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    SobreGrundrisseFrancisco de Oliveira

    A Boitempo Editorial presenteia os leitores de lngua por-tuguesa com uma primorosa traduo dos quase lendrios

    Grundrisse, a obra de Marx que somente veio luz na primeirametade do sculo XX, em virtude dos conflitos centrados nocontrole que o Partido Comunista da ex-URSS exerceu sobre osescritos no divulgados do filsofo de Trier, como parte da lutaideolgico-poltica pela exclusividade do verdadeiro Marx.

    Os Grundrisse foram considerados inicialmente apenas es-boos das ideias que o pensador alemo estava elaborando

    para os textos de O capital, sua obra-prima, espcie de amostraou work in progress do que viria a ser a obra central de Marx;um borrador tantas vezes retocado que poucos se atreveriam acitar. Alis, mesmo O capital experimentou tantas reformu-laes que Engels, aps a morte de Marx, encontrou enormesdificuldades para ser fiel ao pensamento do seu companheiro e

    editar os volumes que ele no pudera terminar em vida. Sabe-se que o fundador de uma das mais importantes correntes dopensamento moderno era to rigoroso consigo quanto com seusadversrios.

    Descobriu-se com o tempo que os Grundrisse so muitomais que esboos ou adiantamentos da obra maior de Marx;talvez por no sentir concludas as ideias que elaborava naocasio, excluiu das obras que publicou, e tambm daquelas squais se dedicaram Engels e Kautsky, preciosos textos que,mesmo no estando literariamente acabados, constituem pat-rimnio do marxismo e das cincias humanas de inestimvelvalor. O vigoroso terico pode ser justamente tido como um es-critor de primeira plana; ele tinha, sem muita modstia, inteira

    conscincia de seu valor literrio e, talvez por exagero e quetemperamento! , tenha deixado na obscuridade muitos textos

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    que esto nos Grundrisse. Textos como Formas que pre-cederam a produo capitalista e as consideraes sobre tra-balho produtivo e improdutivo permaneceram, pois, inacess-veis, prejudicando toda uma discusso terica e o prpriodesenvolvimento do marxismo.

    Eles esto agora com os leitores do Brasil e de outras para-gens onde reina a ltima flor do Lcio (Olavo Bilac), paranossa delcia terica e nossas elaboraes na tradio marxista.Eia, pois, tarefa!

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    Marx em seu fazerJorge Grespan

    Mais do que nunca, impossvel no comear esta ap-resentao com o j clssico finalmente o pblico brasileiro

    tem acesso a uma obra de importncia crucial...: trata-se dapublicao dos Grundrisse, indita em portugus, aguardada htanto tempo por milhares de leitores. Em uma edio completae esmerada, o trabalho de anos de traduo rigorosa est agora mo.

    Os Grundrisse constituem a verso inicial da crtica da eco-nomia poltica, planejada por Marx desde a juventude e escrita

    entre outubro de 1857 e maio de 1858. Ela seria depois muitasvezes reelaborada, at dar origem aos trs tomos de O capital.Mas que ningum se engane o fato de ser uma primeira ver-so no faz destes escritos algo simples ou de mero interesse

    histrico. Alm de entender o ponto de partida da grandeobra de maturidade de Marx, eles permitem v-la de uma per-

    spectiva especial s possvel com manuscritos desse tipo. Pois,como no pretendia ainda public-los, o autor os consideravauma etapa de seu prprio esclarecimento, concedendo-se liber-dades formais abolidas nas verses posteriores. Por exemplo, otrato com os termos da lgica de Hegel excede muito aqui omero flerte depois confessado.

    Abre-se assim a polmica sobre o carter dessa relao priv-ilegiada, se simples momento mais tarde corrigido ou se algoconstitutivo que devia ser ocultado. O emprego frequente dostermos da lgica do posto e pressuposto e as ousadas formu-laes do fetichismo do dinheiro e da particular subjetividadedo capital na oposio dialtica ao trabalho assalariado ap-resentam aqui uma fora sugestiva e explicativa prpria. s

    vezes em detalhe depois desaparecido, s vezes nas amplas

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    pinceladas que visam realar o essencial, Marx revela intenessurpreendentes na sua crtica.

    Escrevendo para si, pde explicitar e dar livre curso a ideiasmais tarde reduzidas a digresso acessria, pde tentar mltip-los caminhos e errar, em todos os sentidos da palavra. Marxaproveitou a circunstncia e deu assim aos estudiosos de suaobra a oportunidade de entend-la mais profundamente. Restaento apenas saudar a iniciativa da Boitempo Editorial e a pa-cincia dos tradutores, desejando tambm aos leitores sucessona empreitada de seu estudo.

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    SUMRIO

    Nota da edio

    Apresentao Mario Duayer

    BASTIAT E CAREY

    INTRODUO[I. PRODUO, CONSUMO, DISTRIBUIO, TROCA(CIRCULAO)]

    ELEMENTOS FUNDAMENTAIS PARA A CRTICA DA ECONOMIAPOLTICA (GRUNDRISSE)

    II. CAPTULO DO DINHEIRO

    [III. CAPTULO DO CAPITAL]PRIMEIRA SEO: O PROCESSO DE PRODUO DOCAPITALSEGUNDA SEO: O PROCESSO DE CIRCULAO DOCAPITALTERCEIRA SEO. O CAPITAL QUE GERA FRUTOS. JURO.LUCRO. (CUSTOS DE PRODUO ETC.)

    ndice onomstico

    Cronologia resumida de Marx e Engels

    Crditos

    E-books da Boitempo Editorial

    http://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/NOTA_DA_EDICAO.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/APRESENTACAO.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/APRESENTACAO.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_1.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_2.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_2.xhtml#heading_id_3http://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_2.xhtml#heading_id_3http://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_2.xhtml#heading_id_3http://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_2.xhtml#heading_id_3http://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/PARTE_2.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/PARTE_2.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_3.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_4.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_4.xhtml#heading_id_3http://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_4.xhtml#heading_id_3http://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_5.xhtml#heading_id_2http://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_5.xhtml#heading_id_2http://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_6.xhtml#heading_id_2http://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_6.xhtml#heading_id_2http://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/INDICE.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CRONOLOGIA.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CREDITOS.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/EBOOKS.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/EBOOKS.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CREDITOS.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CRONOLOGIA.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/INDICE.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_6.xhtml#heading_id_2http://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_6.xhtml#heading_id_2http://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_5.xhtml#heading_id_2http://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_5.xhtml#heading_id_2http://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_4.xhtml#heading_id_3http://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_4.xhtml#heading_id_3http://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_4.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_3.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/PARTE_2.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/PARTE_2.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_2.xhtml#heading_id_3http://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_2.xhtml#heading_id_3http://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_2.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_1.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/APRESENTACAO.xhtmlhttp://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/NOTA_DA_EDICAO.xhtml
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    NOTA DA EDIO

    Os Manuscritos econmicos de 1857-1858, ora publicados in-tegralmente e pela primeira vez em portugus, consistem emtrs textos bastante distintos entre si em natureza e dimenso. Oprimeiro, que s mais tarde Karl Marx intitularia Bastiat e

    Carey, foi escrito em um caderno datado de julho de 1857. Osegundo, contendo o que seria uma projetada Introduo suaobra de crtica economia poltica, de um caderno de cercade trinta pginas, marcado com a letra M e redigido, ao quetudo indica, nos ltimos dez dias de agosto de 1857[1]. O ter-ceiro manuscrito, de longe o mais extenso, compreende a obra

    pstuma de Marx que ficou conhecida como Esboos da crticada economia poltica, ou simplesmente Grundrisse, conforme ottulo da edio alem. Tal texto consiste em dois captulos(Captulo do dinheiro e Captulo do capital) distribudos emsete cadernos numerados de I a VII, com incio em outubro de1857 e trmino em maio de 1858[2]. O ttulo baseia-se em duasindicaes de Marx: a primeira aparece na capa do ltimo ca-derno, iniciado em fevereiro de 1858, onde se l Economiapoltica, crtica da; a segunda um comentrio feito por Marxem carta a Friedrich Engels, datada de dezembro de 1857, emque afirma: trabalho como um louco durante as noites nasntese dos meus estudos econmicos de modo que eu tenhaclaro pelo menos os esboos antes do dilvio[3]. Dessas in-

    dicaes resultou o ttulo conferido aos manuscritos em suaprimeira publicao pelo Instituto Marx-Engels-Lenin do

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    Comit Central do Partido Comunista da Unio Sovitica, em1939: Grundrisse der Kritik der politischen konomie [Esboosda crtica da economia poltica].

    Esta publicao se d no marco de um ambicioso projeto daBoitempo: o de traduzir o legado de Marx e Engels, contandocom o auxlio de especialistas renomados e sempre com basenas obras originais. No intuito de respeitar o texto tal como foiescrito, e atentando para o fato de tratar-se de um manuscrito,reproduzimos com o mximo de fidelidade possvel a sintaxedo alemo, a despeito das diferenas substantivas dos dois idio-mas nesse particular. Assim, as repeties de palavras, o uso de

    expresses pouco frequentes em textos formais e s vezes atfrases incompletas, acompanhando o fluxo de pensamento deMarx, foram respeitados. Se alterssemos essas particularidadescom o objetivo de deixar a leitura mais palatvel, estaramosdescaracterizando o original e no levando em conta que setrata de um manuscrito no preparado para publicao, e simpara o uso pessoal do autor. As palavras em destaque (itlico,sublinhado, letras em caixa alta) constam tal como no original;pontuao, sempre que possvel, tambm. H acentuado usode ponto e vrgula por Marx, mantido na maioria das vezes ealterado em rarssimos casos, apenas quando a compreensoem portugus era prejudicada.

    Os critrios editoriais seguem, no geral, os da coleo dos

    dois filsofos alemes[4], tendo sido adotadas algumas con-venes adicionais, como: palavras ou expresses entre chaves,{ }, so de Marx; entre colchetes, [ ], complemento das edit-oras brasileira e alem ou do tradutor; os nmeros entre barras,|34|, denotam incio de pgina do manuscrito, de acordocom a paginao de Marx; nmeros romanos entre barras,

    |II-1|, marcam o incio de um caderno de Marx; os nmerosentre colchetes situados na margem deste volume, [78],

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    indicam incio de pgina da edio alem (MEGA-2)[5]; palav-ras ou expresses entre < > haviam sido riscadas nomanuscrito original; uma interrupo brusca no texto apareceaqui assinalada com >; as letras sobrescritas (i, f , it), precedi-das de apstrofe, indicam que a frase toda foi escrita na lnguaindicada pela letra sobrescrita (ingls, francs ou italiano),quando apenas uma palavra seguida de letra sobrescrita, sig-nifica que apenas ela estava em idioma diferente; as notas comnumerao contnua so da edio alem; as notas com as-teriscos so do tradutor quando aparecem junto com (N. T.) eda edio brasileira quando com (N. E.).

    A publicao dos Grundrisse vem precedida de uma ap-resentao do professor da Universidade Federal FluminenseMario Duayer supervisor editorial e responsvel pelo texto fi-nal da traduo aqui apresentada , que faz uma gnese, con-textualiza a obra e a sua importncia na produo madura deMarx. Esta edio traz ainda um ndice onomstico das per-sonagens citadas pelo autor, alm da cronobiografia resumidade Marx e Engels que contm aspectos fundamentais da vidapessoal, da militncia poltica e da obra terica de ambos ,com informaes teis ao leitor, iniciado ou no na obra marxi-ana. A ilustrao de capa de Cssio Loredano e tem a gen-tileza de oferecer a Marx um conforto de que no dispunha napoca: luz eltrica.

    A Boitempo Editorial, a Editora UFRJ e o supervisor editorialagradecem aos tradutores Nlio Schneider, Alice Helga Werner(in memoriam) e Rudiger Hoffman; aos professores Francisco deOliveira e Jorge Grespan, que aceitaram com entusiasmo oconvite para escrever os textos de capa; preparadora de texto,Mariana Tavares; a Nelson e Sylvia Mielnik, do Acqua Estdio,e diagramadora Andressa Fiorio; ao capista Antonio Kehl; s

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    revisoras Alexandra Resende e Betina Leme; Fundao deAmparo Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj), quecusteou parte da rigorosa traduo que o leitor tem pela frente;e, muito especialmente, editores e supervisor manisfestam suagratido equipe editorial da Boitempo, responsvel pelaedio: Bibiana Leme, Ana Lotufo e Livia Campos. Todos fo-ram, em diferentes momentos, indispensveis publicaodesta obra que, estamos certos, estar inscrita per omnia saec-ula saeculorum na histria da nossa (e no apenas da nossa)cultura.

    Junho de 2011

    [1] Marx-Engels-Gesamtausgabe-2, Seo II/Apparat, (MEGA-2 II/Apparat)

    (Berlim, Dietz, 1981) , p. 764.[2] Ibidem, p. 775.

    [3] Idem.

    [4] Ver relao completa das obras de Marx e Engels publicadas p. 789.

    [5] MEGA a sigla de Marx-Engels-Gesamtausgabe, projeto que se dedica aeditar a obra completa de Karl Marx e Friedrich Engels, com uma abord-agem histrica e crtica. Em sua segunda fase, a MEGA planeja a pub-

    licao de 114 volumes dos dois pensadores alemes, tendo sido lanados52 at a presente data.

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    APRESENTAO

    Mario Duayer

    Os Grundrisse constituem o primeiro de uma srie demanuscritos redigidos por Karl Marx no desenvolvimento de

    sua crtica da economia poltica, que culmina na publicao dolivro I de O capital, em 1867. Na verdade, como se sabe, essacrtica tem uma primeira verso publicada em 1859 (portanto,logo em seguida redao dos Grundrisse), sob o ttulo Para acrtica da economia poltica[a] o volume inicial do primeirolivro de uma obra inicialmente projetada para seis livros. As in-

    vestigaes preparatrias dos demais terminaram por suscitar amodificao do projeto original e resultaram nos chamadosManuscritos de 1861-1863 e de 1863-1865. Na dcada e meiaque transcorre desde os primeiros estudos de economia polticaat a redao do primeiro caderno dos Grundrisse, Marx deixaregistrado em inmeros cadernos de extratos e notas o imensomaterial que testemunha o longo processo de elaborao desua crtica da economia poltica. Os Grundrisse marcam exata-mente o princpio da consolidao desse processo que assumeuma forma definitiva, ainda que parcial, somente dez anos maistarde, no livro I de O capital.

    Os estudos de economia poltica de Marx remontam dcada de 1840. O Prefcio de Para a crtica da economia

    poltica inclui uma breve descrio do itinerrio de suaspesquisas sobre o tema, situando a deciso de investigar as

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    questes econmicas nos anos 1842-1843. A necessidadedesses estudos ficou patente quando, naqueles anos, como red-ator da Rheinische Zeitung [Gazeta Renana], Marx se viu naembaraosa situao de no dominar o assunto e, portanto, nopoder intervir nos debates relativos aos chamados interessesmateriais, suscitados pelas deliberaes da Assembleia Legis-lativa renana sobre roubo de lenha e parcelamento da pro-priedade fundiria ou pelas controvrsias a respeito de livre-cambismo e protecionismo. Divergncias com os diretoresacerca da conduo da revista, segundo Marx, ofereceram-lheo ensejo para deixar a publicao, retirar-se da cena pblica e

    retomar os estudos[1]

    .A reviso crtica da filosofia do direito de Hegel, cuja in-

    troduo[b] aparece nos Deutsch-Franzsische Jahrbcher[Anais Franco-Alemes] publicados em Paris, em 1844, foi oprimeiro trabalho de Marx para esclarecer tais dvidas. Essainvestigao permite-lhe concluir que

    nem as relaes jurdicas nem as formas de Estado podem ser com-preendidas a partir de si mesmas ou do assim chamado desenvolvi-mento geral do esprito humano, tendo antes a sua origem nas con-dies materiais de vida, cujo conjunto Hegel [...] resume sob onome sociedade civil, e que a anatomia da sociedade civil deveser buscada na economia poltica.[2]

    Essa a justificativa terica para os estudos da economiaburguesa no perodo que se estende de 1843 a 1849. Em 1844,por exemplo, Marx sublinha no prefcio aos Manuscritoseconmico-filosficos que o leitor familiarizado com aEconomia Nacional perceberia com facilidade que os resulta-dos ali obtidos foram produto de uma anlise inteiramente em-prica, fundada num meticuloso estudo crtico da EconomiaNacional[3].

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    Ao longo desses anos, Marx combina a atividade cientficacom uma intensa atuao poltica. Na verdade, no se podeafirmar que realiza plenamente a inteno de retornar ao gabin-ete de estudos, tanto em razo de seu envolvimento polticoquanto das frequentes mudanas de cidade e pas, quase todasresultado de perseguio poltica. Em 1845, expulso de Paris,para onde havia se mudado dois anos antes, aps deixar aredao da Gazeta Renana. Dali transfere-se para Bruxelas,onde vive at 1848, quando deportado da Blgica. Retorna aParis e, imaginando que a revoluo de 1848 se alastraria Alemanha, regressa a Colnia. Com a vitria da contrarre-

    voluo em toda a Europa, banido da cidade alem em 1849e, finalmente, se refugia em Londres, onde vive pelo resto davida.

    Nesse perodo, mesmo em condies longe de favorveis atividade cientfica, Marx prepara, entre outros, os seguintestrabalhos (alguns dos quais em parceria com Engels): em 1843,Sobre a questo judaica e Crtica da filosofia do direito de He-

    gel; em 1844, Glosas crticas ao artigo O rei da Prssia e a re-forma social. De um prussiano, Crtica da filosofia do direitode Hegel Introduo e Manuscritos econmico-filosficos;em 1845, A sagrada famlia e as Teses sobre Feuerbach; em1846, A ideologia alem; em 1847, Misria da filosofia e Tra-balho assalariado e capital; e, em 1848, Manifesto Comunista[c].

    O imenso volume de materiais, como livros, revistas, jor-nais, relatrios oficiais e estatsticas, consultado por Marx naelaborao dessas e outras obras pode ser conhecido com de-talhamento graas ao carter sistemtico de seu mtodo de tra-balho. J em novembro de 1837, aos dezenove anos, elecomenta em uma carta ao seu pai que havia adotado o hbito

    de fazer extratos de todos os livros que leio [...] e, incidental-mente, rabiscar minhas prprias reflexes[4]. O que significa

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    dizer que os extratos redigidos por ele no curso de sua extensaatividade intelectual documentam minuciosamente os temas eautores que foram objeto de sua investigao, permitindo nos acompanhar a evoluo de seus estudos, as reas especficasde interesse que deles se desdobram, mas, sobretudo, com-preender o seu mtodo de trabalho. Por esse motivo, costuma-se dizer que examinar os Grundrisse (e, nesse sentido, os de-mais materiais inditos) como ter acesso ao laboratrio deestudos de Marx.

    Da se compreende a absoluta relevncia da IV Seo daMEGA, exclusivamente dedicada publicao dos excertos,

    anotaes e glosas de Marx e Engels. Para ter noo do volumegigantesco de material pesquisado por Marx, basta dizer quepara a IV Seo est previsto um total de 32 volumes, que, a ju-lgar pela dimenso dos dez j publicados, tero entre 700 e1.700 pginas cada. Escritos em idiomas diversos alemo,grego antigo, latim, francs, ingls, italiano, espanhol e russo ,os cadernos de extratos compreendem uma diversidade impres-sionante de disciplinas, com trechos recolhidos em livros defilosofia, arte, religio, poltica, direito, literatura, histria, eco-nomia poltica, relaes internacionais, tecnologia, matemtica,psicologia, geologia, mineralogia, agronomia, etnologia, qum-ica e fsica[5].

    Recorrendo a esses cadernos, redigidos no perodo que se

    estende de 1843 (quando Marx chega a Paris) a 1849 (data deseu exlio em Londres), possvel constatar que ali comeamseus primeiros estudos de economia poltica. Ao todo, so 27cadernos de extratos compostos ao longo desses anos e nascondies sublinhadas acima , assim discriminados:Cadernos de Paris (1843-1845, nove volumes); Cadernos de

    Bruxelas (1845, seis volumes); Cadernos de Manchester(1845, nove volumes); e trs cadernos que extratam a obra de

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    estrutura e dinmica da economia capitalista constitua igual-mente um imperativo para a luta poltica e a transformao so-cial. Em 1850, na Neue Rheinische Zeitung[Nova Gazeta Ren-ana], revista publicada em parceria com Engels, em Londres,Marx sublinhava que uma nova revoluo s possvel emconsequncia de uma nova crise [...][9].

    O resultado dessa etapa de estudos outra imensa coleode extratos, reunida nos chamados Cadernos de Londres, for-mados por 26 volumes escritos de setembro de 1850 a agostode 1853. Os cadernos I a VI (1850--1851) totalizam cerca de 600 pginas impressas e contm ex-

    tratos, entre outros, dos seguintes autores: John Stuart Mill, JohnFullarton, Tooke, Robert Torrens, Gilbart, James Taylor, Senior,Germain Garnier, William Jacob, Ricardo, Henry Carey, JohnGray, William Cobbett e John Locke. Os estudos concentram-seem questes relativas a dinheiro, crdito, sistema bancrio ecrises[10].

    O volume 8 da IV Seo da MEGA, de cerca de 750 pgi-nas, compreende os cadernos VII a X, de maro a junho de1851, que resenham textos dos seguintes pensadores da eco-nomia poltica: Ricardo, Smith, James Stuart, Thomas Malthus,John Tuckett, Thomas Chalmers, McCulloch, George Ramsay,Thomas de Quincey, entre outros. Alm disso, inclui dois ca-dernos de notas intitulados Bullion: o sistema monetrio com-

    pleto, nos quais Marx sintetiza o resultado de sua investigaosobre o assunto. Neles, anota o que seriam as passagens maisimportantes dos textos dos 91 autores examinados e tece algunscomentrios. Por isso, Marcello Musto sugere que Bullionpode ser considerado a primeira formulao autnoma dateoria do dinheiro e da circulao [de Marx][11].

    Os cadernos XI a XIV, de julho a setembro de 1851, fazemparte do volume 9 da Seo IV da MEGA, com cerca de 540

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    pginas de texto. Os autores de economia poltica estudadosnesses cadernos so, entre outros, Senior, Thomas Hopkins, Ri-cardo, Joseph Townsend, David Hume, Malthus e AdolpheDureau de La Malle. Em conexo com temas de economiapoltica, Marx resenha tambm obras sobre demografia, colon-izao, trfico de escravos e outros temas.

    Os volumes 10 e 11 da Seo IV da MEGA infelizmenteainda no foram publicados. No obstante, podemos recorrers informaes fornecidas por Musto para ter uma ideia de seucontedo. Os cadernos XV e XVI, de setembro a novembro de1851, pertencentes ao volume 10, dedicam-se histria da

    tecnologia e a questes variadas de economia poltica, re-spectivamente[12]. Os ltimos Cadernos de Londres (XVII aXXIV) so escritos entre abril e agosto de 1852, quando Marxretoma o trabalho de investigao anteriormente interrompido,entre outras razes, para redigir O 18 de brumrio de LusBonaparte[d]. O tema central desses cadernos so os vrios es-tgios do desenvolvimento da sociedade humana [...] grandeparte da pesquisa volta-se para os debates histricos sobre aIdade Mdia e a histria da literatura, da cultura e dos cos-tumes[13]. Por fim, cabe mencionar os ltimos cadernos de ex-tratos redigidos antes do incio do trabalho nos Grundrisse (desetembro de 1853 a janeiro de 1855), a saber, nove extensosvolumes sobre a histria da diplomacia e da Espanha, invest-

    igao em grande medida vinculada ao seu trabalho como cor-respondente do New York Tribune, a partir de 1851[14].

    Esses milhares de pginas de extratos documentam, port-anto, o processo de investigao de Marx, ou, em suas palav-ras, a pesquisa destinada a captar detalhadamente a matria,analisar suas vrias formas de evoluo e rastrear a sua con-

    exo ntima. S depois de concludo esse trabalho que sepode expor adequadamente o movimento do real [...][15]. T a l

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    o processo de assimilao e crtica das formas de pensamentocientficas sobre a economia burguesa do qual os Grundrisseconstituem, na verdade, a tentativa inicial de consolidao esistematizao. Na j mencionada carta a Engels de dezembrode 1857, Marx refere-se justamente aos Grundrisse ao informarque trabalho como um louco [] na sntese dos meus estudoseconmicos para ao menos ter claros os esboos antes dodilvio. Os seus estudos de economia poltica desde o inciotiveram o propsito de investigar a estrutura, a dinmica e ascontradies da economia capitalista, pois as crises da decor-rentes constituem, em sua opinio, aberturas para as prticas

    revolucionrias e transformadoras. Compreende-se, portanto,que o prognstico de uma crise econmica iminente o dil-vio forneceu a Marx estmulo para pr no papel as descober-tas de longos anos de estudos de economia poltica e dar umaprimeira forma sua crtica.

    Perplexo com o impressionante trabalho de investigao re-gistrado nos cadernos de extratos, Maximilien Rubel se per-gunta sobre essa paixo, essa mania de copiar de Marx, sobre-tudo quando se leva em conta, alm de suas inmeras ativid-ades como ativista poltico, jornalista e escritor, as condiesde vida miserveis que teve de enfrentar justamente no perodoque coincide com os anos de preparao de sua crtica da eco-nomia poltica[16]. Vivendo em extrema pobreza, permanente-

    mente sitiado por credores, cliente habitual de lojas de penhor,castigado por vrios problemas de sade e devastado pelamorte prematura de quatro de seus sete filhos decerto em vir-tude das condies materiais em que vivia a famlia , o que defato surpreende como ele foi capaz de produzir, nessas cir-cunstncias, no s um trabalho magnfico, uma das teorias

    cientficas mais importantes e influentes de todas as pocas,mas, acima de tudo, uma obra motivada por uma paixo

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    genuna pelo ser humano. Obra que, nas palavras de Marx emcarta a Ferdinand Lassalle, em novembro de 1858, era oproduto de quinze anos de pesquisa, i.e., os melhores anos deminha vida[17].

    Tendo em vista que Marx s pde completar uma parte re-lativamente pequena de um processo de pesquisa de ex-traordinria amplitude, a divulgao dos escritos no publica-dos tem enorme significado, pois d acesso a dimenses de seupensamento que de outra forma permaneceriam inacessveis.Os Grundrisse, alm dessa qualidade que compartilham com os

    demais textos inditos, tm a particularidade de ser o primeiroesboo da obra-prima O capital. Ademais, a despeito de seucarter inacabado, h intrpretes que sugerem que osGrundrisse so o nico trabalho em que a teoria do capital-ismo, da gnese ao colapso, foi delineada por Marx em suatotalidade. Pode-se dizer que constituem a nica obra completade economia poltica escrita por ele, no importa se obscura e

    desordenada[18].Outros autores tm interpretao semelhante. Admitindo

    que nos Grundrisse a teoria crtica marxiana no estava inteira-mente desenvolvida, Moishe Postone sublinha que omanuscrito exibe de maneira muito clara a orientao geral desua crtica madura da modernidade capitalista e a natureza e

    significncia das categorias fundamentais daquela crtica[19]

    .Na mesma linha, Musto argumenta que o texto, apesar de suacomplexidade, tambm muito gratificante, pois fornece o ro-teiro nico de toda a extenso do tratado de que O capitalsomente uma frao[20].

    Esta apresentao no tem o propsito de oferecer umadescrio minuciosa do manuscrito marxiano, muito menosbusca prefaci-lo com uma anlise que sancionaria uma

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    interpretao substantiva. Tendo enfatizado as circunstnciasque marcaram seu longo processo de maturao e destacado oformidvel material bibliogrfico de que se valeu Marx para re-unir condies para prepar-lo, cabe agora comentar as prin-cipais descobertas que fizeram dos Grundrisse a formulaoinicial da crtica em que, para seu autor, uma importante visodas relaes sociais exposta cientificamente pela primeiravez[21].

    As categorias descobertas por Marx no aparecem nos doistextos que abrem os Grundrisse, Bastiat e Carey eIntroduo. O primeiro, a despeito do seu interesse como

    crtica ao que Marx denomina concepes harmonicistas docapitalismo, no tem o objetivo de expor a nova teoria crtica.A Introduo, por seu lado, talvez seja um dos escritos maisdiscutidos da obra marxiana, apesar de ter sido deixado de ladopelo prprio autor, que o menciona apenas uma vez[22], e apar-entemente ignorado por Engels. O interesse que o texto atraipode ser explicado pelo fato de que, embora inacabada, a In-troduo representa um dos raros momentos em que asquestes metodolgicas so tratadas por Marx de maneiraautnoma. Entre tantos outros projetos irrealizados, ele no en-controu tempo, como pretendia, para redigir um pequeno en-saio que tornaria acessvel para o leitor comum o ncleo ra-cionaldo mtodo dialtico que Hegel descobriu, mas tambm

    mistificou[23].Ao fim do ltimo caderno do manuscrito h uma pequena

    seo intitulada Valor, que traz praticamente a mesma fraseque abre O capital: A primeira categoria em que se apresentaa riqueza burguesa a da mercadoria[24]. O que significa dizerque, ao finalizar os Grundrisse, Marx j se decidira pela forma

    de apresentao: a mercadoria como ponto de partida para aexposio do objeto a economia capitalista. Sem a

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    estruturao formal da obra definitiva, no Captulo do din-heiro o manuscrito de 1857-1858 propriamente dito inicia, aocontrrio, com uma crtica ao livro De la rforme des banques,do autor proudhoniano Alfred Darimon, publicado em 1856. Oexame de Darimon oferece a Marx a oportunidade de se ante-cipar a eventuais propostas de inspirao proudhoniana a seuver, pseudossocialistas para a crise, ou seja, o dilvio quejustamente motivara a redao dos Grundrisse. A crtica pro-posta de reforma do sistema bancrio de Darimon, da mesmaforma que s ideias de Proudhon em Misria da filosofia, pro-cura mostrar que, sob a aparncia de uma proposta socialista, o

    que existe de fato uma teoria positiva das relaes sociaispostas pelo capital. Em lugar de transformao radical da real-idade, nas obras de inspirao proudhoniana o que se tem sopropostas para reformar as estruturas existentes. Por essa razo,a crtica a Darimon se desdobra na primeira formulao dateoria do dinheiro de Marx, onde aparecem os desenvolvimen-tos ento inditos de elementos essenciais de sua anlise daforma mercadoria da riqueza na sociedade capitalista, de suateoria do valor, alm da exposio da gnese do dinheiro comoresultado necessrio do desenvolvimento da mercadoria.

    No entanto, a despeito da importncia desse primeiro es-boo da teoria do dinheiro, talvez seja possvel afirmar que oaspecto mais original e fundamental do captulo, do ponto de

    vista da crtica da economia poltica, a anlise da forma dedominao suprapessoal implicada pela mercadoria, pelo val-or, enfim, pelo carter mercantil da sociedade capitalista. Logoaps concluir sua crtica a Darimon, Marx sublinha que

    A dissoluo de todos os produtos e atividades em valores de trocapressupe a dissoluo de todas as relaes fixas (histricas) de de-

    pendncia pessoal na produo, bem como a dependncia multi-lateral dos produtores entre si. [...]

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    A dependncia recproca e multilateral dos indivduos mutuamenteindiferentes forma sua conexo social. Essa conexo social ex-pressa no valor de troca [...]; o indivduo tem de produzir umproduto universal o valor de troca, ou este ltimo por si isolado,individualizado, dinheiro. [...] o poder que cada indivduo exerce

    sobre a atividade dos outros ou sobre as riquezas sociais existenele como o proprietrio de valores de troca, de dinheiro. Seupoder social, assim como seu nexo com a sociedade, [o indivduo]traz consigo no bolso.[25]

    A articulao entre os produtores, portanto, deixa de ser op-erada por relaes de dominao e subordinao pessoais e

    passa a ser realizada pela troca. O que conecta os sujeitos agora produtores de mercadorias a sua necessidade deproduzir valor, riqueza universal, dinheiro. Em uma palavra, ossujeitos so articulados como produtores, isto , como merostrabalhadores, e nessa condio tm de produzir valor, riquezaabstrata e, por isso, crescente. Como resultado dessa forma par-

    ticular de sociabilidade determinada pela relao mercantil, ossujeitos reduzidos a trabalhadores esto subordinados dinmica incontrolada do produto de sua prpria atividade, deseu trabalho. Nessas circunstncias, como o valor a categoriadeterminante do produto do trabalho, segue-se que o sentidoda produo a quantidade, e, portanto, o seu crescimentoilimitado. Trata-se, desse modo, de uma forma de dominao

    abstrata em que o sentido do produto, o sentido da produoda riqueza, est perdido para os sujeitos.

    No cabe aqui, evidentemente, explorar em detalhe essaelaborao terica nos Grundrisse, quase perdida em meio anlise das determinaes do dinheiro, suas funes como me-dida de valor, meio de circulao etc., sem mencionar uma

    descrio minuciosa dos metais preciosos como portadores darelao monetria. No entanto, preciso dar-lhe o devido

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    destaque, pois essa concepo de vida social estranhada e dedominao abstrata central para a dimenso crtica dopensamento marxiano. So essas relaes sociais de produoque, em razo da dominao abstrata que pressupem e de suatendncia reproduo contnua e ampliada, desqualificam aspropostas de reforma, conferem sentido teoria que informa asaes por sua transformao radical e inspiram as lutas pelaemancipao dessas estruturas sociais de dominao auto-produzidas. Dispensvel dizer que esse tema aparece em diver-sos momentos de O capital, como na seo sobre o carterfetichista da mercadoria e nas consideraes sobre a maquin-

    aria, que, na qualidade de elemento do capital, em lugar de ob-jetivao da produtividade do trabalho social se apresentacomo poder externo que submete o trabalhador e suga trabalhovivo.

    O Captulo do capital, o mais extenso do manuscrito, trazpela primeira vez, embora ainda de maneira lacunar e poucosistemtica, as categorias fundamentais da crtica da economiapoltica marxiana, tais como mais-valor ( diferena de suasformas derivadas), fora de trabalho (ou capacidade de tra-balho) como mercadoria [...], trabalho necessrio e mais-trabalho, mais-valor absoluto e relativo, capital constante e var-ivel [...][26].

    Produo capitalista, sendo produo de valor, tem neces-

    sariamente de ser produo de mais-valor. Mais-valor, por suavez, subentende um processo por meio do qual um dos en-volvidos no processo de produo no caso, o trabalhador produz mais valor do que recebe sob a forma de salrio. Porconseguinte, a determinao da produo capitalista comoproduo de valor pressupe a explorao do trabalhador,

    descoberta por Marx, e uma srie de outras categorias funda-mentais da economia capitalista: duplo carter do trabalho,

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    processo de trabalho e processo de valorizao etc. O mais-val-or, contudo, alm de desvendar o mecanismo de acumulaode capital, isto , a expropriao do trabalhador, expressa umprocesso ainda mais fundamental: mais do que significar a ex-plorao do trabalho, como de fato o faz, o mais-valor repres-enta a objetivao, estranhada dos sujeitos, do potencial quepossui o trabalho (social) de reproduzir de forma ampliada assuas condies antecedentes.

    Pode-se compreender melhor o mais-valor como expressodo estranhamento da produtividade do trabalho social quandose leva em conta que o trabalho, como categoria especifica-

    mente humana, diferencia o metabolismo da espcie humanacom a natureza. Nos outros animais esse metabolismo sempreuma adaptao passiva, geneticamente determinada, smudanas das condies do ambiente, ao passo que no ser hu-mano o metabolismo caracteriza-se por uma adaptao ativa,metabolismo por meio do qual, pelo trabalho, o ser humanocria as condies materiais de sua prpria reproduo. Em vir-tude dessa constituio interna do trabalho, a situao tpica noser humano a reproduo ampliada[27]. O mais-valor, nessesentido, expresso historicamente especfica dessa capacid-ade, dessa potncia humana, autonomizada em relao aosseres humanos reduzidos a meros trabalhadores, potncia quedeveio riqueza que opera como um sujeito automtico sob a

    forma de capital. Riqueza sempre crescente e crescentementeestranhada.

    O capital, riqueza autonomizada dos sujeitos, o que Marxdenomina contradio em processo em uma das passagensmais brilhantes e, ao mesmo tempo, esclarecedoras de sua crt-ica da relao social do capital. Por essa razo, citamos nesta

    apresentao tal fragmento dos Grundrisse, que sintetiza tobem o esprito da obra marxiana:

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    A troca de trabalho vivo por trabalho objetivado, i.e., o pr do tra-balho social na forma de oposio entre capital e trabalho assalari-ado, o ltimo desenvolvimento da relao de valor e daproduo baseada no valor. O seu pressuposto e continua sendoa massa do tempo de trabalho imediato, o quantum de trabalho

    empregado como o fator decisivo da produo da riqueza. No ent-anto, medida que a grande indstria se desenvolve, a criao dariqueza efetiva passa a depender menos do tempo de trabalho e doquantum de trabalho empregado que do poder dos agentes postosem movimento durante o tempo de trabalho, poder que sua |po-derosa efetividadei , por sua vez, no tem nenhuma relao como tempo de trabalho imediato que custa sua produo, mas quedepende, ao contrrio, do nvel geral da cincia e do progresso datecnologia [...]. A riqueza efetiva se manifesta antes [...] na tre-menda desproporo entre o tempo de trabalho empregado e seuproduto, bem como na desproporo qualitativa entre o trabalhoreduzido pura abstrao e o poder do processo de produo queele supervisiona. O trabalho no aparece mais to envolvido no

    processo de produo quando o ser humano se relaciona ao pro-cesso de produo muito mais como supervisor e regulador. [...]No mais o trabalhador que interpe um objeto natural modific-ado como elo mediador entre o objeto e si mesmo [...]. Ele secoloca ao lado do processo de produo, em lugar de ser o seuagente principal. Nessa transformao, o que aparece como agrande coluna de sustentao da produo e da riqueza no nem

    o trabalho imediato que o prprio ser humano executa nem otempo que ele trabalha, mas a apropriao de sua prpria foraprodutiva geral, sua compreenso e seu domnio da natureza porsua existncia como corpo social em suma, o desenvolvimentodo indivduo social. O roubo de tempo de trabalho alheio, sobre oqual a riqueza atual se baseia, aparece como fundamento miser-vel em comparao com esse novo fundamento desenvolvido,criado por meio da prpria grande indstria. To logo o trabalho

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    na sua forma imediata deixa de ser a grande fonte da riqueza, otempo de trabalho deixa, e tem de deixar, de ser a sua medida e,em consequncia, o valor de troca deixa de ser [a medida] do val-or de uso. O trabalho excedente da massa deixa de ser condiopara o desenvolvimento da riqueza geral, assim como o no tra-

    balho dos poucos deixa de ser condio do desenvolvimento dasforas gerais do crebro humano. Com isso, desmorona aproduo baseada no valor de troca, e o prprio processo deproduo material imediato despido da forma da precariedade econtradio. [D-se] o livre desenvolvimento das individualidadese, em consequncia, a reduo do tempo de trabalho necessriono para pr trabalho excedente, mas para a reduo do trabalhonecessrio da sociedade como um todo a um mnimo, que corres-ponde ento formao artstica, cientfica etc. dos indivduos pormeio do tempo liberado e dos meios criados para todos eles. Oprprio capital a contradio em processo, [pelo fato] de queprocura reduzir o tempo de trabalho a um mnimo, ao mesmotempo que, por outro lado, pe o tempo de trabalho como nica

    medida e fonte da riqueza. Por essa razo, ele diminui o tempo detrabalho na forma do trabalho necessrio para aument-lo naforma do suprfluo; por isso, pe em medida crescente o trabalhosuprfluo como condio |questo de vida e mortef do ne-cessrio. Por um lado, portanto, ele traz vida todas as foras dacincia e da natureza, bem como da combinao social e do inter-cmbio social, para tornar a criao da riqueza (relativamente) in-

    dependente do tempo de trabalho nela empregado. Por outro lado,ele quer medir essas gigantescas foras sociais assim criadas pelotempo de trabalho e encerr-las nos limites requeridos para conser-var o valor j criado como valor. As foras produtivas e as relaessociais ambas aspectos diferentes do desenvolvimento do indiv-duo social aparecem somente como meios para o capital, e paraele so exclusivamente meios para poder produzir a partir de seu

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    fundamento acanhado. |De fatoi, porm, elas constituem as con-dies materiais para faz-lo voar pelos ares.[28]

    Para finalizar, algumas consideraes sobre a traduo.Como os Grundrisse so um esboo, um texto de trabalho, sem

    o polimento estilstico do prprio autor, a orientao geralseguida foi interferir o mnimo possvel no original, evitandotoda parfrase. Com isso, acreditamos que os leitores destatraduo certamente podero perceber o carter inacabado dotexto e, tanto quanto isso possvel em uma traduo, teroacesso ao original livre de interpretaes. Pelo mesmo motivo,ao contrrio de outras tradues, optamos por no atenuar cer-tas expresses utilizadas por Marx, talvez em momentos degrande irritao com as tolices que submetia crtica, as quaispoderiam ser consideradas grosseiras ou obscenas. Afinal, trata-se de um texto que o autor no destinava publicao e que,por isso, expressa seu estado de esprito.

    Em determinados momentos, o emprego de neologismos

    mostrou-se inevitvel. Nesses casos, procuramos observar osusos correntes na literatura marxista em portugus. A nica eimportante exceo refere-se categoria Mehrwert, que tradi-cionalmente vem sendo traduzida como mais-valia. Em nossaopinio, impossvel justificar tal traduo, seja em termos lit-erais ou tericos. Literalmente, Mehrwert significa mais-val-

    or. Poderia tambm ser traduzida como valor adicionado ouvalor excedente. Uma vez que no traduo literal deMehrwert, o uso de mais-valia teria de ser justificado teor-icamente. Essa tarefa impossvel, pois, como valia nada sig-nifica nesse contexto, no h como justificar mais-valia doponto de vista terico pela simples anteposio do advrbio.Ademais, alm de ser uma traduo ilcita, a expresso mais-

    valia converte uma categoria de simples compreenso em algoenigmtico, quase uma coisa. Produo capitalista, como se

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    [b] Karl Marx, Crtica da filosofia do direito de Hegel Introduo, emCrtica da filosofia do direito de Hegel(So Paulo, Boitempo, 2005). (N. E.)

    [2] Karl Marx, Prefcio, Para a crtica da economia poltica, cit., 4.

    [3] Karl Marx, [Prefcio (do Caderno III)], Manuscritos econmico-filosfi-cos (So Paulo, Boitempo, 2004), p. 19.

    [c] Karl Marx, Sobre a questo judaica (So Paulo, Boitempo, 2010); KarlMarx, Crtica da filosofia do direito de Hegel Introduo, em Crtica dafilosofia do direito de Hegel, cit.; Karl Marx, Glosas crticas ao artigo Orei da Prssia e a reforma social. De um prussiano, em Lutas de classes na

    Alemanha (So Paulo, Boitempo, 2010); Karl Marx, Manuscritoseconmico-filosficos, cit.; Karl Marx e Friedrich Engels,A sagrada famlia(So Paulo, Boitempo, 2003); Karl Marx, AdFeuerbach, em Karl Marx eFriedrich Engels,A ideologia alem (So Paulo, Boitempo, 2007); Karl

    Marx, Misria da filosofia (So Paulo, Expresso Popular, 2009); Karl Marx,Trabalho assalariado e capital & Salrio, preo e lucro (So Paulo, ExpressoPopular, 2006); Karl Marx, Manifesto Comunista (So Paulo, Boitempo,1998). (N. E.)

    [4] Karl Marx, Marx-Engels Collected Works (MECW), v. 1, 1835-1843(Nova York, International Publishers, 1975), p. 11.

    [5]Marcello Musto, The formation of Marxs critique of political economy:from the studies of 1843 to the Grundrisse, Socialism and Democracy, v.

    24, n. 2, jul. 2010, p. 70, nota. 11.[6] Ibidem, p. 99.

    [7] MEGA-2, IV/2 a 7.

    [8] Karl Marx, Prefcio, Para a crtica da economia poltica, cit., 7.

    [9] MECW, v. 10, 1849-1851 (Nova York, International Publishers, 1978),p. 135.

    [10] MEGA-2 IV/7.

    [11] Marcello Musto, The formation of Marxs critique of political eco-nomy, cit., p. 82.

    [12] Ibidem, p. 85.

    [d] So Paulo, Boitempo, 2011. (N. E.)

    [13] Marcello Musto, The formation of Marxs critique of political eco-nomy, cit., p. 87.

    [14] MEGA IV/12.

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    [15] Karl Marx, Prefcio segunda edio alem, em O capital(SoPaulo, Nova Cultural, 1996).

    [16] Maximilien Rubel, Les cahiers dtude de Marx, International Reviewof Social History, v. 2, n. 3, 1957, p. 392-420.

    [17] MECW, v. 40, 1856-1859 (Nova York, International Publishers, 1983),

    p. 353-5.[18]Martin Nicolaus, The unknown Marx, New Left Review, n. 48, v. I,mar.-abr. 1968, p. 43.

    [19] Moishe Postone, Rethinking Capitalin light of the Grundrisse, emMarcello Musto (org.), Karl Marxs Grundrisse: foundations of the critique of

    political economy 150 years later(Londres/Nova York, Routledge, 2008), p.120-37.

    [20] Idem, Foreword, em ibidem, p. xxiii.

    [21] Nessa carta a Lassalle, acima citada, Marx declara que j detm o ma-terial para preparar o manuscrito, sendo o atraso devido sua preocupaocom a forma. Pode-se assumir, portanto, que a essa altura ele considerava oprocesso de investigao substancialmente completo. Com relao formade exposio, essa carta mostra que o seu otimismo no importa se porrazes muito diversas era infundado. MECW, v. 40, cit., p. 354.

    [22] Karl Marx, Prefcio, Para a crtica da economia poltica, cit., 3.

    [23]Carta de Marx para Engels, janeiro de 1858. MECW, v. 40, cit., p. 248.[24]Grundrisse, p. 758 desta edio.

    [25]Grundrisse, p. 102-3 desta edio.

    [26] MEGA-2 II/Apparat, p. 776.

    [27] G. Lukcs, Zur Ontologie des gesellschaftlichen Seins (Darmstadt,Luchterhand, 1986), p. 10 [ed. bras.: Para uma ontologia do ser social, SoPaulo, Boitempo, no prelo].

    [28]Grundrisse, p. 589-91 desta edio.

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    MANUSCRITOS

    ECONMICOSDE 1857-1858

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    Bastiat e Carey

    Bastiat.Harmonies conomiques.

    2. ed. Paris, 1851.

    Prlogof

    A histria da economia poltica moderna termina, com Ri-

    cardo e Sismondi polos antitticos em que um fala inglse o outro, francs , exatamente como comea no final dosculo XVII, com Petty e Boisguillebert. A literaturapoltico-econmica posterior se perde seja em compndioseclticos, sincrticos, como a obra de J. St. Mill, seja naelaborao aprofundada de reas particulares, comoA his-tory of prices[Uma histria dos preos], de Tooke[1], e, emgeral, os escritos ingleses mais recentes sobre a circulao a nica rea em que foram feitas descobertas efetivamentenovas, pois a literatura sobre a colonizao, a propriedadefundiria (em suas diferentes formas), a populao etc. sse distingue da mais a ntiga pela maior riqueza de material, seja na reproduo de antigas controvrsias econmicas

    para um pblico mais amplo e na resoluo prtica deproblemas cotidianos, como os escritos sobre o |livrecomrcioie protecionismoi, seja, por fim, em elucubraestendenciosas sobre as orientaes clssicas, uma relaoem que esto, por exemplo, de Chalmers a Malthus e deGlich a Sismondi, e, em certo aspecto, de McCulloch eSenior, em suas primeiras obras, a Ricardo. Trata-se de

    uma literatura totalmente de epgonos, de reproduo, demaior refinamento da forma, de apropriao mais extensa

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    do material, de nfase, de popularizao, de sntese, deelaborao dos detalhes, sem fases de desenvolvimento de-cisivas e distintivas; por um lado, registro inventrio, poroutro, crescimento do detalhe.

    As nicas excees, aparentemente, so os escritos deCarey, o ianque, e de Bastiat, ofrancs, mas o ltimo ad-mite que se baseia no primeiro[2]. Ambos compreendemque a oposio economia poltica socialismo e comun-ismo tem seu pressuposto terico nas obras da prpriaEconomia clssica, especialmente em Ricardo, que tem deser considerado sua expresso ltima e mais perfeita. Por

    essa razo, ambos consideram necessrio atacar, comoequvoco, a expresso terica que a sociedade burguesaganhou historicamente na Economia moderna, e provar aharmonia das relaes de produo ali onde os economis-tas clssicos ingenuamente retratavam seu antagonismo. Oambiente nacional a partir do qual ambos escrevem, apesarde totalmente diferente, inclusive contraditrio, impele-os

    aos mesmos esforos. Carey o nico economista originaldentre os norte-americanos. Pertence a um pas em que asociedade burguesa no se desenvolveu sobre a base dofeudalismo, mas comeou a partir de si mesma; em que asociedade burguesa no aparece como o resultado reman-escente de um movimento secular, mas como o ponto departida de um novo movimento; em que o Estado, em con-traste com todas as formaes nacionais anteriores, desde oincio esteve subordinado sociedade burguesa e suaproduo e jamais pde ter a pretenso de ser um fim emsi mesmo; enfim, em um pas em que a prpria sociedadeburguesa, combinando as foras produtivas de um velhomundo com o imenso terreno natural de um novo,

    desenvolveu-se em dimenses e liberdade de movimentoat ento desconhecidas e suplantou em muito todo

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    trabalho anterior no domnio das foras naturais; e onde,enfim, os antagonismos da prpria sociedade burguesaaparecem unicamente como momentos evanescentes. Oque poderia ser mais natural do que as relaes deproduo nas quais esse imenso novo mundo se desen-volveu de maneira to rpida, to surpreendente e afortu-nada serem consideradas, por Carey, como as relaes nor-mais e eternas da produo e do intercmbio sociais, re-laes que, na Europa, em especial na Inglaterra, que paraele na verdade a Europa, eram simplesmente inibidas eprejudicadas pelas barreiras herdadas do perodo feudal, o

    que poderia ser mais natural que tais relaes s lhe pare-cessem vistas, reproduzidas ou generalizadas de maneiradistorcida ou falsificada pelos economistas ingleses porqueeles confundiam as distores contingentes daquelas re-laes com seu carter imanente? Relaes americanas con-tra relaes inglesas: a isso se reduz sua crtica da teoriainglesa da propriedade fundiria, do salrio, da popu-

    lao, dos antagonismos de classes etc. Na Inglaterra, a so-ciedade burguesa no existe de forma pura, correspond-ente ao seu conceito, adequada a si mesma. Como os con-ceitos dos economistas ingleses da sociedade burguesa po-deriam ser a expresso verdadeira e cristalina de uma real-idade que eles no conheciam? Para Carey, o efeito per-turbador de influncias tradicionais sobre as relaes nat-urais da sociedade burguesa, influncias que no emer-giam de seu prprio seio, reduz-se em ltima instncia influncia do Estado sobre a sociedade burguesa, a suas in-tervenes e ingerncias. O salrio, por exemplo, crescenaturalmente com a produtividade do trabalho. Seachamos que a realidade no corresponde a essa lei, temos

    unicamente de abstrair a influncia do governo, impostos,monoplios etc., seja no Hindusto, seja na Inglaterra. As

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    relaes burguesas consideradas em si mesmas,i.e., aps adeduo das influncias do Estado, sempre confirmaro defato as leis harmnicas da economia burguesa. Natural-mente, Carey no investiga em que medida essas prpriasinfluncias estatais, |dvida pblica, impostosietc., tm ori-gem nas relaes burguesas e, por conseguinte, naInglaterra, por exemplo, de modo algum aparecem comoresultados do feudalismo, mas de sua dissoluo e super-ao, e na prpria Amrica do Norte cresce o poder dogoverno central com a centralizao do capital. Dessemodo, enquanto Carey confronta os economistas ingleses

    com a maior potncia da sociedade burguesa na Amricado Norte, Bastiat confronta os socialistas franceses com amenor potncia da sociedade burguesa na Frana. Vocscreem que se revoltam contra as leis da sociedadeburguesa em um pas em que jamais se permitiu que essasleis se realizassem! Vocs as conhecem unicamente na atro-fiada forma francesa, e consideram sua forma imanente o

    que somente sua deformao nacional francesa. Vejam aInglaterra. Aqui em nosso pas preciso libertar a so-ciedade burguesa dos grilhes que lhe ps o Estado. Vocsdesejam multiplicar esses grilhes. Primeiro desenvolvamas relaes burguesas em sua forma pura e depois po-demos conversar novamente. (Nesse caso Bastiat temrazo, uma vez que na Frana, em virtude de sua configur-ao social peculiar, muito do que passa por socialismo ,na Inglaterra, economia poltica.)

    Carey, cujo ponto de partida a emancipao da so-ciedade burguesa do Estado na Amrica do Norte, ter-mina, entretanto, com o postulado da interveno doEstado para que o desenvolvimento puro das relaes

    burguesas, como de fato ocorreu na Amrica do Norte, noseja perturbado por influncias exteriores. Ele

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    protecionista, ao passo que Bastiat livre-cambista. A har-monia das leis econmicas aparece em todo o mundo comodesarmonia, e os primeiros indcios dessa desarmonia sur-preendem Carey inclusive nos Estados Unidos. De ondevem esse estranho fenmeno? Carey o explica a partir dainfluncia destrutiva da Inglaterra sobre o mercado mun-dial com sua ambio ao monoplio industrial. Original-mente, as relaes inglesas foram distorcidas no interior dopas pelas falsas teorias de seus economistas. Atualmente,como poder dominante do mercado mundial, a Inglaterradistorce a harmonia das relaes econmicas em todos os

    pases do mundo. Essa uma desarmonia real, de maneiranenhuma baseada meramente na concepo subjetiva doseconomistas. O que a Rssia politicamente para Ur-quhart, a Inglaterra economicamente para Carey. A har-monia das relaes econmicas, para Carey, baseia-se nacooperao harmnica de cidade e campo, de indstria eagricultura. Essa harmonia fundamental, que a Inglaterra

    dissolveu em seu interior, ela destri por meio de sua con-corrncia no mercado mundial e, assim, o elementodestrutivo da harmonia universal. S as proteesaduaneiras o bloqueio nacional fora podem con-stituir uma defesa contra a fora destrutiva da grande in-dstria inglesa. Consequentemente, o ltimo refgio das|harmonias econmicasf o Estado, que antes fora estig-matizado como o nico perturbador dessas harmonias. Deum lado, Carey expressa aqui outra vez o desenvolvi-mento nacional particular dos Estados Unidos, suaoposio e concorrncia com a Inglaterra. E o faz de formaingnua, recomendando aos Estados Unidos destruir o in-dustrialismo propagado pela Inglaterra desenvolvendo-se

    mais rpido por meio de protees aduaneiras. Abstraindodessa ingenuidade, com Carey a harmonia das relaes de

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    produo burguesas termina com a mais completa desar-monia dessas relaes ali onde se apresentam no terrenomais grandioso, o mercado mundial, no desenvolvimentomais grandioso de relaes entre naes produtoras. Todasas relaes que lhe parecem harmnicas no interior de de-terminadas fronteiras nacionais ou, inclusive, na forma ab-strata de relaes universais da sociedade burguesa con-centrao do capital, diviso do trabalho, assalariado etc. ,parecem-lhe desarmnicas ali onde se apresentam em suaforma mais desenvolvida em sua forma de mercadomundial , como as formas internas que produzem o

    domnio da Inglaterra sobre o mercado mundial e que,como efeitos destrutivos, so a consequncia dessedomnio. harmnico quando, no interior de um pas, aproduo patriarcal d lugar produo industrial, e oprocesso de dissoluo que acompanha esse desenvolvi-mento apreendido exclusivamente por seu aspecto posit-ivo. Mas se torna desarmnico quando a grande indstria

    inglesa dissolve a produo nacional estrangeira patriarcal,pequeno-burguesa ou outras formas que se encontrem emestgios inferiores. Para ele, a concentrao do capital nointerior de um pas e o efeito dissolvente dessa con-centrao s tm aspectos positivos. Mas desarmnico omonoplio do capital concentrado ingls com seus efeitosdissolventes sobre os pequenos capitais nacionais de out-ros povos. O que Carey no compreendeu que essas de-sarmonias do mercado mundial so unicamente as ex-presses adequadas ltimas das desarmonias que [so] fix-adas nas categorias econmicas como relaes fixas ou quetm uma existncia local em menor escala. No surpreendeque, por outro lado, ele esquea o contedo positivo desses

    processos de dissoluo o nico aspecto que examina dascategorias econmicas em sua forma abstrata ou das

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    relaes reais no interior de determinados pases, das quaisas categorias so abstradas em sua manifestao plenano mercado mundial. Por isso, onde as relaes econm-icas se apresentam a ele em sua verdade,i.e., em sua real-idade universal, Carey passa de seu otimismo por princ-pio para um pessimismo exasperado e denunciante. Essacontradio constitui a originalidade de seus escritos e lhesconfere seu significado. Ele [norte-]americano tanto emsua afirmao da harmonia no interior da sociedadeburguesa quanto na afirmao da desarmonia das mesmasrelaes em sua configurao de mercado mundial. Em

    Bastiat, no h nada disso. A harmonia dessas relaes um alm que comea justamente ali onde terminam asfronteiras francesas, um alm que existe na Inglaterra e naAmrica [do Norte]. simplesmente a forma ideal, ima-ginria, das relaes anglo-americanas no francesas, e noa forma real que o confronta em seu prprio territrio.Portanto, como em Bastiat a harmonia no resulta de modo

    algum da riqueza da experincia vivida, mas antes oproduto afetado de uma reflexo frgil, ligeira e contra-ditria, o nico momento de realidade nele a exignciade que o Estado francs renuncie a suas fronteiras econm-icas. Carey v as contradies das relaes econmicas tologo elas aparecem como relaes inglesas no mercadomundial. Bastiat, que simplesmente imagina a harmonia,s comea a ver a sua realizao ali onde termina a Franae onde concorrem entre si, liberadas da superviso doEstado, todas as partes constitutivas da sociedadeburguesa nacionalmente separadas. No entanto, inclusiveessa sua ltima harmonia e o pressuposto de todas assuas harmonias imaginrias anteriores um simples pos-

    tulado, que deve ser realizado pela legislao de livrecomrcio.

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    Por essa razo, se Carey, independentemente do valorcientfico de suas investigaes, ao menos possui o mritode expressar em forma abstrata as grandes relaes amer-icanas e, inclusive, em oposio ao velho mundo, o nicopano de fundo real em Bastiat seria a pequenez das re-laes francesas, que, por todo lado, metem o nariz emsuas harmonias. Todavia, o mrito suprfluo, pois as re-laes de um pas to antigo so suficientemente conheci-das e o que menos precisam de tal desvio negativo paraserem conhecidas. Em consequncia, Carey rico empesquisas, por assim dizer,bona fide[a] na cincia econm-

    ica, como as pesquisas sobre crdito, renda etc. Bastiat seocupa unicamente com parfrases gratificantes depesquisas inconclusivas: |a hipocrisia do contentamentof.A universalidade de Carey a universalidade ianque. Paraele, Frana e China esto igualmente prximas. Ele sempre o homem que vive tanto no litoral do oceanoPacfico como no do Atlntico. A universalidade de Bastiat

    fazer vista grossa para todos os pases. Como genunoianque, Carey absorve de todos os lados o abundante ma-terial que o velho mundo lhe oferece, no para identificar aalma imanente desse material e, desse modo, reconhecer-lhe o direito da vida particular, mas para elabor-lo comoevidncias mortas, como material indiferente para seuspropsitos, para suas proposies abstradas desde seuponto de vista ianque. Da seu perambular por todos ospases, sua estatstica massiva e acrtica, sua erudio decatlogo. Bastiat oferece, ao contrrio, uma histriafantstica, com abstraes ora na forma de raciocnio, orana forma de presumidos acontecimentos que, todavia, noocorreram nunca em lugar nenhum, da mesma forma que

    o telogo trata o pecado ora como lei da essncia humana,ora como a histria do pecado original. Por conseguinte,

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    ambos so igualmente anistricos e anti-histricos. No ent-anto, o momento anistrico de Carey o princpiohistrico atual da Amrica do Norte, ao passo que o ele-mento anistrico em Bastiat mera reminiscncia da modafrancesa de generalizao do sculo XVIII. Carey, portanto, informe e difuso, Bastiat, afetado e lgico do ponto devista formal. O mximo que consegue Bastiat so lugares-comuns expressos de maneira paradoxal, polidos |em fa-cetasf. Em Carey, algumas teses gerais so antecipadas emforma axiomtica. Elas vm seguidas de um material in-forme, a compilao como prova a matria de suas teses

    no de modo nenhum elaborada. Em Bastiat, o nico ma-terial abstraindo de alguns exemplos locais ou de fen-menos ingleses normais dispostos de maneira fantstica consiste s das teses gerais dos economistas. A principalanttese de Carey Ricardo, em sntese, os modernos eco-nomistas ingleses; a de Bastiat, os socialistas franceses[3].

    XIV) |Dos salriosf

    As principais teses de Bastiat so as seguintes[4]: todos oshomens aspiram a uma fixidez no rendimento, a uma|renda fixaf. {Autntico exemplo francs: 1) Todo homemquer ser funcionrio pblicooufazer de seu filho um fun-

    cionrio pblico. (Ver p. 371[b]

    .)} O salrio uma formafixa de remunerao (p. 376) e, portanto, uma forma muitoaperfeioada de associao, em cuja forma originria pre-domina o aleatrio[5], porquanto |todos os associadosfesto sujeitos |a todos os riscos do empreendimentof[6].{Se o capital assume o risco por conta prpria, a remuner-ao do trabalho se fixa sob o nome de salriof. Se o tra-

    balho deseja assumir para si as boas e ms consequncias,a remunerao do capital se destaca e se fixa sob o nome

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    de juros (p. 382).} (Sobre essa associao, ver ainda p.382-3.) Todavia, se originalmente predomina o aleatrio na|condio do trabalhadorf, a estabilidade no assalariadoainda no est suficientemente assegurada. um |degrauintermedirio que separa o aleatrio da estabilidadef[7].Esse ltimo nvel alcanado mediante |a poupana, nosdias de trabalho, do que satisfaz s necessidades dos diasde velhice e de doenaf (p. 388). O ltimo nveldesenvolve-se por meio das |sociedades mtuas de se-gurof (idem) e, emltima instncia, pelo |fundo de pensodos trabalhadoresf[8] (p. 393). (Da mesma forma que o ser

    humano partiu da necessidade de se converter em fun-cionrio pblico, ele termina com a satisfao de receberuma penso.)

    Ad. 1. Suponha que tudo o que Bastiat diz sobre a fix-idez do salrio seja correto. O fato de que o salrio sejasubsumido s |rendas fixasi no nos permite conhecer overdadeiro carter do salrio, sua determinao caracter-

    stica. Seria destacada uma das relaes do salrio re-lao que ele tem em comum com outras fontes de renda.Nada mais. Certamente, isso j seria algo para o advogadoque pretende defender as vantagens do salariado. En-tretanto, no seria nada para o economista que deseja com-preender a peculiaridade dessa relao em toda a sua ex-tenso. Fixar uma determinao unilateral de uma relao,de uma forma econmica, e panegiriz-la em comparaocom a determinao inversa: essa prtica ordinria de ad-vogado e apologista caracteriza o raciocinantef Bastiat.Portanto, em lugar de salrio, suponha: fixidez do rendi-mento. No boa a fixidez do rendimento? Todo mundono adora poder contar com o seguro? Especialmente todo

    francs pequeno-burgus e mesquinho? |

    O homem semprenecessitadof? A servido foi defendida do mesmo modo, e

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    talvez com mais razo. O oposto poderia ser tambm afir-mado, e tem sido afirmado. Suponha o salrio igual nofixidez, i.e., avano para alm de certo ponto. Quem noprefere avanar em lugar de ficar parado? Pode-se dizerque m, portanto, uma relao que torna possvel umprogressus in infinitum burgus? Naturalmente, o prprioBastiat em outro lugar considera o salrio como no fix-idez. De que outra maneira, seno pela no fixidez, pelaflutuao, poderia ser possvel ao trabalhador deixar detrabalhar, tornar-se capitalista, como deseja Bastiat[9]? Porconseguinte, o salariado bom porque fixidez; ele bom

    porque no fixidez; bom porque no nem uma coisanem outra, mas tanto uma quanto a outra. Que relaono boa quando reduzida a uma determinao unilater-al, e esta ltima considerada como posio, no comonegao? Todo palavrrio raciocinante, toda apologtica,toda sofistaria pequeno-burguesa repousa sobre talabstrao.

    Depois desse comentrio preliminar geral, chegamos verdadeira construo de Bastiat. Seja dito ainda, de pas-sagem, que seu arrendatriof de Landes[10], o tipo querene em sua pessoa a infelicidade do trabalhador assalari-ado com o azar do pequeno capitalista, de fato poderia sesentir feliz se recebesse salrio fixo. A |histria descritivae filosficafde Proudhon[11] dificilmente chega ao nvel dade seu adversrio Bastiat. forma originria de asso-ciao, em que todos os associadosf compartem os riscosdo acaso, segue-se a forma em que a remunerao do tra-balhador fixada, associao de nvel superior e voluntari-amente integrada por ambas as partes. No desejamoschamar a ateno aqui para a genialidade que primeiro

    pressupe, de um lado, um capitalista e, de outro, um

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    trabalhador, para em seguida fazer surgir do acordo entreambos a relao entre capital e trabalho assalariado.

    A forma de associao em que o trabalhador est ex-posto a todos os riscos do negcio em que todos osprodutores esto igualmente expostos a tais riscos e queimediatamente precede o salrio, em que a remuneraodo trabalho ganha fixidez e torna-se estvel, da mesmaforma que a tese precede a anttese o estado, comoouvimos de Bastiat[12], em que a pesca, a caa e o pastoreioconstituem as formas sociais e produtivas dominantes.Primeiro, o pescador, o caador e o pastor nmades e, em

    seguida, o trabalhador assalariado. Onde e quando se deuessa transio histrica do estado semisselvagem para omoderno? No mximo, nocharivari. Na histria efetiva, otrabalho assalariado resulta da dissoluo da escravido eda servido ou do declnio da propriedade comunal,como se deu entre povos orientais e eslavos e, em suaforma adequada que faz poca, forma que abarca toda a

    existncia social do trabalho, procede da destruio da eco-nomia das corporaes, do sistema estamental, do trabalhonatural e da renda em espcie, da indstria operandocomo atividade rural acessria, da pequena economia ruralainda de carter feudal etc. Em todas essas transieshistricas efetivas o trabalho assalariado aparece como dis-soluo, como destruio de relaes em que o trabalho erafixado em todos os aspectos, em seu rendimento, seu con-tedo, sua localizao, sua extenso etc.Portanto, como neg-ao da fixidez do trabalho e de sua remunerao. A transiodireta do fetiche do africano ao |ser supremofde Voltaire,ou do equipamento de caa de um selvagem norte-amer-icano ao capital do Banco da Inglaterra, no to gros-

    seiramente avessa histria quanto a transio do pes-cador de Bastiat ao trabalhador assalariado. (Alm disso,

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    um polo contra o outro, retirado dessa relao pelo sr.Bastiat e convertido em fundamento histrico de suagnese. Na relao entre salrio e lucro, entre trabalho as-salariado e capital, dizem os economistas, a vantagem dafixidez corresponde ao salrio. O sr. Bastiat afirma que afixidez,i.e., um dos polos na relao entre salrio e lucro,constitui o fundamento histrico da gnese do salariado(ou a vantagem que corresponde ao salrio no emoposio ao lucro, mas s formas anteriores de remuner-ao do trabalho) e, portanto, tambm do lucro, logo, detoda a relao. Em suas mos, por conseguinte, um lugar-

    comum sobre um aspecto da relao entre salrio e lucroconverte-se no fundamento histrico da inteira relao.Isso se d porque ele est continuamente atormentado pelareflexo sobre o socialismo, que, ento, sonhado em todaparte como a primeira forma da associao. O que con-stitui um exemplo da importncia que assumem, nas mosde Bastiat, os lugares-comuns apologticos correntes que

    acompanham as anlises econmicas.Para retornar aos economistas. Em que consiste essa

    fixidez do salrio? O salrio inalteravelmente fixo? Issocontradiria inteiramente a lei da demanda e oferta, o fun-damento da determinao do salrio. Nenhum economistanega as oscilaes, a elevao e a queda do salrio. Ou osalrio independente das crises? Ou das mquinas, quetornam suprfluo o trabalho assalariado? Ou das divisesdo trabalho, que o deslocam? Afirmar tudo isso seria het-erodoxo, e no se afirma. O que se quer dizer que, emmdia, o salrio realiza um nvel mdio aproximado,i.e., omnimo do salrio para toda a classe to detestado porBastiat, e que tem lugar uma certa continuidade mdia do

    trabalho; por exemplo, o salrio pode manter-se mesmoem casos em que o lucro diminui ou momentaneamente

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    desaparece por completo. Ora, o que significa isso senoque, pressuposto o trabalho assalariado como a formadominante do trabalho e o fundamento da produo, aclasse trabalhadora vive do salrio, e que o trabalhador in-dividual em mdia possui a fixidez de trabalhar porsalrio? Em outras palavras, tautologia. Onde capital e tra-balho assalariado a relao de produo dominante, h acontinuidade mdia do trabalho assalariado, logo, fixidezdo salrio para o trabalhador. Onde existe o trabalho as-salariado, existe a fixidez. E isso considerado por Bastiato seu atributo que tudo compensa. Em adio, o fato de

    que no estado social em que o capital est desenvolvido aproduo social, no geral, mais regular, mais contnua,mais variada logo, tambm a renda para os que nela seocupam mais fixa do que ali onde o capital, ou seja, aproduo, no se desenvolveu a esse nvel outra tautolo-gia contida no prprio conceito de capital e de umaproduo nele baseada. Em outras palavras: quem nega

    que a existncia universal do trabalho assalariado pres-supe um desenvolvimento mais elevado das forasprodutivas em relao aos estgios anteriores ao trabalhoassalariado? E como ocorreria aos socialistas formularexigncias superiores se no pressupusessem esse desen-volvimento superior das foras produtivas sociais pro-movido pelo trabalho assalariado? Na verdade, tal desen-volvimento o pressuposto de suas exigncias.

    Nota: a primeira forma em que o salrio se apresenta demodo generalizado o soldo militar, que aparece com odeclnio dos exrcitos nacionais e das milcias de cidados.De incio, o soldo era pago aos prprios cidados. Logo emseguida, foram substitudos por mercenrios, que no pre-

    cisavam ser cidados.

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    2) ( impossvel prosseguir com esse nonsense. |Portanto,ns deixamos de lado o sr. Bastiati.)

    [1]Thomas Tooke,A history of prices, and of the state of the circula-tion(Londres, Longman, Orme, Brown, Green and Longmans,1838-57, 6 v.). Em junho de 1857, pouco antes da redao do es-

    boo sobre Bastiat e Carey, Marx estudou e extratou o tomo 6 da

    obra de Thomas Tooke e William Newmarch,A history of prices,and of the state of the circulation, during the nine years 1848-1856(Londres, Longman, Orme, Brown, Green and Longmans, 1857,v. 6).

    [2]Frdric Bastiat,Harmonies conomiques(2. ed., Paris, Guil-laumin, 1851), p. 364, nota do editor: [Bastiat] props-se |comodeclarou, a se basear principalmente nos trabalhos de M. Carey,

    da Filadlfia, para combater a teoria de Ricardof.[a]Autnticas, de boa-f. (N. T.)

    [3]A parte inferior da quarta pgina do manuscrito est embranco. Provavelmente Marx pretendia, aps o |Prlogof queocupa as primeiras trs pginas e a parte superior da quarta p-gina do manuscrito e contm uma descrio geral das ideias de

    Frdric Bastiat e de Henry Charles Carey , caracterizar commais detalhe o livro de Bastiat,Harmonies conomiques, cit.

    [4]Trata-se do captulo 14 da segunda edio do livro de FrdricBastiat,Harmonies conomiques, cit. No total, a segunda ediocontm 25 captulos.

    [b]Os nmeros de pginas indicados no pargrafo so refern-

    cias de Marx ao livro de Bastiat. (N. T.)[5]Em Frdric Bastiat,Harmonies conomiques,cit., p. 379.

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    [6]Ibidem, p. 380.

    [7]Ibidem, p. 384.

    [8]Segundo Bastiat, os |fundos de penso dos trabalhadoresfdevem ser formados a partir dos recursos dos prprios trabal-

    hadores; somente assim eles podem assegurar o grau adequadoda estabilidade (Frdric Bastiat,Harmonies conomiques, cit., p.395).

    [9]Ibidem, p. 402: |A elevao dos salrios [...] facilita apoupana e a transformao do assalariado em capitalistaf.

    [10]Ibidem, p. 378-9 e 388.

    [11]Pierre-Joseph Proudhon,Systme des contradictions conomiquesou Philosophie de la misre(Paris, Guillaumin, 1846) [ed. bras.:Sistema das contradies econmicas ou Filosofia da misria, SoPaulo, cone, 2003].

    [12]Frdric Bastiat,Harmonies conomiques, cit., p. 379-82.

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    Sumrio[1]

    A. Introduo[I. Produo, consumo, distribuio, troca(circulao)]

    1. A produo em geral2. A relao geral entre produo, distribuio,

    troca e consumo3. O mtodo da economia poltica4. Meios (foras) de produo e relaes de

    produo, relaes de produo e relaesde intercmbio etc.

    http://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_2.xhtml#nota-1http://localhost/var/www/apps/conversion/tmp/scratch_2/OEBPS/Text/CAP_2.xhtml#nota-1
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    A. Introduo

    [I. Produo, consumo, distribuio, troca

    (circulao)]

    1) A produo em geral) O objeto nesse caso , primeiramente, a produo

    material.Indivduos produzindo em sociedade por isso, oponto de partida , naturalmente, a produo dos indiv-duos socialmente determinada. O caador e o pescador,singulares e isolados, pelos quais comeam Smith e Ri-cardo[2], pertencem s iluses desprovidas de fantasia dasrobinsonadas do sculo XVIII, iluses que de forma al-guma expressam, como imaginam os historiadores da cul-tura, simplesmente uma reao ao excesso de refinamentoe um retorno a uma vida natural mal-entendida. Damesma maneira que o |contrato socialf de Rousseau, quepelo contrato pe em relao e conexo sujeitos pornatureza independentes, no est fundado em tal natural-

    ismo. Essa a aparncia, apenas a aparncia esttica daspequenas e grandes robinsonadas. Trata-se, ao contrrio,da antecipao da sociedade burguesa[3], que se pre-parou desde o sculo XVI e que, no sculo XVIII, deu lar-gos passos para sua maturidade. Nessa sociedade da livreconcorrncia, o indivduo aparece desprendido dos laosnaturais etc. que, em pocas histricas anteriores, o faziam

    um acessrio de um conglomerado humano determinado elimitado. Aos profetas do sculo XVIII, sobre cujos ombros

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    Smith e Ricardo ainda se apoiam inteiramente, tal indiv-duo do sculo XVIII produto, por um lado, da dissoluodas formas feudais de sociedade e, por outro, das novasforas produtivas desenvolvidas desde o sculo XVI aparece como um ideal cuja existncia estaria no passado.No como um resultado histrico, mas como ponto departida da histria. Visto que o indivduo natural, con-forme sua representao da natureza humana, no se ori-gina na histria, mas posto pela natureza. At o mo-mento essa tem sido uma iluso comum a toda nova po-ca. Steuart, que em muitos aspectos contrasta com o sculo

    XVIII e, como aristocrata, mantm-se mais no terrenohistrico, evitou essa ingenuidade.Quanto mais fundo voltamos na histria, mais o indiv-

    duo, e por isso tambm o indivduo que produz, aparececomo dependente, como membro de um todo maior: de in-cio, e de maneira totalmente natural, na famlia e nafamlia ampliada em tribo [Stamm]; mais tarde, nas diver-

    sas formas de comunidade resultantes do conflito e dafuso das tribos. Somente no sculo XVIII, com a so-ciedade burguesa, as diversas formas de conexo socialconfrontam o indivduo como simples meio para seus finsprivados, como necessidade exterior. Mas a poca queproduz esse ponto de vista, o ponto de vista do indivduoisolado, justamente a poca das relaes sociais (univer-sais desde esse ponto de vista) mais desenvolvidas at opresente. O ser humano , no sentido mais literal, umzVonpolitikn[4], no apenas um animal social, mas tambmum animal que somente pode isolar-se em sociedade. Aproduo do singular isolado fora da sociedade um casoexcepcional que decerto pode muito bem ocorrer a um

    civilizado, j potencialmente dotado das capacidades dasociedade, por acaso perdido na selva to absurda

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    quanto o desenvolvimento da linguagem sem indivduosvivendo juntos e falando uns com os outros. No necessrio estender-se sobre isso. No seria preciso men-cionar essa questo, que tinha sentido e razo de ser entreas pessoas do sculo XVIII, no fosse o disparate seria-mente reintroduzidono centro da mais moderna economiapor Bastiat, Carey[5], Proudhon etc. Para Proudhon, entreoutros, naturalmente cmodo produzir uma explicaohistrico-filosfica da origem de uma relao econmica,cuja gnese histrica ignora, com a mitologia de que Adoou Prometeu esbarrouna ideia pronta e acabada, que foi

    ento introduzida etc.[6]

    No h nada maistediosamenterido do que as fantasias dolocus communis[a].Por isso, quando se fala de produo, sempre se est

    falando de produo em um determinado estgio dedesenvolvimento social da produo de indivduos soci-ais. Desse modo, poderia parecer que, para poder falar emproduo em geral, deveramos seja seguir o processo

    histrico de desenvolvimento em suas distintas fases, sejadeclarar por antecipao que consideramos uma determin-ada poca histrica, por exemplo, a moderna produoburguesa, que de fato o nosso verdadeiro tema. No ent-anto, todas as pocas da produo tm certas caracterstic-as em comum, determinaes em comum. A produo emgeral uma abstrao, mas uma abstrao razovel, na me-dida em que efetivamente destaca e fixa o elementocomum, poupando-nos assim da repetio. Entretanto,esseUniversal, ou o comum isolado por comparao, eleprprio algo multiplamente articulado, cindido em difer-entes determinaes. Algumas determinaes pertencem atodas as pocas; outras so comuns apenas a algumas.

    [Certas] determinaes sero comuns poca mais mod-erna e mais antiga. Nenhuma produo seria concebvel

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    sem elas; todavia, se as lnguas mais desenvolvidas tmleis e determinaes em comum com as menos desenvolvi-das, a diferena desse universal e comum precisamente oque constitui seu desenvolvimento. As determinaes quevalem para a produo em geral tm de ser corretamenteisoladas de maneira que, alm da unidade decorrente dofato de que o sujeito, a humanidade, e o objeto, a natureza,so os mesmos , no seja esquecida a diferena essencial.Em tal esquecimento repousa, por exemplo, toda asabedoria dos economistas modernos que demonstram aeternidade e a harmonia das relaes sociais existentes. Por

    exemplo: nenhuma produo possvel sem um instru-mento de produo, mesmo sendo este instrumento apen-as a mo. Nenhuma produo possvel sem trabalho pas-sado, acumulado, mesmo sendo este trabalho apenas adestreza acumulada e concentrada na mo do selvagempelo exerccio repetido. O capital, entre outras coisas, tambm instrumento de produo, tambm trabalho pas-

    sado, objetivado [objektivierte]. Logo, o capital uma re-lao natural, universal e eterna; quer dizer, quando deixode fora justamente o especfico, o que faz do instrumentode produo, do trabalho acumulado, capital. Por essarazo, toda a histria das relaes de produo aparece emCarey, por exemplo, como uma maliciosa falsificao pro-vocada pelos governos.

    Se no h produo em geral, tambm no h igual-mente produo universal. A produo sempre um ramoparticular da produo por exemplo, agricultura, pecu-ria, manufatura etc. ou umatotalidade. Mas a economiapoltica no tecnologia. Desenvolver em outro lugar(mais tarde) a relao das determinaes universais da

    produo, em um estgio social dado, com as formas par-ticulares de produo. Finalmente, a produo tambm

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    no somente produo particular. Ao contrrio, sempreum certo corpo social, um sujeito social em atividade emuma totalidade maior ou menor de ramos de produo. Domesmo modo, a relao que a apresentao cientfica temcom o movimento real [reellen] ainda no vem ao casonesse ponto. Produo em geral. Ramos particulares deproduo. Totalidade da produo.

    moda fazer preceder a Economia de uma parte geral e justamente a que figura sob o ttulo Produo (ver,por exemplo, J. St. Mill[7]) , na qual so tratadas as con-dies geraisde toda produo. Essa parte geral consiste ou

    deve supostamente consistir: 1) das condies sem as quaisa produo no possvel. Isso significa, de fato, nadamais do que indicar os momentos essenciais de todaproduo. Mas se reduz de fato, como veremos, a algumasdeterminaes muito simples convertidas em banais tauto-logias; 2) das condies que, em maior ou menor grau, fo-mentam a produo, como, por exemplo, o estado pro-

    gressivo ou estagnante da sociedade de Adam Smith[8].Para conferir significado cientfico a isso, que em Smithtinha seu valor como sntesef, seriam necessrias invest-igaes sobre os perodos dos graus de produtividade nodesenvolvimento dos povos singulares uma investigaoque ultrapassa os limites prprios do tema, mas que, namedida em que faz parte dele, deve ser inserida no desen-volvimento da concorrncia, acumulao etc. Na versogeral, a resposta resume-se proposio geral de que umpovo industrial alcana o auge de sua produo justa-mente no momento mesmo em que est em seu augehistrico. |De fatoi. Um povo est em seu auge industrialna medida em que, para ele, o essencial no somente o

    ganho, mas o ganhar. Nesse caso, os ianquesi[so] superi-ores aos ingleses. Ou ento: na medida em que, por

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    exemplo, certas predisposies raciais, certos climas, certascondies naturais, como proximidade do litoral, fecun-didade do solo etc., so mais favorveis produo do queoutras. O que acaba na tautologia de que a riqueza criadacom maior facilidade medida que seus elementos objet-ivos e subjetivos esto disponveis em maior grau.

    Para os economistas, entretanto, no s isso queefetivamente importa nessa parte geral. Mais do que isso, aproduo deve ser representada veja, por exemplo, Mill, diferena da distribuio etc., como enquadrada emleis naturais eternas, independentes da histria, oportunid-

    ade em que as relaesburguesasso furtivamente contra-bandeadas como irrevogveis leis naturais da sociedadeinabstracto[b]. Esse o objetivo mais ou menos consciente detodo o procedimento. Na distribuio, em troca, a human-idadedeve ter se permitidof de fato toda espcie de ar-btrio[9]. Abstraindo completamente dessa grosseira disjun-o entre produo e distribuio e da sua relao efetiva,

    deve ser desde logo evidente que, por mais que possa serdiversa a distribuio em diferentes graus de sociedade,deve ser possvel tambm nesse caso, assim como o foipara a produo, destacar as determinaes em comum e,da mesma forma, confundir ou extinguir todas as difer-enas histricas em leishumanas gerais. Por exemplo, o es-cravo, o servo e o trabalhador assalariado, todos recebemuma certa quantidade de alimentos que os permitem exi-stir como escravos, servos e trabalhadores assalariados. Oconquistador, que vive do tributo, ou o funcionrio, quevive do imposto, ou o proprietrio fundirio, que vive darenda, ou o monge, que vive da esmola, ou o levita, quevive do dzimo, todos recebem uma cota da produo so-

    cial determinada por leis diferentes das que determinam acota dos escravos etc. Os dois pontos fundamentais que os

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    economistas colocam sob essa rubrica so: 1) propriedade;2) sua proteo pela justia, polcia etc. Ao que se deve re-sponder muito brevemente:

    Ad. 1. Toda produo apropriao da natureza peloindivduo no interior de e mediada por uma determinadaforma de sociedade. Nesse sentido, uma tautologiaafirmar que propriedade (apropriao) uma condio daproduo. risvel, entretanto, dar um salto da para umaforma determinada de propriedade, por exempl