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II SIMPÓSIO SOBRE A BIODIVERSIDADE DA MATA ATLÂNTICA. 2013 129 Morfoanatomia foliar de Gallesia integrifolia (Spreng.) Harms (Phytolaccaceae) Izadora Rocha Gomes¹*, Luena de Oliveira da Conceição¹, Judson Albino Coswosk¹ e Elisa Mitsuko Aoyama² 1 Graduandos em Ciências Biológicas, Depto. Ciências Agrárias e Biológicas /CEUNES- UFES. 2 Professora Depto. Ciências Agrárias e Biológicas, CEUNES-UFES. *Autora para correspondência: [email protected] Introdução A família Phytolaccaceae, constituída por 12 gêneros, é amplamente distribuída, possuindo representantes nas Américas Tropical e Subtropical, na África e na Ásia Oriental. Essa ampla distribuição, porém, não se aplica a todos os gêneros. Das quatro espécies do gênero Gallesia, por exemplo, somente duas estão presentes no Brasil, Gallesia integrifolia (Sprengel) Harms e Gallesia gorarema (Vell.) Moq. (Fraga et al., 2006), sendo a primeira vulgarmente conhecida como de Pau d’alho, Guararema e Ibirarema. Sua madeira é moderadamente pesada, utilizada para vários fins, como construções temporárias, confecção de caixotarias e embalagens leves; quando verde possui um cheiro forte semelhante ao do alho, quando madura e seca perde o cheiro e se torna durável, podendo substituir o pinheiro. É uma espécie de rápido crescimento e de grande porte, medindo de 15 a 30 metros, com tronco variando de 70 a 140 cm de diâmetro. Ocorre no estado de Goiás, Bahia, Espírito Santo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Paraná, comumente encontrada em solos úmidos e férteis. É uma espécie perenifólia, heliófita. Floresce entre os meses fevereiro e abril e os frutos amadurecem no período entre setembro e outubro. Os frutos obtidos podem ser diretamente utilizados para semeadura, uma vez que a retirada da semente do seu interior é difícil (Lorenzi, 2002). Na medicina popular é utilizada para o tratamento do reumatismo, úlceras e outras doenças. Além disso, também é atribuído a ela função de repelente natural a vários insetos graças à volatilidade de seus constituintes químicos. Embora a espécie tenha sido amplamente estudada sob os aspectos farmacognósticos (Akisue et al., 1986), os efeitos de sombreamento no crescimento de plantas jovens (Demuner et al., 2004) e as taxas de germinação de sementes (Barros et al., 2005), a morfoanatomia foliar da espécie carece de estudos detalhados, sendo encontrados alguns detalhes no trabalho de Akisue et al. (1986). Por se tratar de uma espécie nativa, é importante que se estude sua morfoanatomia para auxílio de futuras pesquisas. O objetivo do estudo foi encontrar caracteres da morfoanatomia foliar que possam facilitar a identificação da espécie. Material e métodos Foram coletados dez ramos da Gallesia integrifolia numa área de mata às margens da Rodovia São Mateus-Nova Venécia (Km 37). Para as análises biométrica e morfológica foram utilizadas 10 folhas adultas presentes nos 6º nós. Foram feitas medidas de comprimento e largura de limbo e comprimento e diâmetro de pecíolo para tirar as médias e desvio padrão. Logo depois, as folhas foram fixadas em FAA durante 48 horas e posteriormente colocadas em álcool 70%. A pesquisa morfoanatômica foi conduzida no laboratório de fisiologia vegetal da UFES, Campus de São Mateus. Foram analisadas as mesmas folhas para descrições morfoanatômicas, com a utilização de técnicas de

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II SIMPÓSIO SOBRE A BIODIVERSIDADE DA MATA ATLÂNTICA. 2013 129

Morfoanatomia foliar de Gallesia integrifolia (Spreng.) Harms (Phytolaccaceae) Izadora Rocha Gomes¹*, Luena de Oliveira da Conceição¹,

Judson Albino Coswosk¹ e Elisa Mitsuko Aoyama²

1Graduandos em Ciências Biológicas, Depto. Ciências Agrárias e Biológicas /CEUNES-UFES. 2Professora Depto. Ciências Agrárias e Biológicas, CEUNES-UFES. *Autora para correspondência: [email protected]

Introdução

A família Phytolaccaceae, constituída por 12 gêneros, é amplamente distribuída, possuindo representantes nas Américas Tropical e Subtropical, na África e na Ásia Oriental. Essa ampla distribuição, porém, não se aplica a todos os gêneros. Das quatro espécies do gênero Gallesia, por exemplo, somente duas estão presentes no Brasil, Gallesia integrifolia (Sprengel) Harms e Gallesia gorarema (Vell.) Moq. (Fraga et al., 2006), sendo a primeira vulgarmente conhecida como de Pau d’alho, Guararema e Ibirarema. Sua madeira é moderadamente pesada, utilizada para vários fins, como construções temporárias, confecção de caixotarias e embalagens leves; quando verde possui um cheiro forte semelhante ao do alho, quando madura e seca perde o cheiro e se torna durável, podendo substituir o pinheiro. É uma espécie de rápido crescimento e de grande porte, medindo de 15 a 30 metros, com tronco variando de 70 a 140 cm de diâmetro. Ocorre no estado de Goiás, Bahia, Espírito Santo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Paraná, comumente encontrada em solos úmidos e férteis. É uma espécie perenifólia, heliófita. Floresce entre os meses fevereiro e abril e os frutos amadurecem no período entre setembro e outubro. Os frutos obtidos podem ser diretamente utilizados para semeadura, uma vez que a retirada da semente do seu interior é difícil (Lorenzi, 2002). Na medicina popular é utilizada para o tratamento do reumatismo, úlceras e outras doenças. Além disso, também é atribuído a ela função de repelente natural a vários insetos graças à volatilidade de seus constituintes químicos. Embora a espécie tenha sido amplamente estudada sob os aspectos farmacognósticos (Akisue et al., 1986), os efeitos de sombreamento no crescimento de plantas jovens (Demuner et al., 2004) e as taxas de germinação de sementes (Barros et al., 2005), a morfoanatomia foliar da espécie carece de estudos detalhados, sendo encontrados alguns detalhes no trabalho de Akisue et al. (1986). Por se tratar de uma espécie nativa, é importante que se estude sua morfoanatomia para auxílio de futuras pesquisas. O objetivo do estudo foi encontrar caracteres da morfoanatomia foliar que possam facilitar a identificação da espécie.

Material e métodos

Foram coletados dez ramos da Gallesia integrifolia numa área de mata às margens da Rodovia São Mateus-Nova Venécia (Km 37). Para as análises biométrica e morfológica foram utilizadas 10 folhas adultas presentes nos 6º nós. Foram feitas medidas de comprimento e largura de limbo e comprimento e diâmetro de pecíolo para tirar as médias e desvio padrão. Logo depois, as folhas foram fixadas em FAA durante 48 horas e posteriormente colocadas em álcool 70%. A pesquisa morfoanatômica foi conduzida no laboratório de fisiologia vegetal da UFES, Campus de São Mateus. Foram analisadas as mesmas folhas para descrições morfoanatômicas, com a utilização de técnicas de

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130 GOMES ET AL: MORFOANATOMIA FOLIAR DE GALLESIA INTEGRIFOLIA

corte à mão livre para obtenção de secções transversais e paradérmicas de pecíolo e limbo e posteriormente analisadas em lâminas com glicerina através do microscópio de luz.

Resultados e Discussão

G. integrifolia apresentou folhas completas e simples, com coloração verde escuro na face adaxial e verde mais claro na abaxial, bordo inteiro e levemente ondulado, formato elíptico com ápice cuspidado e base do limbo oblíqua (Figura 8), filotaxia alterna espiralada, peninérveas, superfície glabra e lisa e consistência coriácea. Nas análises biométricas do limbo e pecíolo as médias, amplitude e desvio padrão, respectivamente foram: comprimento médio do limbo 16,33cm (14,60 – 18,70cm) ± 1.21 cm; largura média de limbo 7,30cm (6,40 – 8,20cm) ± 0,55 cm; pecíolo possui comprimento médio de 4,42cm (3,0 – 5,8cm) ± 0.84 cm e diâmetro médio de 1,92 mm (1,50 – 2,22mm) ± 0,210 mm. Com base nas médias e desvio padrão, pode-se observar a alta heterogeneidade foliar com variações maiores para o comprimento do limbo. Em vista frontal da face adaxial, as células têm formas variadas entre triangular e quadrangular deformados apresentando paredes celulares retas (Figura 7). Na face abaxial é comum a presença de estômatos variando entre anomocíticos e paracíticos, sendo o segundo em maior quantidade (Figura 6). A secção transversal do limbo foliar apresenta cutícula delgada (Figura 4), epiderme com aspecto multisseriada, porém é necessário maiores estudos para confirmar tal informação, possui idioblastos, tecido paliçádico varia 1 a 2 camadas de células no sentido anticlinal e parênquima lacunoso (cerca de 6 a 8 camadas) com presença de cristais estiloides e prismáticos de oxalato de cálcio (Figura 5), diferindo da descrição feita por Akisue et al. (1986) que diz em seu trabalho que as camadas de parênquima paliçádico variam entre 1 a 3 e o parênquima lacunoso chega a ter até 10 camadas. Em secção transversal do bordo observa-se uma camada de parênquima paliçádico, cinco a seis camadas de parênquima lacunoso e, na porção lateral do bordo, nota-se a presença de células epidérmicas com forma ovalada (figura 3). Na nervura central, a epiderme contém células de formato retangular e, subjacente à epiderme, há parênquima fundamental e de reserva, composto por cerca de 6 a 8 células envolvendo o sistema vascular (figura 2). A epiderme do pecíolo é formada por células de contorno retangular. O colênquima angular possui células que variam entre 3 a 4 camadas. As células do parênquima fundamental e de reserva variam de 6 a 8 camadas, sendo elas isodiamétricas (Figura 1), além de possuírem poucos cristais do tipo estiloides e prismáticos possuem também idioblastos. Recentemente, tem aumentado o número de trabalhos no qual a anatomia foliar tem sido utilizada como subsídio taxonômico para identificação de várias espécies (Rio et al., 2005, Gomes et al., 2005), assemelhando-se à proposta desse estudo. Muitos dos caracteres apresentados neste estudo são os mesmos apresentados por Akisue et al.(1986), dentre eles o tamanho do limbo e do pecíolo, com pequenas variações. No mesmo trabalho, foi observada também a presença de estômatos anomocíticos e paracíticos em proporções relativamente semelhantes. Contudo, dos caracteres em comum aos dois trabalhos, os que parecem apresentar maior valor taxonômico para identificação da espécie são a epiderme com aspecto multisseriada na nervura central e a presença de cristais estiloides, ambos comuns a estrutura foliar da espécie.

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Conclusão

Dos caracteres observados nas plantas de G. integrifolia, destaca-se a presença de uma epiderme com aspecto de multisseriada na nervura central e os cristais estiloides e prismáticos que atravessam o parênquima, aspectos incomuns à maioria das plantas. A repetição desses caracteres em outros trabalhos corrobora a suposição de que a identificação da espécie pode ser feita através de análises da morfoanatomia foliar. Os idioblastos podem ser os principais responsáveis pelo odor característico do alho.

Referências Bibliográficas

Akisue, M. K., Akisue, G. & Oliveira, F. de 1986. Caracterização Farmacognóstica de Pau D’alho Gallesia integrifolia (Spreng) Harms. Revista Brasileira de Farmacognosia. 1(2):166-182.

Barros, S. S. U., Silva, A. da & Aguiari, I. B. 2005. Germinação de sementes de Gallesia integrifolia (Spreng.) Harms (Pau d’alho) sob diferentes condições de temperatura, luz e umidade do substrato. Revista Brasileira de Botânica. 28(4):727-733

Demuner, V. G., Hebling, S. A. & Dagustinho, D. M. 2004. Efeito do sombreamento no crescimento inicial de Gallesia integrifolia (Spreng) Harms. Boletim do Museu de Biologia Mello Leitão. (N. Sér.) 17:45-55.

Fraga, H. F. S., Rosa, P. M., Morais, A. A., Pinto, A. C., Rezende, C. M. 2006. Análise dos constituintes químicos do óleo essencial das folhas de Gallesia integrifolia (Sprengel) Harms (Phytolaccaceae). 29º Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Química-SBQ.

Gomes, S. M. A., Silva, E. A. M., Lombardi, J. A., Azevedo, A. A. & Vale, F. H. A. 2005. Anatomia foliar como subsídio à taxonomia de Hippocrateoideae (Celastraceae) no Sudeste do Brasil. Acta Botanica Brasilica. 19(4):945-961.

Lorenzi, H. 2002. Árvores brasileiras: manual de identificação e cultivo de plantas arbóreas no Brasil. 1(4):306.

Rio, M. C. S., Kinoshita, L. S., Castro, M. M. 2005. Anatomia foliar como subsídio para a taxonomia de espécies de Forsteronia G. Mey. (Apocynaceae) dos cerrados paulistas. Revista Brasileira de Botânica, 28(4):713-726.

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132 GOMES ET AL: MORFOANATOMIA FOLIAR DE GALLESIA INTEGRIFOLIA

Figuras 1-5. Secções transversais foliares. 6-7. Epiderme em vista frontal das faces abaxial e adaxial. 8. Vista frontal das faces adaxial e abaxial do limbo de Gallesia integrifolia. 1- Epiderme do pecíolo (seta) possui células de contorno retangular. 2- Epiderme da nervura central (seta). 3- Cutícula do bordo foliar (seta). 4- Cutícula do limbo foliar (seta), parênquima paliçádico, e parênquima lacunoso. 5- Detalhe de cristal de oxalato de cálcio do tipo estiloide (seta vermelha). 6- Vista frontal da face abaxial, com grande quantidade de estômatos, célula subsidiária (seta vermelha) e célula-guarda (setas amarelas). 7- Vista frontal da face adaxial, com formato celular variado. Sendo, CA= colênquima angular; PF= parênquima fundamental; E= epiderme; PP= parênquima paliçádico; PL= parênquima lacunoso. Figura 8. Faces adaxial e abaxial do limbo de Gallesia integrifolia.