ca rp o- met acrp ica ( riz o art ro se) .

F ig u ra 29. Art ro p at i a d eg en erat iv a p s-t rau mt ica d o q u adril d ireit o em p acien t e jo v em, mo st ran d o d ef o rmid ad e d o acet b u lo e ca b ea f emo ral , d ev id o a t rau mat ism o p rv io , co m f rat u ra d o acet b ulo n o co rrig id a. No t em a escle ro se s sea e o s cist o s su b co n d rais asso ciad o a o st eo f it o se marg in al.

Na coluna vertebral, a fisiopatologia da artrose se caracteriza pelo achatamento e desidratao do disco vertebral, que reduz sua mobilidade e efeito de absoro de impacto entre as vrtebras. A carga ento conseqentemente transmitida para as vrtebras e articulaes da regio, com a formao de esclerose e ostefitos nos plats vertebrais e articulaes interapofisrias (fig. 30). Os grandes ostefitos vertebrais tambm so chamados de bico de papagaio, podendo pinar as estruturas nervosas que ali transitam. Alm disso, os prprios discos vertebrais podem herniar, reduzindo as dimenses dos canais sseos por onde transitam as estruturas nervosas.

A

B

F ig u ra 30. Esp o n d ilo art ro p at ia d eg en erat i v a d a co lun a lo mb ar co m red u o d o s esp ao s d isc ais e o st eo f it o se an t erio r, p o st erio r e lat e r al, q u e p o d em red u z ir o s can ais ss eo s p o r o n d e t raf eg a m as est rut u ras n erv o sas.

DOENAS INFLAMATRIAS (no infecciosas)Diversas doenas inflamatrias podem comprometer o sistema osteomuscular, principalmente as articulaes. Entre estas se destacam a artrite reumatide (artrite soropositiva) e as soronegativas como a espondilite anquilosante, enteroptica, reiter e psoriase. Alm destas causas, tambm pode ocorrer artrite no lupus eritematoso sistmico, febre reumtica e doenas de deposies de cristais de clcio, como a tendinite calcificante e a gota.

ANATOMIA ARTICULAR As articulaes so coneces funcionais entre diferentes ossos do esqueleto. Elas so comumente classificadas de acordo com sua composio estrutural e o grau de mobilidade. Articulaes fibrosas (sinartrose), que so imveis, como as suturas cranianas; cartilaginosas (anfiartrose), que so discretamente mveis, como a snfise pbica e articulaes disco-vertebrais e articulaes sinoviais (diartrose), que so muito mveis, como as articulaes do joelho e ombro. Nas articulaes sinoviais, as duas superfcies sseas so revestidas por cartilagem hialina, conectadas por ligamentos, e revestidas por uma membrana sinovial que secreta o lquido sinovial, funcionando como um lubrificante articular, reduzindo o atrito entre as cartilagens.

FISIOPATOLOGIA DAS DOENAS INFLAMATRIAS ARTICULARES

A membrana sinovial, por diversas causas, pode apresentar um processo inflamatrio e hipertrofiar, liberando tambm uma srie de enzimas lticas no lquido sinovial. Estas enzimas podem comprometer a cartilagem articular, assim como as demais estruturas intra-articulares, como ligamentos e meniscos. Alm disso, a membrana inflamada e hipertrofiada, tambm chamada de pannus, pode erodir as margens sseas articulares. Durante o processo inflamatrio existe uma hiperemia periarticular, com um aumento de partes moles na regio. Em alguns

casos esta hiperemia tambm pode causar uma osteopenia local, como nos casos de artrite reumatide.

DOENAS ESPECFICAS

ARTRITE REUMATIDE Artrite freqente, de etiologia desconhecida, que causa inflamao sinovial e destruio articular, comprometendo vrias articulaes ao mesmo tempo (poliarticular). As mulheres de meia idade so as mais afetadas. 90 a 95 % dos pacientes so fator reumatide positivo. Entre as alteraes radiolgicas temos aumento de partes moles periarticulares, osteopenia peri-articular, reduo simtrica do espao articular, eroses sseas peri-articulares, cistos sseos, e desvios angulares das articulaes (figs. 31, 32 e 33).

Figura 31. Osteopenia periarticular com reduo dos espaos articulares associados a eroses periarticulares das metatarsofalngicas e metacarpofalngicas. Aspecto

caracterstico da artrite reumatide.

Figura 32. Estudo radiogrfico do joelho mostrando reduo simtrica do espao articular associado a osteopenia periarticular e aumento de partes moles ao redor do joelho, compatvel com sinovite associado derrame articular.

Figura 33. Ressonncia magntica do joelho mostrando sinovite e derrame articular associado eroses periarticulares, reduo simtrica do espao articular e leses csticas posteriores, incluindo cisto de Baker.

ARTROPATIA SORONEGATIVA Nesta parte incluem-se a espondilite anquilosante, artropatia enteroptica, sndrome de Reiter e psorase. Estas doenas tambm tem causa desconhecida e tendem a ser poliarticulares, sendo que a espondilite anquilosante a artropatia soronegativa mais comum e geralmente envolve o esqueleto axial (fig. 34), incluindo a coluna vertebral e articulaes sacro-ilacas; e grandes articulaes do

esqueleto perifrico (ombro e quadril), enquanto Reiter e psorase envolvem o esqueleto perifrico distal, como ps e mos (fig. 35). Estes pacientes so fator reumatide negativo e antgeno HLA B27 positivo. Alguns autores chamam estas doeas de espondiloartropatia devido a alta incidncia de comprometimento principalmente das articulaes sacro-ilacas (sacro-ilete) (fig. 36). Entre as alteraes radiolgicas encontramos alteraes semelhantes a artrite reumatide, como aumento de partes moles e eroses sseas periarticulares, contudo no se observa osteopenia. Nota-se tambm proliferao ssea peri-articular associada alm da formao de entesfitos adjacentes as inseres tendneas.

Figura 34. Estudo radiogrfico de paciente jovem (30 anos), masculino, com espondilite anquilosante, mostrando sindesmfitos (setas) ligando diversas vrtebras lombares, produzindo o aspecto de coluna em bambu.

Figura 35. Paciente feminina com artropatia psoritica mostrando eroses peri e intraarticulares, deformidades angulares e alteraes osteohipertrficas associadas.

Figura 36. Paciente com sndrome de Reiter mostrando fuso ssea (anquilose) das articulaes sacro-ilacas, bilateralmente, devido sacroilite.

LUPUS ERITEMATOSO SISTEMICO E FEBRE REUMTICA So duas doenas que causam deformidades articulares no erosivas, que podem ser corrigidas. Geralmente comprometem as articulaes das mos.

ESCLERODERMIA Doena sem etiologia definida que causa leso de pequenos vasos e fibrose associada. As alteraes radiogrficas mostram atrofia e calcificao de partes moles, mais evidente na ponta dos dedos.

DOENAS DE DEPOSIO DE CLCIO Entre estas doenas destaca-se a gota (deposio de cristais de urato de clcio), deposio por hidrxiapatita (tambm chamada de tendinopatia

calcificante) e por pirofosfato de clcio (conhecida como pseudo-gota). A artrite gotosa uma sinovite causada pela deposio de cristais de urato de clcio, que pode ser limitado a ataques agudos ou tornar-se uma artropatia crnica, com deposio de cristais intra e peri-articulares. Geralmente ocorre em homens de meia idade ou mais velhos. Os ataques agudos podem ocorrer at 12 anos antes das manifestaes radiolgicas, so edema de partes moles, calcificaes peri-articulares, ausncia de osteopenia ou de reduo importante do espao articular e presena de alteraes osteohipertrficas e eroses periarticulares. A principal articulao comprometida a metatarsofalngica do hlux (fig. 37).

Aulna. Em B notam-se tofos gotosos localizados adjacentes s

Barticulaes

Figura 37. Gota. Em A nota-se tofo gotoso calcificado localizado prximo ao olecrano da

metatarsofalangeana e interfalangeana do hlux.

A doena de depsito de pirofosfato de clcio (pseudogota) pode se manifestar clinicamente de modo semelhante gota. Estes pacientes podem

apresentar calcificaes da cartilagem hialina e de estruturas meniscais e ligamentares chamada de condrocalcinose (fig.38) e desenvolver alteraes degenerativas articulares secundrias. Diferente da gota, pode comprometer alm dos homens, as mulheres de meia idade ou mais velhas. Radiograficamente, o que se v so depsitos de clcio intra-articular associado padres de artrose especficas para determinadas articulaes.

Figura 38. Paciente com calcificao intra-articular relacionado cartilagem hialina e meniscos (condrocalcinose) devido deposio de cristais de pirofosfato de clcio (pseudogota). Nota-se reduo dos espaos articulares e esboos osteofitrios marginais, devido a artrose secundria.

A doena por deposio de hidroxiapatita tambm conhecida como tendinopatia calcria, compromentendo principalmente os tendes periarticulares, principalmente ao redor do ombro. Em alguns casos existe a deposio intraarticular dos cristais, levando a uma artropatia inflamatria-degenerativa localizada.

MISCELNIA Existem vrias outras causas de artropatias que no cabe maior descrio no presente material, entre eles existem doenas metablicas, como o hiperparatiroidismo, doenas hematolgicas como a hemofilia alm de outras patologias de origem pouco conhecidas como a sarcoidose.

INFECODoenas infecciosas podem comprometer tanto o osso (osteomielite) quanto a articulao (artrite sptica). As causas podem variar, incluindo leses de fonte hematognica (por via sangunea), por contiguidade de partes moles, pstraumticas (ferimentos abertos) e iatrognicas (aps procedimentos mdicos) (fig. 39). Nas crianas, as leses por via hematognicas so mais comuns, enquanto nos adultos a causa ps-traumtica ocupa a primeira posio.

AFigura 39. Vias de disseminao da osteomielite (A) e artrite sptica (B)

B

Radiologicamente a osteomielite aguda apresenta-se com destruio ssea focal que pode estar associado a esclerose ssea, reao periosteal e edema de partes moles (fig. 40), enquanto a osteomielite crnica mostra um osso com trabeculado irregular, com reas de esclerose e lticas, com margens pouco definidas, reao periosteal irregular e deformidade ssea (fig. 41). Nos casos crnicos, a infeco ssea pode ser sustentada, apesar do tratamento, por reas de tecido sseo necrosado, onde habitam as bactrias que do continuidade a infeco. Esta rea de osso necrosado chamada de seqestro sseo, e geralmente apresenta-se como um fragmento esclertico (fig. 42).

Figura 40. Osteomielite aguda da regio metadiafisria distal do fmur com alterao do trabeculado sseo associado reao periosteal laminar e aumento de partes moles.

Figura 41. Osteomielite crnica mostrando alterao esclertica do trabeculado sseo, reao periosteal irregular e edema de partes moles. Note tambm uma fratura patolgica adjacente a placa de crescimento.

Figura 42. Osteomielite crnica. Paciente com osteomielite crnica aps fratura aberta da difise distal do rdio, mostrando fragmento sseo mais denso no interior da difise radial, compatvel com seqestro osso. Este tecido desvitalizado abriga os microorganismos que perpetuam a osteomielite crnica.

Em geral o paciente tem uma histria de dor ou trauma recente associado a sinais de infeco (febre, limitao de movimentao, calor e rubor local. Um dos grandes problemas da osteomielite deve-se ao atraso das manifestaes radiogrficas em relao ao incio da doena. Em alguns casos, pode demorar em torno de 10 a 14 dias para as primeiras alteraes ao raio-X. O uso da medicina nuclear (cintilografia) e da ressonncia magntica podem ser muito teis para o diagnstico precoce. O ultra-som pode avaliar bem a infeco localizada em partes moles e em algumas articulaes, como o quadril peditrico, enquanto a tomografia pode ser til na avaliao de casos localizados no esqueleto axial, onde o raio-X pode apresentar imagens com muita sobreposio de estruturas, dificultando o diagnstico. O abcesso de Brodie uma forma de osteomielite subaguda crnica onde forma-se um abcesso intra-sseo que apresenta margens esclerticas e bem definidas, em geral nas regies metaepifisrias (fig. 43). Esta leso tem um aspecto alongado e em alguns casos pode ser confundido com tumor.

Figura 43. Abcesso de Brodie. Imagem radioluzente bem definida, com margens esclerticas e formato alongado no perfil, localizado na regio metafisria proximal da tbia.

Nos casos de artrite sptica, os achados radiogrficos so o edema periarticular, causado principalmente pelo derrame articular e inflamao de partes moles adjacentes (fig. 44); osteoporose devido ao aumento da vascularizao local; reduo simtrica e rpida do espao articular devido destruio articular; eroses sseas, que podem levar secundariamente a uma infeco ssea

(osteomielite) (fig. 45 e 46), e como seqela, anquilose ssea (fuso ssea entre as superfcies articulares). Este diagnstico deve ser feito o mais rpido possvel, pois em poucos dias pode haver uma acentuada destruio, levando a um comprometimento irreversvel, limitando significativamente o paciente, que em alguns casos ter que colocar uma prtese articular no futuro.

A

B

Figura 44. Artrite sptica inicial do joelho. Note o aumento de partes moles adjacentes articulao sem sinais evidentes de destruio ssea associado.

Figura 45. Artrite sptica do quadril direito em uma fase mais avanada demonstrando destruio articular e ssea associadas, causando uma deformidade articular no paciente.

Figura 46. Complicao de artrite sptica mostrando a destruio da cabea femural.

Devido ao carter agressivo e crnico da infeco, em alguns casos a leso pode ser confundida radiograficamente com tumor, sendo o diagnstico correto efetuado apenas com o estudo histolgico microscpico ou com prova teraputica (tratamento emprico com antibiticos).

NEOPLASIASPara a avaliao das leses sseas tumorais, um estudo multidisciplinar recomendvel, incluindo o radiologista, patologista e o oncologista. O raio-X de extrema importncia na avaliao da leso. O estudo por ressonncia magntica torna-se importante para a melhor visualizao de partes moles adjacentes ao osso doente (fig. 47).

A F ig u ra 47. p acien t e co m o st eo ssarco ma d a f b u la d ist al. No t e co mo a resso n n cia mag n t i ca ap r esen t a m elh o r d ef in io d a ext en s o d e le so d e p art es mo les ( C) em co mp arao co m o raio- X ( A) e t o mo g raf ia

co mp u t ad o riz ad a ( B) .

Vrias neoplasias podem comprometer o sistema osteo-muscular, sendo divididos em benignas e malignas. As neoplasias malignas so mais freqentes, principalmente devido s metstases. Os tumores malignos primrios so bem menos comuns, destacando-se o tumor de Ewing, osteossarcoma,

condrossarcoma, mieloma mltiplo, plasmocitoma. Existem diversas caractersticas radiogrficas que devem ser avaliadas nos casos de leso tumoral:

Contornos (bem definido = geogrfico, pouco definido = rodo de traa, indefinido = permeativo) (fig. 48).

F ig u ra 48. Pad r es d e d est ru io ssea. Q u an t o mais d ef in id a f o r o s limit es d a leso , maio res c h an ces d e se r b en ig n a.

Margens (esclerticas ou no) (fig. 49).

F ig u ra 49. M arg en s d a leso . Q u an t o mais escler t ic a a b o rd a d a leso , m aio r a ch an ce d e b en ig n id ad e ( 1 A) .

Localizao intra-ossea no plano vertical (epfise, metfise ou difise) e horizontal (excntrica ou central)

Reao periosteal (laminar, multilaminar, raios de sol, casca de , cebola, em pente de cabelo) (fig. 50).

F ig u ra 50. Pad r e s d e rea o p e rio st eal. O s p ad r es co n t n u os ( in it erru p t ed ) t em maio r p ro b ab ilid ad e d e a co mp an h ar l es es b en ig nas, en q u an t o o p ad ro in t erro mp id o ( in t erru p t ed) t em maio r ch an ce d e aco mp an h ar le s es malig n a s o u d e alt a ag ress iv id ad e.

Rotura da cortical e extenso para partes moles (fig. 51)

F ig u ra 51. O s t u mo res malig n o s cu rs a m mais co m ro t ura d a co rt ical e ext en so p ara p art es mo les.

Matriz que pode estar calcificada ou no, sendo que alguns tipos de calcificao podem ajudar na definio do tipo histolgico da leso (fig. 52).

F ig u ra 52. E xemp lo d e t ip o s d e m at riz es calcif ic ad as q u e in d icam u m t u mor d e n at u rez a cart ilag i n o sa.

Todos estas caractersticas da leso devem ser avaliados associados a idade e o sexo do paciente, importante para a hiptese diagnstica final. Como regra geral os tumores benignos apresentam contornos geogrficos, margens esclerticas e bem definidas, reao periosteal laminar slida ou ausente, sem rotura da cortical ou extenso para partes moles (figs. 53 e 54).

figura 53. Leso ssea bem definida, com margens esclerticas, sem rotura da cortical ou extenso para partes moles, localizada na epfise proximal da tbia. Diagnstico: condroblastoma.

Figura 54. Leso ssea com margens definidas, porm no esclerticas, sem rotura da cortical ou extenso para partes moles, em uma localizao muito especfica para dois tipos de tumores: 1 cisto sseo e 2 lipoma do calcneo. Neste caso foi o diagnstico foi cisto sseo.

Enquanto as leses malignas apresentam margens no esclerticas e pouco definidas, em rodo de traa ou permeativas, associado a reao periosteal multilaminar, em raios de sol ou pente de cabelo, podendo apresentar rotura da cortical e extenso para partes moles (figs. 55, 56 e 57). Em pacientes acima de 40 anos, mesmo as leses com caractersticas benignas devem ser observadas

com bastante cautela devido ao importante aumento do nmero de metstases nesta faixa etria.

Figura 55. Raio-X de pacientes com osteossarcoma mostrando leses com margens pouco definidas, rotura da cortical com reao periosteal imatura (com formao de triangulo de Codman setas) e extenso para partes moles.

Figura 56. Osteossarcoma do fmur distal mostrando leso mal definida, com rotura da cortical, reao periosteal imatura e extenso para partes moles, melhor mostrada nas imagens por tomografia computadorizada (C e D) e ressonncia magntica (E).

Figura 57. Neoplasia de partes moles mostrando calcificaes, com margens bem definidas na poro inferior, contudo nota-se margens indefinidas e irregulares junto a margem superior, compatvel com leso mais agressiva associada. As imagens por tomografia computadorizada e ressonncia magntica tambm mostram a leso com uma poro mais definida e outra mais irregular. Diagnstico: condroma de partes moles com transformao maligna para condrossarcoma.

Algumas leses de aspecto agressivo, como a osteomielite (fig. 58), cisto sseo aneurismtico e tumor de clula gigantes podem apresentar achados radiogrficos que sugiram malignidade.

A

B

Figura 58. Dois pacientes com osteomielite (A aguda e B crnica) mostrando leses com margens irregulares e pouco definidas, de aspecto misto (ltico e esclertico), reao peristeal irregular e edema de partes moles. Estas alteraes so identificadas tambm em leses tumorais malignas.

LESES TUMORAIS BENIGNAS As leses tumorais benignas tem uma incidncia maior nas trs primeiras dcadas. So classificadas com relao ao seu tipo histolgico: Ostoblsticas (formadoras de osso): osteoma, ilhota ssea

(enostose), osteoblastoma, osteoma osteide. Condroblsticas (formadoras de cartilagem): encondroma, condroma periosteal, condroma de partes moles, osteocondroma,

condroblastoma, fibroma condromixide. Fibrognico: defeito cortical fibroso (fibroma no-ossificante),

histiocitoma fibroso benigno, displasia fibrosa, fibroma desmoplasico, tumor lipoesclerosante mixofibroso. Tumores de cel. Redondas: histiocitose X. Vascular: hemangioma, angiomatose cstica, linfangioma. Miscelnia (alguns desses tumores apresentam variaes malignas): Tumor de cls. Gigantes, cisto sseo simples, cisto sseo aneurismtico, lipoma intra-sseo, adamantinoma, cordoma.

PRINCIPAIS LESES TUMORAIS MALIGNAS As leses tumorais malignas tem dois picos de incidncia. Nos pacientes mais jovens, nas duas primeiras dcadas, predominam o osteossarcoma e o tumor de Ewing, enquanto no paciente mais velho (quinta dcada em diante) predominam as metstases e o mieloma mltiplo. Osteoblsticas (formadoras de osso): Osteossarcoma, Condroblsticas (formadoras de cartilagem): condrossarcoma. Fibrognica: fibrossarcoma e histiocitoma fibroso maligno. Tumores de cel. Redondas: Tumor de Ewing, linfoma, plasmocitoma, mieloma mltiplo.

Vascular: Angiossarcoma, hemangiopericitoma. Miscelnia: Tumor de cls. Gigantes, cisto sseo simples, cisto sseo aneurismtico, lipoma intra-sseo, adamantinoma, cordoma.