literatura e arte

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A evocação da obra de arte como recurso estilístico na construção da narrativa em Os Cus de Judas, de Antonio Lobo Antunes.

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Page 1: literatura e arte

A evocação da obra de arte como recurso estilístico na

construção da narrativa em Os Cus de Judas, de Antonio Lobo

Antunes.

Page 2: literatura e arte

De grupos excursionistas e de mais impacientes que afastavam com os garfos balões à deriva com sorrisos distraídos, a arrastarem pontas de guirta atrás de si, tal as noivas volantes de Chagall, a bainha dos vestidos. (p. 8)

Page 3: literatura e arte

Por essa época, eu alimentava a esperança insensata de rodopiar em torno de botas brancas e calças cor de rosa, deslizando no ruído roldanas com que sempre imaginei o voo difícil dos anjos de Giotto, a espanejarem nos seus céus bíblicos numa inocência de cordéis. (p. 11)

Page 4: literatura e arte

[...] encontrar pouco a pouco, ladeira abaixo a manhã geométrica da cidades que os azulejos decepam em losangos desbotados, ver os reformados do dominó, na eterna postura de jogadores de carta de Cezanné, e sentir que se deixou irremediavelmente a esse mundo nítido e directo onde as coisas possuem consistência de coisas...(p.50)

Page 5: literatura e arte

[...]Viemos todos hoje ocupar a inocente Lapa cor de rosa imitada de Carlos Botelho da maré baixa das nossas bebedeiras silenciosas à superfície dos quais cintila, de quando em quando e by appointment of Her Majesty the Queen, o reflexo do génio, e sobre nossas cabeças ungidas tombam as línguas de fogo de Johnny Espírito Santo Walker.[...] (p .44)

Page 6: literatura e arte

O Tejo, o sol cor de laranja ao fim da tarde comungado pelos telhados do Areeiro. Sinto-me neste andar, sabe como é, como um avestruz despaisado, e rodo de sala em sala a conversar sozinho.(p. 120)

Page 7: literatura e arte

• Esta cidade absurda, [...] onde os objectos vogam suspensos na luz como nos quadros de Matisse,obrigava-me a tropeçar de quarto em quarto à maneira de uma borboleta entontecida... [...] (p.126)

Page 8: literatura e arte

Um amigo negro da Faculdade levou-me um dia ao seu quarto no Arco do Cego, e mostrou-me o retrato de uma velha esquelética, em cujo rosto se adivinhavam gerações e gerações de petrificada revolta.

- É a nossa Guernica. Queria que a visses antes de me ir embora...(p. 143)

Page 9: literatura e arte

Conheci-te numa manhã de sábado, Sofia, e a tua gargalhada de prisioneira, harmoniosa e estranha como o voo dos corvos que Van Gogh pintara antes de se matar no meio do trigo e do sol, tocou-me como um gesto da irreprimível ternura me toca se me sinto mais só. (p. 148)

Page 10: literatura e arte

Transporte-me como uma Pietá hercúlea o seu Cristo exausto, como eu transportei ao colo, há muitos anos o negro a quem o crocodilo do rio Cambo havia devorado a perna esquerda, e que gemia docemente, tal os filhos das hienas nos ninhos apodrecidas, rodeados de excrementos e de ossos espumosos de gazela. (p. 169)

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