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REVISTA DA ESMESE, Nº 05, 2003 - 223 JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE: PODER OU DEVER DO JULGADOR? Diogo de Calasans Melo Andrade , pós-graduando em Direito Civil- Constitucional, assessor jurídico da Presidência do TJ/SE. SUMÁRIO: 1. Introdução - 2. Das Considerações Gerais - 3. Dos Princípios que regem a matéria - 4. Do Histórico - 4.1. Dos Antecedentes históricos do Julgamento Antecipado da Lide - 4.2. Do Julgamento Antecipado no Direito Brasileiro - 5. Das condições para a aplicação do art. 330 I E II do CPC – 5.1. Da questão de mérito exclusivamente de direito - 5.2. Da questão de direito e de fato - 5.3. Da desnecessidade de produzir prova em audiência – 5.4. Da revelia - 6. Da aplicabilidade nas ações cíveis - 6.1. Da sua aplicação nas Ações de Despejo - 6.2. Da sua aplicação quando existem pedidos cumulativos - 6.3. Da sua aplicação no procedimento sumário - 6.4. Quando ocorrer revelia - 6.5. No caso de apresentação de defesas antecipadas - 6.6. Da sua aplicação nos Embargos - 6.7. Nos casos de ilegitimidade das partes - 6.8. Nos casos de cumulação indevida das ações 6.9. No caso de excesso de execução - 6.10. No caso de nulidade da execução até a penhora - 6.11. Nas causas impeditivas, modificativas ou extintivas da obrigação e demais casos do artigo 741,VI - 6.12. No caso de revelia nos Embargos - 6.13. Nos embargos à arrematação ou à adjudicação - 6.14. Nas Ações Cautelares - 7. Impossibilidade de sua aplicação em certas causas - 7.1. Quando ocorrer pluralidade de partes no pólo passivo da demanda - 7.2. No caso de revel titular de direitos indisponíveis - 7.3. Quando o Ministério Público, o Curador Especial ou o Advogado Dativo estiver no pólo passivo da lide - 7.4. Na Declaratória Incidental como motivo de postergação dos efeitos da revelia - 7.5. Nos casos de Desapropriação - 7.6. No processo de Execução - 7.7. Na exceção de pré-executividade - 7.8. Nos Tribunais de Justiça - 8. O posicionamento da doutrina - 9. Do julgamento antecipado e da lide e tutela antecipada - 9.1. Das diferenciações - 10. Da possibilidade de utilização do instituto após a audiência de conciliação - 11. Julgamento antecipado da lide: poder ou dever do julgador? – 12. Conclusão – Bibliografia

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REVISTA DA ESMESE, Nº 05, 2003 - 223

JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE: PODER OU DEVER DOJULGADOR?

Diogo de Calasans Melo Andrade, pós-graduando em Direito Civil-Constitucional, assessor jurídico da Presidência do TJ/SE.

SUMÁRIO: 1. Introdução - 2. Das Considerações Gerais - 3. DosPrincípios que regem a matéria - 4. Do Histórico - 4.1. DosAntecedentes históricos do Julgamento Antecipado da Lide - 4.2. DoJulgamento Antecipado no Direito Brasileiro - 5. Das condições paraa aplicação do art. 330 I E II do CPC – 5.1. Da questão de méritoexclusivamente de direito - 5.2. Da questão de direito e de fato - 5.3.Da desnecessidade de produzir prova em audiência – 5.4. Da revelia- 6. Da aplicabilidade nas ações cíveis - 6.1. Da sua aplicação nasAções de Despejo - 6.2. Da sua aplicação quando existem pedidoscumulativos - 6.3. Da sua aplicação no procedimento sumário - 6.4.Quando ocorrer revelia - 6.5. No caso de apresentação de defesasantecipadas - 6.6. Da sua aplicação nos Embargos - 6.7. Nos casosde ilegitimidade das partes - 6.8. Nos casos de cumulação indevidadas ações 6.9. No caso de excesso de execução - 6.10. No caso denulidade da execução até a penhora - 6.11. Nas causas impeditivas,modificativas ou extintivas da obrigação e demais casos do artigo741,VI - 6.12. No caso de revelia nos Embargos - 6.13. Nos embargosà arrematação ou à adjudicação - 6.14. Nas Ações Cautelares - 7.Impossibilidade de sua aplicação em certas causas - 7.1. Quandoocorrer pluralidade de partes no pólo passivo da demanda - 7.2. Nocaso de revel titular de direitos indisponíveis - 7.3. Quando o MinistérioPúblico, o Curador Especial ou o Advogado Dativo estiver no pólopassivo da lide - 7.4. Na Declaratória Incidental como motivo depostergação dos efeitos da revelia - 7.5. Nos casos de Desapropriação- 7.6. No processo de Execução - 7.7. Na exceção de pré-executividade- 7.8. Nos Tribunais de Justiça - 8. O posicionamento da doutrina - 9.Do julgamento antecipado e da lide e tutela antecipada - 9.1. Dasdiferenciações - 10. Da possibilidade de utilização do instituto após aaudiência de conciliação - 11. Julgamento antecipado da lide: poderou dever do julgador? – 12. Conclusão – Bibliografia

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1. INTRODUÇÃO

Todos os que batem às portas do Poder Judiciário pretendem ter suasações julgadas de forma efetiva, adequada e célere. A morosidade do processogera não só o desprestígio do Poder Judicante, mas a frustração das partes. Oprocesso utilizado de forma demorada torna-se um instrumento de inquietaçãosocial, na medida em que favorece a parte que não tem direito. A ConstituiçãoFederal em seu art. 5º, inciso XXXV, garante o acesso à Justiça ao assegurar quenão será excluída da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.Ocorre que, do acesso à Justiça à sentença final, a morosidade processual equivaleà inaplicabilidade do princípio constitucional.

Atualmente, existe um extremo apego ao formalismo, haja vista que osoperadores do direito vivem uma tendência ritualística, em detrimento doverdadeiro objetivo do processo que é fazer justiça às partes, ao buscar o maisracionalmente o direito litigado. Em sentido contrário, a utilização da cogniçãoexaustiva do direito em litígio, impedindo a celeridade processual, torna oprocesso moroso levando o Judiciário ao descrédito, posto que, segundo oDes. Pascoal Nabuco, justiça seródia é pura injustiça.

As constantes transformações sócio-jurídicas nas relações da sociedadeestão a exigir formas e estilos mais dinâmicos de resoluções de litígios paraalcançar a solução dos conflitos sociais de forma mais eficaz e célere. Uma dassoluções para evitar a perpetuação das lides é a Antecipação do Julgamento,prevista no Capítulo V, Do Julgamento Conforme o Estado do Processo, SeçãoII, e do Julgamento Antecipado da Lide, art. 330, I e II da Lei 5.869, de 11 deJaneiro de 1973, soluções que evitam a superlotação de processos nas VarasCíveis e a composição do litígio de modo a evitar o desnecessário alongamentoda via processual. No atual Código, ele foi separado do despacho saneador,recebendo vida e estrutura própria, com funcionalidade distinta.

Nesse sentido, a bem ponderada aplicação da Antecipação do Julgamento,em absoluta consonância com o direito constitucional das partes de sedefenderem e fazerem provas de seus direitos é medida extremamente eficaz.Tentando localizar as raízes dessa inovação processual fizemos uma incursãohistórica, constatando que teve sua origem em Roma, embora tenha sidoconsagrada na Alemanha. O Brasil tomou por base a Codificação Portuguesapara a criação da elaboração do citado instituto processual.

A prática do Julgamento Antecipado privilegia os PrincípiosConstitucionais da Economia, Simplicidade, Celeridade, Instrumentalidade eEfetividade Processual, além de eliminar a enorme quantidade de audiências, quena maior parte das vezes são inúteis. Existe uma harmonia entre o instituto e o

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art. 125, II, do CPC, que manda o juiz “velar pela rápida solução do litígio” e como art. 130, que ordena o indeferir “as diligências inúteis ou meramente protelatórias”.

As condições para sua aplicação implicam a questão de mérito, sejaexclusivamente de direito ou, sendo de direito e de fato, não haja necessidade deproduzir prova em audiência ou quando ocorrer à revelia. Pode ser aplicado emquase todas as ações cíveis, restando, apenas, alguns casos que o inadmitem. Osdoutrinadores são unânimes em afirmar sua importância na rápida e eficazaplicação da Justiça.

Importante é estabelecer sua diferença da Tutela Antecipada, prevista noart. 273 do CPC. No primeiro, o julgador decide o próprio mérito da causa,proferindo sentença, na segunda, o juiz antecipa os efeitos da sentença atravésde decisão interlocutória.

No estudo procuramos evidenciar a possibilidade de sua utilização apósa audiência de conciliação, em obediência ao art. 125, IV do CPC e em razão doPrincípio da Conciliação, que é um dever do magistrado. Por fim, tentaremosdemonstrar que o Julgamento Antecipado da Lide não é uma faculdade dojulgador, mas sim um dever que se impõe quando presentes as condiçõeselencadas no art. 330 do CPC.

Em suma, este é o conteúdo do nosso trabalho técnico-científico, queapresentamos sem a intenção de estarmos dando qualquer contribuiçãodoutrinária, mas apenas a de nos somar a quantos têm demonstrado que nãohá discricionariedade no Julgamento Antecipado da Lide, mas efetivação daJustiça, através da prestação jurisdicional mais célere e eficaz.

2. DAS CONSIDERAÇÕES GERAIS

Antigamente o Estado como hoje existe, não tinha força para se sobreporaos indivíduos. Permitia-se aos litigantes a auto-tutela de seus interesses, gerandofatores de insegurança social, tendentes a suscitar a ruptura da vida em coletividade.

Com o transcorrer da história, o Estado se fortaleceu assumindo omonopólio da Jurisdição, isto é, da capacidade de dizer o direito, submetendoas partes à decisão por ele entendida.

Com o surgimento do monopólio da jurisdição, nasce a idéia do processo,que significa avançar, proceder em direção a um fim, ou seja, tornou-se necessáriaa existência de atos ordenados a alcançar um fim, o pronunciamento estatalacerca do direito em litígio, a sentença.

Durante muito tempo o processo foi concebido como uma mera sucessãode atos, até que, em meados do século passado, passou por uma profundarevisão, ganhando, a partir daí, status de ciência autônoma, com meios própriosde investigação científica, o que só foi possível com o questionamento do caráter

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civilista da ação.Assim, o processo passou a ser encarado numa perspectiva instrumental,

trazendo, como aspecto positivo, o cumprimento de seus objetivos sócio-político-jurídicos, e, como negativo, uma tendência processualizante, verificadapelo excessivo apego ao formalismo e sua fuga à realidade social, culminada pelaconsagração dos meios em detrimento dos fins processuais.

A sociedade cresceu, os conflitos se multiplicaram e a prestaçãojurisdicional tornou-se morosa pela utilização do procedimento processual porexcelência, qual seja, o procedimento ordinário, que permite a cognição plena eexauriente do direito em litígio, repelindo sua cognição parcial, sumarizada,colocando-a como exceção.

Houve, portanto, a priorização da segurança jurídica, entendida como odireito dos litigantes à cognição exaustiva do direito em litígio, ensejando aamplitude do contraditório, da defesa, da interposição de recursos, etc, emdetrimento do tempo da prestação jurisdicional, entendida como acesso à Justiça.

Na prática, surge um conflito entre esses dois valores, que, abstratamentesão compatíveis e harmonizados pelo texto constitucional e entre os quais nãohá qualquer hierarquia.

O procedimento ordinário, fundamentado na segurança jurídica, faz comque seja suscitada a desigualdade das partes na relação jurídico-processual, umavez que o ônus da demora do processo recai exclusivamente sobre o autor,tendo se afastado da realidade social.

Assim, o processo tornou-se excessivamente formalista, colocando delado a celeridade em detrimento da segurança jurídica, entendendo-se a demorado processo como um mal necessário à cognição definitiva do Direito, havendoum afastamento da ciência processual em relação ao que se passa na realidadesocial, promovendo uma revolta geral, que transcende à ciência do Direito,preocupando a sociedade como um todo.

Em verdade, o tempo do processo sempre foi visto de forma secundária,o réu que não tem razão beneficia-se da morosidade processual em detrimentodo autor, vale dizer, acarretando-lhe danos de toda a ordem, não só patrimoniais,mas também morais.

Por outro lado, há aqueles que entendem que a morosidade processual énecessária à cognição definitiva do direito, sendo até mesmo natural à tramitaçãodo processo, principalmente pela consagração constitucional do princípio daampla defesa, admitindo-se, defesas abusivas como medidas de se obstar arealização do direito do autor.

É preciso entender que o princípio da inafastabilidade da apreciação dalesão ou ameaça de direito pelo Judiciário, concebido modernamente como atutela efetiva, isto é, tempestiva e adequada, a razão de ser do processo, qual seja,a de dar a cada um exatamente o que é seu, é norma constitucional tal qual a

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ampla defesa, inexistindo qualquer hierarquia entre elas.Com efeito, a justiça que não cumpre suas funções dentro de um prazo

razoável é, na verdade, injustiça. Se o autor for obrigado a esperar a coisa julgadamaterial acerca de um direito, de logo provado, para requerer a execução, a ele terásido imposto um dano, com o processo, auxiliando ao réu que não tem razão.

É claro, portanto, que se deve diminuir o tempo da demanda de formaigualitária entre os litigantes, equilibrando-se a relação processual em torno doprincípio da isonomia, porquanto o direito a um provimento jurisdicionaltempestivo e adequado é, indiscutivelmente, direito à cidadania.

3. DOS PRINCÍPIOS QUE REGEM A MATÉRIA

A função primordial da jurisdição é, por conseguinte, dirimir os conflitossociais e humanos de quantos batem à porta do Poder Judiciário.

Para cumprir esse desiderato mister se faz que os operadores do Direitobusquem, através do processo, a solução que objetive maior eficiência e celeridadena resolução dos conflitos, evitando uma prestação jurisdicional morosa,resultante de práticas procrastinatórias e inúteis, que têm levado o Judiciário aodescrédito.

Entre os institutos processuais que visam evitar a perpetuação das lides,portanto, está o Julgamento Antecipado, fulcrado nos princípios da economia eceleridade processual.

Tal instituto possibilita ao julgador, considerando o desenvolvimento ecircunstâncias do processo, a prolação de decisório de mérito, sem a realização daaudiência específica para a produção de prova oral. A utilização deste instituto commaior freqüência seria uma das soluções para se evitar a superlotação de processosnas Varas Cíveis, importando uma solução mais rápida e justa aos litígios.

São evidentes as vantagens que daí resultarão, para que se atinja o idealsempre perseguido de tornar mais rápida e menos onerosa a distribuição daJustiça, sem prejuízo da instrução da causa. Simplicidade, celeridade e economiasão os requisitos para uma boa aplicação da legislação processual.

Simplicidade, em função da necessidade de se realizar atos processuaissem rigorismos excessivos ou formalidades extremadas, não devendo haverqualquer prejuízo às partes e, evidentemente, com o atingimento de sua verdadeirafinalidade.

A celeridade na prestação jurisdicional talvez seja o que mais tem clamadoa sociedade. A rapidez processual é um aspecto substancial, mas evidentemente,sem o comprometimento de sua efetividade ou dos direitos das partes, tantosob a ótica processual quanto constitucional.

Economia também é assunto de capital importância na seara jurídica,

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considerando os problemas monetários que têm assolado o país nos últimosanos. Se tivéssemos, no entanto, um processo menos oneroso, naturalmentehaveria maiores facilidades para o acesso dos menos favorecidos às decisõesjudiciais.

Admitir o processo como instrumento utilizado para buscar a celeridadena resolução dos conflitos qualificados por pretensões insatisfeitas é aproximaros partícipes da relação processual da efetividade processual. Esta efetividadeestá ligada à rapidez e celeridade de se propiciar prestação da tutela jurisdicionaleficaz. Conclui-se, então, que a morosidade processual é um empecilho a serevitado pelos aplicadores do Direito.

O juiz, revestindo-se de cognição exauriente (em regra, pois no processocautelar basta a cognição sumária para se abrir espaço para julgamento da lidecautelar), desde que respeite os princípios constitucionais, tem, optado pelocompromisso assumido perante a sociedade de prestar a jurisdição através davia mais adequada, usufruindo do julgamento antecipado da lide e proferindosentença de mérito.

Por outro lado, a utilização corajosa do julgamento antecipado da lide éimprescindível para que os valores da efetividade tenham o lugar de destaqueque a sociedade anseia.

Sobre o tema, Benedito Mário Vitiritto, assim escreveu:Cumpre assinalar, ainda, que o instituto em tela – e alvo dopresente estudo – já ao tempo de sua adoção normativa noCódigo de Processo Civil, constitui uma resposta antecipadae elisiva à crônica crítica da morosidade da Justiça, nainquestionável agilização do processo no tempo pela brevidadee economia processual consagrada. Neste, instituto dojulgamento antecipado da lide é uma resposta na presteza –no tempo – da prestação jurisdicional.1

De mais a mais, o Julgamento Antecipado da Lide não derroga o princípiodo contraditório, pois somente poderá ser realizado se os efeitos da reveliativerem ocorrido. Se não ocorrer contestação e se envolver direitos indisponíveis,não obstante, haja revelia, seus efeitos não se verificam, conforme previsto noart. 320 do CPC.

Sendo assim, conclui-se que o julgamento antecipado da lide nada maisé do que atividade valorativa final de um processo, realizada em momentoprocedimental diferenciado do previamente disposto para a generalidade doscasos, através da qual o Estado põe fim a conflitos de interesses qualificados porpretensões resistidas ou insatisfeitas.

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4. DO HISTÓRICO

4.1. Dos Antecedentes históricos do Julgamento Antecipado da Lide:

Remontam ao Direito Romano os fundamentos do julgamentoantecipado da lide, como forma simplificada de solução dos conflitos. A princípio,o romano não fazia separação entre a jurisdição civil e a penal, adotando igualsolução procedimental.

Ao tempo das Ações da Lei, o procedimento era dividido em duas fasesdistintas in iure e in iudicio. Naquela, o magistrado após ouvir o réu, analisava aviabilidade ou não do prosseguimento do feito. Após, adentrava à fase do iniudicio, para posterior julgamento. Se estivesse convicto do término do litígio,deixava de conceder a ação. Aí uma espécie de julgamento antecipado.

No período seguinte, conhecido como Formulário, embora adotadas asfases do anterior período, o magistrado agia com mais liberdade, não sóorientando o processo, mas criando direito, quando ocorresse lacuna ou fossenecessário temperar o rigorismo do jus civile.

Já no período da cognitio extraordinária, os antigos árbitros foramsubstituídos pelos magistrados, como órgãos estatais responsáveis pela aplicaçãoda lei na resolução dos conflitos. É desse período, o aparecimento da figura daSummatim Cognoscere, faculdade deferida ao magistrado para proceder, medianteinvestigação sumária e decidir por simples verossimilhança, através da provasemiplena. Aqui também, o embrião do julgamento antecipado.

Mas, foi no Direito Germânico que se consagrou o instituto, conhecidopor decisão segundo o estado dos autos que se identificou a idéia de se dar umadecisão em meio ao procedimento. Tem-se, portanto, aqui, talvez a origem doinstituto do julgamento antecipado, como conhecido e praticado hodiernamente.

4.2. Do Julgamento Antecipado no Direito Brasileiro:

Importa esclarecer que para a elaboração do artigo 330 do CPC, o legisladorbrasileiro tomou por base os artigos 508, 509 e 510 da codificação portuguesa.Nestes artigos, o fundamento para o julgamento antecipado da lide foi inseridono procedimento comum ordinário. A norma, contida no art. 330, do CPC,guarda, portanto, similitude com aqueles artigos da codificação portuguesa.

O Código de 1939 já previa o julgamento antecipado da lide, nos casosem que o pedido não fosse contestado.

É fundamental reconhecer que o julgamento antecipado da causa, nosmoldes em que está disposto no Código de Processo Civil atual, não encontrasimilitude no direito comparado. Encontra-se, sim, como já foi ressaltado, nasformas de julgamento simplificado.

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Antes da vigência do Código de Processo Civil de 1939, detectava-se ojulgamento antecipado previsto no Decreto-Lei n.º 960, de 1938, que dispunhaa respeito das execuções fiscais, em seu artigo 19, IV.

Também no artigo 354 do Código de 1939, contendo matéria relativa àrenovatória de despejo, em modificação ocorrida em 1948, foi retratado o institutoora analisado. Outro caso é o do artigo 22, do Decreto-Lei nº 3.365/41, queregulamenta o procedimento da desapropriação.

De igual modo, inspirado no então projeto do Código de ProcessoCivil, o Decreto-Lei n.º 890, de 26/06/1969, tendo por escopo abolir asformalidades consideradas inúteis no procedimento da ação de despejo, facultouao juiz o julgamento antecipado da lide.

O surgimento de tal instituto deu-se pela necessidade de se dar maiorceleridade e, conseqüente, economia processual, como também para uma melhorutilização dos atos do processo, quando bem aplicados. O julgamento antecipadoda lide deveu-se, portanto, à observância do princípio de economia processual etrouxe o desafogo do Judiciário pela eliminação de enorme quantidade deaudiências que, ao tempo do Código revogado, eram realizadas sem nenhumavantagem para as partes e com grande perda de tempo para a Justiça.

Este dispositivo foi uma das maiores conquistas que o atual CódigoProcessual trouxe. Desse modo, a antecipação do julgamento da lide importanuma grande conquista para os processualistas que desejavam dar mais celeridadeao processo e autonomia de decidir ao julgador, além de por termo ao desperdíciode tempo que resultava da prática de atos processuais inúteis.

5. DAS CONDIÇÕES PARA A APLICAÇÃO DO ART. 330 I E IIDO CPC

Julgamento Antecipado da Lide é uma forma de decisão conforme oestado do processo, em que o juiz dispensa o prosseguimento processual ejulga desde logo a questão de mérito, por ser unicamente de direito, ou, sendode direito e de fato não houver necessidade de produzir prova em audiência, ou,ainda, quando ocorrer o efeito material da revelia, ex vi do disposto no art. 330do Código de Processo Civil:

O Juiz conhecerá diretamente do pedido, proferindo sentença:I - quando a questão de mérito for exclusivamente de direito,ou, sendo de direito e de fato, não houver necessidade deproduzir prova em audiência.II - quando ocorrer a revelia (art. 319).2

Nessas três hipóteses, a desnecessidade de audiência faz com que se

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elimine a incidência do princípio da oralidade do processo de conhecimento.A sentença é definitiva e tem a mesma natureza e requisitos daquela que se

profere, normalmente, após a instrução em audiência, fundada no art. 269, I, doCPC.

Por outro lado, harmoniza-se com a preocupação de celeridade que devepresidir à prestação jurisdicional, e que encontra regra pertinente no art. 125, nºII, que manda o juiz “velar pela rápida solução do litígio”, e no art. 130 querecomenda indeferir “as diligências inúteis ou meramente protelatórias”.

5.1. Da questão de mérito exclusivamente de direito:

O que é questão? É a dúvida em torno de uma relação jurídica básica dapretensão ou da contestação – (questão de direito) – ou em torno de um fatorelevante (questão de fato).

Mérito consiste no julgamento da procedência, ou improcedência, ouseja, o mérito é lide. Parece, portanto, que mérito é igual à lide, ou seja, é nítidafotografia do conflito de pedido contraditório a ser decidido pelo juiz.

Questão de mérito é questão intrínseca, nuclear, o cerne da questão a serprocessada em Juízo.

Questões exclusivamente de direito são aquelas incontroversas em relaçãoaos fatos alegados, sobre os quais não pairam quaisquer dúvidas. Não havendoimpugnação das conseqüências jurídicas na contestação, a questão será puramentede direito, exigindo-se, de logo, o seu julgamento.

5.2. Da questão de direito e de fato:

Questão de direito é a dúvida em torno de uma relação jurídica básicados pedidos contraditórios. Assim, a questão de direito abrange na área de suacompreensão o direito positivo objetivo, isto é, a lei expressa, ou lei que regulacasos semelhantes ou matéria análoga, ou os princípios gerais do direito, postos,em espécie concreta, com fundamento da pretensão ou da defesa. Se para asolução do litígio não houver necessidade de provas orais, isto é, se o litígio sefunda, por exemplo, em interpretação do direito aplicável a uma determinadarelação jurídica, diz-se que a questão é, apenas, de direito.

Questão de fato é a dúvida em torno da realidade de um fato.Há ocorrência da situação ensejadora do julgamento antecipado da lide

na modalidade em que existem questões de fato e de direito, quando o fato a serprovado aparece de modo cristalino, indiscutível, fora de qualquer dúvida paracognição do juiz.

5.3. Da desnecessidade de produzir prova em audiência:

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Os fatos controvertidos são aqueles relevantes para o deslinde dademanda, mais tais fatos, apesar de controvertidos, deverão ser relevantes e terconexão com a causa. A par de existir fatos controvertidos, a necessidade deprova a respeito deles exige, ainda, que esses fatos controvertidos sejampertinentes e relevantes.

Os objetos da prova são os fatos controvertidos pertinentes e relevantes.Não controvertido o fato (alegado pelo autor e não refutado pelo réu), é ele fatocerto. Decorre que, os litigantes concordando expressamente sobre os fatos queconstituem a lide, nada há a provar.

Fatos pertinentes são aqueles que não são estranhos à causa. Há íntimaligação entre o fato e o desenrolar da lide.

Já fato relevante é o importante, que acresce o conhecimento produtivodo conflito de interesse qualificado por pretensões resistidas ou insatisfeitas.Mesmo que outros fatos surjam, se não ajudam na composição da lide, ojulgamento antecipado não pode ser adiado.

ADA PELLEGRINI assim entende sobre tais fatos: “Para serem objetode prova, os fatos, além de controvertidos, devem, ainda, ser pertinentes erelevantes.”3

No mesmo trilhar, escreveu LUIZ MARINONE:Se o fato, apesar de controvertido, não é pertinente nemrelevante, não há razão para se admitir que a prova recaiasobre ele, sendo necessário, nesse caso, para se evitar oretardamento da prestação jurisdicional, o julgamentoantecipado do mérito.4

5.4. Da revelia:

Revelia é a inatividade do réu que, inobstante ciente da ação, deixatranscorrer in albis o prazo para a resposta. Com a efetivação da citação, surge parao requerido o ônus de promover defesa no prazo fixado pela legislação. Se nãoo faz, caracteriza-se, em regra, o chamado efeito da revelia, que significa a presunçãode verdade dos fatos afirmados pelo autor, como preceitua o art. 319 combinadocom o 324, ambos do Código Processual. Revelia é, então, a não promoção dedefesa, e sua conseqüência de ordem prática é a de presumir-se como verdadeiroo teor fático da petição inicial.

Com a revelia e seus efeitos acontece significativo fenômeno, qual seja, osfatos afirmados pelo autor se revestem, desde que coerentes, da qualidade deveracidade, e assim, deve-se encerrar o processo com julgamento do mérito afavor do autor, julgando-se antecipadamente a lide. Cumpre frisar que julgarantecipadamente a lide não é sinônimo de procedência do pedido.

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Duas conseqüências surgem então do efeito da revelia. A primeira, denatureza substancial, prevista no art. 319, salvante a hipótese do art. 320, que éa de presumir como verdadeiros os fatos asseverados pelo demandante; asegunda, de cunho estritamente processual, vale dizer, produz efeitosdeterminados pelo inciso II, do art.330.

Em conseqüência, afiguram-se-nos como legítimas as seguintesconclusões: ocorrendo a revelia, o autor está dispensado do ônus de provar ofato constitutivo da causa, lembrando que, embora o revel possa intervir “sejaa fase em que se encontre o processo” (art. 322, 2ª parte, do Código) não poderáele produzir prova de fato extintivo ou modificativo do pedido do autor,restando irrecusável a procedência do pedido no conseqüente julgamentoantecipado da lide. Em suma, ocorrerá sobredito julgamento apenas e tão-sóverificada plenamente a revelia, nas condições apontadas.

6. DA APLICABILIDADE NAS AÇÕES CÍVEIS

Com a petição inicial, o juiz ao recebê-la, designa audiência de conciliação.Não alcançada a conciliação, o réu oferece sua defesa, cabendo ao Juiz fixar ospontos controvertidos e sanear as questões processuais pendentes. Estando arelação processual sem vícios processuais e percebendo-se que os pontoscontrovertidos fixados já estão respondidos pelos elementos contidos nos autos,incidindo quaisquer das circunstancias previstas no artigo 330, I, do Código deProcesso Civil, não resta outra alternativa a não ser a do julgamento antecipadoda lide.

Destarte, frustrada a conciliação, o juiz tem a possibilidade de rompercom o procedimento genérico e dilatado, proferindo sentença em audiência, ematendimento aos princípios de celeridade e economia processual. A alegação deque a sentença proferida em audiência pode ter fragilizado o seu conteúdo nãoprospera, pois o fato de a sentença perder em qualidade é extremamentecompensado pelo ganho da celeridade na prestação jurisdicional e publicidadeimediata.

É de se afirmar, ainda, que o julgamento antecipado da lide, por se tratarde medida que procura decidir com celeridade os conflitos sociais, somenteencontra empecilho se afrontar a essência do Direito Material objeto da lide.

A propósito, vale transcrever trecho da obra de Moacyr Amaral Santos,que concluiu:

Tanto num como noutro caso acha-se o processosuficientemente instruído e, pois, maduro para ser julgadoquanto ao seu mérito. Seria perda de tempo inútil e gastosupérfluo de energias processuais dilatar o andamento doprocesso até a audiência de instrução e julgamento, quando

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se encontraria com o mesmo material probatório com o quese apresenta após o encerramento da fase de ordenamento doprocesso. Manda, assim, o princípio da economia processualque, evitando-se perda de tempo e de energias processuais,profira o juiz desde logo sentença quanto à lide, isto é, profirajulgamento antecipado da lide. Para que ocorra esse julgamentose exigem duas condições: a) que o processo tenha constituídoe desenvolvido regularmente; b) que as questões de fato nãoreclamem produção de mais provas.5

6.1. Da sua aplicação nas Ações de Despejo:

É admissível a sua aplicação nas ações despejo e, para corroborar comesta assertiva, trago um julgado do Superior Tribunal de Justiça:

JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE –CERCEAMENTO DE DEFESA –INEXISTÊNCIA – AÇÃO DE DESPEJO DEIMÓVEL RESIDENCIAL – PROVA DAAQUISIÇÃO – ESCRITURA PÚBLICA DECOMPRA E VENDA – INEXISTÊNCIA. Omagistrado tem o poder-dever de julgar antecipadamente alide, desprezando a realização de audiência para a produçãode prova testemunhal, ao constatar que o acervo documentalacostado aos autos possui suficiente força probante paranortear e instruir seu entendimento. Se a decisão que decretoua reforma do imóvel residencial locado funda-se em provadocumental, não tendo o réu instruído sua alegação de ausênciade vínculo locatício com a escritura de compra e venda doimóvel, insusceptível de comprovação mediante provatestemunhal, não há que se falar em cerceamento de defesapor julgamento antecipado da lide. Recurso especial nãoconhecido por unanimidade.6

6.2. Da sua aplicação quando existem pedidos cumulativos:

Quaisquer espécies de pedidos têm a possibilidade de ser objeto detutela antecipatória na hipótese de julgamento antecipado do mérito de um dospedidos cumulativos. Tendo-se formado o processo cumulativo, o julgamentoantecipado somente pode se verificar quando admissível para todas as lides quenele se cumulam. Assim, por exemplo, no caso de processo com reconvenção,

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caberá julgamento antecipado se a ação e a reconvenção estiverem em condiçõesde serem julgadas antecipadamente. Se aquela ou esta não preencher tais condiçõese reclamar prosseguimento do processo, isso dar-se-á para que ambas as lidessejam julgadas pela mesma sentença, em audiência.

Para corroborar com esse entendimento cito Luiz Guilherme Marinone:Estando parte do pedido (ou um dos pedidos cumulados),apesar de contestado, maduro para o julgamento, impõe-se ojulgamento antecipado parcial do mérito.7

6.3. Da sua aplicação no procedimento sumário:

O artigo 278, § 2º, do Código de Processo Civil manda que as disposiçõesdo julgamento conforme o estado do processo sejam aplicadas no rito sumário.Tendo a brevidade na prestação jurisdicional como marca de suas posições, esteprocedimento admite na sua sistemática o julgamento antecipado da lide, poisa ruptura com a realização de atos inúteis atende aos objetivos desseprocedimento.

6.4. Quando ocorrer revelia:

Caracterizada a revelia e ocorridos os seus efeitos, desnecessária fica aprodução e provas, desde que o juiz tenha a seu alcance elementos para o seuconvencimento, julgando antecipadamente a lide.

6.5. No caso de apresentação de defesas antecipadas:

Não raro, o réu, ao invés de esperar a audiência de conciliação, instrução ejulgamento, oferece sua defesa nos autos de forma antecipada. Neste caso érecomendável que o juiz, vislumbrando a existência de elementos suficientespara a formação de cognição exauriente, julgue antecipadamente, sempre tendoem vista as peculiaridades da causa, equilibrando a eficácia de nova tentativa deconciliação.

6.6. Da sua aplicação nos Embargos:

É detectada da redação do artigo 740, parágrafo único, do Código deProcesso Civil, a possibilidade do julgamento antecipado da lide aos moldes doartigo 330, I, do mesmo Código. Ao se examinar as hipóteses legais permissivasdos embargos entende-se que na maioria deles o julgamento antecipado da lideé uma regra, restando a instrução como exceção.

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Com relação aos Embargos à Execução, o art. 740,§ único, do CPC é bemclaro no sentido de admitir o julgamento antecipado, no prazo de 10 (dez) dias,quando ocorrer qualquer das hipóteses ali elencadas. Aliás, este dispositivo éuma transcrição quase que literal do art. 330 do CPC.

6.7. Nos casos de ilegitimidade das partes:

Comprovada a ilegitimidade das partes, deve-se julgar antecipadamentea lide.

6.8. Nos casos de cumulação indevida das ações:

Em casos que tais o julgamento antecipado da lide incidental é imperativoao juiz.

6.9. No caso de excesso de execução:

A falta de sintonia entre o que foi determinado na sentença e oprocedimento escolhido (743, III) certamente acaba no julgamento antecipadoda lide. O julgamento antecipado da lide, embora permitido, é de difícil uso,pois normalmente a comprovação do adimplemento ou não exige audiênciapara oitiva de testemunhas ou para apreciação e exame da prova pericial eesclarecimentos dos peritos.

6. 10. No caso de nulidade da execução até a penhora:

Aqui, a Ação de Embargos, fundada na nulidade até à constrição judicialtem no julgamento antecipado o seu destino natural.

6.11. Nas causas impeditivas, modificativas ou extintivas daobrigação e demais casos do artigo 741,VI:

Na análise para formação da cognição exauriente, o julgamento antecipadoé a solução para a maioria dos embargos fundados nas causas obstativassupervenientes à sentença. No caso de prescrição e de compensação, com execuçãoaparelhada, a certeza do julgamento antecipado aflora. No pagamento e nanovação, em algumas situações, a dilação probatória pode ser necessária. Nosdemais casos, é mister o conhecimento da natureza do direito material envolvidopara revelar se o julgamento pode ser antecipado ou não.

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6.12. No caso de revelia nos Embargos:

Se os Embargos têm fundamento em questões processuais, seria detotal injustiça negar o reconhecimento da presunção da veracidade e o julgamentoantecipado. O resultado da pretensão do Embargante não obedecerá à implacávelrelação de causa e efeito face à inércia do Embargado. Aqui, mais do que nunca,a cautela é imperiosa. O julgamento antecipado da lide, portanto, no caso darevelia, é perfeitamente admissível nos Embargos.

6.13. Nos embargos à arrematação ou à adjudicação:

Após a penhora, se fatos outros houverem que possam influir noandamento da Execução, a ação a ser proposta é a dos Embargos à Arremataçãoou à Adjudicação, conforme a espécie de alienação pública que se deu. Nesta açãoo julgamento antecipado tem grande utilidade, sendo exceção a necessidade deaudiência.

6.14. Nas Ações Cautelares:

Concedida ou não a liminar, após a resposta do requerido, o julgamentoantecipado da lide cautelar pode ser utilizado, não sendo necessária a realizaçãode audiência. É o que se nota pela simples leitura do artigo 803, parágrafo único,do Código de Processo Civil. Presentes os fatos constitutivos de formarazoavelmente alegada, na caracterização da revelia, ou a demanda na qual bastaa devida valoração jurídica, por serem desnecessárias ou suficientes as provascontidas nos autos, o julgamento antecipado da lide cautelar tem sua aplicação.

Certamente este julgamento antecipado somente é cabível em cautelaresantecedentes, pois nas incidentes, a prescrição e a decadência têm o seu domicílioe lá devem ser alegadas, estando sob a égide dos princípios da eventualidade e dapreclusão, quando estas puderem atuar.

Neste trilhar, aquelas matérias do Processo Cautelar, em muitos doscasos admitem, desde que respeitadas suas especialidades, o julgamentoantecipado da lide com formação de cognição exauriente e não somente juízoatravés da cognição sumária.

7. IMPOSSIBILIDADE DE SUA APLICAÇÃO EM CERTASCAUSAS:

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7.1. Quando ocorrer pluralidade de partes no pólo passivo dademanda:

Se houver no pólo passivo da relação processual pluralidade de partes, ealguma(s) destas contestar(em) a ação, não será atingida a presunção da veracidadedos fatos, exigindo-se prosseguimento da relação processual.

Assim, o artigo 320, I do Código de Processo Civil afasta o julgamentoantecipado da lide na hipótese de contestação de litisconsorte unitário, sejanecessário, seja facultativo.

7.2. No caso de revel titular de direitos indisponíveis:

Também o julgamento da lide na modalidade da revelia não encontraaplicabilidade ao ser deparado como revel o titular de direitos indisponíveis, ouquando a indisponibilidade estiver indiretamente ligada ao revel. O Magistradodeve tomar extremo cuidado quando a questão versar sobre direito indisponível,devendo dar toda amplitude possível aos mecanismos de provas admissíveisno caso, até porque da sutilidade dessas discussões, que extrapolam os limitesda particularidade, pode atingir interesse maior.

Somam-se à categoria dos direitos ou interesses indisponíveis oschamados direitos constitucionais de terceira geração, ou seja, aqueles direitosprevistos na Constituição, que visam proteger e realçar os direitos da coletividadevistos sob um prisma de indeterminação. São aqueles direitos que tocam atodos. Preenchem os reclamos de solidariedade surgidos no seio social. Enfim,qualquer que seja a justificativa da indisponibilidade, o julgamento antecipadoda lide pela revelia não pode ocorrer.

Em sendo assim, tratando-se de direitos indisponíveis, a atuação protetivadeve prevalecer, com a coleta de provas para melhor convicção do julgador,como determinado no artigo 130 do Código de Processo Civil.

7.3. Quando o Ministério Público, o Curador Especial ou oAdvogado Dativo estiver no pólo passivo da lide:

Inoperante o efeito material da revelia também, quando o MinistérioPúblico, o Curador Especial ou o Advogado Dativo atuem no pólo passivo dalide. Em tais hipóteses o julgamento antecipado da lide, de conformidade como artigo 330, II, não incide.

7.4. Na Declaratória Incidental como motivo de postergação dos

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efeitos da revelia:

Exemplo de tal situação ocorre quando o réu, mesmo que tenhapermanecido revel, não sofre o efeito da revelia em vista de o autor, antes do juizproferir sentença, oferecer pedido de declaração incidente de relação jurídicaprejudicial.

Contudo, se após a resposta do autor, o juiz perceber que não seránecessária audiência de instrução para ambas as ações, proferirá julgamentoantecipado pertinente à Ação e à Reconvenção. Se a reconvenção exigir provasoutras, o julgamento da ação inicial ficará sobrestado.

7.5. Nos casos de Desapropriação:

A doutrina entende não ser possível o julgamento antecipado da lide,quando se trata de desapropriação com base em utilidade pública.

7.6. No processo de Execução:

Não havendo em sua essência a atividade cognitiva do direito, pois estejá está decidido, inexiste julgamento e, com maior razão, não há que se falar emjulgamento antecipado da lide.

7.7. Na exceção de pré-executividade:

Na exceção de pré-executividade, instituto não tão novo, já existente,sob a égide do Código de Processo Civil de 1939, o julgamento da lide não temutilidade, porque nada há para se romper.

7.8. Nos Tribunais de Justiça:

O legislador deveria privilegiar a celeridade criando mecanismos quepermitissem o julgamento pelo tribunal. Entre os valores da segurança e daceleridade, modernamente, este tem de sobressair. Contudo, no sistema atual, arestrição ao conhecimento do tribunal decorre da exigência de que o órgãocolegiado ad quem só possa apreciar e decidir questões que o juiz a quo estivesseem condições de resolvê-las, no momento em que proferiu a sentença.

8. O POSICIONAMENTO DA DOUTRINA:

Não parece haver, em princípio, se bem aplicado o art. 330, qualquer

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colisão com outros preceitos do nosso ordenamento jurídico. Ao contrário, oinstituto harmoniza-se perfeitamente com o art. 125 do CPC, inciso II, quedetermina ao juiz velar pela rápida solução do litígio, recomendando a legislaçãoprocessual o indeferimento das diligências inúteis ou meramente protelatórias,art.130 do Código de Ritos.

O que tem ocorrido, na prática forense, é o juiz, em audiência de conciliaçãoe saneamento, frustrada a conciliação, sanear o feito e marcar audiência de instruçãoe julgamento e, após, rever sua decisão e julgar antecipadamente a lide.

Conceituando o instituto o ilustre professor baiano Calmon de Passos,assim escreveu:

O Julgamento antecipado da lide não é mais do que julgamentodo feito após a fase postulatória, por motivo de se havercolhido, nessa fase, todo o material de prova necessário paraformar a convicção do magistrado (art. 330, I), ou ocorrendoa revelia (art. 330, II).8

A respeito da diminuição das despesas processuais e do tempo bemleciona Pontes de Miranda ao se referir ao instituto:

O julgamento antecipado da lide tem a finalidade de evitarmaiores despesas e ao mesmo tempo diminuir o tempo paraque se ultime o processo.9

Humberto Theodoro Júnior acertadamente mostra as vantagens dautilização do Julgamento Antecipado da Lide, ao eliminar as audiênciasdespiciendas:

A instituição do julgamento antecipado da lide deveu-se,portanto, à observância do princípio da economia processuale trouxe aos pretórios grande desafogo pela eliminação deenorme quantidade de audiências que, ao tempo do Códigorevogado, eram realizadas sem nenhuma vantagem para aspartes e com grande perda de tempo para a justiça.10

No mesmo diapasão Moacyr Amaral Santos:Seria perda de tempo inútil e gasto supérfluo de energiasprocessuais dilatar o andamento do processo até a audiênciade instrução e julgamento, quando se encontraria com o mesmomaterial probatório com que se apresenta após o encerramentoda fase de ordenamento do processo. Manda, assim, o princípioda economia processual que, evitando-se perda de tempo e deenergias processuais, profira o juiz desde logo sentença quanto

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à lide, isto é, profira o julgamento antecipado da lide.11

Ainda sobre os objetivos do instituto rapificador Moacir Caram Júnior,assim escreveu:

O legislador de 1973, ao instituir o Julgamento Antecipadoda Lide – que é uma modalidade do Julgamento Conforme oEstado do Processo-, teve em vista, precipuamente,proporcionar celerização, sumarização e melhorAdministração ao andamento processual.12

Pode ocorrer, também, na hipótese em que os fatos apresentados, tantopelo autor como pelo réu, sejam cumpridamente provados, seja pela aceitação,mesmo tácita, de um ou de outro, por documentos trazidos aos autos, ouainda, mediante alguma atividade instrutória que dispense a realização de audiência,como, por exemplo, a inspeção judicial de pessoa ou coisa.

Em conferência pronunciada no Instituto dos Advogados Brasileiros,Celso Agrícola Barbi deu ao art. 330 do CPC o seu autorizado aval, salientandoa excepcional importância daquele dispositivo que considerou “uma das maioresconquistas que o Código trouxe, reconhecendo o esforço da doutrina e da jurisprudênciabrasileiras”13

O que o processo ganha em condensação e celeridade, sustentava o prof.Alfredo Buzaid, na Exposição de Motivos que acompanhou o projeto que,como Ministro da Justiça, apresentou ao Presidente da República, in verbis:

O que ganha o processo em condensação e celeridade, bempodem avaliar os que lidam no foro. Suprime-se a audiência,porque nela nada há de particular a discutir. Assim, não sepratica ato inútil. De outra parte, não sofre o processoparalisação, dormindo meses nas estantes dos cartórios,enquanto aguarda meses por uma audiência, cuja realizaçãonenhum proveito trará ao esclarecimento da causa, porqueesta já se acha amplamente discutida na inicial e na respostado réu.14

9. DO JULGAMENTO ANTEPIDADO DA LIDE E TUTELAANTECIPADA

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9.1. Das diferenciações:

Aqueles que inadmitem a concessão do provimento antecipatório, apóso término da instrução, estão confundindo a antecipação de tutela com ojulgamento antecipado da lide.

O Juízo de mera probabilidade, que dá lastro à antecipação de tutela, é ofator preponderante de sua diferenciação em face do instituto do julgamentoantecipado da lide. Neste, a decisão é proferida com o fundamento em juízoabsolutamente exauriente, pois considera que o conjunto probatório acostadoaos autos constitui evidência cabal e insofismável do direito do autor, de formaa dispensar a realização de audiência instrutória. Acontece nas hipóteses em quenão há matéria de fato a ser provada, por se tratar de questão meramente jurídicaou havendo matéria de fato, que esta esteja suficientemente demonstrada pelavia documental.

O Julgamento Antecipado da Lide extingue o processo, com a prolaçãode sentença definitiva. Já a antecipação da tutela é provimento temporário, dadomediante decisão interlocutória, modificável ou revogável a qualquer tempo, atéa prolação da sentença final.

Assim, vê-se que, além da tutela cautelar destinada a assegurar a efetividadedo resultado final do processo principal, existe, em dadas circunstâncias, o poderdo juiz de antecipar, provisoriamente, a própria solução definitiva esperada noprocesso principal. Este expediente constitui mesmo um reclamo da Justiçapara que a realização do direito não fique, em determinados casos, a aguardaruma longa e inevitável demora da sentença final.

Neste contexto, fala-se em medidas provisórias de natureza cautelar, decunho apenas preventivo, e medidas provisórias de natureza antecipatória, decunho satisfativo. Na verdade, tanto a medida cautelar propriamente dita (objetode ação cautelar) como a medida antecipatória (objeto de liminar na própria açãoprincipal) representam providências, de natureza emergencial, executiva e sumária,adotadas em caráter provisório.

Entretanto, a diferença substancial entre as duas medidas está em que atutela cautelar assegura tão somente uma pretensão, ao passo que a tutelaantecipatória realiza de imediato a pretensão, dentro da própria ação principal.Assim, o regime legal das medidas cautelares (sempre não-satisfativas) não seconfunde com o das medidas liminares de antecipação de tutela (de carátersatisfativo provisório, por expressa autorização de lei). Por outro lado, a medidacautelar é objeto de ação separada, que pode ser ajuizada antes da ação principalou no seu curso. Há, por assim dizer, uma “autonomia processual” na cautelar.

O texto do art. 273 do CPC prevê que a tutela antecipada, que poderá ser

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total ou parcial em relação aos efeitos do pedido formulado na inicial, dependerádos seguintes requisitos:

· requerimento da parte;· produção de prova inequívoca dos fatos arrolados na inicial;· convencimento do juiz em torno da verossimilhança da alegação da

parte;· fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou· caracterização de abuso de direito de defesa ou manifesto propósito

protelatório do réu; e· possibilidade de reverter a medida antecipada, caso o resultado da ação

venha a ser contrário à pretensão da parte que requereu a antecipaçãosatisfativa.

Desta forma, a antecipação da tutela deve ser concedida pelo juiz que, arequerimento da parte, se convença da verossimilhança da alegação, mediante aexistência de prova inequívoca, devendo haver, ainda, a existência de um dosincisos do artigo 273, do CPC. Assim, é imperiosa a conjugação de um dosincisos com o caput do artigo 273 do aludido código, para que seja deferida aantecipação.

Note que a tutela antecipatória concedida em sentença em nada seassemelha com o julgamento antecipado da lide. Neste, ainda que haja umasentença de mérito, seus efeitos não são antecipados e, a rigor, o direito subjetivoda parte vencedora continua insatisfeito, tendo ainda que esperar o trânsito emjulgado para após proceder à execução forçada no Processo de Execução (excetono caso de execução provisória).

O julgamento antecipado da lide é uma decisão conforme o estado doprocesso e se dá por circunstâncias que autorizam o proferimento de uma sentençaantecipada (questão de mérito somente de direito ou que não se precise produzirprovas em audiência; ocorrência de revelia).

Exige-se prova inequívoca de ameaça a direito do requerente. Não éapenas um fumus boni juris, mas uma prova-título do direito ameaçado. Aocontrário da medida cautelar, que aprecia hipoteticidades de eventuais danos, atutela antecipatória deve exigir uma certeza através da chamada verossimilhança,que vai além da simples plausibilidade jurídica do direito ameaçado, ocorrendoum juízo de delibação; isto é, a sensibilidade de que há realmente um direito aser tutelado.

A respeito desta distinção Nelson Nery Junior, assim explica:Além de ser medida distinta das cautelares, a tutelaantecipatória também não se confunde com o julgamentoantecipado da lide (CPC 330). Neste, o juiz julga o próprio

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mérito da causa, de forma definitiva, proferindo sentença deextinção do processo com apreciação da lide (CPC 269).Nos casos do CPC 273 o juiz antecipa os efeitos da sentençade mérito, por meio de decisão interlocutória, provisória,prosseguindo-se no processo. No julgamento antecipado dalide há sentença de mérito, impugnável por apelação e sujeitaà coisa julgada material, na tutela concedida antecipadamentehá decisão interlocutória, impugnável por agravo e não estásujeita à coisa julgada material.15

Mais adiante, afirma:Distingue-se da tutela antecipada (CPC 273) porque esta édecisão provisória sobre o mérito, ao passo que o julgamentoantecipado da lide é julgamento definitivo do mérito. 16

Com efeito, quando da entrada de uma ação em juízo, deve-se distinguiros resultados fáticos dos jurídicos esperados pelo autor.

A antecipação da tutela acelera efeitos fáticos da tutela jurisdicional, emnada alterando os efeitos jurídicos, que continuam rumo à coisa julgada.

Já o Julgamento Antecipado da Lide, por seu turno, acelera efeitos jurídicos,não modificando os efeitos fáticos, uma vez que a sentença “imediatamente”prolatada, está sujeita ao recurso de apelação dotado, excetuando-se raros casos– de efeito suspensivo. A eventual execução que se iniciará será provisória, quenada mais é do que uma execução incompleta.

Com efeito, a revelia que provoca o julgamento antecipado da lide aceleraefeitos jurídicos, enquanto que a antecipação da tutela acelera efeitos fáticos. Nãopodem os dois institutos ser, portanto, confundidos, haja vista que produzemefeitos diversos.

10. DA POSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DO INSTITUTOAPÓS A AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO

O magistrado, diante da viabilidade de julgar antecipadamente a lide,deve assim proceder de imediato ou, por primeiro, designar audiência de tentativade conciliação na esteira do artigo 331 do CPC?

Mister se faz dizer que referida audiência preliminar somente ocorreráquando, ao se deparar com causa que verse sobre direitos disponíveis, o juiz nãoverificar qualquer das hipóteses previstas no capítulo intitulado como“julgamento conforme o estado do processo”, ou seja, o processo não poderácomportar extinção com base nos artigos 267 e 269, incs. II a V, do CPC, nemjulgamento antecipado (art. 330, I e II do CPC), conforme exegese extraída,

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aliás, do próprio art. 331, senão vejamos: “Se não se verificar qualquer dashipóteses previstas nas seções precedentes e a causa versar sobre direitosdisponíveis, o juiz designará audiência de conciliação...”

Bem é verdade que o Código foi omisso no que pertine à menção dequalquer expediente conciliatório em momento processual de tal natureza, o que,no pensar de FREDERICO MARQUES, foi proposital. Preleciona ele a respeito:

não há lacuna alguma, aqui, que precise ser preenchida cominvocação do direito comparado ou com os princípios geraisde direito. O julgamento antecipado da lide, dadas as condiçõesda vida forense aqui no Brasil, tem por objetivo justamenteimpedir, o quanto possível, a realização de audiência, paradar mais folga às pautas das diversas varas e juízos.17

E conclui o insigne mestre dizendo que a conciliação é prevista no fim doprocesso, por ser esse:

o momento propício para essa tentativa de acordo, pois aspartes já estarão cansadas, o processo vem se prolongando,sendo esse então o momento psicológico, como diz o autorfrancês Jean Vicent, para ter possibilidade de conseguir umacordo. E quando o juiz proferir o julgamento, conforme oestado do processo, as partes ainda não atingiram esseamadurecimento psicológico para receber bem uma proposta,para conciliação. A tentativa de conciliação apenas iriaprocrastinar o processo, prolongá-lo, abrindo-se uma audiênciaque justamente se quer evitar com o julgamento antecipado.18

De igual forma, VICENTE GRECO FILHO, em sua obra DireitoProcessual Civil Brasileiro, defende que, como a conciliação deve ser feita em audiênciae o julgamento antecipado é justamente para evitar a audiência, a conciliação daspartes nesta fase não está de acordo com a sistemática do Código, sendo, pois,inaceitável. Adota, como visto, como correta a posição de José Frederico Marques.

Pedimos vênia, para discordar desses ilustres doutrinadores, uma vezque o art. 125, IV, do CPC afirma:

O Juiz dirigirá o processo conforme as disposições desteCódigo, competindo-lhe: tentar, a qualquer tempo, conciliaras partes. 19

De mais a mais, a tentativa de conciliação, como verdadeira meta a serperseguida, em apoio à idéia de otimização dos serviços do Poder Judiciário, foielevada à categoria de dever do magistrado. É dever do juiz, por força do disposto

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no inciso IV do art. 125 do CPC, tentar conciliar as partes em qualquer fase doprocesso.

À luz deste quadro, entendemos que não contraria o Código, mesmoquando o juiz puder realizar o julgamento antecipado do feito, marcar umaaudiência no intuito de conciliar as partes. Trata-se, aliás, de merecida homenagemao princípio da conciliação. Se as partes chegarem ao acordo, este será reduzido atermo e o juiz o homologará por sentença, aplicando-se analogicamente o § 1ºdo art. 331. Não havendo conciliação, ele profere a sentença naquele ato ouposteriormente. No entanto, há de se dizer que pela sistemática do Código talaudiência jamais será designada com fundamento no art. 331, mas, como visto,será produto da faculdade conferida ao magistrado de, a qualquer tempo, estimularas partes litigantes para que cheguem a um acordo.

Assim entende Alcides de Mendonça Lima, citado por Bendito Mário:que não é contra o Código o juiz, mesmo quando pode fazero julgamento antecipado, marcar uma audiência para conciliaras partes não havendo conciliação, ele dá a sentença naquelemesmo ato ou posteriormente. Diz ainda que isso “nãoviolenta o Código, mas está de acordo com seu espírito.20

De mais a mais, adotar o entendimento no sentido do descabimento daantecipação do julgamento após a instrução probatória significa não dar respostaaos direitos que necessitam urgentemente de tutela satisfativa, uma vez quefaticamente nada se altera para o demandante.

Neste sentido o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA já decidiu arespeito da possibilidade do Julgamento Antecipado não só após a audiência deconciliação, como também, depois do saneamento do processo, da designaçãoda audiência de instrução e julgamento e do indeferimento de produção deprovas:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - LOCAÇÃOCOMERCIAL - USUFRUTO - FALECIMENTODO USUFRUTUÁRIO NA VIGENCIA DOCONTRATO - PERMANÊNCIA DO AJUSTEATÉ O TERMO FINAL PACTUADO -JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE -APELAÇÃO IMPROVIDA - RECURSOESPECIAL - CERCEAMENTO DE DEFESA EEXTINÇÃO DA LOCAÇÃO - DISSÍDIOJURISPRUDENCIAL E OFENSA AOS ARTS.402, I, E 330, I, DO CPC, 6. E 7., DA LEI 6.649/1979 E 739, I, E 1.202, DO CC.1. TENDO O

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MAGISTRADO, ELEMENTOS SUFICIENTESPARA O ESCLARECIMENTO DA QUESTÃO,FICA O MESMO AUTORIZADO A DISPENSARA PRODUÇÃO DE QUAISQUER OUTRASPROVAS, AINDA QUE JÁ TENHA SANEADOO PROCESSO, PODENDO JULGARANTECIPADAMENTE A LIDE, SEM QUE ISSOCONFIGURE CERCEAMENTO DE DEFESA.2. O CONTRATO DE LOCAÇÃO PACTUADOPELO USUFRUTUÁRIO DO IMÓVEL LOCADOPERMANECE VÁLIDO ATÉ O SEU TERMOFINAL, MESMO EM CASO DE MORTE DOUSUFRUTUÁRIO. OS NUS-PROPRIETÁRIOS,AGORA NO DOMÍNIO PLENO DO IMÓVEL,SOMENTE PODEM INTENTAR A SUARETOMADA APÓS O TERMO FINAL DOCONTRATO. 3. PRECEDENTES DOTRIBUNAL. 4. RECURSO ESPECIAL NÃOCONHECIDO. grifo nosso.21

AÇÃO DE ANULAÇÃO DE ESCRITURAPÚBLICA CUMULADA COM OCANCELAMENTO DO REGISTROIMOBILIÁRIO. JULGAMENTO ANTECIPADODA LIDE. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃOINTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICOEM PRIMEIRO GRAU DE JURISDIÇÃO.ARGUIÇÃO DE NULIDADE. ARTIGOS 82, III,246, 331 DO CPC. DEPENDENDO DAAPRECIAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS DECADA CASO CONCRETO, PODERÁ O JUIZJULGAR ANTECIPADAMENTE A LIDE, SEMCERCEAMENTO DE DEFESA, MESMO SE EMSANEADOR JÁ HOUVESSE DESIGNADOAUDIÊNCIA. NÃO CABE, EM RECURSOESPECIAL, REEXAMINAR FATOS E PROVAS,PARA VERIFICAR DA EVENTUALRELEVÂNCIA DE ‘ESCLARECIMENTO’ EMAUDIÊNCIA PELOS PERITOS. A NÃOINTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

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EM PRIMEIRO GRAU DE JURISDIÇÃO PODESER SUPRIDA PELA INTERVENÇÃO DAPROCURADORIA DE JUSTIÇA PERANTE OCOLEGIADO DE SEGUNDO GRAU, EMPARECER CUIDANDO DO MÉRITO DACAUSA SEM ARGUIR PREJUÍZO NEMALEGAR NULIDADE. DE OUTRA PARTE,NÃO É NECESSÁRIA A INTERVENÇÃO DOPARQUET QUANDO O CANCELAMENTO DOREGISTRO IMOBILIÁRIO APRESENTA-SENÃO COMO PEDIDO PRINCIPAL, MAS COMOMERA E INAFASTÁVEL DECORRÊNCIA DAANULAÇÃO DE CONTRATO DE COMPRA EVENDA. EM RAZÃO DA QUALIDADE DAPARTE, A PRESENÇA NO PÓLO PASSIVO DESOCIEDADE DE ECONOMIA MISTAIGUALMENTE NÃO OBRIGA AINTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO.RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO, PORAMBAS AS ALÍNEAS, ‘’A’’ E ‘’C’’, DOPERMISSIVO CONSTITUCIONAL.22grifo nosso

CERCEAMENTO DE DEFESA: INDEFERI-MENTO DE PROVAS E JULGAMENTOANTECIPADO DA LIDE. 1. PODE O JUIZINDEFERIR PROVA, SE DESNECESSÁRIA 2.PODE O JUIZ CONHECER DIRETAMENTE DOPEDIDO, AINDA QUE TENHA MANDADOESPECIFICAR E JUSTIFICAR PROVA. 3. CASOEM QUE, POR SUAS CIRCUNSTÂNCIAS, ERALÍCITO AO JUIZ ASSIM PROCEDER, DONDEIMPROCEDENTE A ALEGAÇÃO DE OFENSAAOS ARTS. 130, 330-I 331-I DO COD. DE PR.CIVIL. 4. RECURSO ESPECIAL NÃOCONHECIDO.23grifo nosso.

Desse modo, o argumento das pautas do Judiciário não se revelajustificativa para mitigar a grandeza da busca da tão desejada solução conciliatória.

11. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE: PODER OUDEVER DO JULGADOR?

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A discricionariedade judicial está associada a questões de naturezaprobatória, como o princípio da livre apreciação de prova e do livre convencimentodo julgador, ao contrário da discricionariedade administrativa, que está restrita àoportunidade e à conveniência de seus atos.

A exigência de fundamentação no Julgamento Antecipado da Lide é, porsi só, uma vinculação para o magistrado, restringindo ainda mais seu poderdiscricionário.

É certo que o julgador ao apreciar a possibilidade ou não de julgarantecipadamente a lide, em especial, a presença de seus pressupostos e requisitosexigidos, age com uma pequena margem de discricionariedade, entretanto, emsendo efetivamente comprovada a existência desses requisitos, não é lícito aojuiz deixar de julgar antecipadamente.

Após a fase postulatória, o juiz deverá observar detidamente a questão.Sentindo-se suficientemente convencido dos fatos expostos pelas partes e observandonão carecerem de produção de provas, deverá antecipar o julgamento da ação. Damesma forma, agirá o juiz quando as provas documentais anexadas aos autos peloautor o levarem ao exaurimento da cognição acerca dos fatos expostos.

Por outro lado, não há que se falar em cerceamento de defesa se omagistrado entender pela prescindibilidade da audiência instrutória, jásuficientemente convencido para prolatar sentença. Para tanto, a fundamentaçãodo decisório deve espelhar esse juízo de plausibilidade para mencionadaantecipação de provimento.

De mais a mais, o juiz deve atuar com extrema cautela para não suprimiroportunidade de realização de provas relevantes. Entretanto, o magistrado é osenhor da conveniência na produção dos elementos de convicção, porquanto é odestinatário das provas. Isto significa dizer que ele pode indeferir provasdesnecessárias ou realizar outras não solicitadas, desde que justifique aquilo quelhe permite o melhor julgamento. Assim, não há o vício do cerceamento dedefesa pelo simples fato de a parte ter requerido a produção de uma prova e ojuiz não tê-la deferido.

Ultrapassada a etapa saneadora e não se vislumbrando vícios processuaisinsanáveis, é chegado o momento de encarar a possibilidade de se decidir,definitivamente, a lide, desde que os elementos colhidos na relação processualsejam suficientes e adequados à formação de cognição exauriente.

Questão controvertida é saber se o Julgamento Antecipado é um poderou um dever do julgador.

Sobre o assunto Ernani Fidélis, assim entende, litteris:O julgamento antecipado da lide não está na vontade daspartes. Ocorrendo as hipóteses de possibilidade, deve serproferido. Mas o juiz deve ser parcimonioso em decidir

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antecipadamente. Por mais tênue que seja a dúvida sobre ofato, deve-se oferecer à parte oportunidade de provar o que forde seu interesse. A questão não se prende propriamente àforma de justiça, mas de usar de faculdade que dispensamaiores delongas no andamento do processo24

Para corroborar a defesa de sua aplicabilidade imperativa, é salutar notarque o preceito do artigo 330 é no sentido de que o juiz conhecerá diretamente dopedido como determinação e não como permissão.

No dizer de Theotônio Negrão, em comentários ao art. 330:O preceito é cogente: ‘conhecerá’, e não ‘poderá conhecer’, sea questão for exclusivamente de direito, o julgamentoantecipado da lide é obrigatório. Não pode o juiz, por suamera conveniência, relegar para fase ulterior a prolação dasentença, se houver absoluta desnecessidade de ser produzidaprova em audiência. 25

E, mais adiante, assim se manifesta:Não obstante, deve o juiz ser cauteloso no julgarantecipadamente a lide, pois há um grande número desentenças anuladas, nesse caso, por cerceamento de defesa.26

Neste mesmo sentido entende SÁLVIO DE FIGUEIREDOTEIXEIRA, citado por Joel Dias Figueira Jr:

quando adequado, o julgamento antecipado não é faculdade,mas dever que a lei impõe ao julgador.27

ARRUDA ALVIM, também citado pelo mesmo autor, assim discorre:esse julgamento é antecipado àquilo que ocorreria no sistemade 1939, quando esse mesmo julgamento sempre dependeriade audiência de instrução e julgamento, no sistema atualdizer-se antecipado não tem maior sentido, pois que, se seconfigurarem os pressupostos desse julgamento, é dever dojuiz decidir nessa oportunidade e, pois, em rigor, não háantecipação propriamente dita. Se não decidisse, ocorrentesos pressupostos para fazê-lo só a final, o que haveria, naverdade, seria um julgamento atrasado.28

Trilhando essa idéia, JOEL DIAS FIGUEIRA JR:Desde que a hipótese em concreto se enquadre nos moldes do

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inc. I ou II do art. 330, o julgamento se faz mister sem quese verifique qualquer tipo de cerceamento. Trata-se, portanto,de dever do juiz e não de faculdade ou simples liberalidade.29

Corroborando com esse entendimento, ANTÔNIO SALVADOR,assim escreveu:

deve o juiz fazer o julgamento imediato da lide, dispensandoa audiência, mesmo após o despacho saneador, se já foramproduzidas as provas deferidas, sobre elas ouvidas as partes,que nenhuma prova oral desejam realizar na audiência,inclusive afirmando que não desejam esclarecimentos doperito.30

A esse respeito, judiciosa é a afirmativa de CALMON DE PASSOS, inverbis:

Do julgamento antecipado da lide por desnecessidade dainstrução-Examinados pelo juiz, com ou sem argüição doréu, os pressupostos de constituição e de desenvolvimentoválido do processo, bem como as condições da ação e sanadasas irregularidades ou nulidades que o sejam, se desse examenão decorre a extinção do processo, cumpre ao juiz proferirjulgamento segundo o estado do processo, ou conhecendodiretamente o pedido, ou simplesmente saneando o feito.31

No mesma diapasão MOACYR CARAM JÚNIOR entende:O magistrado deve, então, deparando-se com a questão demérito exclusivamente de direito e, por conseguinte, nãohavendo fato a ser indagado, proceder incontinenti à prolataçãoda sentença antecipadamente.32

Diferente deste entendimento é o de ALEXANDRE BIZZOTTO, queafirma que o Julgamento Antecipado é o dever moral, senão veja-se:

A determinação imperativa que se promulga neste trabalhodeve ser entendida como apontamento de cunho moral para ojulgador. Este dever, já se disse, deve ser bem entendido,pois não se encontra na sistemática processual qualquersanção ao descumprimento. Repita-se, é um dever moral.33

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SERGIPE entendeque a Antecipação do Julgamento é uma imposição ao magistrado, como se vê

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do seguinte aresto:AÇÃO RESCISÓRIA. ARGUIÇÃO DENULIDADE DA SENTENÇA QUE ANULOUCOMPRA E VENDA DE ASCENDENTE ADESCENDENTE POR INTERPOSTA PESSOA,FUNDADA NO FATO DE QUE NÃO HOUVEJUNTADA DA PROCURAÇÃO DOVENDEDOR. IRRELEVÂNCIA. DECISÃOPROFERIDA COM RESPALDO NAS PROVASPRODUZIDAS. CONFIRMAÇÃO.IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. DECISÃOUNÂNIME. NÃO HAVENDO, COMO NO CASOEM APREÇO, NECESSIDADE DE PROVAS EMAUDIÊNCIA, DEPOIMENTOS, PERÍCIAS OUINSPEÇÃO JUDICIAL, IMPÕE-SE OJULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE.ADEMAIS, COMO ESCLARECIDO PELASTESTEMUNHAS E CONFESSADO PELOS RÉUSDA AÇÃO E AUTORA DA RESCISÓRIA,AVENDA FOI EFETUADA COM O OBJETIVO DEBENEFICIAR O IRMÃO DA RÉ, COMO APRÓPRIA CONFESSOU, RAZÃO PELA QUALJULGA-SE IMPROCEDENTE A AÇÃORESCISÓRIA, MANTENDO-SE EM TODOS OSSEUS TERMOS A SENTENÇA RESCINDENDA.(INTELIGÊNCIA DOS ARTS.492 E 330, I,AMBOS DO CPC, C/C O ART. 1.132, DO CÓDIGOCIVIL).34 grifo nosso.

O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA já decidiu que o JulgamentoAntecipado não é uma faculdade e sim um dever do julgador, in verbis:

Presentes as condições que ensejam o julgamento antecipadoda causa, é dever do juiz e não mera faculdade, assimproceder.35 grifo nosso.Processual Civil - Nulidade de cerceamento de defesa. I-Acaso a sentença obedeça aos ditames insculpidos no art.458 do CPC, não enseja a sua nulidade. ademais, e cediçoque não e nula a decisão com fundamentação sucinta, mas aque carece da devida motivação, essencial ao processodemocrático. II-Em sede de embargos a execução, e

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inadmissível e mesmo inaceitável, a oitiva de testemunhas,portanto, o juízo deve-se ater aos documentos acostados aosautos, devendo o magistrado fazer uso do permissivo no art.330, inc. I do diploma processual civil, quando o processoversar sobre matéria de direito e a prova ser exclusivamentedocumental. a propósito, o STJ, guardião do direitoinfraconstitucional pátrio e incisivo: “presentes as condiçõesque ensejam o julgamento antecipado da causa, e dever dojuiz, e não mera faculdade, assim proceder. STJ, REsp2.831-RJ. III - Recurso não conhecido.36 grifo nosso.

A mesma Corte, em outro julgado, entendeu que a antecipação dojulgamento é um poder-dever:

CONSTITUCIONAL. AÇÃO POSTULATÓRIADE DIREITOS ESTATUTÁRIOS. REINTE-GRAÇÃO FUNCIONAL. COMPETÊNCIA.JUSTIÇA FEDERAL. - Compete à Justiça Federalprocessar e julgar ação de reintegração em cargo públicofederal, de vez que a pretensão deduzida em juízo temnatureza nitidamente estatutária. PROCESSUALCIVIL. JULGAMENTO ANTECIPADO DALIDE. PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCI-MENTO DO JUIZ. CERCEAMENTO DEDEFESA. INEXISTÊNCIA. - A tutela jurisdicionaldeve ser prestada de modo a conter todos os elementos quepossibilitem à compreensão da controvérsia, bem como asrazões determinantes da decisão, como limites ao livreconvencimento do juiz, que deve formá-lo com base emqualquer dos meios de prova admitidos em direito material,hipótese em que não há que se falar cerceamento de defesapelo julgamento antecipado da lide. - O magistrado tem opoder-dever de julgar antecipadamente a lide, desprezando arealização de audiência para a produção de prova testemunhal,ao constatar que o acervo documental acostado aos autospossui suficiente força probante para nortear e instruir seuentendimento. Recurso especial não conhecido.37 Grifo nosso.

Por outro lado, o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, entendeu quenão há cerceamento de defesa no Julgamento Antecipado, desde que esteja

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fundamentado no convencimento do juiz:AGRAVO DE INSTRUMENTO - CERCEA-MENTO DE DEFESA EM FACE DO JULGA-MENTO ANTECIPADO DA LIDE - INOCOR-RÊNCIA - HIPÓTESE QUE NÃO ENVOLVE AVALORAÇÃO JURÍDICA DA PROVA, MASEVIDENTE PRETENSÃO AO REEXAME E ÀINTERPRETAÇÃO DO ACERVO PROBATÓRIO- IMPOSSIBILIDADE - SÚMULA 279/STF -AUSÊNCIA DE OFENSA DIRETA ÀCONSTITUIÇÃO - RECURSO DE AGRAVOIMPROVIDO. - A decisão judicial que consideradesnecessária a realização de determinada diligênciaprobatória, desde que apoiada em outras provas e fundadaem elementos de convicção resultantes do processo, não ofendea cláusula constitucional que assegura a plenitude de defesa.Precedentes. - A via excepcional do recurso extraordinárionão permite que nela se proceda ao reexame do acervoprobatório produzido perante as instâncias ordinárias.Precedentes.38

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EMAGRAVO DE INSTRUMENTO. JULGAMENTOANTECIPADO DA LIDE. ALEGAÇÃO DECERCEAMENTO DE DEFESA. IMPROCE-DÊNCIA. Julgamento antecipado da lide. A antecipação elegítima se os aspectos decisivos da causa estãosuficientemente líquidos para embasar o convencimento domagistrado, e, por isso, não há necessidade de produção deprovas em audiência. Violação ao princípio da ampla defesa.Inexistência. Agravo regimental improvido.39

Destarte, se a questão de fato gira em torno apenas de interpretações dedocumentos já produzidos pelas partes; se não há requerimento de provasorais; se os fatos arrolados pelas partes são incontroversos; e ainda se nãohouver contestação, o que também leva à incontrovérsia dos fatos da inicial e àsua presunção como verdadeiros (art.319); o juiz não pode promover a audiênciade instrução e julgamento, porque estaria determinando a realização de ato inútile, até mesmo, contrário ao espírito do Código.

Moacyr Caram Júnior, traçando uma orientação para a efetiva utilizaçãodo instituto, assim escreveu em sua obra:

Por fim, se conclui que a aplicabilidade dos institutos

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pesquisados deve ser orientada pela locução consciência,preparo intelectual do magistrado e observância aos preceitosprocessuais e constitucionais, deve ficar patente que oinvestimento na sensibilidade e capacitação técnica-jurídicada magistratura é questão definidora para a melhor utilizaçãodo art.330 do Código Processual Civil.40

É bom lembrar aos magistrados o direito constitucional que garante atodo litigante uma tutela jurisdicional efetiva, adequada e tempestiva, bem comoque a demora do processo prejudica o autor que tem razão e sempre beneficia oréu que não a tem.

Em sendo assim, a regra contida no art. 330 é, a nosso pensar, de ordempública e, portanto, de natureza cogente, não ficando ao alvedrio do juiz ou daspartes a utilização ou não do instituto do Julgamento Antecipado da Lide.

CONCLUSÃO

No transcorrer desse trabalho, decorrem algumas conclusões, poucasrealmente pessoais e algumas outras que decorrem de posicionamentodoutrinário e jurisprudencial.

Mostramos que a prática da cognição exaustiva do direito em litígio,impedindo a celeridade processual, torna o processo moroso levando o Judiciárioao descrédito. Demostramos, por outro lado, que a utilização do JulgamentoAntecipado privilegia os Princípios Constitucionais da Economia, Simplicidade,Celeridade, Instrumentalidade e Efetividade Processual, além de eliminar aenorme quantidade de audiências, que na maior parte das vezes são inúteis.

Afirmamos que dentre os institutos processuais que visam evitar aperpetuação das lides, está o Julgamento Antecipado. Mas adiante,argumentamos que a utilização corajosa do instituto rapificador é imprescindívelpara que os valores da efetividade tenham o lugar de destaque que a sociedadeanseia. Fizemos um passeio na história até chegar ao Julgamento Antecipado daLide presente em nossos dias.

Especificamos as condições para a satisfatória utilização do art. 330 doCPC, conceituando seus vocábulos e adentrando na sua aplicabilidade nas açõescíveis e inaplicabilidade em pouquíssimas causas. Transcrevemos oposicionamento dos grandes doutrinadores brasileiros que escreveram sobre oassunto, no intuito de demonstrar a grande importância de sua utilização, hajavista que existe poucas obras específicas sobre o tema.

Com o objetivo de esclarecer aos operadores do direito, diferenciamos oJulgamento Antecipado da Lide, previsto no art. 330 e incisos, da Tutela

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Antecipada, contida no art. 273 do CPC, que para muitos significam a mesmacoisa, o que não é verdade. Demonstramos que é possível sua aplicação mesmoapós a realização audiência de conciliação, trazendo doutrina e jurisprudência aesse favor.

Por fim, tentamos demonstrar que o Julgamento Antecipado da Lidenão é uma faculdade do julgador, mas sim um dever que se aplica quandopresentes as condições elencadas no art. 330 do CPC, e, para isso, colacionamoso posicionamento do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça,do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, de inúmeros doutrinadores e, osnossos argumentos pessoais.

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1 VITIRITTO, Benedito Mario. Julgamento Antecipado da Lide e outros estudos. 2.ed. São Paulo: lejus, 1999. p. 5.2 NEGRÃO, Theotônio. Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor.33. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 4089.3 GRINOVER, Ada Pellegrini. O julgamento antecipado da lide: enfoque

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constitucional. Revista de Processo, ano II, n.º5, p. 105, janeiro-março de 1977.4 MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela Antecipatória, Julgamento Antecipado eExecução imediata da sentença. 3. ed. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 1999. p.206.5 SANTOS, Moacir Amaral. Primeiras Linhas do Direito Processual Civil. 20. ed. SãoPaulo: Saraiva, 1999. p. 260.6 (STJ – REsp 167552/AM, Rel. Min. Vicente Leal)7 MARINONI, Luiz Guilherme e ARENHAT, Sérgio Cruz. Manual do Processode Conhecimento. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 265.8 PASSOS, José Joaquim Calmon de. Comentários ao Código de Processo Civil. 6. ed.Rio de Janeiro: Forense, 1991. p. 494.9 MIRANDA, Pontes. Comentários ao Código de Processo Civil. Atualizado porSérgio Bermudas. 3. ed. [S. l.]: [s. n.], 1996. p. 260.10 JÚNIOR, Humberto Theodoro. Curso de Direito Processual Civil. 32. ed. Rio deJaneiro: Forense, 2001. Vol. I. p. 360.11 SANTOS, Moacir Amaral. Primeiras Linhas do Direito Processual Civil. 20. ed.São Paulo: Saraiva, 1999. p. 259/262.12 JÚNIOR, Moacyr Caram. O Julgamento Antecipado da Lide, Oliveira. São Paulo:Juarez de Oliveira, 2001, p. 93.13 (Revista do IAB nº 31, p. 53).14 JÚNIOR, Moacyr Caram. O Julgamento Antecipado da Lide, Oliveira. São Paulo:Juarez de Oliveira, 2001. p. 100.15 JÚNIOR, Nelson Nery, Rosa Maria Andrade Nery. Código de Processo CivilComentado. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 613.16JÚNIOR, Nelson Nery, Rosa Maria Andrade Nery. Código de Processo CivilComentado. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 68717 MARQUES, José Frederico. Manual de Direito Processual Civil. [S. l.]: Bookseller,1997. Atualizado por Uilson Rodrigues Alves. Vol. II p. 143/147.18 MARQUES, José Frederico. anual de Direito Processual Civil. [S. l.]: Bookseller,1997. Atualizado por Uilson Rodrigues Alves. Vol. II p. 143/147.19 NEGRÃO, Theotônio. Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor.33. ed. São Paulo, Saraiva, 2002. p. 223.20 VITIRITTO, Benedito Mario. Julgamento Antecipado da Lide e outros estudos. 2.ed. São Paulo: lejus, 1999.21 (STJ, RESP 57861-GO, Min. Anselmo Santiago)22 (STJ, RESP 2903/MG, Rel. Min. Athos Carneiro)23 (STJ, RESP 8772/SP, Rel. Min. Nilson Naves)24 SANTOS, Ernane Fidélis dos Santos. Manual de Direito Processual Civil. Processode Conhecimento. São Paulo: Saraiva, 1998. Vol. 1. p. 409.25 NEGRÃO, Theotônio. Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor.33. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 408.

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26 NEGRÃO, Theotônio. Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor.33. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 408.27 JÚNIOR, Joel Dias Figueira. Comentários ao Código de Processo Civil. Tomo II.São Paulo:. Revista Tribunais, 2001. Vol. 4 p. 45528 IDEM29 IDEM30 SALVADOR, Antônio Raphael Silva. Julgamento imediato da lide mesmo após odespacho saneador, ano 76, junho de 1987, vol. 620, p. 259.31 PASSOS, José Joaquim Calmon de. Comentários ao Código de Processo Civil. 6.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1991. p. 418.32 JÚNIOR, Moacyr Caram. O Julgamento Antecipado da Lide, Oliveira. São Paulo:Juarez de Oliveira, 2001. p. 43.33 BIZZOTTO, Alexandre. Julgamento Antecipado Civil e Penal. Goiânia: ABEditora, 2000. p. 42.34 (TJ/SE, Acórdão 429/1997, Tribunal Pleno, Rel. Epaminondas S. de AndradeLima)35 (STJ, Resp. 7.267-RS, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, DJ de 08.04.91)36 (STJ, Min. Waldemar Zveiter, Resp 136381)37 (STJ, Min. Vicente Leal, Resp 102303).38 (STF, Min. Celso de Mello, Agrag. 153467-MG).39 (STF, Min. Maurício Correia, Agrag. 143608-SP40 JÚNIOR, Moacyr Caram. O Julgamento Antecipado da Lide, Oliveira. São Paulo:Juarez de Oliveira, 2001. p. 47.