modificação comportamental na gestão de peso: da teoria à prática

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56 Nº34 Out-Dez 2014 Pág. 56-66 Marta M. Marques 1 ; Pedro J. Teixeira 2 1 Psicóloga clínica e da Saúde, doutorada em Psicologia da Saúde pela Universidade de Leiden, Países Baixos; investigadora Associada, ciPeR-Self-Regulation Group, Faculdade de Motricidade Humana, Universidade de Lisboa, Portugal; Assistente convidada no iSPA- instituto Universitário, Lisboa, Portugal. 2 doutorado em ciências da nutrição; investigador coordenador, ciPeR- Self-Regulation Group; Professor catedrático, departamento de desporto e Saúde, Faculdade de Motrici- dade Humana, Universidade de Lisboa, Lisboa, Portugal Modificação comportamental na Gestão do Peso: da teoria à prática Palavras chave: Modificação comportamental; Saúde; Teoria; Técnicas; Determinantes Resumo A mudança comportamental é cada vez mais um tema central na intervenção na área da gestão do peso e saúde. Globalmente, o apelo à adoção de «estilos de vida saudáveis» está presente a vários níveis na nossa sociedade, desde as políticas de saúde, passando pelos órgãos de comunicação so- cial, ações locais, até à informação que recebemos através de profissionais de saúde, colegas ou fami- liares. contudo, a modificação comportamental (e principalmente a sua manutenção) é um processo sinuoso que, pela sua complexidade, requer uma análise aprofundada dos fatores determinantes que a influenciam. nesta perspetiva, as teorias da mudança comportamental, nomeadamente as que se focam nos processos autorregulatórios do indi- víduo, assumem particular relevância para a inter- venção, pois definem e estabelecem relações entre os fatores envolvidos na mudança comportamen- tal. estes são potencialmente modificáveis através de técnicas específicas que daqui derivam e que, por sua vez, podem ser integradas na atuação dos profissionais de saúde. no presente texto, abordar- se-á esta temática, com enfoque no percurso ba- seado na evidência que caracteriza a área da modificação comportamental em saúde. Modificação Comportamental em Saúde nas últimas décadas, tem-se assistido a um crescimento exponencial da investigação e inter- venção ao nível da mudança comportamental em saúde, centrado essencialmente na adoção de comportamentos saudáveis (e.g. atividade física) ou extinção de comportamentos de risco (e.g. ta- bagismo), com vista à prevenção ou gestão de doenças crónicas e melhoria da qualidade de vida das populações. este interesse advém da investi- gação que demonstra a influência significativa que os comportamentos individuais têm em di- versos indicadores de saúde e bem-estar. no caso da prevenção e gestão do excesso de peso e da obesidade, os benefícios decorrentes de alterações comportamentais associadas ao estilo de vida (so- bretudo a alimentação e atividade física) encon- tram-se devidamente sustentados (e.g. 1, 2 ). com o desenvolvimento da investigação e in- tervenção no âmbito da modificação comporta- mental em saúde, tem sido possível constatar-se a complexidade inerente à promoção de compor- tamentos de saúde. como Mark Twain disse: “Gi- ving up smoking is the easiest thing in the world. I know because I've done it thousands of timesa . de facto, um dos grandes problemas associados à mudança comportamental em saúde, quer em pessoas aparentemente saudáveis, quer em pes- soas com doença crónica, não é somente a adoção de comportamentos de saúde, mas a manutenção dos mesmos a longo prazo e a prevenção da re- caída. A manutenção da perda de peso é um exemplo claro desta dificuldade 2-4 . esta comple- xidade tem contribuído para o posicionamento a Tradução portuguesa: “deixar de fumar é a coisa mais fácil do mundo. eu sei porque já o fiz milhares de vezes”.

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Aquisição de Comportamentos Saudáveis na Gestão de Peso.Artigo publicado na Revista Fatores de Risco da autoria da Dr.ª Marta Marques e Dr. Pedro Teixeira.

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Marta M. Marques1; Pedro J. Teixeira2

1Psicóloga clínica e da Saúde, doutorada em Psicologia da Saúde pela Universidade deLeiden, Países Baixos; investigadora Associada, ciPeR-Self-Regulation Group, Faculdadede Motricidade Humana, Universidade de Lisboa, Portugal; Assistente convidada no iSPA-instituto Universitário, Lisboa, Portugal.2doutorado em ciências da nutrição; investigador coordenador, ciPeR- Self-RegulationGroup; Professor catedrático, departamento de desporto e Saúde, Faculdade de Motrici-dade Humana, Universidade de Lisboa, Lisboa, Portugal

Modificação comportamental na Gestão do Peso: da teoria à prática

Palavras chave: Modificação comportamental; Saúde; Teoria; Técnicas; Determinantes

Resumo A mudança comportamental é cada vez mais

um tema central na intervenção na área da gestãodo peso e saúde. Globalmente, o apelo à adoção de«estilos de vida saudáveis» está presente a váriosníveis na nossa sociedade, desde as políticas desaúde, passando pelos órgãos de comunicação so-cial, ações locais, até à informação que recebemosatravés de profissionais de saúde, colegas ou fami-liares. contudo, a modificação comportamental (eprincipalmente a sua manutenção) é um processosinuoso que, pela sua complexidade, requer umaanálise aprofundada dos fatores determinantesque a influenciam. nesta perspetiva, as teorias damudança comportamental, nomeadamente as quese focam nos processos autorregulatórios do indi-víduo, assumem particular relevância para a inter-venção, pois definem e estabelecem relações entreos fatores envolvidos na mudança comportamen-tal. estes são potencialmente modificáveis atravésde técnicas específicas que daqui derivam e que,por sua vez, podem ser integradas na atuação dosprofissionais de saúde. no presente texto, abordar-se-á esta temática, com enfoque no percurso ba-seado na evidência que caracteriza a área damodificação comportamental em saúde.

Modificação Comportamentalem Saúdenas últimas décadas, tem-se assistido a um

crescimento exponencial da investigação e inter-

venção ao nível da mudança comportamental emsaúde, centrado essencialmente na adoção decomportamentos saudáveis (e.g. atividade física)ou extinção de comportamentos de risco (e.g. ta-bagismo), com vista à prevenção ou gestão dedoenças crónicas e melhoria da qualidade de vidadas populações. este interesse advém da investi-gação que demonstra a influência significativaque os comportamentos individuais têm em di-versos indicadores de saúde e bem-estar. no casoda prevenção e gestão do excesso de peso e daobesidade, os benefícios decorrentes de alteraçõescomportamentais associadas ao estilo de vida (so-bretudo a alimentação e atividade física) encon-tram-se devidamente sustentados (e.g. 1, 2).

com o desenvolvimento da investigação e in-tervenção no âmbito da modificação comporta-mental em saúde, tem sido possível constatar-sea complexidade inerente à promoção de compor-tamentos de saúde. como Mark Twain disse: “Gi-ving up smoking is the easiest thing in the world.I know because I've done it thousands of times”a.de facto, um dos grandes problemas associadosà mudança comportamental em saúde, quer empessoas aparentemente saudáveis, quer em pes-soas com doença crónica, não é somente a adoçãode comportamentos de saúde, mas a manutençãodos mesmos a longo prazo e a prevenção da re-caída. A manutenção da perda de peso é umexemplo claro desta dificuldade2-4. esta comple-xidade tem contribuído para o posicionamento

a Tradução portuguesa: “deixar de fumar é a coisa mais fácil do mundo. eu sei porque já o fiz milhares de vezes”.

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cada vez mais central da área de estudos da mo-dificação comportamental no âmbito da promo-ção de saúde e da prevenção e gestão da doença.

Para além disto, a ênfase atual na modificaçãocomportamental, impulsionada pelas mudançasnos cuidados de saúde, centra-se sobretudo numaperspetiva autorregulatória que considera que aspessoas têm a capacidade para regular o seu pró-prio comportamento, desde que possuam a mo-tivação e as competências necessárias para tal.A autorregulação remetepara o princípio de que ocomportamento humano édirigido a objetivos impor-tantes para o próprio e quea sua obtenção pode ser fa-cilitada ou afetada por pro-cessos autorregulatórios5.desta forma, considera-seque as intervenções queidentifiquem e potenciemestes processos motivacio-nais e regulatórios, objetivocentral na área da mudançacomportamental, possamser mais eficazes.

A um nível científico, aimportância crescente daárea da modificação com-portamental em saúde estábem patente, por um ladono número de sociedadescientíficas e profissionaisemergentes cujo enfoque énos comportamentos associados à saúde e àdoençab, por outro, no crescente número de pu-blicações científicas internacionaisc. Para alémdisto, as recomendações para a prevenção e tra-tamento de diversos problemas de saúde publica-das por organizações nacionais e internacionaisde Saúde, colocam grande ênfase na modificaçãocomportamental. Por exemplo, nas recomenda-ções mais recentes desenvolvidas pelaAHA/ACT/TOS Task Force para a gestão do pesoem adultos1, é clara a recomendação baseada na

modificação comportamental: «Aconselhar os in-divíduos com excesso de peso ou obesidade a par-ticipar durante pelo menos seis meses numprograma de modificação do estilo de vida que,através da utilização de estratégias de modifica-ção comportamental promove a adesão a umadieta menos calórica e ao aumento da atividadefísica»1.

Ao nível da formação técnico-científica, temtambém vindo a destacar-se o aumento da forma-

ção graduada e pós-gra-duada em Modificaçãocomportamental, na ofertaformativa das ciências daSaúde e do comporta-mento. A investigação eaplicação nesta área, quetem sido desenvolvida fun-damentalmente por espe-cialistas em Psicologia daSaúde e Medicina compor-tamental6, tem co mo prin-cipal objeto de estudo, aanálise dos fatores (deter-minantes) envolvidos noprocesso de mudança com-portamental, bem como odesenvolvimento, imple-mentação e avaliação de in-tervenções de mudançacomportamental baseadasna melhor evidência dispo-nível.

Fatores Explicativos da Mudança Comportamental em SaúdeSabemos hoje que o processo de mudança

comportamental, incluindo os comportamentosadotados com vista à prevenção e gestão dedoença, são influenciados por uma multiplicidadede fatores, comumente designados por determi-nantes (correlatos ou preditores são outros ter-mos utilizados) do comportamento. Osdeterminantes constituem o que se pretendemudar numa intervenção de mudança comporta-

b destacam-se as seguintes sociedades: American Society of Behavioral Medicine (www.sbm.org), International Society of BehavioralMedicine (www.isbm.info), European Health Psychology Society (openhealthpsychology.com), Division 38 - American PsychologicalAssociation (www.health-psych.org), International Society of Behavior Nutrition and Physical Activity (www.isbnpa.org);

c Annals of Behavioral Medicine, Journal of Behavioral Medicine, International Journal of Behavioral Nutrition and Physical Acti-vity, Psychology & Health, Health Psychology Review

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mental. Por exemplo, numa intervenção comvista a potenciar a adesão a um tratamento (e.g.farmacológico), tipicamente intervém-se ao nívelda reestruturação de crenças que o indivíduo temacerca do problema de saúde (e.g. gravidade) e dotratamento (e.g. necessidade de fazer o trata-mento). de acordo com alguma investigação,estas crenças são um determinante central daadesão7. Os determinantes podem corresponderàs características do próprio comportamento aadoptar (e.g. tipo de atividade física), às políticasde saúde (e.g. impostos sobre venda de tabaco),fatores ambientais (e.g. acesso a serviços desaúde) e sociais (e.g. suporte social) relacionadoscom as instituições e comunidade, bem como in-dividuais. A um nível individual, distinguem-sefatores demográficos e biológicos (e.g. idade, his-tória familiar de doença cardiaca), cognitivos (e.g.

autoeficácia, motivação autonóma), emocionais(e.g. perturbações do humor) e comportamentais(e.g. experiências anteriores). no caso da gestãode peso, embora se considere que os fatores am-bientais («ambiente obesogénico»), tenham umgrande peso na sociedade em que vivemos hoje eque, por isso, devam ser um alvo essencial de in-tervenção, é igualmente importante compreendere atuar sobre os determinantes individuais como,por exemplo, a motivação do indivíduo para fazeruma dieta alimentar saudável ou para reduzir oseu peso. estes determinantes individuais promo-tores da autorregulação do indivíduo são, por ex-celência, os principais alvos abordados nainteração entre o profissional de saúde e o utente,pois permitem que o indivíduo atue de forma efi-caz sobre o meio8. A título de exemplo, o artigo deSancho e col. publicado no presente número,apresenta uma revisão exaustiva das categoriasde determinantes do peso corporal em criançasem idade pré-escolar9.

Uma outra forma de classificação dos determi-

nantes da mudança comportamental, que podeser especialmente útil do ponto da vista da inter-venção, é ao nível da sua capacidade de influênciasobre o comportamento-alvo, distinguindo-seentre determinantes distais e proximais. Os fato-res sócio-demográficos são um exemplo de deter-minantes distais que tipicamente não seconstituem como o principal alvo da intervençãocomportamental; enquanto que a atitude, posi-tiva ou negativa, face a um determinado compor-tamento (e.g. inscrição num ginásio), éclaramente um exemplo de um determinanteproximal da intenção de iniciar um comporta-mento10. É, por isso, um processo cognitivo alvofrequente de atenção e intervenção. O peso quecada determinante ou categoria de determinantestêm na explicação da mudança comportamentalnão é igual em todas as situações e varia de

acordo com a complexidade do comportamento-alvo (comportamentos simples versus complexos,como é o caso de fazer vacinação versus praticarexercício físico), com os grupos-alvo (e.g. jovens,adultos, populações clínicas) entre outras carac-terísticas. no caso da intervenção para a gestãodo peso, é comum distinguir-se entre determi-nantes pré-tratamento (por exemplo, as expecta-tivas iniciais de sucesso ou número deexperiências prévias) e determinantes do pro-cesso-tratamento (como a perda inicial de pesoou a autoeficácia), alguns dos quais podem estarmais associados à manutenção, como pode ser ocaso da motivação autónoma11-13.

esta dinâmica entre determinantes de diferen-tes níveis que podem operar em diferentes fases doprocesso de modificação comportamental caracte-rizam as Teorias de Mudança comportamental(que serão abordadas mais à frente neste artigo) econstituem a base para a identificação de métodosou técnicas de intervenção que visam influenciarestes mesmos fatores e comportamentos.

Os determinantes individuais promotores da autorregulação

são os principais alvos abordados na interação

entre o profissional de saúde e o utente,

pois permitem que o indivíduo atue de forma eficaz sobre o meio

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Técnicas de Modificação Comportamental em SaúdePara os profissionais de saúde tem particular

interesse o conhecimento e o acesso a técnicasque auxiliem o seu trabalho ao nível da promoçãoda mudança comportamental nos seus utentes,principalmente as técnicas que se dirigem aos fa-tores individuais promotores de capacidade au-torregulatória do indivíduo na gestão da suasaúde e doença.

As intervenções desenvolvidas com vista à mo-dificação comportamental em saúde têm tido umimportante desenvolvimento no que se refere à di-versidade e qualidade das técnicas que incorpo-ram, acompanhando uma maior compreensão dacomplexidade dos comportamentos e funciona-mento humano. Por técnica de modificação com-portamental entende-se um componente ativo de

uma intervenção, irredutível, observável e repli-cável, que tem o potencial para provocar mudançano(s) determinante(s) e comporta mento(s)-alvoque pretende influenciar14. na maioria dos casosem saúde, a técnica refere-se a um determinadocomportamento evidenciado pela profissional desaúde.

numa fase embrionária da área da modifica-ção comportamental em saúde, considerava-seque, para serem eficazes, as intervenções deve-riam focar-se essencialmente no fornecimento deinformação adequada, quer sobre as potenciaisconsequências de um determinado problema desaúde (e.g. obesidade) ou comportamento derisco (e.g. sedentarismo), quer sobre os benefíciosdecorrentes da alteração de comportamentospara prevenir ou reduzir problemas de saúde (e.g.dieta alimentar adequada como forma de gestãode excesso de peso). considerava-se que a infor-mação adequada influenciaria as atitudes face aum determinado comportamento e que este seriao determinante mais significativo na promoção

da mudança comportamental. dada a baixa efi-cácia deste tipo de intervenções essencialmenteinformativas, principalmente no caso de compor-tamentos complexos (e.g. prática de atividadefísica), as intervenções de modificação comporta-mental têm vindo a adotar uma diversidade detécnicas dirigidas a fatores individuais (e.g. pro-moção da auto-monitorização) e do meio envol-vente (e.g. procura de suporte social), com vista aum impacto mais significativo na mudança com-portamental.

neste âmbito, uma rede internacional de es-pecialistas em modificação comportamental, li-derada pela Professora Susan Michie doUniversity College of London, tem desenvolvidoum trabalho notável de identificação e classifica-ção taxonómica das técnicas utilizadas nas inter-venções de modificação comportamental em

saúde, que se encontram devidamente documen-tadas (www.bct-taxonomy.com). este projetoque, até à data, permitiu a identificação de 93 téc-nicas de modificação comportamental, agrupadasem 16 categorias15 (Tabela 1), reflete uma preocu-pação cada vez mais central em sistematizar oconteúdo das intervenções de mudança compor-tamental e em criar uma linguagem comum quecontribua não só para uma melhor compreensãoe replicação dos componentes das intervenções,mas também para uma maior aproximação entrea investigação e a prática. isto permite que, ao ler-se, por exemplo, a descrição de uma intervençãocomportamental para a gestão do peso que con-tenha uma listagem das técnicas utilizadas deacordo com esta classificação taxonómica16, sejapossível identificar e compreender de forma clarao que foi realizado nessa intervenção, pois a taxo-nomia contém a definição e operacionalização decada uma das técnicas. Para além disso, permiteainda que o profissional de saúde ou o investiga-dor responsável pelo desenvolvimento de uma in-

dada a baixa eficácia das intervenções essencialmente informativas,

as intervenções de modificação comportamental

têm vindo a adotar uma diversidade de técnicas dirigidas

a fatores individuais e do meio envolvente

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Categorias Exemplos de Técnicas de Modificação Comportamental

Objetivos e Planeamento• Formulação de objetivos• Planeamento detalhado da ação (e.g. quando, como e onde)

Feedback e monitorização• Auto-monitorização do comportamento• Feedback acerca do desempenho no comportamento-alvo

Suporte social• Suporte social logístico• Suporte social emocional

conhecimento• instruções sobre como desempenhar o comportamento• Re-atribuições de causas do comportamento (explicações alternativas)

consequências • Monitorização de consequências emocionais• informação sobre as consequências para a saúde

comparação do comportamento• demonstração do comportamento (Modelagem)• comparação social com a performance de outros

Associações• introdução de estímulos para associar ao comportamento desejado

(e.g. post-it para relembrar toma de medicamento)

• exposição gradual a um estímulo associado a algo que se receia

Repetição e substituição• Substituição do comportamento indesejado por um neutro ou desejado.• Treino do comportamento para aumentar competência

comparação de resultados• Fonte credível a favor do comportamento desejado• identificação e comparação de prós e contras

Recompensa e ameaça• Recompensa social (e.g. elogio)• Auto-recompensas

Regulação • Redução de emoções negativas (e.g. gestão de stress)• Redução das exigências dos recursos mentais (e.g. utilização de mnemónicas)

Antecedentes• distração (foco alternativo)• Reestruturação do ambiente físico para facilitar o comportamento desejado

identidade• identificação do próprio como modelo• identidade associada ao comportamento modificado

consequências programadas• descontinuação da recompensa associada ao comportamento indesejado• Recompensa da aproximação ao comportamento

crença/confiança pessoal • Persuasão verbal sobre as capacidades pessoais• enfoque nos sucessos anteriores

Aprendizagem indireta• Recompensa imaginária

• consequências dos comportamentos dos outros (aprendizagem por condicionamento vicariante)

Tabela 1 Taxonomia de Técnicas de Modificação Comportamental

Adaptado de Michie et al (2013), BCT Taxonomy (v1): 93 hierarchically-clustered techniques

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tervenção possa selecionar as técnicas através deuma lista extensa e sistematizada em vez de umalista limitada que se encontra «à mão» ou que foimemorizada16.

nos últimos cinco anos, desde que foi publi-cada a primeira classificação taxonómica das téc-nicas de modificação comportamental17, têm sidorealizadas inúmeras meta-análises de interven-ções comportamentais desenvolvidas em estudosexperimentais controlados. estas revisões têmcomo objetivo principal analisar se a utilização dedeterminadas técnicas, isoladamente ou em con-junto com outras técnicas (por exemplo de acordocom as teorias que as sustentam), explicam a mag-nitude dos efeitos das intervenções de modificaçãocomportamental, nos mais variados comporta-mentos (e.g.18) e problemas de saúde (e.g.19, 20).Uma das principais justificações para a realizaçãodeste tipo de análises é o facto de, repetidamente,

as intervenções de modificação comportamentalem saúde apresentarem uma grande variabilidadena magnitude do seu efeito entre diferentes en-saios clínicos realizados. importa por isso com-preender que componentes (o quê) dasintervenções podem explicar esta variabilidade.Outras características como o formato da inter-venção (o como) são também frequentementeanalisadas. conhecendo os componentes das in-tervenções mais eficazes, será então possível de-senvolver e implementar intervenções para amudança comportamental em saúde realmentebaseadas na evidência. este trabalho está aindanuma fase inicial de desenvolvimento.

A título de exemplo, numa meta-análise publi-cada em 201220 analisou-se a influência das técni-cas utilizadas nas intervenções dirigidas à atividadefísica e alimentação em indivíduos com obesidadee presença (ou risco) de co-morbilidades, na mag-nitude do efeito destas intervenções. Verificou-seque a acumulação de técnicas numa mesma inter-venção, não leva, por si só, a uma maior eficácia da

intervenção. no entanto, foram identificadas algu-mas técnicas de modificação comportamental pro-motoras de competências autorregulatórias comoestando associadas a um impacto mais significativodas intervenções, nomeadamente a provisão deinstruções, a auto-monitorização e a prevenção darecaída (por exemplo através da revisão de objeti-vos). embora os resultados desta e outras revisõessistemáticas focadas na identificação das técnicasde modificação comportamental se revelem pro-missores, estes estudos mostram ainda limitaçõesrelevantes, tais como o reduzido número de inter-venções, períodos de avaliação curtos, e falta de in-formação detalhada sobre a aplicação das técnicas,limitando assim a generalização dos seus resulta-dos neste momento19, 20.

Uma questão que decorre deste processo deidentificação de técnicas e análise dos seus efeitosprende-se com a compreensão do porquê de algu-

mas técnicas de modificação comportamental, uti-lizadas de determinada forma (por exemplo,determinados conjuntos de técnicas), terem maioreficácia do que outras. As teorias de mudançacomportamental em saúde poderão ajudar a res-ponder a esta questão. dada a complexidade dosdeterminantes envolvidos na mudança comporta-mental, as teorias podem ser particularmenteúteis, não só porque estabelecem relações entre osdeterminantes e entre estes e o comportamento,mas também porque operacionalizam quando ecomo é que se deve agir sobre estes mecanismos.Ou seja, as teorias estabelecem os parâmetros, no-meadamente de natureza causal, para a aplicaçãode técnicas de modificação comportamental 21,como ilustrado na figura seguinte (Figura 1).

Não há nada mais prático do que uma boa teoriad

Quando se fala em Teorias de Mudança com-portamental é comum ouvir profissionais, estu-dantes e investigadores de outras áreas da saúde

As teorias estabelecem os parâmetros, nomeadamente de natureza causal,

para a aplicação de técnicas de modificação comportamental

d Frase da autoria de Kurt Lewin, psicólogo (1890-1947) . Versão original: “There is nothing more practical than a good theory”

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questionarem: «Qual é a utilidade destas teoriasna prática»? ou «Que vantagem poderá ter paramim conhecer teorias da psicologia?». Um pri-meiro comentário a estas questões prende-se como facto de, globalmente, os especialistas na áreada modificação comportamental (principalmentea um nível académico) fazerem uma fraca divul-gação e tradução do seu trabalho para os profis-sionais que estão no terreno. com o intuito dereduzir esta barreira, as sociedades científicas/profissionais e as universidades podem e têm pro-movido várias iniciativas de aproximação à prá-tica, tais como: a realização de formação dirigidaa profissionais de saúde ao nível da modificaçãocomportamental; uma divulgação apelativa dosresultados de artigos científicos através dosmedia; ou a criação de revistas e outras publica-ções dirigidas a profissionais (como é o caso dopresente número especial). Por outro lado, o in-teresse do público em geral pela modificaçãocomportamental, bem como pelos princípios bá-sicos que a sustentam (e.g. «como posso perderpeso com sucesso?») é também cada vez maior eisso reflete-se, por exemplo, nas publicações delivros (escritos por académicos de renome) parao público em geral, baseados em determinadasteorias, que utilizam uma linguagem aplicada22,23.

Um segundo comentário refere-se à perceçãodos profissionais de saúde em relação à objetivi-dade e utilidade prática das teorias psicológicas(ou psicossociais) de modificação comportamen-tal. Se é verdade que quando falamos em teoriaspsicológicas de mudança comportamental estápresente uma componente subjetiva associada aocomportamento e aos processos psicológicos queo regulam, também é verdade que os métodos uti-lizados para o desenvolvimento, avaliação e sis-tematização das teorias, são objetivos e rigorosos,como é exigido em qualquer área científica.

Uma grande parte das teorias de mudançacomportamental foram desenvolvidas no âmbitode outras áreas da psicologia, para explicar fenó-menos do funcionamento e comportamentohumano, de como são exemplo as Teorias Moti-vacionais, sendo depois aplicadas ao contexto dasaúde com as devidas adaptações. estas teoriasconsideram um conjunto de construtos que pre-dizem a mudança comportamental e variáveis deresultado associadas (Figura 1). no caso da mo-dificação comportamental em saúde, a teoria«propõe-se a explicar o porquê, quando e comoum comportamento ocorre (ou não), e os fatoresde influência que devem ser abrangidos de formaa promover a mudança do comportamento»24.

entre outras características, uma boa teoriadeve assim providenciar uma explicação lógicados fenómenos e desenvolver predições que pos-sam ser testadas. Para se avaliar se uma teoria demudança comportamental é adequada, esta deveser analisada de forma rigorosa, através de en-saios controlados, testando não só os efeitos daintervenção e a sua magnitude (em contraste comgrupo de controlo por exemplo), mas tambémcomo é que a intervenção produz os seus efeitos.isto é, quais são os construtos, considerados naintervenção, que explicam (pelo menos em parte)o efeito da intervenção no comportamento-alvo(mecanismos de mudança). estes podem ser tes-tados através de análises de mediação dos efei-tos25. Por exemplo, a Teoria da Autoeficácia26,uma das teorias mais citadas na intervenção emmodificação comportamental em saúde, preco-niza que o principal preditor da aquisição de umcomportamento é a expetativa de autoeficáciaque o indivíduo tem, i.e. o seu grau de confiançade que é capaz de desempenhar um determinadocomportamento com sucesso. no caso de uma in-tervenção baseada nesta teoria, para analisarmos

Teoria

Técnicas de Modificação

Comportamental Determinantes Comportamentos

Variavéis de resultado de

saúde

Figura 1Trajectória da Teoria na Mudança Comportamental em saúde

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a sua capacidade explicativa da mudança com-portamental, será então importante avaliar oefeito mediador da autoeficácia no comporta-mento alvo (e.g.27).

Relativamente à sua utilidade prática, as teo-rias de modificação comportamental - são úteispara os profissionais que intervêm nesta área namedida em que identificam e testam que deter-minantes devem ser alterados para que uma mu-dança ocorra e quais os potenciais mecanismosque causam ou influenciam decisivamente essamudança. Ao identificar os mecanismos respon-sáveis pela mudança, é possível «operacionalizá-los» através do uso de técnicas de modificaçãocomportamental. Retomemos o exemplo da Teo-ria da Autoeficácia, para ilustrar a ligação entre ateoria e as técnicas de modificação comportamen-tal. esta teoria, para além de definir claramenteo construto promotor da mudança, apresentatambém as fontes de autoeficácia. isto é, as téc-nicas que podem ser utilizadas para aumentar asexpectativas de autoeficácia do indivíduo e con-sequentemente aumentar a probabilidade de su-cesso na adoção de um comportamento (e.g. ir aoginásio). Uma destas técnicas é a modelagem –demonstração do comportamento positivo que sepretende reforçar com recurso a um modelo.neste caso, o modelo poderia ser uma pessoa comexcesso de peso que tinha conseguido inscrever-se e frequentar o ginásio com sucesso. Porquê atécnica da modelagem? Porque, de acordo com ateoria da autoeficácia (que foi desenvolvida noâmbito das teorias de aprendizagem), a principalforma de aprendizagem ou de aquisição de deter-minados comportamentos é através da observa-ção de modelos (pais, pares, etc.).

Uma das dificuldades inerentes à utilização deteorias de mudança comportamental para o de-senvolvimento de intervenções é a existência deum elevado número de teorias. Um grupo inter-nacional de investigadores em modificação com-portamental, realizou recentemente um processode compilação das teorias existentes24. Foramidentificadas 83 teorias, o que torna muito difícil,até para os especialistas em modificação compor-tamental em saúde, conhecer todas as teorias, osseus construtos e âmbitos de aplicação. Tal comoreferimos anteriormente em relação às técnicasde modificação comportamental, este cenáriocomplexo pode contribuir para um viés na seleçãoe utilização de teorias no enquadramento das in-

tervenções. É um exemplo a escolha de uma de-terminada teoria por ser uma das poucas que seconhece, ou por ser aquela que é mais citada (em-bora neste segundo caso isto possa dar-nos al-guma indicação da sua eficácia). contudo,nenhum destes critérios significa que seja a maisapropriada para o que se pretende. Para alémdisto, este número elevado de teorias pode levarainda a que um profissional de saúde opte pornão utilizar qualquer teoria na sua abordagem,dado o tempo que teria de despender para se in-formar e posteriormente selecionar a teoria maisindicada. Para aproximar a teoria à prática éassim importante simplificar este processo e ga-rantir a sua adequabilidade. Um dos objetivosprincipais do projeto de classificação e ligaçãoentre as técnicas e as teorias de modificação com-portamental, é também a elaboração de recomen-dações que auxiliem na tomada de decisão quantoà escolha de uma teoria de suporte à intervenção.

Que teoria(s) escolher?Quanto à abordagem das teorias, algumas são

mais focadas na explicação do comportamento,analisam os factores psicossociais associados acomportamentos de saúde ou de risco, como: aperceção de risco, motivos para a mudança, su-porte social (respondem à questão – «Porquêmudar o comportamento?»). Outras teorias cen-tram-se nos recursos e estratégias para a imple-mentação da mudança («como é que a mudançaocorre?»). É também usual a distinção entre teo-rias que conceptualizam a mudança comporta-mental em fases (por exemplo, pré-intenção, ação,manutenção - Health Action Process Approach ouHAPA28) e outras que abordam o processo de mu-dança comportamental como um contínuo autor-regulatório (e.g. control Theory29). Algumasteorias são mais abrangentes no seu conteúdo, fo-cadas no ser humano como um organismo ativo eque tende naturalmente para o crescimento e in-tegração (e.g. Teoria da Autodeterminação30); ou-tras são muito específicas para um determinadocomportamento ou para uma determinada fase doprocesso de mudança comportamental (e.g. im-plementation intentions31). existem ainda mode-los integrativos de diferentes teorias e diferentesníveis de análise do comportamento humano (e.g.Prime Theory 32). A Figura 2 ilustra os principaismodelos e teorias, bem como os seus construtosmais relevantes.

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não é objetivo do presente texto fazer uma re-visão destas teorias, ou elaborar recomendaçõesem relação aos quadros teóricos mais indicadosporque, como já foi referido, todas as teorias apre-sentam construtos que podem potencialmente serrelevantes para a mudança comportamental emanálise. Mas importa, a este respeito, informar oleitor sobre as teorias que se apresentam comomais promissoras no âmbito da modificação com-portamental em saúde, e particularmente na ges-tão do peso. neste âmbito, embora não existamestudos que comparem intervenções com diferen-tes quadros teóricos especificamente na gestão depeso, foi recentemente publicada uma meta-aná-lise de intervenções baseadas na teoria para a pro-moção de atividade física, comparando algumasdas principais teorias de mudança comportamen-tal (Teoria do comportamento Planeado, a TeoriaSócio-cognitiva, Modelo Transteórico e a Teoriade Auto-determinação)33. nesta revisão, verificou-se que as intervenções baseadas numa única teoriatinham um efeito significativamente superior doque as intervenções baseadas em construtos demúltiplas teorias e que não havia diferenças sig-nificativas nos efeitos das intervenções, consoantea teoria em que se basearam. não obstante, as in-tervenções com base na Teoria de Auto-determi-nação foram as únicas que apresentaram umefeito de magnitude moderada no comportamentode atividade física, pelo que a não-significância es-tatística na comparação entre teorias poderá estarmais associada à heterogeneidade no número deestudos e nos resultados das intervenções.

de facto, embora o número de estudos dispo-níveis para a Teoria de Auto-determinação sejaainda inferior ao de outras teorias, os seus efeitosparecem especialmente consistentes no caso daatividade física em adultos33 e os mecanismosdescritos pela teoria suportados em estudos dife-rentes e em várias áreas da saúde, incluindometa-análises34, revisões sistemáticas35 e estudoslongitudinais com análises de mediação36. O ar-tigo de Teixeira e col. neste número sintetiza osresultados de um dos maiores estudos na área dagestão do peso baseados nesta teoria37. Outros ar-tigos estão disponíveis, internacionalmente38 eem Portugal39, que ilustram como esta teoria podeser implementada nas práticas profissionais emsaúde. dada a popularidade da entrevista Moti-vacional, é também relevante a elevada proximi-dade concetual entre este método clínico depromover a motivação do utente e os princípiosda Teoria da Auto-determinação40.

O caminho da ciência da modificação comportamentalAs teorias da mudança comportamental aju-

dam-nos a compreender a complexidade desteprocesso ao fornecerem um conhecimento apro-fundado do comportamento e funcionamento hu-mano, útil para o desenvolvimento de técnicas oumétodos de intervenção apropriados. no entanto,importa salientar alguns aspetos adicionais. Oprimeiro é que o comportamento é apenas umadas variáveis que influencia os indicadores desaúde. embora nalguns casos seja essencial, há

Modelos e Teorias de Mudança Comportamental

Modelos Sócio-cogni�vos

- Autoe cácia

- Expecta�vas de resultados

- Percepção de risco

EXEMPLO: Teoria de Autoeficácia 26

Modelos Organísmicos

- Aspirações intrínsecas

- Necessidades psicológicas básicas

- Qualidade da mo�vaçãoEXEMPLO: Teoria da Autodeterminação

Modelos de Autorregulação

- Obje�vos

- Competências regulatórias

- Estratégias de controlo

EXEMPLO: Control Theory29

Modelos Integra�vos

EXEMPLOS

- Teoria PRIME32

- Modelo HAPA28

30

Figura 2Modelos e Teorias de Mudança Comportamental

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outros fatores presentes que exercem influênciasobre o nosso estado de saúde e bem-estar6.

Segundo, cada teoria de mudança comporta-mental dificilmente poderá explicar a totalidadeda variação no comportamento humano. Porexemplo, numa meta-análise da aplicação da Teo-ria do comportamento Planeado aos comporta-mentos de atividade física41 verificou-se quequando as experiências anteriores de sucesso/in-sucesso eram consideradas no modelo preditivodo comportamento, a capacidade explicativa dasprincipais variáveis preconizadas por esta teoria(e.g. atitude) diminuia significativamente.

Terceiro, na procura de técnicas que auxiliema intervenção, são por vezes selecionadas técnicasde intervenção para influenciar certos determi-nantes do comportamento sem serem testadaspreviamente, podendo assim estar a ser aplicadasinadequadamente. A análise do efeito das técni-cas nos determinantes que pretendem influenciaré uma área de investigação recente (mas prioritá-ria) da modificação comportamental em saúde(e.g. 42), que em muito beneficiará a prática.

Os resultados de revisões recentes demons-tram que embora a utilização das teorias no de-senvolvimento da intervenção para a mudançacomportamental tragam benefícios adicionais,estes efeitos são muito variados, principalmenteporque nem sempre as intervenções que utilizamuma base teórica testam os modelos completos,mas apenas os seus construtos centrais. noutroscasos, estas intervenções não têm a qualidade me-todológica necessária para testar estes efeitos (e.gamostras reduzidas)43.

em suma, existe uma variedade de determi-nantes que atuam ao nível da mudança compor-tamental. no caso da obesidade e gestão do peso,e sobretudo para compreender mudanças de

longo prazo, os determinantes individuais conti-nuam a merecer um lugar absolutamente cen-tral44. Alguns quadros teóricos que consideram osprocessos motivacionais e autorregulatórios doindivíduo como fulcrais, embora no contexto deuma multiplicidade de comportamentos, pare-cem ser especialmente promissores na sua capa-cidade explicativa da mudança comportamental.A sua transposição para a prática também pareceacessível e está presentemente a ser testada. noentanto, há ainda um longo caminho pela frentena investigação ao nível da mudança comporta-mental, principalmente na capacidade explicativadestas teorias ao nível da manutenção dos com-portamentos de saúde.

enquanto a área da modificação comporta-mental – um domínio ainda recente de estudo eintervenção – está a percorrer o seu caminho, oque pode o profissional de saúde fazer para ir ade-quando a sua prática ao mais atual conhecimentocientífico? Pode, por um lado, estar atento ao de-senvolvimento de protocolos de intervenção emmudança comportamental e aceder a manuaisbaseados no conhecimento científico. Algunsexemplos já existem e podem ser um bom pontode partida (e.g.45-47). e pode também procurarparticipar em oportunidades de formação e treinoem técnicas de aconselhamento para a mudançacomportamental, sobretudo aquelas com reco-nhecida ligação à investigação científica (isto é,«baseadas na evidência») e ligação aos quadrosteóricos de referência mais importantes. Podeprocurar incluir especialistas em mudança com-portamental nas suas equipas multidisciplinares.Finalmente, pode, de forma autodidata, procuraraumentar continuamente o seu conhecimentosobre a teoria e a prática da modificação compor-tamental. esperamos que este texto possa ter sidoum pequeno contributo nesse sentido.

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